Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00487/07.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/23/2023
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Tiago Miranda
Descritores:IRC; CORRECÇÕES TÉCNICAS;
MENOS VALIAS;
OUTROS CUSTOS ELEGÍVEIS;
Sumário:
I – O artigo 640º nºs 1 e 2 do CPC faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente o que em seu entender são factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, a decisão que devia ter sido tomada e os meios de prova determinantes, sob pena de rejeição do recurso.

II – O processo judicial tributário, conforme artigos 96º e sgs do CPPT é essencialmente um contencioso de mera legalidade, conducente à declaração de nulidade ou anulação de actos tributários. Não se trata assim, nele, de dirimir ex novo a relação jurídica tributária controvertida, no sentido de se decidir se era devido, relativamente a 2004, o imposto liquidado, mas sim de apreciar a validade formal e substancial das liquidações impugnadas, em função dos seus fundamentação e objecto.

III – Neste pressuposto é exigível que, num processo de impugnação de liquidações adicionais motivados por uma inspecção tributária, a emissão do relatório final desta e o teor do mesmo, ao menos na parte relevante enquanto fundamentação do acto impugnado, figure na discriminação dos facos provados.

IV. A imprescindibilidade de determinados custos para a obtenção de proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, nos termos previstos no artigo 23º nº 1 do CIRC, não é um facto a provar, mas uma conclusão a retirar, por indução, de factos concretos que, se tal já não decorrer da documentação contabilística, cumpre ao contribuinte alegar e provar – no procedimento, como no processo (artigo 74º nº 1 da LGT.

V – O abate de participações socias ao activo tão só por o contribuinte as considerar de valor nulo ou em sociedades extintas, sem um facto, a documentar na contabilidade, ou, se não, a alegar e provar no procedimento pelo contribuinte (artigo 74º nº 1 da LGT) de que resulte o desaparecimento dessas participações ou do seu valor, é inadmissível.

VI – Conforme decorre do Artigo 23º nº 1 alª i) do CIRC (redacção em 2004), para relevar como custos, as menos valias têm de ser subsumíveis, em concreto, ao conceito de “indispensabilidade para a geração de proveitos ou a manutenção da fonte produtiva”, enunciado no corpo desse mesmo artigo.

VII - Ao objecto, que é universal; do IRC não interessa tanto a conformidade da fonte do rendimento tributável com um determinado CAE e com o pacto social, mais sim a tributação de todo o rendimento que não deva ser isento ou excluído da tributação por força de Lei (cf. artigo 23º nº 1 do CIRC), pelo que é insusceptível de prejudicar a subsunção dos custos com participações sociais ao conceito de indispensabilidade, o facto de a Recorrente não estar inscrita como sujeito passivo no CAE correspondente à gestão de participações nem ter esta actividade contemplada no seu contrato social.

VIII - Tratando-se de uma venda efectiva de participação social, sem haver notícia de qualquer negócio dissimulado, a AT não tinha como se valer da cláusula anti abuso do nº 2 do artigo 38º da LGT, na redacção original deste número (introduzida pela lei nº 100/99 de 26/7), pelo que a desconsideração do custo da menos valia realizada com a venda da sociedade participada tinha sempre de fundar-se, não numa qualquer ineficácia fiscal da transmissão, mas na alegação de uma manifesta dispensabilidade ou prejudicialidade do negócio, para a manutenção da fonte produtiva da Impugnante ou para a sua capacidade de gerar proveitos.

IX - Este Tribunal não vê, in casu, que seja manifesta e evidente essa falta de relação de sentido e utilidade na transmissão, pela impugnante, por preço abissalmente inferior ao de aquisição, da totalidade do capital de uma empresa sua participada em calamitoso estado financeiro, bem como dos direitos por prestações sociais suplementares e crédito por suplementos sobre a mesma participada, por preço também abissalmente inferior, em ordem à manutenção da fonte produtiva e a geração de proveitos pela Impugnante, pelo que os correspondentes menos valia e custos comuns, respectivamente, deviam ter sido aceites pela AT.

X – À determinação do valor da menos valia realizada com a venda dos direitos decorrentes das prestações suplementares e do custo correspondente
à cessão dos créditos por suprimentos à mesma participada, não obstava o facto de estas cessões terem tido um preço global, pois impunha-se atribuir a cada cessão a parte do preço proporcional ao valor de cada uma, sob pena de se ter de tratar como proveito dois comprovados custo de mais de 16 e de 20 milhões, respectivamente.

XI – Na redacção do nº 3 do artigo 42º do CIRC, anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, só as mais e menos valias realizadas com a transmissão onerosa de partes de capital concorriam apenas em metade do seu valor para a formação da matéria tributável por força dessa norma. As restantes mais e menos valias, entre elas aa realizadas com a transição onerosa dos direitos gerados por prestações suplementares concorriam em 100%, conforme a regra geral do artigo 23º nº 1.

XI – Os custos com a cessão do crédito por suprimentos não são uma menos valia, porque os suprimentos, dado que têm a natureza de um empréstimo, reembolsável e remunerável, integram, não o activo imobilizado, mas sim o activo circulante (cf. nº 1 do artigo 43º do CIRC a contrario sensu). Como tal, a serem dedutíveis, são-no na totalidade.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
[SCom01...], SA”, pessoa colectiva n.° ...14, com sede na ..., Largo ..., ..., ..., interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 9 de Julho de 2009 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Penafiel, que julgou parcialmente improcedente a impugnação, proposta relativamente as liquidações adicionais de IRC do ano de 2004 e juros compensatórios nos valores a pagar e respectivos juros compensatórios nas importâncias de 7.451.864,75 € e 575.556,93 €, respectivamente.

Rematou a sua alegação com as seguintes conclusões:


«C. DAS CONCLUSÕES
1. O acto de liquidação impugnado e mantido pelo Tribunal a quo assenta, em relação à correcção consubstanciada na desconsideração da menos-valía valia fiscal, no valor de € 957.920,40» apurada na sequência da alienação das participações sociais da sociedade [SCom02...], (SIC) e da perda, no valor de € 37.435.081,64, apurada na sequência da alienação de prestações suplementares e da cessão de créditos por suprimentos, realizadas pela recorrente à sociedade “[SCom03...], SA”, numa série (esparsa e desconexa) de suposições, às quais a recorrente — mesmo sabendo que as mesmas não constituem propriamente a Fundamentação do acto de liquidação e, portanto, nos termos do art.° 77.° da LGT, lhe não poderiam ser oponíveis — não quis deixar de se referir e de sumariamente afastar: da prova (documental e testemunhal) produzida nos presentes autos, entende a recorrente que resultaram demonstrada e esclarecida toda a factualidade por si descrita na petição inicial (designadamente a constante dos artigos 1.° a 7.°, 11.° a 52,°), bem como nas alegações finais apresentadas na sequência da audiência de inquirição de testemunhas.

2. Por sua vez, o Tribunal a quo veio ainda introduzir algumas conclusões de facto que não têm, manifestamente, qualquer expressão na realidade dos factos.

3. Com efeito, da extensa matéria de facto dada como provada e não provada, são múltiplos os equívocos e erros patenteados na sentença:
4. (i) o Tribunal a quo não observou um dos princípios estruturantes do contencioso tributário, como seja o principio da imediação da prova. Não foram devidamente valorados todos os elementos susceptíveis de influenciar a convicção do tribunal c também por esta razão não se pode conceder no juízo que foi sendo formulado a propósito da credibilidade do depoimento da testemunha Dr. «AA».
5. (íi) por outro lado, a propósito da contrapartida auferida pela recorrente pela cedência dos créditos de prestações suplementares e de suprimentos, não andou bem o Tribunal ao afirmar que não é possível apurar, em concreto, o valor da venda correspondente a cada um de tais créditos. Não só tal é possível — como bem resulta da ausência de disposição expressa, esse valor é o que resulta da respectiva proporção – como o efeito útil de tal apuramento é irrelevante para o apuramento da real perda experimentada. Sendo certo que uma solução como aquela a que o Tribunal nos conduz — que se traduz numa perda de 0 — é clamorosamente atentatória do princípio da capacidade contributiva e da tributação pelo lucro real.
6. (iii) Também sobre a situação financeira “sã e estável” da sociedade [SCom04...], importa considerar, como bem resultou do depoimento do Dr. «AA», que essa sanidade e estabilidade se verificavam no sentido em que a sociedade estava a cumprir com os seus compromissos, não obstante a sua realidade de facto corresponder à de uma sociedade com extremas dificuldades.
7. (iv) Confundiu-se o Tribunal a quo ao afirmar que “Entre a data da cisão e a da alienação a impugnante ainda conseguiu cobrar alguns créditos que detinha sobre a [SCom04...]”. A prova produzida sobre esta matéria não é no sentido de que” a impugnante conseguiu cobrar créditos que detinha sobre a [SCom04...] mas antes no sentido de que, ainda sob a gestão da impugnante, a [SCom04...]” conseguiu cobrar alguns créditos que detinha e que eram de cobrança muito difícil (depoimento do Eng. «BB»).
8. (v) Ao contrário do que sustenta o Tribunal na sentença ora em crise, não podem subsistir quaisquer dúvidas de que a recorrente se dedicava à gestão dc participações, traduzindo-se esta actividade no exercício do controle da gestão das dezenas de sociedades comerciais em que detém uma participação social, e na aquisição e alienação de participações.
9. (vi) Do mesmo modo que não está demonstrado que, à data dos factos ora em crise, não constava do Pacto Social da recorrente a actividade de gestão de participações. Com efeito, o parágrafo primeiro do Artigo Quarto do Pacto Social é taxativo: “A sociedade pode adquirir e alienar participações em sociedades de direito nacional ou estrangeira, com objecto igual ou diferente do referido no artigo segundo, em sociedades, agrupamentos complementares de empresas, agrupamentos europeus de interesse económico, consórcios e associações em participação.”.
10. (vii) Sobre os motivos da cisão da [SCom02...], o Tribunal julga como não provado que os motivos alegados foram os únicos. O que a recorrente sempre afirmou — e aqui reitera — é que esses foram os principais e mais relevantes.
11. (viii) Por sua vez, no que respeita à venda propriamente dita da [SCom02...] à “[SCom03...]”, declara o Tribunal a quo como não provado que essa era a única solução que permitia recuperar, ao menos em parte, o investimento realizado. Ora, ficou claro que a alienação da [SCom02...] à “[SCom03...], SA”, foi a única solução concreta que permitiu recuperar, ao menos em parte, o investimento realizado, Pode-se afirmar que haveria outras hipóteses sob o ponto de vista teórico, mas a verdade c que, não obstante a postura activa da recorrente, nenhuma outra solução se apresentou, com excepção da alienação à “[SCom03...], SA”.
12. (ix) Já no que respeita ao negócio propriamente dito, o Tribunal a quo foi lesto a considerar que os preços acordados de cedência à “[SCom03...], SA” não se afiguram de molde a constituírem um negócio favorável à recorrente. Também aqui não lhe assiste razão. Contrariamente ao que entendeu o Tribunal a quo, os preços acordados de cedência à “[SCom03...], SA” afiguraram-se de molde a constituírem um negócio favorável à recorrente, conforme resultou, de forma verosímil e coerente, da prova produzida. A que acrescerá, certamente, a circunstância de o negócio ter permitido libertar meios financeiros, ainda que com perdas instantâneas, para os afectar a outras operações geradoras de ganhos.

13. Em bom rigor, todos os factos elencados em sede de alegações finais escritas apresentadas pela ora recorrente no Tribunal a quo são justamente aqueles que se tem por provados, dando-se, por isso, aqui por reproduzidos. E dúvidas não subsistem de que, face a tais erros de julgamento quanto à matéria de facto, não resta senão decidir pela anulação da sentença recorrida.

14. Já no plano da fundamentação de direito, também não assiste razão ao Tribunal a quo.
VEJAMOS;
15. O primeiro argumento invocado pelo 'Tribunal — inovando face à fundamentação da Administração fiscal — é justamente o de que os custos em questão emanam de actos (a actividade de. compra e venda, e gestão de participações) que, não obstante a sua empresarialidade, não são próprios da actividade comercial, industrial ou produtiva da recorrente porque extravasam o seu fim ou objecto social.

16. Para lá do erro de facto já assinalado, não consta do art.° 23º do CIRC uma indexação ao objecto social ou estatutário, com vista a sustentar que todos os actos, mesmo considerados empresariais, que aí não se subsumam expressamente não são dedutíveis. O interesse da sociedade não se encontra absolutamente refém do literal objecto social, pelo contrário, interesse da sociedade afere-se em função da actividade legal e efectivamente exercida. E muito menos se afere em função do CAE.

17. Com efeito, o objecto da sociedade pode abranger uma ou mais actividades principais, actividades secundárias e actividades acessórias - e nestas se incluem, no presente caso, a actividade dc gestão de participações. Pelo que, mesmo que fosse de acolher a interpretação do Tribunal a quo, a verdade é que, no caso ora em juízo, em tal conceito de objecto social se subsume a aquisição, detenção e alienação de participações e de créditos.

18. Por outro lado, é totalmente infundado o argumento do Tribunal a quo de que estamos em presença dc uma operação empresarial insólita, designadamente tendo por base as relações existentes entre alienante e adquirente e a contestação com base nessa mesma suspeição dos critérios determinantes do preço do negócio em crise,

19. Não estamos simplesmente diante de uma mera disputa de factos — em que a recorrente sublinha que os mesmos afastam liminarmente tal suspeita — mas antes perante um grosseiro erro dc direito. O art.° 23.° do CIRC não habilita a Administração fiscal, ou o Tribunal, a promover correcções dc preços. Isto é, a dedutibilidade das perdas de um contribuinte não se afere em função de se terem praticado bons ou maus preços, de ter sido um bom ou mau negócio. E, por ser assim — só podia ser assim! — o art.º 23.° não permite nem faculta instrumentos legais tendentes à correcção de preços. Noutros lugares, porém, como é o caso do art.º 58" do CIRC em matéria de preços de transferência, o legislador cuidou de fixar requisitos e critérios de correcção de preços. Fê-lo mediante a consagração de um regime que exige primeiro a existência de relações especiais e, depois, que nessas relações especiais se pratiquem, grosso modo, condições de mercado. No caso ora em juízo, não estamos sequer em presença de relações especiais (nos termos do n.° 4 do art,° 58." do CIRC) para além de que, de facto, foram praticadas condições dc mercado

20. Por outro lado, o argumento de que as perdas experimentadas com a alienação da [SCom02...] ficaram a dever-se à cisão prévia de que a mesma sociedade foi objecto, e que se consubstanciou no destaque da participação na sociedade de direito peruano [SCom05...] é, para dizer o mínimo, absurdo. Em si mesmo, este argumento é, no mínimo, desconcertante: de que vale, de facto, sugerir que uma sociedade valeria mais se, no momento da venda de que é objecto, no seu imobilizado se encontrasse um activo que reconhecidamente de lá já tinha saído?
21. A verdade é que a referida participação já não pertencia à [SCom02...] na circunstância em que esta sociedade é alienada a um terceiro, e é seguro que a recorrente não pretendia proceder à sua venda (para alem de que está também por demonstrar que o citado terceiro a quisesse adquirir).
22. Do mesmo modo, não teve lugar, antes da venda de que aqui se trata, qualquer manobra ou artifício que alterasse indevidamente o balanço da [SCom02...]: este espelhava, como admite a própria Administração fiscal, a situação patrimonial posterior à cisão que previamente tivera lugar, de acordo com o estrito cumprimento das disposições legais em vigor (nem este ponto c questionado na fundamentação do acto de liquidação impugnado).
23. Sendo assim, apenas se compreenderia a referência à cisão já mencionada e aos seus efeitos se a Administração fiscal, primeiro, e o Tribunal, depois, os pretendessem pôr em causa, em virtude de cuidar, por exemplo, que a mesma tivera por objectivo ou como um dos seus principais objectivos a evasão fiscal, coisa que, não só não fez, como não o poderia já fazer dado ter caducado o direito à liquidação do imposto reportado ao exercício em que se verificou a referida operação.

24. Para lá da referência à cisão, contudo, a tese da Administração fiscal, a que o Tribunal a quo parece ter-se associado, assentava ainda na seguinte ideia: a cisão teria “descapitalizado” a [SCom02...], a subsequente venda desta sociedade teria tido um propósito exclusivamente fiscal, de poupança de imposto, não havendo razões economicamente válidas para proceder à sua realização, pelo que as menos-valias com ela geradas não podem ser aceites por força do n.° 1 do art.° 23.° do CIRC
25. E verdade que, em determinadas circunstâncias — bem diferentes das que nos ocupam — e mediante a verificação dos rigorosos pressupostos previstos na lei, a Administração fiscal pode pôr em causa a eficácia de negócios privados, livremente compostos pelas partes, quando se demonstre que tais negócios, pelo seu carácter atípico, foram celebrados — em detrimento de outros — por razoes exclusiva ou predominantemente fiscais. Mas mesmo esta possibilidade (prevista no art. 38° da LGT) encontra-se reservada àqueles casos em que a desadequação entre as formas negociais empregues e o fim económico visado pelas partes é de tal forma objectiva e relevante que denuncia um propósito de evasão.

26. Acresce que em relação à perda suportada com a alienação de prestações suplementares, à imagem do que ocorreu na fundamentação do acto de liquidação, o Tribunal a quo sustenta, ainda, dois postulados fundamentais: o primeiro é o de que, ao tempo dos factos, o relevo fiscal das perdas sofridas com a referida alienação recebia o limite estabelecido no n.° 3 do artº 42º do CIRC (só contariam por metade do seu valor), uma vez que as mesmas prestações devem figurar no activo imobilizado do respectivo titular; para além disso, contudo, teriam que passar no teste da indispensabilidade alegadamente exigido pelo art.º 23", o que não aconteceria nas circunstâncias específicas da recorrente.

