Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00847/23.0BESNT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/12/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA PARA INVESTIMENTO; SEF;
INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS;
AUSÊNCIA DE SUBSIDIARIEDADE; PROCESSO CAUTELAR;
Sumário:
1 - Em face do que resulta dos autos, incluindo do Processo Administrativo, a Autora submeteu em plataforma on-line do SEF uma candidatura a autorização de residência para investimento [vulgo, “ARI“] ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1, alínea d) e do artigo 90.º-A, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, que aprovou o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.

2 – Atento o disposto no artigo 109.°, n.° 1, do CPTA, daqui resulta que a utilização dessa forma de processo por parte de quem se sinta lesado nos seus direitos e interesses, está dependente (i) de uma necessidade de emissão urgente de uma decisão de mérito sobre o pedido formulado, e que essa decisão se revele indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia, e (ii) que não seja possível ou suficiente o pedido de decretamento de uma providência cautelar com o preliminar ou incidente de uma acção administrativa normal, ou seja a sua subsidiariedade.

3 – Não tendo a Autora concretizado em que medida é que a sua situação é determinante da forma de processo por si utilizada, em torno da sua indispensabilidade, por não ter identificado um concreto direito, liberdade e garantia que seja posto em causa por via da ausência de resposta ou agendamento por parte do SEF no âmbito do procedimento administrativo de autorização de residência para o exercício de actividade de investimento, e depois ainda, não tendo substanciado por que termos e pressupostos é que o pedido de tutela cautelar seria insuficiente para acautelar a sua situação, estamos perante uma manifesta ausência de subsidiariedade da utilização da forma de processo a que se reporta o artigo 109.º do CPTA.

4 - Não tendo a Autora ora Recorrente invocado, ainda que em termos mínimos, por onde sai beliscado o seu direito na obtenção de tutela jurisdicional efectiva em torno da sindicância da actuação do SEF face à não convocação por este, ou ao seu excessivo atraso para esse efeito, e de outra forma, de que essa sindicância apenas pode ser efectivamente efectuada por via do meio de processual a que se reporta o artigo 109.º do CPTA, julgamos ser manifesto que não estão verificados os necessários pressupostos processuais para que possa ser utilizada esta forma de processo, e ao invés, como disposto a final do n.º 1 deste normativo, que não seja possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Intimação Protecção Direitos, Liberdades e Garantias (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


«AA», nacional da República do Vietname [devidamente identificada nos autos] Autora no processo de Intimação que intentou contra o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [MAI], na qual formulou pedido no sentido de “a) Ser a entidade requerida intimada a, no prazo de 10 dias, agendar data para a entrega dos documentos e recolha dos dados biométricos da Autora e seu familiares; b) Ser a entidade requerida instada a fazer o agendamento para data que permita o pedido e processamento do visto schengen atempadamente na Embaixada de Portugal em Banguecoque; c) ser o Senhor Director Geral do SEF condenado ao pagamento de € 10 ,00 (dez euros), a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso em relação ao prazo fixado para o cumprimento da sentença.”, inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada improcedente a Intimação, e absolvido o Réu do peticionado, veio interpor recurso de Apelação.

*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:


