Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00504/16.3BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2018
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:VALOR DA CAUSA
INADMISSIBILIDADE DO RECURSO
ARTIGO 97.º-A, N.º 2 DO CPPT
ACÇÃO PARA RECONHECIMENTO DE UM DIREITO OU INTERESSE LEGÍTIMO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA
Sumário:I - A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
II - Nas situações não previstas no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT deve aplicar-se o n.º 2 do mesmo artigo, o qual determina que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais”.
III - O artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e o artigo 105.º da Lei Geral Tributária estabelecem a alçada dos tribunais tributários, correspondendo à alçada fixada para os tribunais judiciais de 1.ª instância.
IV - A alçada dos tribunais tributários de 1.ª instância é de €5.000,00 para os processos iniciados a partir de 1 de Janeiro de 2015, face à Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro, que conferiu nova redacção ao artigo 105.º da LGT, no qual se passou a estabelecer que "A alçada dos tribunais tributários corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância" e à norma contida no n.º 4 do artigo 280.º do CPPT, que passou a estabelecer que “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância”.
V - A Constituição da República Portuguesa prevê expressamente os tribunais de recurso, por isso, o legislador está impedido de eliminar pura e simplesmente a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática. Já não está, porém, impedido de regular, com larga margem de liberdade, a existência dos recursos e a recorribilidade das decisões.
VI - Não existe um ilimitado direito de recorrer de todas as decisões jurisdicionais, nem se pode, consequentemente, afirmar que a garantia da via judiciária, ou seja, o direito de acesso aos tribunais, envolva sempre, necessariamente, o direito a um duplo grau de jurisdição (com excepção do processo penal).
VII - A inadmissibilidade de recurso, em determinadas situações previstas legalmente, não afronta o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa nem o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, já que a Constituição não impõe a existência de um segundo grau de jurisdição.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Eólica..., Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

Eólica…, Ld.ª, pessoa colectiva n.º 5…, com sede no Eco Parque…, Estarreja, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 31/01/2017, que julgou improcedente a acção para reconhecimento de um direito em matéria tributária, interposta contra o Ministério das Finanças, no pressuposto que esta questão jurídica se repete no tempo, para reconhecimento que a propriedade dos equipamentos instalados em S. Pedro, Serra da Boneca, freguesia de Canelas, concelho de Penafiel, inscritos na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 9…, não integra o âmbito da incidência objectiva do Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis (CIMI).

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“I. O presente recurso é interposto, desde logo, da decisão de fixação do valor da ação, nos termos e do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal recorrido.
II. Na sentença recorrida a decisão sobre a fixação do valor da causa surge fundamentada por remissão para o n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT. Não obstante nada é referido na sentença recorrida quanto aos fundamentos de facto que presidiram a tal decisão, sendo certo que a própria aplicação da regra prevista na norma invocada pelo Tribunal a quo faz apelo à valoração dois critérios factuais – a complexidade da causa e a situação económica do recorrente.
III. Em conformidade entende a Recorrente existir nulidade da decisão de fixação do valor da causa por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, porquanto exista identificação do normativo fundamentador não é apresentado qualquer facto e/ou racional que permita a apreensão da aplicação do direito ao caso concreto (artigo 615º, nº 1, alínea b), do CPC).
IV. Sem prescindir, entendendo-se que a decisão se encontra fundamentada, de acordo com o disposto no n.º 2.º do artigo 108.º do CPPT (aplicável no presente caso ex vi n.º 4 do artigo 145.º do CPPT), cabe ao autor identificar o valor da causa e, sempre que a sua quantificação dependa de uma atuação administrativa, indicar a forma como pretende que a autoridade tributária proceda à sua determinação.
V. A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
VI. O direito que a Autora pretendeu ver reconhecido com a presente ação foi a ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… e que estão na origem da sua inscrição na matriz predial urbana de Canelas, Concelho de Penafiel, sob o artigo n.º U-9…, como prédio urbano do tipo “outros” nos termos conjugados do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, com todos os devidos e legais efeitos, designadamente a anulação da liquidação de IMI melhor identificada no intróito e, bem assim, de todas as que sejam emitidas na pendência da presente ação, pelo que as regras estabelecidas no nº 1 do artigo acima citado não poderão ser aplicadas ao caso em apreço.
VII. A qualificação de uma dada realidade como objeto de tributação em sede de IMI tem como consequência imediata a fixação do seu valor patrimonial (€ 254.406,00, no presente caso) e como consequência mediata, não apenas a sua tributação em sede deste imposto (no valor anual referente a 2014 de € 786,13), pelo tempo em que se mantiver a sua propriedade às taxas que a cada tempo vierem a ser definidas, mas também, e desde logo, a tributação da sua potencial alienação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) (cf. n.º 2 do artigo 1.º do Código do IMT) e/ou em sede de Imposto do Selo (cf. n.º 6 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo e verba 1.1 da respetiva tabela geral) que não ocorrendo na esfera da Autora, ora Recorrente, é um fator a ponderar que pode condicionar uma futura operação de alienação.
VIII. Nas situações não previstas no nº 1 do artigo 97º-A do CPPT deve aplicar-se o nº 2 do mesmo artigo, o qual determina que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1ª instância dos tribunais judiciais”.
IX. Por força do disposto no n.º 1 do artigo 306.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, a competência para a fixação do valor da causa é do juiz, sem prejuízo do dever de indicação do mesmo na petição inicial que sobre as partes impende. Atentas as finalidades de ordem pública relacionadas com a organização e funcionamento dos tribunais e a própria definição do direito de acesso à justiça, que a fixação do valor da causa visa prosseguir, tal determinação integra o núcleo de questões cujo conhecimento e apreciação reveste natureza oficiosa. Como critério norteador de tal decisão apresenta-se a regra segundo a qual, em matéria da determinação do valor da causa a trave-mestra do sistema assenta no conceito de utilidade económica do pedido, e traduzindo-se este num “benefício” que se pretende obter, o seu valor é a quantia a ele equivalente.
X. Quanto à recorribilidade das decisões, determina o n.º 4 do artigo 280.º do CPPT que “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância.”, sendo que o valor da alçada dos tribunais tributários de 1ª instância é (no que ao caso se aplica) igual ao valor o da alçada da 1ª instância dos tribunais judiciais, correspondente a € 5.000 (cf. artigo 105.º da Lei Geral Tributária e artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).
XI. A ora Recorrente, considera, salvo o devido respeito, que na determinação do valor da causa poderia o Tribunal ter seguido um de dois critérios: (i) ou fixava o valor da causa por referência ao valor patrimonial tributário do prédio cuja qualificação jurídica enquanto objeto de IMI é questionada, aplicando por analogia a regra prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, (ii) ou assumia o critério residual previsto no n.º 2 do artigo 34.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), fixando o valor da causa em € 30.001,00 (cf. n.º 4 do artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).
XII. Relativamente ao primeiro critério, apesar de o considerar admissível, a ora Recorrente entende que o mesmo não traduz a efetiva aplicação do princípio da utilidade económica do pedido na determinação do valor da causa. E isto porque no presente caso, fosse reconhecido à Recorrente o direito peticionado, a tradução económica de tal benefício quantificável à data da decisão limitar-se-ia à poupança do imposto já liquidado em razão da sujeição objetiva afastada. No entanto, e por outro lado, há uma vertente deste benefício que não pode ser negligenciada e que é à data inestimável como seja a avaliação da poupança do imposto que viria a ser liquidado (determinada pela duração da titularidade do direito de propriedade sobre os equipamentos em causa) e o impacto intangível que a consideração destes bens como objeto de incidência tributária de outros impostos (e.g., IMT e Imposto do Selo) poderá ter na sua alienação futura.
XIII. Por estas razões, a Autora, ora Recorrente, entende ser de afastar a aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, considerando-se neste caso ter a ação em causa um valor não previsto no n.º 1 daquela norma, e indeterminado à data da sua propositura.
XIV. Admitir que nas causas de valor indeterminado a fixação do valor da causa fica limitada ao máximo correspondente ao valor da alçada dos tribunais tributários, significa, pois, assumir desde logo que estas causas não admitem recurso ordinário, o que constitui um inexorável constrangimento do direito constitucional à proteção jurídica que tem acolhimento genérico no direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, na sua vertente de acesso aos tribunais, previsto no artigo 20.º da CRP.
XV. Mais a mais, os subcritérios definidos na norma em análise para definição do valor da causa – “a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante” – autorizam a conclusão de que a aplicação daquele referencial à determinação da recorribilidade da decisão de 1ª instância é desajustada porquanto, desde logo a aplicação de tais critérios é suscetível de justificar um valor da causa superior a € 5.000 e, por outro lado, a sua aplicação produz uma injustificável discriminação no direito de acesso à justiça, desde logo em razão da condição económica do impugnante/autor, violadora do princípio da igualdade previsto no n.º 2 do artigo 13.º da CRP. Nesta medida, a única interpretação consentânea com os princípios constitucionais estruturantes do Estado de Direito acima referidos é a de que a norma do n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT deve ser interpretada no sentido de que a limitação ao valor que pode ser atribuído à causa pelo Juiz não tem aplicação, desde logo, para efeitos de determinação da recorribilidade da decisão.
XVI. Neste contexto considera a Recorrente que, fora dos casos expressamente previstos no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, na fixação do valor das ações que devam seguir a sua tramitação no âmbito da jurisdição tributária cujo valor económico do pedido não seja determinável, deve seguir-se a regra prevista no n.º 2 do artigo 34.º CPTA, aplicável ex vi alínea c) do artigo 2.º do CPPT. Em conclusão, considera a Autora, ora Recorrente, que deveria ter o Tribunal a quo fixado o valor da presente ação em € 30.001,00.
XVII. Não o tendo feito, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por violação do disposto no n.º 2 do artigo 34.º CPTA, aplicável ex vi alínea c) do artigo 2.º do CPPT, devendo anular-se a decisão quanto à fixação do valor da causa e fixar-se este em € 30.001,00, o que se traduz na recorribilidade da referida sentença.
XVIII. A aplicação do n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT nos termos em que é feita pelo Tribunal a quo é também inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, na sua vertente de acesso aos tribunais e do princípio da igualdade previstos nos artigos 13 e 20.º da CRP, devendo anular-se. Inconstitucionalidade que desde já expressa, principal e autonomamente se invoca, designadamente nos termos e para os efeitos dos artigos 69.º e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional.
XIX. Atenta a defendida recorribilidade da sentença a quo, o presente recurso tem ainda como objeto os vícios da sentença que passam a elencar-se nos pontos seguintes.
XX. Entende a Recorrente, como melhor exporá, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto decorrente da insuficiência da matéria de facto, impondo-se a sua anulação, pois, tivesse o Tribunal recorrido devidamente valorado toda a prova produzida, teria alcançado conclusão diversa, a de que a falta de fundamentação invocada não pode ser imputada ao ato de notificação mas antes ao ato de inscrição matricial.
XXI. Com efeito, refere o Tribunal a quo na sentença recorrida “A falta de fundamentação da decisão de inscrição do prédio na matriz não se confunde com a eventual falta da notificação à autora que teria de ser suprida nos termos do art. 37.º do CPPT”. Ora, a falta de fundamentação da notificação tendo sido suscitada pelo procedimento previsto no artigo 37.º do CPPT e não tendo sido suprida, comunicou-se, para todos os efeitos, presentes incluídos, ao ato comunicado. Assim, por serem insuficientes à boa decisão da presente causa, não pode a Recorrente deixar de impugnar os pontos do probatório da sentença recorrida, na medida em que, em conjunto com os factos aí descritos deveriam ter sido dado como provados os seguintes: a. Com base em informação prestada pela Divisão de Inspeção Tributária II da Direção de Finanças de Aveiro, através do Ofício n.º 8406322, e no âmbito inspeção tributária promovida ao abrigo da ordem de serviço n.º OI201001503, o Serviço de Finanças de Penafiel levantou auto de notícia pela falta de apresentação da declaração modelo 1 do IMI (cf. Documento n.º 7, junto à p.i.).
b. De acordo com o referido auto de notícia, “A empresa Eólica…, Lda, (…) construiu um parque eólico denominado B…, na Serra da Boneca, freguesia de Canelas, deste concelho, constituído por uma torre E45 com aerogerador, em prédios rústicos de que são titulares a Junta de Freguesia de Canelas e Z… e a eles arrendados, que iniciou a produção em 5 de Fevereiro de 2007. Porém não apresentou a declaração modelo 1 do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), a que alude o artigo 13.º do Código desse Imposto acompanhada dos documentos legalmente exigidos, sendo a infração considerada cometida no dia 6 de abril de 2007” (ibidem).
c. Posteriormente, através do Ofício n.º 7254105, datado de 04.01.2011, com a indicação de Ficha n.º 003272423, foi a Autora notificada da avaliação patrimonial de prédio tipo “outros”, com a inscrição na matriz predial urbana sob o artigo P 9… da freguesia de Canelas, concelho de Penafiel (cf. Documento n.º 8, junto à p.i.).
d. Ao prédio urbano objeto de avaliação, cuja identificação se reduzia ao respetivo n.º matricial, os serviços atribuíram o valor patrimonial tributário de € 254.406,00, pelo que na falta de mais informação quanto ao prédio em causa, em 08.02.2011, a Autora requereu ao serviço de finanças de Penafiel, ao abrigo do artigo 37.º do CPPT, a notificação de todas as características e elementos do prédio avaliado, incluindo a respetiva localização (cf. Documento n.º 9, junto à p.i.).
e. Em resposta a esta solicitação, o Serviço de Finanças de Penafiel, através do Ofício n.º1145/1856-20 de 10.02.2011, veio esclarecer que “(…) a promoção oficiosa da avaliação, para inscrição matricial do Parque Eólico em causa, teve por base a informação prestada pela Divisão de Inspeção Tributária II (DTI II), da Direção de Finanças de Aveiro (…)” e que “Quaisquer outras informações relativas ao assunto, designadamente o motivo da ordem de promoção da avaliação, deverão ser solicitadas à entidade mencionada em 2 [DTI II] (…)”.(cf. Documento n.º 10, junto à p.i.).
f. Em conjunto com esta informação o serviço de finanças de Penafiel remeteu à Autora o print da avaliação efetuada. Deste documento resulta que foi considerado na avaliação oficiosa realizada a realidade composta por “uma torre E45 e um aerogerador Repower MM82” implantados num terreno com área total de 2.362.470,0000 m2, confrontando a norte, sul, nascente e poente com terrenos da propriedade da Junta de Freguesia de Canelas (ibidem).
g. De acordo com o mesmo documento, os serviços consideraram consubstanciar aquela realidade um «Prédio “outros” parques Eólicos, sendo considerado o valor por m2 de terreno do parque, custos da fundação e torre (fuste) de um único equipamento instalado, não sendo consideradas outras construções dada a sua inexistência». (ibidem).
