Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00874/10.7BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2022
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE, LEGALIZAÇÃO/DEMOLIÇÃO OBRAS ILEGAIS
Sumário:1 - Resultando um acordo alcançado em sede de acção que intentaram contra determinada empresa fabril, porquanto nesta acção acordaram na possibilidade de a actividade ser levada a efeito pela sociedade em causa dentro de determinado horário e, nos presentes autos, alegam que o não podem fazer porque essa actividade emitia ruído susceptível de perturbar o seu descanso e que, por essa via, não poderá ser legalizada a construção para industria, mas apenas para armazém, mostra-se a posição dos AA insustentável, quanto à inutilidade superveniente da lide

2 - Se, entretanto, na tramitação subsequente do procedimento administrativo de licenciamento/legalização das obras, foi realizado o ensaio condicionante do deferimento do projecto de arquitectura, donde se conclui pelo cumprimento dos limites legais do ruído e assim foi, definitivamente, deferido o pedido de legalização das obras e emissão do pertinente alvará, apenas condicionado a cedências ao domínio público e pagamento, porque devido, de taxas, inexiste razão para a manutenção do pedido de demolição das obras ilegais.

3 - Com este desenvolvimento e finalização do processo de legalização fica sem substracto acrescido a pretensão dos recorrentes no que se refere também à demolição das obras de ampliação realizadas sem licença, o que significa que, além dos montantes indemnizatórios já arbitrados/recebidos pelos AA./Recorrentes, o funcionamento, laboração, da unidade industrial ficou restrita a um horário acordatamente fixado, ou seja, poderá haver laboração de 2.ª feira a sábado, das 06 00 às 22 horas, assim se tendo harmonizado os interesses em litígio, consensualizados entre as partes e sujeitos, aliás, a cláusulas penais específicas prevenindo, no possível, o seu estrito cumprimento - o que permite concluir pela inutilidade superveniente da lide.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . LS... e LC..., residentes na Rua do (...), freguesia de (...), (...), inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 9 de Junho de 2021, que julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, no âmbito da acção administrativa comum, instaurada contra o MUNICÍPIO de (...), sendo contra interessada "JF---, L. da", com sede na Rua do (...), 256, freguesia de (...), (...) e onde aqueles, no final da pi, peticionavam:
- a) Ser a Ré condenada ao pagamento aos AA uma indemnização nunca inferior a 150.000,00 euros, a título de danos morais acrescida de juros legais até efectivo e integral pagamento;
- b) Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efectuadas sem licença de construção respectiva pela firma JF---, L. da; e,
- c) Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária à cessação das actividades industriais não licenciadas da sociedade comercial sob a firma "JF---, L. da".
*
Nas suas alegações, os recorrentes formularam as seguintes conclusões:
"- O Tribunal “a quo” deu como provados os seguintes factos:
“ 1. Com data de 28/10/1999, a Comissão de Coordenação da Região do Norte, emitiu certidão de localização para unidade industrial da classe C, sita no Lugar de (...), freguesia de (...), concelho de (...), destinada à confeção de localização para unidade industrial da classe C, destinada à confeção de vestuário exterior em série em espaço urbano de aglomerado tipo 3, segundo o respetivo PDM – cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial.”
“2. Com data de 06 de junho de 2001, a Direção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território – Norte emitiu a favor da sociedade JF---, Lda, alvará de licença n.º 222/2001, pra rejeição de águas residuais domésticas provenientes das suas instalações sitas no lugar de (...)s, freguesia de (...), concelho de (...) - cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021”
“3. Em 2005/09/27, a Direção Regional de Economia do Norte, emitiu autorização de localização do estabelecimento industrial com a atividade de tecelagem e fio, na Rua do (...), n.º 256, (...)s, freguesia de (...), concelho de (...), requerida pela sociedade JF---, Lda – cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021”-sublinhado e negrito nossos;
“4. Com data de 20/11/2006, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, aprovou a localização de estabelecimento industrial tipo 3, solicitado pela sociedade JF---, Lda, e destinado à tecelagem e fio, sito na Rua do (...), freguesia de (...), concelho de (...)- cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021”
“5. Em 18/07/2006, a Direção Regional da Economia do Norte, deu lugar a vistoria, da qual resultou autorização de exploração da atividade de tecelagem de fio requerida pela sociedade JF---, Lda e cuja autorização de localização foi emitida nos termos dos pontos que antecedem – cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021”
“6. Com data de 15 de abril de 2008, 05/05/2008, 30/06/2008, 14/07/2008 e 18/11/2008, o Autor nos presentes autos, apresentou reclamações junto da entidade demandada, nos seguintes termos: (…)”
“7. Em 22/01/2009, 04/07/2009 e 14/07/2009, os Autores deram lugar a participações junto da Guarda Nacional Republicana, com vista á verificação de ruído proveniente do funcionamento de máquinas de tecelagem da unidade fabril da sociedade JF---, Lda, das quais resultaram os respetivos relatórios, que concluem pela existência de ruído de fundo e vibrações na habitação dos Autores, que estes atribuíram àquela unidade fabril – cfr. docs. n.ºs 11, 12, 14 e 15 juntos com a petição inicial.”
“8. Por Despacho de 20/11/2006, o Presidente da Câmara Municipal de (...) delegou no Vereador da mesma Câmara Municipal DF..., as seguintes competências: (…)”
“9. Entre a Câmara Municipal de (...) e S... – Companhia de Seguros, SA, que passou a ter a designação de M... – Companhia de Seguros, SA e ultimamente de C... – Companhia de Seguros, SA", foi celebrado acordo que denominaram contrato de seguro, consubstanciado na apólice de responsabilidade civil geral, com a apólice n.º 80.100662, que integra os seguintes riscos: (…)”
“10. Com data de 05/05/2008, os serviços do Município demandado, emitiram a seguinte informação, que mereceu concordância do Vereador da Entidade demandada DF..., por Despacho de 07/05/2008:(…)”
“11. Nos dias 4, 15, 16, 22 e 23 de junho e 1, 9, 13 e 14 de julho de 2009, a Direção Regional de Economia do Norte, deu lugar a medições de ruído, tendo como local de medição a sala de jantar da habitação do Autor e das quais resultou o seguinte relatório: (…)”
“12. No âmbito da ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Guimarães, a que coube o processo n.º 3499/11.6TJVNF, em que é Autor SM... e demandada a sociedade JF---, Lda e à qual foi apensa a ação que correu termos no mesmo Tribunal e a que coube o n.º de processo 264/11.4 TJVNF, em que são Autores LS... e LC... e demandada a mesma sociedade JF---, Lda, foi proferida decisão que transitou em julgado em 14/03/2019: da qual resulta provada a seguinte matéria de facto, e a seguinte decisão:(…)”
“13. A sentença antes identificada foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Guimarães pelo seu Acórdão de 08/02/2018 – cfr. Docs. juntos em 27/06/2019.”
“14. Em 10/04/2008, a sociedade JF---, SA, apresentou projeto de arquitetura atualizado com vista à legalização e ampliação de Edifício na Rua do (...), 256, (...), (...), destinado a indústria de tecelagem – cfr. fls. 191 e ss. do PA denominado 1.6” – sublinhado e negrito nossos.
“15. Em 30/04/2008, os serviços do Réu emitiram parecer favorável quanto à aprovação do projeto de arquitetura antes identificado, com condições – cfr. fls. 242 do PA denominado 1.6.”
“16. Em 5/05/2008, o Réu Município procedeu ao levantamento de autos de notícia de contraordenação contra a sociedade JF---, SA, por ter esta procedido à construção de um edifício destinado a indústria com uma área aproximada de 1300 m2, sem estar munido da respetiva licença e por estar a ocupar um edifício com uma atividade industrial, de tecelagem de fio – cfr. fls. 249 e 250 do AP denominado 1.6.” - sublinhado e negrito nossos.
“17. Por Despacho de 28 de maio de 2008, o Presidente da Câmara Municipal de (...), pelo qual certificou que ¯o prédio constituído por edifício de habitação de rés-do-chão e andar, com a área de 390,50 m2 e edifício industrial têxtil de rés-do-chão com a área de 722 m2, sito na Rua do (...), n.º 256, freguesia de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 00588 e inscrito na matriz sob o artigo 1954, anteriormente inscrito sob o artigo 437, propriedade de JF---, Lda é de construção anterior à obrigatoriedade das licenças de construção e/ou utilização, não carecendo de licenças, uma vez que as mesmas licenças só se tornaram obrigatórias a partir de 4 de novembro de 1968, para essa área do Município‖ – cfr. fls. 331 do PA denominado de 1.7.”
“18. Em 17/11/2020, a sociedade JF---, Lda, apresentou nos serviços do Réu, novo pedido e legalização das construções existentes no seu prédio (sito na Rua do (...), n.º 256, freguesia de (...)), pedido a que coube o processo de licenciamento n.º LEG 124/2020. Ora, após análise dos elementos apresentados pela requerente, o Presidente da Câmara Municipal deferiu, por despacho de 12.05.2021, o projeto de arquitetura – cfr. Docs. juntos em 30/06/2021.”
“19. No âmbito da ação de embargos de executado, que correu termos no Tribunal Judicial de Braga sob o processo n.º 2543/19.3T8GMR-A, entre a Embargante JF---, Lda, no âmbito de Audiência Prévia que teve lugar em 13/01/2021, os Embargados, LS... e Laura da Conceição Simões Salazar Pereira, Autores nos presentes autos, e em que figurou como terceiro a sociedade R---, SA, foi celebrada transação nos seguintes termos, que foi homologada por decisão judicial do mesmo dia 13/01/2021: (…)”
“20. Em 17/11/2020, a sociedade JF---, Lda, apresentou novo pedido de legalização de ampliação de edifício destinado a armazém/indústria, alteração de destino de habitação para armazém e legalização de anexo, cujo projeto de arquitetura foi aprovado por Despacho do Presidente da Câmara do Município de (...), com condições, nos seguintes termos: (…)” - sublinhado e negrito nossos.
- Pese embora todos os factos dados como provados, o Tribunal “a quo” decidiu erradamente ao declarar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, no que toca ao pedido formulado na alínea b), porquanto aquilo que se discutia nos autos eram as obras de ampliação levadas a cabo pela sociedade JF---, Ld.ª sem estar munida do respetivo alvará de construção e por consequência a respetiva licença de utilização.
- Apesar de todos os factos que foram valorados e dados como provados pelo Tribunal “a quo”, a decisão não traduziu aquela que é a realidade fáctica, porquanto o Tribunal não terá entendido, lamentavelmente, o problema em apreço/litígio.
- No seu petitório os Autores alegaram que:
“Residem na morada acima mencionada há mais de trinta anos.
A sociedade comercial por quotas sob a firma JF---, Lda., com sede na Rua do (...), n.°M, 256, freguesia de (...), 4770-265 de (...), que se dedica à tecelagem, está implantada numa zona habitacional, a escassos metros dos autores, cujas instalações tem vindo a sofrer alargamentos sucessivos e a aproximar-
se progressivamente da casa de morada de família, supra referida, dos autores. – sublinhado e negrito nossos.
Que esta sociedade procedeu à construção de um edifício para alargamento das suas instalações à margem da lei (sem estar munida do respetivo alvará); procedeu assim, a uma instalação industrial clandestina e ignorou a intimação da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional — Norte (CCDR-Norte), para laborar apenas nas áreas licenciadas, e durante o período diurno. – sublinhado e negrito nossos.
Que a referida sociedade labora em horário contínuo, seis dias por semana e causa um impacto negativo e perante insistência que fizeram junto da Câmara Municipal de (...), esta, por Despacho, ordenou a respetiva desocupação, que foi ignorado pela empresa JF---, Lda, continuando a laborar de forma contínua seis dias por semana, causando nos AA graves danos. – sublinhado e negrito nossos.
Que por várias vezes interpelaram o Município demandado para fazer cumprir aquele Despacho, não o fez. – sublinhado e negrito nossos.
Mais alegaram que a sociedade em causa procedeu construção de um edifício destinado a indústria com uma área aproximada de 1.300 m2 sem estar munido do respetivo alvará de construção e a localização do estabelecimento enquadra-se em área classificada como espaço aglomerado do tipo 3, destinado a habitação e pequeno comércio de apoio. – sublinhado e negrito nossos.
Que nesta edificação funciona uma atividade de tecelagem de fio, sem estar munida da respetiva autorização de utilização e mantém-se em laboração ilegal e sem licença. – sublinhado e negrito nossos.
Que o ruído e a vibração que emite não permitem o descanso indispensável aos autores e à sua família durante a noite, nem um bom ambiente diurno.
Que, no âmbito de ação judicial que interpuseram junto do Tribunal Judicial de (...), foi elaborado um Relatório de Ensaio relativo à avaliação de Medição dos Níveis de Pressão Sonora - Critério de Incomodidade, datado de 15 de julho de 2009, realizado por técnicos da Direção Regional de Economia do Norte que atesta a não conformidade do ruído produzido pela atividade do estabelecimento industrial.
Acresce que na sua atividade a sociedade identificada, lança para o ar uma nuvem de poeiras que tem contribuído para piorar o estado de saúde da Sra. LC..., que já por si sofre de asma.
E que a mesma sociedade agiu em claro prejuízo e total indiferença pela tranquilidade e pela qualidade de vida dos AA, sem que a Autarquia, sucessivas vezes interpelada nesse sentido, procedesse à restituição da legalidade e pusesse termo à exploração ilegal, e profundamente danosa para os AA, do estabelecimento industrial. – sublinhado e negrito nossos.
Que em face da falta de atuação da Câmara Municipal de (...), remeteram a esta diversas comunicações alertando para o impacto negativo na vida dos Autores, sem que da parte de tal entidade houve intervenção no sentido de sanar os efeitos da atividade de tecelagem no descanso dos Autores. – sublinhado e negrito nossos.
O que determinou que experimentassem dificuldades de concentração, não conseguem trabalhar diligentemente, não conseguem dormir, sentindo-se nervosos e ansiosos. Sentem-se profundamente abalados psiquicamente, sendo certo que ainda não recuperam desse abalo.
E, para conseguir algum repouso, os AA. não permanecem em sua casa durante a noite. O Sr. LS... pernoita num anexo à sua habitação que dista cerca de 40 metros desta e sem acabamentos, com paredes apenas revestidas apenas com cimento, que era anteriormente destinado aos animais domésticos e que mesmo pernoitando no barracão, ouve o barulho do funcionamento da tecelagem.
A Sra. LC... também não pernoita no seu lar por não conseguir suportar o ruído e as vibrações; tendo sido medicada para conseguir dormir, mesmo assim foi incapaz de o fazer, então, para evitar o tratamento psiquiátrico que lhe foi prescrito, abandonou a sua casa durante a noite, voltando a ela todos os dias pela manhã. A Sra. LC... começou por pernoitar em casa do seu filho CA…, a partir de junho de 2009, em (…), concelho de (...) e, posteriormente, passou a pernoitar em casa de uma prima, RS…, na freguesia de (...), concelho de (...); Agora pernoita no lugar do (…), também em (...), em casa da sua cunhada Sra. MA…, onde permanece até hoje.
De igual modo o filho de ambos, SM..., se viu obrigado a abandonar o lar familiar por causa da impossibilidade de descansar à noite. E que, em razão da falta de atuação da Câmara Municipal de (...), sofreram danos morais que contabilizam em € 150.000,00, dos quais peticionam ressarcimento.”.
- Concluíram os Autores peticionando ao Tribunal “a quo”:
“a) Ser a Ré condenada ao pagamento aos AA uma indemnização nunca inferior a 150.000,00 euros, a título de danos morais acrescida de juros legais até efetivo e integral pagamento;
b) Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efetuadas sem licença de construção respetiva pela firma JF---, Lda; - sublinhado e negrito nossos.
c) Ser a Ré condenada a adotar a conduta necessária à cessação das actividades industriais não licenciadas da sociedade comercial sob a firma JF---, Lda.”
- Em face da decisão judicial obtida no âmbito da ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Guimarães, a que coube o processo n.º 3499/11.6TJVNF, em que era Autor SM... e demandada a sociedade JF---, Lda. e à qual foi apensa a ação que correu termos no mesmo Tribunal e a que coube o n.º de processo 264/11.4 TJVNF, em que foram Autores LS... e LC... e demandada a mesma sociedade JF---, Lda., foi proferida decisão que transitou em julgado em 14/03/2019, da qual resultou que:
….
- Da análise da decisão obtida no processo n.º 3499/11.6TJVNF, e da transação também ela obtida e que foi homologada por decisão judicial nos autos de embargos de executado, que correram termos no Tribunal Judicial de Braga sob o processo n.º 2543/19.3T8GMR-A, dúvidas não poderiam subsistir aos Autores quanto à existência de inutilidade superveniente da lide dos pedidos que haviam formulado nas alíneas a) e c) dos presentes autos, porquanto a mencionada decisão e transação salvaguardava de forma suficiente aquelas que eram as pretensões jurídicas dos Autores e também na medida em que os mesmos haviam já sido ressarcidos pelos danos patrimoniais produzidos pela sociedade JF---, Lda., danos esses que eram os mesmos invocados nos presentes autos, pelo que quanto ao pedido formulado na alínea a) entenderam e reconheceram os Autores existir uma inutilidade superveniente da lide, porquanto não poderia o Réu Município de (...) ser obrigado a ressarcir os Autores pelos danos não patrimoniais causados pela sociedade JF---, Ld.ª,.