“[…]
CONCLUSÕES:
1. O presente recurso jurisdicional é interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que considerou, em suma, o meio processual utilizado de Intimação para protecção Direitos, Liberdades e garantias um meio impróprio e inexistência de DLG violado por a Recorrente não residir em Portugal, e absolveu a Requerida da instância;
2. A Douta Sentença recorrida, embora tenha considerado a impropriedade do meio processual utilizado, não fez um correcto enquadramento jurídico dos factos alegados, tendo, na realidade, descurado a causa de pedir nos autos - erro de julgamento-, e até a matéria dada como provada no ponto 5. o que, com o devido respeito, levou à incorrecta decisão e que urge corrigir.
3. O Tribunal a quo fixou factos provados que levaram a uma decisão contrária, e não se pronunciou sobre a questão central que era a de saber se o SEF deve ou não respeitar os prazos previsto no art 53º do CPA ex vi art 268º n.º 6 da CRP, violando assim o disposto no art 615º, n.º 1 al c) e d) do CPC.
4. Salvo melhor opinião que o Venerando Tribunal sempre suprirá, o Tribunal a quo fez uma interpretação errada do pedido e do direito aplicável aos factos invocados pela Recorrente;
5. O que está me causa é a condenação do Requerido SEF ( ora AIMA), no prazo de 10 dias, agendar data para a entrega dos documentos e recolha dos dados biométricos da Recorrente e seus familiares;
6. A sentença recorrida padece de erro de julgamento, de facto e de direito, ao considerar que a Intimação para protecção direitos, liberdade e garantias não é o meio idóneo a alcançar o fim de emissão de autorização de residência por a Recorrente não viver em Portugal, e que, portanto não existe nenhum direito violado, quando o que está em causa é o direito a apresentar o pedido de ARI ( direito de iniciativa do art 53º do CPA);
7. Com efeito, não está aqui em causa a emissão de uma autorização de residência;
8. Mas antes a violação por parte da Requerida do preceituado no art. 53º e 86º, n.º 1 do CPA, ex vi art 268ºn.º 4 da CRP, de a Recorrente apresentar pedido de concessão de ARI em resultado do investimento efectuado no país ao abrigo do art 90ºA da lei 23/2007, cfr doc, 1 junto com o RI;
9. A Sentença recorrida padece de erro de julgamento por não se ter pronunciado sobre a violação dos Direitos invocados e importantes ao correcto julgamento da lide no seu todo, e que são direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias do art 17º da CRP;
10. Da leitura atenta da fundamentação da PI e da Resposta formulado pela Recorrente já mencionado, seria inteligivel os direitos considerados violados e que carecem de tutela urgente, que passa pela adopção de uma conduta positiva do SEF: o agendamento de data para apresentar o pedido de ARI, decorrente do investimento efetuado em Portugal, e que confere à Recorrente o direito, nos termos do disposto no art 90ºA da Lei 23/2007, apresentar pedido de ARI;
11. O que está em causa é o reconhecimento que a Recorrente tem direito, como qualquer cidadão em apresentar pedido de concessão de ARI junto do SEF, decorrente do investimento efectuado nos termos do art 90ºA da lei 23/2007, e cujo direito decorre do art 53º do CPA, e que tem direito a receber uma resposta por parte da Requerida, no prazo de 10 dias, como decorre do art 268º, n.º 4 e art 86º do CPA;
12. A Sentença recorrida não teve em conta o facto de estar em causa a violação do principio de iniciativa ( art 53º do CPA) particular em iniciar o procedimento administrativo com vista à obtenção da ARI em Portugal, resultante do investimento feito no nosso pais ( art 90º-A da Lei Imigração);
13. E a constante violação, pela Requerida, do prazo de 10 dias, previsto no art 86º do CPA, ex vi art 268º, n.º 6 da CRP, para a prática dos actos administrativos;
14. Caso a Recorrente lança-se mão da acção administrativa comum para pedir a condenação da AIMA ( anterior SEF) a agendar data para a entrega do pedido de autorização de residência no prazo fixado no art 53º CPA, quando é que a Recorrente teria essa decisão?
15. Pois estando em causa a violação do art 53º do CPA, que estatui que: “ O procedimento administrativo inicia-se oficiosamente ou a solicitação dos interessados”, conjugado com o art 90ºA da Lei 23/2007, fácil é de concluir que se trata da violação de um direito que urge tutela em tempo útil para assegurar o exercicio desse direito que vem sendo negado há mais de 4 anos, desde que efectuou o registo no Portal ARI;
16. De facto, a vida da Recorrente e da sua familia está em suspenso, uma vez que a familia pretende fixar em Portugal o centro da sua vida social e familiar, fugindo duma ditadura que restringir os seus direitos básicos;
17. Pelo que, nos termos do art 90ºA da Lei 23/2007 precisa de ter a ARI para poder sair do Vietname e entrar em Portugal, sendo que nem o agendamento para entrega do pedido conseguiu ainda, embora tenham passado já 4 anos desde a data do registo online do pedido;
18. Dai o recurso à Intimação e não outro meio processual por estar em causa uma violação urgente e actual dos Direitos conjugados consagrados nos art 53º e 86º do CPA ex vi art 268º, n.º 4 e art 90º-A da Lei 23/2007;
19. A Intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é, assim, o meio adequado a efetivar o pedido de direito de residência e o direito ao reagrupamento familiar, através do agendamento de data para inicio do procedimento administrativo (de pedido de autorização de residência, sem a qual não é possivel à Recorrente solicitar ARI em Portugal), “...sobrepondo-se (aos demais meios)...quando a tutela do direito fundamental passe pela adopção ou abstenção de uma conduta ou pela realização de uma prestação por parte da Administração que não envolva a prática de um acto administrativo...” in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed, 2007 de Mário Almeida e Carlos Alberto Cadilha;
20. Ao decidir em contrário, a Douta sentença recorrida viola o art 109º do CPTA e os direitos consagrados nos art 53º e 86º do CPA e art 90º-A da Lei 23/2007;
21. Efectivamente, só o recurso à Intimação para protecção direitos, liberdades e garantias poderá salvaguardar em tempo útil os direitos ameaçados, pois caso contrário, a Recorrente ver-se-à privada de apresentar o pedido de residência ARI decorrente do direito previsto no art 90ºA da Lei 23/2007 conjugado com o art 53º do CPA, de apresentar ao SEF (actual AIMA), sem saber quando o poderá fazer;
22. O direito ao agendamento de data para inicio do procedimento administrativo ( com a entrega da documentação e recolha dos dados biométricos) não pode ser decretado a título precário e provisório; assim como o recurso à Acção Administrativa Comum (para a prática do acto administrativo) não é o meio processual adequado à situação sub judice, pois não existe ainda um procedimento administrativo em tramitação e não iria alcançar, Em tempo útil, a necessidade de agendar data para a entrega do pedido de ARI no prazo de 10 dias;
23. A lei processual administrativa não oferece outro meio processual que permita alcançar ,em tempo útil, o reconhecimento da violação de um DLG, compelindo a Requerida a praticar o acto de agendamento no prazo de 10 dias como estipula o art 86º do CPA;
24. Mais se diga em relação à violação do prazo estipulado no art 86º, n.º 1 do CPA, que confere o prazo geral de 10 dias para a Administração Pública praticar qualquer acto administrativo, também não pode ser decretado a titulo provisório, antes a Providência cautelar estaria a antecipar a decisão de mérito;
25. O prazo de 10 dias que a Administração Pública tem para a prática dos actos, e que não é um prazo meramente indicativo, antes vinculativo, só pode ser efectivado se for reconhecido o carácter urgente da sua violação, e a sua efectivação só é possivel com recurso à Intimação para Protecção direitos, liberdades e garantias;
26. Conforme decidido em Douta Sentença proferida nos autos de Intimação para protecção direitos, liberdades e garantias que correram termos na 1ª UO do TAF Porto, Proc 8/22.5BCPRT,“ ...se está previsto o direito a uma decisão é o dever da Administração se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (cfr art 13º do CPA), a situação escrita corresponde a uma denegação desse direito e ao defraudar desse dever por constituir um obstáculo de facto a que os interessados apresentem sequer os seus “assuntos” à Administração”;
27. O recurso ao uso da Intimação para protecção direitos, liberdades e garantias é o meio idóneo para condenar o SEF a adoptar uma conduta ( agendamento) que vem sendo negada aa Recorrente, não sendo viável o recurso a outro meio processual, sob pena de ainda daqui a 5 anos, o seu direito consagrado no art 86º e art 54º do CPA e o seu Direito a apresentar pedido de ARI ainda estar por exercer;
28. Enfermando em absoluto erro toda a sedimentação de fundamentação quando considera que a Recorrente, e a sua família, por não residirem em Portugal, não carecem de proteção da Constituição da República Portuguesa e, que portanto, não existe violação de qualquer DLG;
29. A Douta Sentença é nula por violação do art 13º da CRP ao considerar que o cidadão estrangeiro não pode apresentar pedido de ARI por não se encontrar a residir em Portugal;
30. Facto que tem lhe sido negado há 4 anos pelo SEF, uma vez que não agenda data para a entrega do pedido de ARI e iniciar, assim, o pedido de ARI;
31. A jurisdição Portuguesa já considerou o uso da Intimação como o meio adequado para a correcção deste comportamento por parte da Recorrida, reconhecendo que o SEF tem o dever de dar cumprimento ao agendamento para a entrega do pedido de ARI no prazo de 10 dias;
32. Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido de intimação do SEF a agendar data para a entrega do pedido de ARI e de reagrupamento familiar e recolha dos dados biométricos no prazo de 10 dias.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso e revogada a douta sentença recorrida e substituida por outra que admita a Intimação para protecção direitos, liberdades e garantias como meio processual idóneo e, em consequência, citada a Requerida para contestar.
COMO É DE DIREITO E DE JUSTIÇA!
[…].”

**

O Recorrido não apresentou Contra Alegações.

*

O Tribunal a quo proferiu despacho visando a não ocorrências das apontadas nulidades, assim como a admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

**

O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, em suma, no sentido de ser negado provimento ao recurso, e de ser confirmada a Sentença recorrida.


***

Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

***

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que venha a declarar a sua nulidade, sempre tem de decidir [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA] “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.”, reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões suscitada pela Recorrente e patenteadas nas conclusões apresentadas consistem, em suma e a final, em apreciar e decidir, sobre se a Sentença recorrida padece das nulidades que lhe são apontadas, assim como de erro de julgamento [de facto e de direito].

**

III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue:

“[…]
1. Em 18/12/2019 a Autora outorgou escritura pública, no Cartório Notarial ... do Notário ..., na qual declarou comprar, pelo preço de 250.000 € um sessenta e oito avos do prédio urbano composto por casa de ... e dois andares, sito na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ... quatrocentos e quarenta e nove, atualmente inscrito na matriz ...72, da ..., ..., ..., ..., ... e ... - cfr. documento n.º ... junto com a petição inicial e processo administrativo.
2. A Autora é residente em 235/107 ..., Vietname – cfr. documento n.º ... junto com a petição inicial e processo administrativo.
3. A Autora requereu, em 13/05/2020, a concessão de autorização de residência para atividade de investimento, ao abrigo do disposto no artigo 90º-A da Lei nº 23/2007, de 4 de julho, tendo a sua candidatura sido aceite – cfr. documento n.º ... junto à petição inicial e processo administrativo.
4. A Autora requereu em 18/05/2020 o reagrupamento familiar para o seu cônjuge, «BB», e para os seus filhos «CC», «DD» e «EE», tendo as respetivas candidaturas sido aceites – cfr. documentos juntos à petição inicial sob o n.º 4 e processo administrativo.
5. A Autora obteve agendamento pelo SEF para o dia 21 de maio de 2021 às 13:30 na Direção Regional Vale do Tejo e Alentejo, ao qual não compareceu, por não poder viajar face à pandemia de Covid19 – cfr. fls. 340 do SITAF.
Motivação: A convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e do processo administrativo, nos termos expressamente referidos no final de cada facto.
[…]”
**

IIIii - DE DIREITO
Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 23 de outubro de 2023, que tendo apreciado a pretensão deduzida pela Autora contra o Réu Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [MAI], no sentido de o mesmo ser intimado a agendar data para a entrega dos documentos e recolha dos seus dados biométricos e de seus familiares, por data que permita o pedido e processamento do visto Schengen atempadamente na Embaixada de Portugal em Banguecoque, e ainda, que o Director Geral do SEF seja condenado ao pagamento da quantia de €10,00, a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso em relação ao prazo fixado para o cumprimento da sentença, veio a julgar pela sua improcedência e a absolver o Réu do pedido.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Aqui chegados, cumpre fazer um ponto prévio.

Pese embora a Recorrente tenha sustentado que o Tribunal a quo errou no julgamento efectuado em sede da matéria de facto [Cfr. conclusão 6 das Alegações de recurso], a realidade é que a mesma [Recorrente] não cumpre, ainda que em termos mínimos, o ónus processual que para si é decorrente em face do disposto no artigo 640.º do CPC, pelo que, outro julgamento não podemos empreender que não seja o de que a Recorrente se conformou com a factualidade que o Tribunal a quo fez constar do probatório, e sobre a qual fez incidir o seu julgamento em matéria de direito.

Posto isto, cotejadas as demais conclusões das Alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, sustenta a mesma a ocorrência da violação do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d) do CPC [que não o tendo dito, se reconduz à nulidade da Sentença], a ocorrência da nulidade da Sentença por violação do artigo 13.º da CRP [por ter sido julgado que um cidadão estrangeiro não pode apresentar pedido de ARI por não se encontrar a residir em Portugal], e bem assim que não fez o Tribunal a quo um correcto enquadramento jurídico dos factos por si alegados e até da matéria de facto provada, o que levou a uma interpretação errada do pedido e do direito aplicável aos factos, e assim a uma decisão incorrecta.

Cumpre para já apreciar então da eventual ocorrência das invocadas nulidades da Sentença recorrida, como assim sustentado pela Recorrente, a que se reportam as alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

E por reporte às nulidades imputadas à Sentença recorrida, cumpre para aqui extrair o artigo 615.º do CPC, como segue:

Artigo 615.º
Causas de nulidade da sentença
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
[…]
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”

Enquanto Tribunal de recurso e tendo subjacente o disposto no artigo 627.º, n.º 1 do CPC, este TCA Norte conhece dos recursos jurisdicionais interpostos onde devem ser evidenciadas as irregularidades de que a Sentença pode enfermar [que se reportam a nulidades que afectam a Sentença do ponto de vista formal e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade], assim como os erros de julgamento de facto e/ou de direito, que por si são resultantes de desacerto tomado pelo Tribunal na formação da sua convicção em torno da realidade factual, ou da interpretação e aplicação do direito, em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa.

Aqui chegados.