XXII. Nestes termos deverão ser relevados como factos provados os supra evidenciados e, em conformidade proferida nova decisão.
XXIII. Quanto ao invocado vício de falta de fundamentação, entende a Recorrente que a sentença recorrida peca por erro na aplicação do direito.
XXIV. A inscrição de um prédio na matriz predial consubstancia um ato em matéria tributária que imediatamente afeta direitos e interesses legalmente protegidos da entidade que, relativamente ao mesmo é qualificada como sujeito passivo de IMI, como é o caso da Autora, ora Recorrente (cf. Acórdão de 27.11.2013, no processo n.º 01725/13, do Supremo Tribunal Administrativo, disponível em www.dgsi.pt).
XXV. Como ato em matéria tributária que afeta direitos ou interesses legalmente protegidos, a inscrição na matriz predial de uma dada realidade física como prédio para efeitos fiscais deve ser devidamente fundamentada.
XXVI. Ora, no caso aqui em análise, em razão da notificação da avaliação do prédio aqui em causa, a Autora apresentou um pedido de fundamentação legal das razões de facto e de direito subjacentes à realidade que estava a ser objeto de avaliação, dirigido pela Autora ao serviço de finanças de Penafiel, nos termos do n.º 1 do artigo 37.º do CPPT. Em resposta a este pedido, o serviço de finanças de Penafiel remeteu à Autora documentação justificativa da avaliação efetuada (critérios avaliados e cálculos de avaliação) não fornecendo qualquer indicação as normas legais ao abrigo das quais realidade estava a ser considerada «prédio “outros”».Com efeito, no que respeita ao quadro legal aplicável, o print fornecido como elemento fundamentador do ato de avaliação apenas fazia referência aos critérios legais de avaliação seguidos (cf. Doc. n.º 9 junto à p.i., campo “Tipo de avaliação: Aval. Artigo 46º n. 2 – Método do custo c/terreno”).
XXVII. Ora, “(…) o vício de falta de fundamentação legalmente exigida tem como consequência a ilegalidade do acto a notificar, tratando-se de um vício intrínseco do acto (…). Contudo admite-se no artigo 37.º, n.º 1 do CPPT a utilização deste mecanismo para requerer a notificação ou a passagem de certidão que contenha a fundamentação em falta. Isto é assim na medida em que, na prática será impossível determinar se a falta de fundamentação consubstancia um vício do acto de notificação – a fundamentação existe mas não foi comunicada - ou do acto notificado – que não continha a fundamentação legalmente exigida”. Assim “(…) na prática será impossível determinar se a falta de fundamentação constitui uma deficiência do acto de notificação ou do acto notificado – estes são materialmente um só – e o n.º 1 do artigo 37.º do CPPT a admite expressamente a utilização deste mecanismo para requerer a fundamentação em falta” Posto isto “Sendo obrigatória a notificação do acto, quando ele tem de ser fundamentado é obrigatória a notificação da fundamentação, pois ela, nestes casos, faz parte do acto”.
XXVIII. Do que antecede resulta que tendo a Recorrente utilizado o mecanismo do n.º 1 do artigo 37.º do CPPT, deverá considerar-se que a fundamentação notificada em resposta a esse pedido consubstancia a fundamentação do ato.
XXIX. O direito à fundamentação dos atos administrativos e tributários que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos é um princípio constitucional previsto no artigo 268º da CRP. O direito dos contribuintes à fundamentação dos atos tributários encontra-se ainda concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77º da LGT, que mais não é do que uma réplica do n.º 1 do artigo 125.º do CPA, aplicável ex vi da alínea c) do artigo 2.º da LGT e da alínea d) do artigo 2.º do CPPT.
XXX. Assim, tal fundamentação há de ser expressa, clara, suficiente e congruente, uma vez que visa responder às necessidades de esclarecimento do contribuinte, tendo o dever de fundamentar, concomitantemente, duas funções: (i) permitir que o contribuinte possa dispor dos elementos necessários à compreensão suficiente da motivação da decisão, (ii) conheça as razões fácticas e jurídicas que estiveram na sua base, por forma a aceitá-las ou rebatê-las, optando em consciência entre a aceitação da decisão e a sua impugnação.
XXXI. Por esse motivo, a insuficiência, a obscuridade e a contradição da fundamentação do ato tributário equivalem a falta de fundamentação, como resulta do disposto no nº 2 do artigo 125º do CPA, visto que essa insuficiência, obscuridade ou contradição impedem que o seu destinatário apreenda o iter volitivo e cognoscitivo que determinou a Autoridade Tributária a praticá-lo com o sentido decisório que lhe conferiu.
XXXII. De facto, no caso sub judice é minimamente percetível à Autora, ora Recorrente, o conteúdo da atuação da Autoridade Tributária – a consideração de uma dada realidade física como um conjunto de prédios para efeitos de IMI. No entanto, a circunstância da Autora perceber o conteúdo do ato praticado pela Autoridade Tributária (como seja o de inscrição matricial e, bem assim, os atos de liquidação de imposto subsequentes) é bem distinta de perceber quais os fundamentos subjacentes a tal ato.
XXXIII. A Autoridade Tributária não identifica o fundamento legal que justifica que a realidade física parque eólico deve dar lugar à inscrição matricial aqui em crise.
XXXIV. Bem analisada a petição inicial, a mesma não traduz, ao contrário do que propugna o Tribunal a quo na sentença recorrida, uma plena compreensão dos fundamentos legais subjacentes a inscrição matricial aqui em causa. Aliás, bem se descortina da petição inicial da Recorrente que a impugnação da qualificação jurídica operada pelo do ato aqui em causa assentou numa lógica de “exclusão de partes”, tendo sido refutadas todas as hipóteses normativas sob as quais se poderia subsumir tal qualificação. Ora, tal “compreensão” dos fundamentos do ato não é seguramente a que foi pretendida pelo legislador ao impor à Administração este dever de fundamentação dos atos em matéria tributária.
XXXV. Atento o exposto haverá que concluir padecer a sentença recorrida de erro na aplicação do direito por violação do disposto na alínea c) do artigo 99 do CPPT e do artigo 77.º da LGT, devendo ser anulada.
XXXVI. Sem prescindir, os factos sobre os quais se alicerça o direito aplicado na sentença recorrida são os constantes da alínea J) do respetivo probatório, segundo a qual “A inscrição referida em G) teve origem na informação de fls.120 verso a 121 verso, complementada pelas informações de fls 132 a 133 e 134 a 135 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido”.
XXXVII. Ora, do probatório fixado na sentença apenas se pode extrair terem existido comunicações emitidas pela Direção de Finanças de Aveiro ao Chefe do Serviço de Finanças de Penafiel no sentido de ser promovida a “avaliação do parque eólico, Eólica…, Lda. de acordo com as regras do IMI” e de lhe ser dado conhecimento da avaliação (cf. fls. 120 verso a 121 verso em anexo à sentença recorrida) e no sentido do esclarecimento de dúvidas alegadamente suscitadas pelo Chefe deste serviço (cf. fls. 132 a 133 e 134 a 135 verso em anexo à sentença recorrida).
XXXVIII. Da ficha de avaliação propriamente dita (ficha n.º 3272423, cf. fls. 140 verso 141 verso a 142 verso, integrantes da sentença recorrida) e da declaração modelo 1 oficiosa (cf. fls. 2 verso do processo administrativo, na qual se identifica a inexistência de quaisquer documentos em anexo à mesma) não resulta, contudo, que o enquadramento legal propugnado nas informações da Direção de Finanças de Aveiro constantes da documentação acima tenha sido o seguido pelo Chefe do Serviço de Finanças na emissão da decisão em apreço.
XXXIX. Sendo o ato de inscrição oficiosa de um prédio da matriz e o ato de inscrição do respetivo valor patrimonial tributário definitivo da competência do Chefe do Serviço de Finanças da área da localização dos bens (cf. alíneas a) e e) do n.º 3 do artigo 13.º do CIMI) não compreende a Recorrente como pode uma informação de outro órgão, sem competência material ou territorial para a emissão do ato em análise, não incorporada no próprio ato administrativo em causa (inscrição matricial oficiosa) ou em qualquer outro ato preparatório do mesmo (e.g. avaliação patrimonial do “prédio” objeto de inscrição) constituir fundamentação do mesmo.
XL. Nesta medida entende a Recorrente ter a sentença recorrida incorrido em erro de julgamento dos factos e do direito aos mesmos aplicáveis devendo anular-se.
XLI. Por todo o exposto deve considerar-se configurar a situação em apreço uma clara situação de ausência ou vício de fundamentação legalmente exigida, nos termos da alínea c) do artigo 99.º do CPPT (ex vi do n.º 1 do artigo 70.º do mesmo Código), do ato de inscrição matricial e do ato de avaliação dos prédios aqui em causa, razão pela qual os mesmos padecem de ilegalidade, e todos os atos tributários (e.g. liquidações de imposto) que no mesmo radiquem, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento de direito.
XLII. Sem prescindir, defende a Recorrente, na lógica impugnatória acima identificada adotada perante a falta de fundamentação do ato que operou a qualificação jurídica que reputa de ilegal, que os equipamentos que integram o parque eólico aqui em questão e que foram integrados no objeto de incidência tributária do IMI não consubstanciam, desde logo, uma fração de território nos termos e para os efeitos da 1ª parte do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI.
XLIII. A sentença recorrida, não contestando este facto, entende que a Autora não tem razão, porquanto “No caso em apreço os equipamentos do Parque Eólico e, em particular, o equipamento em causa nestes autos, é uma realidade distinta do terreno em que está implantado, está afeto a um fim não transitório e mais do que isso está assente no mesmo local por um período superior a um ano, pelo que é para todos os efeitos legais um prédio à luz do art.º 2.º do CIMI e como tal objeto de incidência objetiva de IMI” (cf. pp. 7 e 8 da sentença recorrida). Verifica-se, pois, uma contradição entre os fundamentos de facto e a decisão proferida, o que traduz a nulidade da sentença recorrida, cf. n.º 1 do artigo 125.º do CPPT.
XLIV. Sem prescindir, tendo em conta a segunda parte do acima citado artigo 2.º do Código do IMI, segundo a qual também preenchem o conceito tributário de prédio “as águas, plantações, edifícios ou construções nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao território onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”, a Recorrente, reiterando que como demonstrado nada indica que a Autoridade Tributária e Aduaneira, ao efetuar a inscrição do Parque Eólico… na matriz predial, se tenha socorrido desta alternativa, ainda assim avaliou a possibilidade da sua aplicação ao caso concreto.
XLV. Mas ainda, que assim houvesse sucedido – o que, face ao que vem de se expor, apenas por mero dever de patrocínio se concede – dificilmente se compreende de que forma as componentes do parque eólico aqui em causa [sapata de betão armado (fundação) e a torre de suporte dos equipamentos de geração de energia (aerogerador)] se podem subsumir ao conceito de edifício ou construção, uma vez que tratando-se de meros equipamentos, não integram qualquer aceção conhecida daqueles conceitos.
XLVI. Em virtude da sua natureza, os referidos equipamentos não foram objeto de uma obra de construção, mas de uma mera instalação. Tal como acima se indicou, na qualificação do prédio aqui em causa como prédio urbano do tipo “outros” a Autoridade Tributária e Aduaneira deu relevância à sapata de betão armado (fundação) e à torre de suporte dos equipamentos de geração de energia (aerogerador). Ora, os aerogeradores são compostos por três peças distintas: o rotor, o gerador e a torre de suporte. A sapata de betão, em que assenta a torre do aerogerador, e a torre em si não consubstanciam qualquer espécie de edifício ou construção.
XLVII. Sobre esta questão, o Tribunal a quo pronunciou-se sustentando a natureza de construção relevante para efeitos do disposto na segunda parte do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI dos equipamentos aqui em causa sem, contudo fundamentar por que razão assim os qualificou.
XLVIII. Com efeito, refere a sentença recorrida que a Autora, ora Recorrente, não tem razão ao considerar que “(…) o equipamento em causa [que] é composto por três peças distintas, o rotor, o gerador e a torre de suporte que assenta numa sapata de betão, não consubstancia qualquer espécie de edifício ou construção” já que “O art.º 2.º, n.º 1, do CIMI prevê construções de qualquer natureza, pelo que o referido equipamento sendo composto por três peças que estão unidas e interligadas, sob pena de não ter qualquer aproveitamento útil, e assentes no solo por uma sapata de betão constituem uma construção para efeitos de IMI” (cf. p. 8 da sentença recorrida). Assim, neste particular incorre a sentença em vício de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que levaram o Tribunal a quo a considerar serem os equipamentos sob análise construções nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI, o que importa a sua nulidade (cf., n.º 1 do artigo 125.º do CPPT).
XLIX. A Recorrente, admitiu ainda, por mero dever de patrocínio, a possibilidade de se considerar que estes elementos do parque eólico constituem uma construção para estes efeitos. No entanto entende que para a sua subsunção na segunda parte do n.º 1 do artigo 2,º sempre se imporia que tais construções fossem dotadas de valor económico autónomo.
L. Alegou a Autora, ora Recorrente na sua p.i. que os elementos a que a Autoridade Tributária e Aduaneira decidiu conferir relevância tributária para estes efeitos não possuem qualquer valor económico intrínseco ou autonomia funcional relativamente aos equipamentos geradores de energia de que são meros acessório, razão pela qual, não poderiam ser considerados como edifícios ou construções relevantes para o preenchimento do conceito de prédio urbano do tipo “outros” nos termos e para os efeitos do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI.
LI. Esta questão não foi, contudo, objeto de apreciação no âmbito da sentença recorrida, o que traduz o vício de omissão de pronúncia que importa, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, a nulidade da decisão.
LII. Caso se entenda que a referência genérica à subsunção das “construções” em análise na hipótese da segunda parte do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI consubstancia a pronúncia do tribunal recorrido sobre esta questão, o que apenas se impõe por dever de patrocínio, sempre haverá que concluir que a sentença recorrida incorre em erro na aplicação do direito devendo ser anulada.