- No que toca ao pedido formulado na alínea c) mais uma vez entenderam e reconheceram os Autores existir uma inutilidade superveniente da lide, porquanto as decisões judicias e transações obtidas nos processo supra mencionados resolveriam a sua situação de forma definitiva, porquanto havia sido decidido que a sociedade JF---, Lda. poderia laborar no local com exceção do período compreendido entre as 22:00h e as 06:00h e ainda no dia de descanso semanal, o Domingo.
- Encontrando-se também assim decidido o pedido formulado nos presentes autos na alínea c) porquanto seria manifestamente contraditório exigir-se ao Município de (...) ser obrigado a adotar a conduta necessária à cessação das actividades industriais não licenciadas da sociedade JF---, Lda quando existiam duas decisões judicias que permitem que a mesma possa laborar dentro de determinado horário.
No que diz respeito ao pedido formulado pelos Autores na alínea b), isto é: “Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e
interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efetuadas sem licença de construção respetiva pela firma JF---, Lda;” entendem os Autores que essa sua pretensão não foi apreciada/discutida pelos Tribunais Cíveis motivo pelo qual entendem não existir inutilidade superveniente da lide no que a esse pedido diz respeito.
- Não poderia ser outro o entendimento dos Autores, porquanto nas ações cíveis demandaram a sociedade JF---, Lda. e na ação administrativa demandaram o Município de (...) por permitir/consentir a construção/ampliação de um edifício com 1300m2 apesar de sucessiva e reiteradamente interpelado para agir de forma a não permitir que tal construção se pudesse edificar ou mesmo permanecer no local.
- O Tribunal “a quo” ao decidir pela inutilidade superveniente da lide do pedido formulado na alínea b) e sustentou a sua decisão no facto de “previamente ao momento em que os Autores intentaram a presente ação, já a atividade de tecelagem havia sido autorizada, quer em termos de localização, quer em termos de funcionamento, pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte a pela Direção Regional de Economia do Norte – cfr. pontos 1 e ss. do probatório.
E contra tais autorizações, prévias ao licenciamento da construção que competiria à Entidade demandada, não reagiram os Autores.
Por outro lado, a sociedade JF---, Lda, apresentou novo projeto com vista ao licenciamento das construções que levou a efeito e à legalização de outras, o que mereceu aprovação pela entidade demandada, como resulta dos pontos 10, 14, 15, 17 e 18 do probatório.,.
- Mal andou a esse respeito o Tribunal “a quo” porquanto a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte a pela Direção Regional de Economia do Norte somente havia autorizado, quer em termos de localização, quer em termos de funcionamento a atividade de fabrico de malha, nomeadamente a confeção de vestuário exterior em série, ao invés da tecelagem de tecidos que é efetuada na sociedade.
- Mal andou a esse respeito o Tribunal “a quo” porquanto a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte a pela Direção Regional de Economia do Norte somente havia autorizado, quer em termos de localização, quer em termos de funcionamento a atividade de fabrico de malha, nomeadamente a confeção de vestuário exterior em série, ao invés da tecelagem de tecidos que é efetuada na sociedade.
- Se analisarmos com a especial acuidade que nos é exigível constatamos que essa autorização emitida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte a pela Direção Regional de Economia do Norte foi aprovada/emitida por Despacho datado de 25/10/1999, ou seja, mais de 5 anos antes das obras de ampliação levadas a cabo pela JF---, Lda..
- Mesmo a conceber-se que pudesse existir atividade de tecelagem, o que não é o caso, somente poderia ser exercida nas edificações existentes à data da emissão da mencionada autorização, ou seja, 25/10/1999.
- O argumento/fundamentação da autorização prévia emitida pela CCDRN não poderia colher na medida em que existindo essa autorização a mesma apenas consentia/permitia a localização e funcionamento dessa atividade industrial nos imóveis que à data distavam a mais de 150 metros da habitação dos Autores.
- O Tribunal “a quo” sustentou a sua decisão no facto de que “a sociedade JF---, Lda, apresentou novo projeto com vista ao licenciamento das construções que levou a efeito e à legalização de outras, o que mereceu aprovação pela entidade demandada, como resulta dos pontos 10, 14, 15, 17 e 18 do probatório. Sendo que, nos termos de tais pontos do probatório, a Entidade demandada aprovou os projetos de arquitetura e deu lugar ao licenciamento, quanto ao projeto apresentado em 2008. E também contra tais atos os Autores não se insurgiram. – sublinhado e negrito nossos.
- Tal raciocínio padece de vício porquanto os Autores sempre deram conta ao Município de (...) através de sucessivas interpelações que tal licenciamento não era passível de ser concedido nos moldes em que era formulado, na medida em que a construção e a localização do estabelecimento, leia-se ampliações, se enquadravam em área classificada como espaço aglomerado do tipo 3, destinado a habitação e pequeno comércio de apoio.
- Licenciamento, esse, que também nunca veio acontecer.
- Do facto 20. dado como provado resulta que a 17/11/2020, a sociedade JF---, Lda, apresentou novo pedido junto do Município de (...) para legalização de ampliação do edifício destinado a armazém/indústria, alteração de destino de habitação para armazém e legalização de anexo, cujo projeto de arquitetura foi aprovado, de forma condicionada, por Despacho do Presidente da Câmara do Município de (...).
- O novo pedido formulado junto do Município de (...) para legalização de ampliação do edifício destinado a armazém/indústria formulado pela sociedade JF--- na pendência da presente ação mais não demonstra que a tentativa de a todo custo tentar por termo ao processo mediante a tentativa de legalização de obras ilegais, resolvendo por um lado o problema da sociedade mas também a tentativa do município se furtar às suas responsabilidades tentando a todo o custo licenciar uma construção que bem sabe não ser passível de licenciamento.
- Não se pode aceitar a fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” quando refere que embora de forma condicionado tenha sido aprovado o projeto de arquitetura tal implique, necessariamente, o licenciamento/regularização das edificações existentes.
- Refere ainda o Tribunal “a quo” que pese embora o projeto de arquitetura tenha sido deferido de forma condicionada, isto é, à realização de projeto acústico entende-se que “independentemente do que venha a resultar de tal projeto acústico, os Autores acordaram na possibilidade de tal atividade ser exercida dentro de horário judicialmente fixado. Pelo exposto, também no que ao pedido formulado na alínea b) da petição inicial, a presente ação mostra-se inútil em face da aprovação do projeto de arquitetura que visa licenciar/ legalizar as obras levadas a efeito pela sociedade JF---, Lda,” – sublinhado e negrito nossos.
- Apesar de os Autores terem efetivamente acordado na possibilidade da atividade levada a cabo pela sociedade JF--- Lda. pudesse ser exercida dentro de horário judicialmente fixado, nunca se poderá conceber que com esse ato ou decisão judicial implique que os Autores não queiram ver apreciada a problemática das edificações efetuadas sem licença de construção e respetiva licença de utilização.
- Não deveria resultar outra apreciação sobre o pedido formulado na alínea b) que não fosse a de o Tribunal “a quo” condenar o Réu a adotar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efetuadas sem licença de construção respetiva pela firma João &
Feliciano, Lda;
- Ficando assim demonstrada a existência de uma errada apreciação da prova que, diga-se, era abundante e suficiente para que o Tribunal “a quo” tivesse decidido conforme havia sido peticionado pelos Autores na alínea b) da sua petição inicial".
*
E finalizam "Termos em que requer a V.ªs Ex.ªs a admissão do presente Recurso, a sua apreciação, e seja revogada a douta Sentença recorrida, como é de justiça".
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Notificadas as alegações, apresentadas pelos recorrentes, supra referidas, nada disse a entidade recorrida, Município de (...).
*
O Digno Magistrado do M.º P.º, notificado nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
*
Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento
*
2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
1 - A - A decisão recorrida fixou a seguinte factualidade:

1 . Com data de 28/10/1999, a Comissão de Coordenação da Região do Norte, emitiu certidão de localização para unidade industrial da classe C, sita no Lugar de (...), freguesia de (...), concelho de (...), destinada à confeção de localização para unidade industrial da classe C, destinada à confeção de vestuário exterior em série em espaço urbano de aglomerado tipo 3, segundo o respetivo PDM – cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial.
2 . Com data de 06 de junho de 2001, a Direção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território – Norte emitiu a favor da sociedade JF---, Lda, alvará de licença n.º 222/2001, pra rejeição de águas residuais domésticas provenientes das suas instalações sitas no lugar de (...), freguesia de (...), concelho de (...) - cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021.
3 . Em 2005/09/27, a Direção Regional de Economia do Norte, emitiu autorização de localização do estabelecimento industrial com a atividade de tecelagem e fio, na Rua do (...), n.º 256, (...)s, freguesia de (...), concelho de (...), requerida pela sociedade JF---, Lda – cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021.
4 . Com data de 20/11/2006, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, aprovou a localização de estabelecimento industrial tipo 3, solicitado pela sociedade JF---, Lda, e destinado à tecelagem e fio, sito na Rua do (...), freguesia de (...), concelho de (...)- cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021.
5 . Em 18/07/2006, a Direção Regional da Economia do Norte, deu lugar a vistoria, da qual resultou autorização de exploração da atividade de tecelagem de fio requerida pela sociedade JF---, Lda e cuja autorização de localização foi emitida nos termos dos pontos que antecedem – cfr. Docs. juntos pela entidade demandada, em 30/03/2021.
6 . Com data de 15 de abril de 2008, 05/05/2008, 30/06/2008, 14/07/2008 e 18/11/2008, o Autor nos presentes autos, apresentou reclamações junto da entidade demandada, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- cfr. Docs. n.ºs 5 a 10 juntos com a petição inicial
7 . Em 22/01/2009, 04/07/2009 e 14/07/2009, os Autores deram lugar a participações junto da Guarda Nacional Republicana, com vista á verificação de ruído proveniente do funcionamento de máquinas de tecelagem da unidade fabril da sociedade JF---, Lda, das quais resultaram os respetivos relatórios, que concluem pela existência de ruído de fundo e vibrações na habitação dos Autores, que estes atribuíram àquela unidade fabril – cfr. docs. n.ºs 11, 12, 14 e 15 juntos com a petição inicial.

1. Por Despacho de 20/1172006, o Presidente da Câmara Municipal de (...) delegou no Vereador da mesma Câmara Municipal DF..., as seguintes competências:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. Doc. junto com a contestação do Réu Município.

8 . Entre a Câmara Municipal de (...) e S... – Companhia de Seguros, SA, que passou a ter a designação de M... – Companhia de Seguros, SA e ultimamente de C... – Companhia de Seguros, SA", foi celebrado acordo que denominaram contrato de seguro, consubstanciado na apólice de responsabilidade civil geral, com a apólice n.º 80.100662, que integra os seguintes riscos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. Doc. junto com a contestação do Réu Município.

9 . Com data de 05/05/2008, os serviços do Município demandado, emitiram a seguinte informação, que mereceu concordância do Vereador da Entidade demandada DF..., por Despacho de 07/05/2008:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. doc. n.º 1, junto com a petição inicial.

10 . Nos dias 4, 15, 16, 22 e 23 de junho e 1, 9, 13 e 14 de julho de 2009, a Direção Regional de Economia do Norte, deu lugar a medições de ruído, tendo como local de medição a sala de jantar da habitação do Autor e das quais resultou o seguinte relatório:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. Doc. n.º 4, junto com a petição inicial e fls. 530 e ss. do PA denominado 1.7.

11 . No âmbito da ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Guimarães, a que coube o processo n.º 3499/11.6TJVNF, em que é Autor SM... e demandada a sociedade JF---, Lda e à qual foi apensa a ação que correu termos no mesmo Tribunal e a que coube o n.º de processo 264/11.4 TJVNF, em que são Autores LS... e LC... e demandada a mesma sociedade JF---, Lda, foi proferida decisão que transitou em julgado em 14/03/2019: da qual resulta provada a seguinte matéria de facto, e a seguinte decisão:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cfr. Docs. juntos em 27/06/2019.

13 . A sentença antes identificada foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Guimarães pelo seu Acórdão de 08/02/2018 – cfr. Docs. juntos em 27/06/2019.

14 . Em 10/04/2008, a sociedade JF---, SA, apresentou projeto de arquitetura atualizado com vista à legalização e ampliação de Edifício na Rua do (...), 256, (...), (...), destinado a indústria de tecelagem – cfr. fls. 191 e ss. do PA denominado 1.6.

15 . Em 30/04/2008, os serviços do Réu emitiram parecer favorável quanto à aprovação do projeto de arquitetura antes identificado, com condições – cfr. fls. 242 do PA denominado 1.6.

16 . Em 5/05/2008, o Réu Município procedeu ao levantamento de autos de notícia de contraordenação contra a sociedade JF---, SA, por ter esta procedido “à construção de um edifício destinado a indústria com uma área aproximada de 1300 m2, sem estar munido da respetiva licença e por estar a ocupar um edifício com uma atividade industrial, de tecelagem de fio – cfr. fls. 249 e 250 do AP denominado 1.6.

17 . Por Despacho de 28 de maio de 2008, o Presidente da Câmara Municipal de (...), pelo qual certificou que “o prédio constituído por edifício de habitação de rés-do-chão e andar, com a área de 390,50 m2 e edifício industrial têxtil de rés-do-chão com a área de 722 m2, sito na Rua do (...), n.º 256, freguesia de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 00588 e inscrito na matriz sob o artigo 1954, anteriormente inscrito sob o artigo 437, propriedade de JF---, Lda é de construção anterior à obrigatoriedade das licenças de construção e/ou utilização, não carecendo de licenças, uma vez que as mesmas licenças só se tornaram obrigatórias a partir de 4 de novembro de 1968, para essa área do Município” – cfr. fls. 331 do PA denominado de 1.7.

18 . Em 17/11/2020, a sociedade JF---, Lda, apresentou nos serviços do Réu, novo pedido e legalização das construções existentes no seu prédio (sito na Rua do (...), n.º 256, freguesia de (...)), pedido a que coube o processo de licenciamento n.º LEG 124/2020. Ora, após análise dos elementos apresentados pela requerente, o Presidente da Câmara Municipal deferiu, por despacho de 12.05.2021, o projeto de arquitetura – cfr. Docs. juntos em 30/06/2021.

19 . No âmbito da ação de embargos de executado, que correu termos no Tribunal Judicial de Braga sob o processo n.º 2543/19.3T8GMR-A, entre a Embargante JF---, Lda, no âmbito de Audiência Prévia que teve lugar em 13/01/2021, os Embargados, LS... e Laura da Conceição Simões Salazar Pereira, Autores nos presentes autos, e em que figurou como terceiro a sociedade R---, SA, foi celebrada transação nos seguintes termos, que foi homologada por decisão judicial do mesmo dia 13/01/2021:
ACTA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA
Processo: 2543/19.3T8GMR-A.
Data: 13-01-2021, às 15:00 horas.
Juiz de Direito: Dra. A….
Escrivão Auxiliar: E….
Embargante: JF---, Lda.
Mandatário: Dr. S….
Embargados: LS… e LC….
Terceiro: R---, S.A.
Mandatário: Dr. S....
Mandatário: Dr. T….
Presentes: Os Ilustres mandatários das partes, bem como os embargados.
*
Declarada aberta a audiência pela Mma. Juiz, pelos ilustres mandatários das partes foi dito terem alcançado um acordo extrajudicial que passarão a transmitir, o qual requerem que fique exarado em acta.
*
Pelo ilustre mandatário da embargante foi pedida a palavra e no seu uso, protestou juntar aos autos, em cinco dias, procuração com poderes especiais para este acto, conferida pela empresa R---, S.A. (terceiro).
*
JF---, S.A., LS... e LC..., respetivamente embargante e embargados nos autos supra referenciados e R---, S.A., sociedade anónima com o NIPC (…), vêm dizer que pretendem, pelo presente, pôr termo ao presente litígio, dispondo sobre as questões que constituem o seu objeto, nos termos da presente transação judicial (doravante, a “Transação”), nos seguintes termos:
1. Por sentença, transitada em julgado, aqui dada à execução, a embargante foi condenada a cessar a sua atividade, exercida no prédio urbano, sito na Rua do (...), número 256, da freguesia de (...), Concelho de (...), destinado a armazém e atividade industrial, prédio esse melhor identificado na sentença dada à execução, no período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o domingo.
2. As Partes acordam que, à data da entrada do respetivo processo executivo, o local em apreço na referida sentença estava e está a ser utilizado pela sociedade R---, S.A.
3. Face ao exposto, acordam as Partes que a sociedade R---, S.A. também não poderá exercer atividade no local arrendado à embargante, melhor identificado no número 1., no aludido período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas.
4. Mais acordam as Partes que, sem prejuízo do decidido em tal sentença, os embargados, expressamente e sem reservas, autorizam, por contrapartida à celebração do presente acordo, que a sociedade R---, S.A., a embargante ou qualquer outra sociedade, poderão exercer atividade industrial em tal prédio urbano, excecionalmente, no período compreendido entre as 06:00h e as 13:00h do Domingo até ao último dia do mês de agosto de 2021.
5. Após a data referida no número anterior, i.e., o último dia do mês de agosto de 2021, as Partes acordam que voltará a vigorar o decidido na sentença a que se alude supra, ou seja, ficando as Partes impossibilitadas de exercer, no local em apreço, atividade industrial durante o mencionado Domingo.
6. Face ao acordo ora celebrado, a embargante obriga-se, ainda, a clausular em futuros contratos de arrendamento ou quaisquer outros onde seja cedido o direito de gozo do edifício em apreço nos presentes autos, a impossibilidade de nele ser exercida atividade industrial, exclusivamente no período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o domingo.
7. Mais se obriga a embargante, na eventualidade de o referido prédio vir a ser transmitido, a fazer constar no respectivo documento de transmissão a impossibilidade dos adquirentes nele exercerem actividade idêntica à exercida pela embargante, isto é, tecelagem de tecido, nos horários e dias constantes da sentença dada à execução, ou seja, deverão cessar actividade no período noturno que se situa entre as 22,00 horas e as 06,00 e bem assim no dia de descanso semanal, o domingo.
8. A obrigação da embargante referida no número anterior, circunscreve-se apenas e só à exigência de inserir tal clausulado no título de transmissão, não lhe podendo ser assacada qualquer responsabilidade na eventualidade do adquirente não vir a cumprir.
9. A não inclusão de tal clausulado, referido no número 7, implica a obrigação de a embargante ter de pagar aos embargados a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a título de cláusula penal.
10. A embargante acorda em pagar aos embargados a quantia de 2000 euros (dois mil euros) a título de compensação pelos incómodos que, contingentemente, possam ter sido causados a estes últimos, valor esse que será pago no prazo de 48 horas após a homologação da presente Transação, mediante transferência bancária para a conta com o IBAN, a indicar pelos embargados nos autos em 2 dias, titulada em nome dos embargados, prescindido do pagamento de quaisquer demais quantias peticionadas nestes autos de execução.
11. Com a celebração do presente acordo e com o pagamento da quantia a que se alude no número anterior, os embargados declaram, ainda, incondicional e irrevogavelmente que nada têm a exigir da sociedade JF---, S.A. e R---, S.A. seja a que título for, unicamente quanto à matéria dos presentes autos, ou seja, quanto à matéria do título dado à execução, declarando, ainda, cautelarmente e se aplicável, que renunciam ao direito de queixa contra tais sociedades ou seus legais representantes no que respeita aos factos em questão nos presentes autos.
12. Acordam, por último, as partes que no caso de se verificar um incumprimento da obrigação de a embargante cessar a sua atividade no referido período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o Domingo, com as limitações constantes da acordada alteração de horário até ao último dia do mês de agosto de 2021, esta obriga-se a pagar aos embargantes, a título de cláusula penal, a quanta de 5000 euros (cinco mil euros) por cada dia em que se verifique tal incumprimento. A sociedade R---, S.A. assume, solidariamente com a embargante, a mesma obrigação de pagamento perante os embargados, apenas e só enquanto se mantiver a exercer atividade no local em apreço, cessando todas e quaisquer obrigações desta perante os embargados quando e caso venha a deixar de exercer atividade no local arrendado à sociedade JF---, S.A..
13. A embargante, adicionalmente, obriga-se a colaborar com os embargados com vista a que a garantia bancária prestada no âmbito do processo declarativo, de que aqueles são beneficiários, lhes seja liquidada pela instituição bancária obrigada.
14. A presente Transação será eficaz entre as Partes a partir da sua homologação judicial.
15. As custas serão suportadas pela embargante, prescindido as Partes, mutuamente, de custas de parte.”
- cfr. Doc. junto em 30/06/2021.

20 . Em 17/11/2020, a sociedade JF---, Lda, apresentou novo pedido de legalização de ampliação de edifício destinado a armazém/indústria, alteração de destino de habitação para armazém e legalização de anexo, cujo projeto de arquitetura foi aprovado por Despacho do Presidente da Câmara do Município de (...), com condições, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cfr. doc. junto em 30/06/2021.
***
1 - B - Na sequência do requerimento da contra interessada “JF---, L. da”, de 17/11/2020 – pedido de legalização das obras de ampliação realizadas – e de despacho de 11/5/2021 do Sr. Presidente da CM de (...) – que deferiu o projecto de arquitectura, embora condicionado --- como se extrai dos pontos 18 e 20 dos factos provados supra --- solicitada à entidade demandada a actualização – a existir – do procedimento de licenciamento, apuraram-se, assim, os seguintes factos que se alinham, em aditamento:
21 . Solicitada a apresentação, no âmbito dos projectos de especialidade, da avaliação do ruído – nos termos do Despacho do Sr. Presidente da CM de (...), de 11/11/2021 – a contra interessada “JF---, L. da”, em 14/1/2022, apresentou Relatório de Ensaio – medição dos níveis de pressão sonora - realizado pela empresa “ALFADVICE – Laboratórios de Ensaios Acústicos Empresa acreditada pelo IPAC, onde se conclui que “… Os resultados obtidos … demonstram a conformidade dos itens ensaiados com os critérios gerais de amostragem para ensaios e medições acústicas, definidas pelo LNEC e legislação aplicável, designadamente o Regulamento Geral do Ruído - Decreto-Lei n.º 9/2007 de acordo com os critérios de amostragem da APA de Julho de 2020
22 . Por despacho do Sr. Presidente ca CM de (...), de 2/2/2022, foi deferido o processo de legalização e emissão do alvará de legalização, nas condições da informação da Gestora de Procedimento, de 31/1/2022, assumidas no Parecer da Chefe de Divisão de Gestão Urbanística, Arq.ª CC....

2 . MATÉRIA de DIREITO

No caso dos autos, verificamos que os recorrentes, inconformados com a sentença do TAF de Braga, vêem apenas suscitar, nesta sede recursiva, a inutilidade superveniente da lide, por, essencialmente, entenderem que o pedido efectivado sob a alínea b), em sede de p.i., não se mostrar prejudicado pela decisão/transacção verificada no Proc. n.º 246/11.4TJVNF.
Vejamos!
Os pedidos efectivados, no final, da pi da presente acção são os seguintes:
a) Ser a Ré condenada ao pagamento aos AA uma indemnização nunca inferior a 150.000,00 euros, a título de danos morais acrescida de juros legais até efectivo e integral pagamento;
- b) Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efectuadas sem licença de construção respectiva pela firma JF---, L. da; e,
- c) Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária à cessação das actividades industriais não licenciadas da sociedade comercial sob a firma "JF---, L. da" - sublinhado e negrito nossos.
*
Na transacção efectivada no Proc. n.º 246/11.4TJVNF, em sede executória da decisão judicial, de 45/4/2017, confirmada pelo TR de Guimarães de 8/2/2018, foi homologado o seguinte acordo:
1. Por sentença, transitada em julgado, aqui dada à execução, a embargante foi condenada a cessar a sua atividade, exercida no prédio urbano, sito na Rua do (...), número 256, da freguesia de (...), Concelho de (...), destinado a armazém e atividade industrial, prédio esse melhor identificado na sentença dada à execução, no período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o domingo.
2. As Partes acordam que, à data da entrada do respetivo processo executivo, o local em apreço na referida sentença estava e está a ser utilizado pela sociedade R---, S.A.
3. Face ao exposto, acordam as Partes que a sociedade R---, S.A. também não poderá exercer atividade no local arrendado à embargante, melhor identificado no número 1., no aludido período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas.
4. Mais acordam as Partes que, sem prejuízo do decidido em tal sentença, os embargados, expressamente e sem reservas, autorizam, por contrapartida à celebração do presente acordo, que a sociedade R---, S.A., a embargante ou qualquer outra sociedade, poderão exercer atividade industrial em tal prédio urbano, excecionalmente, no período compreendido entre as 06:00h e as 13:00h do Domingo até ao último dia do mês de agosto de 2021.
5. Após a data referida no número anterior, i.e., o último dia do mês de agosto de 2021, as Partes acordam que voltará a vigorar o decidido na sentença a que se alude supra, ou seja, ficando as Partes impossibilitadas de exercer, no local em apreço, atividade industrial durante o mencionado Domingo.
6. Face ao acordo ora celebrado, a embargante obriga-se, ainda, a clausular em futuros contratos de arrendamento ou quaisquer outros onde seja cedido o direito de gozo do edifício em apreço nos presentes autos, a impossibilidade de nele ser exercida atividade industrial, exclusivamente no período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o domingo.
7. Mais se obriga a embargante, na eventualidade de o referido prédio vir a ser transmitido, a fazer constar no respectivo documento de transmissão a impossibilidade dos adquirentes nele exercerem actividade idêntica à exercida pela embargante, isto é, tecelagem de tecido, nos horários e dias constantes da sentença dada à execução, ou seja, deverão cessar actividade no período noturno que se situa entre as 22,00 horas e as 06,00 e bem assim no dia de descanso semanal, o domingo.
8. A obrigação da embargante referida no número anterior, circunscreve-se apenas e só à exigência de inserir tal clausulado no título de transmissão, não lhe podendo ser assacada qualquer responsabilidade na eventualidade do adquirente não vir a cumprir.
9. A não inclusão de tal clausulado, referido no número 7, implica a obrigação de a embargante ter de pagar aos embargados a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), a título de cláusula penal.
10. A embargante acorda em pagar aos embargados a quantia de 2000 euros (dois mil euros) a título de compensação pelos incómodos que, contingentemente, possam ter sido causados a estes últimos, valor esse que será pago no prazo de 48 horas após a homologação da presente Transação, mediante transferência bancária para a conta com o IBAN, a indicar pelos embargados nos autos em 2 dias, titulada em nome dos embargados, prescindido do pagamento de quaisquer demais quantias peticionadas nestes autos de execução.
11. Com a celebração do presente acordo e com o pagamento da quantia a que se alude no número anterior, os embargados declaram, ainda, incondicional e irrevogavelmente que nada têm a exigir da sociedade JF---, S.A. e R---, S.A. seja a que título for, unicamente quanto à matéria dos presentes autos, ou seja, quanto à matéria do título dado à execução, declarando, ainda, cautelarmente e se aplicável, que renunciam ao direito de queixa contra tais sociedades ou seus legais representantes no que respeita aos factos em questão nos presentes autos.
12. Acordam, por último, as partes que no caso de se verificar um incumprimento da obrigação de a embargante cessar a sua atividade no referido período noturno que se situa entre as 22:00horas e as 06:00horas e, bem assim, no dia de descanso semanal, o Domingo, com as limitações constantes da acordada alteração de horário até ao último dia do mês de agosto de 2021, esta obriga-se a pagar aos embargantes, a título de cláusula penal, a quanta de 5000euros (cinco mil euros) por cada dia em que se verifique tal incumprimento. A sociedade R---, S.A. assume, solidariamente com a embargante, a mesma obrigação de pagamento perante os embargados, apenas e só enquanto se mantiver a exercer atividade no local em apreço, cessando todas e quaisquer obrigações desta perante os embargados quando e caso venha a deixar de exercer atividade no local arrendado à sociedade JF---, S.A.. "
13. A embargante, adicionalmente, obriga-se a colaborar com os embargados com vista a que a garantia bancária prestada no âmbito do processo declarativo, de que aqueles são beneficiários, lhes seja liquidada pela instituição bancária obrigada.
14. A presente Transação será eficaz entre as Partes a partir da sua homologação judicial.
15. As custas serão suportadas pela embargante, prescindido as Partes, mutuamente, de custas de parte" - sublinhados nossos.
*
A sentença recorrida estribou a sua decisão na seguinte argumentação:
"Do probatório resulta que os Autores intentaram contra a sociedade JF---, Lda, ação da qual resultou a condenação desta sociedade em fazer cessar a sua atividade de tecelagem durante o período noturno que se situa entre as 22 horas e as 06 h, bem assim, no dia de descanso semanal e domingo. Mais foi condenada a mesma sociedade a indemnizar os Autores em € 10.000,00, pelos transtornos de que padeceram por efeito do ruído resultante da atividade de tecelagem que a mesma sociedade levada a efeito em prédio próximo da habitação dos Autores – cfr. ponto 12 do probatório.
E na execução de tal decisão os Autores e a sociedade JF---, Lda, lograram chegar a entendimento, nos termos que resultam do ponto 19 do probatório.
Dado conhecimento aos presentes autos do acordo antes mencionado, foram os Autores notificados para se pronunciarem quantos aos efeitos de tal acordo nos presentes autos, tendo os Autores, por requerimentos de 30/06/2021, vieram dizer que no que toca aos pedidos formulados sob as alíneas a) e c), entendem que efetivamente tais pedidos/pretensões foram definitivamente solucionadas na ação cível e ainda com a transação efetuada nos autos de embargos e reconhecem a existência de inutilidade da presente ação no que respeita a tais pedidos.
E notificada a Entidade demandada e interveniente quanto à inutilidade superveniente nos pedidos formulados na alínea a) e c) da petição inicial, não se opuseram.
Como é sabido e resulta claramente do disposto no artigo 277.º, al. e), do CPC, a inutilidade superveniente da lide é uma causa de extinção da instância. Explicam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre que - a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide se dá quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida‖ - Cfr. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 1.º - Artigos 1.º a 361.º, 2018 (4.ª edição), p. 561.
É esta, indiscutivelmente, a situação da ação no que se refere aos pedidos formulados pelos Autores nas alíneas a) e c) da sua petição inicial, devendo a ação, nesta parte, extinguir-se, por visível inutilidade (insusceptibilidade de alcançar efeito útil) – neste sentido o Acórdão do Colendo Supremo Tribunal de Justiça de 11/11/2020, Processo n.º 873/19.3T8VCT-A.G1.S1, que com a devida vénia resulta transcrito.
Todavia, alegam os Autores que quanto ao pedido que formulam na alínea b) da petição inicial, o de - Ser a Ré condenada a adoptar a conduta necessária ao restabelecimento de direitos e interesses violados, nomeadamente à ordenação da demolição das obras efetuadas sem licença de construção pela firma JF---, Lda.”, não ocorre inutilidade superveniente.
Contudo sem razão.
Desde logo porque tendo alcançado acordo com a sociedade JF---, Lda, pelo qual consentiram o funcionamento da indústria de tecelagem em horário determinado por sentença judicial, tal posição é contrária a tal acordo, porquanto dele se pode infirmar que os Autores reconhecem a possibilidade de a atividade poder funcionar nesses moldes.
Por outro lado, e previamente ao momento em que os Autores intentaram a presente ação, já a atividade de tecelagem havia sido autorizada, quer em termos de localização, quer em termos de funcionamento, pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte a pela Direção Regional de Economia do Norte – cfr. pontos 1 e ss. do probatório.
E contra tais autorizações, prévias ao licenciamento da construção que competiria à Entidade demandada, não reagiram os Autores.
Por outro lado, a sociedade JF---, Lda, apresentou novo projeto com vista ao licenciamento das construções que levou a efeito e à legalização de outras, o que mereceu aprovação pela entidade demandada, como resulta dos pontos 10, 14, 15, 17 e 18 do probatório.
Sendo que, nos termos de tais pontos do probatório, a Entidade demandada aprovou os projetos de arquitetura e deu lugar ao licenciamento, quanto ao projeto apresentado em 2008.
E também contra tais atos os Autores não se insurgiram.
Sendo que, relativamente ao mais recente ato – cfr. ponto 20 do probatório, que aprovou o projeto de arquitetura apresentado pela sociedade JF---, Lda, apesar de deles terem conhecimento, nada disseram os Autores, antes pretendendo manter o pedido formulado na alínea b), na sua petição inicial, dizendo, “…que a Contrainteressada pretende legalizar/licenciar as construções existentes destinando-as a armazém/indústria.
Porém, da análise do documento onde consta o Parecer proferido pela Chefe de Divisão de Gestão Urbanística a Sr.ª Arq.ª CC..., resulta que “considerando as reclamações associadas ao exercício da atividade deverá ser apresentado o projeto acústico”.
Facto pelo qual o aludido Projeto de Arquitetura mereceu Despacho favorável do Sr. Presidente da Câmara Municipal condicionado às “condições do parecer”;
Vale isto por dizer que o mencionado projeto de arquitetura para ser definitivamente aprovado carecerá, obrigatoriamente, da realização de projeto acústico;
Projeto acústico, esse, que a ser realizado segundo normais critérios apenas elucidará, mais uma vez, o Município de (...) da existência de fortes ruídos e vibrações;
(…)
E nos moldes em que a Contrainteressada quer proceder ao licenciamento do edifício para “armazém/indústria” difícil se torna perceber como poderá proceder o Município de (...) à respetiva legalização na medida em que os direitos dos Autores e Contrainteressada colidem de forma gritante;
Facto pelo qual entendem os Autores não ser passível a legalização das referidas construções porquanto as mesmas se encontram localizadas em área classificada como espaço aglomerado do tipo 3, destinado a habitação e pequeno comércio de apoio;
Mais uma vez, repete-se, os Autores assumem uma posição contraditória quanto ao que alegam nos presentes autos e o que resulta do acordo alcançado em sede de ação que intentaram contra a sociedade JF---, Lda, porquanto, se nesta ação acordaram na possibilidade de a atividade ser levada a efeito pela sociedade em causa dentro de determinado horário, já nos presentes autos alegam que o não podem fazer porque essa atividade emitia ruído suscetível de perturbar o seu descanso e que, por essa via, não poderá ser legalizada a construção para industria, mas apenas para armazém.
É manifesto o contrasenso da posição dos Autores, mesmo litigância desconforme com os princípios da objectividade e boa fé que se impõem.
Por outro lado, apesar de terem conhecimento da aprovação do respetivo projeto de arquitetura, não reagiram contra tal decisão.
Consagra o artigo 20.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 118/2019, de 17/09, o seguinte:
“..."
Quanto à caracterização jurídica do ato de aprovação do projeto de arquitetura e consentânea evolução jurisprudencial, Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves e Dulce Lopes, in Regime Jurídico da urbanização e Edificação Comentado, 4ª edição, 2016, Almeida, págs. 307 e ss., referem:
"A propósito das obras de edificação, as questões que mais se colocam relacionam-se com a qualificação jurídica da aprovação do projeto de arquitetura. Esta questão assume relevo a vários níveis e com diferentes escalas de relevância.
Desde logo, em termos de indemnizabilidade, quando a entrada em vigor superveniente de um plano ou a prática de um ato administrativo posterior determinem a caducidade, anulação ou declaração de nulidade ou revogação do mesmo. Neste caso, tem sido genericamente aceite que a aprovação do projeto de arquitetura, ao configurar-se como um ato prévio do procedimento de licenciamento de obras de edificação, que define de forma estável determinados elementos que o ato final do procedimento deve acolher, dará lugar, precisamente por se tratar de um ato com efeitos constitutivos (mas não com eficácia permissiva), ao pagamento da indemnização devida por afetação de uma posição jurídica carecida de proteção do seu titular (cfr., neste sentido, designadamente, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de maio de 2001, processo 046 227).
Outra situação, porém, cuja dilucidação é essencial para uma correta caracterização deste ato em termos substantivos, coloca-se nas hipóteses em que a câmara municipal tenha já aprovado o projeto de arquitetura e, entretanto, antes do ato final de licenciamento, as referidas regras urbanísticas se tenham alterado.
Não há dúvida que, se o plano determinar a caducidade da aprovação do projeto de arquitetura, o particular terá, do mesmo modo que no pedido de informação prévia, direito a uma indemnização.
Contudo, a determinação da caducidade por efeito da entrada em vigor de um novo ou modificado instrumento de planeamento não configura, em face do princípio da aplicação das leis no tempo, a situação regra, o que não nos dispensa de questionar se, nas hipóteses em causa, o ato final do procedimento deve respeitar estas normas ou se deve inscrever a definição da situação feita no âmbito do projeto de arquitetura que com elas não se conforma.
Tal como se afirmou antes a propósito da informação prévia favorável, também no caso da aprovação do projeto de arquitetura estamos perante um ato prévio imune a alterações jurídicas posteriores, muito embora estejamos aqui numa situação diferente da informação prévia favorável, já que se trata de um ato que, ao contrário daquela, incide de forma definitiva sobre uma parte da pretensão global do interessado, isto é, procede à apreciação de todos os aspetos relativos à arquitetura (a estrutura da obra, a respetiva implantação, a sua inserção na envolvente, a respetiva cércea, alinhamento, o respeito das condicionantes dos planos em vigor, etc.). Uma vez apreciados, ficam estes aspetos definitivamente decididos, ficando apenas por responder as questões relativas às respetivas especialidades. Estamos neste caso perante um único procedimento dividido em duas partes, em que o legislador entendeu que o momento adequado para a apreciação da conformidade com o plano é o da apreciação do projeto de arquitetura (que, para além do mais, não se prevê ser repetida na hipótese de mudança das regras jurídicas aplicáveis).
Não teria, por isso, lógica, até por uma questão de economia procedimental, que, estando definitivamente decidida a questão da conformidade da pretensão com o plano, a mesma tivesse de voltar a ser apreciada no momento da emissão da licença de construção, ainda para mais quando, confirmadamente, não haverá lugar a um momento posterior de análise da pretensão urbanística deduzida, por os projetos de especialidades não serem alvo de apreciação municipal. Assim, tendo em consideração que a conformidade do projeto com os instrumentos de planeamento territorial deve ser verificada na fase da apreciação do projeto de arquitetura, qualquer alteração posterior daqueles instrumentos é irrelevante, exceto quando o plano disponha ele próprio noutro sentido.
Com efeito, tendo em consideração o princípio já anteriormente referido do tempus regit actum (que determina que a validade de um ato administrativo depende das normas legais e regulamentares aplicáveis em vigor à data da sua prática) e a natureza de verdadeiro ato administrativo da aprovação do projeto de arquitetura, teremos de concluir que ele será validamente emitido se não contrariar as normas vigentes no momento em que for praticado, sendo indiferente qualquer alteração normativa que se venha a verificar posteriormente, tanto mais que o momento em que se deve verificar a referida conformidade é precisamente o da apreciação do projeto de arquitetura.
Ora, se no momento em que for aprovado o projeto de arquitetura forem cumpridas todas as normas que nessa data estão em vigor, tal significa que aquela aprovação é válida, razão pela qual, tratando-se de um ato constitutivo de direitos (pelo menos do direito a que as questões por ele apreciadas não voltem a ser colocadas no decurso do procedimento), não poderá ser posto em causa pelo plano diretor municipal que entrou em vigor supervenientemente, sob pena de violação, aqui sim, do disposto no artigo 166.o do CPA. Sobre esta questão, vide Fernanda Paula Oliveira, “Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20.6.2002, Proc. 143/02, (1.a Secção)”, cit.
(…)
Hoje, porém, em vez de um desvio de jurisprudência pode mesmo falar-se de uma inflexão de posição dos nossos Tribunais Administrativos, que afirmam, sem peias, o efeito constitutivo e definitivo da aprovação dos projetos de arquitetura, como o comprovam, entre outros, os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Sul de 25 de março de 2010 (processo 01460/06), de 24 de junho de 2010 (processo 03250/07), e de 28 de outubro de 2009 (processos 04399/08 e 04110/08, este último comentado por Fernanda Paula Oliveira, «“Água mole em pedra dura…” de novo o ato de aprovação do projeto de arquitetura», cit.) e o Acórdão do STA de 14 de julho de 2010 (processo 0321/10).
E seguindo esta Doutrina, aliás, sustentada na Jurisprudência dos nossos tribunais superiores, a decisão de aprovação do projeto de arquitetura significa, então, que a situação jurídica das construções levadas a efeito pela sociedade JF---, Lda, do ponto de vista do ordenamento do território e da sua conformidade com os instrumentos de gestão territorial, por efeito da aprovação do projeto de arquitetura, embora que de forma condicionada se encontra regularizada.
E a alegada falta de projeto acústico não poderá, ainda, assumir qualquer relevo, porquanto, tal como resulta do artigo 20.º do RJUE antes transcrito, a sociedade em causa dispõe de prazo para o apresentar, juntamente com os demais projetos de especialidades e aí sim, poderá a entidade demandada, verificar se o mesmo cumpre as imposições legais e se é apresentado de modo a acautelar que a construção reúna os requisitos para nela ser exercida a atividade de tecelagem.
Note-se, mais uma vez, que independentemente do que venha a resultar de tal projeto acústico, os Autores acordaram na possibilidade de tal atividade ser exercida dentro de horário judicialmente fixado.
Pelo exposto, também no que ao pedido formulado na alínea b) da petição inicial, a presente ação mostra-se inútil em face da aprovação do projeto de arquitetura que visa licenciar/ legalizar as obras levadas a efeito pela sociedade JF---, Lda, sendo que contra tal ato nada pedem os Autores, nem aquela sociedade é parte nos presentes autos.
Assim, ao abrigo da al. e), do artigo 277.º, do Código de Processo Civil (C.P.C.), ex vi art. 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, deverá ser declarada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide”.
Vejamos, objectivado o litígio, a posição processual dos recorrentes e a decisão do TAF de Braga!
Efectuada uma análise completa e crítica de toda a tramitação deste processo, sem se olvidar o que foi decidido, com trânsito em julgado, também no Proc. 264/11.4TJVNF que correu termos nos tribunais judiciais (longamente abordado nos factos provados supra), verificamos que, efectivamente, as als. a) e c) do petitório deste autos, se mostram totalmente satisfeitas --- como – convenhamos – os recorrentes concordam ---, sendo que assim o dissídio entre a sentença recorrida e os AA./Recorrentes se limita, restringe, objectiva na (in) utilidade de conhecimento/decisão também da alínea b) do petitório que, no fundo, atenta a argumentação apresentada e a transacção efectuada em sede executiva no aludido Proc. 264/11, à solicitada “ordenação” da demolição das obras efectuadas sem licença de construção pela contra interessada “JF---, L. da”.
Naturalmente que a argumentação propendida na sentença do TAF de Braga se mostra congruente e lógica, atenta a posição assumida pelos recorrentes na transacção efectivada com a contra interessada e empresa que explora a mesma - sociedade “R---, S.A” -, concatenada com a decisão de aprovação do projecto de arquitectura com vista ao pedido de legalização das obras de ampliação - concordando-se, aliás, com o entendimento actual da jurisprudência referida na decisão da 1.ª instância, que, aliás, sempre viemos defendendo – mas apenas com um senão que seria uma especial condição desse deferimento, diversa das habituais “especialidades” subsequentes ao despacho de aprovação do projecto de arquitectura, ou seja, a apresentação de um estudo/avaliação acerca do ruído, atentos os contornos do processo de legalização e dos processos que envolviam os litigantes.
Porém, na tramitação subsequente do procedimento administrativo de licenciamento/legalização das obras, como acima se aditou – pontos 21 e 22 – foi realizado o ensaio condicionante do deferimento do projecto de arquitectura e que – convenhamos – como os demais realizados Excepto um dos ensaios, no que se refere a período nocturno – cfr. ponto dos factos provados., conclui pelo cumprimento dos limites legais do ruído e assim foi deferido o pedido de legalização das obras e emissão do pertinente alvará, apenas condicionado a cedências ao domínio público e pagamento, porque devido, de taxas no valor de 14.554,05€.
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Com este desenvolvimento e finalização do processo de legalização fica sem substrato acrescido a pretensão dos recorrentes no que se refere também à demolição das ditas obras de ampliação realizadas sem licença, o que significa que, além dos montantes indemnizatórios arbitrados/recebidos (10.000,00X2)+(2000,00X2) pelos AA./Recorrentes, o funcionamento, laboração, da unidade industrial ficou restrita a um horário acordatamente fixado, ou seja, poderá haver laboração de 2.ª feira a sábado, das 06 00 às 22 horas, assim se tendo harmonizado os interesses em litígio, consensualizados entre as partes e sujeitos, aliás, a cláusulas penais específicas prevenindo, no possível, o seu estrito cumprimento.
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Deste modo, ainda que com fundamentação acrescida, com base no desenvolvimento do processo de legalização, importa, sem necessidade de ulteriores considerações, negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.


III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a decisão recorrida.
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Custas pelos recorrentes.
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Notifique-se.
DN.

Porto, 8 de Abril de 2022

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho