Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00683/17.2BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Carlos de Castro Fernandes
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA;
VALOR DO PROCESSO;
ISENÇÃO DE PROPINAS;
Sumário:
I - A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

II – Á data dos factos, nas situações não previstas no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT dever-se-ia aplicar o disposto n.º 2 do mesmo artigo, o qual determinava que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais”.

III – No entanto, estando concretamente em causa uma ação administrativa em que foi peticionada a anulação de um ato de indeferimento de isenção do pagamento de propinas, com o consequente e implícito pedido do direito à respetiva isenção, o valor do processo há-de fixar-se de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 97.º-A do CPPT e não de acordo com o n.º 2 desta mesma norma, então ainda vigente.

IV – Cabendo agora ao Juiz o poder-dever de fixar o valor da causa, não estando de acordo com o valor assumido pelas partes, não fornecendo os autos elementos suficientes para o poderem determinar, deverá o Juiz ordenar as diligências que tiver por necessárias para a sua verificação e posterior fixação, nos termos do art.º 308.º do CPC ex vi art.º 2.º do CPPT e n.º 4 do art.º 31.º do CPTA.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – «AA» (Recorrente), melhor identificado nos autos, veio interpor recurso contra o despacho saneador/sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, pela qual se julgou parcialmente procedente a ação intentada contra a Universidade de ... (Recorrida), na qual peticionava anulação do despacho pelo qual se lhe negou o pedido de isenção do pagamento de propinas e se pediu o reconhecimento do direito de isenção daquelas.

No presente recurso, o Recorrente formula as seguintes conclusões:
1. O TRIBUNAL A QUO AO DECIDIR COMO DECIDIU FAZ ERRADA INTERPRETAÇÃO DA LEI E DO DIREITO APLICÁVEIS IN CASU.
2. A DECISÃO RECORRIDA COMEÇA POR RECONHECER QUE A PRESENTE AÇÃO É UMA AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE DIREITOS PARA DEPOIS, E APÓS A PÁGINA 19 TRATÁ-LA COMO AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO.
3. ASSIM, SE PRIMEIRAMENTE RECONHECE QUE SE TRATA DE UMA AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE DIREITOS, IN CASU, O DIREITO DO AQUI RECORRENTE À ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS REFERENTES AO CURSO DE DOUTORAMENTO EM CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO QUE FREQUENTOU NA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE ... ..., TENDO ADEMAIS RECONHECIDO O DIREITO DE ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS DO DOCENTE POR ENTENDER QUE SE ENCONTRAVA EFETIVAMENTE ENQUANTO DOCENTE NO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO NO N.º 4 DO ARTIGO 4.º DO DEC.-LEI N.º 216/92, DE 13.10, A VERDADE É QUE, LIMITA TAL DIREITO AO ANO DE 2015/2016.
4. O TRIBUNAL A QUO AO DECIDIR COMO DECIDIU, PELA APLICABILIDADE DA ISENÇÃO PREVISTA NO N.º 4 DO ARTIGO 4.º DO DL N.º 216/92, DE 13 DE OUTUBRO APENAS RELATIVAMENTE AO ANO LETIVO DE 2015/2016, POR ENTENDER QUE SÓ REFERENTE A ESSE ANO LECTIVO É QUE O AQUI RECORRENTE CUMPRIU UM “PRAZO CONCRETO” FAZ ERRADA INTERPRETAÇÃO DA LEI E DO DIREITO.
5. NA PRESENTE AÇÃO ESTÃO EM CAUSA PEDIDOS TÍPICOS DA AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE DIREITOS PARA A QUAL NÃO ESTÁ DETERMINADO QUALQUER “PRAZO CONCRETO.”.
6. NA SENTENÇA DO TAF DE ... DATADA DE 12/04/2018, TRANSITADA EM JULGADO, PROFERIDA NO ÂMBITO DO PROCESSO N.º 601/16.5BECBR QUE “(…) O DECRETO-LEI N.º 216/92 NÃO ESTATUI QUALQUER REGRA DE PRAZO COM EFEITOS PRECLUSIVOS, (…).”.
7. ESTÁ EM CAUSA O RECONHECIMENTO DE SITUAÇÕES JURÍDICAS OBJETIVAS DECORRENTES DA LEI, EM ESPECIAL, O DIREITO DO AQUI RECORRENTE À ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS REFERENTES AO CURSO DE DOUTORAMENTO EM CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO QUE FREQUENTOU NA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE ... NOS TERMOS E AO ABRIGO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 2.º, n.º2, alíneas a) e g), 4.º, n.º 2, al. e) e 37.º, n.º 1 al.s a) e g) do CPTA.
8. CONFORME RECONHECIDO NA SENTENÇA RECORRIDA O AQUI RECORRENTE APENAS PODERIA INGRESSAR NA CARREIRA DOCENTE CASO OBTIVESSE O DOUTORAMENTO ATÉ 31 DE AGOSTO DE 2018 FACE AO N.º 1 DO ARTIGO 2.º CONJUGADO COM O Nº1 DO ARTIGO 5º, AMBOS DO DL N.º 45/2016, DE 17/8 ALTERADO PELA LEI N.º 65/2017, DE 9/8, PELO QUE TEM DIREITO A BENEFICIAR DO DIREITO POTESTATIVO PURO À ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS EM TODO O CURSO DE DOUTORAMENTO QUE FREQUENTOU NA UNIVERSIDADE DE ... NOS TERMOS DO ARTIGO 4.º, N.º 4 DO DL N.º 216/92, DE 13 DE OUTUBRO.
9. O RECONHECIMENTO DO DIREITO EM CAUSA É IGUALMENTE INDEPENDENTE DE QUALQUER OBRIGATORIEDADE POR PARTE DO RECORRENTE DE FORMULAR PEDIDOS DE ISENÇÃO ANUAIS CONFORME PARECE RESULTAR DA SENTENÇA RECORRIDA, TANTO MAIS QUE, A RECORRIDA BEM SABE O PERÍODO DE TEMPO EM QUE O RECORRENTE FREQUENTOU O DOUTORAMENTO, FACTO, DE REST0, ADMITIDO POR ACORDO.
10. É ILEGAL RESTRINGIR O RECONHECIMENTO DE UMA SITUAÇÃO JURÍDICA SUBJETIVA DIRETAMENTE DECORRENTE DE NORMAS JURÍDICO-ADMINISTRATIVAS, COMO É O CASO DA ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS A UM DETERMINADO ANO LETIVO QUANDO OS PRESSUPOSTOS PARA A ISENÇÃO SE VERIFICAM EM TODOS OS ANOS LETIVOS DO DOUTORAMENTO QUE FREQUENTOU, TANTO MAIS QUE, FACE AO TIPO DE AÇÃO EM CAUSA NÃO EXISTE QUALQUER PRAZO.
11. AS PRETENSÕES PETICIONADAS EM JUÍZO NÃO DEPENDEM, NEM EXIGEM A PRÁTICA DE ATOS ADMINISTRATIVOS, POR OS TERMOS DA ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE PROPINAS AOS DOCENTES QUE ESTEJAM OBRIGADOS A OBTER O DOUTORAMENTO NÃO SE INSERIREM NO ÂMBITO DOS PODERES DE AUTORIDADE DA ADMINISTRAÇÃO, MAS ANTES DECORREREM DIRETAMENTE DA APLICAÇÃO DE NORMAS COM CARÁTER IMPERATIVO, SENDO QUE, NO CASO DECORREM DO N.º4 DO ARTIGO 4.º DO DL N.º 216/92, DE 13 DE OUTUBRO.
12. E, A VERDADE É QUE, O PRÓPRIO TRIBUNAL A QUO REFERE QUE “O ACTO ADMINISTRATIVO ASSUME NESTE CASO UMA NATUREZA MERAMENTE DECLARATIVA, UMA VEZ QUE A ISENÇÃO DE PAGAMENTO DAS PROPINAS RESULTA DIRECTA E IMEDIATAMENTE DA LEI”, PELO QUE É ILEGAL RESTRINGIR O DIREITO DO RECORRENTE A UM DETERMINADO ANO LETIVO TENDO A DECISÃO RECORRIDA, DESDE LOGO, VIOLADO O N.º 4 DO ARTIGO 4.º DO DL N.º 216/92, DE 13 DE OUTUBRO.
13. O TRIBUNAL RECORRIDO FEZ ERRADA APLICAÇÃO DO ESTATUTO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS (EBF) AO CASO SUB JUDICE
14. O RECORRENTE IMPUGNA O VALOR FIXADO À CAUSA POR, IN CASU, SE APLICAR O CRITÉRIO SUPLETIVO INSERTO NO ARTIGO 34.º DO CPTA.
Termina, o Recorrente, pedindo que o presente recurso seja julgado totalmente procedente, devendo ser revogado o despacho saneador-sentença na parte em que decidiu limitar o direito do docente à isenção do pagamento de propinas no curso de doutoramento que frequentou na Universidade de ... ao ano letivo de 2015/2016.
Respondendo ao apontado recurso, a Recorrida (Universidade de ...) apresentou contra-alegações, nestas concluindo que:
O presente recurso jurisdicional terá que ser julgado improcedente, pois a decisão em recurso decidiu em conformidade com a prova carreada e com a lei, não assistindo como tal qualquer razão à tese defendida pelo Recorrente, pelo que sempre o presente recurso jurisdicional terá que improceder.
Na verdade, o aresto em recurso não enferma de qualquer erro de julga- mento ao concluir que o Recorrente tem direito à isenção de propinas apenas com efeitos circunscritos ao ano lectivo de 2015/2016 – e não relativamente aos demais anos do seu doutoramento.
Com efeito, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) o benefício fiscal em causa nos presentes autos assume uma natureza meramente declarativa, uma vez que a isenção de pagamento das propinas resulta directa e imediatamente da lei.
Para além disso, o artº 12.º do EBF determina que a constituição dos benefícios fiscais se reporta à data dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento “declarativo” pela Administração, o que significa que o pedido do reconhecimento da isenção reportaria os seus efeitos à data da verificação dos pressupostos da mesma, que coincide, in casu, com a data da entrada em vigor do Dec.-Lei n.º 207/2009, de 31.08 – ou seja, dia 01.09.2009.
Contudo, como bem nota o aresto em recurso, isto não significa que o Recorrente pudesse vir, a todo o tempo, e independentemente do momento da verificação dos ditos pressupostos, formular o pedido de reconhecimento da isenção e beneficiar da mesma ab initio.
Com efeito, nessa matéria a nossa mais autorizada jurisprudência não tem dúvidas, afirmando que “...o legislador ao afirmar que o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos, no caso dos benefícios dependentes de reconhecimento, não quis criar a regra de que o interessado pode a todo o tempo, independentemente do momento da verificação dos ditos pressupostos, formular o seu pedido de reconhecimento da isenção e beneficiar da mesma ab initio, antes quis proteger os interessados das demoras, abusivas ou conjunturais, da actuação da administração, fazendo retroagir a operabilidade da isenção a momento anterior - a isenção será reconhecida perante pressupostos de facto já consolidados antes da formulação do pedido junto da administração - colocando-a, assim, fora da influência da própria actividade administrativa...” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.10.2016, Proc. n.º 01664/15),
Pelo que “...a fixação de um prazo para a apresentação do pedido e consequente operabilidade da isenção visa proteger a estabilidade dos actos tributários (...) e faz recair sobre o requerente do pedido a escolha do momento a partir do qual pretende beneficiar da referida isenção (ou a opção pela não operabilidade da isenção - cfr. artigo 69º, n.º 1 da LGT), sendo certo que se o fizer dentro dos prazos legalmente estabelecidos poderá beneficiar da mesma ab initio...” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.10.2016, Proc. n.º 01664/15).
Contudo, a verdade é que o Recorrente não alega concretamente que procedeu à sua inscrição no doutoramento em todos os anos lectivos – ou seja, desde o ano lectivo de 2008/2009 até ao ano lectivo de 2015/2016 –,
Sendo certo que da prova produzida só resultaram dois pedidos apre- sentados pelo Recorrente a solicitar o reconhecimento de isenção – um de 2015, outro de 2012 – e que este ultimo foi indeferido e não impugnado judicialmente – assim se mantendo no ordenamento jurídico;
10ª Para além de que em 2008/2009 ainda não poderia beneficiar da isenção que invoca porquanto não era obrigatória a obtenção do grau de doutoramento para se manter na carreira docente no Ensino Superior Politécnico;
11ª Pelo que dúvidas não há em como o pedido de isenção apresentado em 2015 tem mera eficácia ex nunc e apenas pode surtir efeitos no ano lectivo de 2015/2016, tal como foi decidido no aresto em recurso;
12ª Para além disso, também o vício de incompetência de que alegadamente padece o acto impugnado nunca poderia ser julgado procedente, uma vez que o reconhecimento do invocado vício não produziria qualquer modificação no status quo do Recorrente, já que se está perante acto de conteúdo negativo;
13ª Sendo certo que, ainda assim, não só o Administrador da Universidade de ... integra a estrutura orgânica da mesma pessoa colectiva que o Reitor daquela (cfr. artigos 25.º, n.º 1, al. b), e 27.º dos Estatutos da Universidade de ... - Despacho Normativo n.º 43/2008),
14ª Como sempre se diga que tal acto foi proferido ao abrigo de um despacho de delegação de competências do Reitor ao Administrador, pelo que mesmo não havendo expressa menção ao facto de ser exercido no âmbito de tais competências delegadas, a verdade é que tal ausência, só por si, também não determinaria a invalidade do acto – v. artº 48.º/2 do CPA,
15ª Pelo que não se verifica qualquer ilegalidade geradora de nulidade, bem decidindo o Tribunal a quo ao considerar que o Recorrente apenas tem direito à isenção de propinas no curso de Doutoramento com efeitos circunscritos ao ano lectivo de 2015/2016.
Termina a Recorrida pedindo que seja negado provimento ao presente recurso.
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Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal (cf. fls. 250 dos autos – paginação do SITAF).
*
Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

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II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
1. No dia 14.01.2009 o ora Autor efectuou a inscrição no curso de Programa de Doutoramento em Ciências e Tecnologia da Informação da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de ..., referente ao ano lectivo de 2008/2009;
_______________________________________________________________________________
Cfr. certificado multiusos emitido pelos serviços da Universidade de ... presente a fls. 28 dos autos.

2. O ora A. exerce funções de docente na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de ... desde Novembro de 2002, e até pelo menos dia 12.06.2008, com a categoria de Equiparado a Assistente do 1.º triénio;
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Cfr. Curriculum vitae do A. e formulário de candidatura ao programa doutoral em Ciência de informação e Tecnologia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de ..., respectivamente, de fls. 4-5 e 10 do Processo Administrativo (PA) em apenso.

3. O ora A. exerce as referidas funções de docente do Ensino Superior na categoria de Equiparado a Professor Adjunto em regime de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo desde, pelo menos, dia 18.09.2015 e até à data de entrada da p.i. neste Tribunal;
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Cfr. declaração dos serviços da ESEC e declaração do Administrador do Instituto Politécnico de ..., presentes a fls. 27 e 31 dos autos.

4. Em 21.09.2015 o ora A. apresentou nos serviços da Universidade de ..., requerimento com o seguinte teor:
«Assunto: Pedido de Isenção de Pagamento de Propinas de Doutoramento
(…)
1. Por ser docente do ensino superior politécnico, nomeadamente da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de ... (vide declaração anexa), o requerente encontra-se estatutariamente obrigado a obter o doutoramento, por força do Regime Transitório, para poder transitar para a carreira ao abrigo do disposto no Decreto-lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto, na redacção da Lei n.º 7/2010, de 13 de Maio, pelo que
2. ao requerente aplica-se o disposto no n.º 4 do artigo 4.º do Decreto-lei n.º 216/92, de 13 de Outubro, que dispõe que "estão isentos do pagamento de propinas os docentes do ensino superior que, nos termos do respectivo estatuto, estejam obrigados à obtenção dos graus de mestre e de doutor".
3. Tendo em atenção o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 17 de Abril de 2015, proferido no Processo n.º 655/12.3BECBR (…), transitado em julgado, que reconheceu inequivocamente o direito à isenção do pagamento de propinas como um direito subjectivo, oponível erga omnes, que vincula directamente não apenas o Estado, mas também as instituições do Ensino Superior Público, é inequívoco que o requerente tem direito a beneficiar da isenção do pagamento de propinas ao abrigo do supra referido comando legal.
4. Com efeito, pode ler-se nos pontos II e III do sumário do referido Acórdão o seguinte:
II - A norma do artigo 4.º/4 do citado Decreto-Lei n.º 216/92, de 13 de Outubro, mantida em vigor pelo artigo 35.º/1-e) da Lei n.º 37/2003, confere o direito de isenção do pagamento de propinas a qualquer docente do ensino superior que, nos termos do respectivo estatuto, esteja obrigado à obtenção do grau de mestre ou de doutor, ainda que a instituição de ensino superior onde frequente tal curso não coincida com aquela onde presta serviço docente.
III - No quadro do relação tripartida em que se processa o financiamento do ensino superior público, o referido "direito de isenção do pagamento de propinas" situa-se no plano da relação tributária entre o estudante e a instituição de ensino superior credora da taxo devida pelo serviço de ensino; enquanto que o "direito a receber a adequada compensação”, conferido à instituição onerada pela isenção e previsto no artigo 35.º/2-b) da mesmo Lei n.º 37/2003, se situa no plano do relação creditícia entre as instituições de ensino superior e o Estado (Ministério da tutela), pelo que a falta de regulamentação desta compensação não é transponível nem oponível no âmbito daquela outra relação jurídica, onde se mantém directamente operativo o referido direito de isenção do pagamento de propinas.
5. Assim, vem o requerente requerer que lhe sejam estendidos os efeitos de tal acórdão e como tal, reforçar que seja reconhecido o seu direito à isenção de propinas tal como oportunamente requerido.
Face ao exposto, requer que lhe seja reconhecido o direito à isenção do pagamento de propinas por se encontrar na previsão do abrigo do n.º 4, do artigo 4.º do Decreto-Lei nº 216/92 de 13 de Outubro e, consequentemente atribuído o respectivo beneficio no Nónio conforme resulta, aliás, da página web da Universidade de ... que se anexa.»;
_______________________________________________________________________________
Cfr. visado requerimento e informação dos serviços da Entidade Demandada sobre a data de entrada do mesmo, presentes a fls. 148-149 e 143 do PA em apenso.

5. Em 23.03.2016 recaiu sobre o referido requerimento informação elaborada pelos serviços de Gestão de Informação da Entidade Demandada, onde se pode ler, entre o mais, o seguinte:
«O Estudante, docente do Instituto Politécnico de ..., vem solicitar a isenção do pagamento da propina 2015/2016 ao abrigo do n° 4, do artigo 4° do Decreto-Lei n° 216/92, de 13 de outubro, alegando a necessidade de obtenção do grau de doutor para efeitos de progressão na respetiva carreira e o" ... Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 17 de Abril de 2015, proferido no Processo n.º 655/12.3BECBR disponível in www.dgsi.pt (…) transitado em julgado, que reconheceu inequivocamente o direito à isenção do pagamento de propinas como um direito subjectivo, oponível erga omnes, que vincula directamente não apenas o Estado, mas também as instituições do Ensino Superior Público, é inequívoco que o requerente tem direito a beneficiar da isenção do pagamento de propinas ao abrigo do supra referido comando legal."
Verifica-se que o Estudante apresentou idênticos pedidos no ano letivo 2012/2013 (44126NON, 45891 NON e 48353NON), Indeferidos por "... enquanto não existir a necessária regulamentação, aos docentes de outras instituições de ensino superior que se hajam matriculado na Universidade de ... e que venham aqui requerer isenção de propinas ao abrigo, exclusivamente, da referida norma, não é sustentável aceitar essa pretensão, tendo todavia a preocupação de assegurar a situação "aos docentes pertencentes ao mapa de Pessoal da Universidade de ...", conforme disposto no artigo 2° da Deliberação do Conselho Geral da Universidade ... [deliberação (extracto) n° 11812013, publicada no DR, 2ª série, n° 11, de 16 de janeiro)."»;
____________________________________________________________________________
Cfr. visada informação, presente a fls. 142-143 do PA em apenso.

6. Na sequência da informação referida no ponto anterior, foi ainda lavrado parecer pelos serviços da Entidade Demandada, em 19.03.2016, com o seguinte teor:
«Conforme exposto na informação de Serviço, e atendendo a que a situação invocada pelo Doutorando respeita a uma decisão individual sobre uma situação específica, a Universidade de ... tem entendido que enquanto não existir a necessária regulamentação, aos docentes de outras instituições de ensino superior que se hajam matriculado na Universidade de ... e que venham aqui requerer isenção de propinas ao abrigo, exclusivamente, da referida norma, não é sustentável aceitar essa pretensão, tendo todavia a preocupação de assegurar a situação "aos docentes pertencentes ao mapa de Pessoal da Universidade de ...", conforme disposto no artigo 2° da Deliberação do Conselho Geral da Universidade ... (deliberação (extracto) n° 11812013, publicada no DR, 2ª série, n° 11, de 16 de janeiro].
A Universidade ... encontra-se, assim, dependente da regulamentação da iniciativa da DGES, não lhe devendo ser exigível que, na sua ausência, seja chamada a suportar os encargos que decorreriam do deferimento das pretensões que anualmente lhe são dirigida, devendo os Docentes promover junto da Instituição de Ensino Superior a que se encontram vinculados, em consonância com recomendação do CRUP, o pagamento das propinas devidas pela frequência do Doutoramento na Universidade ....
Perante o exposto deve indeferir-se o pedido.»;
_______________________________________________________________________________
Cfr. visado parecer, presente a fls. 140-141 do PA em apenso.

7. Em 12.04.2016 o ora A. apresentou nos serviços da Entidade Demandada pronúncia por escrito sobre a proposta de indeferimento referida no ponto anterior;
_______________________________________________________________________________
Cfr. visada resposta e informação presentes a fls. 170 e ss. e 176 do PA em apenso.

8. Sobre a pronúncia apresentada pelo ora A. foi então elaborada informação pelos Serviços de Gestão de Informação da Entidade Demandada, em 01.06.2016, com o seguinte teor:
««AA», docente do Ensino Superior Politécnico, inscrito no Programa de Doutoramento em Ciências e Tecnologias da Informação, tendo requerido a isenção do pagamento de propinas ao abrigo do n.º 4, do artigo 4.º do DL n.º 216/92, de 13 de Outubro e sendo notificado no dia 30.03.2016 da proposta de indeferimento (req. n.º 78019NON), pelo ticket #1045223 datado de 12.04.2016 vem apresentar Audiência de Interessados ao abrigo do disposto nos artigos 121.º e ss. do CPA.
Na exposição agora apresentada, o Estudante mantêm (sic) na íntegra as razões justificativas que motivaram o pedido inicialmente apresentado e apensa um Relatório do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga. Refere também pretender o reembolso da quantia que foi obrigado a pagar para poder requerer admissão à prestação de provas de doutoramento.»;
_______________________________________________________________________________
Cfr. informação presente a fls. 176 do PA em apenso.

9. Na sequência da informação referida no ponto anterior foi ainda lavrado parecer em 30.05.2017 pelos Serviços de Gestão Académica, onde consta, entre o mais, o seguinte:
«Tipo: Redução ou isenção de propina
Ano letivo: 2015/2016
O Requerente reitera neste pedido de reapreciação os mesmos factos e argumento de pedido anteriormente apresentados, pelo que sobre o mesmo resume-se:
(1.) Sobre a situação invocada pelo Doutorando da ação do SNESup a correr no TAC de Lisboa, não há informação que imponha à Universidade ... a aceitação do presente pedido de isenção de propinas.
(2.) A Universidade de ... tem entendido que enquanto não existir a necessária regulamentação, aos docentes de outras instituições de ensino superior que se hajam matriculado na Universidade de ... e que venham aqui requerer isenção de propinas ao abrigo, exclusivamente, da referida norma, não é sustentável aceitar essa pretensão.
(3.) A Universidade ... teve todavia a preocupação de assegurar a situação "aos docentes pertencentes ao mapa de Pessoal da Universidade de ...", conforme disposto no artigo 2° da Deliberação do Conselho Geral da Universidade ... [deliberação (extracto) nº 118/2013, publicada no DR, 2" série, nº11, de 16 de janeiro].
(4.) A Universidade ... encontra-se assim, dependente da regulamentação da iniciativa da DGES, não lhe devendo ser exigível que, na sua ausência, seja chamada a suportar os encargos que decorreriam do deferimento das pretensões que anualmente lhe são dirigida, devendo os Docentes promover junto da Instituição de Ensino Superior a que se encontram vinculados, em consonância com recomendação do CRUP, o pagamento das propinas devidas pela frequência do Doutoramento na Universidade ....
Perante o exposto, propõe-se o indeferimento do pedido.»;
____________________________________________________________________________
Cfr. visado parecer a fls. 174-175 do PA em apenso.

10. Em 14.07.2017 foi emitido por membro da Administração da Universidade de ..., «BB», o seguinte despacho:
«Indeferido.
Nos termos e fundamentação da dirigente do SGA, que corroboro.»
__________________________________________________________________
Cfr. despacho presente a fls. 173-175 do PA em apenso e fls. 25 dos autos.

11. Em 07.08.2017 o ora A. apresentou Reclamação do visado despacho, dirigida ao Reitor da Universidade de ...;
_______________________________________________________________________________
Cfr. petição de reclamação presente a fls. 205-210 do PA em apenso.

12. Em 23.11.2017 deu entrada neste Tribunal a p.i. que deu origem aos presentes autos;
_______________________________________________________________________________
Cfr. registo SITAF a fls. 3-4 dos autos.

Mais se provou que:

13. Em 31.10.2012 o ora A. apresentou requerimento nos serviços da Entidade Demandada, no qual se pode ler o seguinte:
«(…) exercendo funções de Professor Adjunto Equiparado na Escola Superior de Educação de ..., estando obrigado à obtenção do grau de doutor nos termos estatutários para efeitos de progressão/transição e estando matriculado no Programa de Doutoramento em Ciências e Tecnologias da Informação, vem por este meio requerer a V. Ex.ª a isenção do pagamento de propinas nos termos e para efeitos do disposto no n.º 4, do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 216/92, de 13 de Outubro.
(…)
Dado que o pagamento de propinas é anual, o requerente solicita que, para o ano lectivo 2012/2013, seja deferido o seu pedido de isenção de propinas nos termos legais (e que quaisquer montantes entretanto pagos possam vir a ser devolvidos) e, quando assim se não entender, se aguarde (à semelhança do que têm feito diversas universidades), pelo menos, a tomada de decisão no processo supra identificado.»;
_________________________________________________________________
Cfr. visado requerimento e comprovativo de entrega, presentes a fls. 132 e 134 do PA em apenso.

14. Em data não concretamente determinada, foi remetido ao ora A. ofício da Entidade Demandada, datado de o3.12.2012, onde se pode ler o seguinte:
«Assunto: Pedido de isenção do pagamento de propinas ao abrigo do disposto no artigo 4°, n° 4, do Decreto-Lei no 216/92, de 13 de Outubro.
Cumpre-me comunicar a V.ª Ex.ª que após análise do pedido referido em epígrafe, foi proferido despacho pela Senhora Vice-Reitora, Profª Doutora «CC», datado de 21.11.2012, que aponta no sentido do indeferimento da pretensão que apresentou e que teve por base os seguintes fundamentos:
De acordo com a opinião já há muito consolidada, e que encontra fundamento no entendimento defendido pela Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES), designadamente na Informação no 384/DSPP/PDD/2004, Processo n° 1/CF/2004, o disposto no nº 4, do artigo 4°, do Decreto-lei no 216/92, de 13 de Outubro, conjugado com o disposto no artigo 35°, nº 2, alínea b), da lei n° 37/2003, de 22 de Agosto (que estabelece as bases do financiamento do ensino superior), deve ser interpretado no seguinte sentido, que se transcreve da referida Informação da DGES: "apesar do articulado legal parecer ser claro e de aplicação automática, a realidade é que mio o é, carecendo de regulamentação que, tratando o que seja adequada compensação financeira estabeleça claramente a forma e os termos da sua atribuição".
Nestes termos, tem vindo a ser defendido que enquanto a necessária regulamentação se não verificar, aos docentes de outras instituições de ensino superior que se hajam matriculado na Universidade de ... e que venham aqui requerer isenção de propinas ao abrigo, exclusivamente, da referida norma, não é sustentável aceitar a pretensão.
Também o Regulamento de Propinas e Prémios da Universidade de ... (regulamento n° 633/2011, publicado no DR, II Série, no 238, de 14 de Dezembro), não prevê a isenção do pagamento de propina de doutoramento nestas situações.
De igual modo, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), questionado pela Universidade de ... sobre situações como a que ora se analisa, pronunciou-se através da Recomendação nº 03/20 l 0/CRUP, de 12 de Outubro de 2010, no seguinte sentido:
"[...], O CRUP, reunido em 12 de Outubro do corrente ano, decidiu recomendar o seguinte, sem prejuízo de considerar que deve permanecer ao critério de cada universidade a resolução de tais casos:
- O pagamento das propinas de segundos e terceiros ciclos por parte de docentes vinculados a instituições de ensino superior públicas, cuja progressão na carreira esteja dependente da realização destes cursos, deve competir preferencialmente às entidades a quem os mesmos se encontrem vinculados;
-As instituições envolvidas, bem como os respectivos interessados poderão procurar financiamento para estes cursos através de programas próprios, nomeadamente o Programa PROTEC."
A Universidade de ..., encontra-se, assim, dependente da atrás referida regulamentação da iniciativa da DGES, não lhe sendo exigível que, na sua ausência, seja chamada a suportar os encargos que decorreriam do deferimento das inúmeras pretensões que anualmente lhe são dirigidas. Até lá, temos vindo a sugerir, cm consonância com a referida recomendação do CRUP, que os Docentes promovam, junto da Instituição de Ensino Superior a que se encontram vinculados o eventual pagamento das propinas devidas pela frequência do Doutoramento na Universidade de ....
Nestes termos, deve V. Ex' proceder ao pagamento das propinas em falta, com o acerto do valor dos inerentes juros decorrentes do tempo de análise do seu requerimento.
Não obstante, é-lhe conferido o prazo de dez dias úteis para se pronunciar, querendo, sobre o sentido da presente decisão, findo o qual, na ausência de pronúncia, a mesma se tornará definitiva.»;
_______________________________________________________________
Cfr. visado ofício da Universidade de ..., presente a fls. 138-139 do PA em apenso.

15. Em 26.12.2012 o ora A. apresentou nos serviços da Entidade Demandada pronúncia por escrito sobre a proposta de indeferimento referida no ponto anterior;
__________________________________________________________________
Cfr. visada resposta e histórico de reencaminhamentos da Entidade Demandada, a fls. 125-129 e 131 do PA em apenso.


16. Em 18.03.2013 o requerimento referido em 13. foi objecto de despacho exarado pela Vice-Reitora da Entidade Demandada com o seguinte teor:
«Reitero o indeferimento pelas razões já apresentadas.»;
_________________________________________________________________
Cfr. visado despacho presente a fls. 130 do PA em apenso.

17. Em 01.04.2015 o Reitor da Universidade de ... exarou despacho, entre o mais, com o seguinte teor:
«Nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 92.º do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, constante da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, do n.º 1 do artigo 9.º, da alínea b) do n.º 1 do artigo 25.º, do artigo 27.º e do n.º 5 do artigo 49.º dos Estatutos da Universidade de ..., constantes do Despacho Normativo n.º 43/2008, nos artigos 40.º, 58.º e 61.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, nos artigos 35.º a 41.º do Código do Procedimento Administrativo, delego na Administradora da Universidade de ..., Mestre «BB», com possibilidade de subdelegação, a competência para, nos termos da lei vigente e das normas e regulamentos internos da Universidade, e no que ao âmbito da respetiva Administração diz respeito: (…)
4 - Despachar os requerimentos dos estudantes, nos termos dos regulamentos, normas e despachos gerais existentes, remetendo para a Equipa Reitoral os casos de verdadeira excecionalidade, de ambiguidade nas regras ou ausência de regras aplicáveis; (…)»;
_________________________________________________________________
Cfr. despacho n.º 4219/2015, publicado em Diário da República n.º 81/2015, 2.ª Série, de 27.04.2015.

18. O qual foi publicado no Diário da República n.º 81/2015, 2.ª Série, de 27.04.2015;
________________________________________________________________
Cfr. visado DR.

19. Em 17.11.2017 foi emitida declaração escrita pelos serviços da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de ..., onde consta entre o mais, o seguinte
««AA» exerce funções docentes na Escola Superior de Educação de ..., encontra-se abrangido pelo regime transitório previsto no artigo 8º-A da lei 7/2010. Pela lei 45/2017 vê prorrogado o mesmo até 31/08/2018, data em que deve ter o doutoramento concluído.

Mais se informa que no dia seguinte à data da defesa do doutoramento transitará para a carreira de Professor Adjunto, não sendo necessário aguardar pela data limite de 31/08/2018.».
_________________________________________________________________
Cfr. visada declaração, presente a fls. 27 dos autos.

*
Na sentença recorrida considerou-se que inexistiam factos não provados com relevância para a decisão da presente questão.
*
No que diz respeito à motivação factual, escreveu-se na sentença recorrida que:
«A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos presentes nos autos, não impugnados, e constantes do processo administrativo em apenso, tudo conforme o que se deixou plasmado a propósito de cada um dos pontos do probatório.»

-/-

III – Questões a decidir.

No presente recurso, cabe analisar e decidir os erros de julgamento apontados à sentença recorrida, nomeadamente quanto ao valor do processo nela fixado, quanto à interpretação e a aplicação do n.º 4 do art.º 4.º do Decreto-lei n.º 216/92, de 13 de outubro e quanto à aplicação do disposto no Estatuto dos Benéficos Fiscais.

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IV – Da apreciação do presente recurso.
Constitui objeto do presente recurso a sentença proferida nos presentes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., pela qual se concedeu parcial provimento à ação administrativa movida pelo Recorrente contra a Universidade de ....
Assim, na decisão jurisdicional ora em apreço, o citado Tribunal de primeira instância determinou que:
“Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente a presente acção administrativa e, em consequência, declara-se que o A. tem direito à isenção de propinas devidas no curso de Doutoramento em que se inscreveu, com efeitos circunscritos ao ano lectivo de 2015/2016.”
Deste modo, considerando os pedidos formulados pelo então Autor (aqui Apelante), este não obteve provimento quanto ao pedido formulado de anulação do ato administrativo que lhe havia indeferido o pedido de isenção de pagamento de propinas no que tange aos demais anos letivos, assim como relativamente aos demais pedidos que formulou quanto a estes últimos.
IV.1 – Do valor do processo e da admissibilidade do presente recurso.
Na situação ora em apreço, o Recorrente (Autor) formulou na sua petição inicial os seguintes pedidos:
«[…] deve a presente ação ser julgada totalmente procedente por provada devendo o ato impugnado notificado ao A. mediante comunicação datada de 14 de julho de 2017, ser declarado nulo ou, no mínimo, anulável e, consequentemente deve a Ré ser condenada a:
a) reconhecer que o A., enquanto docente do ensino superior politécnico se encontra na previsão do n.º 4 do artigo 4.º do DL n.º 216/92, de 13 de outubro,
b) reconhecer o direito potestativo puro do A. à isenção do pagamento de propinas em todos os anos lectivos no curso de doutoramento que frequenta na Universidade de ...;
c) reembolsar toda e qualquer quantia que o A. pagou ou venha a pagar a titulo cautelar para poder prosseguir e concluir os estudos de doutoramento;
d) pagar as custas incluindo custa de parte.».
Também, a propósito do valor atribuído ao presente processo, na sentença recorrida escreveu-se que:
“[…] Quanto ao valor da causa, considerando que não resulta dos autos o valor das propinas cuja isenção/benefício em causa se pretendia ver reconhecido (cfr. art.º 97.º, n.º 1, al. d) do CPPT), importa aplicar o critério supletivo previsto no n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT e, atenta a complexidade da causa e desconhecendo-se a condição económica do A., fixa-se o valor da causa no limite máximo permitido: €5.000,00. […]”
Na presente situação, há que ter presente que à data em que foi proferida a sentença recorrida (26.09.2019), o art.º 97.º-A do CPPT dispunha que:
Artigo 97.º-A
Valor da causa
1 - Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes:
a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende;
b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado;
c) Quando se impugne o acto de fixação dos valores patrimoniais, o valor contestado;
d) No recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, o do valor da isenção ou benefício.
e) No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior.
2 - Nos casos não previstos nos números anteriores, o valor é fixado pelo juiz, tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais. Efetivamente a norma constante deste n.º 2 do art.º 97.º-A do CPPT só veio a ser revogada pela alínea b) do artigo 11.º do Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, que entrou em vigor 60 dias depois da publicação desta.
3 - Quando haja apensação de impugnações ou execuções, o valor é o correspondente à soma dos pedidos.
Por outro lado, à data dos factos ainda estava em vigor o disposto no n.º 4 do art.º 280.º do CPPT Norma que só veio a ser revogada pela alínea b) do art.º 11.º da Lei n.º 118/2019, com entrada em vigor a 16.11.2019. em que se estatuía que: “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância.”. Deste modo, in casu, o fator determinante para se saber se o presente recurso é admissível, tendo em conta o teor da decisão recorrida, passa por apreciar se houve erro de julgamento quanto ao valor do processo fixado na sentença recorrida.
Ora, na sentença recorrida estipulou-se o valor do processo no montante de € 5.000,00 (cinco mil euros) de acordo com o n.º 2 do art.º 97.º-A do CPPT, uma vez que «…que não resulta dos autos o valor das propinas cuja isenção/benefício em causa se pretendia ver reconhecido».
Porém, há que ter em conta que o valor da causa indicado no presente processo pelo ora Recorrente se cifrou em € 30.000,01. Ora, este valor não foi posto em causa pela Recorrida (Ré) na sua contestação.
No entanto, a sentença recorrida formulou um juízo bem distinto quanto ao valor do presente processo e, como vimos, aplicou a regra contida no n.º 2 do art.º 97.º-A do CPPT.
Assim, há que ter em conta que o Juiz não está vinculado à indicação feita pelas partes quanto ao valor do processo, tal como decorre do art.º 306.º do CPC e n.º 4 do art.º 31.º do CPTA ex vi art.º 2.º do CPPT, cabendo-lhe o dever de o fixar nos termos do disposto nesta norma processual civil.
Porém, na fixação do valor concreto do presente processo, devemos ter em conta que na sentença recorrida se considerou que os pedidos formulados pelo então Autor, diziam respeito a uma isenção de natureza fiscal. Assim, afirma-se, designadamente na decisão jurisdicional ora em apreço que:
“[…]
Os pedidos em causa correspondem a um pedido típico de acção de reconhecimento de direitos, melhor dizendo reconhecimento de qualidades/preenchimento de condições, neste caso de reconhecimento do direito à isenção de propinas, conforme é permitido pelo disposto nos artigos 2.º, 2, alíneas a) e g), 4.º, n.º 2, al. e) e 37.º, n.º 1, alíneas a) e g) do CPTA.
[…]
Logo, a questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se o ora A., devido ao facto de exercer funções docentes na Escola Superior de Educação de ..., tem direito à isenção do pagamento de propinas, previsto no n.º 4 do artigo 4.º do DL n.º 216/92, de 13.10, para a frequência do curso de Doutoramento em Ciências e Tecnologia da Informação da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de .... Caso se venha a decidir que o A. tem direito a essa isenção, saber se os montantes entretanto pagos lhe devem ser restituídos.
[…]
Nos termos e com os fundamentos expostos, há que concluir que o ora A. tem razão quanto à aplicação à sua situação do disposto no n.º 4 do artigo 4.º do Dec.-Lei n.º 216/92, de 13.10, pelo que tem direito a beneficiar da isenção do pagamento de propinas referentes ao curso de Doutoramento em Ciências e Tecnologia da Informação da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de ..., mas apenas por referência ao ano lectivo em que requereu essa isenção, ou seja, no ano lectivo de 2015/2016.
[…]
No caso vertente, resulta da norma em causa que o benefício fiscal é automático, como indicia a expressão “estão isentos”. Assim, o acto administrativo assume neste caso uma natureza meramente declarativa, uma vez que a isenção de pagamento das propinas resulta directa e imediatamente da lei.
Ora, quanto à constituição dos benefícios fiscais o artigo 12.º do EBF prevê que o direito aos mesmos deve reportar-se à data dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento “declarativo” pela Administração. Desde modo, o pedido do reconhecimento da isenção reportaria os seus efeitos à data da verificação dos pressupostos da mesma, que coincide, in casu, com a data da entrada em vigor do Dec.-Lei n.º 207/2009, de 31.08 – 01.09.2009, como vimos já.
[…]
No caso vertente, resulta da norma em causa que o benefício fiscal é automático, como indicia a expressão “estão isentos”. Assim, o acto administrativo assume neste caso uma natureza meramente declarativa, uma vez que a isenção de pagamento das propinas resulta directa e imediatamente da lei.
Ora, quanto à constituição dos benefícios fiscais o artigo 12.º do EBF prevê que o direito aos mesmos deve reportar-se à data dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento “declarativo” pela Administração. Desde modo, o pedido do reconhecimento da isenção reportaria os seus efeitos à data da verificação dos pressupostos da mesma, que coincide, in casu, com a data da entrada em vigor do Dec.-Lei n.º 207/2009, de 31.08 – 01.09.2009, como vimos já.
E pelo menos desde 09.05.2007 que se impõe, mesmo no caso de frequência do curso conducente à obtenção de grau de doutoramento, que a inscrição seja efectuada anualmente, nos prazos que forem definidos para o efeito, quer os estudantes estejam a frequentar o curso, quer estejam a apenas a elaborar a tese (cfr. n.º 6 do art.ç 67.º do Regulamento n.º 341/2015 - Regulamento Académico da Universidade de ..., norma que já constava do n.º 6 do art.º 64.º do Regulamento n.º 315/2013, do n.º 3 do art.º 70.º do Regulamento n.º 344/2010 e do art.º 7.º do Regulamento n.º 78/2007, que iniciou a vigência em 9.5.2007 – cfr. art. 43.º, n.º 1).
Assim sendo, entende-se que os estudantes que frequentam o curso conducente à obtenção de grau de doutoramento e que queiram beneficiar da isenção de propinas prevista no n.º 4 do artigo 4.º do DL n.º 216/92, devem, não só proceder à sua inscrição no visado curso, como pedir, rectius, revelar à Administração (neste caso a Universidade de ...), o preenchimento dos pressupostos da concessão da isenção, também anualmente, no início de cada ano lectivo.
Essa é, de resto, a solução que melhor se coaduna com o tipo de tributo em causa. O facto tributário ao qual se aplica a propina é, como vimos já “a prestação efectiva, individualizada e contínua, do serviço público de ensino durante um ano lectivo”. Esse facto tributário renovar-se-á (não de forma automática, mas mediante inscrição) anualmente, pelo que cumpre ao estudante revelar à Administração o preenchimento dos pressupostos da concessão da isenção, também anualmente, até porque, no caso, pode bem suceder que o doutorando deixe, por algum motivo, de ser docente, deixando pois, de reunir uma das condições de que depende tal direito.
[…]
De resto, decorre do probatório que, para além do requerimento de 21.09.2015, o ora A. apresentou um requerimento pedindo o reconhecimento dessa isenção em 31.10.2012, especificamente dirigido para obter a isenção de propina relativamente ao ano de 2012/2013 (cfr. facto provado sob o ponto 13.). Esse pedido de reconhecimento viria a ser indeferido por decisão da Entidade Demandada de 18.03.2013 (cfr. facto provado sob o ponto 16.).
Esse acto, mantendo-se na ordem jurídica, também obsta a que o reconhecimento do direito peticionado produza efeitos em relação a todos os anos lectivos em que o A. tenha eventualmente frequentado o visado curso de doutoramento.
Assim, conclui-se que o pedido de isenção apresentado em 21.09.2015 tem mera eficácia ex nunc, e apenas pode surtir efeitos no ano lectivo de 2015/2016, o que será evidenciado no dispositivo da presente sentença.
[…]”
Nessa sequência, a decisão jurisdicional ora em apreço, como vimos, decidiu reconhecer ao então Autor o direito à isenção de propinas apenas no ano letivo de 2015/2016.
Deste modo, a sentença recorrida embora comece por afirmar que estava em causa uma ação para reconhecimento de direitos, acaba por tratar a situação e definir o respetivo dispositivo como estando em causa o indeferimento de um pedido de isenção de natureza fiscal, sendo o tributo indicado as propinas universitárias aqui em causa. No entanto, o pedido principal formulado pelo ora Recorrente era no sentido de ver anulado um determinado ato administrativo que lhe havia negado o direito à isenção. Só e como eventual consequência desta anulação é que solicita o reconhecimento do seu direito à isenção, direito este que veio a ser parcialmente reconhecido.
Porém, na sentença apelada, faz-se uma errónea interpretação dos pedidos formulados pelo então Autor, tratando-se os mesmos como se a questão em apreço se tratasse de uma ação para reconhecimento de direitos, quando o que estava em causa era uma ação impugnatória de ato administrativo em matéria tributária em que o Autor quiçá pretenderia antes, mais corretamente, formular um pedido de condenação à prática do ato administrativo legalmente devido.
Assim sendo, ao invés do decidido na sentença recorrida, entendemos que a presente situação se subsume ao disposto na então vigente alínea c) do n.º 1 do art.º 97.º-A do CPPT, quando nesta se estatui que o valor da causa é fixado “… no recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, o do valor da isenção ou benefício” peticionado.
Para o efeito, dentro das competências que lhe são atribuídas pela lei, não estando o Julgador de acordo com o valor indicado pelas partes e não sendo reconhecível pelos elementos constantes dos autos qual o concreto valor a fixar, deveria ter providenciado no sentido de obter os elementos necessários para a sua fixação, nos termos do artigo 308.º do CPC ex vi art.º 2.º do CPPT e n.º 4 do art.º 31.º do CPTA. Com efeito, a então norma do n.º 2 do art.º 97.º-A do CPPT não incluía na sua previsão legal, a situação descrita aqui nos autos e transposta na sentença recorrida, quanto à invocada dificuldade de quantificação da(s) isenção(ões) requerida(s). Assim, a apontada norma apenas intervinha nas hipóteses que não eram de todo subsumíveis nas diferentes alíneas do n.º 1 do art.º 97.º-A do CPPT, o que, como vimos, não é o caso presente.
Por outro lado, como se refere no acórdão do STJ de 08-03-2018 4255/15.8T8VCT-A.G1.S1 (in www.dgsi.pt):
“[…]
O art.º 306.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, estipula que compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.
A propósito desta disposição legal, o Juiz Conselheiro Salvador da Costa [1] escreveu:
O n.º 1 estabelece competir ao juiz a fixação do valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes. É uma solução inspirada no relevo do valor processual da causa, quanto à forma do processo comum executivo para pagamento de quantia certa, à sua relação com a alçada do tribunal e à competência das secções de competência cível.
No regime pretérito, o valor da causa era suscetível de ser relevantemente acordado, expressa ou tacitamente, pelas partes, salvo se o juiz, findos os articulados, entendendo que o acordo estava em flagrante oposição com a realidade, fixasse à causa o valor que considerasse adequado.
Mas se o juiz, por qualquer motivo, não usasse esse poder, o valor processual da causa, proferido que fosse o despacho saneador ou a sentença, conforme os casos, considerava-se definitivamente fixado na quantia acordada.
As partes indicavam frequentemente para a causa valor desconforme com a utilidade económica do pedido e a lei e, não raro, o juiz não proferia o respetivo despacho de fixação do valor da causa, desvirtuando-se, por via disso, o regime de admissibilidade dos recursos e a própria obrigação de pagamento da taxa de justiça.
A referida alteração visou obstar, além do mais, às mencionadas consequências. Agora, independentemente da posição das partes relativamente ao valor da causa, o juiz tem de o fixar, podendo, para o efeito, nos termos dos artigos 308.º e 309.º, ordenar diligências.
Assim, o acordo expresso ou tácito das partes quanto ao valor processual da causa já não releva com vista à sua fixação, impondo-se ao juiz a verificação da sua conformidade com os factos e a lei.
Em suma, o juiz tem que ajuizar sobre a objetividade do acordo a que as partes chegaram sobre o valor da causa. (…)
Também, em anotação ao art.º 306.º, do Código de Processo Civil, Abílio Neto [2] escreve:
Embora as partes continuem obrigadas a indicar o valor da causa na petição inicial (art.º 552.º-1-f), sob pena de recusa do articulado (art.º 658.º-e), após o DL n.º 303/2007 o juiz passou a ter uma intervenção ativa muito mais acentuada na fixação desse valor, sobrepondo-se ao acordo das partes, o que fará, em regra, no despacho saneador, ou antes (se houver a admissão de recursos interpostos de decisões anteriores), ou na sentença, ou ainda no despacho de admissão do recurso (art.os 306.º e 641.º).
O poder-dever atribuído ao juiz de fixar o valor da causa, mesmo quando o valor aceite pelas partes, tácita ou expressamente, não esteja “em flagrante oposição com a realidade” (anterior n.º 1 deste artigo), teve por objetivo declarado dificultar a interposição (artificial) de recursos.
É nesta perspetiva que se compreende e explica a regra enunciada no nº 3 deste preceito.
Assim, cabendo ao juiz do tribunal de primeira instância fixar o valor da causa está vedado aos tribunais de recurso usarem as faculdades previstas no art.º 306.º do Código de Processo Civil.

[1] Os Incidentes da instância, 2016, 8ª edição, pág. 60 e seguintes.
[2] Novo Código de Processo Civil, Anotado, 3.ª edição revista e ampliada, maio/2015, pág. 369-370.
[…]”
Deste modo, nos termos do art.º 308.º do CPC, cabe ao Juiz quando não aceite o valor indicado pelas partes, aqui implicitamente assumido por estas como perfazendo o montante de € 30.000,01, fixá-lo de acordo com os elementos constantes do processo. Porém, na ausência destes, deverá o Juiz determinar as diligências necessárias para o apuramento do valor do mesmo, ouvindo-se as partes a propósito de tal questão.
Por isso, embora não se perfilhe o entendimento da Recorrente quanto à aplicabilidade do disposto no artigo 34.º do CPTA, também não secundamos o entendimento vertido na sentença recorrida quanto ao critério que se socorreu para a fixação do valor da presente causa.
Por outro lado, há que ter presente que a fixação do valor da causa e as diligências a tomar para o efeito, cabem ao Tribunal recorrido nos termos do art.º 306.º do CPC, ex vi art.º 2.º do CPPT e n.º 4 do art.º 31.º do CPTA.
Deste modo, tendo sido erroneamente fixado o valor do presente processo na sentença recorrida, não cabendo a esta instância fixar o valor do mesmo, terão os autos que baixar à primeira instância para a sua fixação, ordenando esta as diligências que tiver por convenientes para o efeito, ouvindo as partes para tal. Ora, tal implica a anulação da sentença recorrida e a remessa dos presentes autos ao Tribunal recorrido, se nada mais a tal obstar.
*
Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário:
I - A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
II – Á data dos factos, nas situações não previstas no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT dever-se-ia aplicar o disposto n.º 2 do mesmo artigo, o qual determinava que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1.ª instância dos tribunais judiciais”.
III – No entanto, estando concretamente em causa uma ação administrativa em que foi peticionada a anulação de um ato de indeferimento de isenção do pagamento de propinas, com o consequente e implícito pedido do direito à respetiva isenção, o valor do processo há-de fixar-se de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 97.º-A do CPPT e não de acordo com o n.º 2 desta mesma norma, então ainda vigente.
IV – Cabendo agora ao Juiz o poder-dever de fixar o valor da causa, não estando de acordo com o valor assumido pelas partes, não fornecendo os autos elementos suficientes para o poderem determinar, deverá o Juiz ordenar as diligências que tiver por necessárias para a sua verificação e posterior fixação, nos termos do art.º 308.º do CPC ex vi art.º 2.º do CPPT e n.º 4 do art.º 31.º do CPTA.

-/-

V – Dispositivo
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida, ordenando-se a remessa dos presentes autos ao Tribunal recorrido.

Custas pela Recorrida (por vencida).


Porto, 08 de fevereiro de 2024

Carlos A. M. de Castro Fernandes
Conceição Soares
Tiago Lopes de Miranda