Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01457/13.5BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/29/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Cristina da Nova
Descritores:VÍCIOS INVOCADOS, SUBSIDIARIEDADE DO SEU CONHECIMENTO, VALORAÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL, IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA FACTO PROVADA E NÃO PROVADA
PROCESSO FISCAL/INDIVIDUAL E PROCURAÇÃO FORENSE,
EXCESSO DO PRAZO DE INSPEÇÃO, CONTRADITÓRIO, DILIGÊNCIA DE RECOLHA DE DADOS, MÉTODOS INDIRETOS EXCESSO DE QUANTIFICAÇÃO, TAXA DE EVASÃO FISCAL.
Sumário:1- Procuração do s.p. para ser junta ao processo individual//fiscal, a que alude o art. 135.º do CIRC não é suficiente para que se infira que ela tem em vista o procedimento de revisão, aonde se fez representar por perito por si indicado, o seu TOC. Importa que se especifique o objeto a que se destina. A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do ato a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las.

2- A discordância tout court sobre a valoração da prova testemunhal produzida e sobre a convicção do julgador, sem precisar ou identificar o vício lógico em que se incorre não permite a alteração da matéria de facto. A alteração da matéria de facto – ou a correta fixação da matéria de facto como a Recorrente reclama – pressupõe o erro no seu julgamento. O que ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.

3- Os elementos documentais constantes dos autos não justificam a alteração da matéria de facto tal como pretende a recorrente em matéria de duração da inspeção, não obstante, é uniforme o entendimento da jurisprudência, máxime, a do STA Entre outros, Ac. de25-02-2015 no processo 070/14, disponível em www.dgsi.pt
, que inobservância dos prazos legalmente definidos para a inspecção apenas relevam directamente em sede de caducidade da liquidação, não ofende os princípios constitucionais da legalidade, proporcionalidade e imparcialidade.
Os depoimentos valem em função da objetividade do que se diz, sua coerência e isenção emprestam, por sua vez, credibilidade e plausibilidade ao depoimento.

4 -Na determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação [art. 74º, n. º3 da LGT].Da fundamentação adotada pela AT têm de resultar motivos pelos quais se considera legalmente justificado o recurso ao método indireto, no caso, verificam-se os pressupostos da aplicação da metodologia indireta na parte respeitante aos processos a zero em falta no período de janeiro de 2008 a agosto de 2011.
Verificados os pressupostos da aplicação do método indireto, a Administração Fiscal terá que quantificar os rendimentos tributáveis através da sua aplicação em concreto.

5- É clara a jurisprudência, nomeadamente deste TCA Acórdão de 19-06-2019 no processo 02362/08 BEPRT e Ac. do TCA Sul de 17-09-2019 no processo 484/16 , em matéria de quantificação da matéria tributável por método indireto, que compete sempre ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação, por sua vez, cabe à AT indicar os critérios utilizados nessa quantificação e justifica-los.
Resulta que o cálculo da taxa de “evasão fiscal” no montante de 32,7%, foi construída com base nos valores registados pela empresa no período compreendido entre setembro e dezembro de 2011 (taxa média de 4 meses), servindo de base para calcular os valores de processos a zero e processos em falta relativos ao período compreendido entre janeiro de 2008 e agosto de 2011, observado o art. 90.º da LGT.*
* Sumário elaborado pela relatora
___________________________________
i) Entre outros, Ac. de25-02-2015 no processo 070/14, disponível em www.dgsi.pt

ii) Acórdão de 19-06-2019 no processo 02362/08 BEPRT e Ac. do TCA Sul de 17-09-2019 no processo 484/16
Recorrente:M., LDA
Recorrido 1:Fazenda Pública
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1.RELATÓRIO.

M., Lda., com NIF (…), vem recorrer da sentença do TAF de Braga que julgou improcedente a impugnação da liquidação adicional do IRC dos exercícios de 2008 a 2010.
*
Formula nas respetivas alegações (cfr.fls.390-440 do processo digital) com as seguintes conclusões que se reproduzem:

«1) A factualidade articulada e provada não permite que a impugnação possa ser julgada totalmente improcedente.
2) A recorrente imputou ao acto impugnado, na PI, os seguintes vícios invalidantes:
Falta de notificação do mandatário (art.º 40º/nº 1 do CPPT)
Violação do princípio do contraditório (art.º 8º do RCPIT)
Violação do prazo do procedimento inspectivo (artº 36º/ nºs 2 e 3 do RCPIT)
Errónea quantificação do lucro tributável (art.º 99º/alínea a) do CPPT) e
3) Os documentos nº 10 e 11 anexos à p.i. demonstram que a impugnante constituiu mandato tributário, com representação, ao abrigo do artº 5º do CPPT.
4) A referida procuração foi outorgada em 19.12.2012, foi apresentada na Direcção de Finanças de Viana do Castelo em 14.01.2013, com a menção expressa de que esta procuração se destinava ao processo individual da impugnante, tendo em 28.01.2013 sido apresentado esclarecimento a confirmar que a dita procuração se destinava ao processo individual da impugnante.
5) Na data da apresentação da procuração (14.01.2013) tinha acabado de ser concluído um procedimento inspectivo, como se pode ver pelo documento nº 7 (notificação do Relatório da Inspecção), a que se seguiu a instauração de um procedimento de revisão da matéria tributável, formulado em 28.01.2013, ao abrigo do artº 91º da LGT, como se pode ver pelo documento nº 8, anexos à p.i.
6) À data da conclusão do procedimento de revisão da matéria tributável, ocorrida a 09.04.2013, a impugnante já dispunha de mandatário, pelo que, nos termos do disposto no artº 40º do CPPT, a notificação da decisão daquele procedimento tinha de ser efectuada na pessoa do mandatário. E não foi.
7) O documento nº 7 (Relatório da Inspecção) demonstra que a AT procedeu a uma auditoria ao sistema informático da impugnante, fazendo intervir um perito em informática, sem que a recorrente tivesse podido escrutinar esse procedimento, designadamente, através da nomeação de um perito de informática, segundo as regras da prova pericial.
8) A agravar esta situação está o facto de a impugnante não ter conseguido abrir o “CD” remetido em anexo ao relatório da Inspecção, no qual estariam gravados ficheiros que a Inspecção considerava úteis ao esclarecimento das correcções.
9) Portanto, não foi assegurado à recorrente o direito ao contraditório previsto no artº 8º do RCPITA.
10) O documento nº 7 (Relatório da Inspecção) a fls. 5 – II.1 Credencial, âmbito e extensão da acção inspectiva, comprova que a acção inspectiva se iniciou a 24.06.2009 e terminou a 9.11.2012.
11) Tendo, por conseguinte, durado 3 anos e 5 meses, muito para além do prazo legal sem, contudo, ter sido objecto de qualquer prorrogação.
12) O documento nº 7 (Relatório da Inspecção) demonstra que a AT procedeu ao apuramento do lucro tributável da recorrente, relativamente aos anos em causa, utilizando em simultâneo o método de avaliação directa – fazendo correcções técnicas e o método de avaliação indirecta – fazendo correcções presumidas, somando os dois tipos de correcções para determinar o valor final.
13) Esta realidade encontra-se espelhada com especial clarividência a fls. 15, 18-v e 19 do Relatório inspectivo.
14) Nos articulados 49º a 67º da p.i., a impugnante identifica 6 (seis) erros de quantificação que constituem fundamento para a presente impugnação. São eles:
i. No apuramento dos designados “processos a zero” não se teve em consideração que uma parte desses “processos a zero” se justifica através de certas realidades da vida da empresa, adiante explicitadas, que representam um excesso de quantificação de pelo menos 25%.
ii. A quantificação dos designados “processos a zero” assentou nos valores médios por refeição dos “processos maiores que zero”, que estão errados, como se verá adiante, a propósito do terceiro erro.
iii. A quantificação dos designados “processos maiores que zero” é excessiva porquanto não leva em consideração que uma grande parte das refeições servidas no restaurante de Viana, que a impugnante estima em 95%, respeita a pratos económicos (prato do dia), cujo preço ronda os 6€.
Assim, levando em consideração esta realidade, os valores médios avançados pela Inspecção devem ser de 6,45€ (12,95x5%+12,29x95%/2) e de 6,60€ (12,95x5%+12,59x95%/2)
iv. A quantificação dos designados “processos em falta” baseou-se nos valores médios por refeição de 12,29€ e de 12,59€, quando essa quantificação deveria basear-se nos valores médios indicados pela impugnante, de 6,45€ e 6,60€ (acima mencionados)
v. A aplicação da taxa de 32,78% a pretexto de uma alegada evasão fiscal, não tem suporte legal, nem está fundamentada, caso fosse legalmente permitida, contribuindo para uma quantificação excessiva.
vi. A quantificação efectuada pela Inspecção está desfasada do lucro real, o que a torna excessiva.
15) No que concerne ao primeiro dos erros identificados, o mesmo resulta dos factos seguintes:
Não foi abatido o número de refeições gratuitas, resultantes da promoção que atribui ao cliente uma refeição gratuita por cada 10 refeições, e que se estima em cerca de 10% do valor total das refeições servidas, e que justificam, nessa medida., uma parte dos designados “processos a zero”.
Não foram abatidas as quebras na cobrança dos serviços de clientes “em fuga”, que, igualmente justificam uma parte dos designados “processos a zero”
Não foram abatidas as encomendas à cozinha anuladas por troca dos bens a pedido do cliente ou por mudança de mesa, que, do mesmo modo, justificam uma parte dos designados “processos a zero”
16) No que concerne ao segundo dos erros identificados, o mesmo resulta do facto de os valores médios por refeição apurados para os designados “processos a zero” ter resultado da utilização dos valores médios por refeição apurados para os designados “processos maiores que zero” que, como se verá adiante, a propósito do terceiro erro, são excessivos.
17) Relativamente ao terceiro erro identificado, ele resulta do facto de não ter sido levado em consideração que uma parte das refeições servidas no restaurante de Viana consiste em refeições económicas, tipo “prato do dia”, seja na percentagem de 95% indicada pela impugnante, seja na percentagem de 50% admitida pelo inspector que prestou declarações como testemunha.
18) No que respeita ao quarto erro identificado, ele resulta do facto de o valor dos designados “processos em falta” dever ser apurado com recurso aos mesmos valores médios por refeição dos “processos maiores que zero” e esses valores estarem errados, como se demonstrou acima.
19) No que concerne ao quinto erro identificado, ele resulta do facto de a lei não prever a possibilidade de serem aplicadas na quantificação por métodos indirectos taxas de evasão fiscal e, ainda que a lei permitisse o uso desse tipo de taxa, a taxa aplicada de 32,78% não se mostra justificada ou fundamentada, sendo, por isso arbitrária (porquê 32,78%?)
20) Relativamente ao sexto erro identificado, ele resulta do facto de se entender que a AT não está obrigada a quantificar a matéria tributável por métodos indirectos o mais próximo possível do designado lucro real.
21) A recorrente pretende impugnar os seguintes itens da matéria de facto, mantendo a ordem por que foram articulados, requerendo desde já a reapreciação da prova gravada, nos termos seguintes:
Item 22 do probatório: “Em 14.01.2013 a impugnante apresentou na Direcção de Finanças de Viana do Castelo uma procuração forense a favor do Advogado A., tendo esclarecido em 28.01.2013 que a mesma se destinava ao processo fiscal da M., LDA”.
Item 20 do probatório: “Com a comunicação do RIT foi remetido à impugnante um DVD com toda a informação tida em consideração pelo inspector e recolhida do sistema informático pelo Núcleo de Técnicos referido em 05) e 06), contendo toda a informação por eles recolhida e gravada e a que se alude em 06)”
Item 35 do probatório: “O procedimento de inspecção tributária teve início em 19.06.2012, com a assinatura das ordens de serviço, pelo gerente da loja R., e conclusão em 27.12.2012, com a notificação do relatório da inspecção tributária à impugnante”.
22) Na parte final do probatório foram dados como não provados os seguintes factos:
Facto não provado: “[...] o vertido no ponto 54.º da PI, designadamente que: - 95% das refeições servidas nos Restaurantes explorados pela impugnante são do tipo económico ao preço de €6,00; - que as refeições económicas são vendidas a metade do valor contabilizado; - que a impugnante possui uma promoção neste tipo de refeições económicas, publicitada no site da internet oferecendo uma refeição gratuita ao fim de dez refeições pagas e que esta prática corresponde a 10% da anulação no sistema de facturação dos “processos a zero””.
Facto não provado: “[...] o vertido nos pontos 55.º e 56.º da PI, designadamente que o número de “processos a zero” e “processos em falta” considerados pelo SIT representam um excesso de pelo menos 25% e que o valor médio dos “processos maiores que zero” é excessivo.”
Facto não provado: “[...] o vertido no ponto 49.º da PI, nomeadamente que a impugnante não pode escrutinar os elementos utilizados na quantificação efectuada pela AT”.
23) Embora a impugnante e ora recorrente não tenha estabelecido expressamente uma relação de subsidiariedade dos vícios arguidos, na verdade, essa relação está implícita na ordem por que foram tais vícios invocados visto que a procedência de qualquer deles torna desnecessário o conhecimento dos seguintes, sendo certo que, o julgamento dos vícios arguidos pela ordem indicada pela impugnante conferia mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
24) Assim, deveria o Tribunal a quo ter conhecido dos vícios arguidos pela ordem indicada pela impugnante, como decorre do artº 124.º, nº 2 – alínea b) do CPPT, e não o fez.
25) Deste modo, assiste à impugnante o direito de organizar as suas alegações, atacando a douta sentença recorrida pela ordem em que foram arguidos os vícios invalidantes do acto impugnado.
26) Acresce que, o Tribunal a quo assentou a sua convicção dando total credibilidade à testemunha arrolada pela Fazenda Pública e negando qualquer credibilidade à testemunha arrolada pela impugnante, fazendo uma errada avaliação dos respectivos depoimentos.
27) Por um lado, recusa-se a aceitar as declarações de ciência proferidas pela testemunha arrolada pela recorrente, já que se trata de alguém que conhece bem a realidade económica da impugnante.
28) Por outro lado, o tribunal a quo reconhece total credibilidade à testemunha arrolada pela Fazenda Pública sendo que tal testemunha, a não ser inábil para depor, sempre teria de ser considerada como desprovida de qualquer credibilidade.
29) Na verdade, esta testemunha é o inspector que subscreveu o relatório inspectivo que está a ser questionado no Tribunal.
30) Nada mais natural, por demais evidente e decorre da experiência comum que o inspector que subscreveu o controvertido relatório tente em tribunal, de defender a sua “dama” resolvendo eventuais dúvidas sobre o dito relatório mediante a reformulação dos argumentos utilizados ou a adição de novos elementos.
31) Deste modo, este tipo de testemunhas não deve ser admitido a depor por se encontrar sob suspeita quanto à integralidade daquilo que possa dizer porque, na verdade, tem interesse em influenciar a decisão do tribunal em favor do “seu” relatório.
32) Por conseguinte, o inspector tributário ouvido como testemunha nos autos não goza de qualquer credibilidade. Por isso, não deveria ter sido admitido a depor.
33) Por outro lado, os relatórios inspectivos constituem sempre a fundamentação dos actos de liquidação que neles se baseiam.
34) Quer isto dizer que tudo o que um inspector acrescente ao seu relatório na qualidade de testemunha está a reproduzir fundamentação a posteriori. O que é ilegal.
35) Com efeito, como vem sendo decidido pelas instâncias superiores dos TAF, a fundamentação dos actos em matéria tributária tem de ser contextual, contemporânea e integrante do próprio acto, não podendo os tribunais valorar razões de facto ou de direito que não constem da fundamentação, sejam elas eleitas pelo tribunal, sejam elas invocadas pela AT a posteriori. - Cfr, por exemplo, Ac.do STA de 27.01.2016 – Proc.º nº 043/16 e Ac do STA de 21.11.2012 – Proc.º nº 0736/12, disponíveis em www.dgsi.pt
36) Por isso, admitir a depor um inspector que subscreveu um relatório inspectivo equivale a aceitar uma fundamentação a posteriori.
37) O Tribunal a quo deu como provado [Facto 22 do probatório] que a impugnante apresentou na Direcção de Finanças de Viana do Castelo uma procuração forense destinada ao processo fiscal/individual da impugnante.
38) Como se constata através dos Doc’s 10 e 11 anexos à PI, tal não corresponde inteiramente à realidade.
39) Com efeito, resulta destes documentos que a impugnante conferiu, para além dos poderes forenses em geral, também poderes especiais para praticar actos de natureza procedimental ou processual tributária, cumulando, assim, um mandato forense com um mandato tributário com representação, ao abrigo do artº 5.º do CPPT, devendo a procuração ficar alocada ao processo fiscal/individual da impugnante.
40) Estes dois tipos de mandato não podem ser confundidos.
41) A procuração forense habilita o mandatário a litigar em determinado processo ou procedimento em nome do mandante.
42) Já o mandato tributário habilita o mandatário a intervir em qualquer acto em matéria tributária, como decorre do artº 16.º, nº 1 da LGT conjugado com o artº 40.º, nº 1 do CPPT.
43) Daqui decorre que o mandatário da impugnante tinha de ser notificado da decisão do procedimento de revisão da matéria tributável subscrito pela impugnante, mesmo sem ter intervindo nesse procedimento na posição de litigante.
44) Na verdade, mesmo sem ter subscrito o pedido de revisão, na qualidade de mandatário, era vontade da mandante que o seu mandatário acompanhasse os trâmites do procedimento de revisão, o que implicava a sua notificação ao mandatário.
45) Este entendimento colhe apoio no artº 136º do CIRC que prevê a existência de um processo individual onde se incorporem as declarações e outros elementos que se relacionem com o mesmo.
46) De acordo com o ofício-circulado nº 19, de 09/11/1989 – da Direcção de Serviço do IR – antiga DGCI (disponível no Portal das Finanças), no processo individual devem ser arquivados todos os elementos respeitantes a cada contribuinte, não só os que aparecem listados nesse ofício-circulado, a título exemplificativo, mas todos, incluindo, portanto, as procurações.
47) A pretensão da recorrente tem suporte legal, ou seja, a procuração por si apresentada habilitava o mandatário a intervir em todos os actos de natureza tributária que lhe digam respeito.
48) A AT tinha na sua posse uma procuração emitida pela impugnante, conferindo mandato tributário ao seu advogado, o que a obrigava a notifica-lo de todos os actos em matéria tributária que dissessem respeito à impugnante.
49) Os entraves colocados pela AT ao mandato conferido pela impugnante, como se encontra demonstrado nos autos, constituem uma restrição inadmissível ao direito de representação fiscal consagrado na lei.
50) Por um lado, a forma como devem os contribuintes conferir mandato tributário envolve matéria que não cabe nas competências da AT.
51) Na verdade, a forma de conferir mandato tributário não envolve uma “questão fiscal” cuja apreciação caiba nas competências da AT.
52) Com efeito, “questão fiscal” será aquela que de qualquer forma, imediata ou mediata, faça apelo à interpretação e aplicação de normas de direito fiscal, com atinência ao exercício da função tributária da Administração [Cfr neste sentido Ac. do TCAN de 04.11.2011 – Proc.º nº 01161/10.6BEBRG]
53) Por conseguinte, a forma como deve ser conferido o mandato encontra-se regulada na lei civil e pauta-se pelo princípio da liberdade contratual (Cfr artº 405.º do CCivil), cabendo aos contribuintes o direito de definir o modo e a forma como desejam ser representados perante a AT, não podendo ser colocados entraves ao exercício do mandato que não resultem da lei civil, cabendo à AT, tão só, cumprir a vontade dos contribuintes expressa através do contrato de mandato.
54) Por outro lado, os entraves colocados pela AT à procuração apresentada pela impugnante, na justa medida em que impedem o seu mandatário de aceder aos trâmites de um pedido de revisão, consubstancia em si um entrave ao direito de defesa da impugnante, violador do princípio da proibição da indefesa enquanto corolário dos princípios da tutela jurisdicional efectiva e da proporcionalidade consagrados no artº 20º, nº 4 da Lei Fundamental.
55) A violação dos direitos de defesa consiste na privação ou limitação do direito de defesa dos particulares perante os órgãos judiciais (ou administrativos), nos quais se dirimem questões cuja resolução pode afectar a sua esfera jurídica.
56) Como referem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA [Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed, Coimbra Editora, p. 163] a violação do princípio da proibição da indefesa, enquanto “(...) limitação do direito de defesa, verificar-se-á, sobretudo, quando a não observância “(...) de princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer o seu direito de alegar [e provar, acrescentamos nós] daí resultando prejuízos efectivos para os seus interesses”
57) Esta questão remete-nos para os princípios estruturantes da ordem jurídica democrática, onde encontra especial relevo o princípio do processo equitativo, integrado pelos elementos de densificação enunciados no artº 6º, § 1º da CEDH e no artº 14º do PIDCP – instrumentos internacionais de que Portugal é Parte – e que comandam a formulação das garantias inscritas no artº 20º da Constituição da República portuguesa. [Cfr. FALCÃO, Pedro Marinho “O Princípio da Proibição da Indefesa e a Tributação das Manifestações de Fortuna” Almedina, 2015, p.104]
58) Por sua vez, muito embora o legislador disponha de uma ampla margem de liberdade na concreta modelação do processo, a verdade é que o direito ao processo inculca que os regimes adjectivos devem revelar-se funcionalmente adequados aos fins do processo e conformar-se com o princípio da proporcionalidade, não estando, portanto, o legislador autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva. [Cfr. MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui de “Constituição Portuguesa Anotada” Coimbra Editora, Tomo I, 2005, p.190]
59) Se o legislador ordinário não pode introduzir constrangimentos processuais que limitem ou inutilizem arbitrariamente o direito de defesa dos cidadãos, muito menos se admite que, por via de uma interpretação dos tribunais ou da Administração se criem tais constrangimentos.
60) Deste modo, e em face dos argumentos adiantados, deve ser dado como provado que o mandatário da impugnante não foi notificado da decisão do procedimento de revisão, em violação do disposto no artº 16.º, nº 1 da LGT e artº 40.º, nº 1 do CPPT.
61) Daqui resulta a ineficácia da decisão do procedimento de revisão da matéria tributável que, por esse motivo, não podia servir de base às liquidações impugnadas que, assim, se encontram inquinadas de ilegalidade, devendo ser anuladas.
62) O Tribunal a quo deu como provado [facto 20 do probatório] que a AT entregou à impugnante, juntamente com o relatório inspectivo, um DVD contendo toda a informação recolhida pelos técnicos do Núcleo de Informática Forense da AT.
63) O Tribunal a quo não pode afirmar que o citado DVD continha toda a informação recolhida pelos técnicos do referido Núcleo de Informática porquanto, não se mostra provado nos autos que o tribunal tenha acedido ao conteúdo de tal DVD.
64) E poderia fazê-lo, já que o mencionado DVD se encontra junto ao processo.
65) O que não pode é o Tribunal afirmar que o controvertido DVD contém determinada informação sem ver essa informação.
66) O que vale por dizer que o Tribunal a quo está a dar como provado um facto que desconhece.
67) Portanto, tratando-se tal DVD de um elemento de prova invocado pela AT para justificar as correcções por si efectuadas, se não se aceder ao conteúdo desse DVD fica precludida a possibilidade de a impugnante escrutinar tal meio de prova.
68) Ou seja, fica a impugnante impedida de exercer o direito ao contraditório.
69) Por outro lado, a auditoria efectuada pela AT ao sistema informático da impugnante decorreu sem se dar a esta a possibilidade de se fazer representar nessa diligência por um perito especializado, como era seu direito em face do que se dispõe no artº 54.º, nº 3, em conjugação com o artº 8.º, nº 1, ambos do RCPITA.
70) A AT apareceu nas instalações da impugnante para realizar a dita auditoria, que decorreu com relativa rapidez (2 horas?) solicitando a presença da impugnante mas não explicando que tipo de diligências iria realizar nem informando que a impugnante poderia nomear um perito especializado para acompanhar esse tipo de diligências.
71) Assim, a impugnante assistiu à realização da questionada auditoria mas sem perceber em concreto aquilo que estava a ser feito, ou seja, sem perceber como estava a decorrer a auditoria do ponto de vista técnico, porque nada percebe dessa matéria, daí a necessidade de fazer intervir um perito seu.
72) Deste modo, a impugnante não pôde escrutinar o trabalho que a AT estava a realizar para poder controlar a legalidade desse mesmo trabalho.
73) Ou seja, a impugnante foi impedida de exercer o direito ao contraditório relativamente a uma diligência que iria servir como meio de prova para o procedimento inspectivo - cfr. depoimento da testemunha da impugnante, A., cujas declarações se transcrevem acima, tiradas do CD da gravação da prova – Faixa 1- 00:00:01 a 01:46:34:
74) Na verdade, embora a testemunha não estivesse presente durante a realização da auditoria, descreveu com relativa certeza – depoimento indirecto – a forma como a AT atropelou os direitos de defesa da impugnante nessa diligência.
75) Deste modo, e em face dos argumentos adiantados, deve ser dado como provado que a impugnante foi impedida de se fazer representar por um perito especializado nas diligências da auditoria realizada pelo Núcleo de Informática Forense da AT, em violação do disposto no artº 8.º, nº 1 e artº 54.º, nº 3 do RCPITA.
76) Devendo, ainda, ser dado como provado que o DVD que acompanhava o relatório inspectivo notificado à recorrente não possuía as características técnicas que permitissem aceder à informação contida no mesmo, em violação do disposto no artº 8.º, nº 1 e artº 62.º, nº 3 – alínea i), ambos do RCPITA.
77) Daqui resultando a ilegalidade do procedimento inspectivo e, em consequência, a ilegalidade das liquidações baseadas nele, que devem ser anuladas.
78) O Tribunal a quo deu como provado [Facto 35 do probatório] que o procedimento inspectivo teve início a 19.06.2012, com a notificação das ordens de serviço, e conclusão em 27.12.2012, com a notificação do relatório inspectivo.
79) Porém, o inspector que subscreveu o referido relatório [Cfr Doc nº 7 anexo à PI] afirma a fls 5, que a acção inspectiva se baseou nas ordens de serviço nºs (...) emitidas a 24.05.2012, teve início a 24.06.2009 e conclusão a 09.11.2012.
80) O que vale por dizer que o referido inspector teve de dar início ao procedimento de inspecção ainda antes da emissão das ordens de serviço, o que torna ilegais os actos inspectivos levados a cabo antes da emissão das ordens de serviço por falta de credenciação, em violação do artº 46.º do RCPITA.
81) Em todo o caso, formalmente, o procedimento inspectivo terá sido iniciado em 19.06.2012, data da assinatura das ordens de serviço, embora os actos inspectivos estivessem em curso desde 24.06.2009, facto que, a prevalecer, implica a ilegalidade da auditoria efectuada pelo Núcleo de Informática Forense da AT, por falta de credenciação, em violação do disposto no artº 46.ºdo RCPITA.
82) Com efeito, consta do controvertido relatório inspectivo que essa auditoria ocorreu a 29.03.2012, em data anterior à emissão das ordens de serviço que, como se viu, ocorreu a 24.05.2012.
83) Ou seja, tal auditoria decorreu fora de um procedimento inspectivo, o que contraria o disposto no artº 28.º, nº 2 - alínea c) e artº 29.º, nº 1 – alínea a) do RCPITA conjugados com os artºs 1º e 2.º, nº 2 – alínea g) do mesmo diploma legal, que permitem a realização daquele tipo de diligência, mas no âmbito de um procedimento de inspecção formalmente instaurado com observâncias das regras estabelecidas no citado RCPITA.
84) De duas, uma:
Ou se considera que o procedimento de inspecção decorreu entre as datas indicadas no relatório inspectivo, excedendo o prazo legal de 6 meses sem qualquer prorrogação, nos termos do artº 36.º, nºs 2 e 3 do RCPITA, violando, ainda, o princípio da proporcionalidade ínsito no artº 7.º do mesmo diploma legal.
Ou se considera que o procedimento de inspecção decorreu nas datas eleitas pelo Tribunal a quo, e, nesse caso, a auditoria efectuada pelo Núcleo de Auditoria Forense da AT foi levada a cabo antes de emitidas as ordens de serviço, portanto, sem credenciação, em violação do disposto no artº 46.º do RCPITA.
85) Deste modo, e em face dos argumentos adiantados, deve ser dado como provado que o procedimento de inspecção excedeu o prazo legal de conclusão, ou, em alternativa, que a auditoria realizada pelo Núcleo de Auditoria Forense da AT é ilegal por falta de credenciação.
86) Daqui resultando a ilegalidade do procedimento inspectivo e, em consequência, a ilegalidade das liquidações nele baseadas, que devem ser anuladas.
87) O Tribunal a quo deu como não provados os seguintes factos:
O vertido no ponto 49.º da PI
O vertido no ponto 54.º da PI
O vertido nos pontos 55.º e 56.º da PI
88) No que respeita ao facto articulado ponto 49.º da PI, é evidente o erro de julgamento.
89) Com efeito, dando-se como provado que o DVD que acompanhava o relatório inspectivo notificado à recorrente [cfr facto 20 do probatório] não possuía as características técnicas que permitissem aceder à informação contida no mesmo, em violação do disposto no artº 8.º, nº 1 e artº 62.º, nº 3 – alínea i), ambos do RCPITA, é lógico que a impugnante não pôde escrutinar os elementos utilizados na quantificação efectuada pela AT como foi alegado na PI.
90) Nem se diga que, face à impossibilidade de aceder ao conteúdo do referido DVD, a impugnante estava obrigada a pedir um novo DVD.
91) Com efeito, estando em causa, como parece ser o caso, uma incompatibilidade de software, entre as ferramentas informáticas utilizadas pela AT e os equipamentos da impugnante (para além de outros onde se tentou abrir o controvertido DVD – caso do escritório do advogado da impugnante, do escritório do contabilista e da empresa que presta acessoria informática à impugnante,) bem podia a impugnante pedir 500 DVD’s que o problema subsistiria.
92) Na realidade, este problema de incompatibilidade de software só poderia ser ultrapassado realizando novamente a auditoria utilizando outras ferramentas que fossem compatíveis com o software utilizado pela impugnante (solução para a qual a AT não estaria disponível, com certeza, arriscamos nós dizer) – cfr. depoimento da testemunha da impugnante, A., cujas declarações se transcrevem acima, tiradas do CD da gravação da prova – Faixa 1- 00:00:01 a 01:46:34: - depoimento prestado com conhecimento de causa, que não foi possível abrir o DVD que acompanhava o relatório inspectivo por incompatibilidade do software.
93) Além disso, estava em curso o prazo para a apresentação do pedido de revisão da matéria tributável que não permitia delongas na tentativa de abrir o dito DVD anexo ao relatório inspectivo, vendo-se obrigada a deduzir o pedido de revisão mesmo sem aceder ao conteúdo daquele DVD..
94) Por outro lado seria manifestamente injusto e sem suporte legal transferir para a impugnante o ónus de resolver um problema técnico gerado pela própria AT, composta por um corpo de funcionários altamente qualificados.
95) No que respeita aos factos articulados no ponto 54.º da PI, o erro de julgamento é notório.
96) Com efeito, nos pontos 49º a 67.º da PI a impugnante identifica seis erros de quantificação que constituíram fundamentos da impugnação, acima discriminados, bastando o reconhecimento de um deles para a que a errónea quantificação fosse julgada procedente.
97) Porém, o Tribunal a quo não reconheceu nenhum deles, baseando-se no depoimento do inspector tributário que depôs como testemunha da Fazenda Pública, considerado pelo tribunal como absolutamente credível, não obstante não gozar de qualquer credibilidade como ficou demonstrado acima.
98) Por outro lado, o Tribunal a quo negou à testemunha arrolada pela impugnante qualquer credibilidade sem, contudo, explicar as concretas razões que faziam desta testemunha alguém sem credibilidade.
99) Com efeito, o tribunal a quo limitou-se a dizer que o depoimento da testemunha, sem mais, não logrou convencer o Tribunal acerca do ali questionado, argumentação, salvo o devido respeito, demasiado genérica e simplista, nada fundamentando, servindo, aliás, para este processo ou qualquer outro.
100) É muito fácil dizer que a testemunha não convenceu o Tribunal se o Tribunal não quer ser convencido, visto que já chegou a um pré-juízo incompatível com o depoimento da testemunha que, por isso, é desvalorizado.
101) Em julgamento, os depoimentos das testemunhas valem na medida em que estas produzem declarações de ciência, ou seja, dizem aquilo que sabem, porque presenciaram ou viram, devendo essas declarações ser aceites a menos que o tribunal detecte contradições que levem a considerar os depoimentos como não verdadeiros, devendo essas contradições constar da motivação do tribunal.
102) Da leitura da douta sentença recorrida conclui-se que não foi isto que se passou no julgamento aqui sob censura – cfr. depoimento da testemunha da impugnante, A., cujas declarações se transcrevem acima, tiradas do CD da gravação da prova – Faixa 1- 00:00:01 a 01:46:34: - descrevendo com elevada segurança e certeza os factos que levam à conclusão de que a quantificação da matéria tributável levada a cabo pela AT está errada.
103) Deste modo, e em face dos argumentos adiantados, deve ser dado como provado o erro de quantificação da matéria tributável e, em consequência, ser declarada a ilegalidade das liquidações efectuadas com base nesse erro, que devem ser anuladas.
104) Nos itens 32 a 42 da PI a impugnante, ora recorrente, insurge-se contra o facto de a AT ter procedido ao apuramento do lucro tributável utilizando em simultâneo o método de avaliação directa – fazendo correcções meramente aritméticas, e o método de avaliação indirecta-fazendo correcções presumidas, somando os dois tipos de correcções para determinar o valor final.
105) A impugnante considera este procedimento ilegal porque gera duplicação de colecta.
106) Uma vez que a quantificação através da utilização do método indirecto abrange a totalidade da actividade do contribuinte, então o valor apurado através deste método já contém em si o valor das correcções apuradas através do método directo resultantes de irregularidades concretas detectadas pela AT, evidentemente, parciais/parcelares.
107) Se somarmos os dois tipos de correcções, iremos sobrepor essas correcções, porquanto, a correcção maior já comporta a correcção menor, sendo do conhecimento até empírico, que o todo comporta a parte. É uma questão matemática.
108) Daí que a impugnante invoque a duplicação de colecta, tal como vem definida no artº 205º do CPPT, já que o tributo incidente sobre o todo, apurado por métodos indirectos, volta a incidir sobre a parte, apurada por métodos directos, apura-se o mesmo tributo duas vezes sobre o mesmo facto tributário no mesmo período de tempo.
109) Por isso, o método indirecto de quantificação, quando utilizado, deve substituir o método directo, que não deve ser utilizado (por não permitir a quantificação directa e exacta da matéria tributável total) – cfr. SALDANHA SANCHES [cf. Manual de Direito Fiscal, 3ª ed, Coimbra Editora, 2007, p. 477].
110) Para este autor, com quem se concorda plenamente, trata-se da existência de dois métodos alternativos e não cumulativos.
111) O Tribunal a quo entende que a lei permite o uso simultâneo dos dois métodos de quantificação, entendendo a recorrente, salvo o devido respeito, que a lei não permite esse uso simultâneo, porquanto isso implica uma interpretação da lei assente numa contradição.
112) Com efeito, o que a lei diz é que sempre que a contabilidade não seja fiável a matéria tributável será apurada através dos métodos indirectos.
113) O que a AT faz, ao aplicar os dois métodos de quantificação em simultâneo, é considerar a contabilidade como verdadeira para as correcções técnicas e como não verdadeira para as correcções presumidas porque isso permite uma maior arrecadação de receita.
114) Com esse modo de operar a AT está a violar, com a concordância do Tribunal a quo, o princípio da não contradição, segundo o qual uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo.
115) A recorrente entende que o Tribunal a quo não está a interpretar correctamente os artigos 83.º, 85.º, 87.º e 88.º da LGT, incorrendo, por isso, em erro de julgamento.
116) Na realidade, a determinação da matéria tributável através do método directo afasta a utilização do método directo, não podendo ser utilizados os dois métodos em simultâneo, sob pena de se duplicar a colecta.
117) Acresce que, nos articulados 49.º a 67º da PI, a impugnante insurge-se contra o facto de a AT ter aplicado na quantificação da matéria tributável, agravando-a, uma taxa que designa por “taxa de evasão fiscal” que não existe na lei portuguesa.
118) A aplicação daquela taxa trata-se de uma invenção do inspector que subscreveu o relatório inspectivo, superiormente sancionada.
119) O Tribunal a quo não declarou ilegal uma tal taxa, violadora do princípio da legalidade ínsito no artº 103.º, nº 2 da Lei Fundamental, incorrendo, por isso, em erro de julgamento.
120) Violou a douta sentença recorrida, por errada interpretação e aplicação, nomeadamente, os artigos 16.º, nº 1, 83.º, 85.º, 87.º e 88.º da LGT, o artº 40.º, nº 1 do CPPT, os artigos 1.º, 2.º, nº 2- alínea g), 7.º, 8º,º 1, 54.º, nº 3 e 62.º, nº 3 – alínea i) do RCPITA e artº 103.º, nº 2 da CRP.
TERMOS EM QUE
deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida com qualquer dos fundamentos invocados pela recorrente e, consequentemente, a impugnação julgada procedente.»