A exigência de fundamentação das decisões judiciais tem consagração constitucional, mostrando-se expressamente prevista no artigo 205.º, n.º 1 da CRP, nos termos do qual “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”, sendo que é pela fundamentação da decisão que se permite o controlo da sua legalidade pelos seus destinatários e a sua sindicância pelos tribunais superiores, evitando-se desse modo qualquer livre arbítrio do julgador.

Em obediência a esta exigência constitucional, o legislador ordinário consagrou no artigo 154.º do CPC o “dever de fundamentar a decisão”, estipulando no seu n.º 1 que “As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”. E, por outro lado, cominou com a nulidade a Sentença quando ocorra excesso de pronúncia.

Isto posto, regressemos ao caso dos autos.

Analisada a Sentença recorrida constatamos que a Mm.ª Juiza do Tribunal a quo, depois de fixar a factualidade que entendeu por relevante, com referência aos elementos de prova que a suportam, enunciou as razões que conduziam à apreciação do mérito da causa, tendo estribado juridicamente a sua posição no sentido de que a pretensão da Autora não podia proceder, por falecerem os pressupostos de que depende o uso da Intimação para protecção de direitos, liberddes e garantias, previstas no artigo 109.º do CPTA, tendo julgado a intimação improcedente e absolvido o Réu do pedido contrra si formulado.
Como assim foi julgado por este TCA Norte, por seu Acórdão datado de 17 de janeiro de 2016, proferido no processo 02279/11.5BEPRT, “[…] Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º da mesma diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).[…]”

Conforme assim tem julgado o Supremo Tribunal Administrativo, e de forma reiterada, só se verifica omissão de pronúncia quando o Tribunal, pura e simplesmente, não chegue a tomar posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – neste sentido, Cfr. Acórdão datado de 19 de fevereiro de 2014, proferido no recurso 126/14, Acórdão datado de 09 de abril de 2008, proferido no recurso 756/07, e Acórdão datado de 23 de abril de 2008, proferido no recurso 964/06.

Com efeito, sempre que o Tribunal recorrido não leve em consideração um facto que deva ser julgado como provado, ou que tenha julgado provado ou levado em consideração algum facto que não devesse assim ser atendido, essa actuação/omissão não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, na precisa medida em que esses factos não consubstanciam, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 95.º, n.º 1 do CPTA.

Como assim ensina Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981, páginas 144 a 146 “[…] quando o juiz tome conhecimento de factos de que não pode servir-se, por não terem sido, por exemplo, articulados ou alegados pelas partes (art. 664.º), não comete necessariamente a nulidade da 2.ª parte do art. 668.º. Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão […]”.

Efectivamente, tais situações reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos Acórdãos dos Tribunais Superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC.

Com efeito, e ainda de acordo com o supra citada Autor “[…] uma coisa é o erro de julgamento, por a sentença se ter socorrido de elementos de que não podia socorrer-se, outra a nulidade de conhecer questão de que o tribunal não podia tomar conhecimento. Por a sentença tomar em consideração factos não articulados, contra o disposto no art. 664.º, não se segue, como já foi observado, que tenha conhecido de questão de facto de que lhe era vedado conhecer.” […]”

Efetivamente, para os efeitos de omissão de pronúncia, o conceito de “questão” não integra os casos em que o juiz deixe de apreciar algum ou alguns dos argumentos aduzidos pelas partes no âmbito das questões suscitadas.

Neste caso, o que pode ocorrer, quando muito, é o vício de fundamentação medíocre ou insuficiente, qualificado já como erro de julgamento, e portanto, equacionável em sede de mérito.

O que importa é que o Tribunal a quo decida a questão colocada, e não, que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão.

Não há assim qualquer excesso de pronúncia, nem ambiguidade ou contraditoriedade no que foi apreciado e decidido pelo Tribunal a quo neste domínio.

De maneira que, como assim julgamos, a Sentença recorrida não padece das assacadas nulidades, por ambiguidade ou ininteligibilidade da Sentença recorrida [fundada na violação do artigos 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC], nem por omissão/excesso de pronúncia [fundada na violação do artigos 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC], sendo que, em torno da invocada nulidade por violação do artigo 13.º da CRP [Cfr. conclusão 29 das Alegações de recurso], sendo patente a invocação por parte do Recorrente do julgamento do Tribunal a quo, estaremos é perante erro de julgamento em matéria de interpretação e aplicação do direito, sancionável com a revogação da Sentença e não com a nulidade.

Falece assim a invocação da ocorrência das nulidades imputadas à Sentença.

Prosseguindo.

No essencial, o que se extrai das conclusões das Alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, é que a sua pretensão está ancorada no entendimento que prossegue de que errou o Tribunal a quo em matéria de interpretação e aplicação do direito, ao ter apreciado e decidido que por não ter [a Autora ora Recorrente] alegado os pressupostos necessários para a utilização do concreto meio processual em apreço [a Intimação para a Proteção de Direitos, Liberdades e Garantias], que o recurso a essa forma de processo se revela um meio impróprio, pois que no seu entender o recurso à Intimação e não a outro meio processual, foi por si prosseguido por estar em causa uma violação urgente e actual dos direitos conjugados consagrados nos artigos 53.º e 86.º do CPA e artigo 90.º-A da Lei n.º /2007, de 04 de julho, e que se trata do meio idóneo a condenar o SEF a efectuar o pretendido agendamento, sendo inviável o recurso a uma qualquer outra forma de processo, e que a Sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido [agendamento de data para a entrega do pedido de ARI e de reagrupamento familiar, e recolha dos dados biométricos].

A pretensão da ora Recorrente neste instância de recurso, assim como no Tribunal de 1.ª instância tem subjacente, primordialmente, a justaposição de que a forma de processo por si utilizada é o meio processual idóneo a alcançar a tutela jurisdicional por si reclamada, e que por nenhum outro meio processual pode alcançar a tempestiva e necessária tutela.

Considerando que a Sentença recorrida é em tudo idêntica [de resto, por ser muito idêntica a causa de pedir e o pedido formulado a final da Petição inicial] àquela que foi proferida pela Mm.ª Juíza no passado dia 15 de setembro de 2023, no Processo n.º 651/23.5BESNT, do que foi interposto recurso jurisdicional para este TCA Norte por parte do aí Autor, no que veio a derivar a prolação do Acórdão datado de 30 de novembro de 2023 [de que foi relator, o ora relator nos presentes autos], e onde foi conhecida e apreciada, em torno das questões aí suscitadas, na sua essência, matéria de igual natureza e mérito àquelas que aqui ora vêm colocadas, aderimos à jurisprudência firmada por aquele Acórdão [sem reservas, embora com as adaptações que mostrem necessárias, designadamente em sede da matéria de facto], pelo que aqui damos por enunciada a respectiva fundamentação, tendo em vista alcançar uma interpretação e aplicação uniformes do direito [cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil], como segue:

Início da transcrição
“[…]
A Autora, ora Recorrente sustenta, a final e em suma, que deitou mão da concreta forma de processo a que se reporta o artigo 109.º do CPTA, por estar o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras a demorar na tramitação do seu pedido, em termos que considerou serem excessivos, face à delonga procedimental de já alguns anos, e que a utilização dos meios processuais tradicionais levaria a que a decisão que viesse a ser proferida seria manifestamente desnecessária e extemporânea, tendo a mesma centrado esse seu enfoque, na particularidade de estar em dúvida a continuidade do regime de autorização de residência por si escolhido, assim como o conexionado pedido de reagrupamento familiar.

Dispõe o artigo 109.°, n.° 1, do CPTA, que “A intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adoção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar.”.

Daqui resulta que a utilização desta forma de processo por parte de quem se sinta lesado nos seus direitos e interesses, está dependente (
i) de uma necessidade de emissão urgente de uma decisão de mérito sobre o pedido formulado, e que essa decisão se revele indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia, e (ii) que não seja possível ou suficiente o pedido de decretamento de uma providência cautelar com o preliminar ou incidente de uma acção administrativa normal, ou seja a sua subsidiariedade.
[…]
Conforme deflui da Sentença recorrida, e com reporte à causa de pedir e ao pedido deduzido a final da Petição inicial, o Tribunal a quo julgou que a Autora não alegou, de forma substanciada, porque é que a concessão de tutela jurisdicional efectiva de que alega carecer, apenas e só lhe pode ser conferida por via da forma de processo a que se reporta o artigo 109.º do CPTA, e já não por via de um juízo provisório típico a que se reporta a tutelar cautelar.

Em face do que resulta dos autos, incluindo do Processo Administrativo, a Autora submeteu em plataforma on-line do SEF uma candidatura a autorização de residência para investimento [vulgo, “ARI“] ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1, alínea d) e do artigo 90.º-A, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, que aprovou o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.

Dispõe o artigo 90.º-A, da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, como segue:

“Artigo 90.º-A
Autorização de residência para atividade de investimento
1 - É concedida autorização de residência, para efeitos de exercício de uma atividade de investimento, aos nacionais de Estados terceiros que, cumulativamente:
a) Preencham os requisitos gerais estabelecidos no artigo 77.º, com exceção da alínea a) do n.º 1;
b) Sejam portadores de vistos Schengen válidos;
c) Regularizem a estada em Portugal dentro do prazo de 90 dias a contar da data da primeira entrada em território nacional;
d) Preencham os requisitos estabelecidos na alínea d) do n.º 1 do artigo 3.º
2 - É renovada a autorização de residência por períodos de dois anos, nos termos da presente lei, desde que a Autora comprove manter qualquer um dos requisitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 3.º.
[…]”

De acordo com o disposto no artigo 65.º-D, n.º 16 do Decreto-Regulamentar n.º 84/2007, de 05 de novembro, que veio regulamentar a Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, bem como do Manual de Procedimentos previsto no artigo 65º-J daquele Decreto Regulamentar, a Autora formalizou necessário registo electrónico necessário para efeitos de lhe poder vir a ser apreciada e atribuída autorização de residência para investimento, e que para tanto já procedeu ao pagamento de diversas taxas que lhe foram liquidadas pelo SEF.

Ou seja, o SEF dispõe de um sistema específico de recepção dos pedidos relativos aos procedimentos previstos na Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, e no Decreto que a regulamentou, aplicável, no que ora interessa, aos pedidos de autorização de residência para investimento [ARI], o que tem como pressuposto que tem de ser efectuado um prévio agendamento junto dos serviços para essa finalidade, a ser efectuado através de uma plataforma on-line, a qual vai indicando aos interessados quais os postos de atendimento do SEF e as disponibilidades para esse efeito.

O que acontece, tão somente, é que o procedimento de concessão aa Autora da autorização de residência para atividade de investimento ao abrigo do disposto no artigo 90º-A da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho e também o pedido de reagrupamento familiar, está em suspensão, pois que a mesma não foi ainda notificada para efeitos de comparecer visando a recolha de dados biométricos.

Estando pressuposto que a concessão da autorização de residência para actividade de investimento, nos termos do disposto nos artigos 90.º-A da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, e artigos 65.º-A e 65.º-D do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 05 de novembro, demandam a apresentação de um conjunto de documentos assim como a prova de um conjunto de requisitos, que só ao SEF cumpre prosseguir, do que se oferece como resultado conclusivo é que o SEF deve efectuar esse agendamento.

Sem esse agendamento por parte do SEF, nunca a Autora verá apreciada a sua pretensão final que é a concessão de ARI.

Em conformidade com o disposto no artigo 2.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, a todo o direito corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação.

Esse desiderato também está vertido no artigo 2.º do CPTA, no sentido de que no direito à concessão de tutela jurisdicional está contido o direito de obter, em prazo razoável, e mediante um processo equitativo, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar e de obter as providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, destinadas a assegurar o efeito útil da decisão, sendo que, de todo o modo, a via de aceder a essa tutela não é indiscriminada pois que a todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos, e onde pode ser obtida, entre o mais, o reconhecimento de situações jurídicas subjectivas directamente decorrentes de normas jurídico-administrativas ou de actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo, o reconhecimento de qualidades ou do preenchimento de condições, o pedido de condenação à adopção de comportamentos pela Administração Pública, o pedido de condenação da Administração à adoção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados, a intimação da Administração a prestar informações, permitir a consulta de documentos ou passar certidões, e a adopção das providências cautelares adequadas para assegurar o efeito útil das decisões a proferir em processo declarativo.

Após a apresentação pela Autora da candidatura à atribuição de ARI, a mesma ficou incursa num procedimento administrativo junto do SEF, o qual lhe liquidou taxas e que ele as pagou, e nessa medida, mesmo não sendo cidadão de nacionalidade Portuguesa, tem direito a que a sua pretensão seja apreciada e decidida em conformidade com o regime jurídico aplicável à sua situação [in casu, o Decreto-Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, e o Decreto-Regulamentar n.º 84/2007, de 05 de novembro], para o que, no plano da actuação da Administração, e porque Portugal é um Estado de direito formal e material, e a Administração está subordinada na sua actuação à observância do bloco de legalidade pré-existente, assim garantindo a juridicidade na sua actuação, não podendo deixar de ser convocados os princípios gerais da actividade administrativa a que se reportam os artigos 3.º a 19.º do CPA.

Por outro lado, ainda, tendo o SEF perante si um procedimento administrativo, que pese embora tenha sido iniciado há alguns anos e num contexto de pandemia, veio a notificar a Autora para completar os dados e aqui não tendo a mesma comparecido, pelas razões que veio a aduzir, das duas uma, ou decide/tinha decidido pela deserção do procedimento [Cfr. artigo 132.º do CPA], ou tornava a notificar a Autora para esse efeito, em termos que, para quem vive no outro lado do planeta, possa organizar convenientemente a sua vida em termos de se poder deslocar a Portugal.

Ou seja, esse relacionamento com a Autora tem de pautar-se por padrões de razoabilidade, pois que, não pode o Estado Português disciplinar um concreto regime jurídico de concessão de ARI, cativando os investidores, acenando-lhes com uma promessa e criando neles uma expectativa, que para esse efeito fazem investimentos e os identificam como realizados junto do procedimento administrativo, que é aliás um dos requisitos para a apreciação do pedido tendo em vista a avaliação da decisão final a proferir, ficando depois a Administração votada ao silêncio.

Salientamos que em face do disposto no artigo 3.º do CPTA, os Tribunais administrativos julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação, assegurando os meios declarativos urgentes necessários à obtenção da tutela adequada em situações de constrangimento temporal, assim como os meios cautelares destinados à salvaguarda da utilidade das sentenças a proferir nos processos declarativos.

Já relativamente ao julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo em torno do disposto no artigo 15.º da CRP, quando refere que sendo a Autora estrangeiro, que não “… poderia ser titular de um qualquer direito, liberdade e garantia em território nacional tipificado na nossa CRP susceptível de servir de base à presente intimação...“, não acompanhamos o Julgamento prosseguido.

Desde logo, importa realçar que a situação em apreço nestes autos não é sequer similar à que foi tratada no Acórdão do STA datado de 10 de setembro de 2020, proferido no Processo n.º 01789/18.5BELSB, pois que a pretensão do interessado se centrava na obtenção da nacionalidade, em razão do nascimento, e aqui apenas está em causa o pedido de agendamento de recolha de dados biométricos para sequenciação do pedido de autorização de residência para investimento por cidadão estrangeiro.

Não é por não ser residente em Portugal e por ser estrangeiro que está vedado aa Autora o recurso ao meio processual a que se reporta o artigo 109.º do CPTA.

Ou seja, não é a sua condição de estrangeiro e por não residir em Portugal, que lhe pode ser obstado a deitar mão de uma forma de processo prevista na lei, quando é certo que a Autora tem para com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, uma relação jurídica de natureza administrativa, a que é aplicável o direito português, seja para efeitos da sua declaração, seja para efeitos da busca de tutela jurisdicional efectiva.

Note-se que, sendo a Autora um candidato a uma AR para investimento em Portugal, com candidatura aceite pelo SEF e tendo já pago as taxas que lhe foram exigidas, estamos perante um requerente que vê cerceada a sua liberdade de iniciativa económica, que é um direito fundamental de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias.

Mas não é porém por aqui, ou seja, que por se tratar a Autora de um estrangeiro não residente em território nacional, ou na perspectiva de que não se está/pode estar em face da violação de direitos liberdades e garantias que a pretensão da Autora, foi erradamente apreciada pelo Tribunal a quo, e que por essa via se pode concluir que a final ficou inquinada a decisão tomada.

Como assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, a Autora não concretizou em que medida é que a sua situação é determinante da forma de processo por si utilizada, em torno da sua indispensabilidade, por não ter identificado um concreto direito, liberdade e garantia que seja posto em causa por via da ausência de resposta ou agendamento por parte do SEF no âmbito do procedimento administrativo de autorização de residência para o exercício de actividade de investimento, e depois ainda, não substanciou por termos e pressupostos é que o pedido de tutela cautelar seria insuficiente para acautelar a sua situação.

Atento o disposto no artigo 109.º, n.º 1 do CPTA, no sentido de que esta forma de processo principal pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adoção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar, o que se extrai da Petição inicial, e assim também das conclusões das Alegações de recurso ora em apreço, é que para além de a Autora ora Recorrente considerar excessivo o tempo que o SEF já demorou e que ainda pode demorar a retomar o procedimento administrativo que foi por si [Autor] iniciado, não logrou todavia qualificar por que termos e pressupostos, dignos de atendimento por parte do Tribunal, é que a conduta positiva por si requerida se revela indispensável para assegurar um seu direito, por não ser suficiente em face das concretas circunstâncias, o decretamento de uma providência cautelar.

Ora, não tendo a Autora ora Recorrente invocado, ainda que em termos mínimos, por onde sai beliscado o seu direito na obtenção de tutela jurisdicional efectiva em torno da sindicância da actuação do SEF face à não convocação por este, ou ao seu excessivo atraso para esse efeito, e de outra forma, de que essa sindicância apenas pode ser efectivamente efectuada por via do meio de processual a que se reporta o artigo 109.º do CPTA, julgamos ser manifesto que não estão verificados os necessários pressupostos processuais para que possa ser utilizada esta forma de processo, e ao invés, como disposto a final do n.º 1 deste normativo, que não seja possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar.

Neste conspecto, por julgarmos com interesse para a decisão a proferir, para aqui extraímos o que no domínio da subsidiariedade do meio processual a que se reporta o artigo 109.º, n.º 1 do CPTA, refere Carla Amado Gomes, in Pretexto, contexto e texto da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, Março de 2003, páginas 15 a 21, disponível em https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/291-135.pdf., como segue: […]
“[...]
2.3.2.1. A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias tem por objecto a tutela dos direitos constantes do Título II da Parte I da CRP, bem como outros direitos fundamentais dispersos por outras secções da Lei Fundamental que revistam natureza análoga, nos termos do artigo 17º da CRP (supra, 2.2.). A tutela em causa visa prevenir, com especial celeridade, qualquer atentado, por parte dos poderes públicos, ao exercício útil destes direitos, por acção ou omissão. O objecto do pedido poderá ser um de três:
- a condenação da Administração - rectius, da entidade que prossiga a função administrativa - na emissão de um acto administrativo ou na cessação de efeitos deste;
- a condenação da Administração na adopção de uma conduta material, ou na abstenção de uma determinada conduta material; e
- a condenação da Administração na emissão de um regulamento de execução, ou na revogação substitutiva de um regulamento de execução ilegal, de modo a prevenir ou a fazer cessar a violação de um direito, liberdade ou garantia do(s) particular(es).
[...]
2.3.2.3. Sem embargo da relevância dos requisitos mencionados supra, pensamos que a chave da questão da admissibilidade da intimação é a sua subsidiariedade relativamente à modalidade de decretamento provisório de qualquer providência cautelar, prevista no artigo 131º do CPTA. Com efeito, este é um requisito fundamental, não só para a compreensão da figura da intimação no contexto dos meios jurisdicionais disponíveis, em Portugal, para fazer face, directa ou indirectamente, à violação de direitos, liberdades e garantias, como para determinar o seu real âmbito de aplicação.
Diga-se, em primeiro lugar, que a subsidiariedade a que se refere o nº 1 do artigo 109º está em estreita ligação com a indispensabilidade a que a mesma nº 1 também alude. Diríamos que a subsidiariedade se perfila, negativamente, como um requisito de admissibilidade e, positivamente, como uma condição de provimento. Adiante (2.3.3.) explicaremos melhor esta segunda ideia.
Na sua qualidade de requisito negativo de admissibilidade, deve dizer-se, em segundo lugar, que a subsidiariedade é muito mais ampla do que a norma estatui. A possibilidade de utilização da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não depende apenas da impossibilidade ou insuficiência do decretamento provisório de qualquer providência, antes tem também como pressuposto a inexistência de qualquer outro meio processual especial de defesa de direitos, liberdades e garantias determinados.
[…]
Em que consiste, então, esta subsidiariedade? Por outras palavras, quando é que a intimação prefere ao decretamento provisório da providência cautelar? O artigo 109º responde com duas condições alternativas: a intimação deve ser usada sempre que a provisoriedade do juízo cautelar não seja possível ou suficiente para assegurar a tutela plena do direito. Não se trata, por isso, de uma questão de maior rapidez na concessão da providência - note-se que o prazo a que alude o nº 3 do artigo 131º e aquele a que se refere o nº 1 do artigo 111º (intimação com urgência especialíssima, dir-se-ia) é a mesma: 48 horas -, mas antes da aplicação do princípio da interferência mínima em sede cautelar (em sentido amplo). Isto é, estando em causa cognições sumárias motivadas pela urgência, o juízo provisório, revisível no próprio processo cautelar em curso, prefere ao juízo definitivo proferido na intimação, só eventualmente revisível em via de recurso (se o houver).
Possibilidade ou suficiência, são estas as características que o decretamento deve revestir para demonstrar a sua prevalência em face da intimação. Cabe ao juiz da intimação avaliar da impossibilidade ou insuficiência hipotéticas do decretamento provisório, alegadas pela Autora, antes de admitir o pedido.
[...]
Em primeiro lugar, as impossibilidade e insuficiência de tutela efectiva do direito através do decretamento provisório da providência devem avaliar-se, na perspectiva do Juiz, do ponto de vista jurídico. Isto porque o que está em causa é a antecipação legítima do juízo principal, que é uma condição jurídica de exercício do poder jurisdicional (cautelar). O julgador tem, por isso, que se convencer de que, em face das condições concretas de exercício do direito alegadamente ameaçado, a opção pela tutela sumária é inevitável. Ou seja, e de acordo com o princípio da interferência mínima, sempre que o exercício válido do direito não estiver sujeito a qualquer prazo - leia:se: quando a Autora puder voltar a exercer o direito cuja efectividade está comprometida com um resultado equivalente (descontado o natural decurso do tempo) num momento ulterior -, a tutela cautelar prefere à sumária. Caso o exercício do direito esteja sujeito a prazo - leia:se: sempre que a Autora, ainda que possa voltar a exercer o direito ulteriormente, não obtenha a mesma resultado que no momento da apresentação do pedido -, então a tutela sumária prefere à tutela cautelar. Em última análise, o que decide a questão da opção entre ambas as modalidades é a avaliação da repetibilidade de exercício útil do direito, pondo em equação os princípios da interferência mínima e da igualdade na reconstituição da situação actual hipotética;
2. Em segundo lugar, as impossibilidade e insuficiência de tutela efectiva do direito através do decretamento provisório da providência avaliam-se, na perspectiva da Autora, do ponto de vista fáctico. O que se traduz em que, para a Autora, o importante é obter uma qualquer legitimação jurisdicional para exercer o seu direito, seja provisória ou definitiva, sendo certo que o seu interesse, na prática, fica acautelado quer através de uma decisão sumária, quer através de uma decisão provisória (decretamento provisório). Por outras palavras, o que releva, para quem requer - seja uma intimação, seja um decretamento provisório de qualquer providência cautelar - é o resultado fáctico, a possibilidade efectiva de exercício do direito em tempo útil, independentemente da legitimidade da cobertura jurisdicional deste exercício do ponto de vista do princípio da interferência mínima. […]
[...]“

Ora, em face do que já deixamos expendido supra, resulta do processado nos autos, e em particular da causa de pedir imanente à Petição inicial e ao pedido formulado a final, que a dilucidação da questão que a Autora veio colocar ao Tribunal é passível de tutela cautelar, por absolutamente compatível com pedido dessa natureza, porquanto, o decretamento de uma providência cautelar, ainda que a título provisório [Cfr. artigo 131.º do CPTA] afigura-se como o meio processual adequado para que a Autora possa assegurar em tempo útil a efectividade do seu direito, alcançando assim uma satisfação para as suas necessidades, que se fixam, muito simplesmente, na sua convocação assim como dos seus familiares para efeitos da realização dos dados biométricos em Portugal.

Neste patamar.

Julgamos assim que, sendo a Autora ora Recorrente interveniente com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras numa relação jurídica administrativa controvertida, que lhe assiste legitimidade para impugnar um acto administrativo [Cfr. artigo 55.º, n.º 1, alínea a) do CPTA] que lhe seja destinado, assim como para pedir a condenação à prática de acto administrativo, quando tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido [Cfr. artigo 67.º, n.º 1, alínea a) do CPTA], e nesse conspecto, de peticionar a concessão da tutela cautelar que ao caso for mais adequada.

Ou seja, julgamos que se mostra suficiente para efeitos de que a Autora possa assegurar o exercício, em tempo útil, dos direitos que refere, dando assim resposta às necessidades por si invocadas [v,g., autorização de residência para actividade de investimento em Portugal – Cfr. pontos 5, 6, 20, 21 e 22 da Petição inicial], o pedido de adopção de uma providência cautelar até que seja proferida decisão com trânsito em julgado na acção principal, que na eventualidade de dedução de recurso jurisdicional tem efeito meramente devolutivo, sendo que, em torno da forma de processo a que se reporta o artigo 109.º, n.º 1 do CPTA, e na situação dos autos, estamos perante uma manifesta ausência de subsidiariedade.

Embora com fundamentação não totalmente coincidente com a Sentença recorrida, julgou com acerto o Tribunal a quo quando decidiu que em face do alegado pela Autora, não se mostrava reunido qualquer dos requisitos processuais de que depende o uso da Intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias previstos no artigo 109.º, n.º 1 do CPTA, julgamento que confirmamos.
[…]”
Fim da transcrição

De maneira que, a pretensão recursiva da Recorrente tem assim de improceder na sua totalidade, por ter o Tribunal a quo julgado com acerto em torno da constatada impropriedade do uso do meio processual a que se reporta ao artigo 109.º do CPTA, não padecendo a Sentença recorrida dos erros de julgamento que lhe vêm por si apontados, tendo a solução jurídica a que chegou o Tribunal a quo que manter-se, embora com a fundamentação expendida supra.

*

E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Autorização de residência para investimento; SEF; Intimação para protecção de direitos liberdades e garantias; Ausência de subsidiariedade; Processo cautelar.

1 - Em face do que resulta dos autos, incluindo do Processo Administrativo, a Autora submeteu em plataforma on-line do SEF uma candidatura a autorização de residência para investimento [vulgo, “ARI“] ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1, alínea d) e do artigo 90.º-A, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, que aprovou o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional.
2 – Atento o disposto no artigo 109.°, n.° 1, do CPTA, daqui resulta que a utilização dessa forma de processo por parte de quem se sinta lesado nos seus direitos e interesses, está dependente (i) de uma necessidade de emissão urgente de uma decisão de mérito sobre o pedido formulado, e que essa decisão se revele indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia, e (ii) que não seja possível ou suficiente o pedido de decretamento de uma providência cautelar com o preliminar ou incidente de uma acção administrativa normal, ou seja a sua subsidiariedade.
3 – Não tendo a Autora concretizado em que medida é que a sua situação é determinante da forma de processo por si utilizada, em torno da sua indispensabilidade, por não ter identificado um concreto direito, liberdade e garantia que seja posto em causa por via da ausência de resposta ou agendamento por parte do SEF no âmbito do procedimento administrativo de autorização de residência para o exercício de actividade de investimento, e depois ainda, não tendo substanciado por que termos e pressupostos é que o pedido de tutela cautelar seria insuficiente para acautelar a sua situação, estamos perante uma manifesta ausência de subsidiariedade da utilização da forma de processo a que se reporta o artigo 109.º do CPTA.
4 - Não tendo a Autora ora Recorrente invocado, ainda que em termos mínimos, por onde sai beliscado o seu direito na obtenção de tutela jurisdicional efectiva em torno da sindicância da actuação do SEF face à não convocação por este, ou ao seu excessivo atraso para esse efeito, e de outra forma, de que essa sindicância apenas pode ser efectivamente efectuada por via do meio de processual a que se reporta o artigo 109.º do CPTA, julgamos ser manifesto que não estão verificados os necessários pressupostos processuais para que possa ser utilizada esta forma de processo, e ao invés, como disposto a final do n.º 1 deste normativo, que não seja possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar.

***

IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente «AA», confirmando a Sentença recorrida, embora com a fundamentação expendida supra.

*
Custas a cargo da Recorrente – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC e artigo 4.º n.ºs 2, alínea b), e 6, do Regulamento das Custas Processuais.

**

Notifique.

*

Porto, 12 de janeiro de 2024.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator

Luís Migueis Garcia - Voto a decisão, com seguinte declaração de voto: afigura-se-me que (e, conforme notou o próprio tribunal “a quo”, ultrapassado o liminar), a intimação deve ser decidida não em razão de uma “inadequação do meio processual utilizado” (como, imprecisamente, a nosso ver, não obstante ter referenciado a ultrapassagem de momento próprio, aquele tribunal acabou por referir), mas antes sob luz do que são seus pressupostos de decretamento, ou não, reconhecendo, ainda que no alimento dessa outra perspectiva, bondade ao discurso fundamentador presente na decisão recorrida, que acabou por “concluir pela improcedência da pretensão formulada pelo A.”, absolvendo “a entidade demandada de todo o peticionado”.

Celestina Caeiro Castanheira, em substituição