27. Sucede, porém que, ao tempo a que reportam os factos, a redacção do n.° 3 do art.° 42.° referia-se expressamente apenas às menos-valias inerentes à transmissão de “partes de capital”, e não a quaisquer menos-valias relativas a bens do activo imobilizado. Ora, as prestações suplementares podem desempenhar funções análogas às do capital social, dispõem certamente de uma estabilidade semelhante à que corresponde ao mesmo capital social, e será mesmo admissível que se sustente deverem figurar no activo imobilizado do respectivo titular, mas não constituem seguramente “partes de capital”.
28. Por outro lado, a Lei n.° 60-A/2005, de 30 de Dezembro, veio dar uma nova redacção ao n.° 3 do art.° 42.° do CIRC, que passou a prescrever que a “diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução do capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor” (sublinhado da recorrente).

29. Quer isto dizer que o legislador quis estender a limitação ao relevo fiscal das menos-valias geradas com a transmissão dc partes de capital a outros tipos de perdas — que não já menos-valias — também relativos a partes de capital ou outras componentes do capital próprio (das participadas, supõe-se), como é o caso das prestações suplementares.

30. Não tem, assim, qualquer fundamento a pretensão de limitar, em nome do n.° 3 do art.º 42.° do CIRC, as perdas sofridas pela recorrente com a alienação das prestações suplementares que efectuara em benefício da [SCom02...].

31. Prosseguindo, em relação à perda gerada com a cessão dc créditos por suprimentos, a Administração fiscal entende que só podem ser aceites como custos, para efeitos do art.º 23º do Código do IRC, na medida em que se mostre a sua incobrabilidade nos termos do art.º 39.° do mesmo Código, o que não aconteceria no caso da recorrente. É certo que o Tribunal a quo não acolheu expressamente este argumento, transformando a alusão ao art.° 39.° como critério possível de apuramento da indispensabilidade das perdas — o que não tem qualquer cabimento atendendo a que à Administração fiscal não cabia empreender qualquer juízo de indispensabilidade.

32- Seja na acepção em que o Tribunal a quo se refere ao art.° 39.º, seja na da Administração fiscal, a verdade é que, no caso concreto, não tratamos de créditos incobráveis, porquanto não se verifica a hipótese do art.° 39,° do CIRC, o que deita por terra ambas as teses.

33. Posto isto, seja qual for o método pelo qual a Administração fiscal e o Tribunal a quo julgam que a recorrente terá cumprido a intenção que tanto lhe imputam (a produção de um determinado resultado fiscal através de um conjunto de operações com empresas do seu grupo económico, pré-ordenadas a esse fim), é inegável que, ainda que essa intenção existisse, o respectivo efeito fiscal jamais poderia ser desconsiderado com fundamento no artigo 23° do CIRC — a regra de que as menos-valias, enquanto perdas suportadas pelo sujeito passivo de imposto, concorrem negativamente para a determinação da matéria colectável é expressamente acolhida pela al. i) desse preceito e, por sua vez, de acordo com o n.° 1 do art.° 43-° do CIRC, consideram-se menos-valias as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, determinando ainda o nº 2 do mesmo artigo que o valor das menos-valias se apura pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas.

34. Com o enquadramento legal relevante para os factos em causa, aqui exaustivamente descritos — atenta a prova testemunhal produzida nos presentes autos (para o qual se remete na integra), a consideração fiscal da menos-valia e perda realizadas era imediata, sem depender sequer do teste da indispensabilidade — com efeito, vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio constitucional segundo o qual as empresas devem ser fundamentalmente tributadas de acordo com o seu lucro real, daí que, por regra, tem relevância fiscal todos os encargos suportados pelas sociedades na prossecução dos seus objectivos estatutários.

35. Certamente que aquela regra comporta determinadas excepções, nomeadamente ao nível dos custos; todavia, sempre estes casos excepcionais hão-de estar previstos na lei, sob pena de intolerável ofensa ao princípio da legalidade, para além de que, neste domínio, encontra-se vedado o recurso à analogia, quer por força, de novo, do princípio da legalidade — que reserva à lei formal a definição dos elementos essenciais da vida do imposto —, quer pela regra do art,° 11.° do CC, segundo a qual as normas excepcionais não podem ser objecto de analogia.
36. Por outro lado, a indisputabilidade do custo não pode aferir-se em função da sua aptidão para gerar, de imediato, a realização de um ganho, nem em função da sua importância para a capacidade de subsistência da empresa — basta, aliás, ter em conta que muitos dos exemplos de custos fiscalmente aceites fornecidos pelo legislador não determinam a obtenção directa de proveito algum, nem se podem considerar vitais para a manutenção da fonte produtora (por exemplo, as despesas com regimes complementares de segurança social ou os encargos suportados com diferenças de câmbio).

37. Na verdade, o corpo do nº 1 daquele art.° 23° apenas permite a desconsideração fiscal dos custos extra-empresariais, isto é, daqueles que não apresentam qualquer afinidade com a actividade da sociedade, como os encargos com despesas privadas dos sócio ou com terceiros, estranhos à empresa — a sua aplicação para desconsiderar fiscalmente um custo afectivamente suportado está, portanto, circunscrita às situações de confusão entre o património empresarial c o património pessoal dos sócios, bem como àquelas em que a empresa, em detrimento do seu património, pretende beneficiar terceiro.

38. Naturalmente, esta regra da consideração fiscal das menos-valias vale independentemente da natureza ou conveniência do negócio que as originou, das qualidades dos seus intervenientes e da existência de relações especiais entre as partes.

39. As considerações tecidas tornam claro que aos factos descritos nunca se poderá aplicar o nº 1 do artigo 23° do CIRC — repita-se a desconsideração de uma menos-valia efectiva na determinação da matéria colectável de forma alguma se pode estribar na definição legal de custo fiscal —, pelo que, demonstrada a imprestabilidade desta norma para desconsiderar a menos-valia e a perda experimentadas pela recorrente, fica igualmente demonstrada a ilegalidade da liquidação em crise, por absoluta falta de fundamento legal e, bem assim, da sentença do Tribunal a quo que a manteve.

40. O acto de liquidação impugnado assenta, em relação à correcção consubstanciada na desconsideração dos custos incorridos pela recorrente, relativos (i) a reintegrações associadas a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, no valor de € 76.276,00 e (ii) a abates de participações financeiras, no montante de € 5,011,51, na alegada violação das normas do n.° 1 do art.° 23º e da al. g) do n.° 1 do art° 42.°, ambos do CIRC, quer por não ter sido demonstrada a indispensabilidade dos custos incorridos para a formação dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora quer por não se encontrarem preenchidos os requisitos impostos por esta ultima disposição legal,

41. Ora, a prova testemunhal produzida é suficiente para demonstrar a imprescindibilidade dos custos incorridos pela recorrente pata a formação dos seus proveitos e para a manutenção da sua fonte produtora: da prova (documental e testemunhal) produzida, entende a recorrente que resultaram demonstrada e esclarecida toda a factualidade por si descrita na petição inicial, nas alegações finais apresentadas na sequência da inquirição de testemunhas, bem como no Ponto 2 do Subcapítulo B.II das presentes alegações.

42. Seja como for, também neste caso, a norma que a Administração fiscal alega ter sido violada (o art.° 23.° do CIRC), e que o Tribunal a quo reitera, em quase todas as situações é, conforme se argumenta no Ponto 2 do Subcapítulo B.II das presentes alegações — para o qual se remete —, absolutamente imprestável para determinar a desconsideração de perdas que, conforme ficou provado, foram efectivamente experimentadas pela recorrente no exercício da sua actividade operacional.
DEVE, ASSIM, O PRESENTE RECURSO PROCEDER NOS TERMOS EXPOSTOS, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.

Notificada como recorrida, a AT não respondeu à alegação.

O Digníssimo Procurador-geral Adjunto neste Tribunal emitiu sucinto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

II- Questões a decidir
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações, interpretadas, como é lógico, em função daquilo que se pretende sintetizar, isto é, o corpo das alegações.
Assim sendo, as questões cuja apreciação é peticionada são, por ordem lógica, as seguintes:

1ª Questão
O Mº Juiz a quo errou no julgamento em matéria de facto porque, devido a não ter observado o princípio da imediação da prova, não ponderou devidamente todos os elementos susceptíveis de influenciar a sua convicção, designadamente quanto ao depoimento da testemunha «AA», e por ter incorrido nos erros de apreciação da prova e de conclusões em matéria de facto indicados nas conclusões 4 a 12, não deu como provados?

2ª Questão
De qualquer modo, errou de direito, o Mº Juiz a quo, ao confirmar a desconsideração, pelo acto impugnado:
A – Dos custos incorridos pela recorrente, relativos (i) a reintegrações associadas a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, no valor de € 76.276,00, ocorridas, designadamente com a perda de material por sinistros (68 943 €) e com a reversão de casas pré-fabricadas e respectivo recheio, para o Estado do Malawi, no fim da construção da estrada que motivou a sua edificação, durante o exercício de 2004 (7 333.00);

B - Dos custos decorrentes de abates de participações financeiras nas empresas identificadas na alínea T da discriminação dos factos provados, nom total de 5.011,51 €?

C - Da menos valia fiscal no valor de € 957.920,40 apurada na sequência da alienação das participações sociais da sociedade [SCom02...] e deduzida ao lucro tributável do exercício de 2004 apenas em 50% (€ 478.960,20), conforme artigo 42º nº 3 do CIRC, inerente à alienação, pela Recorrente à sociedade Argentina “[SCom03...], SA" por 7.607,88 € (10.000 USD), da totalidade da sua participação financeira na [SCom02...], da qual era accionista única?

D - Das perdas decorrentes das cedências dos direitos decorrentes das prestações complementares de capital no montante de 16 692 306,54 €, e dos suprimentos à mesma participada, no montante de 20 849 271,37 €, pelo preço global de 106 496,32 €, à mesma sociedade argentina.



III - Apreciação do objecto do recurso

A fundamentação da sentença recorrida em matéria de facto é a seguinte:
3 - Fundamentação. —
3.1 - De facto. —
3.1.1 - Com relevância para a decisão da causa, o tribunal julga provado: —
A) Em cumprimento da ordem de serviço n.° ...51, de 03/07/2006, foi iniciada em 28/08/2006, uma acção inspectiva à impugnante relativa ao exercício de 2004 (fls. 90 do apenso).

B) O prazo inicial de realização da acção de inspecção foi prorrogado por mais três meses, nos termos da alínea a), do n.° 3 do artigo 36.° do RCPIT, segundo despacho da Exmª Chefe de Divisão das Empresas não Financeiras I, de 30 de Janeiro de 2007, tendo a prorrogação sido notificada ao sujeito passivo nos termos do n.° 4 do mesmo artigo, (fls. 90 do apenso).

C) O âmbito desta acção classifica-se como geral e incide sobre o exercício de 2004 (fls. 91 do apenso).

D) A impugnante está inscrita para efeitos fiscais com o CAE 45.230 e tem como actividade desenvolvida a construção de auto-estradas, estradas, vias-férreas, aeroportos e instalações desportivas (fls. 91 do apenso).

E) A impugnante integra o Grupo [SCom06...], formalmente constituído em Dezembro de 2000, representado pela [SCom06...] SGPS,SA, (fls. 252).

F) A impugnante tem como objecto social e dedica-se (fls. 258, 259, certidão da Conservatória do Registo Comercial (fls. 378) e depoimento das testemunhas):
1) À execução mediante contratos de empreitada, subempreitada, concessão, subconcessão, prestação de serviços ou quaisquer outros, de obras públicas e particulares, designadamente de estradas, pontes, aeroportos, vias férreas, portos, barragens, edifícios e outras construções, e ainda de obras de saneamento básico, de recolha, transporte e tratamento de todo o tipo de resíduos sólidos ou líquidos, com ou sem aproveitamento energético, de captação, tratamento e distribuição de águas, bem como quaisquer outras obras e serviços de natureza urbana;
2) À produção e comercialização de quaisquer bens e produtos relacionados com a actividade de construção, designadamente a produção e ou a comercialização de betão pronto;
3) À promoção, construção e venda ou exploração por conta própria de empreendimentos imobiliários ou turísticos, e, bem assim, à urbanização, loteamento e venda de terrenos para construção;
4) À compra e venda de bens imóveis e à revenda dos adquiridos para esse fim; —
5) À construção de edifícios e à correspondente venda e quaisquer outras formas de comercialização dos mesmos;
6) Á elaboração de estudos técnicos de engenharia e à montagem de equipamento;
7) Ao exercício de actividades agro-pecuárias e florestais; e
8) À extracção de inertes, ã exploração de pedreiras e de minas de qualquer natureza.

G) Até 10/12/2003 a impugnante também tinha como objecto social (fls. 372 da certidão da Conservatória do Registo Comercial):
«2 - Mediante simples deliberação do Conselho de Administração a sociedade poderá ainda: -a) — Dedicar-se à exploração de quaisquer outras actividades industriais ou comerciais directamente relacionadas com as que constituem o seu objecto principal ou necessárias para o bom exercício e pleno aproveitamento destas últimas. - b) - Constituir ou adquirir participações em sociedades com objecto idêntico ou diferente do seu, regidas ou não por legislação especial, e bem assim em agrupamentos complementares e outras modalidades de associação de empresas».

H) Em 31/12/2004, o capital social da impugnante estava representado por 20.000.000 acções ao portador, com valor nominal de 5,00 €, cada, totalmente subscrito e realizado, pertencente na totalidade à [SCom06...] (doravante [SCom06...]SGPS,SA) - (fls. 91 do apenso e 260 dos autos).

I) Em 31/12/2004 faziam parte do imobilizado financeiro da impugnante, a participação financeira no capital social das seguintes sociedades comerciais residentes e não residentes em Portugal (fls. 92 e 93 do apenso e 260 dos autos):
1. Partes de capita) em empresas do Grupo [SCom06...] - Sociedades por acções:
SociedadeSede Participação
[SCom07...]Gabão51,27%
[SCom08...] SALisboa100%
[SCom09...], SAOliv. Frades50%
[SCom10...], SALinda-a-Velha100%
[SCom11...], SAPorto100%
[SCom12...] GMBHAlemanha100%
[SCom13...], SALisboa100%
[SCom14...], Ld.aMoçambique50%
[SCom15...] - SGPS, SAOliv. Frades50%
[SCom16...], LLCEUA100%
[SCom17...], LLCEUA50,50%
[SCom18...] - MauríciasIlhas Maurícias 100%
[SCom19...], RTHungria100%
[SCom20...], SAPorto100%
[SCom21...], SALisboa50%
[SCom22...], Ld.aMatosinhos100%
[SCom23...], SARep. Checa80%
[SCom24...], BVHolanda100%
2. Partes de capital em empresas do Grupo [SCom06...] - Sociedades por quotas:
[SCom25...], Ld.aS.J. Madeira71,18%
[SCom26...]Moçambique50%
[SCom27...], Ld.aAmarante100%
[SCom28...], Ld.aLisboa25%
[SCom29...], Ld.aV.N. Gaia100%
[SCom30...], Ld.aPorto70%
[SCom31...], SRORep. Checa80%
[SCom32...], SRORep. Checa70%
[SCom33...], Ld.aFunchal100%
[SCom34...], Ld.aPorto Alto100%
[SCom35...], Ld.aPorto Alto100%
[SCom36...], Ld.aEntroncamento 15%
[SCom37...], Ld.aEstremoz50%
[SCom38...], Ld.aSacavém77,5%
3. Empresas associadas - Sociedades por acções:
[SCom39...]., SAPorto44,72%
[SCom40...], SAAmarante25%
[SCom41...], SAAmarante50%
[SCom42...], SATavira65,88%
[SCom43...], SALisboa20,38%
4. Empresas associadas - Sociedades por quotas:
— [SCom44...], Ld.a
Oeiras50%
[SCom45...], Ld.aPorto30%
[SCom46...], Ld.flPorto50%
[SCom47...], ACETavira50%
[SCom48...], Ld.aTa vira50%
[SCom49...] (soc. Civil)Lisboa50%
[SCom50...], SAPeru45%

5. Partes de capital em outras empresas associadas: —
[SCom51...], SA; [SCom52...], SA; [SCom53...], SA; [SCom54...], ElM; [SCom55...], SA; [SCom56..., SA]; .... [SCom57...], SA; [SCom58...], SA; [SCom06...] SA; [SCom59...], Ld.a; [SCom60...], SA; [SCom61...], SA.

J) No ano de 2003 terminou o processo de reorganização do Grupo [SCom06...], tendo sido constituída a “[SCom01...], SA”, resultante da fusão da “'[SCom18...], SA”, da "[SCom62...], SA” e da “[SCom63...], SA” (fls. 93 e 94 do apenso e certidão da Conservatória do Registo Comercial).

K) Em 2004 a impugnante num processo de fusão, incorporou as seguintes empresas das quais era a única sócia/accionista (fls. 94 do apenso): —
[SCom64...], SA; —
[SCom65...], SA; —
[SCom66...], Ld.a; —
[SCom67...], SA; e —
[SCom68...], SA. —

Com relevância para a dedutibilidade de reintegrações associadas a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado.

L) No exercício de 2004, a impugnante contabilizou na conta «#6945 - Custos e Perdas Extraordinários - Perdas em Imobilizações - Abates», o montante de 89.234,00 €, relativo a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, respeitando (fls. 94 do apenso e 302 a 307 dos autos (arts. 182.° a 197.°)):
L.1) 7.118,00 €, ao valor líquido do imobilizado corpóreo roubado à impugnante, no decurso do exercício de 2004; —
L.2) 68.943,00 €, ao valor liquido do imobilizado corpóreo afectado por sinistros, no decurso do exercício de 2004; —
L.3) 7.333.00 €, a casas pré-fabricadas e respectivo recheio, que reverteram para o Estado do Malawi, no fim da construção da estrada, que motivou a sua edificação, durante o exercício de 2004. —

M) A impugnante apresentou à administração fiscal o requerimento de aceitação previsto no art. 10.°, n.° 3, do Decreto Regulamentar n.° 2/90, de 12 de Janeiro, do material roubado e sinistrado, no decurso do exercício de 2004 (fls. 94 e 95 do apenso). —

N) O requerimento de aceitação dos bens sinistrados no exercício de 2004, foi apresentado pela impugnante à administração fiscal em 1/2/2005, isto é, depois do fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência dos respectivos factos (fls. 449, 306 - art. 190.º da petição inicial a contrario - e fls. 95 do apenso).

O) A impugnante não apresentou à administração fiscal o requerimento de aceitação previsto no art. 10.°, n.° 3, do Decreto Regulamentar n.° 2/90, relativo às casas do Malawi (fls. 319 - art. 249º da petição inicial - e fls. 95 do apenso).

P) As casas pré-fabricadas e respectivo recheio foram edificadas pela impugnante aquando da construção de uma estrada no Malawi e no final da obra, reverteram para o dono da obra (fls. 244 a 250 e fls. 95 do apenso).

Q) O contrato de construção celebrado com o Estado do Malawi obrigava a que essas edificações revertessem para o dono da obra no fim da empreitada (fis. 244 a 250 e fis. 95 do apenso).

R) O valor do activo imobilizado roubado, sinistrado e entregue ao Estado do Malawi, acima referido, foi considerado como custo e concorreu para a formação da matéria colectável da impugnante, no exercício de 2004 (fls 94 do apenso e 302 a 307 dos autos).

Com relevância para a dedutibilidade dos custos decorrentes de abates de participações financeiras.

S) Na contabilidade da impugnante a conta «6946006904 - Custos e Perdas Extraordinários - Perdas de Imobilizado - Abates de Participações Financeiras» tinha, em 31/12/2004, um saldo de 70.344,08 € (fls. 96 do apenso e 322 dos autos (art. 260.°)).
T) Nessa conta foram contabilizados diversos abates de participações financeiras, no montante de 5.011,51 €, referentes às seguintes empresas (fls. 96 do apenso e 321 dos autos (arts. 257.° e 258.°)):
EmpresaValor do abate
[SCom69...], SA998,58 €
[SCom70...], SA259,37 €
[SCom71...], SA99,76 €
[SCom72...], SA283,07 €
[SCom73...], SA49,88 €
[SCom74...] SA2.032,24 €
[SCom75...], SA1.163,65 €
[SCom76...], SA124,96 €
Total5.011,51 €

U) As empresas identificadas no quadro antecedente continuam a exercer a actividade tributável em sede de IRC (fls. 96 e 164 do apenso). —

V) As perdas pelos abates das participações financeiras do quadro antecedente concorreram para a formação da matéria colectável da impugnante, no exercício de 2004 (fls. 322 (art. 261.®)).---

Com relevância para a desconsideração de encargos indevidamente documentados:

W) A impugnante contabilizou na conta «698806999 - Custos e Perdas Extraordinárias - Outros Não Especificados», o montante de 60.000,00 €, por pagamento de danos, prejuízos e sobrecustos incorridos pela empresa “[SCom77...], SA” (fls. 96 do apenso).

X) A «[SCom77...]» não emitiu factura ou documento equivalente, pelo respectivo pagamento (fls. 96 do apenso).

Y) A impugnante pagou a referida indemnização pelo cheque n.° ...22, datado de 12/01/2004, sacado sobre o Banco 1..., SA, no valor de 60.000,00 €, emitido à ordem de “[SCom77...], Ld.fl” (fls. 253).

Z) A “[SCom77...], SA” emitiu, em 19/01/2004, o recibo de quitação com o seguinte teor: —
«[SCom77...], S.A., declara para os devidos e legais efeitos, que recebeu de [SCom01...], S.A., a quantia de € 60.000 (sessenta mil euros), a titulo de pagamento por todos os danos, prejuízos e sobrecustos por si incorridos na execução, para a referida [SCom01...], S.A. (antes denominada apenas por [SCom18...], S.A.), de diversos trabalhos de subempreitada (contratos CA 055/01, CA 419/01 e CA 206/02) no âmbito da designada "Empreitada para a Construção da Obra Geral e das Obras de Arte (PS e PI), do sublanço .../... - ..., da ... - Auto Estrada .../...".
Mais declara que com o recebimento da aludida quantia de € 60.000 (sessenta mii euros), de que dá aqui integral quitação, se considera totalmente ressarcida de todos os aludidos danos, prejuízos e sobrecustos e que nada mais tem a receber ou a reclamar de [SCom01...], S.A., seja a que título for» (fls. 254 e 324). - -

Com relevância para a dedutibilidade das menos-valias fiscais da alienação da participação financeira.

AA) A impugnante detinha 100% do capital da sociedade “[SCom02...], SA” ([SCom02...]), actualmente designada “[SCom78...], SA”, matriculada na Conservatória do Registo Comercial ..., ...36, pessoa colectiva n.° ...03 (fls. 262 - arts. 11,° e 12.° da petição inicial - e fls. 97 do apenso).

BB) A [SCom02...] detinha, em 2004, 91,68% do capital da sociedade comercial de Direito Argentino “[SCom04...]” ([SCom04...]), sendo o restante capital (8,32%) detido pela sociedade argentina “[SCom03...], SA” (fls. 97 do apenso, 269 e 270 dos autos (arts. 37.° e 42.°)).

CC) A impugnante concedeu vários créditos a título de suprimentos e prestações suplementares à empresa [SCom02...], no total de 20.849,271,37 e € 16.692.306,54, respectivamente, para apoiar financeiramente a actividade da empresa argentina [SCom04...] (fls. 97 do apenso).

DD) Por escritura de 24/11/2004, a impugnante alienou a totalidade da sua participação financeira na [SCom02...], da qual era accionista única, por 7.607,88 € (10.000 USD), à sociedade Argentina “[SCom03...], SA" (que detinha 8,32% da sociedade [SCom04...]), tendo simultaneamente cedido por 106.496,32 € (140.000,00 USD) os suprimentos e prestações suplementares atrás referidos nos montantes respectivos de € 20.849.271,37 e € 16.692.306,54 (fls. do apenso).

EE) A sociedade argentina "[SCom03...], SA” passou a ser accionista única da [SCom02...] e indirectamente da sociedade argentina [SCom04...] (fls. 97 do apenso).

FF) A [SCom02...] foi constituída em 18/08/1997, com sede na Zona Franca ..., na Rua ..., ..., Edifício ..., ..., ..., sendo a impugnante, à data da sua constituição, a sua accionista única, tendo como actividade principal a indústria da construção civil e obras públicas e actividades complementares ou afins, designadamente, a exploração e comercialização de equipamentos de construção civil (fls. 97 do apenso).

GG) Em 31/12/2001, o valor dos investimentos, participações financeiras, do activo líquido total e do capital próprio da [SCom02...] eram (fls. 98, do apenso, e 263 dos autos):
Valor de Balanço% dos investimentos financeiros no activo líquido total
Investimentos financeiros18.379.232,00 €61%
[SCom79...], Ld.a (Cabo Verde)980.975,00 €3%
[SCom04...], SA (Argentina)1.750.589,00 €6%
[SCom05...], SA (Perú)15.533.899,00 €52%
[SCom80...], Ld.a95.899,00 €0,3%
[SCom81...], Ld.a
[SCom82...] (Brasil)17.929,00 €0,06€
Activo líquido total29.985.562,00 €
Capital próprio7.016.151,00€
HH) No âmbito da reestruturação do grupo [SCom06...] implementado em 2002, a [SCom02...] foi cindida, destacando do seu património a participação na sociedade peruana [SCom05...], SA (doravante [SCom05...]) (fls. 98 do apenso e 263 dos autos).

II) Com esta cisão foi constituída a sociedade comercial “[SCom11...], SA” (doravante [SCom11...]), que passou a deter a [SCom05...] a 100% (fls. 97 do apenso e 263 dos autos).

JJ) A "[SCom11...]" era detida a 100% pela [SCom06...] (fls. 97 do apenso e 263 dos autos).

KK) Com a cisão, a [SCom02...] manteve as restantes participações sociais (fls. ... 118).

LL) A data relevante para a operação de cisão da [SCom02...] é, sob o ponto de vista contabilístico, 01/08/2002 (fls. 264).

MM) No projecto de cisão da “[SCom02...]” consignaram-se como motivos e objectivos que estiveram na base da cisão (fls. 98 e 99 do apenso e 115,116, 264 e 265 dos autos):
“«Para além da sua actividade correspondente ao objecto social de indústria de construção civil e obras públicas a [SCom02...], por força de aquisições e associações efectuadas nos últimos anos, tem assumido também a gestão global das empresas suas participadas. São empresas situadas no continente sul americano e que também se integram na mesma área de negócios, como seja o caso da brasileira [SCom81...], Lda, da [SCom04...], SA, na Argentina e da peruana [SCom05...], SA.
Consoante a envolvente económica do país em que a respectiva unidade de negócios opera, a cada um destes investimentos correspondem diferentes graus de risco. De facto, no cenário sul americano, destaca-se positivamente a estabilidade e o progresso económico peruano, gerador de um ritmo de crescimento bem mais rápido do que nos restantes países.
Para sustentar o projectado crescimento da [SCom05...], SA e o interesse em incrementar a diversificação dos seus negócios, vai-se revelar necessário procurar e encontrar um ou mais parceiros locais, podendo esta parceria realçar-se não directamente com a [SCom05...], SA mas sim nas sociedades que a dominem, não sendo desejável que esses parceiros partilhem dos riscos associados às restantes participações da sociedade, tanto mais quanto estas operem em mercados completamente distintos daquela. Acresce que, fruto de alterações legislativas, actuais e projectadas, com reflexos transnacionais, nos últimos tempos a realização de parcerias económicas têm-se mostrado mais fáceis de concretizar quando o regime fiscal dos intervenientes não é o das Zonas Francas ou o dos vulgarmente denominados “Paraísos Fiscais”.
Perante este quadro, entende a Administração da sociedade que devem ser criadas as condições que permitam a realização das referidas parcerias, autonomizando a participação da [SCom05...], S.A. das restantes participações actualmente detidas pela [SCom02...] e de outras que no futuro lhe possam advir, o que se alcança através da operação de cisão simples aqui projectada e proposta.
Com esta operação passarão a existir duas entidades juridicamente autónomas, separando-se a actividade normal da empresa e a gestão das restantes participações, da administração da participação na [SCom05...], S.A, a qual é entregue a uma sociedade gestora de participações sociais - veículo com regime legal mais apropriado para essas funções , com sede no ..., submetida a um regime jurídico-fiscal normal, conseguindo-se, assim, um melhor aproveitamento dos meios e recursos a afectar a cada uma das diferentes áreas de negócio, criando-se, simultaneamente, o quadro jurídico que permitirá a concretização das parcerias regionais para o desenvolvimento do negócio de construção civil e obras públicas no Peru».

NN) A cisão da [SCom02...] teve, entre outros objectivos, o de isolar a participação correspondente à [SCom05...] das restantes partes sociais detidas pela [SCom02...], por forma a cuidar separadamente da gestão e do desenvolvimento do activo subjacente, incluindo a possível captação de novos investidores especificamente interessados apenas no mercado peruano, que assim poderiam participar directamente ou indirectamente através da nova sociedade gestora.

OO) Das participações financeiras detidas pela [SCom02...], a participação na “[SCom05...], S.A.” era a que tinha menor risco económico e financeiro associado, era a que apresentava, à data da cisão, a melhor capacidade de crescimento e de gerar resultados, positivos no futuro, e era o activo de maior e melhor valor do património da empresa cindida (fls. 99 do apenso).

PP) Em consequência da cisão, o valor dos investimentos financeiros, do activo liquido total e do capital próprio da [SCom02...], passaram a ser, em 31/12/2002, os seguintes (fls. 99 e 100 do apenso):
Variação
Ano de 2001Ano 2002Valor%
Investimentos financeiros18.379.232,00 €17.929,00 €(18.361.303,00 6)(99%)
Activo líquido total29.985.562,00 €1.819.487,00 €(28.166.075,00 €)(94%)
Capital próprio7.016.151,00€(20.401.948,00 €)(27.401.948,00 €)(391%)
Capital social850.000,00 €850.000,00 €
Prestações suplementares3.192.307,00 €16.692.307,00€13.500.000,00 €423%
Ajustamentos de partes de capital em empresas do grupo5.459.212,00 €(23.063.050,00 €)(28.522.262,00 €)(523%)
Reservas legais169.594,00 €169.594,00 €
Outras reservas192.606,00 €(10.738.203,00 €)(10.930.809,00 €)(5,675%)
Resultados transitados(2.173.605,00 €)(4.278.314,00 €)(2.104.709,00 €)97%
Resultado liquido de exercício(673.962,00 €)(34.281,00 €)639.681,00 €(95%)

QQ) A referida operação de cisão levou a uma diminuição do activo líquido total em aproximadamente 94 %, passando de 29.985.562,00 €, em 2001, para 1.819.487,00 €, em 2002 (fls. 100 do apenso e 265 dos autos (art. 20.°)).

RR) Os capitais próprios diminuíram aproximadamente 391%, passaram de 7.016.151,00 €, em 2001, para um valor negativo de 20.401.948,00 €, em 2002 (fls. 100 do apenso).

SS) Em 30/09/2004, o balanço da [SCom02...] registava um valor negativo de capitais próprios de 19.163.925,46 € (fls. 234, 235 e 270 (art.45.0)).

TT) A diminuição de capitais próprios deveu-se, sobretudo, ao impacto negativo de
15.533.898.0 €, valor contabilístico da participação financeira da “[SCom05...], SA", provocado pela cisão, sendo que 10.930.808,00 € se referem à reserva de cisão e 4.603.090,00 € se reportam a ajustamentos de partes de capital em empresas do grupo (fls, 100 do apenso). —

UU) O valor dos capitais próprios seria negativo, no total de 33.901.948,00 € (20.401.948,00 + 13.500.000,00 €) se a [SCom01...] não tivesse aumentado o valor das prestações suplementares na [SCom02...], no montante de 13.500.000,00 €, ano de 2002, depois da cisão (fls. 100 do apenso e 267 dos autos (art. 27.°) e depoimentos das testemunhas «CC» e «DD»).

W) Em 31/12/2002, o capital social da [SCom02...] estava totalmente absorvido pelos prejuízos resultantes da cisão (fls. 100 do apenso). —

WW) A continuidade desta empresa dependia, para além de outros factores, da realização de futuras operações lucrativas e/ou do apoio financeiro a conceder pelos sócios e/ou outras entidades, tendo-se verificado que foi esta última a opção financeira tomada (fls. 100 do apenso).

XX) A [SCom06...] injectou dinheiro na [SCom02...] a título de prestações suplementares, no montante de 13.500.000,00 €, em 2002, totalizando estas prestações, em 31/12/2002, o valor de 16.692.306,54 €, valor que se manteve inalterado até à data da alienação da participação financeira que a impugnante detinha na [SCom02...], em 24/11/2004, e a título de suprimentos, nos montantes de 1.097.980.0 € e de € 5.914.393,86, em 2003 e 2004, respectivamente, sendo o total dos suprimentos, em 24/11/2004, de 20.849.271,37 €(fls. 100 e 217 a 222 do apenso e 267 dos autos (arts. 28.° a 31º.44.° e 46.°)).

ZZ) Desta menos-valia, o sujeito passivo deduziu ao lucro tributável de 2004 apenas 50%, no montante de € 478.960,20, nos termos do n. 3 do artigo 42.° do CIRC (ffs. 101, 223 e 224 do apenso e 271 dos autos (art. 50.°)).

AAA) Em simultâneo, cedeu por 106.496,32 € os suprimentos e as prestações suplementares que detinha na [SCom02...] à data dessa escritura, nos montantes de 20.849.271,37 € e de 16.692.306,54 €, respectivamente, à mesma sociedade argentina, originando esta cedência um custo extraordinário de 37.435.081,64 €, contabilizado na conta «6987006999 - Custos e Perdas Extraordinários - Créditos Cedidos» (fls. 101 e 171 a 178 do apenso e 271 e 272 dos autos (arts. 47.° e 51,0)). -

Com relevância para a dedutibilidade das perdas decorrentes de cedência de créditos de prestações suplementares de capital e suprimentos. —

BBB) A impugnante contabilizou na conta «41 - Investimentos Financeiros - Empréstimos de Financiamento - Empresas do Grupo», o montante de 16.692.306.54 €, relativo a prestações suplementares (fls. 104 do apenso e 270 dos autos (art. 44.®)).

CCC) A impugnante contabilizou na conta «25212 - Accionistas - Empresas do Grupo - Empréstimos Concedidos», o montante de 20.849.271,37 €, relativo a suprimentos (fls, 104 do apenso e 270 dos autos (art. 44.º)).

DDD) A impugnante cedeu o crédito pelas prestações suplementares de capital e pelos suprimentos, pelo valor global de 106.496,27 €, não sendo possível apurar, em concreto, o valor de venda correspondente a cada um deles (fls. 104,168,169 e 175 do apenso).

Outros factos relevantes:

EEE) Na sequência da acção inspectiva acima referida, a impugnante foi notificada da demonstração de liquidação de IRC, respeitante ao ano de 2004, correspondente à liquidação n.° ...67, de 02/07/2007, no valor a pagar de 6.219.848,70 €, e da demonstração de acerto de contas n.° ...87, com data de compensação em 03/07/2007, com um valor a pagar de 8.027.421,68 €, sendo 7.451.864,75 €, de imposto, e 575.556,93 €, de juros compensatórios, e cuja data limite de pagamento era 08/08/2007 (fls. 78 e 79).

FFF) O período 2001-2002 ficou marcado pelo colapso financeiro da Argentina, na sequência do fim da paridade entre o Peso Argentino e o Dólar dos EUA, com o PÍB a decrescer 10,9%, a inflação a aumentar para 41% e a dívida pública a aumentar 164% gerando-se uma conjuntura de instabilidade política, social e económico-financeira (fis. 229 a 233 e 332 a 338).

GGG) Esta conjuntura afectou indelevelmente todos os investimentos, operadores e activos a eles associados, relacionados com a Argentina, incluindo a participação da [SCom02...] na [SCom04...] (fls. e 332 a 338 e depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

HHH) No Relatório Consolidado de Gestão da [SCom06...] SGPS, SA, relativo ao exercício de 2002, consignou-se: "na sequência do fim da paridade entre o Peso Argentino e o Dólar dos EUA, bem como da instabilidade (social, política e económico-financeira) então gerada naquele país, com a consequente perda de valor comerciai do Peso Argentino, procedeu-se à conversão do património da subsidiária do GRUPO com sede na Argentina ([SCom04...]), tendo a consequente desvalorização integrai, no montante de 29 milhões de euros, sido registada em “Ajustamentos de Conversão Cambiai”” (fls. 127).

I") A [SCom02...] juntamente com a impugnante, enquanto sua accionista única, no exercício de 2002, teve que enfrentar vicissitudes extraordinários que obrigaram à tomada de medidas urgentes, enfrentando os efeitos decorrentes da crise económico-financeira que se abateu sobre a Argentina (fls. 229 a 233, 332 a 338 e depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

JJJ) A [SCom02...] viu-se obrigada a injectar dinheiro na [SCom04...], a título de prestações suplementares, no montante de 13.500.000,00 €, que em nada dependeram da cisão operada na [SCom02...] e que sempre teriam de ser realizadas ainda que a cisão não tivesse tido lugar (fls. 229 a 233 e depoimento das testemunhas «AA» e «CC»).

KKK) Na origem deste expressivo esforço financeiro da impugnante e da [SCom02...] esteve sempre, por um lado, o objectivo de atenuar o elevado impacto da crise económico-financeira de 2002, e por outro lado, criar condições para que a [SCom04...] lograsse iniciar um período gerador de lucros (depoimento das testemunhas «AA» e «CC»).

LLL) Em Abril de 2002 a [SCom06...] manifestava o propósito de manter a participação financeira que detinha na [SCom04...], apesar da crise vivida na Argentina (fls. 229 e depoimento das testemunhas «AA» e «CC»).

MMM) Volvidos dois anos sobre o auge da crise da Argentina, mantinham-se as dificuldades e a permanente necessidade de canalizar recursos financeiros para a [SCom04...] (fis. 229 e depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

NNN) A impugnante e a [SCom02...] equacionaram três cenários para superar as dificuldades da [SCom02...]:
1) encontrar um parceiro local, com experiência e conhecimento do mercado argentino, para partilha do investimento; —
2) Venda total, por parte da impugnante, da [SCom02...] a um terceiro interessado; —
3) Dissolução da [SCom02...] ou da [SCom04...] (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

OOO) A impugnante, através da [SCom02...], mantinha uma cooperação com a sociedade de direito argentino “[SCom03...], SA", que detinha uma participação de 8,32% na [SCom04...] (fls. 97 do apenso e depoimento das testemunhas «AA» e «CC»).

PPP) A impugnante decidiu que a opção mais acertada seria a de proceder à alienação dos activos, embora tal implicasse o consequente registo de relevantes perdas (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

QQQ) No ano de 2004 a impugnante recebeu uma proposta da "[SCom03...], SA” para comprar a [SCom02...] (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

RRR) A impugnante ponderadas as alternativas, bem como o histórico de dificuldades e exigências financeiras, acabou por chegar a acordo com a "[SCom03...], SA", que permitiu recuperar, ao menos em parte, o investimento realizado (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante). —

SSS) A "[SCom03...], SA" pretendia adquirir o capital da [SCom02...] e não directamente a participação que esta detinha na [SCom04...], por encontrar algum valor em continuar a deter a referida participação através de uma sociedade comercial com sede na Zona Franca ... (depoimento da testemunha «AA»).

Com relevância para a decisão da causa provou-se ainda:

TTT) No Relatório Consolidado de Gestão da [SCom06...] SGPS, SA, relativo ao exercício de 2002, consignou-se ainda:
No Perú, país em que, através de uma associada local, o GRUPO também exerce actividade, verificou-se, apesar da conjuntura negativa, um crescimento do PIB de 5,2% (segundo os últimos dados disponibilizados pelo INEI - Instituto Peruano de Estatística). Este indicador, no que ao sector da construção se refere, terá mesmo crescido 8,3%, embora o peso do sector na economia peruana esteja ainda aquém do que seria de esperar face à necessidade de infra-estruturas do país" (fls. 127);
“América do Sul - O Peru não pode deixar de ser influenciado pela crise que todo este subcontinente atravessa, mas as medidas que tomámos em devido tempo, levam-nos a ter moderada confiança no futuro. (...)
Acreditamos assim que fizemos as apostas certas nesses mercados, não deixando de acreditar que, com a reestruturação efectuada no Peru e se a crise sul-americana não sofrer qualquer agravamento que afecte ainda mais aquele Pais, temos condições para que numa futura retoma (que obrigatoriamente acontecerá) estaremos extremamente bem posicionados" (fls. 136); e
“Durante o ano de 2002 o sector da construção no Peru recuperou 8,3% relativamente ao ano anterior. Este incremento esteve associado ao maior dinamismo do sector privado num contexto de recuperação da procura interna fundamentalmente de habitação social e autoconstrução. A reabilitação e expansão da infra-estrutura viária pelo sector público diminuiu 6%, reflexo da menor actividade na construção e reabilitação de estradas. Os investimentos em infra-estruturas mineiras diminuíram ligeiramente consequência da envolvente da conjuntura internacional de que depende este mercado directamente. (...) A actividade da [SCom05...] foi condicionada pela evolução negativa do mercado onde está inserida, obras públicas e mercado de infra-estruturas mineiras pelo que registou uma baixa de actividade em cerca de 26%, com a consequente reestruturação da Empresa para estes níveis de facturação. Num mercado altamente competitivo e com um excesso de capacidade de produção, a diminuição de margens operacionais é a consequência natural e imediata. Os resultados obtidos, residualmente negativos, demonstram a capacidade da empresa em se adaptar a novas situações e em superar as dificuldades conjunturais de Mercado preparando-se para a nova fase do ciclo económico Peruano que se prevê próximo. Â semelhança dos exercícios anteriores, a empresa concentrou grande parte da sua actividade junto das grandes companhias mineiras (clientes privados), principalmente no cliente tradicional (desde há mais de 10 anos), [SCom83...]. Pelas razões referidas o volume de negócios da empresa cifrou-se em 24,8 milhões de euros e os resultados líquidos foram negativos em 288 mil euros» (fls. 142).

UUU) Em 2002 a [SCom04...] trabalhava exclusivamente na construção e manutenção da via férrea, com uma quota de mercado de 90% (fls. 229 a 233 e depoimento das testemunhas «AA» e «CC»).

VV) Aquando da alienação da participação social da [SCom02...] (entretanto redenominada[SCom78...], SA”) à “[SCom03...], SA”, a [SCom04...] tinha uma situação financeira sã e estável (depoimento de «AA»).

WWW) Entre a data da cisão e da alienação a impugnante ainda conseguiu cobrar alguns créditos que detinha sobre a [SCom04...] (depoimento de «AA»).

XXX) No início de 2008 a [SCom04...] continuava a funcionar (depoimento de «CC»).

YYY) As prestações suplementares na [SCom02...], no montante de 13.500.000,00 €, foram realizadas no ano de 2002, depois da cisão (depoimentos de «CC», «EE» e «DD»).

ZZZ) Estas prestações suplementares foram realizadas já depois de se ter gorado a possibilidade de construção da linha ferroviária entre a Argentina e o Chile (depoimento de «CC»).

AAAA) Para garantia do pagamento da liquidação adicional de IRC n.° ...67 e demonstração de acerto de contas n.° ...87 e consequente suspensão do processo de execução fiscal a que se reporta esta impugnação, a impugnante prestou, em 09/08/2007, uma garantia no valor de 10.034.441,84 €, por seguro-caução, válida de 3/8/2007 até pedido de cancelamento da Direcção-Geral dos Impostos ou declaração escrita da Direcção-Geral dos Impostos que informe estarem satisfeitas todas as obrigações garantidas (fls. 454 a 457 e 460).

BBBB) A impugnação foi deduzida em 09/08/2007 (fls. 3).

3.1.3 - Matéria de facto julgada não provada:

1. Na origem da decisão do abate das participações financeiras da impugnante esteve a constatação de que as participações em causa não tinham já qualquer valor de mercado: não eram transaccionáveis por manifesta inexistência de interessados, não representavam qualquer valor na perspectiva da impugnante, e, na sua maioria, ou não mantinham qualquer actividade ou já estavam em liquidação (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

2. A impugnante dedica-se à gestão de participações como actividade subsidiária.

3. A cisão da [SCom02...] só teve como motivo e objectivos, o de isolar a participação correspondente à [SCom05...] das restantes partes sociais detidas pela [SCom02...], por forma a cuidar separadamente da gestão e do desenvolvimento do activo subjacente, incluindo a possível captação de novos investidores especificamente interessados apenas no mercado peruano, que assim poderiam participar directamente ou indirectamente através da nova sociedade gestora originada pela mesma cisão (depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante).

4. A alienação da [SCom02...] á “[SCom03...], SA”, era a única solução que permitia recuperar, ao menos em parte, o investimento realizado.

5. Face aos valores espelhados no balanço da [SCom02...], os preços acordados de cedência da participação social e dos créditos que a impugnante detinha na e sobre a [SCom02...] à “[SCom03...], SA" afiguraram-se de molde a constituírem um negócio favorável à impugnante.

6. Todos os roubos que determinaram a integral desvalorização dos bens em causa na esfera da impugnante foram objecto de participação às autoridades policiais competentes.

7. Os requerimentos de aceitação dos bens sinistrados no exercício de 2004, relativos à ‘‘Betoneira" e à “Fresa agrícola”, no valor de 306,00 € e 454,00 €, foram apresentados à administração fiscal antes do fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto (fis. 306 - art. 190.° da petição inicial 422 a 428 e 436 e seguintes e 448 a 453).

3.1.1 - Motivação.
(…)»

Posto isto, enfrentemos o objecto do recurso.

A
Questão prévia
Da alteração à decisão em matéria de facto
A.1. Aditamento à matéria de facto provada.
Importa, antes de mais, ter presente que o processo judicial tributário concebido nos artigos 96º e sgs do CPC é essencialmente um processo de mera legalidade, conducente à declaração de nulidade ou anulação de actos tributários.
Não se trata assim, aqui, de dirimir ex novo a relação jurídica tributária controvertida, no sentido de se decidir se, substancialmente, era devido, relativamente a 2004, o imposto liquidado, mas sim de apreciar a validade formal e substancial das liquidações impugnadas, em função da sua fundamentação e do seu objecto.
Os actos impugnados foram consequência da Inspecção Tributária a que aludem as alíneas A) a C) da matéria de facto provada. Relevam, em último termo, das alterações à Matéria tributável de 2004 propostas e fundamentadas no Relatório da Inspecção (RIT). Porém este não figura, sequer por remissão, na discriminação de facos provados.
A apreciação da legalidade das liquidações em face da sua fundamentação não é possível sem o conhecimento, pelo menos, dos factos que foram a emissão e a aprovação do RIT e o sue teor.
Este facto, aliás, é matéria alegada na petição, pelo que, à luz do disposto pela conjugação do artigo 264º do CPC aplicável (5º do actual) e 123º nº 2 ex vi 2º do CPPT, era, à partida, devida a sua discriminação (como provado).
Está provado mediante o documento autêntico que é o RIT (integrante do PA e, nestes autos, junto com a PI):
Os termos do nº 1 do artigo 712º do CPC aplicável (662º nº 1 do actual) conferem ao tribunal de apelação o poder-dever de alterar a matéria de facto se a prova produzida o permitir.
Como assim, antes de nos confrontarmos com as questões suscitadas pela Recorrente e acima enunciadas, havemos por bem aditar à matéria de facto julgada provada na sentença recorrida, os seguintes factos:
B-1
O relatório final da Inspecção foi objecto de concordância por despacho de 22/5/2007 do director do serviço de Finanças ....
B-2
Do teor daquele Relatório, que aqui se dá por integralmente reproduzido, fazem parte os seguintes excertos:
1.3. Descrição sucinta das conclusões da acção de Inspecção
1.3.1. Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas - IRC
1.3.1.1. Correcções ao Resultado Fiscal: € 38.117.437,55

a) Reintegrações não aceites como custos: € 82.634,00
O sujeito passivo não acresceu ao lucro tributável o montante de € 82.634,00, relativo a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, não aceites como custo fiscal nos termos dos n°s 2 e 3 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12 de Janeiro, referentes a (ver Ponto 3.1.1.1.):
- € 7.118,00 respeitante a bens roubados, para o qual o sujeito passivo apresentou requerimento a solicitar a aceitação desse montante, mas cujas desvalorizações não se enquadram no n° 2 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90;
- € 68.183,00 respeitantes a bens cujo requerimento a solicitar a aceitação desse montante não foi entregue no prazo estabelecido no n° 3 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90, ou seja, até ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional;
- € 7.333,00 relativo ao valor líquido de bens do activo imobilizado da Sucursal do Malawi para o qual não pediu autorização à Direcção-Geral dos Impostos, através de exposição devidamente fundamentada, a sua aceitação como custo fiscal, conforme determina o n° 3 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12/01.
(…)
d) Custos não indispensáveis à actividade: € 37.500.093,15

d.1) Despesas não indispensáveis para a realização dos proveitos - Cessão de créditos: € 37.435.081,64
Da análise da conta 6987006999 - Custos e Perdas Extraordinários - Créditos Cedidos, cujo saldo é € 37.435.081,64, verificou-se que a empresa cedeu suprimentos e prestações suplementares nos montantes de € 20.849.271,37 e € 16.692.306,54, respectivamente, pelo valor global de € 106.496,27.
Dos financiamentos efectuados pelo sujeito passivo à “[SCom78...], S.A.” Novo nome entretanto adoptado pela [SCom02...], cf. alª VV) dos factos provados (através de suprimentos e prestações suplementares nos montantes respectivos de € 20.849.271,37 e de € 16.692.306,54), apenas foi reembolsado no montante de € 106.496,27 (140.000,00 USD), pelo que a diferença, no montante de € 37.435.081,64, registada na conta atrás referida, não é de aceitar como custo para efeitos fiscais pelos seguintes motivos (ver Ponto 3.1.1.5):
As perdas sofridas com a transmissão onerosa das prestações suplementares não são de aceitar como custo para efeitos fiscais, nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC, uma vez que não foi demonstrada pelo sujeito passivo a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora;
As perdas sofridas com a transmissão onerosa dos suprimentos, que não se conexionam com a anulação dos encargos Inerentes à respectiva cobrança, não são de aceitar como custo para efeitos fiscais, nos termos do n.° 1 do art.° 23° do CIRC, pelo facto dessas perdas não serem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, uma vez que a incobrabilidade desses créditos não resulta de processo especial de recuperação de empresas e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência, conforme o estipulado no artigo 39° do CIRC.

d.2) Abates de participações financeiras: € 5.011,51
Foram contabilizados como custo contabilístico diversos abates de participações financeiras, no montante de € 5.011,51, os quais não são de aceitar como custo fiscal, nos termos do n.° 1 do art.° 23° do CIRC, por não serem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (ver Ponto 3.1.1.4-A).

d.3) Despesas indevidamente documentadas: € 60.000,00
Não é de aceitar como custo fiscal, nos termos da alínea g) do n° 1 do artigo 42° do CIRC, o montante de € 60.000,00 relativo ao pagamento de danos, prejuízos e sobrecustos incorridos pela empresa “[SCom77...], SA", uma vez que esta despesa está indevidamente documentada pois não existe factura e/ou documento equivalente que comprove a mesma (ver Ponto 3.1.1.4-B).

e) Menos-Valias Fiscais: € 478.960,20
A menos-valia fiscal deduzida ao lucro tributável de 2004, no montante de € 478.960,20, resultante da venda da participação financeira que a [SCom01...] detinha na [SCom02...], não é de aceitar como custo fiscal, nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC, uma vez que não ficou demonstrada a sua imprescindibilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (ver Ponto 3.1.1.5.).
(…)
3. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável
Foram analisadas as áreas contabilístico-fiscais de acordo com os procedimentos em uso e com a profundidade considerada adequada nas circunstâncias, tendo-se verificado o seguinte;
3.1. imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas - IRC
3.1.1. Correcções ao Lucro Tributável
3.1.1.1. Reintegrações não aceites como custos
O sujeito passivo contabilizou na conta 69.45 - Custos e Perdas Extraordinários - Perdas em Imobilizações - Abates o montante de € 89.234,00, relativo a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, o qual não é de aceitar como custo fiscal o montante de € 82.634,00 pelos seguintes motivos:
- € 7.118,00 relativo ao valor líquido do imobilizado corpóreo roubado, não é de aceitar
como custo fiscal uma vez que estas desvalorizações excepcionais não se enquadram no n° 2 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90 (Anexo 1);
- € 68.183,00 não é de aceitar como custo fiscal uma vez que o requerimento apresentado pelo sujeito passivo não foi entregue no prazo estabelecido no n° 3 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90, ou seja, até ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto que determinou a desvalorização excepcional (Anexo 1);
- € 7.333,00 relativo a casas pré-fabricadas e respectivo recheio, edificadas aquando da construção de uma estrada no Malawi, e que, no final da obra, reverteram para o dono da obra. Embora o contrato de construção celebrado com o Estado do Malawi obrigar a que essas edificações revertam para o dono da obra, aquele valor não é de aceitar como custo fiscal uma vez que o sujeito passivo não pediu autorização à Direcção-Geral dos Impostos, através de exposição devidamente fundamentada, conforme determina o n° 3 do artigo 10° do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12/01 (Anexo 2).
(…)
3.1.1.4. Custos não indispensáveis à actividade
A) Abates de participações financeiras
Da análise da conta 6946006904 - Custos e Perdas Extraordinários - Perdas de Imobilizado - Abates de Participações Financeiras, cujo saldo era, em 31 de Dezembro de 2004, de € 70.344,08, verificou-se que foram contabilizadas na mesma conta diversos abates de participações financeiras, no montante de € 5.011,51, que dizem respeito às seguintes empresas que continuam a exercer actividade tributável em sede de IRC:
(…)
Dado que o sujeito passivo não justificou a anulação destas participações financeiras, este valor não é de aceitar como custo fiscal, nos termos do n.° 1 do art.° 23° do CIRC, por não ser comprovadamente indispensável para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (Anexo 4).

B) Despesas indevidamente documentadas
O sujeito passivo contabilizou na conta 6988006999 - Custos e Perdas Extraordinários - Outros Não Especificados o montante de € 60.000,00 relativo ao pagamento de danos, prejuízos e sobrecustos incorridos pela empresa ‘'[SCom77...], SA", o qual não é de aceitar como custo fiscal, nos termos da alínea g) do n.° 1 do art.° 42° do CIRC, uma vez que este custo está indevidamente documentado pois não foi emitido factura e/ou documento equivalente pelo beneficiário (Anexo 5).
Importa salientar que, nos termos do n.° 3 do artigo 115° do CIRC, na execução da contabilidade todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, o que não se verifica no presente caso.
3.1.1.5. Alienação de participação financeira e cessão de créditos
(…)
Por escritura de 24 de Novembro de 2004 (Contrato de Compra e Venda de Acções e Contrato de Cessão de Créditos), a empresa [SCom01...] alienou a totalidade da sua participação financeira na sociedade [SCom02...], da qual era accionista única, por € 7.607,88 (10.000 USD), à sociedade argentina “[SCom03...], SA” (que detinha 8,32% da sociedade [SCom04...]), tendo simultaneamente cedido por € 106.496,32 (140.000,00 USD) os suprimentos e prestações suplementares atrás referidos nos montantes respectivos de € 20.849.271,37 e € 16.692.306,54. Assim, a sociedade argentina “[SCom03...], SA” passou a ser accionista única da sociedade [SCom02...] e indirectamente da sociedade argentina [SCom04...] (Anexo 6 - folhas 4 e seguintes).
Analisada esta operação, verificou-se que:
1. A empresa [SCom02...] foi constituída em 18 de Agosto de 1997, tendo como actividade principal a indústria da construção civil e obras públicas e actividades complementares ou afins, designadamente, a exploração e comercialização de equipamentos de construção civil, e sede na Zona Franca ..., na Rua ..., ..., Edifício ..., ... .... À data da sua constituição, a empresa [SCom01...] era a sua accionista única
Segundo contrato de compra e venda de acções e cedência de créditos, a [SCom01...] concedeu vários créditos a título de suprimentos e prestações suplementares à empresa [SCom02...], no total de € 20.849.271,37 e € 16.692.306,54, respectivamente, para apoiar financeiramente a actividade da empresa argentina [SCom04...] (detida pela [SCom02...] em 91,68%).
Por escritura de 24 de Novembro de 2004 (Contrato de Compra e Venda de Acções e Contrato de Cessão de Créditos), a empresa [SCom01...] alienou a totalidade da sua participação financeira na sociedade [SCom02...], da qual era accionista única, por € 7.607,88 (10.000 USD), à sociedade argentina “[SCom03...], SA” (que detinha 8,32% da sociedade [SCom04...]), tendo simultaneamente cedido por € 106.496,32 (140.000,00 USD) os suprimentos e prestações suplementares atrás referidos nos montantes respectivos de € 20.849.271,37 e € 16.692.306,54. Assim, a sociedade argentina “[SCom03...], SA” passou a ser accionista única da sociedade [SCom02...] e indirectamente da sociedade argentina [SCom04...] (Anexo 6 - folhas 4 e seguintes).
Analisada esta operação, verificou-se que:
1. A empresa [SCom02...] foi constituída em 18 de Agosto de 1997, tendo como actividade principal a indústria da construção civil e obras públicas e actividades complementares ou afins, designadamente, a exploração e comercialização de equipamentos de construção civil, e sede na Zona Franca ..., na Rua ..., ..., Edifício ..., ... .... À data da sua constituição, a empresa [SCom06...] era a sua accionista única.
(…)
6. Em resultado desta cisão, o valor dos investimentos financeiros, do activo líquido total e do capital próprio da [SCom02...] passaram a ser, em 31/12/2002, os seguintes:
(…)
7. Da análise do quadro acima, verifica-se que a operação de cisão levou a uma diminuição do activo líquido total em aproximadamente 94%, passando de € 29.985.562, em 2001, para € 1.819.487, em 2002. Os capitais próprios diminuíram aproximadamente 391%, passaram de € 7.016.151, em 2001, para um vaior negativo de € 20.401.948, em 2002.
8. Esta diminuição dos capitais próprios deveu-se, fundamentalmente, ao impacto negativo de € 15.533.898 (valor contabilístico da participação financeira na “[SCom05...], S.A.”) resultante da cisão, sendo que € 10.930.808 se referem à reserva de cisão, e € 4.603.090 se referem a ajustamentos de partes de capital em empresas do grupo (Anexo 10).
9. Saliente-se que o valor dos capitais próprios ainda seria mais negativo, no total de € 33.901.948 (€ 20.401.948 + € 13.500.000), caso a [SCom01...] não tivesse, no ano de 2QQ2 (já após o processo de cisão), aumentado o valor das prestações suplementares na [SCom02...], no montante de € 13.500.000.
10. Assim, em 31/12/2002, o capital social da [SCom02...] estava totalmente absorvido pelos prejuízos resultantes da cisão. Deste modo, a continuidade desta empresa dependia, para além de outros factores, da realização de futuras operações lucrativas e/ou do apoio financeiro a conceder pelos sócios e/ou outras entidades (Anexos 11 e 12), tendo-se verificado (conforme referido no ponto seguinte) que foi esta última a opção financeira tomada.
11. A [SCom06...] teve que injectar dinheiro na [SCom02...] a título de prestações suplementares, no montante de € 13.500.000, em 2002, totalizando estas prestações, em 31/12/2002, o valor de € 16.692.306,54 (valor que se manteve inalterado até à data da alienação da participação financeira que a [SCom06...] detinha na [SCom02...] - 24/11/2004) , e a título de suprimentos, nos montantes de € 1.097.980,00 e de € 5.914.393,86, em 2003 e 2004, respectivamente, sendo o total dos suprimentos, em 24/11/2004, de € 20.849.271,37 (Anexo 13).
12. Por escritura de 24 de Novembro de 2004, a empresa [SCom06...] alienou a totalidade da sua participação financeira na [SCom02...] à sociedade argentina "[SCom03...], S.A.” por € 7.607,88, que tinha sido adquirida em 1997 por € 797.956,43, originando uma menos-valia fiscal de € 957.920,40.
13. Desta menos-valia, o sujeito passivo deduziu ao lucro tributável de 2004 apenas 50%, no montante de € 478.960,20, nos termos do n° 3 do artigo 42° do CIRC (Anexo 14).
14. Em simultâneo, cedeu por € 106.496,32 os suprimentos e as prestações suplementares que detinha na [SCom02...] à data dessa escritura, nos montantes de € 20.849.271,37 e de € 16.692.306,54, respectivamente, à mesma sociedade argentina, originando esta cedência um custo extraordinário de € 37.435.081,64, contabilizado na conta 6987006999 - Custos e Perdas Extraordinários - Créditos Cedidos.
Sobre o enquadramento em termos fiscais dos custos originados pela cedência da participação financeira e dos créditos importa referir o seguinte:
A. Cedência da participação financeira
1. A venda da participação financeira na [SCom02...] originou uma menos-valia fiscal de € 957.920,40, deduzida ao lucro tributável do exercício de 2004 apenas 50%, no valor de € 478.960,20, nos termos do n° 3 do artigo 42° do CIRC. A desvalorização da empresa e a consequente menos-valia foi originada fundamentalmente pela cisão em 2002 da [SCom02...], mediante destaque da participação financeira que esta empresa detinha na sociedade peruana “[SCom05...], S.A.”, para com ela constituir uma nova sociedade designada “[SCom11...], S.G.P.S., S.A.".
2. Esta participação financeira era o activo de maior valor que a [SCom02...] detinha e que correspondia aproximadamente a 52% do seu activo líquido total. Por outro lado, das participações financeiras que a [SCom02...] detinha, todas elas no mercado sul-americano (Brasil, Argentina e Perú) e na mesma área de negócios, o investimento na “[SCom05...], S.A." era o investimento de menor risco e de maior capacidade de crescimento devido á estabilidade e ao progresso económico Peruano. - AA,
3. Verifica-se assim que, em consequência do processo de cisão, a [SCom06...] descapitalizou a [SCom02...], onde era accionista único, ficando esta empresa com capital próprio negativo, no montante de € 20.401.948,00, em 31/12/2002, tendo o seu capital social ficado absorvido pelos prejuízos causados por esta operação.
4. Vejamos então o tratamento jurídico-fiscal desta menos-valia realizada.
5. De acordo com a redacção do artigo 23°, n° 1 do CIRC consideram-se como custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos e para a manutenção da fonte produtora, o que inclui, designadamente, as menos-valias realizadas (conforme alínea i) do n° 1 do referido artigo 23° do CIRC). O artigo 43°, n° 1 do CIRC vem caracterizar como mais-valias e menos-valias realizadas “os ganhos obtidos ou as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, e, bem assim, os derivados de sinistros ou os resultantes da afectação permanente daqueles elementos a fins alheios à actividade exercida”.
6. Deste modo, temos como regra geral que as menos-valias realizadas com a transmissão onerosa das partes sociais em causa, que constituem elementos do activo imobilizado, concorrem, enquanto componentes negativas, para a formação do lucro tributável do ano a que respeita a alienação, conforme ao disposto nos artigos 43° e seguintes do CIRC.
7. Contudo, o disposto no n° 3 do artigo 42° do CIRC vem limitar esta regra geral, ao estipular que: “A diferença negativa entre as mais-valias e menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital, concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”. Assim, o saldo negativo apurado entre as mais-valias fiscais e as menos-valias fiscais resultantes da alienação de partes de capital (ou seja, participações sociais) só concorre em 50 % para a formação do lucro tributável.
8. Contudo, para que as menos-valias fiscais concorram para a formação do lucro tributável é necessário que se comprove a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos e para a manutenção da fonte produtora, nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC.
9. Como já referido anteriormente, consideram-se custos e perdas, nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC, "os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”. Consequentemente, para que certos decréscimos patrimoniais possam ser fiscalmente dedutíveis, é necessário que satisfaçam impreterivelmente estes requisitos de dedutibilidade relativos à sua indispensabilidade.
10. Mesmo perante regras específicas, como é o caso das mais e menos valias constantes dos artigos 43° e seguintes do CIRC, o n° 1 do artigo 23° do CIRC opera sempre, como clausula geral, pois os vários custos e perdas elencados nas diversas alíneas do n° 1 do artigo 23° do CIRC estão subordinados ao disposto no corpo do referido artigo. Nestes termos, torna-se necessário, para responder positivamente à consideração como perdas das menos-valias em causa, confirmara sua indispensabilidade.
11. Para que um determinado custo ou perda seja aceite fiscalmente, é necessário, para além da sua correspondência com um facto económico real, um juízo valorativo que é aferido “por critérios da racionalidade económica face aos objectivos estatutários e atendendo, por isso, à razoabilidade e fundamentação das decisões de gestão no momento e nas circunstâncias em que são tomadas”, conforme formulado por Saldanha Sanches, em Manual de Direito Fiscal, 2a ed., Coimbra 2002, p. 281. Isto afasta todos os custos que resultem de operações cuja finalidade é exclusivamente fiscal, de poupança de imposto, por lhes estar totalmente ausente válidas razões económicas, e exclui também os custos em que, sem qualquer fundamentação bastante a aferir por parâmetros objectivos, não incorreria um operador económico diligente colocado em condições análogas.
12. No presente caso, considerando que foram apuradas menos-valias fiscais consideradas pela empresa como custo fiscal em 50 %, seria necessário que esta demonstrasse, sem margem para dúvidas, que esse custo foi indispensável, o que não se verificou.
13. Note-se, com efeito, que o sujeito passivo se limita a alegar factos genéricos, nomeadamente, a necessidade de realizar fundos para fazer face a futuros investimentos em outros mercados e a operações inerentes ás actividades de exploração da empresa, pelo que não foi minimamente apresentada qualquer factualidade que permita, sem margem para dúvidas, demonstrar a indispensabilidade da operação de alienação da participação financeira.
14. A relevância fiscal de um custo depende da prova da sua necessidade, adequação, normalidade ou da produção de resultados (ligação a um negócio lucrativo), sendo que a falta dessas características determina a sua desconsideração como custo. E no caso concreto nenhuma destas características esteve ou poderia estar presente.
15. concluindo, a menos-valia ficai resultante da venda da participação que a [SCom06...] detinha na [SCom02...] foi originada, fundamentalmente, pela descapitalização desta empresa, antes da sua alienação, pela [SCom06...]. Podemos, pois, dizer que a finalidade desta operação é exclusivamente fiscal, de poupança de imposto, não havendo razões económicas válidas. Assim, a menos-valia fiscal deduzida ao lucro tributável de 2004, no montante de € 478.960,20, não será de aceitar como custo fiscal, nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC, uma vez que não ficou demonstrada a sua imprescindibilidade para a realização dos proveitos ou dos ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

B. Cedência dos créditos
O sujeito passivo contabilizou na conta 41 - investimentos Financeiros - Empréstimos de Financiamento - Empresas do Grupo o montante de € 16.692.306,54, relativo a prestações suplementares, e na conta 25212 - Accionistas - Empresas do Grupo - Empréstimos Concedidos o montante de € 20.849.271,37, relativo a suprimentos.
2. Conforme referido anteriormente, a empresa cedeu as prestações suplementares e os suprimentos por um valor global de € 106.496,27, não sendo possível apurar o valor de venda correspondente a cada um deles (Anexo 6 - folhas 1 e 2).
Z.J Tanto as prestações suplementares como os suprimentos têm que ser objecto de uma consideração autónoma para efeitos fiscais, dada a presença de regimes próprios e o facto de o juízo de indispensabilidade, conforme artigo 23°, nº 1 do CIRC, assentar em considerações específicas:
B.1 Prestações Suplementares
(…)
3. As prestações suplementares, conforme o disposto no artigo 210° do Código das Sociedades Comerciais, podem ser exigidas aos sócios, mediante deliberação, se o contrato de sociedade assim o permitir (…).
4. Este tipo de prestações suplementares não podem ser consideradas como "créditos exigíveis” por parte dos sócios sobre a sociedade, pois não existe a faculdade de livremente as exigir, umas vez que a sua restituição encontra-se dependente de factos alheios à vontade do sócio concedente. Saliente-se que a restituição das prestações só pode ter lugar desde que a situação líquida não fique inferior à soma do capital e da reserva legal e o respectivo sócio já tenha liberado a sua quota (artigo 213°, n°s 1 e 2).
5. As prestações suplementares constituem, portanto, entregas pecuniárias que satisfazem funções análogas ao capital social (conforme artigos 31° e 32° do Código das Sociedades Comerciais), razão que justifica a inexigibilidade do crédito, bem como a inexistência de qualquer remuneração própria (para além daquilo que resulta do desenvolvimento da própria actividade social) sofrendo o mesmo risco do capital social (…).
7. Consequentemente, as perdas sofridas com a transmissão onerosa de prestações suplementares representam fiscalmente uma menos-valia, sujeita ao regime que o CIRC aplica às partes de capital no artigo 42°, n° 3 quando determina que “a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital, concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”, uma vez que estas prestações suplementares se devem considerar como inerentes à participação social, com consequência de que não podem ser transmitidas a outra pessoa separadamente da participação social.
8. Apesar de ter considerado as Prestações Suplementares como investimentos financeiros (conta 41), os custos resultantes da sua alienação tiveram um tratamento contabilístico igual ao dos suprimentos, conforme referido anteriormente.
9. Concluindo, tendo em conta que as prestações suplementares se subordinam, em termos fiscais e contabilísticos, à participação social, com a consequência de que não podem ser transmitidas a outra pessoa separadamente da participação social, elas seguem, na sua alienação, o regime das mais-valias e das menos-valias realizadas constante dos artigos 43° e seguintes do CIRC. Consequentemente, as perdas sofridas com a transmissão onerosa de prestações suplementares representam fiscalmente uma menos-valia, sujeita ao regime estipulado pelo n° 3 do artigo 42° do CIRC, ou seja, dedutível ao lucro tributável em apenas metade do seu valor, mas desde que seja demonstrado a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos e para a manutenção da fonte produtora conforme o exigido pelo artigo 23° n° 1 do CIRC (ver Ponto A). No presente caso, uma vez que não foi comprovada a indispensabilidade do custo associado à transmissão onerosa das prestações suplementares, o mesmo não é de aceitar fiscalmente nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC.

B.2. Suprimentos
1. O contrato de suprimento, como contrato especial de mútuo (artigo 1142° do Código Civil), encontra-se definido no artigo 243°, n° 1 do Código das Sociedades Comerciais (CSC), como sendo "o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência". É principalmente o elemento da “permanência do crédito", que se traduz na estipulação de um prazo de reembolso superior a um ano (artigo 243°, n° 2 do CSC) ou a não utilização da faculdade de reembolso pelo prazo de um ano (artigo 243°, n° 3 do CSC) que distingue a figura do “suprimento".
2. No caso dos suprimentos, enquanto verdadeiros empréstimos, por oposição às prestações suplementares, existe a pretensão do sócio ao reembolso dos capitais por si entregues (acrescido, muitas vezes, de um direito ao juro remunerador do investimento), ainda que essa pretensão goze de um regime particular face aos credores comuns (conforme artigo 245° do CSC),
3. Apesar dos suprimentos funcionarem na prática muitas vezes como "substitutivos do capital" (procura-se com eles dotar a sociedade de meios financeiros que lhe possibilitem assumir encargos necessários à execução do seu objectivo social, constituindo um fundo suplementar de maneio para as despesas de exploração e respectivas necessidades de tesouraria), eles possuem um regime que impede a sua recondução em sede de capitais próprios, sendo necessário incluir os suprimentos nos capitais alheios da sociedade beneficiária. Desta forma, o sócio passa a ser um credor da sociedade.
4. Importa ainda realçar que o crédito de suprimentos é cindível da participação social, pelo que se pode transmitir o crédito sem a participação, assim como se pode transmitir a participação sem o crédito.
5. Consequentemente, os suprimentos constituem créditos exigíveis (conforme o regime do artigo 245°, n° 1 do CSC), cuja transmissão onerosa se reconduz a uma cessão de créditos, contrato pelo qual o credor transmite a terceiro, independentemente do consentimento do devedor, a totalidade ou uma parte do crédito (conforme artigos 577° e seguintes do Código Civil). Note-se que na cessão de créditos de suprimentos, o crédito cedido mantém inteiramente o regime que lhe correspondia enquanto crédito de suprimentos, não obstante poder já não pertencer a um sócio - é o que resulta das regras gerais dado o disposto no artigo 585° do Código Civil.
6. Importa agora analisar em que termos é que a perda resultante da cessão deste crédito de suprimentos pode ser aceite como custo fiscal.
7. De um do ponto de vista conceptual, a alienação onerosa de créditos por suprimentos deveria também reconduzir-se, na perspectiva fiscal, ao regime das mais-valias e menos-valias. Sem prejuízo da recondução contabilística das perdas na alienação de investimentos financeiros a perdas extraordinárias, dado originarem-se em transacções, em atenção ao sector de actividade em que a empresa opera, que estão fora das suas actividades típicas e que não ocorrem com frequência, em termos de realidades fiscais verifica-se um directo enquadramento no artigo 43º nº 1 do CIRC. CIRC (contudo, para a situação em apreço, considerando o tratamento seguido pela [SCom06...], esta qualificação assume apenas relevo fundamentalmente dogmático).
8. Os créditos da titularidade de uma sociedade podem ser compreendidos nas imobilizações ou no activo circulante, sendo que os elementos patrimoniais que se destinem a ser usados duradouramente pertencem às imobilizações, ao passo que os créditos correntes (v. g. sobre clientes) pertencem ao activo circulante.
9. Os suprimentos, atento o elemento da permanência, devem ser considerados entre as imobilizações financeiras, pelo que as perdas conexas com as respectivas “desvalorizações” por via da sua transmissão onerosa estão subordinadas á figura fiscal das menos-valias de facto, estão então em causa variações no valor do património do sujeito passivo, que são postas em evidência com a alteração material da respectiva composição, as quais respeitam a alienações de bens do imobilizado e não resultam da actividade corrente. Nestes termos, as perdas em créditos do imobilizado são susceptíveis de serem deduzidas como menos-valias ao lucro tributável desde que sejam objecto de realização, especificamente, desde que resultem de actos que se analisem numa alienação onerosa.
10. Em consequência, de um modo geral, a diferença entre o montante nominal do crédito incluído no imobilizado ou o seu custo de aquisição e a prestação recebida em contrapartida no âmbito da respectiva cessão onerosa (conforme artigo 43°, n° 3, alínea f) do CIRC) implica fiscalmente uma menos-valia.
11. Só que, para além desta afirmação de princípio de que a cessão onerosa do crédito de suprimentos configura uma situação de realização de uma menos-valia, sempre que se verifique diferença negativa entre o custo fiscal do crédito e o preço de cessão, é imediatamente necessário convocar, com particular incidência, o princípio da indispensabilidade presente no n° 1 do artigo 23° do CIRC.
12. Assim sendo, a “indispensabilidade da perda poderá ser comprovada caso se demonstre que a diferença entre o valor do crédito e o valor recebido se destina a anular o risco inerente à respectiva cobrança e permite a disponibilidade de um valor cuja aplicação poderá gerar proveitos sujeitos a imposto”. Na verdade, excepto relativamente aos casos em que os créditos são cedidos a valor inferior ao nominal como antecipação da contabilização de custos e perdas correspondentes aos riscos e incómodos de cobrança que se transferem para o adquirente, é particularmente complexo, na perspectiva da indispensabilidade, encontrar uma justificação para a cedência.
13. Existe clara separação entre as perdas que resultam da alienação de créditos e as perdas que resultam da desvalorização do crédito por incobrabilidade: no primeiro caso, o crédito deixa definitivamente o património da empresa para ser substituído por outro bem ou valor; no segundo caso, o crédito permanece no património da empresa, sendo, porém, objecto de um procedimento de desvalorização, o qual se prende, no essencial, com um juízo fáctico sobre as possibilidades de cobrança do crédito.
14. Não obstante esta separação entre perdas por incobrabilidade do crédito e perdas por alienação do crédito, a verdade é que a não aceitação como custo da “desvalorização" do crédito em si considerado, em atenção à sua cobrança, não pode deixar de se repercutir sobre a própria aceitação como custo das perdas resultantes na respectiva alienação. Caso contrário, as regras estabelecidas para a aceitação como custos de créditos incobráveis seriam completamente ultrapassadas, admitindo-se como custo, sem justificação bastante (v. g. pelos encargos da cobrança), uma perda em crédito perfeitamente cobrável ou cuja incobrabilidade não foi objecto de reconhecimento em conformidade com a lei fiscal.
15. Isto implica que, [se] no caso de perdas por incobrabilidade do crédito há que encontrar factos relevantes que sejam significativos da inviabilidade de exigência do crédito, o mesmo tem que suceder quando se esteja perante a verificação da alienação de um crédito, que está na dependência da vontade do credor e que pretende configurar-se como escolha empresarial.
16. Na verdade, se em si considerada a cessão a título oneroso de um crédito do imobilizado gera, no ponto de vista fiscal, uma mais-valia ou menos-valia, a aceitação desta última, nos termos do artigo 23°, n° 1 do CIRC, depende relevantemente da questão da própria possibilidade de cobrança e dos requisitos de incobrabilidade.
17. Na situação em apreço, estamos perante suprimentos, logo, perante créditos que não resultam da actividade normal da empresa (conforme artigo 34°, n° 1, alínea a), bem como o disposto no artigo 35°, n° 3 alínea d) do CIRC), é imprescindível, para a aceitação das perdas resultantes da sua alienação onerosa, atentar nas condições exigidas para considerar o crédito como incobrável.
18. Conforme disposto no artigo 39° do CIRC, "Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente”.
19. Consequentemente, a aceitação como custo fiscal das perdas resultantes da alienação de créditos por suprimentos, que não se conexionem com a anulação dos encargos inerentes à cobrança do crédito, depende de se poder dizer que se verificam as condições de incobrabilidade que se determinam neste artigo 39° do CIRC, apenas nessa eventualidade se podendo considerar preenchido o requisito da indispensabilidade.
20. Concluindo, para que se possa aceitar a dedutibilidade fiscal integral das perdas advenientes da alienação de suprimentos é necessário, nos termos do artigo 23°, n° 1 do CIRC, que o crédito seja incobrável e que tal resulte de processo especial de recuperação de empresas e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência (artigo 39° do CIRC; conforme artigo 268°, n° 3 do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas). No presente caso, uma vez que não se verifica a existência de qualquer um destes requisitos, não é de aceitar fiscalmente o custo resultante da alienação dos suprimentos nos termos do n° 1 do artigo 23° e do artigo 39°, ambos do CIRC.
(…)”.

A.2 Alteração na discriminação de factos não provados:
Além do sobredito aditamento de factos provados, considerando que, no presente caso, atento o objecto da acção, resulta numa afirmação conclusiva, contraditada, aliás, por plúrimos factos concretos julgados provados, como veremos, determina-se a exclusão, da discriminação dos factos não provados, da seguinte proposição:
“A impugnante dedica-se à gestão de participações como actividade subsidiária.”

B
Discussão do recurso

1ª Questão
O Mº Juiz a quo errou no julgamento em matéria de facto porque, devido a não ter observado o princípio da imediação da prova, não ponderou devidamente todos os elementos susceptíveis de influenciar a sua convicção, designadamente quanto ao depoimento da testemunha «AA», e por ter incorrido nos erros de apreciação da prova e de conclusões em matéria de facto indicados nas conclusões 4 a 12, não deu como provados os factos como tal discriminados nas alegações finais da Recorrente?

Como tem sido uniformemente julgado neste Tribunal, os princípios da oralidade e imediação e da livre apreciação da prova (artigos 590º a 606º e 607º nº 5 do CPC) implicam que o julgamento do recurso em matéria de facto, quanto à apreciação de provas que não sejam prova legal, não é um julgamento, ex novo, em que se possa fazer tábua rasa do julgamento do juiz da 1ª instância que, esse sim viu, ouviu e apreciou com imediação o depoimento de testemunhas e declarantes, antes deve ficar-se pela detecção do erros de julgamento revelados pelas “regras da experiência comum” ou logicamente demonstráveis.
Em coerência com este entendimento e para obviar à perplexidade de não haver um objecto concreto e definido para a crítica da decisão de facto, o artigo 685-B do CPC aplicável (640º do actual CPC), aqui aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, decisão que devia ter sido tomada e meios de prova determinantes, impondo-lhe inclusivamente, no caso da prova verbal gravada (com é o caso) sob pena de “imediata rejeição (…) do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a).
Percorridas as alegações e as conclusões do recurso verifica-se que o Recorrente não procede, nas conclusões, à especificação positiva, dos factos que julga deverem ter siso julgados provados e não provados e, nem numas nem noutras, à especificação dos meios de prova dos quais decorreria em seu entender, por força da lógica ou da experiência comum, haver erro manifesto do Mº Juiz a quo no sentido de terem ficado provados, em vez de não provados, estes factos. A recorrente enuncia a sua discordância com o Juiz a quo quanto à desvalorização de alguma prova testemunhal, e quanto a conclusões em matéria de facto, mas não destaca especificadamente factos concretos, meios de prova passagens desses depoimentos que em seu entender obrigariam a concluir pela prova destes factos julgados não provados.
Quanto a conclusões em matéria de facto, podem as mesmas ser discutidas em face dos factos concretos provados e não provados.
Quanto à apreciação da prova, isto é, quanto a decisão sobre prova e não prova de factos concretos, porque o Recorrente não cumpre com ónus decorrente do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 640º d CPC, o recurso vai rejeitado.


2ª Questão
De qualquer modo, errou de direito, o Mº Juiz a quo no julgamento de direito ao confirmar a desconsideração, pelo acto impugnado:

a – Dos custos incorridos pela recorrente, relativos (i) a reintegrações associadas a desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado, no valor de € 76.276,00, ocorridas, designadamente com a perda de material por sinistros (68 943 €) e com a reversão de casas pré-fabricadas e respectivo recheio, para o Estado do Malawi, no fim da construção da estrada que motivou a sua edificação, durante o exercício de 2004 (7 333.00);

b - Dos custos decorrentes de abates de participações financeiras nas empresas identificadas na alínea T da discriminação dos factos provados, nom total de 5.011,51 €?

c - Da menos valia fiscal no valor de € 957.920,40 apurada na sequência da alienação das participações sociais da sociedade [SCom02...] e deduzida ao lucro tributável do exercício de 2004 apenas em 50% (€ 478.960,20), conforme artigo 42º nº 3 do CIRC, inerente à alienação, pela Recorrente à sociedade Argentina “[SCom03...], SA" por 7.607,88 € (10.000 USD), da a totalidade da sua participação financeira na [SCom02...], da qual era accionista única?

d - Das perdas decorrentes das cedências dos direitos decorrentes das prestações suplementares de capital no montante de 16 692 306,54 €, e dos suprimentos à mesma participada, no montante de 20 849 271,37 €, pelo preço global de 106 496,32 €, à mesma sociedade argentina.

a – Desvalorizações excepcionais de bens do activo imobilizado.
Por sinistro:
Se bem entendemos as alegações da Recorrente, o erro da sentença recorrida no julgamento de direito nesta matéria, consistiria numa violação do artigo 23º no 1 do CIRC, em consequência de não se ter reconhecido a imprescindibilidade do custo, já que prova testemunhal seria suficiente para demonstrar tal imprescindibilidade, e numa indevida aplicação da alª g) do nº 1 do artigo 42º do CIRC (que exclui da dedução os encargos não documentados).
Antes de mais, a imprescindibilidade não é um facto, mas uma conclusão a retirar de factos provados que a Recorrente não indica para fundamento da sua conclusão.
Depois, e sobretudo, a Recorrente nada contrapõe ao essencial da fundamentação de facto e direito da sentença nesta parte – a saber, a não satisfação de um requisito legal decorrente do artigo art.º 10.°, n.º 3, do referido do Decreto Regulamentar n.º 2/90 de 2 de Janeiro (comunicação e requerimento de aceitação da desvalorização à AT, em devido tempo) que nada tem a ver com a alª g) do nº 1 do artigo 42º do CIRC.
Por perda de casas pré-fabricadas:
Também aqui a alegação da Recorrente deixa sem qualquer crítica a fundamentação da sentença recorrida, a saber, o incumprimento do sobredito requisito.
Tanto basta para a resposta a esta alínea da presente questão (material sinistrado) ser negativa.

b - Abates de participações financeiras nas empresas identificadas na alínea T da discriminação dos factos provados, nom total de € 5.011,51.
Se bem entendemos a alegação da Recorrente (cf. conclusões 40º e 41º), o erro no julgamento de direito consistiria, aqui, numa violação do artigo 23º no 1 do CIRC, em consequência de não se ter reconhecido a imprescindibilidade do custo, já que a prova testemunhal seria suficiente para a demonstrar.
Os fundamentos com que a sentença recorrida confirmou a desconsideração deste custo são redutíveis aos seguintes excertos:
“A administração tributária não aceitou como custo fiscal, nos termos do art. 23.°, n.° 1, do CIRC, o montante de 5.011,51 €, correspondente ao valor de parte das participações financeiras abatidas peia impugnante no exercício de 2004, por a impugnante não ter justificado o respectivo abate e não ter comprovado a indispensabilidade de tal custo para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora.
Por sua vez, a impugnante pugna pela dedutibilidade de tais custos alegando, em síntese, que essas participações sociais não eram transaccionáveis por manifesta inexistência de interessados, por não representarem, na perspectiva da impugnante, qualquer valor e, na sua maioria, ou não mantinham qualquer actividade ou já estavam em liquidação. Acresce que estavam ligadas à actividade acessória de gestão de participações sociais da impugnante, e tinham uma conexão fáctica e económica com essa actividade, pelo que consubstanciando uma diminuição patrimonial, devem relevar como custo fiscal. Como perda efectivamente sofrida com a actividade empresarial, não é necessária a prova da indispensabilidade do art. 23.° do CIRC.
Vejamos.
O art. 17.°, n.° 1, do CIRC prevê que «O lucro tributável das pessoas colectivas ê constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código».
(…)
Partindo o lucro tributável do lucro contabilístico, as verbas contabilizadas têm de estar documentadas e comprovadas, ficando os ganhos e perdas com o respectivo suporte documental para demonstração das operações subjacentes.
Por sua vez, o artº 23.° define-nos os custos ou perdas, consagrando uma cláusula geral (custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora), seguida de uma enumeração exemplificativa (nomeadamente os seguintes).
No caso em apreço a administração fiscal desconsiderou este custo, porquanto a impugnante não comprovou os fundamentos do abate das participações sociais abatidas e até constatou que essas participações pertenciam a sociedades comerciais que continuavam a exercer a actividade tributável em sede de IRC. —
Atenta a falta de justificação do abate, a administração fiscal considerou que apesar do custo estar documentado, não estava comprovada a indispensabilidade do custo.
E entendemos que com razão.
Vejamos.
Conforme se disse a indispensabilidade do custo para a formação de proveitos deve ser aferido por critérios de racionalidade económica face aos objectivos estatutários e atendendo à razoabilidade e à fundamentação das decisões de gestão no momento e nas circunstâncias em que são tomadas. —
Nesta parte, a impugnante, não obstante alegar que as participações financeiras abatidas correspondem a custo efectivo, por não terem valor de mercado, não serem transaccionáveis por inexistência de interessados, não representarem, na perspectiva da impugnante, qualquer valor e por na sua maioria não manterem actividade ou estarem em liquidação, não logrou provar tais factos (número 1) da matéria de facto).
Não se tendo comprovado que as alegadas participações sociais não tinham valor de mercado, não eram transaccionáveis por inexistência de interessados e na sua maioria não mantinham actividade ou estavam em liquidação, não existe um critério económico objectivo e razoável que leve a aceitar aquele custo como custo fiscal, derivado da actividade económica da impugnante e que fundamente a consideração do custo da operação, como custo fiscal. —
Por outro lado, da matéria de facto provada (alínea F) da matéria de facto) e não provada (número 2) da matéria de facto), resultou que a impugnante não tinha como objecto social e actividade económica a gestão de participações sociais. —
Mais. A impugnante teve esse objecto social até 2003. Com a alteração do contrato de sociedade a impugnante retirou-o expressamente do seu objecto social. À data dos factos, no exercício de 2004, a impugnante já não tinha essa actividade como objecto social. —
Nessa medida, também não pode dizer-se que o custo desta operação é um custo indispensável e inerente à actividade comercial da impugnante. Não é um custo associado à actividade produtiva da impugnante, nem à actividade do seu escopo social, é um custo derivado de uma actividade que não faz parte do seu objecto social e da sua actividade. —
Ao contrário do pugnado pela impugnante, a mera redução do activo imobilizado pela sua alienação não constitui de per si um custo fiscal inatacável pela indispensabilidade do art. 23.°. Se bem que a alienação do activo imobilizado revele uma efectiva diminuição do seu património, ainda assim não pode dizer-se que esse acto comprove, só por si, a conexão com a actividade comercial exigida pelo art. 23.°. —
Nestes casos, em que a alienação está comprovada fiscalmente, não está em causa o acto de gestão empresarial e a sua expressão económica na empresa (A conexão empresarial - com aquela empresa - está comprovada. Porém, essa conexão empresarial, não é bastante para efeitos fiscais. A consideração fiscal da operação exige ainda que essa conexão empresarial se insira no âmbito do objecto social da respectiva empresa e da respectiva actividade, só assim se respeitando o princípio da especialidade do fim das sociedades comerciais). Está em causa o seu efeito fiscal. E a consideração do efeito fiscal embora não passe pelo julgamento do acto de gestão empresarial, passa inelutavelmente pela sua a apreciação na medida em que para efeitos fiscais tem necessariamente de aferir-se se o acto se insere ou não no objecto da sociedade comercial e se constitui ou não um acto inerente à sua actividade económica
Atendendo [a] que a impugnante não comprovou as razões económicas que fundamentaram o abate das respectivas participações sociais (arts. 342º do código Civil (artº 74.°, n.º 1, da LGT) e que, além disso, a actividade de gestão de participações sociais não faz parte do seu objecto social, não pode dizer-se que aquela operação se insere no âmbito da sua actividade económica e por isso mesmo não pode dizer-se que a contabilização do custo dessa operação seja bastante para ser considerada como custo fiscal e muito menos, que comprove que esse custo constitui um custo indispensável à realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para manutenção do fonte produtora. —
Nesta parte, julga-se improcedente a impugnação, mantendo-se a desconsideração fiscal do custo da operação de abate das participações sociais.
Um dos esteios deste discurso, atenta a alteração à decisão em matéria de facto não provada, deixou de subsistir.
Como vimos, a afirmação de que a Impugnante tinha como actividade subsidiária a gestão de participações sociais tem, numa lide como a presente, natureza conclusiva, pois, pelo menos quanto a parte do objecto da impugnação e no entendimento das partes, a discussão sobre a procedência da causa depende, entre o mais, de um juízo sobres se, em face de factos alegados e provados, se pode concluir, ou não, que a Impugnante se dedicava em 2004 a gerir participações sociais.
É, assim, por indução, a partir dos factos provados, que se há-de chegar a conclusão quejanda, oposta ou até diversa.
Está provado que em 2004 tal actividade já não constava do contrato social da Impugnante e que o código de actividade económica em que ela estava colectada não incluía a gestão de participações sociais.
Porém, também estão provados factos de que decorre que a Impugnante, a despeito de ter aqueles CAE e pacto social, continuava, em 2004, a manter muitas participações sociais e a transacciona-las.
Veja-se as alíneas I), S), T) e DD) e a NN dos facos provados. Destes factos concretos – posse continuada de múltiplas participações sociais e a transmissão da participação de pelo menos uma – conclui-se que a Recorrente em 2004 se dedicava, também, à gestão das suas muitas participações sociais.
De qualquer modo:
À vocação universal do IRC não interessa tanto a conformidade da fonte do rendimento tributável com um determinado CAE e com o pacto social, como a tributação de todo o rendimento que não deva ser isento ou excluído da tributação por força de Lei.
Certamente, se se tratasse de proveitos a tributar, não estaríamos a discutir aqui se eram alheios ao CAE ou ao objecto social da impugnante em ordem a não serem tributados em IRC…
Tal universalidade nos proveitos não pode deixar de ter contrapartida nos custos, sob pena de violação do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real.
Este pragmatismo em ordem a uma tributação objectiva e universal, é bem revelado no artigo 23º nº 1 do CIRC, que, ao definir custos ou perdas, para efeito da determinação do rendimento colectável, não recorre a qualquer alusão à actividade económica normal ou registada ou constante do objecto social, antes adopta uma formulação neutra do ponto de vista da espécie de actividade “formal” do contribuinte, ao referir os custos à indispensabilidade para gerar quaisquer lucros sujeitos a imposto ou para manter a fonte produtiva.
Assim, embora acompanhando toda a doutrina e jurisprudência citadas pelo Mº Juiz a quo acerca do sentido amplo, mas funcionalmente determinável, do conceito de “indispensabilidade” para efeitos no nº 1 do artigo 23º do CIRC, consideramos insusceptível de prejudicar o preenchimento desse conceito pelos custos gerados com a gestão de participações, o facto de a Recorrente não estar inscrita como sujeito passivo no CAE correspondente à gestão de participações nem ter esta actividade contemplada no seu objecto social.
Daqui não se segue, porém, que proceda a pretensão da recorrente, subjacente a esta questão.
Parece que a Recorrente confundiu o abate destas participações, alegadamente inúteis, com uma qualquer operação económica ou financeira. Na verdade, o abate ao activo é apenas uma operação contabilística, de tradução de uma realidade. O que releva como custo não é um abate mas a perda real que, com o abate aos activos, se pretende traduzir na contabilidade.
Ora, não só a contabilidade da recorrente não registava, os factos por que as participações sociais em causa deviam ser consideradas perdidas, como a Impugnante não concretizou, quer no procedimento inspectivo, designadamente em audiência prévia, quer na Petição Inicial, participação a participação social, o facto da vida real de que resultaria tratar-se de participação já sem objecto ou de valor real igual a zero.
Conforme o artigo 74º nº 1 da LGT, era da Impugnante o ónus de, tanto no procedimento como no processo, alegar e provar tais factos. É certo que ela beneficiava da presunção da veracidade da sua contabilidade formalmente bem organizada (artigo 75º nº 1 da LGT), mas a contabilidade e seus registos (cf. artigo 75º nº 1 da LGT) não integram qualquer informação de factos de onde haja de decorrer tratar-se de perdas. Contabilisticamente apenas estão documentadas determinadas participações sociais, que, por natureza, são activos.
Pelo exposto, embora não se mantendo uma parte da fundamentação da sentença quanto a este objecto, a resposta a esta alínea da presente questão é negativa.

c - Da menos valia fiscal no valor de € 957.920,40 apurada na sequência da alienação da participação sociai na sociedade [SCom02...] e deduzida ao lucro tributável do exercício de 2004 apenas em 50% (€ 478.960,20).

Se bem entendemos as alegações da recorrente, o erro de julgamento residiria numa violação, por deficiente interpretação, do artigos 42º nº 3 e 23º nº 1 do CIRC, ao postular-se que as perdas por menos valias mediante a transmissão de partes de capital (a que se refere aquele nº 3) só relevariam como custos se acompanhadas do atributo de indispensabilidade, a qual estaria excluída no caso da Impugnante, dado que da sua actividade normal não fazia parte a gestão de participações sociais – portanto, a sua venda – quando o certo era que aquele nº 3 impunha, tratando-se da venda de partes de capital, a consideração da menos valia sem mais requisitos.
Segundo a Recorrente, tratou-se de um acto de gestão dos destinos de empresa participante, ditado pela racionalidade económica, e não é atribuição do Fisco julgar se foi a melhor opção, para desconsiderar o custo, ao abrigo, em ultimo termo, do artigo 23º nº 1 do CIRC, a não ser que ocorra aplicar-se a cláusula antifraude, o que não é o caso (artigo 38º nº 2 da LGT).
Já vimos porque não obsta, em si mesmo, à dedutibilidade de quaisquer custos, o facto de os proveitos com eles almejados não integrarem o objecto social ou o CAE do sujeito passivo.
Assim as alegações que permanecem em discussão são a necessidade de a menos valia com a venda da parte de capital, ser considerada indispensável para a formação dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, para valer como custo fiscal, e essa outra de que não é atributo da AT apreciar o mérito das decisões de gestão da contribuinte.
Porém a recorrente não tem razão quando pretende extrair da norma do nº 3 do artigo 42º do CIRC a conclusão de que o custo de uma menos valia não carece do requisito de indispensabilidade disposto no nº 1 do artigo 23º do mesmo diploma.
Na verdade, sendo o nº 2 do artigo 23º claramente exemplificativo do disposto no nº 1, onde se exige em geral a indispensabilidade da perda, e encontrando-se a menos valia prevista na alínea i) desse nº 2 segue-se que carece, também ela, do requisito em geral exigido. Quanto ao nº 3 do artigo 42º, conforme a epígrafe do artigo, mais não dispõe do que a exclusão de metade do valor das mais valias ali mencionadas – sendo de todo insofrível, por uma interpretação metodologicamente informada pelo elemento sistemático, a conclusão de extrair dele uma excepção à regra geral enunciada no n.º 1 do citado artigo 23º.
Neste passo, impõe-se verificar com que fundamentação é que o fisco desconsiderou esta menos valia contabilizada pela impugnante.
Conforme item 3.1.1.5, acima transcrito, maxime a sua parte “A – cedência de participação financeira”, o Fisco fundamentou a desconsideração da menos valia, em geral, na necessidade de concorrerem a natureza objectiva de menos valia e a indispensabilidade da mesma para a geração de proveitos ou a manutenção da fonte produtiva da Impugnante. Em concreto, o Fisco não pôs em causa a natureza de menos valia, mas não reconheceu a indispensabilidade da transacção, em suma porque, das circunstâncias e antecedentes, designadamente a cisão da [SCom02...] em 2002, que a descapitalizou, a diferença abissal entre valor de aquisição (797.956,43 em 1997) e o da venda (7.607,88 € em 2004). Destes antecedentes e contexto concluiu, o Fisco, que se tratou de uma operação com um fim exclusivamente fiscal, enfim, de planeamento fiscal, sem qualquer interesse económico ou financeiro para a Impugnante, o que implicaria a não indispensabilidade e, logo, a não dedutibilidade da perda.

A posição do Mº Juiz a quo retoma a tese, já descartada, da irrelevância do custo por não se enquadrar na actividade da Impugnante, mas chama à colação, cumulativamente, a tese da necessidade da convergência da natureza de menos valia e da indispensabilidade do custo para a geração de proveitos ou a manutenção da fonte produtiva, sustentando não ocorrer o segundo elemento do binómio:
Ponderando:
- A diferença brutal entre o valor de aquisição e o valor de alienação; —
- A oportunidade da alienação (quando apesar de se invocar a crise argentina, se constata que a alienação foi realizada dois anos depois do seu auge e depois de no auge da crise a impugnante ter efeito uma reestruturação empresarial e não ter ponderado nessa altura o destino a dar à [SCom02...] e à [SCom04...], quando já sabia nessa altura que se tinha gorado a possibilidade de construção da linha ferroviária Argentina / Chile); depois da impugnante ter investido na empresa e de ser considerada uma das maiores e mais conceituadas no seu ramo de actividade na Argentina; quando detinha cerca de 90% do mercado; quando já tinha uma situação económica sã e estável; -
- Que a sua avaliação foi determinada sobretudo atendendo ao seu histórico e à sua falta de perspectivas futuras (ponderando-se ainda aqui o depoimento parcialmente inconsistente da testemunha «FF» quanto á forma de avaliação da participação alienada), mas que veio a apurar-se que ainda se mantém activa em 2007; —
- Quando se apura que entre o auge da crise argentina e o momento da alienação ainda são cobrados alguns créditos da impugnante;
- Que a participação é vendida a um sócio por um preço muito abaixo do preço de aquisição, indiciando até um preço de favor (relevando aqui o depoimento de «AA» que acerca do preço da alienação referiu de forma espontânea como um "valor simbólico” nas declarações da testemunha, que depois esclareceu que ao falar em “valor simbólico” queria referir-se à diferença entre o valor da alienação e o valor que a impugnante da aquisição, tendo depois declarado que perante a sua situação contabilística e patrimonial o valor da alienação era o valor de mercado (Porém não se compreende como é possível tal valor quando do seu depoimento e das restantes testemunhas arroladas pela impugnante se constata que as prestações suplementares de capital e os suprimentos destinavam-se a fazer face à crise e a investir em equipamentos e know how, sendo certo que a testemunha também refere que a alienação foi feita ao antigo sócio que sempre foi um parceiro local sério, o que deixa transparecer alguma forma de gratidão para com ele); conjugado com a forma algo ligeira de avaliação da participação alienada atendendo aos valores em causa (uma única avaliação, não confrontada com uma avaliação externa, eventualmente realizada na Argentina, mais próxima da [SCom04...] e da sua situação real, enquanto único activo da [SCom02...]) e o depoimento parcialmente inconsistente e pouco espontâneo de «FF» sobre o valor da avaliação da participação alienada);
Não pode dizer-se que o custo decorrente desta menos-valia, bem como das menos valias derivadas das alienações das prestações suplementares e dos suprimentos, sejam um custo comprovadamente indispensável para a realização de proveitos e / ou para manutenção da fonte produtora.”
Importa, antes de mais, notar que o Mº Juiz a quo nem sempre se cingiu ao limite do objecto que lhe competia apreciar – o mérito do acto impugnado, tal como foi fundamentado pela AT, designadamente no Relatório – aduzindo outra razões, para além das invocadas no Relatório, para a legalidade da não aceitação destes custos, com o que resvala, nessa medida para uma fundamentação por terceiro e a posteriori do acto impugnado, que, por o ser, não pode relevar para a um juízo de improcedência da impugnação.
Cingindo-nos aos aspectos em que a sentença recorrida aprecia e sanciona a fundamentação constante do RIT, adiantamos já que a não acompanhamos.
Temos por dispensável tecer mais considerações teóricas sobre o que deve entender-se por indispensabilidade dos custos para efeitos do artigo 23º nº 1 do CIRC, uma vez que o Mº Juiz a quo já o fez de modo assaz esclarecedor e ilustrado com doutrina e jurisprudência.
Neste pressuposto, o nosso julgamento é o seguinte:
Salvo disposição legal em contrário, designadamente o disposto no nº 1 do artigo 38º da LGT, os negócios dos contribuintes são eficazes fiscalmente, nos mesmos termos em que o são no comércio jurídico em geral. Esta é a regra aflorada no artigo 11º, nº 1 da LGT.
O contribuinte tem, como decorrência do direito fundamental à livre iniciativa económica, liberdade de conduzir a sua actividade de gerar lucros e manter a sua fonte produtiva como melhor lhe parecer com vista a esse fim. Assim, não é atributo da AT sindicar, seja a posteriori seja a priori, a oportunidade circunstancial das concretas decisões tomada nesse âmbito, muito menos para daí concluir pela dispensabilidade e, portanto, da não dedutibilidade de um custo.
É certo que as circunstâncias sincrónicas e diacrónicas de determinado negócio podem revelar que este, objectiva e evidentemente, só pode ser dispensável ou até prejudicial para os fins da obtenção de proveitos e da manutenção da fonte produtiva do contribuinte.
São, desde logo, aqueles casos em que se geram gastos em benefício de terceiros ou dos sócios sem qualquer contrapartida real ou com contrapartida muito inferior ao gasto, sem justificação possível ou verosímil.
Aliás, esses gastos podem ocorrer acompanhados de elementos objectivos e subjectivos indiciadores de fraude à lei, sendo então aplicável o nº 2 do artigo 38º da LGT, in casu, na redacção original, introduzida pela Lei nº 100/99 de 26/7, que era a seguinte:
“São ineficazes os actos ou negócios jurídicos quando se demonstre que foram realizados com o único ou principal objectivo de redução ou eliminação dos impostos que seriam devidos em virtude de actos ou negócios jurídicos de resultado económico equivalente, caso em que a tributação recai sobre estes últimos.”
No nosso caso, tratando-se de uma venda efectiva de participação social sem qualquer outro negócio dissimulado, a AT não tinha como se valer desta cláusula.
Assim, a desconsideração do custo tinha sempre de fundar-se, não numa qualquer ineficácia da transmissão, mas na alegação de uma manifesta dispensabilidade ou prejudicialidade do negócio, para a manutenção da fonte produtiva da Impugnante ou para a sua capacidade de gerar proveitos.
Sucede que este tribunal não vê que seja manifesta e evidente a falta de relação de sentido e utilidade da transmissão da [SCom02...], em ordem à manutenção da fonte produtiva e a geração de proveitos pela Impugnante.
Vejamos:
A vantagem não é apenas fiscal. Com efeito, tratava-se de uma empresa com um passivo enorme e urgentemente carecida de investimento de capital (cf. alínea SS dos factos provados). Por outro lado, foram julgados provados os factos MMM, NNN e OOO, que consistem materialmente em que a Impugnante ponderou a venda da [SCom02...] entre outras soluções para superar as dificuldades da participada, de onde decorre não se poder excluir uma intenção ou uma destinação objectiva da venda à manutenção da fonte produtiva de ambas as empresas.
É certo que em alguma medida o mau estado da [SCom01...] e a venda por insignificante preço se devera à cisão da [SCom02...].
Porém, tal cisão ocorrera bem dois anos antes da venda e, ao que se provou, com pelo menos uma comprovada motivação racional – cf. facto provado NN – não constando provada essa outra de descapitalizar para depois vender por insignificante valor e deduzir menos valias. Além disso provou-se que a Impugnante ainda injectou, depois da cisão, 13 500 000 na participada e fez-lhe suprimentos no montante de 20 849 271,37 € e prestações suplementares no montante de 16 692 306,54 € ou seja, teve todos estes avultados custos, certamente para manter a participada em funcionamento, o que não se pode presumir que fizesse se o seu objectivo com a cisão fosse simplesmente realizar menos valias fiscais.
A diferença abissal entre os valores de aquisição e venda não é facto inédito nem muito menos inexplicável in casu, atenta o estado calamitoso da participada, tendo em conta que, com a venda, ainda que por irrisório preço, a Impugnante alienou todo o passivo relativamente a terceiros, de que, como única accionista da participada, era potencial responsável.
Tudo considerado, concluímos que não estavam provados factos de que decorresse manifesta falta de racionalidade da venda da [SCom02...] pelo preço praticado ou a intencional descapitalização em ordem apenas a uma indevida “poupança” fiscal, pelo que a desconsideração da menos valia com o fundamento invocado pela AT e pela sentença recorrida foi indevida, por violação do artigo 23º nº 1 do CIRC.
O recurso e a impugnação procedem, portanto, no que a esta parte respeita.

d - Das perdas decorrentes das cedências dos direitos decorrentes das prestações suplementares de capital no montante de 16 692 306,54 €, e dos suprimentos à mesma participada, no montante de 20 849 271,37 €, pelo preço global de 106 496,32 €.

Também aqui cumpre notar a irrelevância de toda a parte da fundamentação da sentença recorrida que resulte em qualquer melhoria da fundamentação, pelo Tribunal recorrido, do acto impugnado.
No relatório da Inspecção, a desconsideração destas perdas foi fundamentada pela AT nos termos da parte “B – cedência de créditos” do item 3.1.1.5 do RIT acima transcrito.
Essencialmente, começou-se por expor a diferença de natureza e de tratamento fiscal de uma e outra operações, notando-se a incompatibilidade dessa diversidade de natureza e de regime fiscal com a consideração de um preço global e indiscriminado para ambas, mas, sem embargo, sustentou-se que uma e outra transmissão deveriam ser tratadas como menos valias.
Assim, entendeu-se que a perda com transmissão dos direitos decorrentes das prestações suplementares, atenta a definição de mais e menos valias contida no nº 1 do artigo 43º do CIRC, devia ser tratada como menos valia, atenta a natureza de activo imobilizado, dos créditos com fonte em tais prestações e, portanto, dedutível apenas por metade, conforme nº 3 do artigo 42º do CIRC, mas que, in casu, tal não era admissível, atenta a indispensabilidade da perda, para os efeitos do artigo 23º nº 1 do CIRC, pelos mesmos motivos já explanados quanto à veda da [SCom02...].
Quanto aos suprimentos, o fisco considerou que, apesar de verdadeiros empréstimos, devem ser tratados como imobilizações financeiras, pelo que as perdas com a venda também são menos valias, valendo como custo apenas por metade.
Contudo, diz o Fisco, nem mesmo a contabilização como menos valias – e a dedução do correspondente custo por metade – poderiam, se tivesse sido contabilizadas nesses termos – ser aceites, quer porque não temos um preço discriminado de realização para cada uma das duas operações, quer porque lhes falta o requisito da indispensabilidade para os efeitos do citado artigo 23º nº 1 do CIRC, uma vez que ficou por demonstrar, pela Impugnante a incobrabilidade desses créditos nos termos do artigo 39º do CIRC. Com efeito, entendeu-se que “a não aceitação como custo da “desvalorização" do crédito em si considerado, em atenção à sua cobrança, não pode deixar de se repercutir sobre a própria aceitação como custo das perdas resultantes na respectiva alienação. Caso contrário, as regras estabelecidas para a aceitação como custos de créditos incobráveis seriam completamente ultrapassadas, admitindo-se como custo, sem justificação bastante (v. g. pelos encargos da cobrança), uma perda em crédito perfeitamente cobrável ou cuja incobrabilidade não foi objecto de reconhecimento em conformidade com a lei fiscal.

A sentença recorrida, na parte em que aprecia o mérito desta fundamentação do acto impugnando, é redutível aos seguintes excertos:
3.3) A dedutibilidade das perdas decorrentes de cedência de créditos de prestações suplementares de capital e dos suprimentos. —
(…)
3.3.1) A dedutibilidade das perdas decorrentes de cedência do crédito de prestações suplementares de capital.
(…)
As perdas sofridas com a transmissão onerosa das prestações suplementares de capital constituem fiscalmente uma mais ou menos valia nos termos do art. 43.° do CIRC. —
A determinação do seu valor e da correspondente mais ou menos valia depende do valor da respectiva realização. —
No caso em apreço, pese embora a impugnante contabilizasse a alienação das prestações suplementares de capital e os suprimentos em contas separadas, não foi possível apurar qual foi o valor de alienação de umas e outros. Com efeito, a impugnante alienou as prestações suplementares e os suprimentos pelo valor total de 106.496,27 €, não especificando qual era o valor que correspondia à alienação das prestações suplementares e qual era o valor que correspondia à alienação dos suprimentos (fis. 171 a 177 do apenso). —
Competia à impugnante separar e provar os custos com a alienação das prestações suplementares, dos custos com a alienação dos suprimentos. Não tendo especificado uns e outros, não se pode imputar a totalidade dos custos a qualquer um deles, nem se pode imputar 0 custo efectivo de, a cada um deles. —
Atendendo que a subsunção do juízo de indispensabilidade para uns e outros é essencialmente diferente, importava apurar o valor de realização concreta de cada um deles. Não tendo sido feito esse apuramento, não tendo a impugnante determinado em concreto qual o valor de alienação das prestações suplementares e dos suprimentos, não pode agora fazer-se uma concretização do custo, de cada um deles e apurar, em concreto, a menos valia de cada um deles e como tal não podem relevar como custo fiscal, uma vez que não é possível determinar a respectiva indispensabilidade {art. 23º, n.° 1, alínea /), do CIRC), —
Acresce que a indispensabilidade deste custo estava também afastada, nos mesmos moldes e pelos mesmos fundamentos da indispensabilidade do custo decorrente da alienação da participação social, referida anteriormente no ponto 3.2).
(…)
Fica assim prejudicada a aplicabilidade do art. 42.°, n.° 3, do CIRC. —
Nesta parte a impugnação também improcede.
3.3.2) A dedutibilidade das perdas decorrentes de cedência do crédito de suprimentos. —
(…)
Vejamos o caso dos autos.
A alienação dos suprimentos como cessão a título oneroso de um crédito do activo imobilizado constitui, do ponto de vista fiscal, uma mais ou menos-valia (art. 43.º, n.°s 1 e 3, aliena f), do CIRC), estando a aceitação do custo fiscal da menos-valia dependente da prova da sua indispensabilidade (art. 23.° do CIRC).
A indispensabilidade do respectivo custo não foi demonstrada pela impugnante.
Por um lado, como se disse já a propósito da alienação das prestações suplementares, a impugnante alienou as prestações suplementares e os suprimentos por um preço global, não identificando o valor de alienação de uma e outros, não permitindo por isso apurar, em concreto, o valor das menos valias resultantes da alienação das prestações suplementares e dos suprimentos, pelo que não permitindo apurar o custo exacto da alienação de umas e outros, não pode agora apurar-se o valor da menos-valia imputável à alienação dos suprimentos. —
Em consequência, não pode relevar-se como custo fiscal. —
Por outro lado, a indispensabilidade da alienação dos suprimentos não foi comprovada pelos mesmos motivos que não foi comprovada a indispensabilidade da alienação das participações sociais. Os fundamentos da falta de indispensabilidade do custo da alienação das participações sociais e das prestações suplementares de capital no ponto 3.2), que aqui se dão por integralmente reproduzidas (…).
Todas estas circunstâncias revelam que a cedência do crédito de suprimentos naquelas circunstâncias não demonstram a existência de uma indispensabilidade do custo daquela alienação.
Finalmente, a invocação do art. 39.° do CIRC não constitui qualquer ilegalidade, porquanto decorre da fundamentação do relatório que a incobrabilidade dos créditos nos termos dessa disposição legal, foi invocada apenas como critério de fixação da indispensabilidade do custo, isto é, a administração tributária invocou o critério de incobrabilidade dos créditos do art. 39.° como critério de orientação para fixação da indispensabilidade do custo.
A utilização desse critério para fixação da indispensabilidade de um custo, a par de outros, não encerra em si nada de ilegal. —
(…)
Mais ainda. A utilização do critério da incobrabilidade dos créditos nos termos do art. 39.° do CIRC, constitui também uma forma de evitar a fraude â lei, conforme refere a administração tributária. —
A utilização da incobrabilidade dos créditos, como critério da determinação da indispensabilidade dos custos para efeitos fiscais, constitui um critério razoável e obsta que possa utilizar-se a alienação de créditos como forma de considerar como custo fiscal um prejuízo decorrente da alienação de um crédito cobrável (o sujeito passivo em vez de assumir os custos da cobrança de um crédito, alienava-o com um prejuízo, pelo menos equivalente a esse custo e obtinha dessa forma um custo fiscal) ou cuja incobrabilidade não tinha sido objecto de reconhecimento em conformidade com a lei fiscal. —
Daí que entendamos que o custo da alienação dos suprimentos não pode considerar-se como custo comprovadamente indispensável para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, pelo que não pode ser aceite como custo fiscal nos termos dos arts. 23.°, n.° 1, alínea /), e 43.°, n.°s 1 e 3, alínea f), do CIRC. —
Aqui a impugnação também improcede.”
A Recorrente sustenta que a proibição da analogia nas normas de incidência tributária proscreve a consideração de qualquer destas perdas como menos valias: quer as prestações suplementares de capital, precisamente porque só a redacção subsequente do nº 3 do artigo 42º do CIRC, introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, veio dar uma nova redacção ao n.° 3 do art.° 42.° do CIRC, que passou a prescrever que a “diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução do capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”; quer as perdas sofridas com activo circulante, como é o caso dos empréstimos exigíveis, que se vencem e cujos reembolso e juros são exigíveis como os de qualquer outro mútuo.
De todo o modo – diz – o preço de venda, por ser global, não obsta ao tratamento diferenciado de uma e outra perdas, devendo nesse caso tomar-se como preço de cada transmissão a proporção de cada uma no valor total.
Mais conclui que a desconsideração fiscal de tamanhas perdas como as que estão provadas atenta contra o princípio da tributação das empresas pelo lucro real.
Quid juris?
Comecemos pelo tratamento fiscal a dar a um e outro custo.
A Recorrente, ao recusar a natureza de menos valia ao custo incorrido com a venda das prestações suplementares feitas à participada parte do pressuposto, errado, de que é no nº 3 do artigo 42º do CIRC que se deve procurar a delimitação do conceito de mais valia. Assim, a venda de prestações suplementares só poderia dar azo a menos e mais valias a partir da entrada em vigor da redacção acima transcrita daquela norma. Até lá, como a norma só falava de transmissão onerosa de “partes de capital” (e não, também, de “ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares”) esta espécie de perdas seria dedutível como qualquer outro custo.
Por sua vez, o Fisco e o Mº Juiz a quo arrimam-se no teor do corpo do artigo 43º nº 1, norma que, essa sim, define o conceito de mais e de menos valias, conforme a respectiva epígrafe, para assimilarem ao conceito de menos valia, quer a venda das prestações suplementares, quer a cessão do crédito por suprimentos, numa interpretação incompatível com a letra do preceito, no que respeita aos suprimentos, pois estes não integram o activo imobilizado, mas sim o circulante, como já expusemos. De outra interpretação, no mínimo, não literal do nº 3 do artigo 42º do CIRC, concluem que o valor de todas as menos e ou mais valias, incluindo as geradas por transmissão onerosa de prestações suplementares e outos elementos do activo imobilizado e as (putativamente) geradas pela cessão dos créditos por suprimentos, apenas poderia relevar, como custo, em metade (se porventura se demonstrasse a sua indispensabilidade nos termos do artigo 23º nº 1 do CIRC.
Ora, não nos parece que seja isso que resulta da conjugação destas duas normas do CIRC, no quadro do princípio da legalidade e da proibição de aplicação analógica das normas de incidência tributária. Vejamos:
As prestações suplementares (vide artigos 210º e sgs do CSC) integram pela sua natureza mui bem explicada no RIT, o activo imobilizado, pelo que as perdas ocorridas com a sua transmissão são menos valias, conforme o artigo 43º nº 1 do CRC. Porém, nem elas são capital da participada, embora o possam vir a ser, nem o direito da participante que as prestou corresponde a uma participação no capital da participada, embora o possa vir a ser.
Como assim, não se pode retirar directamente dos termos do nº 3 do artigo 42º, como fazem o acto impugnado e a sentença recorrida, a norma de que a menos valia realizada por venda de prestações complementares de capital é dedutível apenas por metade.
Pelo contrário, considerando a norma da proibição da analogia nas normas tributárias relevantes para incidência do imposto, consagrada no nº 3 do artigo 11º da LGT e os princípios da tipicidade e da legalidade tributária, e ainda o princípio – da ordem dos direitos liberdades e garantias – da Segurança Jurídica no Estado de Direito (artigo 2º da Constituição), o intérprete tem de se ficar pela conclusão de que, até à reformulação do nº 3 do artigo 42º do CIRC pela lei nº n.° 60-A/2005, de 30 de Dezembro, apenas “as menos e mais valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital” concorriam para a matéria tributável apenas em metade do seu valor. As restantes menos e mais valias concorriam por inteiro, como custo ou como proveito, respectivamente, para a matéria tributável.
Deste modo, a menos valia realizada com venda de prestações suplementares valia por inteiro, como qualquer outro custo.
Quanto à venda dos créditos por suprimentos, muito menos sentido faz sustentar a sua relevância por metade nos termos do nº 3 do artigo 42º do CIRC, na redacção anterior à citada lei nº 60-A/2005: quer porque não se trata de activo imobilizado, mas, enquanto empréstimos do sócio à sociedade, activo circulante, quer porque, mesmo que de menos valia se tratasse, sempre estaria fora da restrição de relevância disposta no nº 3.
Podemos assentar, assim, em que, quer as perdas com a venda das prestações suplementares, quer as perdas com a venda do crédito por suprimentos, podiam ser deduzidos na totalidade do seu valor.
Esta igualdade de tratamento de uma e outra perdas quanto à percentagem do custo a relevar (100%) não torna irrelevante o óbice levantado pelo Fisco e confirmado na sentença recorrida, do tratamento fiscal diferenciado. Efectivamente, não é indiferente saber que valor atribuir aos preços de cessão de um e outro direitos, pois quanto à menos valia pode haver a relevar, no valor da realização, outros encargos que lhe sejam inerentes, conforme dispõe o corpo do nº 2 do artigo 43º do CIRC.
Por sua vez, a perda inerente à cessão do crédito por suprimentos também só se pode quantificar se tivermos um dado preço de venda.
Há, portanto, necessidade de se saber o valor de realização da menos valia e valor do preço da cessão do crédito por suprimentos.
Porém não vemos como não dar razão, nesta matéria, à Recorrente, quando sustenta que se deveria representar, como valor de realização e de venda, respectivamente a parte, no preço global, proporcional ao montante das prestações e ao montante dos suprimentos.
Na verdade, se se aceita o custo – e ele é evidente, pois o preço global é inferior à soma do valor das prestações e dos suprimentos – é forçoso quantificar um e outro custos por aquele lógico meio. A alternativa seria o absurdo de não haver qualquer perda apesar de a haver em mais de 16 e de 20 milhões, respectivamente.
Convimos, portanto, em que o valor dedutível da menos valia realizada com a venda das prestações suplementares é determinado pela totalidade da diferença entre 16 692 306,54 € (montante das prestações suplementares) e a parte do preço global de venda de ambos os activos proporcional ao peso do montante das prestações suplementares no produto da soma destas com o crédito por suprimentos (44.5% = 47 390,72 €).
Assim, sem prejuízo da contabilização de quaisquer encargos devidamente documentados com a realização da venda das prestações suplementares (cf. corpo do nº 2 do artigo 43º do CIRC) o valor dedutível da menos valia realizada com a venda das prestações suplementares era de 16 692 306, 54 – 47 392,72 = 16 644 913,82 €.
Quanto ao crédito por suprimentos a perda também se definia nos mesmos termos, desta feita sem a ressalva de quaisquer encargos a acrescentar, valendo desta feita a percentagem de 55,5%.
Fica-nos assim para apreciar a existência, ou não, da indispensabilidade dos custos, exigida pelo artigo 23º nº 1 do CIRC.
No tocante à venda das prestações suplementares, o fisco e a Sentença recorrida arrimaram a sua conclusão da não verificação de tal requisito nos mesmo motivos por que assim concluíram quanto à transmissão da participação na [SCom02...].
Como assim, evitando delongas, dá, o Tribunal, por reproduzido tudo quando discorremos a em ordem à conclusão pela verificação de tal requisito naquela transmissão, concluindo, com tal fundamento, pela indispensabilidade da menos valia com a veda das prestações suplementares, nos termos do artigo 23º nº 1 do CIRC.
Quanto ao custo com a cessão do crédito por suprimentos:
A Inspecção encontrou o fundamento para concluir pela falta de indispensabilidade no facto de a recorrente não se ter desembaraçado do ónus de demonstrar que o crédito transmitido era incobrável, nos termos do 39º de então do CIRC, segundo o qual “os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos (…) na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o esta se mostre insuficiente”.
Alegou que se assim não fosse estaria aberta a porta para a fraude, isto é, poder-se-ia contornar os requisitos dispostos no referido artigo 38º para a dedução, como custo, de um crédito incobrável, simulando a sua cessão por preço irrisório.
A sentença recorrida secundou e confirmou este critério.
Não a podemos corroborar.
Trata-se de um critério intoleravelmente formal e indiferente à realidade, sendo certo que o que se pretende, em regra, no nosso sistema fiscal, é tributar rendimento real.
Mas além disso é um critério absurdo, pois resulta fatalmente na impossibilidade/inutilidade da dedução de custos quejandos. Com efeito, se os créditos forem de facto e de direito incobráveis, com todos os requisitos de forma exigidos pelo artigo 39º, então podem ser deduzidos na totalidade pelo que não há utilidade nem mesmo sentido em deduzir o valor, sempre menor, que seria o da diferença entre o valor nominal e o de uma cedência, aliás, improvável, por falta de interessados, atenta a incobrabilidade adquirida, de facto et de jure.
Quanto à fraude, essa, pode e deve combater-se nos termos do nº 2 do artigo 38 da LGT.

Conclusão
De tudo o exposto resulta que o recurso merece provimento em tudo o que resulta das alíneas C e D e não o merece no mais que era o seu objecto.


V – Da prestação de garantia.
Do que se concluiu quanto ao recurso resulta ir revogada a sentença recorrida também na parte em que se pronunciou sobre se a garantia prestada pela Impugnante era devida ou indevida.
Em consequência do decidido no recurso e na sentença, na parte em que transitou em julgado, consigna-se que a garantia foi indevida em 99% do seu valor.

Custas
A procedência parcial do recurso da Impugnante bole com a repartição da responsabilidade pelas custas de toda a acção, nos termos do artigo 527º do CPC. Assim, haverá que proferir decisão quanto às custas em ambas as instâncias, as quais ficarão a cargo de ambas as partes na proporção do decaimento a final.
Atento o decaimento final quanto aos custos considerados e desconsiderados, julgamos proporcional 1% para a Recorrente e 99% para a Recorrida AT.
Considerando que a conduta processual das partes não é merecedora de qualquer censura ou reparo e o concreto valor das custas a suportar pela parte que teve maior decaimento se afiguraria (não havendo dispensa do pagamento do remanescente) algo desproporcionado, entendemos que se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso nos termos do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do RCP, pelo que dispensamos as partes do respectivo pagamento.

VI - Dispositivo
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder parcial provimento ao recurso, isto é, no tocante a tudo o que decorre das alíneas c) e d) da segunda questão acima enunciada e discutida e, consequentemente, julgar a impugnação, na parte recorrida, parcialmente procedente, anulando-se as liquidações impugnadas, também na parte que relevou da desconsideração dos custos incorridos com a transmissão onerosa da participação da impugnante na empresa [SCom02...] e com a venda dos direitos relativos a prestações suplementares e a suprimentos, da Impugnante sobre a mesma sociedade participada.
No mais que era objecto de recurso, mantém se a improcedência da impugnação.
Custas, em ambas as instâncias, por ambas as partes, consoante o decaimento final, que se fixa em 1% para a Recorrente e 99% para a recorrida. Artigo 527º do CPC.
Porto, 23/11/2023

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Irene Isabel Gomes das Neves
José António Oliveira Coelho