Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00358/13.1BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/20/2023
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:TABELA REMUNERATÓRIA DA CARREIRA MÉDICA; DECRETO-LEI N.º 353-A/89, DE 16 DE OUTUBRO;
DECRETO-LEI N.º 73/90, DE 06 DE MARÇO;
PRINCÍPIO DA IGUALDADE;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA», residente na Travessa ..., ... ..., «BB», residente na Rua ..., ..., ... ..., e «CC», residente na Avenida ..., ..., ..., ... ..., propuseram ação administrativa especial contra o MINISTÉRIO DA SAÚDE, com sede na Av. ... ..., HOSPITAL ..., S.A., com sede em ..., ... ..., e HOSPITAL 2... (atualmente Centro Hospitalar ..., EPE), com sede na Avenida ... ..., pedindo que seja “julgado e declarado nulo, de nenhum efeito, o ato que incorretamente posicionou as AA. no escalão 1 – índice 145 (atual 71-72) e, consequentemente, serem condenados solidariamente os RR. a reposicionar as AA. no escalão 2, índice 160 (atual 79-80), da respetiva categoria de acordo com a Tabela Remuneratória da Carreira Médica, ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 12.° e art.° 62.° do Dec.-Lei n.° 73/90 de 6 de março, conjugados com o n.° 2 do art.º 17.° do Dec.-Lei n.° 353-A/89, com efeitos reportados ao mês de outubro de 2005, obstando, assim, à contínua, permanente e reiterada violação do princípio da igualdade por parte da Administração Pública, consagrado nos art.os 13.° e 59.°-n.° 1, a) da Constituição da República Portuguesa, face à diferença de remuneração entre colegas com idêntica antiguidade e progressão de carreira, com a restituição do valor das diferenças salariais, acrescido de juros de mora à taxa legal, até verificado o seu integral pagamento, com todas as consequências daí decorrentes”.
Indicaram, como contrainteressado, o CENTRO HOSPITALAR 2... (CENTRO HOSPITALAR 2...), com sede na Quinta ..., ... ..., ....

Foi proferido despacho saneador, no qual foram julgadas procedentes as exceções de ilegitimidade do R. Ministério da Saúde e do contrainteressado CENTRO HOSPITALAR 2..., com a sua consequente absolvição da instância. Mais foi julgada parcialmente procedente a exceção de caso julgado no que se refere ao pedido formulado pela A. «CC», na parte relativa ao vício de violação de lei decorrente da inobservância da regra de 10 pontos na integração na nova categoria, prosseguindo os autos, no que concerne àquela A., unicamente para apreciação do vício de violação do princípio constitucional da igualdade.
Por decisão proferida pelo TAF de Coimbra foi julgada a acção improcedente e absolvidos os RR. dos pedidos.

Desta vem interposto recurso por «AA», «BB» e «CC».
Alegando, formularam as seguintes conclusões:
1 - As Recorrentes na P.I. indicaram a existência do acto recorrido era aquela que tinha incorrectamente posicionado no escalão 1-índice 145(actual 71-72), porquanto, as mesmas deveriam encontrar-se escalonadas no escalão 2, indíce 160(actual 79-80) da respectiva categoria de acordo com a Tabela Remuneratória da Carreira Médica, ao abrigo do disposto no nº2 do art.12º e art.62º do Dec. Lei nº73/90 de 6 de Março, conjugados com o nº2 do art.17º do Dec. Lei nº353-A/89, com efeitos reportados ao mês de Outubro de 2005;
2 - A Exma Senhora Dra. «DD», Distinta Médica, a exercer as mesmas funções das Recorrentes, desde a mesma data, como Assistente Hospitalar Graduada de Anestesiologia, no CENTRO HOSPITALAR 2..., onde, o supra citado profissional, ocupa a mesma categoria da Recorrente (Assistente Graduado), foi promovido na mesma data da Recorrente, exerce as mesmas funções da Recorrente encontra-se posicionado no escalão 2, índice 160, da Tabela Salarial da Carreira Médica;
3 - Verifica-se a adopção duma postura distinta, arbitrária em relação a profissionais, todos eles, integrados na mesma categoria, especialidade e com o mesmo período de tempo de serviço, onde se verifica a aplicação da “regra” da diferença de dez pontos obrigatória na integração de nova categoria e que decorre da Lei. nº2 do art.17º do Dec. Lei nº353-A/89 e o mapa II, anexo ao Dec. Lei nº19/99, de 27 de Janeiro;
4 - O Dec. Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, de acordo com o disposto no nº2 do art.17º viu consagrado para todas as carreiras a promoção a categoria superior, como regra para determinar o escalão de promoção, um impulso mínimo de 10 pontos, inclusivamente as carreiras médicas;
5 - Com a entrada em vigor o Dec. Lei 73/90, de 6 de Março, especificamente dirigido às carreiras médicas, aquela mesma regra manteve-se quanto à promoção a categoria superior nas, conforme se retira pelo disposto no seu art.12º, no caso concreto, no que respeita à categoria de clínico geral da carreira médica de clínica geral;
6 - O supra referido diploma foi revogado pelo Dec. Lei nº177/2009, de 4 de Agosto, o qual, dispõe no seu art.17º que a identificação dos níveis remuneratórios correspondentes às posições remuneratórias das categorias da carreira especial médica é efectuada em termos a prever em decreto regulamentar;
7 - Até à presente data continua por publicar o decreto regulamentar no que concerne a questões de natureza remuneratória relativas às categorias da carreira médica;
8 - Tendo em conta a data em que ocorreu a promoção das Recorrentes e, dada a inexistência, até hoje, de diploma regulamentar para o efeito, não pode a referida promoção, com efeito, deixar de se reger pelo Dec. Lei nº73/90, de 6 de Março; 9-No entanto, a regra dos 10 pontos consagrada pelo nº2 do art.17º do Dec. Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro não pode deixar de ser atendida em termos de carreira médica;
10 - A esse propósito importa atender ao art.62º o Dec. Lei nº73/90, de 6 de Março, alude que é subsidiariamente aplicável o Dec. Lei nº353-A/89, de 16 de Outubro, em tudo aquilo que não se encontre expressamente regulamentado;
11 - Nesse sentido, e de acordo com o carácter subsidiário conferido ao Dec. Lei nº353-A/89, não se pode deixar de invocar o disposto no nº2 do art.17º desse diploma, que em caso de promoção “(...)resultar um impulso salarial inferior a 10 pontos, a integração na nova categoria faz-se no escalão seguinte da estrutura da categoria(...)”;
12 - Há violação do princípio da igualdade com base, entre outras situações, no exemplo referente ao da colega Dr.ª «DD», como ficou, de resto, provado, a exercer as mesmas funções, desde a mesma data, como Assistente Hospitalar Graduada de Anestesiologia no CENTRO HOSPITALAR 2..., a qual foi posicionada no escalão 2, índice 160, e, de outra banda, com base na tomada de posição do Ministério da Saúde a favor da aplicação da “regra da diferença dos 10 pontos;
13 - Reconhece a sentença a quo que existe uma diferente interpretação das disposições legais aplicáveis ao posicionamento remuneratório dos profissionais integrados na carreira médica hospitalar promovidos à categoria de Assistente Graduado;
14 - Desse facto, até hoje, nenhuma posição foi tomada pela Tutela em relação à forma como aquele e outros profissionais se encontram providos na categoria de Assistente Graduado em Escalão e Índice superior ao das Recorrentes;
15 - Encontrando-se os referidos trabalhadores afectos a um regime de uniformidade e de tratamento igualitário no âmbito do SNS, o CENTRO HOSPITALAR 2..., existiria todo o interesse em aferir as razões e fundamentos que levaram a sustentar aquela posição assumida em relação ao referido trabalhador, designadamente, no que respeita ao seu posicionamento em termos de escalão profissional;
16 - É constatável o manifesto tratamento diferenciado aqui evidenciado entre trabalhadores ligados à mesma entidade publica consubstanciada no Serviço Nacional de Saúde;
17 - O acto que relegara as Recorrente para escalão remuneratório diferente dos outros colegas, em igualdade de circunstâncias, reflecte de forma manifesta e inquestionável a violação, à luz da Lei, dum princípio fundamental e que se prende com o tratamento de igualdade imposto pela Constituição da República Portuguesa;
18 - O princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, traduz, no fundo, a ideia geral de proibição do arbítrio, visando impedir as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objectivo, constitucionalmente relevantes;
19 - O acto que posicionou as Recorrentes no supra mencionado escalão e índice remuneratório, por todo o acima exposto, corresponde a um acto inválido, consequentemente nulo, por ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, não produzindo quaisquer efeitos jurídicos - nº 1 do art. 134º do CPA) -;
20 - Têm as Recorrente direito ao reposicionamento no escalão 2, índice 160 (actual 79-80), da respectiva categoria de acordo com a Tabela Remuneratória da Carreira Médica, ao abrigo do disposto no nº2 do artigo 12º e art. 62º do Dec. Lei nº 73/90 de 6 de Março, conjugados com nº 2 do art.17º do Dec. Lei nº 353-A/89, com efeitos reportados ao mês de Outubro de 2005, obstando, assim, à contínua, permanente e reiterada violação do princípio da igualdade por parte da Administração Pública, consagrado nos arts. 13º e 59º-nº 1, a) da Constituição da República Portuguesa, face à diferença de remuneração entre colegas com idêntica antiguidade e progressão de carreira, com a restituição do valor das diferenças salariais, acrescido de juros de mora à taxa legal, até verificado o seu integral pagamento, com todas as consequências daí decorrentes;

Com o suprimento, requer-se seja julgado procedente o presente recurso e revogada a sentença recorrida por Acórdão que julgue nulos os actos que posicionaram as Recorrentes na categoria de Assistente Graduado, e atribuído, em termos remuneratórios, o escalão 1, índice 145 (actual 71-72), de forma a reposicionar no escalão 2, índice 160 (actual 79-80), da respectiva categoria de acordo com a Tabela Remuneratória da Carreira Médica, com todas as legais consequências, com o que se fará sã e serena Justiça!
O Centro Hospitalar ..., EPE, (CHBV) juntou contra-alegações, concluindo:

A. Relativamente ao Recorrido CHBV só está em causa apreciação do vício de violação do princípio constitucional da igualdade, uma vez que a questão do alegado vício de violação de lei decorrente da inobservância da regra dos 10 pontos na integração na nova categoria, da Recorrente «CC», já ficou decidida no Despacho Saneador.
B. Quanto aquele apontado vício (violação do princípio da Igualdade) não merece a sentença a quo qualquer censura.
C. Na verdade, pese embora decorrer da mesma a existência de diversidade de interpretações quanto à questão da progressão para a categoria de Assistente Graduado na carreira especial médica e subsequente reposicionamento remuneratório, as interpretações divergentes são por parte de entidades diferentes.
D. O Recorrido CHBV aplicou à Recorrente «CC» as normas vigentes sobre a matéria da forma que entendeu ser a correta, tendo procedido de idêntica forma com todos os seus funcionários nas mesmas condições;
E. Não teve qualquer intervenção ou responsabilidade na forma como foi aplicada a progressão nos profissionais de outra entidade.
F. Tais atos – de diferentes entidades - só poderão ser escrutinados por via do vício de violação de lei, isto é, apreciando se a sua aplicação foi conforme ao normativo legal em vigor.
G. O que no caso da Recorrente «CC» sucedeu – a sua progressão à categoria de Assistente Graduado e consequente reposicionamento remuneratório já havia sido objecto de acção judicial anterior, sendo que nenhuma ilegalidade foi imputada ao ato executado pelo ora Recorrido CHBV.

Nestes termos e nos mais de Direito com o suprimento,
Deve manter-se a sentença a quo e a consequente absolvição do Recorrente CHBV dos pedidos
feitos pela Recorrente «CC», com o que se fará inteira
JUSTIÇA!

Também o HOSPITAL ... juntou contra-alegações, concluindo:

1 - A promoção das AA., ora Recorrentes foi efetuada à luz do Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de Março, mais propriamente do n.º 2 do art.º 12.º, diploma que estabelecia àquela data, o regime legal das carreiras médicas.

2 - Estabelece o n.º 2 do citado art.º 12.º que “a promoção a categoria superior faz-se para o 1º escalão da estrutura remuneratória dessa categoria ou para o escalão a que corresponda índice superior mais aproximado, se o médico já vier auferindo remuneração igual ou superior à daquele escalão”.

3 - Foi em consequência da aplicação do citado normativo, que a ora Recorrida posicionou as AA., em virtude da sua promoção a categoria superior (assistente graduado), no escalão 1 da respetiva categoria.

4 – Esgota-se nesta norma, a disciplina jurídica da promoção das AA., enquanto médicas integradas na carreira médica hospitalar.

5 - Encontra afastada, in casu, a aplicação do n.º 2 do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89 de 16 de outubro, no que se reporta à interpretação do art.º 62.º do Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de Março, sob o título “legislação subsidiária”, que determina que as regras plasmadas naquele Decreto-Lei n.º 353-A/89, somente deverão ser observadas na ausência de previsão expressa neste Decreto-Lei n.º 73/90.

6 - O Decreto-Lei n.º 73/90 define clara e expressamente, as concretas regras referentes à promoção e progressão na carreira onde se integram as AA Recorrentes, impedindo o recurso (subsidiário) às regras previstas no n.º 2 do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89.

7 – A regra do “impulso salarial inferior a 10 pontos”, não é in casu aplicável, atenta a carreira médica hospitalar detida pelas AA. Recorrentes.

8 - Os atos impugnados obedeceram aos preceitos legais aplicáveis, concluindo-se forçosamente pelo correto posicionamento das AA. no escalão 1, índice 145.

9 – Não ocorre por parte da R. ora Recorrida, postura distinta e arbitrária em relação a profissionais integrados na mesma categoria, especialidade e tempo de serviço, já que os actos invocados pelas AA. Recorrentes foram praticados por entidades distintas, pelo que não resulta a violação, por parte da R. Recorrida, do princípio da igualdade.
Pelo que bem andou o Tribunal a quo decidindo como decidiu, devendo manter-se a sentença recorrida nos seus exatos termos.

Termos em que e nos melhores de Direito que suprirão, deverá manter-se integralmente a decisão recorrida e assim decidindo, se fará inteira JUSTIÇA.

O MP, notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:

1) As AA. «AA» e «BB» exercem as funções de médicas anestesistas no R. HDFF, com a categoria de Assistente Graduado da carreira médica hospitalar, em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado (cfr. docs. de fls. 181 e 182 do suporte físico do processo).
2) Antes da sua promoção à categoria de Assistente Graduado de Anestesiologia, as AA. «AA» e «BB» encontravam-se providas na categoria de Assistente da carreira médica hospitalar, posicionadas no escalão 4, índice 140, da Tabela Salarial da Carreira Médica (acordo).
3) As AA. «AA» e «BB» foram promovidas à categoria de Assistente Graduado com efeitos a partir de 12/10/2005, tendo sido posicionadas no escalão 1, índice 145, da Tabela Salarial da Carreira Médica, nos termos do n.º 2 do art.º 12.º do Decreto-Lei n.º 73/90, de 06/03, a que correspondem a remuneração base de € 4.107,02 e os atuais níveis remuneratórios 71 e 72 da Tabela Remuneratória Única (cfr. docs. de fls. 27, 28, 181 e 182 do suporte físico do processo).
4) A A. «CC» exerce as funções de médica anestesista no R. CHBV, com a categoria de Assistente Graduado da carreira médica hospitalar, em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado (cfr. doc. de fls. 183 do suporte físico do processo).
5) Antes da sua promoção à categoria de Assistente Graduado de Anestesiologia, a A. «CC» encontrava-se provida na categoria de Assistente da carreira médica hospitalar, posicionada no escalão 4, índice 140, da Tabela Salarial da Carreira Médica (cfr. doc. de fls. 12 do processo administrativo).
6) A A. «CC» foi promovida à categoria de Assistente Graduado com efeitos a partir de 31/08/2005, tendo sido posicionada no escalão 1, índice 145, da Tabela Salarial da Carreira Médica, nos termos do n.º 2 do art.º 12.º do Decreto-Lei n.º 73/90, de 06/03, a que correspondem a remuneração base de € 4.107,02 e os atuais níveis remuneratórios 71 e 72 da Tabela Remuneratória Única (cfr. docs. de fls. 9, 10 e 12 do processo administrativo).
7) Na sequência de um pedido de esclarecimentos efetuado pelo R. CHBV (então HOSPITAL ...) ao Diretor-Geral da Saúde acerca da correção do posicionamento remuneratório no escalão 1, índice 145, dos assistentes hospitalares que foram promovidos à categoria de Assistente Graduado, respondeu a Secretaria-Geral do Ministério da Saúde, pelo ofício n.º ...63, de 03/10/2006, que, “porque a disciplina jurídica a que obedece a promoção a categoria superior nas carreiras médicas é, efetivamente, a prevista no citado artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 73/90, de 6 de março, que não estipula como regra para determinar o escalão de promoção um impulso mínimo de 10 pontos, a que acresce que, nos termos do artigo 62.º do mesmo diploma, ‘Em tudo o que não esteja expressamente previsto no presente diploma é aplicável ao pessoal referido no artigo 2.º o disposto no Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de outubro’, entende-se que, no caso em apreço, a transição de um assistente hospitalar posicionado no escalão 4, índice 140, determina o seu posicionamento no escalão 1, índice 145, da categoria de assistente graduado”, ofício do qual foi dado conhecimento à A. «CC» em 16/10/2006 (cfr. docs. de fls. 24, 26, 27 e 29 do processo administrativo).
8) Na sequência de um idêntico pedido de esclarecimentos efetuado pelo R. HDFF à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) acerca da correção do posicionamento remuneratório no referido escalão 1, índice 145, dos assistentes hospitalares que foram promovidos à categoria de Assistente Graduado, esta última entidade comunicou ao R. HDFF, pelo ofício n.º ...59, de 09/01/2008, o seu entendimento de que “a transição de um assistente hospitalar posicionado no escalão 4, índice 140, determina o seu posicionamento no escalão 1, índice 145, da categoria de assistente graduado”, ofício do qual foi dado conhecimento às AA. «AA» e «BB» em 20/01/2008 (cfr. docs. de fls. 29, 30, 31, 91 e 92 do suporte físico do processo).
9) A petição inicial da presente ação deu entrada em juízo no dia 28/05/2013 (cfr. doc. de fls. 3 do suporte físico do processo).

DE DIREITO
É pelas conclusões do recurso que se delimita o conhecimento do mesmo.
Assim,
Vem o presente recurso interposto pelas AA. da sentença que julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu os RR. do pedido de reposicionamento das AA. no escalão 2, índice 160 da categoria de Assistente Graduado e consequente reconstituição das suas carreiras e restituição das diferenças salariais, acrescidas de juros, em virtude da improcedência do pedido impugnatório dirigido à declaração de nulidade do ato que as posicionou, após promoção àquela categoria, no escalão 1, índice 145.
Sustentam as Recorrentes que foram incorretamente posicionadas no escalão 1, índice 145 da categoria de Assistente Graduado, porquanto as mesmas deveriam tê-lo sido no escalão 2, índice 160, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 12º e artigo 62.º do DL 73/90 de 06.03, conjugado com o n.º 2 do artigo 17.º do DL 353-A/89 de 16.10, verificando-se uma postura arbitrária em relação a outros profissionais, integrados na mesma categoria, nesses termos colocados, e da qual defende resultar a violação do principio da igualdade.
Cremos que carecem de razão.
Vejamos,
A referida promoção foi efetuada à luz do Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de março, mais propriamente do n.º 2 do art.º 12.º, diploma que estabelecia àquela data, o regime legal das carreiras médicas.
Estabelece o n.º 2 do citado art.º 12.º que “a promoção a categoria superior faz-se para o 1º escalão da estrutura remuneratória dessa categoria ou para o escalão a que corresponda índice superior mais aproximado, se o médico já vier auferindo remuneração igual ou superior à daquele escalão”.
E foi em consequência da aplicação do citado normativo, que o ora Recorrido posicionou as AA., em virtude da sua promoção a categoria superior (assistente graduado), no escalão 1 da respetiva categoria.
Cremos, tal como foi igualmente entendido pelo Tribunal a quo, que se esgota nesta norma, a disciplina jurídica da promoção das AA., enquanto médicas integradas na carreira médica hospitalar.
Ao contrário do que vem defendido pelas AA. Recorrentes, encontra-se afastada a aplicação do n.º 2 do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89 de 16 de outubro, posto que não perfilhamos a tese daquelas, no que se reporta à interpretação do art.º 62.º do Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de março.
É que o referido art.º 62.º do Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de março, sob o título “legislação subsidiária”, determina que as regras plasmadas no Decreto-Lei n.º 353-A/89, somente deverão ser observadas na ausência de previsão expressa no Decreto-Lei n.º 73/90 de 06 de março.
Ora, o Decreto-Lei n.º 73/90 expressamente define regras concretas e taxativas, referentes à promoção e progressão na carreira onde se integram as AA, conforme resulta do já citado art.º 12.º, o que impede, portanto, o recurso (subsidiário) às regras previstas no n.º 2 do art.º 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89.
Também o Tribunal assim julgou, perfilhando o entendimento do Acórdão (proc. n.º 0606/12) do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 18/10/2012.
Concluiu ainda que a regra do “impulso salarial inferior a 10 pontos”, não é in casu aplicável, atenta a carreira médica hospitalar detida pelas AA. Recorrentes.
Destarte, crendo que os actos impugnados obedeceram aos preceitos legais aplicáveis - como bem se decidiu na sentença ora em crise - forçosamente temos de concluir pelo correto posicionamento das AA. no escalão 1, índice 145.
Reportando-nos à invocada violação do princípio da igualdade, em virtude da alegada postura distinta e arbitrária em relação a profissionais integrados na mesma categoria, especialidade e tempo de serviço, importa chamar à colação o seguinte.
O Estado assegura o direito à proteção da saúde através do Serviço Nacional de Saúde (adiante SNS), que abrange todas as instituições prestadores de cuidados de saúde, dependentes do Ministério da Saúde.
Integram o SNS todos os serviços e entidades públicas prestadoras de cuidados de saúde, designadamente os agrupamentos de centros de saúde, os estabelecimentos hospitalares e as unidades locais de saúde.
Estes últimos, integram o setor público empresarial do SNS, do qual fazem parte 40 unidades hospitalares, enquanto entidades públicas, dotadas de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial e natureza empresarial.
Acompanhamos igualmente nesta sede a fundamentação do Tribunal a quo, inserta na sentença prolatada, que entendeu não resultar a violação do princípio da igualdade, em virtude dos actos subjacentes, que alicerçam tal alegação, terem sido praticados por entidades distintas e perfeitamente autónomas.
(Como é sabido, na definição aristotélica de igualdade, discernir casos similares e diferentes é crucial: só os casos iguais devem ser tratados de forma igual, devendo os casos diferentes ser tratados de forma desigual na proporção da sua diferença.
Como sublinham Gomes Canotilho e Vital Moreira, em Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., o princípio da igualdade "exige positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes", o que se traduz, afinal, numa proibição do arbítrio. No mesmo sentido se afirma no Acórdão do STA de 26/09/2007, rec. 1187/06, “o princípio da igualdade traduz-se numa proibição do arbítrio, impondo, na consideração das suas dimensões igualizante e diferenciante, um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes".
Este sentido vinculante do princípio da igualdade tem sido exaustivamente enunciado pelo Tribunal Constitucional, em inúmeros arestos, de que se destaca o Acórdão 186/90 - proc. n.°533/88, de 06/06/90, do qual se destaca o seguinte trecho:
"O princípio constitucional da igualdade do cidadão perante a lei é um princípio estruturante do Estado de direito democrático e do sistema constitucional global..., que vincula directamente os poderes públicos, tenham eles competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição Anotada, 1.° vol., cit., p. 151, e Jorge Miranda, «Princípio da Igualdade»,
in Polis/Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, vol. III, Lisboa, São Paulo, Verbo, 1985, págs. 404/405.
Este facto resulta da consagração pela nossa Constituição do princípio da igualdade perante a lei como um direito fundamental do cidadão e da atribuição aos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria, traduzida na sua aplicabilidade directa, sem necessidade de qualquer lei regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades públicas, tenham elas competência legislativa, administrativa ou jurisdicional-artigo 18.°, n.°1, da Constituição.
Princípio de conteúdo pluridimensional, postula várias exigências, entre as quais a de obrigar a um tratamento igual das situações de facto iguais e a um tratamento desigual das situações de facto desiguais, proibindo, inversamente, o tratamento desigual das situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais. Numa fórmula curta, a obrigação da igualdade de tratamento exige que «aquilo que é igual seja tratado igualmente, de acordo com o critério da sua igualdade, e aquilo que é desigual seja tratado desigualmente, segundo o critério da sua desigualdade».
(...)
O princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Numa expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio.
(...)
E, no mesmo sentido, cfr. o Acórdão nº 39/88 (Diário da República, l Série, de 3 de março de 1988): «O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio, ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificarão razoável, segundo critérios de valor objectivo, constitucionalmente relevantes.
Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe ainda a discriminação; ou seja: as diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subjectivas, como são as indicadas, exemplificativamente, no n° 2 do artigo 13°.
Esclareça-se que a «teoria da proibição do arbítrio» não é um critério definidor do conteúdo do princípio da igualdade, antes expressa e limita a competência de controlo judicial. Trata-se de um critério de controlabilidade judicial do princípio da igualdade que não põe em causa a liberdade de conformação do legislador ou da discricionariedade legislativa. A proibição do arbítrio constitui um critério essencialmente negativo, com base no qual são censurados apenas os casos de flagrante e intolerável desigualdade.”- na mesma linha, o Acórdão do STA nº 073/08 de 13/11/2008. Ou seja, este sentido vinculativo do princípio da igualdade, exaustivamente enunciado pelo Tribunal Constitucional, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante).

Voltando ao caso concreto não resulta a violação do princípio da igualdade, porquanto os actos subjacentes, que alicerçam tal alegação, foram praticados por entidades distintas e perfeitamente autónomas.
Destarte, bem decidiu o Tribunal a quo, julgando improcedente a ação.
X
Sucede, porém, que, relativamente à Recorrente «CC» e ao Recorrido Centro Hospitalar ..., EPE, o recurso só pode ter-se como interposto quanto à questão da alegada violação do Princípio da Igualdade, uma vez que a questão relativa ao invocado vício de violação de lei decorrente da inobservância da regra dos 10 pontos na integração na nova categoria já tinha sido decidida no Despacho Saneador, tendo, então, sido julgada parcialmente procedente a exceção de caso julgado, invocada pelo ora Recorrido - tendo prosseguido os autos (repete-se, quanto à Drª «CC») somente para apreciação do vício de violação do princípio constitucional da igualdade.
Assim, quanto a este ponto, refere a sentença recorrida:
“(...) não se pode concluir que os RR. violaram o princípio da igualdade pelo facto de uma colega de profissão, na mesma situação das AA., ter sido posicionada, por outra entidade empregadora que não os ora RR., no escalão e índice remuneratórios que aquelas consideram corretos e que, por isso, também lhes deviam ter sido aplicados. Trata-se, com efeito, de uma diferente interpretação das disposições legais aplicáveis ao posicionamento remuneratório dos profissionais integrados na carreira médica hospitalar promovidos à categoria de Assistente Graduado que foi tomada por entidades distintas (de um lado os RR., do outro o CENTRO HOSPITALAR 2...), pelo que não pode daí resultar uma violação do princípio da igualdade. Diferente seria, claro está, se a mesma entidade decidisse aplicar interpretações diversas quanto ao posicionamento remuneratório do seu pessoal médico que se encontrasse nas mesmas exatas condições, pois que, aí sim, estar-se-ia a introduzir uma diferenciação de tratamento irrazoável, sem justificação plausível para as diferentes interpretações das normas legais que a mesma entidade decidia aplicar ao seu pessoal, colocado em situações iguais.”
Insurgindo-se as Recorrentes e alegando que: reconhece a sentença que existe uma diferente interpretação das disposições legais aplicáveis ao posicionamento remuneratório dos profissionais integrados na carreira médica hospitalar promovidos à categoria de Assistente graduado.
Todavia, assim não é.
Como decorre do aresto, essa diversidade de interpretações reporta-se a entidades diferentes: por um lado, o ora Recorrido CHBV (e também o HD ...), teve um entendimento quanto à aplicação do quadro normativo vigente, relativo à progressão para a categoria de Assistente Graduado, na carreira especial médica, tendo procedido de forma idêntica com todos os seus funcionários nas mesmas condições; por outro lado, o CENTRO HOSPITALAR 2..., terá tido um entendimento diverso quanto a esse mesmo quadro legislativo, fazendo uma aplicação diversa, pelo menos quanto à situação apresentada para comparação (desconhece-se se o terá feito a outros funcionários nas mesmas circunstâncias).
O Recorrido CHBV não foi, naturalmente, responsável, nem teve qualquer intervenção na progressão da médica do CENTRO HOSPITALAR 2..., pelo que nunca lhe poderá ser assacada o vício de violação do Princípio da Igualdade.
Tal diferença de interpretações quanto aos preceitos legais vigentes, por entidades diversas, só poderia levar ao vício de violação de lei por uma delas, sendo tais atos postos em crise.
O que sucedeu no caso do ato de progressão da Recorrente «CC» que, a seu tempo, recorreu contenciosamente do mesmo, para o TAF de Viseu. Tal ato não mereceu, contudo, censura judicial, significando que as regras vigentes relativas à progressão foram correctamente aplicadas pelo Recorrido.
Em suma,
Como sentenciado, conclui-se que os atos impugnados, pelos quais as AA. foram posicionadas, em termos remuneratórios, no escalão 1, índice 145 (atual 71-72), da Tabela Salarial da Carreira Médica, após a sua promoção à categoria de Assistente Graduado, não padecem dos vícios que lhes são imputados, devendo ser mantidos na ordem jurídica, o que determina não só a improcedência do pedido impugnatório, dirigido à declaração de nulidade dos atos, como também, forçosamente, a improcedência do pedido de condenação dos RR. a reposicionar as AA. no escalão 2, índice 160 (atual 79-80), da respetiva categoria, com a consequente reconstituição das suas carreiras, acompanhada pela restituição das diferenças salariais em falta, contabilizadas desde 2005, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.
Improcedem, pois, as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelas Recorrentes.
Notifique e DN.
Porto, 20/10/2023

Fernanda Brandão
Nuno Coutinho
Isabel Jovita