*
A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do presente recurso (…)Começando pela falta de notificação ao mandatário.
Dúvidas não subsistem de que a recorrente constituiu mandatário e de que este não foi notificado dos termos do procedimento tributário a partir daí, como impõe o 40º do CPPT.
Porém, não se revela controverso que a AT cuidou de saber, face ao caráter genérico da procuração, qual o processo a que se destinava, notificando para o efeito, quer a recorrente, quer o mandatário, como decorre dos factos provados 28, 29, 30 e 31.
E, por outro lado, como bem salienta a sentença, a recorrente não deixou de exercer atempadamente os seus direitos, intervindo ativamente no procedimento de revisão que acionou e revelando posteriormente, ao apresentar a presente impugnação, um conhecimento esclarecido das razões e argumentos subjacentes às liquidações que ataca.
Estamos, assim, quando muito, reconduzidos à preterição de uma formalidade não essencial que se encontra suprida, revelando-se a propósito esclarecedor o ac. citado na sentença, que não merece, a meu ver, censura.

Avançando para a alegada violação do princípio do contraditório e do prazo do procedimento inspetivo, parece-me também que a sentença fez uma correta apreciação dos factos e sua subsunção ao direito.

Relativamente ao CD/DVD com a informação recolhida pelo Núcleo de Informática Forense da AT basta atentar no ponto 6 dos factos provados, que não vejo posto em causa, segundo o qual terá sido extraído, na presença da recorrente, informação para formatos editáveis e efetuados testes aos ficheiros recolhidos junto dos restaurantes, designadamente testes de consistência de eventuais registos apagados, “gaps” (falhas sequenciais) nos campos de incrementação sequencial referentes a numeração de documentos e repetição de documentos.
Acresce referir que o teor dessa informação ressalta, naturalmente, do extenso e pormenorizado relatório da ação inspetiva.

No que respeita ao prazo do procedimento começo por salientar que a indicação da data 24.6.2009 apontada no relatório como sendo a do início da inspeção se deve, certamente a lapso, pois que se revela contraditória com as demais datas.
Considerando, assim, assentes as datas indicadas nos pontos 18 e 19 como sendo as do início e desfecho da ação inspetiva e que, com bem se consigna na sentença, ainda que o prazo previsto no artº 36º, nº 2 do RCPIT tivesse sido ultrapassado por não ter havido prorrogação, tal facto apenas implica a cessação do efeito suspensivo da caducidade da liquidação, no caso não verificado por força de instauração de processo criminal nos termos do nº 5 do artº 45º da LGT, só resta concluir pela improcedência do alegado, também nesta parte.

Por fim, a errónea quantificação do lucro tributável.
De acordo com o artº 607º, nºs 4 e 5 do CPC, na sentença o Juiz consigna os factos provados e os não provados, fazendo uma análise crítica das provas, que aprecia livremente segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, excetuando-se aqueles para os quais a lei exige formalidade especial ou possam ser provados por documentos.
“O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação sub judice que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
No que respeita à disciplina da impugnação da decisão da 1ª instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe à recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida” – cfr. ac. do TCAS de 10.4.2004, proc. 07503/14 e artº 640º, nº 1 do CPC.

A recorrente dirige-se aos factos não provados dando ênfase, para pugnar, contrariamente ao decidido, pela comprovação dos factos ali elencados, que reportou nos artºs da petição, sob o nº 54 (95% das refeições servidas nos restaurantes são do tipo económico, vendias por metade do valor contabilizado, promoção neste tipo de refeições publicitada no site, com oferta gratuita da 10ª), 55ºe 56º ( nº de processo a zero e processos em falta considerados pelo SIT representam um excesso de pelo menos 25% e que o valor médio dos processo maiores que zero é excessivo).
À parte a questão do acesso ao CD do Núcleo de Informática da AT, que acima se analisou, a recorrente limita-se a questionar as declarações da testemunha indicada pela RFP, dando em seu detrimento relevo às declarações da testemunha por si arrolada.
Ou seja, baseia-se essencialmente no depoimento de testemunha que, norteou em parte, a elaboração da matéria de facto não provada, pretendendo daí retirar ilações diversas das vertidas na sentença.
Ora o Tribunal de 2ª instância só pode/deve modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova produzidos, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a regra da livre apreciação da prova, um resultado diferente do Tribunal “a quo” que seja racionalmente sustentado – ac TCAS de 25.6.2019, proc. 2459/14.0BESNT.
Ora, atentando na “motivação da decisão de facto” e realçando que a controvérsia gira em torno da justificação da anulação de cerca de 269 000 registos do sistema de faturação durante o período inspetivo, afiguram-se-me acertadas as considerações detalhadas quanto ao depoimento da testemunha no sentido de concluir não se revelar convincente.

Resta-me concluir, de tudo o exposto, pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida na ordem jurídica.
*

Sem vistos dos Exmos. Juízes adjuntos, por assim se ter acordado, foi o processo à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR.

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações:

[A] Se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto quantos aos factos provados dos itens 22, 20 e 35, bem como aos factos dados como não provados relativos ao invocado nos artigos 54.º, 55.º, 56.º e 49.º da petição inicial, implicando assim, que se conclua pela falta de notificação do mandatário, violação do princípio do contraditório e violação do prazo do procedimento inspetivo.

[B] Saber se a sentença errou no seu juízo de confirmação das correções à matéria coletável por métodos indiretos, havendo excesso de quantificação e se a taxa de 32,78% aplicada está fundamentada.

*


3. FUNDAMENTOS de FACTO

Em sede de probatório a 1ª Instância, fixou os seguintes factos:

«1. A impugnante dedica-se, com intuito lucrativo, à restauração explorando dois estabelecimentos de Restaurante situados em V. do C., com a designação de M. 1 e M. 2, localizando-se um na Av.ª (…) e o outro na Av.ª (…) – Cf. fls. 57 do PA.
2. A impugnante está registada para o exercício da atividade de “Restaurante tipo tradicional” (CAE 056101), possui contabilidade organizada, em sede de IRC encontra-se enquadrada no regime geral de tributação e em sede de IVA encontra-se enquadrada no regime normal de periodicidade mensal – Cf. fls. 57 do PA.
3. Nas salas de refeições dos dois restaurantes/estabelecimentos da impugnante, encontravam-se em funcionamento, no período de 2008 até 2012, equipamentos de registo de operações de venda, tipo P.O.S. - Point Of Sale / Ponto de venda-, sendo utilizado o programa de facturação Winrest – Cf. fls. 57/58 do PA; Prova testemunhal.
4. A impugnante foi alvo de um procedimento inspectivo aos exercícios de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012 - Cf. fls. 03 do PA
5. A acção inspectiva atrás referida, foi efectuada com a assistência técnica prestada pelo Núcleo de Informática Forense da Autoridade Tributária e Aduaneira, com recurso a ferramentas de auditoria informática, tendo procedido à gravação de “bi a bit” dos dispositivos de armazenamento de dados existentes nos sistemas informáticos da impugnante – Cf. fls. 03 do PA; Prova testemunhal.
6. O Núcleo de Informática referido no ponto anterior, na presença da impugnante, extraiu a informação para formatos editáveis e nessa sequência foram efectuados testes aos ficheiros recolhidos junto dos Restaurantes da impugnante, designadamente testes de consistência de eventuais registos apagados, “Gaps” (falhas sequenciais) nos campos de incrementação sequencial referentes a numeração de documentos e repetição de documentos – Cf. fls. 03 do PA.
7. Na sequência dos testes referidos em 06), a inspecção Tributária verificou que existiam linhas de registos apagadas e “gaps” na numeração dos documentos – Cf. fls. 03 do PA; Prova testemunhal.
8. Em 29.03.2012, a inspecção tributaria procedeu à cópia dos movimentos de vendas/prestação de serviços constantes do suporte informático em uso pela impugnante nos estabelecimentos/Restaurantes, em DVD não regravável em dois exemplares, um para a inspecção e outro para a impugnante a quem entregou – Cf. fls. 36 do PA e fls. 73e 74 do processo físico, cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; Prova testemunhal.
9. A inspecção Tributária entregou à impugnante cópia dos ficheiros de dados informáticos produzidos pela aplicação Winrest relativo aos estabelecimentos, desde 2008, que servem de suporte aos valores de prestações de serviços efectuados e declarados quanto aos anos de 2008 a 2012 – Cf. fls. 44 do PA apenso cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; Cf. fls. 73/74 do processo físico; Prova testemunhal.
10. No âmbito da acção inspectiva, os Serviços de Inspecção Tributária (SIT) concluíram, na recolha dos ficheiros de dados produzidos pelo Winrest, apenas a directoria “export” continha ficheiros de dados – Cf. fls. 58 do PA.
11. Em 09.11.2012, no âmbito da acção inspectiva atrás referida, foi efectuado um Projecto de Relatório de Inspecção Tributária nos termos constantes de fls. 16/35 do PA cujo teor se tem por integralmente reproduzidas para os devidos efeitos legais.
12. A impugnante foi notificada para se pronunciar sobre o Projecto de Relatório referido em 11) e nada disse – Cf. Relatório Final da Inspecção Tributária (RIT).
13. Em 05.12.2012, os Serviços de Inspecção Tributária (SIT) elaboraram o Relatório Final de Inspecção Tributária (RIT) do qual resultaram correcções à matéria calcetável em sede de IVA e IRC dos exercícios de 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012, nomeadamente fixados através de métodos indirectos – Cf. fls. 53/87 do PA apenso, cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
14. As correcções à matéria colectável em sede de IRC, através de métodos indirectos, atrás referidas, foram as seguintes:
2008200920102011
€ 450.474,19€ 483.026,14€ 507.256,82€ 577.072,11
- Cf. fls. 55/56 do PA.
15. Consta do Relatório inspectivo referido em 13), quanto à análise dos dados recolhidos pelos SIT no sistema de facturação da impugnante, o seguinte:
(Documento na sentença original)
– Cf. RIT.
16. Foram as seguintes as razões que levaram os SIT a efectuar correcções e cálculos com base em métodos indirectos:
(Documento na sentença original)

– Cf. RIT
17. Desde 01.01.2008 até Março de 2012 a impugnante anulou/apagou, no sistema de facturação, mais de duas centenas de milhar de linhas/registos de pedidos efetuados e prestados aos clientes – Facto não controvertido.
18. As ordens de serviço para o procedimento inspectivo atrás referido foram assinadas em 19.06.2012 pelo gerente de loja, R. – Cf. fls. 6/7 do PA.
19. Através de ofício 0099523 de 14.12.2012, a AT comunicou à impugnante o teor do Relatório Inspectivo atrás referido, que o recebeu em 27.12.2019 – Cf. Doc. 07 junto com a PI e fls. 46/48 do PA.
20. Com a comunicação do RIT foi remetido à impugnante um DVD com toda a informação tida em consideração pelo inspetor e recolhida do sistema informático pelo Núcleo de Técnicos referido em 05) e 06), contendo toda a informação por eles recolhida e gravada e a que se alude em 06) – Cf. RIT e prova testemunhal.
21. A impugnante reclamou em janeiro de 2013 da fixação de valores por métodos indirectos, à luz do artigo 91º da LGT, nos termos constantes do Doc. 8 junto com a PI cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
22. Em 14.01.2013 a impugnante apresentou na Direcção de Finanças de Viana do Castelo uma procuração forense a favor do Advogado A., tendo esclarecido em 28.01.2013 que a mesma se destinava ao processo fiscal da M., LDA – Cf. fls. 121/122 do PA e doc. 10 junto com a PI.
23. Em 12.02.2013, na sequência da junção da procuração referida no ponto anterior foi prestada informação pela AT nos termos constantes de fls. 127/128 do PA cujo teor se tem por reproduzido para os devidos efeitos legais a suspender a recepção da procuração até se determinar para que processos se destina.
24. Em 18.02.2013, sobre a informação referida no ponto anterior foi elaborado o despacho de concordância – Cf. fls. 126 do PA.
25. Em 18.02.2013 e em 25.02.2013, reuniram na Direcção de Finanças de V. do C. os peritos da Administração Tributária e da impugnante para apreciar o pedido de revisão da matéria coletável acima referido, não tendo obtido acordo, tendo sido elaborada a acta nº 3/2013 daquela reunião – Cf. fls. 107/112 do PA.
26. Em 25.02.2013 o perito da impugnante declarou, entre o mais, que:
“(...)
Apesar da inexistência de ficheiros informáticos no restaurante M., e não de registos contabilísticos, anteriores a 19 de Agosto de 2011, pelas razões explicadas pessoalmente, pelo SP à inspecção tributária, todos os motivos constam e foram registados em tempo pela contabilidade do SP;
IV
Ignorando os dados contabilísticos disponíveis, optou a inspecção tributária pela aplicação de cálculos aritméticos, com base em pressupostos que não correspondem aos movimentos efectivos da empresa, dispensando-se de procurar a aproximação e análise da realidade económica em que o sujeito passivo se insere.
V
A explicação dos procedimentos a “zero” e os movimentos do dia 21 de Agosto de 2011, evidenciados no relatório da Inspecção Tributária, não foram considerados, insistindo-se no cálculo e aplicação aritmética para obtenção de resultados e respectivas correcções.
VI
A aplicação prática deste método pela inspecção tributária, para encontrar bases tributáveis, resulta em números, movimentação de pessoas e refeições absolutamente irrealista, para os locais e restaurantes em referência. Estamos em presença de unidades em que o volume de negócios assenta numa percentagem muito elevada de refeições económicas (diárias), cujo baixo valor, por razões óbvias, não sofre qualquer alteração desde o ano 2007.
Em conclusão, e pelos motivos aduzidos, não foi possível o acordo em sede de comissão e procedimentos de revisão...” – Cf. Laudo junto a fls. 110 do processo físico.
27. Em 25.02.2013, no âmbito do procedimento de revisão, a Perita da Administração Tributária, declarou que:
“(...)
A Perita da Administração Tributária sobre a Quantificação da Obrigação Tributária e a Tributação pelo Lucro Real alega o seguinte:
A Administração Tributária deve utilizar o método de avaliação indirecta sempre que se mostrem reunidos os pressupostos legalmente previstos para a sua aplicação, nomeadamente, a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, nos termos do artigo 87º alínea b) da Lei geral Tributária – LGT -, inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração (...) ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal (...), artº 88º alínea a) do mesmo diploma legal, sendo que, a avaliação indireta é subsidiária da avaliação directa – artº 85º nº 1 do mesmo diploma.
No caso de fixação do lucro tributável por métodos indiretos, compete à Administração Tributária demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos e, feita essa prova, recai sobre a empresa o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação, nos termos do disposto no artigo 74º nº 3 da LGT. Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes ...
A presunção anteriormente referida não se verifica quando:
- As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;
- O Contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações;
Neste caso, porque em relação à quantificação com recurso a métodos indirectos, pela sua própria natureza, não se pode exigir a mesma precisão que na quantificação feita com base na declaração da empresa, não basta a esta criar uma dúvida razoável, antes se lhe exigindo a prova de que os elementos de que se serviu a AT ou o método que utilizou são errados.
Ao exigir o suporte documental e o registo contabilístico das operações, o legislador está no fundo a controlar o cumprimento de obrigações fiscais, que decorrem, nomeadamente, dos artigos 17º e 123º do CIRC... e dos princípios constitucionais que impõem que a tributação das empresas incida sobre o rendimento real e efetivo, o qual será apurado de acordo com a declaração do sujeito passivo, observados que sejam, entre outras, as regras relativas à documentação dos gastos e ganhos.
Como diz Saldanha Sanches (...) E permitindo desta forma, registar todas as relações patrimoniais em que participa a empresa”.
Dúvidas não restam que a empresa não cumpriu com o anteriormente descrito, nomeadamente, com o integral registo contabilístico inerente às receitas da atividade de restauração.
No caso em análise, a tributação por métodos diretos não foi possível, face à insuficiência de elementos da contabilidade, e irregularidade na sua organização/execução, originando, a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável.
Pelo exposto, o recurso à aplicação de Métodos indiretos é inquestionável, por razões de facto e de direito, nos termos da alínea b) do referido artº 87º da LGT.
A perita da Administração Tributária, por sua vez, dá a sua concordância com o teor do Relatório de Inspecção Tributária e reitera a necessidade do recurso à utilização de métodos indiretos e isto porque, segundo conclui, há carência de elementos que permitam efetuar a tributação direta e objetiva, nomeadamente a saber:
Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável do imposto;
Depois de a Perita da Administração Tributária ter exposto os fundamentos – pressupostos teóricos da aplicação dos métodos indiretos, passou a demonstrá-los na prática, conforme se transcreve:
(...)
A Perita da Administração Tributária debateu, com o Perito do contribuinte, os pontos vertidos no pedido de revisão apresentado pela empresa, conforme passa a descrever (em síntese):
Analisada a pretensão do perito do contribuinte relativamente à percentagem de processos a zero e de processos em falta, mostra-se relevante o seguinte:
Não foi realizada qualquer demonstração da percentagem de 25% solicitada;
Ainda que fosse aceite tal pretensão, apenas seria de a considerar relativamente aos processos a zero, em virtude dos motivos invocados no ponto 9 do pedido de revisão pressuporem o normal funcionamento do sistema informático;
Consequentemente, e porque o apagamento de processos dos ficheiros informáticos em causa é originado por funcionamento diverso do normal, conforme demonstrado no relatório da inspecção, os processos em falta jamais poderão ser considerados “normais”.
No que ao cálculo do valor médio da refeição diz respeito, salienta-se o facto dos montantes determinados pelo IT – Inspetor Tributário, terem exclusivamente por base os processos registados no sistema informático da empresa com valor positivo, encontrando-se a média dos valores influenciado pelos diferentes preços unitários (por talão).
Quer-se com isto dizer que não acolhe o princípio invocado pelo perito do contribuinte de que 95% dos processos são originados por refeições económicas ao preço de € 6,00, porquanto não demonstrou este facto, bem como desprezou por completo a composição da amostra.
No decurso do debate, a Perita demonstrou o cálculo da referida taxa de evasão fiscal, no montante de 32,78%, taxa esta construída com base nos valores declarados pela empresa e estimados pela Administração Tributária, no período de Setembro a Dezembro de 2011 (taxa média dos quatro meses). A referida taxa serviu de base para calcular os valores de Processos a zero e Processos em falta relativos ao período de Janeiro de 2008 a Agosto de 2011, inerentes ao restaurante da Amorosa, em virtude da empresa não ter apresentado os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest, muito embora tenha sido notificada para tal.
O perito da empresa também referiu o facto e demonstrou com cálculos, que pelo valor determinado pelo inspetor tributário daria um valor absurdo de refeições em ambos os restaurantes.
A Perita da Administração Tributária contra argumentou e demonstrou, também, que pela capacidade das salas de refeição e o valor atribuído por refeição, as mesmas não encheriam mais que uma vez. Assim, demonstrou que os valores estimados pela AT não estariam tão exagerados como a empresa refere.
O Perito do Contribuinte reitere que os processos a zero “linhas apagadas”, têm por base, clientes que fogem sem pagar ou mudanças de mesa ou pedido, originando, assim, a anulação de linhas.
A Perita da AT reforçou o facto de tal ter sido previsto e tido em conta na formulação dos cálculos efetuados pelo Inspetor Tributário, sem o qual, o valor estimado seria muito maior.
III – TENTATIVA DE REALIZAÇÃO DE ACORDO
No decurso do diálogo entre os peritos foi ventilado o tema dos gastos, ou seja, o inspetor Tributário presumiu prestações de serviços, que serviram de base ao cálculo do IVA presumido, não tendo efetuado o mesmo raciocínio em relação aos gastos, nomeadamente, aquisição de matérias primas e mercadorias, originado, assim, uma margem bruta muito superior à da unidade orgânica de V. do C., e mesmo nacional.
Assim, a Perita da AT argumentou que quanto à temática dos gastos teria fundamentos para alterar o lucro presumido, mas tal não teria influência no IVA presumido.
O perito do Contribuinte alegou que não teria vantagem em tal acordo, em virtude de tal ter como consequência admitir a “fuga”, situação que em fase posterior quer provar que não existiu.
IV-IMPOSSIBILIDADE DE ACORDO
Perante os factos, os peritos foram unânimes em concordar que não existia possibilidade de efetuar qualquer acordo.
Face ao exposto, a Perita da Administração Tributária, não está na posse de condições que lhe permitam alterar, no que quer que seja, os montantes das fixações concretizadas, decorrentes do relatório da Inspecção Tributária inerente ao ato inspetivo que a empresa foi objeto e controvertidas no pedido de revisão” - Cf. fls. 111/118 do processo físico.
28. Através de ofício de 28.02.2013, a Direcção de Finanças de V. do C., sob assunto “INSCRIÇÃO OFICIOSA DE REPRESENTANTE”, comunicou ao Chefe de Finanças de Viana do Castelo a junção da procuração referida supra e suspensão de procedimento Cf. fls. 129 do PA.
29. Em 20.03.2013, através de ofícios do Serviço de V. do C., sob assunto: “INSCRIÇÃO OFICIOSA DE REPRESENTANTE”, foi comunicado à impugnante e ao Advogado A., a suspensão da junção da procuração no cadastro da impugnante até ser proferido parecer da DSJT Cf. fls 130 e 131 do PA cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais e fls. 132/137 do PA.
30. A impugnante recebeu o ofício referido no ponto anterior em 26.03.2013 Cf. fls. 134 do PA.
31. O Advogado atrás identificado recebeu o ofício referido em 29) em 21.03.2013 Cf. fls. 135/137do PA.
32. Em 09.04.2013 foi proferida decisão sobre a revisão da fixação da matéria Tributável, onde, entre o mais, se decidiu que:
“(...) considerando as posições dos peritos após a possibilidade de debate contraditório, considerando que pelo perito mandatado pelo contribuinte nenhuns meios de prova foram trazidos para a reunião contrariamente ao legalmente estatuído em matéria de ónus da prova, no sentido de demonstrar qual o ganho do seu representado, ou qual o imposto devido, embora pudesse e devesse fazê-lo, com elementos que, certamente, teria ao seu dispor, mostrando-se inviabilizada a tributação por métodos de avaliação direta, usando da prerrogativa que me é conferida pelo nº 6 do artº 92º da Lei Geral Tributária, decido não dar provimento à reclamação, mantendo todos os valores inicialmente fixados.” – Cf. fls. 116/120 do PA apenso cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
33. Através de ofício 002799 de 11.04.2013, a AT remeteu a impugnante o teor da decisão da reunião de peritos e decisão final sobre o pedido de revisão referida nos pontos anteriores – Cf. fls. 113/120 do PA.
34. Em Abril de 2013, na sequência da acção inspectiva atrás referidas foram emitidas as seguintes liquidações adicionais de IRC e juros, dos períodos de 2008, 2009 e 2010, no valor total de € 398.917,61, designadamente:
Liquidação de IRC, do período de 2008, com o nº 2013 8310001885, de 10.04.2013, no valor de € 126.745,96;
Liquidação de IRC, do período de 2009, com o nº 2013 8310002000, de 19.04.2013, no valor de € 137.224,41 e
Liquidação de IRC, do período de 2010, com o nº 2013 8310002007, de 19.04.2013, no valor de € 134.947,24 Cf. Docs nºs 2, 3, 4, 5 e 6 juntos com a PI cujo teor se tem por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais.
35. O procedimento de inspeção tributária teve início em 19.06.2012, com a assinatura das ordens de serviço, pelo gerente de loja, R., e conclusão, em 27.12.2012, com a notificação do relatório da inspeção tributária à impugnante Cf. fls. 06/07 e 46/48 do PA.
36. Em 07.12.2012 foi autuado o processo de inquérito por crime fiscal, falsificação, viciação e alteração de programas informáticos, com o nº 99/2012.7IDVCT, a correr termos Ministério Público - Procuradora da República V. C.- DIAP - 1.ª Secção, em que a sociedade impugnante é arguida Cf. fls. 138 do PA.
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FACTOS NÃO PROVADOS: Com interesse para a decisão a proferir não se provou o vertido no ponto 54º da PI, designadamente que: - 95% das refeições servidas nos Restaurantes explorados pela impugnante são do tipo económico ao preço de € 6,00; - que as refeições económicas são vendidas a metade do valor contabilizado; - que a impugnante possui uma promoção neste tipo de refeições económicas, publicitada no site da internet, oferecendo uma refeição gratuita ao fim de dez refeições pagas e que esta prática corresponde a 10% de anulação no sistema de facturação dos “processos a zero”.
Não se provou ainda o vertido no ponto 55º e 56º da PI, designadamente que o número de “processos a zero” e “processos em falta” considerados pelos SIT representam um excesso de pelo menos 25% e que o valor médio dos “processos maiores que zero” é excessivo.
Também não resultou provado o vertido no ponto 49º da PI, nomeadamente que a impugnante não pode escrutinar os elementos utilizados na quantificação efectuada pela AT.
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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO:
A decisão da matéria de facto provada efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e do Procedimento Administrativo (PA), consoante se anota em cada ponto do probatório, e bem assim da posição da impugnada e impugnante nos seus articulados.
Quanto ao ponto 17) dos factos provados, o Tribunal apoiou-se na posição da FP e impugnante ao longo do procedimento e dos autos.
Na verdade, na acção inspectiva foi apurado que foram apagados registos ou linhas do sistema de facturação, o que as partes não discordam, apesar de apresentarem justificações diferentes para tal facto.
A impugnante não questiona os registos anulados ou apagados/ a zero, tentando justificar tal ocorrência com clientes que fogem sem pagar, mudança dos clientes de mesa, troca nos pedidos, refeições oferecidas/gratuitas no uso de “cartões” (por cada dez refeições económicas uma era alegadamente oferecida), etc., assim tentando justificar os cerca de 269.000 registos anulados durante o período inspectivo que os SIT detetaram.
Para prova do vertido no ponto 20) dos factos provados, o Tribunal apoiou-se no RIT e bem assim no depoimento da testemunha arrolada pela FP, inspector Tributário que elaborou o RIT em causa, tendo explicado de modo claro, espontâneo e com conhecimento direto, o modo como elaborou o RIT e como fixou os valores encontrados e estimados através da contabilidade da impugnante e dos elementos em falta no registo eletrónico da facturação, constantes do CD/DVD recolhido pelos Técnicos a que se alude no ponto 05) e 06) da factualidade assente. Tendo, além disso, esclarecido que remeteu CD ao impugnante quer juntamente com o RIT quer aquando da elaboração do Projeto de Relatório, esclarecendo que o mesmo podia ser “lido” e consultado.
Relativamente aos pontos 03), 05), 06), 07) 08) e 09) dos factos provados, a par dos documentos referenciados em cada um daqueles pontos de facto assentes, foi igualmente esclarecedor o depoimentos das duas testemunhas ouvidas pelo Tribunal, nomeadamente a testemunha arrolada pela FP e a arrolada pela impugnante, corroborando o vertido nos documentos juntos aos autos, ali referenciados, esclarecendo que os técnicos da AT gravaram em CD/DVD a informação do sistema de facturação, na presença da impugnante, tendo entregue um DVD/CD à impugnante o qual, segundo esclareceu o TOC da impugnante, inicialmente teve dificuldade em abrir por não possuir equipamento informático compatível e que nunca requereu ou solicitou cópia do mesmo.
Quanto aos pontos alegados na PI que foram dados como não provados, resultam ora da prova em sentido inverso, ora da falta de prova sobre os mesmos, sendo que, o acervo documental existente aponta em sentido inverso.
De facto, relativamente a alguns pontos, foram os mesmos dados como provados, tendo como consequência a “resposta” de não provado relativamente ao vertido na PI.
Na verdade, apesar de ter sido arrolada uma testemunha pela impugnante, Dr. A., Técnico Oficial de Contas (TOC) da impugnante, relativamente à matéria que foi dada como não provada, o depoimento da testemunha, sem mais, não logrou convencer o Tribunal acerca do ali questionado.
Com efeito, pese embora a testemunha (única) indicada pela impugnante tivesse avançado ao Tribunal que discordava dos montantes encontrados e quantificados pela AT quanto às correções feitas à matéria tributável fixada, salientou, em concreto e sem qualquer outro tipo de prova que o corroborasse e especificasse, que, “as correcções eram anormais, a casa não conseguia aquela projecção”; e que era “impossível as correcções e estimativa, sendo incomportáveis com a capacidade da casa”, que “os valores (da AT) estavam inflacionados”, que se tratava de “rendimentos anormais para o fluxo que tem”, e que “ 95% da facturação vem de pratos económicos”; “ a taxa aplicada pela AT foi de 30 e tal por cento, segundo o CD não é possível face à realidade económica da empresa. Não são credíveis os valores”, etc.
Ora, este depoimento por si só não bastou para convencer o Tribunal do “excesso”, da razão do excesso e o quantum entendido por real ou ajustado, o fluxo de clientes efetivo nos horários de funcionamento e a justificação e demonstração de que 95% da faturação vem de “pratos económicos” sendo o valor dos mesmos cerca de € 6,00.
É verdade que a testemunha referiu, de modo geral e vago, que o Restaurante (…) tinha “picos” no Verão e que depois era residual.
Salientou ainda que o valor encontrado pela AT para as festas da Srª da Agonia “era anormal”, referindo que nesse dia foi acordado um valor fixo, que a fatura estava pré determinada e que respeitava a um batizado, o que não convenceu o Tribunal, desde logo porque não se nos afigura credível que no dia de maior movimentação naquela zona, como sucede nas festas da Srª da Agonia, correspondesse a um dia em que a casa faturasse cerca de € 300,00 apenas. Menos ainda quando, nesse mesmo dia, no sistema de faturação, os pedidos de refeição foram todos anulados, ficando com registos a “zero”.
Por outro lado, e no que tange ao facto de se encontrarem anuladas centenas de linhas (315) na facturação, a testemunha afirmou que não sabia esclarecer o que em concreto se passou, nem como foi prestado o(s) serviço(s).
Disse ainda a testemunha que 95% da faturação vem de pratos económicos a cerca de € 6,00 cada (e não os cerca de € 12,00 encontrados pelos SIT para cada um dos Restaurantes), o que, pese embora esta afirmação, ficou a mesma por demonstrar e de ser corroborada.
Aliás, tratando-se de dois Restaurantes com horário de funcionamento durante todo o dia, almoço e jantar, não existem à noite refeições (nem ao fim de semana) e/ou pratos económicos, donde, os 95% alegados pela impugnante sejam irreais atento o funcionamento dos dois restaurantes com refeições ao jantar e almoço quando apenas no almoço existem pratos económicos. Mesmo considerando que metade das refeições são servidas na hora do almoço e a outra metade na hora do jantar, nunca os 95% poderiam justificar uma plausível percentagem de refeições económicas, e o mesmo sucederia se o(s) Restaurante (s) não estivessem abertos na hora de jantar.
Por outro lado, como adiante se verá, menos plausível será, à luz da experiência comum, que dois restaurantes servissem 95% de refeições económicas que eram vendidas a metade do seu custo.
De resto, a testemunha também esclareceu que existiam pratos sem ser económicos (pedidos “à carta”), com outro tipo de preços, mas sem “clientela em profundidade”, não sendo quantificável ou esclarecida esta alegada profundidade.
Disse ainda a testemunha, tal como referido na PI, que as refeições económicas eram contabilizadas a um valor superior aquele que o restaurante adquire na cobrança efectiva e que “sai ao dobro daquilo que leva”, o que nos afigura inverosímil à luz da experiencia de vida, como avançamos já, na medida em que não é razoável que um qualquer Restaurante que afirma que vive essencialmente de refeições económicas (95% segundo refere), as mesmas custem o dobro do valor a que são vendidas. Ora, os Restaurantes, assim como qualquer negócio com escopo lucrativo, estão no mercado com finalidades lucrativas e não para manter prejuízos ou fazer caridade, designadamente “vendendo a menos daquilo que custa”, de modo a justificar a razão pela qual o valor contabilizado dos pratos/refeições estão pelo dobro. Esta vaga explicação, não logrou, com efeito, esclarecer e convencer o Tribunal.
No que tange ao preço das refeições, que entende a impugnante e na opinião da testemunha rondar os € 6,00 e não os cerca de € 12,00 encontrados pela AT, além de nenhuma prova ter sido trazida quanto a este valor de € 6,00 (designadamente clientes a corroborar aquele pagamento e justificativos/facturas/recibos daqueles eventuais pagamentos, etc) e/ou excesso quanto aos €12,00 atento o giro do restaurante, o certo é que, basta aceder à pagina, site, da impugnante para perceber que o valor das refeições se situa entre os 15 e € 40 (Disponível em: https://www.tripadvisor.pt/Restaurant_Review-g189185-d6624067-Reviews-Restaurante_(...).html.).
Ademais, do mesmo sítio da internet se evidencia que não se trata de um Restaurante económico que serve essencialmente pratos económicos, estando publicitada a referência a mariscos, pratos de peixe fresco, cozinha internacional, etc.
Por outro lado, ainda, a instância da FP, quando solicitado ao TOC para esclarecer em que dados se apoiou para chegar aos 95% de refeições económicas e ao valor de cerca de € 6,00 por cada uma o mesmo bastou-se em afirmar, sem concretizar, esclarecer nem se apoiar em qualquer dado objectivo e/ou documental, que se apoiava “na frequência e estatística das casas”, sem saber responder à questão colocada pela FP quanto ao facto de os dados da contabilidade espelharem um valor médio de €12,00 e para explicar onde encontra os € 6,00.
O Tribunal também não se convenceu com o depoimento do TOC, única testemunha trazida, que a impugnante possui uma promoção nas refeições económicas, publicitada no site da internet, oferecendo uma refeição gratuita ao fim de dez refeições pagas e que esta prática corresponde a 10% de anulação no sistema de facturação dos “processos a zero”.
De facto, consoante avançamos, não se convenceu primeiramente o Tribunal que a maioria das refeições servidas no Restaurante era tipo “económico”, menos ainda que o eram em cerca de 95%. Na linha de raciocínio por nós traçada, não faz sentido que as refeições económicas, alegadamente contabilizadas pelo dobro, (ainda) fosse oferecida uma em cada dez. Além disso, não foi trazida prova dessa promoção nem tão pouco um qualquer cliente que explicasse esse modus operandi. Por assim ser, também não ficou o Tribunal convencido que esta prática promocional (que não ficou provada) explique os alegados 10% de anulações no sistema de facturação dos “processos a zero”.
O depoimento isolado da testemunha indicada pela impugnante não convenceu, ainda, o Tribunal que o número de “processos a zero” e “processos em falta” considerados pelos SIT representem um excesso apesar de repetidas vezes referir que para o giro das casas eram valores excessivos. Por outro lado, e por maioria de razão, não ficou o Tribunal convencido e menos ainda esclarecido de que, esse referido excesso represente pelo menos 25%, e que o valor médio dos “processo maiores que zero” é excessivo, quando a estas percentagens ninguém se referiu assim como ninguém logrou esclarecer o Tribunal de modo concreto, consubstanciado e objetivamente esclarecedor.
Por fim, no que tange à falta de prova da factualidade vertida no ponto 49 da PI assinalado, decorre do facto do Tribunal se ter convencido do contrário. Ou seja, que foi fornecido um CD/DVD à impugnante pelo Núcleo de Apoio que recolheu a informação do sistema de facturação a que se alude no probatório, que ficou disponível à impugnante, sendo certo que, ainda que eventualmente houvesse inicialmente dificuldade em abrir o CD de forma a ser lida a informação ali colocada, seja porque o computador do TOC era incompatível quer porque não pediu uma nova cópia à AT, tal circunstância não poderia ser assacada à AT quando afirma que não tinha como escrutinar a informação recolhida ao sistema informático. Além disso, como resulta do ponto 19) dos factos provados, com o RIT foi enviado à impugnante um DVD com a informação que era de leitura acessível, CD/DVD esse remetido pelo inspetor que elaborou o RIT e o enviou (CD) juntamente com o RIT conforme o afirmou de modo credível e seguro ao Tribunal
Ora, foi análise de toda a prova assim enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, sedimentou a convicção do Tribunal quanto aos factos dados como Provados e Não Provados Cf. art. 74º LGT, 76º nº 1 LGT e art. 362º e ss do CC.»
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4. Apreciação jurídica do recurso.

Antes de entrar na análise do recurso da matéria de facto, importa tomar posição sobre o que a Recorrente se insurge na sentença, por no seu entender, não ter respeitado a ordem dos vícios alegados pela impugnante na p.i., na medida em que estava implícita nessa ordem, uma relação de subsidiariedade, deveria o tribunal a quo ter conhecido os vícios de acordo com a ordem indicada como decorre do art. 124.º, n.º2, al. b) do CPPT.

Todavia, a Recorrente não tem, naturalmente, razão.

Na verdade, o art. 101.º do CPPT permite que o impugnante estabeleça, segundo a ordem que indica e expressamente o requer, uma relação de subsidiariedade entre os vícios imputados ao ato.
Todavia, a possibilidade de o impugnante determinar a ordem de conhecimento dos vícios não é total na medida em que, por um lado, a lei determina que o faça expressamente, e, por outro, estes vícios só terão relevo no âmbito do grupo dos vícios que importem a anulabilidade do ato, mas a vontade do impugnante só é atendível se e na medida em que o claramente o expressar.

A norma do art. 124.º tem como pressuposto, também, no 2.º grupo dos vícios que determinem a anulabilidade do ato, que eles conduzam à mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, querendo isto dizer que o vício que se conheça conduza à eliminação jurídica do ato impugnado e que impeça definitivamente a renovação do ato.

Ora, não tendo a impugnante requerido ao tribunal que conhecesse segundo a ordem pela qual os invocava, impõe-se ao tribunal conhecer segundo a ordem que dá melhor e mais estável eficácia da tutela do ofendido, tendo em conta aquele critério de não haver possibilidade já de renovação do ato.
Neste sentido CPPT anotado do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Vol. II, página 342, 6.ª Edição, Áreas Editora.

Ora, é esta a orientação jurisprudencial unânime e uniforme
Ac. do STA de 18-05-2016, no recurso 0100/16; Ac. do STA de 17-06-2015 no recurso 0395/15; Ac. do STA de 8-10-2014, no recurso 0114/11 e Ac. do STA de 06-07-2011 no recurso 0355/11, todos disponíveis em www.dgsi.pt

No segundo grupo, a indicada pelo impugnante sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.»
Assim, a apreciação dos vícios que conduzam à anulação do acto impugnado é feita, portanto, segundo a ordem indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade ou, na sua falta, pela ordem que determine, segundo o prudente arbítrio do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
E a melhor interpretação da norma constante deste normativo (nº 2 do art. 124º do CPPT) aponta no sentido de que a regra de que o reconhecimento de um vício prejudica o conhecimento dos restantes só se pode justificar quando o reconhecimento da existência de um deles impeça definitivamente a renovação do acto, pois, se esta for possível em face do vício reconhecido, será necessário apreciar os restantes, uma vez que o conhecimento destes poderá levar à anulação com base num vício que impeça tal renovação. Na verdade, como refere o Cons. Jorge de Sousa [(1) Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, vol. II, 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, anotações 17 a 19 ao art. 124º, pp. 340 a 342] o entendimento de que o reconhecimento da existência de um vício leva a considerar prejudicado o conhecimento dos restantes «só se pode justificar quando o reconhecimento da existência de um vício impeça definitivamente a renovação do acto, pois, se esta for possível em face do vício reconhecido, será necessário apreciar os restantes, uma vez que o conhecimento destes poderá levar à anulação com base num vício que impeça tal renovação.»
Ou seja, a orientação contida no nº 1 do próprio art. 124º do CPPT, apontando para o conhecimento prioritário dos vícios susceptíveis de determinar inexistência ou nulidade do acto impugnado e, só depois, dos vícios geradores de anulabilidade, e a ordem de conhecimento que lhe subjaz, porventura viabilizadora de dispensa de conhecimento de outros vícios, só pode justificar-se quando o conhecimento de um vício impeça definitivamente a renovação do acto, pois, se esta for possível em face do vício reconhecido, será necessário apreciar os restantes, uma vez que o conhecimento destes poderá levar à anulação com base num vício que impeça tal renovação.
E também a jurisprudência desta Secção do STA tem acentuado que deve conhecer-se em primeiro lugar dos vícios de violação de lei (stricto sensu), salvo nos casos em que não possa apreender-se o conteúdo do acto, nomeadamente no caso de falta de fundamentação - cfr., entre outros, os acs. desta Secção do STA, de 22/9/1994, proc. nº 32.702; de 7/2/1996, proc. nº 15.887; de 23/4/1997, proc. nº 35.367; de 22/3/2006, proc. nº 0916/04; de 24/1/2007, proc. nº 0939/06; de 18/9/2008, proc. nº 0437/2008; de 7/12/2010, proc. nº 0569/10; de 6/7/2011, proc. nº 355/2011; e de 7/9/2011, proc. nº 023/11.

4.1. Entre os fundamentos do recurso encontra-se o erro no julgamento de facto, pelo que há que dar primazia.

A recorrente impugna os seguintes itens da matéria de facto,
20, 22 e 35 dos factos provados, mantendo a ordem por que foram articulados, requerendo a reapreciação da prova gravada.

Os documentos nº 10 e 11 anexos à p.i. demonstram que a impugnante constituiu mandato tributário, com representação, ao abrigo do artº 5º do CPPT.
A referida procuração foi outorgada em 19.12.2012, foi apresentada na Direcção de Finanças de Viana do Castelo em 14.01.2013, com a menção expressa de que esta procuração se destinava ao processo individual da impugnante, tendo em 28.01.2013 sido apresentado esclarecimento a confirmar que a dita procuração se destinava ao processo individual da impugnante.

Deste modo discorda com a formulação dada ao item 22: “Em 14.01.2013 a impugnante apresentou na Direcção de Finanças de V. do C. uma procuração forense a favor do Advogado A., tendo esclarecido em 28.01.2013 que a mesma se destinava ao processo fiscal M., LDA”

Vejamos,
Os documentos 10 e 11 não permitem contrariar a redação dada pelo tribunal recorrido ao item 22, na medida em que em 14-01-2013 a recorrente requer a junção de procuração outorgada a advogado para ser junta aos autos de processo pessoal/fiscal, tratando-se como decorre do seu teor de uma procuração forense genérica para atos procedimentais e forenses. Por sua vez, o documento 11, de 28-01-2013, limita-se a excluir que a mesma seja para ser junta ao processo de inquérito Fiscal n.º 99/2012.7 IDVCT.

Ao contrário do que alega, o teor dos documentos não estabelece a conexão pretendida, ou seja, que a procuração visava de modo inequívoco representar o s.p., intervindo em qualquer ato de natureza tributária, nomeadamente, no procedimento de revisão.
Senão veja-se, a procuração deu entrada na D.F. de V. do C. quando o s.p. havia já sido notificado do relatório final de inspeção, razão pela qual, ao juntar procuração o mandatário e mandante ao abrigo do princípio da colaboração deveriam ter informado o que visava a mesma, intervir no respetivo procedimento de revisão, permitindo de forma inequívoca dar a finalidade pretendida. Todavia, remetem-se à ambiguidade para agora vir dizer que não foi notificado da decisão não obstante a existência de procuração forense.

A verdade é que se assim o pretendiam, não se entende a razão pela qual junta a procuração (14-1-2013) que, como diz, visava o procedimento de revisão, não assinou, também, o pedido de revisão de 28/1/2013, debelando quaisquer dúvidas que pudessem surgir com o destino da procuração.

Não foi este o caminho seguido, permanecendo com o seu esclarecimento de 28/1/2013 “de nada esclarecer”, fazendo menção genérica ao processo individual/Fiscal da mandante, mas que não se destinava ao Inquérito Fiscal n.º 99/2012.7 IDVCT.
Do que se vem de dizer, é claro que o facto 22 tem de permanecer inalterado, pois, nada há que aponte para que a procuração tivesse a finalidade única de ser junta ao procedimento de revisão, aonde se fez representar por perito por si indicado, o seu TOC.
Ademais, o Ex.mo mandatário e mandante foram notificados, em 28-03-2013 que a inscrição oficiosa no cadastro do representante legal da sociedade estava suspensa até melhor indagação e resposta da Direção dos Serviços de Justiça Tributária, sendo a notificação da decisão do pedido de revisão datada de 11-04-2013.

Ora, a Recorrente o que fez foi dizer que a procuração era para ser junta ao processo fiscal/individual da impugnante.
Não obstante o art. 135.º do CIRC estatuir que a AT organiza um registo dos sujeitos passivos de IRC, com base nas declarações para inscrição e outros elementos que disponha, registo este que será atualizado tendo em conta as alterações verificadas, o cancelamento da inscrição do registo far-se-á mediante declaração de cessação ou outros elementos que a ATA disponha, não se relaciona com o procedimento de revisão, pelo que, incumbia à impugnante esclarecer o destino que pretendia dar à procuração forense, não resultando que uma procuração que se destine ao processo individual do sujeito passivo seja, ipso facto, uma representação para todos e quaisquer atos ou procedimentos fiscais.

Na verdade, como explícita o art. 5.º do CPPT, o mandato tem de observar as regras do mandato previstas na lei, tal como a representação. A Recorrente havia já indicado o seu representante no procedimento de revisão, razão pela qual se impunha que declarasse que a procuração visava aquele concreto procedimento, até porque não é obrigatória a constituição de advogado neste procedimento.

A nossa jurisprudência, nomeadamente do STA, tem vindo a decidir no sentido de que “a preterição de tal formalidade, (leia-se notificação do relatório a advogado constituído) não integra acto directamente lesivo, tendo havido apenas preterição de formalidade que se degradou em não essencial, ou seja, é de concluir que estamos perante uma mera irregularidade” Acórdãos do STA de 12-04-2012, no proc. 896/11, de 22-01-2020 no proc. 0915/16 r o do Pleno de 24-02-2021, no recurso 087/16.
Aliás, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do ato a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las.
Cfr. Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 441/13, disponível em www.dgsi.pt

Por outro lado, ainda em matéria de impugnação do julgamento de facto vem dizer que: o tribunal recorrido deu total credibilidade à testemunha da FP (inspetor que elaborou o relatório) que a não ser inábil para depor sempre teria que ser desprovida de qualquer credibilidade; do mesmo modo, nega em aceitar as declarações de ciência da testemunha arrolada pela recorrente. O tribunal não pode dar como assente que o DVD continha toda a informação recolhida pelos técnicos do Núcleo de Informática, pois não se mostra provado que o tribunal acedeu ao conteúdo do DVD, embora o pudesse fazer por estar junto ao processo. Na diligência de recolha de tais dados não foi avisada para o efeito e sem lhe dar a possibilidade de se fazer representar com perito especializado para o efeito, a diligência foi feita na presença da impugnante mas sem explicar que tipo de diligência ia ser feita, embora presente, sem perceber o que estava a ser feito, não podendo, assim, escrutinar o trabalho da AT, impedida de exercer o contraditório.

Para o efeito, aponta o depoimento da testemunha A., faixa 1 da gravação minutos 00:00:01 a 01:46:34

Para que se conclua que, “a impugnante foi impedida de se fazer representar por um perito especializado nas diligências da auditoria realizada pelo Núcleo de Informática Forense da AT (…)”

Devendo ainda dar como provado que: “o DVD que a acompanhava o relatório inspetivo notificado à recorrente não possuía as características técnicas que permitissem aceder à informação contida no mesmo (…)”, impossibilitando a sua abertura, havia incompatibilidade de software.
Tal importa a conclusão da ilegalidade do procedimento.

Apreciando
A Recorrente defende, desde logo, que ocorreu errada valoração da prova apresentada, no que concerne à prova testemunhal, pois deu-se credibilidade a uma testemunha e não já a outra.
A discordância sobre a valoração da prova testemunhal produzida e sobre a convicção do julgador, sem precisar ou identificar o vício lógico em que se incorre não permite a alteração da matéria de facto.
A alteração da matéria de facto nos moldes pretendidos, pelo Tribunal de Recurso, só poderá ocorrer em situações de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado em 1ª instância.
No sentido do texto Ac. do TCASul no processo 07219/13 de 29/5/2014, disponível no site da dgsi.
Por outro lado, a sentença justifica, de forma objetiva e perfeitamente percetível, as razões que leva a atender o depoimento dessa testemunha (TOC) e as que determinaram a sua não valoração na parte respeitante à quantificação. Ou seja, percebe-se perfeitamente por que o seu depoimento não foi convincente, por um lado, não foi respaldado em dados objetivos e percetíveis, por outro lado, há situações que não sabe explicar com rigor e objetividade.

Por fim, refira-se o irrazoabilidade da crítica ao depoimento da testemunha da FP (inspetor) o qual acabaria por ser uma fundamentação à posteriori do ato de liquidação, na medida em tem interesse em defender o que escreveu e esclarecer dúvidas que o mesmo suscitam, reformulando no depoimento argumentos utilizados ou aditando outros.

Neste contexto, importa clarificar que o ato fundamentador da liquidação já não é o relatório da inspeção, mas, e, só o despacho da Diretora de Finanças, proferido no âmbito do procedimento de revisão, razão pela qual não faz qualquer sentido este argumento para descredibilizá-lo.
A liquidação impugnada assentou num ato emanado da comissão de revisão, mais propriamente, na decisão da Diretora de Finanças, na ata n. º03/2013
Neste sentido o acórdão deste tribunal de 7/12/2016 no processo n.º 1206/07.7 BEVIS, disponível em www.dgsi.pt e acórdãos da relatora nos processos n.ºs, 1693/04 de 02-03-2017, 2386/04 de 23-11-2017, não publicados.
por conseguinte é este o ato que que define e estabelece os limites da fundamentação da liquidação.


Na esteira da jurisprudência deste tribunal Acórdão deste tribunal, no qual a presente relatora foi adjunta, de 09-06-2016 no processo n.º 303/2001, ainda inédito. «A alteração da matéria de facto – ou a correcta fixação da matéria de facto como a Recorrente reclama – pressupõe o erro no seu julgamento. O que ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto (…)
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).

Por conseguinte, não cumprindo a recorrente o ónus de alegação, com falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e em que a recorrente se funda e a falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, a consequência será sempre a rejeição.

No que respeita ainda à impugnação de facto, importa clarificar que o recurso nesta matéria está elaborado de forma conclusiva e com juízos conclusivos, por outro lado, o depoimento da testemunha no que respeita ao seu teor, a sua não presença na diligência, bem como a delimitação do conteúdo do que disse, jamais permitiriam tirar as ilações pretendidas.

Acresce que o depoimento não infirma o que consta do processo e que consubstanciou no item 20 dos factos provados[Com a comunicação do RIT foi remetido à impugnante um DVD com toda a informação tida em consideração pelo inspector e recolhida do sistema informático pelo Núcleo de Técnicos referido em 05) e 06), contendo toda a informação por eles recolhida e gravada e a que se alude em 06)”]

Aliás, tal alteração mostrar-se-ia dissonante com ao auto de diligência de 29-03-2012 [fls. 74 do p.a.], na qual, na presença de F., responsável de sala, foi feita uma cópia dos movimentos de venda/prestação de serviços relativos à atividade exercida no local visado, elementos constantes do suporte informático ali em uso pelo sujeito passivo, em DVD não regravável em dois exemplares iguais, destinando-se um a posterior análise por estes serviços de inspeção tributária (dado uma análise exaustiva não ser possível no decorrer da presente ação) e o outro ao sujeito passivo como garante dos elementos assim obtidos pela IT, autenticados através de rubrica aposta por todos os intervenientes acima identificados.

Este auto jamais foi posto em causa pela impugnante, o qual, também, não é contrariado pelo que disse a testemunha da impugnante, esta nem é especialista informático, mas Técnico Oficial de Contas da Impugnante.

Por fim, a afirmação do item 20 “contendo toda a informação por eles recolhida e gravada e a que se alude em 06)”, não é contrariado pelo depoimento, quer o relatório quer os elementos anexos ao relatório inspetivo, apontam exatamente no sentido do item 20; aliás, em face da falta de registos no Restaurante (…), o sistema informático apenas continha armazenado os ficheiros posteriores a 19 de Agosto de 2011, razão pela qual a IT notificou a contribuinte por ofício de 19-06-2012 [fls. 44 do p.a.] para apresentar na DF de Viana os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest a partir de 1 de janeiro de 2008, e a impugnante nada fez.
Ademais, resulta do teor do relatório e seus anexos, a informação extraída do sistema informático da impugnante e inclusa no DVD, igualmente colocado ao dispor do sujeito passivo.
Também não há elementos factuais no processo dos quais se possam extrair factos que permitam concluir que a impugnante, aqui recorrente, foi impedida de se fazer representar por técnico especializado.
Supõe-se, que a impugnante não estaria convencida de que seria notificada previamente da diligência, tendo em conta, que ela é desencadeada por uma denúncia anónima e que, por isso, demandava, averiguar da veracidade da mesma, estando respaldada nos competentes despachos para o efeito.

Por outro lado, o depoimento da testemunha nada contraria que o DVD continha a informação recolhida e gravada, a não ser que a diligência fosse realizada com deficiência tal que no DVD não constasse a informação copiada, e aqui estaríamos perante uma deficiência técnica da Inspeção que lhe coartaria a capacidade de investigação e análise, em última instância seria prejudicial à AT e não ao sujeito passivo.
Por último, afirma ter tido a dificuldade no acesso ao conteúdo do DVD, ora, sempre estaria na sua disponibilidade fazer diligências junto da AT para ultrapassar os ditos constrangimentos no acesso à informação.

Ora, não consta que a recorrente tenha solicitado qualquer ajuda à AT para ultrapassar os constrangimentos que alegou e muito menos para elaborar o seu requerimento de revisão de fixação da matéria coletável o que permite concluir que a ele teve acesso.
Se o DVD não continha toda a informação recolhida e gravada porque não reclamou?
A testemunha disse que não conseguiu aceder ao DVD, do mesmo passo, confirma que não chegou a pedir ajuda a quem fez a aludida cópia. Por conseguinte, não acedeu porque nada fez por isso. Assim, mantém-se inalterado o facto que se pretendia dar outra formulação.

Deste modo, não se antolhe como foi violado o contraditório, tal como está previsto no art. 45.º da LGT, pois que a diligência não só foi feita na presença da impugnante como lhe foi facultado a respetiva cópia, para, assim, tomar conhecimento do seu conteúdo e contraditar se necessário na reclamação ou impugnação.

A recorrente está também em desacordo com o Item 35 do probatório: “O procedimento de inspecção tributária teve início em 19.06.2012, com a assinatura das ordens de serviço, pelo gerente da loja R., e conclusão em 27.12.2012, com a notificação do relatório da inspecção tributária à impugnante”.

Neste particular chama à colação, para pôr em causa este facto, o doc. n.º 7 anexo à PI, que a ação inspetiva se baseou nas ordens de serviço emitidas a 24-05-2012, teve inicio a 24-06-2009 e conclusão a 9-11-2012, o que significa que o inspetor iniciou o procedimento inspetivo antes ainda da emissão das ordens de serviço; mas a prevalecer o início da inspeção a 19-06-2012 a auditoria informática é ilegal por falta de credenciação.

Ora o documento n.º 7 é o ofício n.º 009523 para notificação do relatório de inspeção, com data de 14-12-2012, este concreto documento nada diz sobre ordens de serviço!
Por outro lado, como emerge dos autos [fls. 36 do p.a.] e o auto de diligência de 29-03-2012, baseou-se nos despachos n.º DI201200118 e DI201200119, emitidos em 12-03-2012, aliás como já acima se disse, diligência que teve por objetivo averiguar se a denúncia tinha algum fundamento, momento diferente e distinto do procedimento de inspeção.

Já o rosto do relatório faz alusão à ordem de serviço 0I201200217/8. No p.a. existem os documentos [fls. 2-13] como, propostas de inspeção, ordem de serviço externa aos exercícios de 2008 a 2012, com data de 22-05-2012, no qual está nomeado o Inspetor J. baseada na denúncia anónima que justifica os despachos para recolha de ficheiros informáticos utilizados pelo s.p., e início da inspeção, em 19-06-2012, data em que o gerente de loja apõe o seu nome [fls.6 e 7 do p.a.] nota de diligência do art. 61.º do RCPIT de 9-11-2012 [fls. 12 e 13 do p.a.] e termo da inspeção, com notificação do projeto de relatório [com registo de 16-11-2012 do p.a.], e a notificação do relatório inspetivo com registo e a/r assinado em 27-12-2012 [fls. 47 do p.a.]
Os elementos documentais constantes dos autos não justificam a alteração da matéria de facto tal como pretende a recorrente, pelo que improcede.

Por fim, corrobora-se o juízo da sentença na eventual ultrapassagem dos prazos do procedimento inspetivo, pois, tem sido uniforme o entendimento da jurisprudência, máxime, a do STA
Entre outros, Ac. de25-02-2015 no processo 070/14, disponível em www.dgsi.pt
, inobservância dos prazos legalmente definidos para a inspecção apenas relevam directamente em sede de caducidade da liquidação, não ofende os princípios constitucionais da legalidade, proporcionalidade e imparcialidade.


Prosseguindo com a impugnação do julgamento de facto discorda com os factos não provados, “[...] o vertido nos pontos 55.º e 56.º da PI, designadamente que o número de “processos a zero” e “processos em falta” considerados pelo SIT representam um excesso de pelo menos 25% e que o valor médio dos “processos maiores que zero” é excessivo.”
“[...] o vertido no ponto 49.º da PI, nomeadamente que a impugnante não pode escrutinar os elementos utilizados na quantificação efectuada pela AT”, do seguinte modo:
Do art. 49.º e 67.º da PI a impugnante identificou seis erros de quantificação, bastando o reconhecimento de um deles para proceder a errónea quantificação:
-Apuramento dos designados “processos a zero”, que representam 25% do excesso de quantificação;
-A quantificação dos “processos zero”, assentou nos valores médios por refeição, que estão errados;
- A quantificação dos designados “processos maiores que zero” é excessiva por não levar em consideração parte das refeições servidas no restaurante de Viana, que estima em 95% de pratos económicos cujo o preço ronda o €6;
-A quantificação dos designados “processos em falta” baseou-se nos valores médios por refeição baseou-se em valores de €12,29 e 12,59 quando deveria basear essa quantificação em valores médios indicados pela impugnante de €6,45 e 6,60;
-A aplicação da taxa de 32,78% a pretexto de uma alegada evasão fiscal, não tem suporte legal nem está fundamentada;
-A quantificação efetuada pela IT está desfasada do lucro real.
“[...] o vertido no ponto 54.º da PI, designadamente que: - 95% das refeições servidas nos Restaurantes explorados pela impugnante são do tipo económico ao preço de €6,00; - que as refeições económicas são vendidas a metade do valor contabilizado; - que a impugnante possui uma promoção neste tipo de refeições económicas, publicitada no site da internet oferecendo uma refeição gratuita ao fim de dez refeições pagas e que esta prática corresponde a 10% da anulação no sistema de facturação dos “processos a zero”.
Por apenas se ter baseado no depoimento do inspetor tributário, negando à testemunha arrolada pela impugnante qualquer credibilidade, sem dizer porquê, sendo uma argumentação genérica e simplista.

Para tanto salienta o depoimento da testemunha A., cujas as declarações estão gravadas no CD faixa 1-00:00:01 a 01:46:36.

Vejamos,
Os depoimentos prestados sempre terão de ter por base dados objetivos que emprestem credibilidade e plausibilidade ao que se diz.

Ora, do depoimento da testemunha o que resulta é a sua indignação com os valores alcançados pela IT, na sua ótica implicaria que os restaurantes tivessem uma rotatividade exponencial, fora da realidade, refere-se a uma projeção que fez com base nos dados de que partiu a administração fiscal e que, tendo por base, 6,00€ ou ainda 12,00€ por refeição, implicaria uma rotação média de pessoas muito menor.

Não explica a razão de se afetar o restaurante de V., nas Festas da Agonia, a um batizado, apenas esclarece, que a pessoa com qual foi feito o acordo era conhecida e pagou o serviço no restaurante da A..

Na verdade, pese embora a sua qualidade de Técnico Oficial de Contas não apresenta dados objetivos, através dos registos da contabilidade, do número de pessoas e refeições que comportam os estabelecimentos, qual o n.º médio de refeições servidas, os preços fixados no estabelecimento, o tipo de refeição relacionado com a rotação das mesas, enfim, factos objetivos que permitissem alocar aos factos provados o que invoca nos artigos 49.º a 56.º da p.i. Aliás nem a projeção que invoca ter feito aparece nos autos de forma a perceber-se o raciocínio que rebate as operações e os critérios erigidos pela inspeção.

O depoimento da testemunha vai muito ao encontro do articulado da reclamação para a comissão de revisão, o qual se esteia em afirmações algo genéricas e conclusivas, sem se respaldar em dados da atividade efetiva e real da impugnante.
Ora, não basta afirmar, como fez no seu depoimento, que os números dos processos a zero em falta, considerados pela inspeção não estão de acordo com a realidade, que o número de refeições servidas a que chegou a inspeção era irreal, tal como o valor médio de refeição.

Por conseguinte, jamais a realidade vertida nos artigos da p.i., identificados, poderiam constar do acervo factual provado na sentença.
Não há elementos no processo que apontem para que os restaurantes servissem refeições tipo económico com preço por refeição de €6,00, sendo 95% das refeições, eram servidas a metade do preço contabilizado; 10% das refeições a zero, eram refeições gratuitas.
Também aqui improcede o erro de julgamento de facto imputado à sentença.
*
4.2. Saber se a sentença errou no seu juízo de confirmação das correções à matéria coletável por métodos indiretos, havendo excesso de quantificação não estando fundamentada legalmente e de facto a taxa de 32,78% bem como ser ilegal aplicação, em simultâneo, dos dois métodos de determinação da matéria coletável (direto e indireto), levando à duplicação de coleta.

Na determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação [art. 74º, n. º3 da LGT]

Da fundamentação adotada pela AT resultam motivos pelos quais se considerou legalmente justificado o recurso ao método indireto verificando-se os pressupostos da aplicação da metodologia indireta na parte respeitante aos processos a zero em falta no período de janeiro de 2008 a agosto de 2011, diga-se, questão não controvertida, em virtude da empresa, não obstante, notificada para apresentar os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest naquele período não o ter feito.

Verificados os pressupostos da aplicação do método indireto, a Administração Fiscal terá que quantificar os rendimentos tributáveis através da sua aplicação em concreto. Corroborando o que vai exposto o Ac. do TCA Norte de 6/10/2005, no proc. 00314/04, disponível no site da dgsi.
Esta quantificação tem, forçosamente, que ser norteada pelo fim do apuramento do rendimento real, sob pena de desvio do poder.
Não se trata apenas de procurar obter uma aproximação ao rendimento real nem de sancionar o contribuinte, isto independentemente de ser ou não difícil atingir o fim legal da aplicação de métodos indiciários. Saldanha Sanches, Quantificação da Obrigação Tributária, Cadernos da CTF, 173, pág. 400


Neste particular discreteou a sentença que,(…) Na situação que nos cabe analisar, as correções efetuadas pela Inspeção Tributária resultaram da aplicação de métodos indiretos e da avaliação direta da matéria tributável, devido à prática de “viciação” do sistema informático, por parte do sujeito passivo, no que se refere aos ficheiros de dados do programa de facturação WinRest.
É certo, portanto, que os SIT lançaram mão em simultâneo de avaliação direta e indirecta, e bem, como adiante explicaremos, sem que tal configure a alegada duplicação de colecta. (…)A avaliação indirecta tem carácter excepcional (cfr. art. 81º n.º 1 da LGT) e é subsidiária em relação à avaliação directa (cfr. art. 85.º, n.º 1 da LGT), o que serve para evidenciar a preferência legal pela utilização dos métodos de avaliação directa, só sendo esta preterida e cedendo lugar à avaliação indirecta quando se demonstre, fundamentadamente, que não é possível a fixação através da avaliação directa. Nessa sequência, o artigo 57.º CIRC refere-se à determinação da matéria colectável por métodos indiciários, remetendo para os pressupostos desta forma de avaliação previstos nos artigos 87° a 89° da LGT.
Nos termos do disposto no artigo 123.º CIRC, a contabilidade do sujeito passivo deve encontrar-se organizada segundo os sãos princípios da lei comercial e fiscal, quer na perspectiva formal, quer na perspectiva material. Assim, e apesar de se presumirem verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei (bem como os dados e apuramento inscritos na sua contabilidade ou escrita), conforme decorre do artigo 75.º da LGT, essa presunção cessa se a AT demonstrar a falta de correspondência entre o teor de tais declarações, contabilidade e a realidade (cfr. artigo 75.º, n.º 2, da LGT).(…)nada impede que num mesmo procedimentos sejam utilizados os dois tipos de avaliação. Razão pela qual, na situação que nos cabe analisar, nenhuma censura merece a AT por lançar mão de métodos de avaliação directa (correcções técnicas) e avaliação indirecta, desde logo quando a avaliação directa não é possível. Assim, havendo situações em que é possível uma quantificação exata por existência de elementos, a mesma efectua-se directamente, por correcções meramente aritméticas sempre que possível e, na parte em que tal se mostre impossível, recorre-se à avaliação indirecta mercê de “ali” não ser possível corrigir (também) através de correcções aritméticas. Sendo possível, contrariamente ao defendido pela impugnante, num mesmo procedimento inspectivo cumular correcções meramente aritméticas (onde elas sejam possíveis) e avaliação indirecta (onde aquelas outras não são já possíveis), sem que haja duplicação de colecta como entende a impugnante e que mais adiante explicaremos.
A utilização simultânea da avaliação direta e indirecta, quando possível, torna-se, não só uma faculdade mas um poder/dever da AT na medida em implica, como in casu, uma maior proximidade à realidade a tributar pois só se avalia indirectamente aquilo que não foi possível fazer por via directa.
Excluindo estas situações, que os SIT destacaram e corrigiram directamente, os SIT concluíram pela impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à concreta determinação da matéria colectável de IRC (cuja fundamentação não vai posta em causa), atendendo às várias anomalias verificadas na contabilidade, a qual não fornece dados fiáveis e suficientes, tendo, assim fundamentado o recurso à aplicação de métodos indirectos, nos termos do já enunciado artigo 87.º nº 1 al. b) da LGT.
Na verdade, os SIT consideraram todos os registos a zero, sem dados na tabela de “Detalhe”, assim como os processos em falta, imputando o seu valor médio a cada período de imposto, conforme está demonstrado no Capítulo V do RIT, estabelecendo uma relação objectiva entre os factos apurados e a situação da impugnante.
Decorre, com efeito, do ponto V do RIT, quanto ao calculo/estimativa do valor médio em cada um dos Restaurantes M. 1 e M. 2, pelo método indirecto, o seguinte para Processos a zero sem dados na tabela de “Detalhe”:
“(...) 1.1.1 – Restaurante M. 1 (…)
Esta situação irregular foi quantificada com recurso ao “IDEA”, expurgando do universo da tabela “Cabeçalhos”, todos os registos (processos) a zero, daqui resultando dois ficheiros. Um com todos os registos com valor maior que zero “Cabeçalho valor maior 0 para media por talão”, outro com todos e só os registos com valor igual a zero “Cabeçalho a Zero sem detalhe”. Do primeiro “Cabeçalho valor maior 0” determinou-se o valor médio de todos os processos maiores que zero, que determinou 12,29€:
(...)
Quantificaram-se todos os processos a zero por períodos de imposto, imputando a cada um o valor médio e, desse cálculo, resultaram os seguintes montantes: (...)
1.1.2 – Restaurante M. 2 (…)
Esta situação irregular foi quantificada nos termos relatados no ponto 1.1.1 anterior, daqui resultando dois ficheiros. Um com todos os registos com valor maior que zero “Cabeçalho c_valor maior 0 _ Cálculo media talão para talões a zero sem detalhe”, outro com todos e só os registos com valor igual a zero “2_Cabeçalho a Zero sem detalhe”. Do primeiro “Cabeçalho c_valor maior 0” determinou-se o valor médio de todos os processos maiores que zero, que determinou 12,59€:
(...)
Quantificaram-se todos os processos a zero por períodos de imposto, imputando a cada um o valor médio e, desse cálculo, resultaram os seguintes montantes: (...)
(...)
1.2. - Inexistência de dados – Processos em falta
1.2.1) Restaurante M. 1 (…)
Conforme ficou referido no item 1.4.3.2, a), 1, do Cap. III, o número de processos em falta neste restaurante é de 7.572. A sua quantificação foi efetuada com recurso à média por talão referida
no ponto 1.1.1 anterior. Desta operação resultaram os seguintes quantitativos: (...)
1.2.2) Restaurante M. 2 (…)
Conforme ficou referido no item 1.4.3.2, a), 2, do Cap. III, o número de processos em falta neste restaurante é de 6.025. A sua quantificação foi efetuada com recurso à média por talão referida no ponto 2.1.2 anterior. Desta operação resultaram os seguintes quantitativos:
(...)
1.3 – Inexistência de dados – Informação em falta do restaurante da Amorosa, anterior a 19 de agosto de 2012
Conforme se referiu no item 1.4.1 do Cap. III, relativamente ao restaurante da Amorosa, o sistema informático, apenas possuía armazenados os ficheiros posteriores a 19 de agosto de 2011, tendo o sujeito passivo sido notificado aos 19 (dezanove) de junho de 2012, para que no prazo de 10 (dez) dias, apresentasse na DF de Viana do Castelo, os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest, a partir de 1 de janeiro de 2008, o que não cumpriu até à presente data.
Perante esta inexistência de informação, procedemos à sua quantificação nos seguintes termos:
Com base nos valores declarados para cada um dos restaurantes e dos valores calculados anteriormente por métodos indiretos, efetuamos uma avaliação dos valores evadidos mensalmente.
É possível verificar por este mapa a homogeneidade dos valores omitidos em cada um dos restaurantes. Atentos à mudança de taxa de imposto de IVA em Janeiro de 2012, optamos por trabalhar com a percentagem respeitante ao restaurante da Amorosa, onde faltam os ficheiros, e com as margens médias em 31 de Dezembro de 2011.
(...)
Perante estes elementos, aplicamos aos valores declarados pelo contribuinte, a percentagem de evasão cifrada em 32,78%, do que resultaram os seguintes tributos em falta.
(...)” - Cf. RIT a que alude o probatório.
Importa desde já notar que, relativamente à taxa de evasão fiscal encontrada pelos SIT, acima referida, no montante de 32,78%, foi também ela construída com base nos valores declarados pela impugnante e estimados pela Administração Tributária, no período de Setembro a Dezembro de 2011 (taxa média dos quatro meses).
A referida taxa serviu de base para calcular os valores de Processos a zero e Processos em falta relativos ao período de Janeiro de 2008 a Agosto de 2012, inerentes ao restaurante da Amorosa, em virtude da empresa não ter apresentado os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest, apesar de solicitados, como se vê do RIT (não esta sequer questionado que não existiam) e pela Perita da AT.
No que respeita à alegada errónea quantificação, defende a impugnante que os valores encontrados pelos SIT são excessivos, o que, adiante-se desde já, o probatório não evidencia.
Na alegação da impugnante, de modo a justificar o excesso de quantificação, refere que as “refeições económicas” eram vendidas a metade do valor contabilizado, aduzindo que possuía uma promoção neste tipo de refeições, oferecendo uma refeição gratuita ao fim de 10 refeições pagas, referindo que anula no seu sistema de faturação estas refeições gratuitas, o que significa um número de “processos a zero” de cerca de 10 % do total das refeições económicas; Nos meses de verão muitos clientes “fogem” sem pagar, o que obriga a impugnante a anular estas refeições, gerando, assim, mais “processos a zero”. Acrescenta ainda, na sua alegação que, com bastante frequência as encomendas à cozinha têm de ser anuladas por transferência para outra mesa ou porque o cliente alterou o seu pedido, o que provoca, mais uma vez, o surgimento de “processos a zero”.
De realçar que o facto de alguns clientes poderem fugir sem pagar, apesar de suceder, não pode ter a dimensão justificativa que a impugnante pretende e assim justificar grande parte dos registos apagados, e o mesmo se diga quanto às mudanças de mesa ou de pedido. Contudo, a verdade é que esta circunstância foi considerada na formulação dos cálculos efetuados pelo Inspetor Tributário, o que decorre do RIT, sendo certo que, se assim não fosse, o valor estimado seria naturalmente maior.
A impugnante refere, como já avançamos, que o valor médio encontrado pela AT para as refeições se cifra nos cerca € 6,00 para cada um dos Restaurantes e não nos cerca € 12,00, sendo que as refeições tipo económico correspondem a cerca de 95% do volume do negocio dos Restaurantes, o que, além do já exposto, recorde-se, mereceu resposta negativa quanto à sua prova, consoante decorre do probatório e da motivação da decisão de facto (mais concretamente dos factos considerados não provados).
Os SIT, consoante espelha o probatório concluíram mercê das “periciais” ao sistema de facturação, WinRest (O Winrest é um sistema aplicativo informático que produz e gere a faturação de um estabelecimento, especialmente, vocacionado para a área da restauração) que a impugnante, durante o período inspectivo anulou várias operações, pedidos, que deveriam estar contabilizados em vez de ser suprimidos, tornando infiel aqueles registos de facturação, o que, de resto tem eco no ponto 17 dos factos provados.
Como se disse, em sede de procedimento inspetivo, a partir da análise dos dados recolhidos do sistema informático em uso nos estabelecimentos da impugnante, WinREST, foi possível confrontar os valores declarados pelo sujeito passivo com os dados constantes dos ficheiros informáticos, quer do Restaurante M. 1, sito na (…), quer do Restaurante M. 2, sito em (…), consoante acima se explicou.
O Restaurante M. 1, o sistema informático apenas possuía armazenados os ficheiros posteriores a 19 de agosto de 2012, faltando, por isso, os ficheiros de dados produzidos e gerados pela aplicação WinREST, anteriores àquela data.
Estes elementos, que serviriam de suporte aos valores das prestações de serviços declaradas para efeitos tributários, nunca foram fornecidos pelo sujeito passivo à administração tributária, não obstante ter sido, para esse efeito, regularmente notificado, consoante decorre do Anexo III do RIT.
Constataram ainda os SIT a existência de várias omissões e inexatidões nos Mapas de Apuro Diário, constantes da contabilidade do sujeito passivo, face aos respetivos dados eletrónicos, conforme o evidencia os quadros do RIT. A par disto, as linhas apagadas, processos a zero, maiores que zero e em falta.
Foi constatado também, no Restaurante de (…) o talão nº 256120, do dia 21 de agosto de 2011, dia das festas da Sr. da Agonia, um dos dias de maior volume de negócios do ano, continha 315 linhas anuladas a que corresponderiam outras tantas válidas, tendo a impugnante declarado apenas 312,75€, o mais baixo do mês e um dos mais baixos do ano.
Além de que, no restaurante de (…), entre 01.01.2008 e 29.03.2012, existiram 268.809 registos anulados, o que perfaz uma média de 173,42 registos por dia, de acordo com os SIT (cf. Cap. III, ponto 1.4.3 do RIT a que alude o probatório).
Como se viu do acima exposto, a impugnante não conseguiu justificar estas omissões e excesso.
Na verdade, foram vários os processos encontrados que a IT apelida de “registos a zero”, “maiores que zero” e em falta, explicando ao longo do RIT como foram estimados os valores para tais omissões em cada um dos Restaurantes. Apesar disso, diz a impugnante, também, que existe excesso, que ficou por demonstrar.
Não conseguiu provar o alegado excesso na quantificação apurada através de métodos indiretos, em conformidade com o disposto no artigo 74º, nº 3, da LGT, conjugado com o nº 3, do artigo 100º do CPPT, nomeadamente através da demonstração dos reais valores tributáveis.

A recorrente discorda do entendimento vertido na sentença, no sentido da realidade da impugnante não ser passível simultaneamente de determinação da matéria coletável por método direto e método indireto, por haver uma contradição, pois que uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo e, não fez uma correta interpretação dos arts. 83.º a 88.º da LGT.

Embora insista na duplicação de coleta não concretiza como errou a sentença ao afastar a existência de duplicação.
Do mesmo passo não individualiza o erro da sentença em não afastar o método direto, ou melhor, o respaldo legal para aplicação do método indireto, quando usado, substituir o método direto, ou seja, por que entende que os métodos são alternativos.

Na verdade, discordando do decidido não ataca os fundamentos da sentença que concluiu naquele sentido.
Nesta medida tem de improceder este segmento recursivo, porquanto a sentença explana os fundamentos legais que permitem o apuramento da matéria tributável por meio direto, ou seja, com os elementos encontrados nos seus registos, e na parte, em que não dispõe de quaisquer registos, o uso do método presuntivo ou indireto.

Por fim, insurge-se com a “taxa de evasão fiscal” que não existe na lei portuguesa, tratando-se de uma invenção do inspetor.

Vejamos,
Como tem sido clara a jurisprudência, nomeadamente deste TCA Acórdão de 19-06-2019 no processo 02362/08 BEPRT e Ac. do TCA Sul de 17-09-2019 no processo 484/16 , em matéria de quantificação da matéria tributável por método indireto, compete sempre ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação, por sua vez, cabe à AT indicar os critérios utilizados nessa quantificação.

Do ato emanado do despacho da Senhora Diretora de Finanças, no âmbito do procedimento de revisão, que assume a posição do perito da AT (bem como do relatório) no respetivo procedimento de revisão, resulta que o cálculo da taxa de “evasão fiscal” no montante de 32,7%, foi construída com base nos valores declarados pela empresa no período compreendido entre setembro e dezembro de 2011 (taxa média de 4 meses), servindo de base para calcular os valores de processos a zero e processos em falta relativos ao período compreendido entre janeiro de 2008 e agosto de 2011, inerentes ao restaurante da Amorosa, em virtude de a empresa não ter apresentado os ficheiros de dados produzidos e geridos pela aplicação WinRest.

Na verdade, o art. 90.º, n.º 1, da LGT, fixa os elementos a atender pela AT na determinação da matéria coletável por método indiretos, para o que poderá ter em conta os seguintes elementos, nomeadamente, uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte, bem como a partir do facto conhecido, como os dados registados em determinado período, para calcular no período imediatamente anterior o valor estimado das omissões.
Não há dúvida que a AT explícita de forma compreensível à luz da atividade da impugnante, concretamente determinada pelos registos, a taxa encontrada para determinar o valor que se estima que foi realizado e omitido.
Em face deste raciocínio assente em dados objetivos, a partir da concreta atividade da impugnante teria a recorrente que contrariar a bondade da correção assente no aludido critério para inferir a expressão quântica do facto tributário. Ora, a Recorrente objetiva e claramente não contraria a validade técnica do critério usado pela AT, nem demonstra, como é seu ónus, que haja excesso de quantificação.

Nestes termos, o recurso terá de improceder na sua totalidade, mantendo-se a sentença recorrida por não padecer do apontado erro de julgamento.

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5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Notifique-se.
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Porto, 29 de Abril de 2021

Cristina da Nova
Ana Paula Santos
Margarida Reis
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iii) Neste sentido CPPT anotado do Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Vol. II, página 342, 6.ª Edição, Áreas Editora.

iv) Ac. do STA de 18-05-2016, no recurso 0100/16; Ac. do STA de 17-06-2015 no recurso 0395/15; Ac. do STA de 8-10-2014, no recurso 0114/11 e Ac. do STA de 06-07-2011 no recurso 0355/11, todos disponíveis em www.dgsi.pt

v) Acórdãos do STA de 12-04-2012, no proc. 896/11, de 22-01-2020 no proc. 0915/16 r o do Pleno de 24-02-2021, no recurso 087/16.

vi) Cfr. Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 22 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 441/13, disponível em www.dgsi.pt

vii) No sentido do texto Ac. do TCASul no processo 07219/13 de 29/5/2014, disponível no site da dgsi.

viii) Neste sentido o acórdão deste tribunal de 7/12/2016 no processo n.º 1206/07.7 BEVIS, disponível em www.dgsi.pt e acórdãos da relatora nos processos n.ºs, 1693/04 de 02-03-2017, 2386/04 de 23-11-2017, não publicados.

ix) Acórdão deste tribunal, no qual a presente relatora foi adjunta, de 09-06-2016 no processo n.º 303/2001, ainda inédito.

x) Entre outros, Ac. de25-02-2015 no processo 070/14, disponível em www.dgsi.pt

xi) Corroborando o que vai exposto o Ac. do TCA Norte de 6/10/2005, no proc. 00314/04, disponível no site da dgsi.

xii) Saldanha Sanches, Quantificação da Obrigação Tributária, Cadernos da CTF, 173, pág. 400

xiii) Acórdão de 19-06-2019 no processo 02362/08 BEPRT e Ac. do TCA Sul de 17-09-2019 no processo 484/16