LIII. Com efeito, damos aqui por integralmente reproduzida, pela sua clareza, a recente e anteriormente citada jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul sobre esta matéria no Acórdão de 26.01.2017 proferido no processo n.º 516/15.4BELLE.
LIV. No caso em apreço, como bem deixou o Tribunal a quo consignado no probatório da sentença, “O Parque Eólico… é composto, entre o mais, por 1 aerogerador REpower MM82 de 2MW de potência, instalado desde 05/02/2007 num prédio rústico da Junta de Freguesia de Canelas”.( cf. alínea c) do probatório da sentença recorrida).
LV. Assim, na senda da jurisprudência citada, os elementos que integram o parque eólico e a que a Autoridade Tributária decidiu conferir relevância económica autónoma para efeitos de tributação, não são mais do que partes componentes do parque eólico, o qual, para funcionar necessita de outros equipamentos, desde logo a rede de cabos que ligam os aerogeradores à rede elétrica pública.
LVI. Nesta medida ao considerar tais equipamentos como construções relevantes para efeitos de inscrição autónoma na matriz predial urbana incorre a sentença recorrida em erro na aplicação do direito por violação do n.º 1 do artigo 2.º do CIMI, devendo ser anulada.
LVII. Sem prescindir, partindo da consideração de que os equipamentos aqui em análise, que compõem o parque eólico não incorporam qualquer conceito de edificação ou construção fiscalmente relevante para estes efeitos, considera a Recorrente não será o simples facto de estarem afetos a uma atividade económica que lhes confere a qualificação de prédios urbanos para estes efeitos.
LVIII. Com efeito, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 3.º e no artigo 4.º do Código do IMI, na redação à data dos factos, resulta que o conceito de prédio urbano é residual relativamente ao conceito de prédio rústico e que apenas podem ser considerados rústicos aqueles prédios que (i) se situem fora de aglomerados urbanos; (ii) não sejam qualificados como terrenos para a construção; (iii) tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas ou não tendo uma afetação geradora de rendimentos agrícolas não se encontrem construídos ou possuam construções de caracter acessório e de reduzido valor.
LIX. Na situação em apreço, o prédio em questão situa-se fora de um aglomerado urbano; não foi qualificado como terreno para a construção; não tendo uma afetação geradora de rendimentos agrícolas; e como acima demonstrado, tal como configurado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, possui construções de caracter acessório e sem valor autónomo.
LX. Nesta medida, nunca o prédio aqui em causa poderia ser considerado urbano mas sim rústico, como aliás o é e está inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Canelas, concelho de Penafiel. Neste exato sentido se manifesta a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, proferida a respeito da qualificação das pedreiras e saibreiras, com base na mera não afetação ou não destinação normal de um prédio rústico, situado fora de aglomerado urbano, a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, como prédios urbanos do tipo “outros” nos termos e para os efeitos do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, firmada nos Acórdãos datados de 30.05.2012 (proferido no processo n.º 01109/11), de 27.06.2012 (proferido no processo n.º 01004/11), de 27.11.2013 (proferido no processo n.º 0317/12), de 06.03.2014 (proferido no processo n.º 0320/12) e de 01.10.2014 (proferido no processo n.º 0400/12). Esta jurisprudência considera ainda que constitui “grave desigualdade e discrepância ao ter de se tributar como prédio urbano uma pedreira inserida em Reserva Agrícola Nacional, quando tais áreas são consideradas com prédios rústicos para quaisquer outras finalidades” (cf. Acórdão de de 27.11.2013, proferido no processo n.º 0317/12).
LXI. Ora, por semelhança de circunstâncias, também o Parque Eólico… é rodeado de prédios rústicos, logo, também constituiria uma discriminação injustificada a qualificação como urbano do prédio aqui em apreço, sendo ilegal a qualificação jurídica de prédio urbano do tipo “outros” nos termos e para os efeitos do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, do prédio aqui em apreço.
LXII. Quanto a esta questão, considerou o Tribunal a quo na sua douta sentença que a Autora, ora Recorrente defendendo que “(…) o referido equipamento não é um prédio urbano do tipo outros, à semelhança do que sucede com as pedreiras, como vem sendo defendido pela jurisprudência do Colendo Supremo Tribunal Administrativo”, não tinha razão. “Desde logo esta questão contende com a qualificação do prédio e a sua avaliação pelo que terá de ser impugnada em ação própria” (cf. p. 8 da sentença recorrida). Não obstante, decidindo, entendeu o Doutro Tribunal a quo que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo invocada pela Autora, ora Recorrente, para afastar a qualificação do parque eólico como prédio urbano deixou de ter aplicação com a entrada em vigor da nova redação do artigo 3.º do Código do IMI, introduzida pelos artigos 161.º e 163.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, sendo que, “(…) a qualificação das pedreiras como prédio rústico resultava da anterior redação do art.º 3.º, n.º 1 do CIMI, que não é aplicável de todo ao caso dos equipamentos dos Parques Eólicos.” (cf. p. 8 da sentença recorrida).
LXIII. A título prévio, importa aqui deixar claro que o que se pretende tributar enquanto prédio urbano, e já não rústico, com a nova redação da norma é a propriedade de terrenos que tenham por destino normal uma utilização geradora de rendimentos comerciais e industriais. Ora, como decorre do probatório esse direito de propriedade não se verifica na esfera jurídica da Autora, ora Recorrente, mas dos locadores dos mesmos. No caso em apreço, a qualificação do “prédio” em que os equipamentos sob análise estão instalados como prédio rústico ou urbano assenta na premissa, antes demonstrada, de que tais equipamentos tal como são relevados pela Autoridade Tributária poderiam quando muito traduzir edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor. Em consequência, por ser efetuada por referência ao terreno, logo ao respetivo proprietário, tal qualificação nunca importaria a sujeição passiva a favor da Autora.
LXIV. Quanto a esta questão importa, no entanto, fazer uma reflexão sobre a atribuição de natureza interpretativa a normas de incidência tributária como é a que resulta do artigo 3.º do Código do IMI. Ora, conforme acima se referiu, o legislador, pelos artigos 161.º e 163.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, introduziu uma alteração ao artigo 3.º do Código do IMI à qual conferiu “caráter interpretativo”. Pretende com isto o legislador aplicar a nova redação da norma em crise a factos anteriores à entrada em vigor da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março.
LXV. Sucede que não obstante o declarado caráter interpretativo da alteração dada ao artigo 3.º do CIMI pelo artigo 163.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, estamos, na verdade, perante uma norma inovadora e não interpretativa. Caso se entenda que a nova versão do n.º 1 do artigo 3.º do CIMI, face à redação da norma conferida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, não se encontra compreendida na anterior previsão da mesma norma, tal significa que da aludida norma resulta agora a incidência tributária distinta (a título de prédio urbano e, por isso, mais onerosa) sobre situações que antes não estavam a ela sujeitas (por traduzirem um objeto tributário distinto – prédios rústicos, sujeitos a uma tributação menor).
LXVI. Assim sendo, porque da redação do n.º 1 do artigo 3.º do CIMI, anterior à Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, não resultava a incidência de imposto enquanto prédios urbanos sobre terrenos situados fora de aglomerados urbanos que não fossem de considerar terrenos para construção pelo facto de os mesmos terem “por destino normal uma utilização geradora de rendimentos comerciais e industriais” independentemente da existência de construções sobre o mesmo e natureza dessas construções, mas antes de terrenos situados fora de aglomerados urbanos que não fossem de considerar terrenos para construção que, não tendo uma afetação normal a uma atividade geradora de rendimentos agrícolas se encontrassem construídos ou dispusessem apenas de edifícios ou construções de carácter não acessório, deverá considerar-se que a nova redação não se encontra acolhida na redação anterior.
LXVII. De facto, à luz da anterior redação da norma em análise, neste tipo de terrenos, verificando-se a inexistência de construções ou a existência de “edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor” não era a mera afetação de tais terrenos à produção de rendimentos comerciais ou industriais que determinaria a sua qualificação como “prédio urbano” com as inerentes consequências. Entendimento este sustentado pela jurisprudência dominante, desde logo em relação às pedreiras.
LXVIII. Atento o que antecede, nunca poderia o julgador ou intérprete concluir que da norma em crise decorria a tributação como prédio urbanos deste tipo de situações sem, utilizando as palavras do Autor anteriormente citado, ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei.
LXIX. Em face da anterior redação da verba nunca poderiam, pois, os tribunais ter adotado uma interpretação que conduzisse à tributação como prédios urbanos de terrenos situados fora de aglomerados urbanos que não fossem de considerar terrenos para construção pelo simples facto de os mesmos terem “por destino normal uma utilização geradora de rendimentos comerciais e industriais” independentemente da existência de construções sobre o mesmo e natureza dessas construções. Do que aliás dá testemunho a jurisprudência citada.
LXX. Nesta medida, a entender-se que a atual redação do n.º 1 do artigo 3.º do CIMI compreende a referida interpretação só poderá concluir-se pelo seu caráter inovador e não de norma interpretativa. Em consequência, o artigo 163.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, qualificando como interpretativa a atual redação daquela norma com o propósito da sua aplicação a factos tributários ocorridos antes da sua entrada em vigor, consubstancia uma norma retroativa, em violação do princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, assim como do princípio da proteção da confiança e da segurança jurídica, que decorre do artigo 2.º da CRP. E a sentença recorrida em virtude de ter aplicado tal norma incorre no mesmo vício de ilegalidade, devendo ser anulada
LXXI. Sem prescindir, entendeu ainda o Tribunal a quo na sentença recorrida, sem mais, que “Além disso, resulta dos arts. 2.º, n.ºs 1 a 3, 3.º, 4.º e 6.º, n.ºs 1, alínea d) e 4 do CIMI, que os equipamentos dos Parques Eólicos são prédios urbanos, porque não derem [entendemos devem] ser classificados como rústicos, e são da espécie outros”, concluindo, desta forma, que “Os equipamentos dos Parques Eólicos estão sujeitos à incidência subjetiva do IMI”.
LXXII. Ora, atentas as várias hipóteses de qualificação previstas nas normas do CIMI apresentadas como fundamento para a decisão (que abrangem o conceito geral de prédio, o conceito de prédio rústico, o conceito de prédio urbano e o conceito de prédios urbanos do tipo “outros”) não consegue a Recorrente descortinar quais os factos concretamente subsumíveis nas referidas hipóteses normativas, no contexto da invocação da natureza de prédios rústicos cuja apreciação originou a decisão em causa apreciação. Por esta razão deve considerar-se, neste segmento decisório, nula a sentença recorrida por falta de especificação da fundamentação de facto para o juízo de direito que profere, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT.
LXXIII. No que diz respeito à invocada inconstitucionalidade da qualificação jurídica dos equipamentos do Parque Eólico… como prédio urbano por violação do princípio da igualdade, previsto nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP), o Tribunal a quo considera na sentença recorrida tal questão diverge do objeto dos presentes autos, “(…) porquanto essa classificação por espécies contende com a classificação dos prédios e não com a qualificação dos equipamentos que compõem os Parque Eólicos como prédio para efeitos de incidência do art. 2.º do CIMI”, afirmando no entanto que tal inconstitucionalidade não se verifica porque “Pese embora o prédio urbano em causa efetivamente não usufrua ou exija os serviços e infraestruturas essenciais aos prédios urbanos típicos, habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços e terrenos para construção, a sua classificação como prédios urbanos da espécie outros tem em consideração essas características específicas e diferenças essenciais que se repercutem na sua avaliação e consequente valor patrimonial tributário e imposto legalmente exigível” (cf. p. 9 da sentença recorrida).
LXXIV. Para sustentar a invocada inconstitucionalidade a Autora, ora Recorrente, expôs a incoerência sistémica da previsão de tal tributação, desde logo, em face do regime tributário previsto no Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, o qual estabelece normas relativas à atividade de produção de energia elétrica, e que determinou que as empresas detentoras de licenças de exploração de parques eólicos estão obrigadas a pagar aos municípios uma renda de 2,5% do pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia produzida (cf. ponto 27 do anexo II do referido Decreto-Lei). Nos termos daquela previsão legal, este pagamento tem por base a conveniência de refletir uma repartição dos benefícios globais inerentes aos parques eólicos a nível nacional e local. Tudo indica, pois, que com a criação desta tributação, o legislador sentiu necessidade de determinar que os municípios nos quais os referidos parques eólicos se encontravam instalados participassem no valor por eles gerado, assim assegurando que pelo menos uma parte desse valor era localmente afetado.
LXXV. Ora, tal propósito apenas pode ter existido no pressuposto de que de outra forma as populações e as autarquias locais não participariam naquele valor a não ser por intermédio da administração central. De facto, não fora a previsão de tal tributo, nunca os municípios teriam qualquer participação no valor gerado por aquelas unidades de produção de energia. Ademais, e no que para este efeito releva , a previsão daquela contribuição teve necessariamente como pressuposto o facto de os parques eólicos não configurarem uma realidade autónoma dos terrenos em que se encontram instalados os respetivos equipamentos, e de não serem, consequentemente, autonomamente tributáveis em sede de IMI, sem o que a preocupação do legislador com a participação das autarquias locais no valor gerado por esses aerogeradores não teria qualquer sentido. De facto, de outra forma, já as autarquias retirariam da mera instalação do parque eólico na respetiva circunscrição territorial uma participação económica acrescida. Assim, dificilmente se antevê que o legislador possa ter pretendido que se procedesse à qualificação dos parques eólicos como prédios para efeitos de IMI, erigindo os respetivos promotores, consequente e inelutavelmente, como sujeitos passivos de mais este imposto municipal.
LXXVI. Mais se refira que, estando o IMI erigido sob a lógica do princípio do benefício, a qualificação de um prédio como urbano ou rústico e a sua tributação mais ou menos agravada, tem subjacente as utilidades que os sujeitos passivos do imposto retiram da atuação dos municípios. Neste sentido, ainda que relativamente à Contribuição Autárquica, a que o IMI veio suceder, se pronuncia a jurisprudência do Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 363/01, segundo a qual “Ao estabelecer a Contribuição Autárquica o legislador justificou-a (…) com a “lógica do princípio do benefício”, correspondendo o seu pagamento à contrapartida dos benefícios que os proprietários recebem com obras e serviços que a comunidade proporciona”.
LXXVII. Os parques eólicos constituem equipamentos que funcionam de forma automática sem intervenção humana (ou com intervenção humana residual), não necessitando dos serviços ou infraestruturas municipais que são normalmente essenciais à utilização de prédios urbanos (e.g. saneamento, adequação de acessos, recolha de lixo, etc.). Com efeito, o nível de utilização deste tipo de disponibilidades municipais é em tudo semelhante ao que se regista relativamente aos demais prédios rústicos (quase limitado às infraestruturas rodoviárias).
LXXVIII. Nesta medida, atribuir relevância autónoma enquanto prédios urbanos para efeitos tributários a estes equipamentos não pode deixar de se afigurar como uma violação do princípio constitucional da igualdade [cf. artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP)], princípio, aliás, especificamente previsto no âmbito da tributação do património (cf. n.º 3 do artigo 104.º da CRP).
LXXIX. Ante o exposto, não pode, também, deixar de se concluir, atento o atual quadro legal da tributação do património, que a qualificação jurídica aqui em causa rompe com o sentido de coerência do sistema fiscal, que “Não obstante esta sua falta de autonomia (para conduzir à inconstitucionalização das leis) e as demais limitações em que se move, o princípio da coerência do sistema sempre se apresenta como um auxiliar importante no desencadear da operacionalidade prática dos princípios constitucionais, de que vimos falando, mormente do princípio da igualdade fiscal que, perante uma assistematicidade, mais facilmente se pode concluir pela sua violação.”.
LXXX. Assim, a interpretação das normas dos artigos 2.º, n.º 1, 4.º e 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, que conduza à qualificação jurídica dos equipamentos que compõem os parques eólicos como prédio urbano do tipo “outros”, é não só é assistemática, como é manifesta e materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade tributária previsto nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º, n.º 3 da CRP, o que, em consequência, justifica o reconhecimento da ilegalidade da qualificação jurídica em escrutínio.
LXXXI. Neste sentido, ao decidir, sem mais que tal inconstitucionalidade não se verifica porque “Pese embora o prédio urbano em causa efetivamente não usufrua ou exija os serviços e infraestruturas essenciais aos prédios urbanos típicos, habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços e terrenos para construção, a sua classificação como prédios urbanos da espécie outros tem em consideração essas características específicas e diferenças essenciais que se repercutem na sua avaliação e consequente valor patrimonial tributário e imposto legalmente exigível” (cf. p. 9 da sentença recorrida), o Tribunal a quo incorre em erro na aplicação do direito. Razão pela qual deve anular-se a decisão recorrida.
LXXXII. Invocou ainda a Recorrente para sustentar a ilegalidade da qualificação jurídica sob apreciação que o facto de a Autoridade Tributária e Aduaneira qualificar juridicamente o Parque Eólico… como um prédio urbano do tipo “outros” com autonomia em relação ao terreno em que o mesmo se encontra implantado, assim o inscrevendo na matriz predial respetiva, importa ainda a duplicação de inscrições matriciais sobre o mesmo objeto, acarretando inexoravelmente uma situação de duplicação de coleta.
LXXXIII. Ao inscrever na matriz predial o referido parque eólico como uma fração de território correspondente à área dos terrenos nos quais os equipamentos acima indicados se encontram instalados, a Autoridade Tributária e Aduaneira duplicou a inscrição das mesmas frações de território na matriz. Como decorre do probatório da sentença recorrida (cf. alínea E) da matéria de facto dada como provada), os equipamentos que compõem o parque eólico aqui em causa, encontram-se instalados numa fração de território, autonomamente inscrita na matriz predial rústica da freguesia de Canelas do Concelho de Penafiel. Isto é, o prédio nos quais os referidos equipamentos foram instalados já existia (!) e já estava inscrito na matriz.
LXXXIV. Com a instalação dos referidos equipamentos, nada se alterou, porquanto depois daquela instalação, o imóvel continuou a existir inscrito na matriz em nome dos respetivos proprietários. Assim, nada se alterou quanto aos acima referidos imóveis, com exceção do facto de aí terem sido instalados aqueles equipamentos de produção de energia. Desta forma, ao ter promovido a inscrição na matriz de um parque eólico que não existe enquanto construção ou enquanto fração de território autónoma em que estão implantados os respetivos componentes, a autoridade tributária, na verdade, promoveu a duplicação da inscrição matricial, a qual tem como efeito a reiterada duplicação da tributação de IMI sobre a mesma fração de território, enquanto prédio rústico e enquanto prédio urbano do tipo “outros”, redundando inevitavelmente numa situação de duplicação de coleta anual, nos termos e para os efeitos do artigo 205.º do CPPT. Com efeito, nos termos do artigo 205, n.º 1 do CPPT, há duplicação de coleta, para efeitos de oposição à execução, quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo.
LXXXV. Note-se que não obstante a referida norma definir duplicação de coleta para efeitos de oposição à execução, uma vez que aquela constitui fundamento de oposição à execução, nos termos do disposto no artigo 204.º do CPPT, a duplicação de coleta é também causa de ilegalidade da liquidação (cf., neste sentidos os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 26.02.2003 e de 8.07.2009, proferidos no âmbito dos processos n.º 6195/12 e n.º 530/09, respetivamente) e no caso, como bem se extrai de tudo quanto antecede, é uma das consequências da ilegalidade da qualificação jurídica aqui em análise.
LXXXVI. Ora, devem verificar-se os seguintes requisitos cumulativos para se concluir estarmos perante uma situação de duplicação de coleta: “a) unicidade dos factos tributários; b) identidade da natureza entre o tributo pago e o que de novo se exige; c) coincidência temporal do tributo pago e o que de novo se pretende cobrar.”
LXXXVII. No caso em apreço, no que se refere à “unicidade dos factos tributários”, é por demais evidente que o mesmo se encontra verificado. Com efeito, de acordo com a informação constante do auto de notícia em anexo sob a designação de Doc. n.º 7 junto à p.i., a Autoridade Tributária e Aduaneira claramente atesta que a “A empresa Eólica…, Lda, (…) construiu um parque eólico denominado B…, na Serra da Boneca, freguesia de Canelas, deste concelho, constituído por uma torre E45 com aerogerador, em prédios rústicos de que são titulares a Junta de Freguesia de Canelas e Z… e a eles arrendados, (…)”.
LXXXVIII. Para se verificar a unicidade dos factos tributários é necessário que a realidade fáctica que está subjacente à pluralidade de liquidações seja a mesma. No caso em apreço, tal requisito encontra o seu preenchimento na circunstância de as liquidações de imposto terem como objeto a tributação da propriedade do supra identificado prédio urbano, propriedade essa que já será objeto de tributação por referência ao prédio inscrito na matriz predial rústica da propriedade de Z…. Só não o sendo, efetivamente, na parte do terreno utilizado que se encontra inscrita na matriz predial rustica e que é da propriedade da Junta de Freguesia de Canelas pelo facto desta se tratar de uma entidade que beneficia de isenção subjetiva.
LXXXIX. Neste contexto, a qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… nos termos efetuados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, derivando numa situação de reiterada duplicação de coleta, é também inconstitucional, por violação do princípio da justiça, decorrente dos artigos 106.º, 107.º, n.º1, 266, n.º 2 e 268, n.ºs 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa.
XC. Sobre a invocada duplicação de coleta e inerente violação do princípio constitucional da justiça, o Tribunal a quo considerou não poder ser este vício ser conhecido no âmbito da presente ação em virtude de se tratar de um fundamento do processo de oposição à execução e contender com a avaliação do prédio com o seu valor patrimonial e com as respetivas avaliações, questões essas que devem ser objeto de ações próprias, ficando prejudicado o julgamento desta causa de pedir (cf. p. 10 da sentença recorrida).
XCI. No contencioso tributário vigora o princípio da impugnação unitária, nos termos do qual, em regra, só há impugnação contenciosa do ato final do procedimento que afeta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da Autoridade Tributária e Aduaneira perante este, definindo os seus direitos ou deveres, cf. artigos 54.º do CPPT e 66.º da Lei Geral Tributária (LGT). A decisão administrativa de inscrição na matriz de uma dada realidade, que a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou tratar-se de um prédio urbano do tipo “outros”, vem alterar a composição de direitos e deveres que integram a esfera jurídica da entidade a que tal prédio é imputado, desde logo conferindo-lhe a qualidade de sujeito passivo de IMI (podendo igualmente ter consequências em Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis, Imposto do Selo e mesmo Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas). Este é, pois, um ato em matéria tributária que não comporta, imediatamente, a apreciação da legalidade do ato de liquidação de imposto.
XCII. Nesta medida tal ato pode ser objeto de impugnação autónoma nos termos da alínea p) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 97.º do CPPT, sendo, contudo, esta uma mera faculdade do contribuinte. O não aproveitamento dessa prerrogativa, que é somente uma faculdade, não preclui a possibilidade de sindicar os vícios aqui em causa na impugnação da liquidação de imposto que radique em tal inscrição matricial.
XCIII. A interpretação contrária no sentido da inimpugnabilidade dos vícios da decisão administrativa de inscrição matricial nesta sede afrontaria o princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigos 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da CRP), que não se compagina com a preclusão de direitos de impugnação contenciosa sem uma previsão legislativa inequívoca. De facto, a regra da inimpugnabilidade conhece apenas uma exceção, a de se tratar de um ato destacável, ou seja, se houver uma “disposição expressa em sentido diferente” a impor a impugnação autónoma (cf. artigo 54.º do CPPT). Ora, não se descortina, in casu, qualquer previsão legal expressa no sentido da impugnabilidade contenciosa autónoma do ato administrativo que determinou a inscrição matricial de uma dada realidade física, considerada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, como prédio.
XCIV. Deste modo a Autora não fica impedida de discutir as ilegalidades do ato de inscrição matricial, pelo qual operou a qualificação jurídica de objeto de imposto, no âmbito de impugnação da liquidação de imposto que nele radica uma vez que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º e do artigo 99.º, ambos do CPPT, os atos de liquidação podem ser impugnados com fundamento em qualquer ilegalidade. Não existe qualquer disposição legal expressa a prever a destacabilidade e a impugnabilidade autónoma da decisão de inscrição matricial de uma dada realidade como prédio urbano para efeitos de IMI. De todo o modo, tratando-se este de um ato imediatamente lesivo, tal apenas implica que o contribuinte disponha, a título de faculdade, da impugnação autónoma do ato de inscrição matricial. Em consequência, admite-se que a ilegalidade do objeto da inscrição matricial, que coincide com o objeto das consequentes liquidações de IMI, venha a ser arguida em sede de impugnação judicial de tais liquidações.
XCV. Considerando, pois, que se pretende sindicar a ilegalidade do objeto das liquidações de IMI, por referência à qualificação jurídica do mesmo operada via inscrição matricial; e considerando que a impugnação judicial admite a arguição destes vícios no tocante à liquidação de imposto presente mas que o processo de impugnação judicial não pode ter como objeto a definição futura das relações jurídicas semelhantes que se venham a estabelecer entre a Autoridade Tributária e Aduaneira e a Autora, ora Recorrente, com base nos mesmos pressupostos de facto e de direito, não poderá deixar de se concluir que a ação para o reconhecimento de um direito ou interesse em matéria tributária é o meio adequado para obter tutela judicial contra os atos administrativos (maxime de liquidação de IMI) que sejam emitidos tendo como pressuposto a qualificação jurídica da realidade aqui em causa como prédio urbano do tipo “outros”.
XCVI. Neste contexto, esta ação tem como âmbito objetivo a apreciação de todas as questões que podem ser apreciadas em sede de impugnação judicial da legalidade das liquidações de IMI, designadamente todas as ilegalidades às mesmas imputáveis por referência à qualificação jurídica da realidade aqui em causa como prédio para efeitos de IMI.
XCVII. Por esta razão, ao não se pronunciar sobre a duplicação de inscrição matricial operada pela qualificação jurídica em apreço, a qual tem como inerente consequência a duplicação da coleta, estando a tal obrigada, deve a sentença recorrida ser considerada nula por omissão de pronúncia nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, ser reconhecida a ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… e que estão na origem da sua inscrição na matriz predial urbana de Canelas, Concelho de Penafiel, sob o artigo n.º U-9…, como prédio urbano do tipo “outros” nos termos conjugados do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, com todos os devidos e legais efeitos, designadamente a anulação da liquidação de IMI melhor identificada no introito da p.i. e, bem assim, de todas as que sejam emitidas na pendência da presente ação, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”
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O Recorrido, Ministério das Finanças, apresentou contra-alegações e interpôs recurso subordinado, tendo concluído da seguinte forma:
DO RECURSO SUBORDINADO
i) De acordo com o Art.º 633.º do CPC, na redacção dada pela Lei 41/2013 de 26 de Junho, determina que se ambas as partes ficarem vencidas cada uma pode recorrer na parte em que lhe seja desfavorável, podendo o recurso ser independente ou subordinado.
ii) No caso vertente, a ora Recorrente em sede de contestação suscitou as excepções de inidoneidade do meio processual, inimpugnabilidade do acto de inscrição na matriz por depender de prévia interpelação administrativa e da intempestividade da acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, tendo todas sido julgado improcedentes no âmbito da douta sentença, pelo que o recurso subordinado se reconduz a sindicar a legalidade da sentença relativamente à improcedência das excepções de inidoneidade do meio processual, inimpugnabilidade do acto de inscrição na matriz por depender de prévia interpelação administrativa e da intempestividade da acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, em que o aqui ora Recorrente decaiu na sentença.
iii) A douta sentença relativamente à inidoneidade do meio processual, determinou que não obstante a ora Recorrente ter razão em parte, pois a referida reclamação da inscrição na matriz podia obter o mesmo efeito que a acção para um reconhecimento ou interesse legítimo em matéria tributária, ainda assim estando em causa a discordância na qualificação jurídica dos factos no que respeita à inscrição dos prédios na matriz, e não um mero erro material de inscrição bem como a repercussão da sujeição de IMI com efeitos futuros, julgou improcedente a excepção em causa.
iv) Destarte, a sentença recorrida para além de ser totalmente omissa no que respeita à apreciação da excepção de inidoniedade do meio processual, na medida em que não se pronuncia acerca da acção administrativa especial consubstanciar o meio processual adequado com vista à ora Recorrida sindicar a pretensão aduzida, procede ainda a uma errada interpretação e aplicação do disposto no Art.º 145.º do CPPT.
v) Resulta dos autos, a aqui Recorrida intentou ao abrigo do disposto no Art.º 145.º do (CPPT), uma acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, com vista à definição de uma questão jurídica que, por natureza se repete no tempo, relativamente à liquidação de Imposto IMI do ano de 2014, datada de 27.02.2015, materializada através dos documentos de cobrança das respectivas prestações com o n.ºs 2014 254382303, 2014254382403 e 2014 254382503, qual seja, o reconhecimento de que não integra o âmbito da incidência objectiva deste imposto, nos termos do disposto no Art.º 2.º n.º 1, Art.º 4.º, Art.º 6.º n.º 1 alínea d) e n.º 6 todos do CIMI, no que concerne aos equipamentos instalados em S. Pedro, Serra da Boneca, freguesia de Canelas, Concelho de Penafiel.
vi) Em sede de contestação a ora Recorrente suscitou que a acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, prevista no Art.º 145.º do CPPT, é um meio processual que visa assegurar a tutela efectiva do direito ou interesse legalmente protegido em matéria tributária mas somente quando os restantes meios contenciosos não assegurem essa mesma tutela, alegando que a jurisprudência tem propendido entendimento no sentido de que a inscrição oficiosa constitui um acto imediatamente lesivo, que lesa a esfera jurídica dos contribuintes sendo por esse facto sindicável judicialmente, por via de acção administrativa.
vii) Veja-se nesse sentido o acórdão do STA, proferido no Proc. n.º 0836/14 de 22.04.2015 o qual refere que ”A inscrição oficiosa na matriz de uma determinada realidade física, por ter sido qualificada como prédio, reconduz-se a acto imediatamente lesivo dado que provoca uma alteração e significativa na esfera jurídica da recorrente, conferindo-lhe a qualidade sujeito passivo de IMI e nessa qualidade o sujeitando a várias obrigações tributárias, incluindo a obrigação de imposto”, e pelo mesmo diapasão, propendem ainda o Acórdão do STA proferido no Proc. n.º 01725/13 de 27.11.2013 e ainda o Acórdão referente ao Proc. n.º 01685/13 de 08.01.2014.
viii) Destarte, a douta sentença omitiu pronúncia acerca da inidoniedade do meio processual – acção administrativa especial - que a ora Recorrente considerou ser o meio processual adequado com vista à aqui Recorrida sindicar a pretensão aduzida.
ix) Encontrando-se o ordenamento jurídico tributário estruturado com os meios ou instrumentos considerados pelo legislador como aptos para a realização dos direitos que pretende fazer valer em juízo, sendo que cada um desses meios corresponde à forma mais adequada de obter essa tutela jurisdicional efectiva, como desde logo se proclama na norma do Art.º 2.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), e que no direito tributário encontra guarida nas normas dos Art.ºs 101.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 97.º do CPPT, fica claramente coarctado ao interessado poder escolher um ou outro meio processual, livremente, já que a cada direito corresponde o meio processual adequado para o fazer valer em juízo, de acordo com a causa de pedir e pedido invocados, conforme aliás tem sido jurisprudência unânime, (veja-se a este propósito entre muitos outros, os Acórdãos do STA de 30-9-2009 e 29-9-2010, Recursos n.ºs 626/09 e 127/10, respectivamente).
x) Neste desiderato, sendo entendimento sólido da jurisprudência que a inscrição oficiosa constitui um acto imediatamente lesivo sendo sindicável judicialmente, o meio processual adequado com vista a sindicar as eventuais ilegalidades de inscrição oficiosa na matriz de determinada realidade física como prédio, se subsume à acção administrativa especial.
xi) Logo, a sentença ao considerar que não obstante a ora Recorrente ter razão em parte, pois a referida reclamação da inscrição na matriz podia obter o mesmo efeito que a acção para um reconhecimento ou interesse legítimo em matéria tributária, mas estando em causa a discordância na qualificação jurídica dos factos no que respeita à inscrição dos prédios na matriz, e não um mero erro material de inscrição bem como a repercussão da sujeição de IMI com efeitos futuros, tendo julgado improcedente a excepção em causa, para além de não emitir pronuncia quanto ao meio processual adequado – acção administrativa especial – com vista à ora Recorrida sindicar a pretensão aduzida, procede ainda a uma errada interpretação e aplicação das normas legais, mormente do disposto no Art.º 145.º do CPPT, devendo ser julgada procedente a excepção de inidoniedade do meio processual laborando a sentença em manifesto erro de interpretação e aplicação do Art.º 145.º do CPPT.
xii) No que concerne inimpugnabilidade do acto de inscrição matricial, entendeu a sentença ora recorrida que no caso dos autos não estando em causa o erro de inscrição do prédio na matriz, mas uma qualificação indevida dos equipamentos de construção e consequente qualificação como prédio, não estava depende da reclamação administrativa necessária prevista no Art.º 130.º n.º 3 do CIMI, improcedendo assim a excepção invocada.
xiii) Entende a Recorrente que também aqui a douta sentença procedeu a uma errada interpretação e aplicação da factualidade subjacente nos autos, bem como do disposto no n.º 3 do Art.º 130.º do CIMI, pois, a acção tal como se encontra configurada pela ora aqui Recorrida, consubstancia, em suma, a apreciação da qualificação jurídica dos equipamentos do Parque Eólico, inscritos na matriz predial sob o artigo n.º U – 9… qualificado como prédio urbano tipo “outros”, e não uma qualificação indevida dos equipamentos de construção.
xiv) Estando em causa um acto de inscrição, a impugnação dependeria sempre de prévia interpelação administrativa, nos termos do nº 3 do artigo 130º do CIMI, solicitando a correcção da inscrição junto do chefe do serviço de finanças da área da localização do prédio e este a recuse ou não se pronuncie no prazo de 90 dias contados a partir da data de entrega do pedido, de acordo com o artigo 131º do CIMI (Neste sentido, veja-se, o entendimento sufragado no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido a 2007-10-16, no âmbito do processo n.º 01645/07).
xv) Tal prévia interpelação administrativa in casu não ocorreu, tendo a ora Recorrida reagido judicialmente da inscrição do imóvel na matriz e da avaliação e das liquidações daí decorrentes, pelo que porque se trata da apreciação da qualificação jurídica dos equipamentos do Parque Eólico, inscritos na matriz predial sob o artigo n.º U – 9… qualificado como prédio urbano tipo “outros”, e não uma qualificação indevida dos equipamentos de construção a sua impugnação autónoma dependeria sempre de prévia interpelação administrativa, nos termos do nº 3 do Art.º 130º do CIMI, o que não sucedeu, pelo que se entende que a douta sentença procede a uma errada interpretação e aplicação da factualidade subjacente nos autos, bem como do disposto no n.º 3 do Art.º 130.º do CIMI.
xvi) Quanto à intempestividade, entendeu a sentença ora recorrida que não obstante terem decorrido mais de 4 anos sobre o conhecimento da lesão, uma vez que a lesão é contínua nada impede que seja proposta a acção.
xvii) Destarte, não pode a ora Recorrente conformar-se com tal entendimento, tendo novamente a sentença recorrida efectuado uma errada apreciação e interpretação dos factos não escorando a sua fundamentação em qualquer base legal, doutrinal ou jurisprudencial, em claro e manifesto confronto com a lei, mormente com o disposto no Art.º 145.º n.º 2 do CPPT.
xviii) Resulta indubitavelmente dos autos, que a Requerente foi notificada através do Ofício n.º 7254105 de 04.01.2014, da avaliação patrimonial do prédio urbano classificado como “outros” sob o n.º P 9... da freguesia de Canelas, através da Ficha n.º 003272423 e a coberto do registo postal n.º RY153380802PT (v.d. processo administrativo), tendo no seguimento da interposição do disposto no Art.º 37.º do CPPT, sido validamente notificada em 10.02.2011, ocorrendo a partir dessa data o início do prazo para a aqui Recorrida sindicar contenciosamente o acto administrativo de inscrição oficiosa e de avaliação, quer por via de acção administrativa especial quer por via da notificação da liquidação e consequente reacção através de impugnação judicial.
xix) A aqui Recorrida deixou precludir o prazo de 4 anos após a constituição do direito ou o conhecimento da lesão do interessado.
xx) Entende a sentença recorrida que a lesão é contínua e por esse facto a acção é intempestiva, todavia, questionar-se-á a que lesão a que a sentença alude? Será porventura a lesão correspondente ao acto de inscrição do imóvel na matriz, ou a lesão provocada pela emissão de liquidações de IMI decorrente da prévia inscrição na matriz, e que se renovam anualmente.
xxi) È que a acção tal como se encontra configurada pelo ora Recorrido, pretende sindicar a ilegalidade da inscrição dos equipamentos do Parque Eólico, em sede de incidência objectiva de IMI xxii) Por outro lado, a sentença não escora a sua fundamentação em qualquer base legal, doutrinal ou jurisprudencial, aliás, nem sequer identifica de que forma tal lesão é contínua e em que é que esta se caracteriza.
xxiii) Ao invés, o prazo consignado no n.º 2 do Art.º 145.º do CPPT, para intentar a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária é de 4 anos após a constituição do direito ou o conhecimento da lesão do interessado.
xxiv) Tendo a Requerente tomado conhecimento do acto de inscrição oficiosa na matriz do prédio urbano classificado como “outros” e que deu origem ao artigo n.º P 9..., bem como ao acto de avaliação do aludido prédio em 10.02.2011, o prazo para interpor a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, nos termos do disposto no n.º 2 do Art.º 145.º do CPPT, iniciou-se a partir dessa data pelo que, tendo a presente acção sido interposta em 29.02.2016 – mais de um ano depois, portanto afere-se, que a presente acção é claramente intempestiva.
xxv) Neste, desiderato, recorta-se que a sentença recorrida para além de enfermar de erro de julgamento ao julgar improcedente a excepção de intempestividade, na medida em que não fundamenta qual o acto lesivo em causa que habilita a interposição da acção, e por essa via a sua tempestividade, procede à errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 2 do Art.º 145.º do CPPT.
DAS CONTRA ALEGAÇÕES
xxvi) Inconformada com a douta sentença proferida pelo douto Tribunal a quo, a qual julgou totalmente improcedente a acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, vem a Recorrente interpor recurso, ao abrigo do disposto no Art.º 280.º e seguintes do CPPT, para esse Venerando Tribunal, alegando nulidade da decisão de fixação do valor da causa, ou em erro de julgamento por violação do disposto no n.º 2 do Art.º 34.º do CPTA, aplicável ex vi alínea c) do Art.º 2.º do CPPT, devendo para o efeito o valor ser fixado em € 30.001,00, que o acto de inscrição matricial e o acto de avaliação dos prédios em causa, padecem de ausência ou vício de fundamentação legalmente exigida, nos termos do disposto na alínea c) do Art.º 99.º do CPPT, e que a interpretação das normas constantes no Art.º 2.º, n.º 1, 4.º, 6.º n.º 1 alínea d) e n.º 6 todos do CIMI, tal como efectuada na sentença, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade tributária previsto no Art.º 13.º, 103.º n.º 1 e 104.º n.º 3 todos da CRP, e por fim duplicação de colecta, na medida em que quando os referidos equipamentos foram instalados, já se encontra inscrito o imóvel na matriz.
xxvii) Alega a Recorrente, nulidade da sentença, no que respeita à fixação do valor da causa, por falta de especificação entre os fundamentos e a decisão, porquanto ainda que exista identificação do normativo fundamentador, não é apresentado qualquer facto e/ou racional que permita a apreensão do direito ao caso concreto.
xxviii) Todavia não lhe assiste razão.
xxix) No caso vertente inexiste qualquer a contradição, entre os fundamentos e a decisão no que respeita à fixação do valor da causa, primeiramente, porque a fixação do valor da causa escorou-se em normativo legal, designadamente o n.º 2 do Art.º 97-A do CPPT, aliás normativo legal que foi a própria Recorrente que aquando da propositura, considerou ser um valor indeterminado e invocou para o efeito o citado normativo legal.
xxx) Logo, a decisão de fixação do valor da causa decorre da lei, mormente do n.º 2 do Art.º 97-A do CPPT, e nos limites aí fixados, atendendo ao tipo de acção em causa e do valor a fixar de acordo com a alçada dos tribunais de 1ª instância., pelo que, são espúrios os argumentos da Recorrente no que concerne nulidade da sentença, e à fixação do valor da causa, por falta de especificação e entre os fundamentos e a decisão.
xxxi) Sindica ainda a Recorrente que, o direito que pretendeu ver reconhecido com a acção se subsumia à ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico, e que por esse facto, a qualificação dessa realidade com objecto de tributação em sede de IMI tem como consequência a imediata fixação do seu valor patrimonial, ou seja no valor de € 254.406,00.
xxxii) Todavia, os argumentos sindicados pela ora Recorrente são claramente improcedentes, porquanto, foi a própria Recorrente que no âmbito da propositura da acção e nos termos e para os efeitos no disposto no n.º 2 do Art.º 108.º do CPPT, e no que respeita à fixação do valor da causa, considerou que o valor era “Indeterminado nos do disposto no n.º 2 do artigo 97-A do CPPT.
xxxiii) Ou seja, foi a própria Recorrente que fez alusão na fixação do valor ao disposto no n.º 2 do Art,.º 97-A do CPPT, ou seja, ao valor ser fixado pelo juiz, tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais, para agora, em sede de recurso vir alegar que o valor da causa deveria ser o correspondente ao valor patrimonial fixado em sede de IMI - € 254.406,00 -, ou caso assim não se entenda € 30.001,00 nos termos do disposto n.º 2 do Art.º 34.º do CPTA.
xxxiv) A questão ora suscitada não deixa de se traduzir no exercício de uma posição jurídica que contraria o comportamento anteriormente assumido (vinere contra factum proprium) pois, aquando da propositura da acção a Recorrente e para efeitos de fixação do valor da causa entendeu estar-se perante um valor indeterminado e por esse facto, entendeu ser aplicável o disposto no n.º 2 do Art,.º 97-A do CPPT, para posteriormente, em sede de recurso vir sindicar o valor fixado pelo tribunal a quo, que aplicou na fixação do valor da causa a norma citada.
xxxv) Logo, os argumentos invocados pela Recorrente para além de espúrios, consubstanciam um manifesto abuso de direito.
xxxvi) No que respeita a ser considerado como valor da causa o correspondente ao valor patrimonial fixado em sede de IMI - € 254.406,00 -, apraz referir que a Recorrente intentou ao abrigo do disposto no Art.º 145.º do (CPPT), uma acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, com vista à definição ao reconhecimento de que não integra o âmbito da incidência objectiva de IMI, nos termos do disposto no Art.º 2.º n.º 1, Art.º 4.º, Art.º 6.º n.º 1 alínea d) e n.º 6 todos do CIMI, os equipamentos instalados em S. Pedro, Serra da Boneca, freguesia de Canelas, Concelho de Penafiel, ou seja, a pretensão sustentada na presente acção tal como se encontra configurada pelo Recorrente, reporta-se à apreciação do âmbito da incidência em sede de IMI, dos equipamentos instalados no Parque Eólico.
xxxvii) Logo, para efeitos de fixação do valor da causa estará sempre subjacente um conceito indeterminado, pois visa-se aferir do reconhecimento da incidência objectiva em sede de IMI, dos equipamentos instalados no Parque Eólico e nunca poderá ser correspondente ao valor da avaliação dos equipamentos que compõem o Parque Eólico - € 254.406,00 -.
xxxviii) Tanto mais que, foi a própria Recorrente que em cumprimento do estatuído no disposto no Art.º 108.º n.º 2 do CPPT, fixou para efeitos de valor da causa um valor indeterminado nos termos do n.º 2 do Art.º 97.º- A do CPPT.
xxxix) Por outro lado, encontra-se manifestamente arredada a fixação do valor da causa em € 30.001,00 de acordo com as regras estatuídas no disposto no n.º 2 do Art.º 34.º do CPTA, desde logo, porque não são aplicáveis in casu as regras consignadas para efeitos de fixação do valor da causa, quando estejamos perante um valor indeterminado, estatuídas no CPTA, na medida em que inexiste necessidade de aplicação subsidiária do CPTA, quando e relativamente à fixação de valor indeterminado, o CPPT possui regras próprias para a sua determinação e fixação.
xl) Nesse desiderato, o n.º 2 do Art.º 97.º-A do CPPT, é claro ao definir as regras a observar quando o valor da causa seja indeterminado tendo sido a própria Recorrente que fixou um conceito indeterminado para efeitos de valor da causa nos termos do n.º 2 do Art.º 97.º-A do CPPT, aquando da propositura da acção, pelo que decaem liminarmente os argumentos aduzidos.
xli) Neste desiderato, entendemos que não se verificam os requisitos para a interposição de recurso, pois tendo a sentença recorrida, fixado o valor da causa em € 5.000,00, nos termos do n.º 2 do Art.º 97.º-A do CPPT, e de acordo com o disposto no n.º 4 do Art.º 280.º do CPPT, Art.º 105.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) e Art.º 44.º nº 1 da Lei da Organização do Sistema Judiciário (Lei 62/2013, de 26 de Agosto) tendo sido fixado o valor da causa em € 5.000,00, a sentença não é recorrível, por falta do pressuposto consignado no n.º 4.º do Art.º 280.º do CPPT.
xlii) Quanto ao erro de julgamento decorrente da insuficiência da matéria de facto e anulação nos termos do disposto na alínea c) do Art.º 99.º do CPPT e do Art.º 77.º da LGT, assacado pela Recorrente, apraz referir que jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem uniformemente vindo a entender que a fundamentação do ato é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, sendo que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal compreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato, ou seja, quando o destinatário possa conhecer as razões que levaram o autor do ato a decidir daquela maneira e não outra (cfr. acórdão do STA de 2000.04.13 no âmbito do recurso n.º 31.616; acórdão do STA de 1998-10-28 in Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, págs. 503-512 e acórdão da secção do contencioso do STA de 1993-05-25, proferido âmbito do recurso n.º 27387 Acórdão de 15.02.2007 proferido no âmbito do Proc. n.º 1096/06 de 11.11.2004, Proc. n.º 504/04 de 23.12.2003, Proc. n.º 48.168-A (Pleno) de 30.04.2003, Proc. n.º 46556 (Pleno) de 10.07.2002 e Proc. n.º 274/2002 e de 29.10.2009 proferido no âmbito do Proc. n.º 0778/09)
xliii) Ou seja, a fundamentação é um conceito relativo, que varia consoante o tipo legal de acto administrativo em concreto, havendo que entender a exigência legal em termos hábeis, dada a funcionalidade do instituto e os objectivos essenciais a prosseguir.
xliv) Cumpre assentir que conforme amplamente assente na sentença recorrida quer o acto de inscrição oficiosa na matriz e concomitantemente o acto de avaliação do referido prédio, quer os procedimentos encetados com a Requerente (pedidos de informações e respostas a emails) encontram-se cabalmente fundamentados, dando a conhecer o iter lógico cognoscitivo pelo qual a entidade Recorrida decidiu.
xlv) Como bem reiterou a sentença recorrida, o vício de forma não se confunde com o vício de violação de lei por erro dos pressupostos de facto e de direito, pelo que não poderá confundir-se falta de fundamentação da decisão impugnada com a falta de fundamentação da notificação da decisão.
xlvi) Por outro lado, não é possível afirmar que determinado acto se encontra infundamentado quando, no caso concreto, a motivação contextual permitiu ao seu destinatário ficar a saber as razões de facto e de direito que levaram a Recorrida a tomar a decisão em causa, com aquele sentido e conteúdo, pelo que, a fundamentação é suficientemente clara e inequívoca, tanto mais que a A. por via da presente acção e em face dos argumentos por si explanados ao longo do seu articulado, demonstra ter cabalmente compreendido o quadro fáctico e legal em que assentou o acto da entidade Recorrida, já que rebate, ponto por ponto, toda a sua actuação, falecendo assim in totum os argumentos aduzidos pela Recorrente.
xlvii) Invoca a Recorrente, nulidade da sentença, por contradição entre os fundamentos e a decisão, nos termos e para os efeitos no Art.º 125.º do CPPT, alegando que o parque eólico não preenche o conceito de fracção de território e que a sentença recorrida ao não contestar esse facto, enferma de contradição entre os fundamentos e decisão.
xlviii) Tal argumento é totalmente infundada, pois, nunca estaremos perante uma nulidade da sentença, mas quando muito perante um erro de julgamento, pois, basta uma breve análise dos argumentos expostos para concluir que nem a Recorrente atribui grande enfoque à nulidade assacada.
xlix) No que concerne à qualificação do parque eólico como fracção do território refira-se que o disposto no Art.º 2º do CIMI, é considerado prédio qualquer edifício ou construção dotado de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontre implantado, embora situado numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
l) Recorta-se assim que, o conceito fiscal de prédio afasta-se da noção civilista, ou seja, o Art.º 2º do CIMI estabelece um conceito específico para a determinação da incidência do IMI, mais amplo do que o constante no Art.º 204º do Código Civil, abrangindo não só fracções de território, como os edifícios ou construções nele implantadas, ainda que móveis por natureza, desde que tenham carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios, presumindo-se o seu carácter de permanência quando estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.
li) Conforme entendeu a sentença recorrida, os equipamentos do Parque Eólico, consubstancia uma realidade distinta da do terreno em que está implementado.
lii) Por outro lado, está afecto a um fim não transitório, encontrando-se assente no mesmo local, por um período superior a um ano, pelo que para todos os afectos consubstancia um prédio para efeitos fiscais à luz do estatuído no Art.º 2.º do CIMI, e nesse desiderato, objecto de incidência objectiva de IMI, (aliás conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, proferido a 2011-10-19, no âmbito do processo n.º 0351/11, no qual aquele tribunal considerou, de forma clara, que os edifícios integrantes de uma barragem constituem um prédio urbano susceptível de ser tributado em sede de IMI: Disponível na Internet em
<URL:http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bcaa07319e6544a6802579340032fad2?OpenDocument>.
«I– Não está sujeito a IMI o titular de subconcessão de terreno do domínio público hídrico, uma vez que este não pode considerar-se terreno para construção no sentido conferido pelo Código, não sendo possível aqui interpretação analógica. II– Já nenhum obstáculo existe a que, relativamente às construções efectuadas no terreno e autorizadas no contrato de concessão (subconcessão), estas fiquem sujeitas a IMI, uma vez que o Decreto-Lei nº 468/71 estabelece expressamente que as construções se mantêm na propriedade do concessionário (subconcessionário) enquanto durar a concessão (subconcessão), falecendo assim os argumentos invocados pela Recorrente.
liii) Alega a Recorrente que atenta as várias hipóteses de qualificação previstas no CIMI, apresentadas como fundamento da decisão, não consegue descortinar os factos subsumíveis nas hipóteses normativas, arguindo a nulidade da decisão por falta de especificação da fundamentação de facto e de direito todavia cumpre referir que nunca se subsumiria à nulidade da sentença mas a erro de julgamento.
liv) Desde logo, e como bem sindicou a sentença recorrida, o prédio em questão não se confunde com a qualificação jurídica das pedreiras como prédio rústico defendida pelo STA, pelo que, a qualificação jurídica aí estabelecida repercute-se à qualificação de prédios como rústicos ou urbanos, e não a com a qualificação dos equipamentos como prédio, para efeitos da determinação objectiva em sede de IMI, improcedendo os argumentos da Recorrente
lv) Alega a Recorrente que a sentença incorre em erro na aplicação do direito alegando que a interpretação das normas constantes no Art.ºs 2.º nº 1, 4.º e 6.º do CIMI que conduz à qualificação jurídica dos equipamentos que compõem os parques eólicos, é assistemática e inconstitucional, destarte, são infundados os argumentos invocados pela Recorrente.
lvi) O sentido essencial do princípio da equivalência está em proibir que se introduzam nos tributos comutativos diferenciações alheias ao custo ou ao benefício, assim como em proibir que o valor destes tributos ultrapasse esse mesmo custo ou benefício, sacrificando os respectivos sujeitos passivos em proveito da comunidade, no entanto, in casu o que está subjacente é o princípio da capacidade contributiva e não qualquer contrapartida ou beneficio do sujeito passivo inerente a taxas ou contribuições.
lvii) Por outro lado, e como reiterou a sentença recorrida, para além de não se verificar a alegada inconstitucionalidade, tal questão não contende com a alegada qualificação dos equipamentos dos Parques Eólicos, mas apenas com a sua classificação, improcedendo o raciocínio da Recorrente.
lviii) Alega a Recorrente que omissão de pronuncia por a sentença não s ter pronunciado sobre a duplicação da inscrição matricial, todavia, atente-se que a sentença recorrida começa por aquilatar que a alegada duplicação da colecta deverá ser arguida em impugnação própria e não na acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária.
lix) Por outro lado e conforme refere Jorge Lopes de Sousa, “a duplicação da colecta resulta da aplicação do mesmo preceito legal mais do que uma vez ao mesmo facto tributário ou situação tributária concreta. No entanto, torna-se necessário que a realidade fáctica que está subjacente à pluralidade de liquidações seja a mesma, o que não acontecerá, por exemplo, no caso de liquidações adicionais em que se pretende cobrar um tributo que, indevidamente, não foi liquidado inicialmente.” (cfr. CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, vol. III, pág. 526) acrescentando ainda o mesmo autor que, para que se possa concluir pela duplicação da colecta é essencial que o tributo esteja pago por inteiro, “a referência ao pagamento do tributo por inteiro tem ínsita a exigência de que o tributo devido esteja totalmente pago, o que afasta a possibilidade de invocação da duplicação de colecta quando o tributo apenas está parcialmente pago, na sequência da primeira liquidação, seja por que foi feito o pagamento apenas de parte das prestações, seja por que a primeira liquidação, apesar de estar paga na sua totalidade, não atinge o montante a cobrar em face da segunda liquidação”, cfr. pág. 527.
lx) No caso dos autos não nos encontramos perante duplicação da colecta, na medida em que o aerogerador que foi inscrito na matriz como prédio urbano sob o artigo P U- 9..., encontra-se inserido num prédio rústico de que são proprietários a Junta de Freguesia de Canelas e Z….
lxi) Resulta assim que, para efeitos de IMI nos encontramos perante duas realidades distintas, uma decorrente do prédio rústico propriedade da Junta de Freguesia de Canelas e Z….
lxii) De acordo com o disposto no Artº. 205.º do CPPT, a duplicação da colecta caracteriza-se pelos seguintes vectores:-Unicidade do facto tributário;-Identidade da natureza entre a contribuição ou imposto já pago integralmente e o que de novo se pretende cobrar; -Coincidência temporal entre a incidência do imposto pago e o que de novo se exige (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 25/10/78, Acs. nº.207, pág.391; ac.T.T.2ª. Instância, 12/10/93, C.T.F.373, pág.227 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.4966/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/2/2013, proc.6195/12; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.604; Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.526 e seg.).
lxiii) Inexiste unicidade do facto tributário enquanto pressuposto da relação jurídica tributária - não é uno no caso vertente pois estamos perante duas realidades distintas em termos de IMI, sendo uma referente ao prédio rústico em que se encontra implementado o aerogerador, e outra referente à inscrição do aerogerador como prédio urbano.
lxiv) No mesmo pressuposto inexiste identidade da natureza entre a contribuição ou imposto já pago integralmente e o que de novo se pretende cobrar, atendendo à distinção entre as realidades que se encontram sob incidência de imposto.
lxv) Neste desiderato, improcedem os argumentos da Recorrente.
Nestes termos e nos mais de direito que V.ª Ex.ª doutamente suprirá, deve ser negado provimento ao presente recurso, devendo manter –se a douta sentença recorrida.
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A EÓLICA…, LDA. apresentou contra-alegações em defesa da improcedência do recurso subordinado, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões:
1.ª A douta sentença recorrida julgou improcedente a ação para o reconhecimento de um direito em matéria tributária deduzida com vista à declaração da ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… e que estão na origem da sua inscrição na matriz predial urbana da freguesia de Canelas, concelho de Penafiel, sob o artigo n.º U-9… como prédio urbano do tipo “outros”;
2.ª O Tribunal a quo julgou, ainda, não verificadas as três exceções suscitadas pela Fazenda Pública na sua douta contestação, a saber: falta de idoneidade do meio processual, identificando a ação administrativa especial para impugnar a legalidade do ato de inscrição matricial como o meio idóneo; falta de interpelação administrativa prévia como condição de impugnabilidade do ato de inscrição matricial, e intempestividade da presente ação;
3.ª Quanto à primeira exceção, o Tribunal a quo considerou que a ação para reconhecimento de um direito é adequada à pretensão da ora Recorrida uma vez que “(…) está em causa uma discordância na qualificação jurídica dos factos sujeitos à inscrição do prédio e não um mero erro material da inscrição (…)” (cf. página 2 da sentença recorrida);
4.ª Relativamente à segunda exceção, o Tribunal a quo considerou que não estando em causa uma reclamação da inscrição na matriz, a presente ação não estava dependente da reclamação prevista no artigo 130.º do Código do IMI;
5.ª Quanto à exceção de intempestividade da ação, considerou o Tribunal recorrido reconheceu que a ação foi apresentada “ (…) decorridos mais de 4 anos sobre o conhecimento da lesão”(cf. página 3 da sentença recorrida), pelo que também neste ponto não assistia razão à administração tributária;
6.ª Não se conformando com esta decisão, o Ilustre Representante da Fazenda Pública interpôs o presente recurso reiterando, em suma, o expendido na contestação;
7.ª Todavia, salvo o devido respeito, o presente recurso está votado ao insucesso, uma vez que não se verifica qualquer uma das invocadas exceções, como, aliás, concluiu – e bem – o Tribunal a quo;
8.ª Como resulta do disposto no artigo 145.º, n.º 3, do CPPT e tem sido defendido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, a ação para reconhecimento de um direito em matéria tributária é um meio processual complementar, que pode ser proposto quando os restantes meios contenciosos não assegurem uma tutela efetiva dos direitos e interesses legítimos dos administrados (cf. neste sentido, exemplificativamente, acórdãos de 02.06.2010 e de 19.10.2016, proferidos nos processos n.º 0118/10 e n.º 0600/16, respetivamente);
9.ª Contrariamente ao defendido pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública, não está em causa a inscrição do prédio da matriz, mas a qualificação dos equipamentos em apreço e a subsunção ao conceito de “Outros” (cf. artigo 2.º do Código do IMI) para efeitos de incidência de IMI com efeitos futuros;
10.ª Trata-se, na verdade, de obstar à prática de atos futuros – liquidações de IMI referentes a 2015 e seguintes – que têm como pressuposto a mesma situação de facto e de direito que subjaz ao ato tributário já praticado –liquidação de IMI relativa a 2014–;
11.ª Tendo, assim, presente a pretensão da Autora resulta inequívoco que a presente ação constitui o meio processual adequado, não assistindo razão ao Ilustre Representante da Fazenda Pública, nesta parte;
12.ª Acresce que, contrariamente ao invocado pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública a presente ação não se encontra na dependência do disposto no artigo 130.º do Código do IMI;
13.ª A necessidade de interpelação administrativa prévia a que alude a Fazenda Pública verifica-se única e exclusivamente no caso em que se pretenda a correção de erros materiais das inscrições matriciais e, na situação sub judice, o que se sindica é uma qualificação jurídica, pelo que não é aplicável ao caso em apreço a norma constante do n.º 3 do artigo 130.º do Código do IMI;
14.ª Por fim, contrariamente ao invocado pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública, a presente ação é intempestiva;
15.ª Em primeiro lugar, importa notar que a que a AT faz alusão é a notificação do “Comprovativo da declaração para a inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz (modelo 1) oficiosa”, da qual consta a inscrição provisória (logo, não definitiva) do prédio e a respetiva avaliação (cf. “artigo provisório referido no campo “Elementos da Declaração”);
16.ª De facto, a inscrição matricial enquanto ato administrativo definitivo ocorre quando, nos termos da lei, designadamente do artigo 118.º do Código do IMI, estejam estabilizados todos os elementos que a integram e que lhe permitem produzir os seus efeitos tributários;
17.ª Pelo que, não sendo o ato notificado – a inscrição provisória na matriz – um ato definitivo, não era suscetível de ser impugnado;
18.ª Acresce, sem prejuízo do exposto, que não constitui objeto imediato da presente ação a impugnação da legalidade do ato de inscrição matricial per se, mas antes a ilegalidade da liquidação de IMI do ano de 2014, datada de 27.02.2015, materializada nos documentos de cobrança das respetivas prestações com os n.ºs 2014 25482303, 2014 254383403 e 2014 254382503 e, bem assim, todas as liquidações que sejam emitidas (no futuro), por referência ao mesmo objeto tributário, porquanto cada urna destas liquidações, sendo ilegal, constitui uma lesão efetiva e autónoma do património da Recorrida (qualificação jurídica cuja lesividade se efetiva e reitera numa base anual por via das liquidações de imposto);
19.ª Deste modo, tendo a Recorrida reagido contra o ato lesivo no prazo previsto no artigo 145° do CPPT, qual seja, a liquidação de IMI de 2014, a presente ação é tempestiva, como concluiu e bem o Tribunal a quo.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Ilustre Tribunal suprirá, deve o presente recurso subordinado ser julgado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida, nesta parte, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso principal e julgados improcedentes os fundamentos subjacentes ao recurso subordinado.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, no recurso principal, e pelo Recorrido, no recurso subordinado, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu, desde logo, em erro de julgamento ao fixar o valor da causa em €5.000,00, sendo o primeiro fundamento deste recurso que o seu valor excede a alçada do tribunal recorrido [artigo 629.º, n.º 2, alínea b)], e, consequentemente, o recurso admissível.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provado:
A) A Autora tem por objeto social a produção de energia elétrica, recorrendo à energia cinética dos ventos (artigo 28.º da petição inicial, confissão da autora).
B) Para este efeito, instalou na Serra da Boneca, freguesia de Canelas, Concelho de Penafiel, diversos equipamentos, os quais compõem o Parque Eólico… (artigo 29.º da petição inicial, confissão da autora).
C) O Parque Eólico… é composto, entre o mais, por 1 aerogerador REpower MM 82, de 2MW de potência, instalado desde 05/02/2007 num prédio rústico da Junta de Freguesia de Canelas (artigo 31.º da petição inicial, confissão da autora e fls. 140 verso e 141).
D) A autora instalou os equipamentos que integram aquele parque eólico em terrenos arrendados aos respetivos proprietários (artigos 32.º e 33.º da petição inicial, confissão da autora).
E) Tais imóveis encontravam-se já devidamente inscritos, em nome dos respetivos proprietários - a Junta de Freguesia de Canelas e Z…– na matriz predial rústica da freguesia de Canelas, concelho de Penafiel (artigo 34.º da petição inicial, confissão da autora e fls. 141).
F) Em 07/09/2010 o equipamento referido em C) foi inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Canelas sob o artigo P9…, pela declaração de fls. 140 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
G) Este prédio foi avaliado pela ficha de avaliação constante de fls. 141 verso a 143 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
H) O valor patrimonial tributário do prédio foi fixado em €254.410,00 (fls. 141 verso a 143 verso).
I) A autora foi notificada da avaliação do prédio (fls. 119).
J) A inscrição referida em G) teve origem na informação de fls. 120 verso a 121 verso, complementada pelas informações de fls. 132 a 133 e 134 a 135 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Com relevância para a decisão da causa, inexiste matéria de facto julgada não provada.
3.1.1 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos.
A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa.”

2. O Direito

Na sentença recorrida foi fixado o valor da causa em €5.000,00, com referência expressa ao artigo 97.º-A, n.º 2 do CPPT.
A decisão sobre a fixação do valor da causa surge, portanto, fundamentada por remissão para o n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT. Não obstante, na óptica da Recorrente, nada é referido na sentença recorrida quanto aos fundamentos de facto que presidiram a tal decisão, sendo certo que a própria aplicação da regra prevista na norma invocada pelo Tribunal a quo faz apelo à valoração dois critérios factuais – a complexidade da causa e a situação económica do recorrente.
É por este motivo que entende a Recorrente existir nulidade da decisão de fixação do valor da causa por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, porquanto exista identificação do normativo fundamentador não é apresentado qualquer facto e/ou racional que permita a apreensão da aplicação do direito ao caso concreto (artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC).
Para analisar esta questão, não podemos deixar que efectuar um breve enquadramento circunstancial.
Na petição inicial desta acção foi indicado valor da causa indeterminado nos termos do artigo 97.º, n.º 2 do CPPT, não tendo sido contestada pelo Ministério das Finanças tal indicação – cfr. o n.º 2.º do artigo 108.º ex vi n.º 4 do artigo 145.º, ambos do CPPT. Assim, a falta de impugnação por parte do réu significa que aceita o valor atribuído à causa pelo autor – artigo 305.º, n.º 4 do CPC. No entanto, sem prejuízo deste dever de indicação que impende sobre as partes, que se mostra cumprido nos autos, compete ao juiz fixar o valor da causa – cfr. artigo 306.º, n.º 1 do CPC. Foi neste circunstancialismo que o meritíssimo juiz a quo fixou o valor da acção, acolhendo, portanto, a indicação das partes.
Efectivamente, o artigo 97.º-A, n.º 2 do CPPT estabelece que “nos casos não previstos nos números anteriores, o valor é fixado pelo juiz, tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais.”
Como veremos infra, actualmente, esse valor é €5.000,00; pelo que foi fixado pelo tribunal recorrido precisamente o valor máximo previsto no mencionado artigo 97.º-A.
Neste contexto, não vislumbramos qualquer necessidade de, in casu, na decisão de fixação do valor da causa haver uma ponderação da complexidade da causa e da situação económica do recorrente, dado que a Recorrente somente se insurge contra o facto de tal fixação reflectir uma inadmissibilidade de recurso.
Efectivamente, a Recorrente funda este recurso, primeiramente, na nulidade da decisão que fixou o valor da causa, referindo-se ao artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC. Na verdade, as causas de nulidade da sentença aplicam-se, com as necessárias adaptações aos despachos – cfr. artigo 613º, n.º 3 do CPC, estando aqui suscitada a falta de especificação dos fundamentos, de facto e de direito, que justificaram a decisão.
Para que a decisão padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da decisão, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade.
Ora, na situação em apreço, a decisão de fixação do valor não enferma de nulidade, dado que surge na sequência da indicação das partes, não consubstanciando, por isso, qualquer decisão surpresa, na medida em que somente existe uma concretização do disposto na norma invocada pela própria Recorrente na sua petição inicial, acolhendo o limite máximo aí previsto.
Para a eventualidade de se entender que a decisão não enferma de nulidade, como efectivamente não se verifica, a Recorrente aponta, igualmente, erro de julgamento na fixação do valor da causa, não obstante ter sido ela própria a indicar na petição inicial o disposto no artigo 97.º-A, n.º 2 (e o disposto no artigo 12.º, n.º 1, alínea f) do Regulamento das Custas Processuais, para saber qual a base tributável para efeitos de pagamento da taxa de justiça – nos processos cujo valor é fixado pelo juiz da causa com recurso a critérios indeterminados e não esteja indicado um valor fixo).
Na determinação do valor da causa, a Recorrente sustenta que o Tribunal poderia ter seguido um de dois critérios: (i) ou fixava o valor da causa por referência ao valor patrimonial tributário do prédio cuja qualificação jurídica enquanto objecto de IMI é questionada, aplicando por analogia a regra prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, (ii) ou assumia o critério residual previsto no n.º 2 do artigo 34.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), fixando o valor da causa em € 30.001,00 (cf. n.º 4 do artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto).
Ora, é a Recorrente que afirma que a jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Assim sendo, se o CPPT se refere à determinação do valor em processos que decorram nos tribunais tributários, como é a presente acção de reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, perante norma específica que regula a matéria, não haverá necessidade de recorrer a um critério residual previsto no CPTA. Nesta conformidade, é de afastar, desde logo, o disposto no artigo 34.º, n.º 2 desse diploma.
O direito que a Autora pretende ver reconhecido com a presente acção é a ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… e que estão na origem da sua inscrição na matriz predial urbana de Canelas, concelho de Penafiel, sob o artigo n.º U-9…, como prédio urbano do tipo “outros” nos termos conjugados do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, com todos os devidos e legais efeitos, designadamente, a anulação da liquidação de IMI identificada na petição inicial e, bem assim, de todas as que sejam emitidas na pendência da presente acção.
A Recorrente optou, portanto, por esta acção, no pressuposto que esta questão jurídica se repetirá no tempo, para reconhecimento que a propriedade dos equipamentos instalados em S. Pedro, Serra da Boneca, freguesia de Canelas, concelho de Penafiel, inscritos na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 9…, não integra o âmbito da incidência objectiva do Código do IMI.
É verdade que a qualificação de uma dada realidade, como objecto de tributação em sede de IMI, tem variadas consequências, assim como tem como pressuposto a sua inscrição na matriz predial.
Como é sabido, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a esclarecer que a susceptibilidade de impugnação autónoma do acto de inscrição oficiosa na matriz da realidade física do aerogerador como prédio urbano, decorre da lesividade do acto, tanto assim que, caso o contribuinte não tenha contra ele reagido no momento em que ele surgiu e se tornou lesivo, pode ainda vir a atacar esse mesmo acto quando ele se insira num procedimento de liquidação e venha a determinar um acto posterior de liquidação.
Ou seja, quando se faz uma inscrição oficiosa na matriz de um bem que o contribuinte entende que não é um prédio e não pode, por isso ser inscrito, como tal, na matriz, pode imediatamente impugnar essa inscrição por ela ser, em si mesma, susceptível de vir a determinar a liquidação de um ou vários tributos. Mas, seguidamente, se o bem foi avaliado e lhe foi atribuído um valor, pode impugnar esse acto de avaliação e impugnar o tributo que venha a ser liquidado com base nessa avaliação.
Como se refere no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Novembro de 2013, proferido no rec. n.º 1725/13 –, «o acto de inscrição oficiosa na matriz de uma determinada realidade física como prédio reconduz-se a acto imediatamente lesivo dado que provoca uma alteração significativa na esfera jurídica da recorrente, daí a admissibilidade de ser formulado pedido de suspensão da sua eficácia (…),o facto de a imediata lesividade de tal acto permitir, querendo, a sua impugnação autónoma, não obsta a que, não o tendo sido, possa ainda ser sindicado em sede de impugnação da liquidação do tributo «…».e ainda como se refere no acórdão do STA, proferido em 8/01/2014, no recurso nº 01685/13, «as eventuais ilegalidades praticadas nos actos prévios de fixação do valor patrimonial tributário do prédio, como o de inscrição oficiosa na matriz de determinada realidade física como prédio, podem ser objecto de impugnação autónoma – através de acção administrativa especial – ou invocadas em impugnação de acto tributário ou em matéria tributária posterior, como o de segunda avaliação.»
Ora, ainda que, como referido supra, ao acto de inscrição na matriz esteja inelutavelmente ligado o acto de fixação do valor patrimonial do “prédio” inscrito, todavia, não se confundem, tanto assim que a respectiva legalidade pode ser questionada autonomamente.
Assim, embora a fixação do valor patrimonial do prédio (€ 254.406,00, no presente caso) não se confundir com qualquer das realidades referidas, tem como consequência mediata, não apenas a sua tributação em sede de IMI (no valor anual referente a 2014 de € 786,13), pelo tempo em que se mantiver a sua propriedade às taxas que a cada tempo vierem a ser definidas, mas também, e desde logo, a tributação da sua potencial alienação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) (cf. n.º 2 do artigo 1.º do Código do IMT) e/ou em sede de Imposto do Selo (cf. n.º 6 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo e verba 1.1 da respectiva tabela geral).
Nestes termos, a Recorrente, claramente, não atacou qualquer das realidades referidas, tendo escolhido uma acção de reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, no pressuposto abrangente que todas estas questões se repetirão no tempo, sendo factores que poderão condicionar uma futura operação de alienação.
Ora, se a Recorrente optou por não impugnar liquidação de IMI, não será possível aplicar para determinação do valor da acção o artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT.
De igual forma, se a Recorrente não questiona o acto de fixação do valor patrimonial do prédio, não será possível aplicar para determinação do valor da causa o artigo 97.º-A, n.º 1, alínea c) do CPPT.
A Recorrente também não impugnou autonomamente o acto de inscrição oficiosa na matriz da realidade física do aerogerador como prédio urbano, onde já seria aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT.
Nesta conformidade, não estamos perante qualquer situação prevista no n.º 1 do artigo 97.º-A. Nas situações não previstas no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT deve aplicar-se o n.º 2 do mesmo artigo, o qual determina que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais”.
Conclui-se, assim, que o valor da acção proposta não poderia ser determinado nos termos do artigo 97.°-A, n.º 1, alínea c), do CPPT, mas antes deve, como foi, ser determinado em conformidade com o artigo 97.°-A, n.º 2, do CPPT.
É destituído de sentido aplicar analogicamente o artigo 97.º-A, n.º 1, alínea c) do CPPT se existe norma expressa para as situações não previstas no n.º 1: o n.º 2 do mesmo artigo (pelo que não existe lacuna a preencher).
Destarte, resultando manifesto que a acção em apreço teve por único fundamento e causa de pedir o reconhecimento da ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico…, somos de entendimento que não assiste razão à Recorrente, impondo-se manter a decisão de fixação do valor da causa, em conformidade com o regime vertido no n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT.

Aqui chegados, resta constatar, reiterando, que o valor da causa foi fixado em €5.000,00, correspondendo ao valor máximo permitido nos termos do artigo 97.º-A, n.º 2 do CPPT, e que a petição inicial foi apresentada em 29/02/2016.
Nos termos do artigo 288.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o relator não conhecerá do recurso se entender que lhe faltam manifestamente os respectivos pressupostos processuais.
Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância – cfr. artigo 280.º, n.º 4 do CPPT.
Ora, de harmonia com o disposto no artigo 105.º da Lei Geral Tributária (LGT), na redacção que lhe foi dada pela Lei de Orçamento de Estado para 2015 (Lei n.º 82-B/2014 de 31/12), e artigo 280.º, n.º 4 do CPPT, na redacção da mesma Lei n.º 82-B/2014, a alçada do Tribunal Tributário de 1.ª Instância corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância, ou seja, €5.000,00 – cfr. artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26/08.
Esta alçada foi prevista neste n.º 4 do artigo 280.º apenas para os processos de impugnação judicial e de execução fiscal, mas foi fixada no mesmo montante para a generalidade dos processos da competência dos tribunais tributários pelo artigo 105.º da Lei Geral Tributária.
Apesar da fixação da alçada, deverá entender-se que são recorríveis decisões proferidas em processos de valor inferior à alçada, nos casos em que no Código de Processo Civil se admitem recursos independentemente do valor da causa.
Contudo, escalpelizando os fundamentos do presente recurso, não só não se enquadra em nenhuma dessas situações, como não está em causa o disposto no artigo 280.º, n.º 5 do CPPT.
Importa salientar que a admissibilidade de recurso, por efeito das alçadas, é regulada pela lei em vigor à data em que seja instaurada a acção – cfr. artigo 6.º, n.º 6 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e artigo 24.º, n.º 3 da Lei de Organização e do Funcionamento dos Tribunais Judiciais (LOFTJ).
Ora, a presente acção foi deduzida em 29/02/2016 e, nessa data, o valor da alçada dos tribunais tributários de primeira instância era de €5.000,00 (desde 01/01/2015).
Portanto, à data da instauração do presente processo judicial, em 29/02/2016, o valor da alçada dos tribunais tributários encontrava-se já fixada em € 5.000,00 face ao aumento da alçada definida para os tribunais tributários de 1.ª instância pela Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2015 (Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro), que conferiu nova redacção ao artigo 105.º da LGT, no qual se passou a estabelecer que "A alçada dos tribunais tributários corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância" e à norma contida no n.º 4 do artigo 280.º do CPPT, que passou a estabelecer que “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância”.
Por conseguinte, com a entrada em vigor da referida Lei n.º 82-B/2014, em 01 de Janeiro de 2015, ocorreu a revogação tácita da norma contida no n.º 2 do artigo 6.º do ETAF, que dispunha o seguinte: «A alçada dos tribunais tributários corresponde a um quarto da que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância», sabido que a lei posterior revoga a anterior não só quando expressamente o declare, como, também, como é caso, seja com ela incompatível – cfr. artigo 7.º, n.º 2, do Código Civil.
Assistiu-se, assim, a um significativo aumento da alçada e, portanto, da possibilidade geral de recurso ordinário, já que anteriormente a alçada dos tribunais tributários correspondia a ¼ da estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância, pelo que não cabia recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassasse €1.250,00.
E a circunstância de o ETAF ter sido republicado em 02/10/2015 (face às alterações introduzidas pelo Dec. Lei n.º 214-G/2015 aos artigos 1º, 2º, 4º, 9º, 13º, 14º, 17º, 24º, 29º, 40º, 41º, 43º, 44º, 46º, 48º, 49º, 51º, 52º e 74º) não significa que esse artigo 6.º tenha visto a sua vigência reestabelecida, isto é, tenha recuperado a sua vigência e operado a revogação das normas que tacitamente a haviam revogado.
Com efeito, o legislador que procedeu à alteração das referidas normas do ETAF não manifestou intenção de mexer na matéria das alçadas ou de proceder à alteração da norma que constava do artigo 6.º do ETAF e que, como se viu, fora entretanto revogada (o legislador não o incluiu entre os preceitos do ETAF de 2002 que quis alterar), nem existe qualquer disposição no sentido da restauração da sua vigência ou, sequer, de revogação da lei revogatória e de repristinação da norma contida nesse artigo 6.º do ETAF – cfr. Acórdão do STA, de 24/02/2016, proferido no âmbito do processo n.º 01291/15.
Assim, considerando que foi fixado o valor da causa em €5.000,00, é forçoso concluir não ser admissível o presente recurso quanto às restantes questões colocadas no recurso principal, uma vez que o valor da acção não excede o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância – cfr. artigo 280.º, n.º 4 do CPPT.
Logo, tal inviabiliza a tomada de conhecimento do presente recurso principal por este Tribunal Central Administrativo Norte, ficando, consequentemente, prejudicado o conhecimento do recurso subordinado – cfr. artigo 288.º, n.º 2 do CPPT e artigo 655.º do Código de Processo Civil.

Consciente da irrecorribilidade da sentença recorrida, a Recorrente defende que a aplicação do n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT, nos termos em que é feita pelo Tribunal a quo, é também inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, na sua vertente de acesso aos tribunais e do princípio da igualdade previstos nos artigos 13.º e 20.º da CRP. Esta inconstitucionalidade foi expressa, principal e autonomamente invocada, designadamente, nos termos e para os efeitos dos artigos 69.º e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional.
Saliente-se que o direito ao duplo grau de jurisdição não se traduz no atropelo da lei, ou seja na ultrapassagem das normas que regulam esse direito.
«A jurisprudência do Tribunal Constitucional já, por várias vezes, afirmou que em matéria de direito ao recurso jurisdicional, não resulta da Constituição, em termos genéricos, nenhuma garantia do duplo grau de jurisdição e que tal direito não faz parte integrante e necessária do princípio constitucional do acesso ao direito e à justiça, expressamente consagrado no artigo 20.º da Constituição» (cfr. os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 239/97, 510/2003, 44/2008, 339/2011 e 396/14 todos in www.tribconstitucional.pt, e, bem assim Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo I, 2.ª edição, nota XXI ao artigo 20.º, pp. 449 a 452, e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4.ª edição revista, nota XIV ao artigo 20.º, p. 418).
Como ficou sublinhado no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 396/14, de 07.05.2014, «o direito que o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição a todos assegura de “acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos” consiste no “direito a ver solucionados os conflitos, segundo a lei aplicável, por um órgão que ofereça garantias de imparcialidade e independência, e face ao qual as partes se encontrem em condições de plena igualdade no que diz respeito à defesa dos respectivos pontos de vista (designadamente sem que a insuficiência de meios económicos possa prejudicar tal possibilidade)”. Da previsão constitucional decorre ainda que a tutela jurisdicional dos direitos e interesses legalmente protegidos deve ser efetuada “mediante processo equitativo” e cujos procedimentos possibilitem uma “decisão em prazo razoável” e sejam “caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos” (n.ºs 4 e 5 do referido artigo 20.º da CRP).
A exigência de um duplo grau de jurisdição apenas está expressamente consagrada no âmbito do processo penal e relativamente a decisões condenatórias ou que afetem a liberdade do arguido (artigo 32.º, n.º 1, da CRP). Para além disso, esse direito é considerado por alguma doutrina e jurisprudência, embora com fundamentação não inteiramente coincidente, como inerente à proteção contra decisões jurisdicionais que imponham restrições a direitos, liberdades e garantias pessoais.
Fora desses domínios específicos, o legislador ordinário goza de ampla margem de conformação do direito ao recurso, podendo regular diversamente a possibilidade e o modo de impugnação das decisões jurisdicionais».
No fundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem reafirmado que não existe um ilimitado direito de recorrer de todas as decisões jurisdicionais, nem se pode, consequentemente, afirmar que a garantia da via judiciária, ou seja, o direito de acesso aos tribunais, envolva sempre, necessariamente, o direito a um duplo grau de jurisdição (com excepção do processo penal) – vide Ac. 510/2003, de 28.10.2003 (Diário da República II Série, de 6.1.2004).
Neste mesmo sentido tem sido a posição tomada pelo Supremo Tribunal Administrativo sobre a questão, como decorre dos Acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo proferidos nos processos n.º 1960/03 e n.º 603/09 e ainda do Acórdão da Secção de Contencioso Tributário de 11/07/2012, proferido no recurso n.º 509/12 (recurso de revista excepcional).
Concluindo, a não admissibilidade do recurso, in casu, não afronta o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa nem o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, já que a Constituição não impõe a existência de um segundo grau de jurisdição.
Como tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional, a nossa Lei Fundamental não contém preceito expresso que consagre o direito ao recurso para um outro tribunal, nem em processo administrativo/tributário, nem em processo civil, pelo que o legislador apenas não pode suprimir ou inviabilizar globalmente a faculdade de recorrer. Como se pode ler no seu acórdão n.º 36/2009, de 20/01/2009, «(...) relativamente ao direito de acesso aos tribunais, constitui reiterado entendimento deste Tribunal o de que do artigo 20.º, n.º 1, da CRP não decorre um direito geral a um duplo grau de jurisdição (…)
Como a Lei Fundamental prevê expressamente os tribunais de recurso, pode concluir-se que o legislador está impedido de eliminar pura e simplesmente a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática. Já não está, porém, impedido de regular, com larga margem de liberdade, a existência dos recursos e a recorribilidade das decisões (cf. os citados Acórdãos nºs 31/87 e 65/88, e ainda n.º 178/88 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 12.º, p. 569); sobre o direito à tutela jurisdicional, ainda Acórdãos n.º 359/86 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 8.º, p. 605), n.º 24/88 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 11.º, p. 525) e n.º 450/89 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 13.º, p. 1307).».
Por tudo o exposto, impõe-se negar provimento ao recurso da decisão respeitante ao valor da causa, manter que o seu valor não excede a alçada do tribunal de que se recorre, não tomar conhecimento das restantes questões colocadas no recurso principal, por inadmissibilidade legal do mesmo, e julgar prejudicado o conhecimento do recurso subordinado.

Conclusões/Sumário

I - A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
II - Nas situações não previstas no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT deve aplicar-se o n.º 2 do mesmo artigo, o qual determina que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais”.
III - O artigo 280.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e o artigo 105.º da Lei Geral Tributária estabelecem a alçada dos tribunais tributários, correspondendo à alçada fixada para os tribunais judiciais de 1.ª instância.
IV - A alçada dos tribunais tributários de 1.ª instância é de €5.000,00 para os processos iniciados a partir de 1 de Janeiro de 2015, face à Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro, que conferiu nova redacção ao artigo 105.º da LGT, no qual se passou a estabelecer que "A alçada dos tribunais tributários corresponde àquela que se encontra estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância" e à norma contida no n.º 4 do artigo 280.º do CPPT, que passou a estabelecer que “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância”.
V - A Constituição da República Portuguesa prevê expressamente os tribunais de recurso, por isso, o legislador está impedido de eliminar pura e simplesmente a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática. Já não está, porém, impedido de regular, com larga margem de liberdade, a existência dos recursos e a recorribilidade das decisões.
VI - Não existe um ilimitado direito de recorrer de todas as decisões jurisdicionais, nem se pode, consequentemente, afirmar que a garantia da via judiciária, ou seja, o direito de acesso aos tribunais, envolva sempre, necessariamente, o direito a um duplo grau de jurisdição (com excepção do processo penal).
VII - A inadmissibilidade de recurso, em determinadas situações previstas legalmente, não afronta o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa nem o direito de acesso à tutela jurisdicional efectiva, já que a Constituição não impõe a existência de um segundo grau de jurisdição.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso da decisão respeitante ao valor da causa, manter que o seu valor não excede a alçada do tribunal de que se recorre, não tomar conhecimento das restantes questões colocadas no recurso principal, por inadmissibilidade legal do mesmo, e julgar prejudicado o conhecimento do recurso subordinado.
Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 08 de Fevereiro de 2018
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro