Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00057/14.7BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/27/2016
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Vital Lopes
Descritores:OPOSIÇÃO
INSOLVÊNCIA
INSUFICIÊNCIA DE BENS
REVERSÃO
Sumário:1. Por força do estatuído no n.º7 do art.º23.º da LGT, declarada a insolvência do devedor originário, deve o órgão da execução fiscal equacionar a possibilidade de reversão das dívidas perante os indícios de insuficiência de bens do devedor originário;
2. Se o imóvel avaliado nos termos do CIMI (1.064.433,50€) sobre que recai garantia hipotecária prestada no âmbito do plano de recuperação, não é de valor suficiente para o pagamento da dívida garantida (1.100.000,00€), nem se prova que a AT, em caso de liquidação do devedor principal logre, na insolvência, pagamento prioritário sobre outros bens do seu património, verifica-se uma situação de fundada insuficiência de bens à luz do disposto no art.º153.º, n.º2 al. b), do CPPT.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:P...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

P…, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a oposição que deduziu à execução fiscal n.º4219201101033000 e apensos contra ele revertida e originariamente instaurada contra o Clube Desportivo… por dívidas de IVA (0703T a 0806T) e IRS- Retenções na fonte (2011/06 a 2011/08), no valor global de 68.724,59€

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.246).

Na sequência do despacho de admissão, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:

I. A Sentença proferida nos presentes autos, não se pode manter.

II. A Administração Fiscal exige o pagamento, por parte do Recorrente, da quantia total de €68.724,59 (sessenta e oito mil setecentos e vinte e quatro euros e cinquenta e nove cêntimos), mediante reversão operada ao abrigo do disposto no artigo 23.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária.

III. O Recorrente é apenas responsável subsidiário pela quantia em divida, não lhe podendo ser exigido o pagamento do valor em dívida, porquanto o principal responsável, Clube Desportivo ... tem bens suficientes que permitem o seu pagamento.

IV. Tal facto, do ponto de vista do Recorrente, ficou comprovado no presente processo, nos pontos 5.º e 6.º, dos factos, sendo certo, porém, que o Tribunal “a quo” não levou em devida consideração o mesmo, tendo optado por considerar a Oposição apresentada improcedente.

V. O devedor principal, Clube Desportivo ..., foi declarado insolvente no processo que corre termos no 3.° Juízo do Tribunal Judicial de Santo Tirso, sob o n.° 3954/12.0TBSTS, constando tal informação dos autos.

VI. Em tal processo de insolvência foi apresentado plano de Insolvência - votado favoravelmente pela Fazenda Nacional, diga-se - onde se prevê o pagamento integral do crédito devido à Fazenda Nacional, o que nos leva a concluir que a reversão das dívidas do Clube Desportivo ... é manifestamente precipitada e prematura, sendo mesmo um contrassenso, atento o sentido de voto da Autoridade Tributária.

VII. Na eventualidade de vir a ser decretada a liquidação do devedor originário - hipótese que se adianta por mera questão de raciocínio - o seu património, em sede de liquidação, será suficiente para assegurar o crédito da Fazenda Nacional.

VIII. O devedor principal tem activo que ultrapassa o montante de €1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros), facto este que é dado como provado na sentença proferida - pontos 5.° e 6.º, dos factos.

IX. Atento o exposto, é inequívoco que não corresponde, de todo, à verdade que o devedor principal não possua bens capazes de liquidar, na íntegra, os valores devidos à Fazenda Nacional,

X. Crendo mesmo, e muito seriamente, que nenhuma razão assiste à Autoridade Tributária quando alega que a devedora principal tem um passivo de sete milhões de euros e que por tal motivo fica provada a insuficiência de bens, facto que a sentença recorrida igualmente teve em consideração, no ponto 7.°, dos factos.

XI. O volume de passivo da devedora principal em nada releva para o pagamento dos valores em dívida à AT na medida em que de acordo com o artigo 97.º, n.° 1, do CIRE “a contrario”, mantém-se o privilégio creditório geral dos créditos do Estado que tenham sido constituídos nos 12 meses anteriores à declaração de insolvência, o que é o caso em apreço.

XIX. O Tribunal “a quo” não teve em devida atenção este facto de importância extrema, pois os créditos do Estado, constituídos nos últimos 12 meses, têm preferência de pagamento em detrimento dos demais, facto que acautela, ainda que em parte, o pagamento dos créditos da Recorrida.

XIII. O crédito da Fazenda Nacional vai ser integralmente pago, na hipótese de uma liquidação do activo da devedora principal.

XIV. Sem prescindir do exposto, temos que o supra identificado processo de insolvência foi encerrado atenta a homologação do plano de insolvência apresentado, plano esse que não foi cumprido pela devedora principal, facto que acarretou que esta fosse novamente declarada insolvente, em 15 de Dezembro de 2015, desta feita pela Comarca do Porto, Instância Central, Secção do Comércio de Santo Tirso, J2, no processo com o n.° 3594/15.2TBSTS - conforme documento que se junta, atenta a sua superveniência, já que apenas ocorreu em data posterior à prolação da sentença recorrida, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos.

XV. Em tal processo será apresentado plano de insolvência onde será garantido o pagamento da totalidade do crédito atinente ao presente processo, estando, dessa forma, assegurado de forma integral o crédito da Fazenda,

XVI. Tendo em conta até o elevado valor do activo da Devedora Principal - mais de € 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros) - mantendo-se o privilégio previsto no artigo 97.°, do CIRE.

XVII. Ou seja, o devedor principal garante a liquidação da dívida que mantém para com a Autoridade Tributária.

XVIII. Assim sendo e em conclusão: atento o facto de ter a devedora principal bens que permitem o pagamento integral da dívida à Fazenda Nacional afigura-se que a reversão efectuada não se adequa e não se pode manter por falta de fundamento legal, devendo a sentença proferida ter tido estes factos em devida consideração, o que não ocorre.

XIX. Deveria o Tribunal “a quo” ter considerado a Oposição apresentada totalmente procedente, impondo-se, consequentemente, a esse Exmo. Tribunal a revogação da sentença proferida, devendo a mesma ser substituída por outra que julgue procedente a Oposição apresentada e considere extinta a execução interposta contra o Recorrente.

XX. Em corroboração do exposto veja-se que determina o n.° 2, do artigo 23.º, da LGT ao dispor que “A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários.”.

XXI. E bem assim o n.º 2, do artigo 153.° do CPPT determina que “O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores; b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da divida exequenda e acrescido.”.

XXII. Ainda no seguimento da posição do Recorrente atente-se ao excerto de um artigo publicado na revista de Doutrina Tributária, 3.° Trimestre de 2002, que estatui o seguinte “Na responsabilidade subsidiária a cobrança do imposto só actua sobre o responsável por forma mediata e coerciva, e por reversão em processo de execução fiscal, ou seja, primeiro haverá que envidar a cobrança da dívida sobre o devedor do imposto (contribuinte directo ou o substituto) e só após exauridos ou esgotados esses mecanismos será possível reverter, cobrar a divida aos responsáveis, administradores e gerentes das sociedades comerciais.”.

XXIII. Neste mesmo sentido veja-se o Acórdão do supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 0488/06, de 29-09-2006, in www.dgsi.pt, que estatuí que: “Assim, à face da LGT, concluindo-se pela “fundada insuficiência” de bens penhoráveis do devedor originário, pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens do responsável subsidiário esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário”.

XXXV. Atento o supra exposto, bem como o que decorre dos autos e que foi julgado como provado, entende o Recorrente que a Sentença proferida deveria ter sido no sentido de julgar a Oposição apresentada como procedente, tendo andado mal ao decidir como o fez.

XXV. O Tribunal “a quo” fez uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 23.°, n.° 2, da LGT, 153.°, n.° 2, do CPPT e 97.º, n.° 1, do CIRE.

Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, deve a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que determine a extinção da execução interposta contra o Recorrente.

Assim, será feita, como sempre, inteira Justiça!»

A Recorrida não contra-alegou.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente (cf. artigos 635.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão que importa resolver reconduz-se, nuclearmente, a indagar se se verificam os pressupostos da responsabilidade subsidiária, nomeadamente, no que respeita à inexistência ou insuficiência de bens do devedor originário, nos termos previstos no n.º2 do art.º23.º da LGT e n.º2 do art.º153.º do CPPT.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:

«Dos factos com relevância para a apreciação das questões.
1.º - Pelo Serviço de Finanças da Trofa foi instaurado o processo de execução fiscal (PEF) n.º4219201101033000 e aps., contra o devedor originário Clube Desportivo ..., NIPC: 5…, por dívidas de IVA e IRS, no valor global de € 65.724,59.
2.º - Por despacho de 05.12.2013 procedeu o referido Serviço de Finanças à reversão das dívidas referidas em 1.º), contra o ora oponente - cf.doc. de fls.20 e 21 do processo físico.
3.º - O ora oponente foi citado para os termos da reversão em 09.12.2013 - cf. doc. de fls.56 do processo físico.
4.º - Por sentença de 11.06.2013 foi o executado declarado insolvente no processo n.º3954/12.0TBSTS, aberto com caráter pleno, por decisão do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santo Tirso - cf. doc. de fls.194 do processo físico.
5.º - O devedor originário possui os seguintes bens imóveis: prédio urbano, sito em União das freguesias de Bougado, concelho da Trofa, inscrito na respetiva matriz sob o art.º9… (antigo artigo urbano n.º4…, da freguesia de S. Martinho do Bougado), avaliado, nos termos do CIMI em € 132.96,33; prédio urbano, sito em União das freguesias de Bougado, concelho da Trofa, inscrito na respetiva matriz predial sob o art.º1… (antigo artigo urbano n.º4…, da freguesia de S. Martinho do Bougado, deste concelho), avaliado, nos termos do CIMI em € 1.064.433,50.
6.º - De acordo com o doc. n.º2, anexo à audição prévia do ora oponente, existem bens móveis com um valor estimado de € 25.000.
7.º - No processo especial de revitalização n.º3506/12.5TBSTS, que antecedeu o referido processo de insolvência do executado, foram reclamados créditos que ultrapassaram os sete milhões de euros.
8.º - O ora oponente assinou o pedido de pagamento em prestações com data de 22.09.2011.
9.º - O ora oponente exerceu funções diretivas no Clube Desportivo ... entre 08.07.2011 e 12.10.2011.
10.º - O devedor originário requereu ao competente Serviço de Finanças o pagamento dos PEF em causa associados ao Processo de Insolvência em prestações e de acordo com o plano de recuperação aprovado no referido processo de insolvência - cf. doc. de fls.200 do processo físico.
11.º - Como garantia da dívida em causa no PEF objeto dos presentes autos foi constituída hipoteca voluntária devidamente registada na competente Conservatória - cf. doc. de fls.200 e seguintes do processo físico.
Não existem factos não provados com relevância para a decisão do processo.

***
Motivação:
No que respeita à factualidade considerada provada e relevante à decisão da causa, o Tribunal fundou a sua convicção na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e que não foram objeto de impugnação, assim como, em parte dos factos alegados pelas partes que não foram impugnados e que estão, igualmente, corroborados pelos documentos constantes dos autos (cf. artigos 74.º e 76.º n.1º da Lei Geral Tributária (LGT) e artigos 362.º e seguintes do Código Civil (CC))».
4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Decorre da lei que o âmbito do recurso se encontra delimitado pelas conclusões das alegações extraídas da motivação do recurso apresentado pelo Recorrente, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria nelas não inserida, com ressalva dos casos em que se impõe o seu conhecimento oficioso, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos282.º, n.ºs 5 a 7 do CPPT e 684.º, n.º3, do CPC (actual 635.º, n.º4).

Assim sendo, analisadas as conclusões do recurso, constata-se que o Recorrente não se conforma com a sentença recorrida por erro de julgamento quanto à verificação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, nomeadamente, no que respeita à inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário. Vejamos.

Preceitua o art.º23.º da LGT, para o que aqui importa decidir:
«1. - A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
2. - A reversão contra o responsável subsidiário depende de fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão.
3. - Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fica suspenso desde o termo do prazo da oposição até á completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.
7. - O dever de reversão previsto no n.º 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis».

E o art.º153.º do CPPT, na parte que importa para os autos, dispõe:
«2. - O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores;
b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.

No caso em apreço, a AT exige do oponente, aqui Recorrente, o pagamento da quantia de 68.724,59€, mediante reversão operada ao abrigo do disposto nos n.º2 e 7 do art.º23.º da LGT e 153.º, n.º2 al. b), do CPPT.

O devedor originário, Clube Desportivo da Trofa, foi declarado insolvente por sentença de 11/06/2013, proferida no proc.º3954/12.0TBSTS, do 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santo Tirso e foi na sequência de tal informação que foi proferido o despacho de reversão, de 05/12/2013, como se alcança de fls.455/456.

Ora, à data da prolação da sentença de insolvência e da prolação do despacho de reversão, dispunha o artigo 23º, n.º 7 da LGT que, “o dever de reversão previsto no n.º 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis”.

Pode-se retirar deste preceito legal, bem como do disposto nos nºs. 2 e 3 do mesmo artigo 23º, que o legislador quis, uma vez verificada a insuficiência dos bens do executado e ainda sem que tenham sido penhorados e vendidos todos os bens que lhe restem, que a AT profira obrigatoriamente o despacho de reversão. E tal despacho deve ser proferido mesmo que o quantum da responsabilidade do devedor subsidiário não esteja completamente determinado e que os autos de execução devam aguardar, quanto a si, que ocorra a completa excussão dos bens do executado e devedor principal, verificados que estejam, naturalmente, os restantes requisitos legalmente previstos para que possa ocorrer a reversão – vd. Ac. do STA, de 02/07/2014, proc.º01200/13.

Sucede que o Recorrente, não questionando embora a possibilidade legal de reversão no seguimento da sentença de insolvência e antes da remessa do processo executivo ao de insolvência (art.º181.º, n.º2, do CPPT), entende que o devedor originário tem bens suficientes para o pagamento da dívida, falecendo o requisito da fundada insuficiência de bens penhoráveis como operante da reversão. Mas sem razão, avançamos já.

Como é pacífico na jurisprudência, a inexistência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se ao momento em que a reversão ocorre – vd. Ac. do STA, de 16/03/2016, tirado no proc.º0647/15.

Como consta da fundamentação do despacho de reversão, o devedor originário possui dois bens imóveis, avaliados nos termos do CIMI, em 132.960,33€ e 1.064.433,50€, existindo ainda bens móveis com o valor estimado de 25.000,00€.

No entanto, como também se refere no mesmo despacho, teve o serviço de finanças conhecimento «que no processo especial de revitalização n.º3506/12.5TBSTS que antecede o aludido processo de insolvência, foram reclamados créditos que ultrapassam os sete milhões de euros, pelo que o património do executado não é suficiente para a regularização de todo o passivo (e por isso insolvente), isto é, perante a insolvência fica provada a insuficiência de bens penhoráveis, o que habilita desde logo a promoção da reversão contra os responsáveis subsidiários» (cf. pontos 5. a 7. do probatório, não impugnado).

Ora, não excedendo o património penhorável do devedor principal 1.250.000€, tal valor mostra-se muito aquém dos créditos reclamados no processo de revitalização e que integram o passivo do devedor principal, de 7.000.000€, em termos de justificar a reversão.

Ainda que a Administração tributária tenha votado favoravelmente o plano de recuperação económica e obtido do devedor principal garantias para o pagamento das dívidas em prestações, nos termos previstos nos artigos 196.º e 199.º do CPPT, tal não obsta à reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens do responsável subsidiário chamado fique dependente da prévia excussão dos bens penhorados do devedor originário, devendo-se, nesse caso, suspender a execução do chamado até estar definido com precisão o montante a pagar por ele (não podendo, por conseguinte, a AT praticar actos coercivos como a penhora ou venda de bens do responsável subsidiário chamado).

A este propósito, e tal como decorre dos pontos 10. e 11. da sentença e de fls.200/212 dos autos, veio a ser constituída garantia hipotecária, no âmbito dos autos de insolvência, sobre um dos imóveis do devedor principal – o avaliado nos termos do CIMI em 1.064.433,50€ - para pagamento em prestações de dívidas à AT no valor de 1.100.000,00€, e à Segurança Social de 120.528,66€, não podendo, com tais valores, concluir-se de forma certa e segura, bem pelo contrário, que o pagamento integral do crédito fiscal logra satisfação através da garantia hipotecária.

Por outro lado, na eventualidade de vir a ser decretada a liquidação do devedor originário, o seu património imóvel e móvel, de cerca de 1.250.000€, mostra-se claramente insuficiente para satisfação dos créditos fiscais, face ao referido passivo de 7.000.000€.

A este propósito, pretende o Recorrente que lhe aproveita a contrario o disposto no art.º97.º, n.º1 al. a) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo DL n.º53/2004, de 18 de Março, segundo o qual, “Extinguem-se, com a declaração de insolvência:
a) Os privilégios creditórios gerais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de segurança social constituídos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência;”, na medida em que os créditos do Estado constituídos nos 12 meses anteriores à declaração de insolvência se mostram privilegiados, logrando pagamento prioritário no caso de liquidação do activo.

Na graduação de créditos no processo de insolvência e para a questão dos autos, importa ter em conta o disposto nos artigos 46.º, 48.º, 174.º e 175.º do CIRE.

Estatui o n.º1 do art.º46.º do CIRE: «A massa insolvente destina-se à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo».

Estabelece o n.º1 do art.º174.º do CIRE: «Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 172.º, liquidados os bens onerados com garantia real, e abatidas as correspondentes despesas, é imediatamente feito o pagamento aos credores garantidos, com respeito pela prioridade que lhes caiba; quanto àqueles que não fiquem integralmente pagos e perante os quais o devedor responda com a generalidade do seu património, são os saldos respectivos incluídos entre os créditos comuns, em substituição dos saldos estimados, caso não se verifique coincidência entre eles».

E dispõe o n.º1 do art.º175.º do mesmo Código que «O pagamento dos créditos privilegiados é feito à custa dos bens não afectos a garantias reais prevalecentes, com respeito da prioridade que lhes caiba, e na proporção dos seus montantes, quanto aos que sejam igualmente privilegiados».

Seguem-se na graduação os créditos comuns e subordinados, pela ordem indicada no art.º48.º do CIRE.

Ou seja, não encontrando os créditos fiscais do Estado integral satisfação através da garantia hipotecária constituída (art.º174.º, n.º1), também não é líquido que como créditos privilegiados obtivessem qualquer satisfação, pois o Recorrente não demonstra, ou sequer alega, a inexistência de garantias reais ou privilégios creditórios prevalecentes (art.º175.º, n.º1), sobre outros bens que integram o património do devedor principal.

Concluindo, não demonstra o oponente, aqui Recorrente, que à data do despacho de reversão não se verificavam os pressupostos do seu chamamento à execução, nomeadamente no que concerne à fundada insuficiência de bens do devedor principal, nos termos do disposto no n.º2 do art.º153.º do CPPT.

E, na falta dessa prova, bem andou a AT ao promover a reversão contra si no seguimento do conhecimento oficial da declaração de insolvência do devedor principal, nos termos do disposto no n.º7 do art.º23.º da LGT, não tendo a sentença incorrido em erro de julgamento ao sancionar tal actuação, merecendo ser confirmada.

O recurso não merece provimento.

5 - DECISÃO
Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo do Recorrente.
Porto, 27 de Outubro de 2016
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro