Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00048/10.7BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/23/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL; IRS; VENDA DE IMÓVEL; HABITAÇÃO PRÓPRIA E PERMANENTE; MAIS VALIAS.
Sumário:1 – O artigo 10.º, n.º 5 do CIRS exclui da tributação as mais valias provenientes da transmissão onerosa de imóveis [“de partida”] destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo e do seu agregado familiar, sendo que para esse efeito, no imóvel adquirido [imóvel “de chegada”] também nele tem de ser prosseguido o mesmo destino [da habitação própria e permanente].

2 - A tributação das mais-valias surge na medida em que a alienação de um determinado bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual o princípio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva, sendo que, uma mais-valia é, precisamente, nos termos do artigo 10.º, n.º 4, alínea a) do CIRS, a diferença entre o valor da realização [o montante da alienação do bem] e o valor da aquisição [o montante pelo qual o bem entrou na esfera patrimonial do alienante].*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:V. e Outra
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO

V. e M., inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 28 de outubro de 2015, pela qual julgou improcedente a pretensão impugnatória por si deduzida contra a liquidação de IRS referente ao ano 2005, inserta na Demonstração de Acerto de Contas n.º 2009 00001683602, com valor a pagar de €8.791,70.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 161 a 174 dos autos em suporte físico], elencaram a final as conclusões que ora se reproduzem:

“Em conclusão:
1) A sentença deve ser considerada nula, pois existe erro na pronúncia sobre questões que a Juíza deva apreciar, cf. Art.º 125º, do CPPT.

2) Pois, o que está em causa nos autos é saber se existiu reinvestimento ou não.

3) Deve na prova produzida ser dado como provado que:

4) Os recorrentes fizeram o reinvestimento;

5) E que o prédio objeto de reinvestimento era habitação própria e permanente do agregado familiar.

6) Por outro lado, os recorrentes demonstraram a sua morada em (...) através de "factos justificativos", tais como o atestado da freguesia de (...), mesmos se não cumprirem com a sua obrigação de comunicação da mudança de domicílio fiscal prevista no Art.º 19.º da LGT.

7) Por conseguinte, não obsta ao preenchimento do pressuposto de "habitação permanente", o n.º 5 do Art.º 10.º do CIRS, a não comunicação da alteração do domicílio fiscal.

Nestes termos,
Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente a impugnação judicial, com efeitos na anulação da liquidação recorrida com todas as consequências legais, para que assim se faça JUSTIÇA.”
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A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou Contra alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu Parecer pelo qual, a final e em suma, foi do entendimento de que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional.
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Colhidos os vistos das Ex.mas Senhoras Juízas Desembargadoras Adjuntas, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em apreciar, em suma, se a Sentença recorrida padece da invocada nulidade, por erro na pronúncia sobre questões que o Tribunal recorrido devia apreciar [Cfr. conclusão 1], assim como de erro de julgamento de facto e de direito [Cfr. conclusões 2, 3, 4, 5, 6 e 7].
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da Sentença recorrida, datada de 28 de outubro de 2015, foi fixada a matéria de facto provada, que por facilidade para aqui se extrai como segue:

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

3.1. Com interesse para a decisão a proferir, julgam-se provados os seguintes factos:

1. Em 12.05.2005, no Cartório Notarial de Lisboa, a fls. 109/110 verso do livro n.º 399 M, foi lavrada uma escritura intitulada “Compra e Venda” em que intervieram, como primeiro outorgante, A..., na qualidade de representante de A.A.., como segundo outorgante, V., ora Impugnante e, como terceira outorgante, A.. – cfr. fls. 125/127 dos autos.

2. Na referida escritura consta, entre o mais, o seguinte:

“[…]
DISSE O PRIMEIRO OUTORGANTE NA QUALIDADE EM QUE OUTORGA:
----Que livre de ónus ou encargos e pelo preço de OITENTA MIL EUROS, que o seu representado declara já ter recebido, em nome dele vende ao segundo outorgante a fracção autónoma designada pela letra “B” correspondente ao RÉS-DO-CHÃODIREITO, destinada a habitação, com uma arrecadação no sótão, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na freguesia de (...), concelho da (...), na Praceta (...), número 1 – C, com traseiras para a Estrada do (...), número …, na freguesia de (...), descrito na Segunda Conservatória do Registo predial da (...) sob a ficha zero zero duzentos e sessenta da referida freguesia […], inscrito na respectiva matriz urbana da freguesia de (...) sob o artigo …. com o valor patrimonial (IMT) de 46 199,06 €.
PELA TERCEIRA OUTORGANTE FOI DITO:
Que para inteira validade deste contrato dá o consentimento ao seu marido para a presente venda.
DISSE O SEGUNDO OUTORGANTE:
Que aceita a venda nos termos exarados, destinando-se a fracção a habitação. […]”

3. Em 16.06.2005, no Cartório Notarial do Licenciado R.., a fls. 101 e ss. do livro n.º 20-A, foi lavrada uma escritura intitulada “Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca e Finança” em que intervieram, como primeiro outorgante, A.., na qualidade de procurador de V. e M., ora Impugnantes, como segundos outorgantes F.. e I.., como terceiro outorgante, R.R.C., na qualidade de procurador do Banco Comercial Português S.A. e, como quartos outorgantes, A.M.. e F.A..

4. Na referida escritura consta, entre o mais, o seguinte:

“[…]
DISSE O PRIMEIRO OUTORGANTE:
----Que pela presente escritura e, em nome dos seus representados, vende aos segundos outorgantes, pelo preço de CENTO E CINCO MIL EUROS, que já recebeu, a fracção autónoma designada pela letra “J”, destinada exclusivamente a habitação, ou seja o SEGUNDO ANDAR DIREITO, com uma arrecadação no sótão, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na RUA (…), número um com traseiras para a ESTRADA DO (...), números – A, na freguesia de (...), concelho da (...), descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de (...) sob o número ….da referida freguesia, com a aquisição registada a favor d eles pela inscrição G – um, e a propriedade horizontal pela inscrição F – dois, inscrito na respectiva matriz sob o artigo …, com o valor patrimonial de € 42.349,13.
[…]
DISSERAM OS SEGUNDOS OUTORGANTES
Que aceitam a presente venda nos termos exarados e que o referido imóvel se destina, exclusivamente, a habitação própria permanente.
[…]”.

5. Com base na Ordem de Serviço n.º OI200900296, o Impugnante marido foi objeto de uma ação inspetiva interna que incidiu sobre o ano de 2005 (IRS). – cfr. fls. 9 do processo administrativo apenso.

6. Através do ofício n.º 006101, de 22.05.2009, remetido por carta registada, foi o Impugnante notificado do projeto de conclusões do Relatório de Inspeção e para, querendo, exercer o direito de audição. – cfr. fls. 12 do processo administrativo apenso.

7. Em 03.06.2009 o Impugnante marido remeteu o fax e docs. de fls. 21 e ss. do processo administrativo apenso.

8. Em 23.06.2009, foi elaborado o relatório final de inspeção que consta de fls. 6/11 do processo administrativo apenso, que se dão por reproduzidas, e do qual consta, entre o mais, o seguinte:

[…]
DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE
ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
CATEGORIA G-
O sujeito passivo procedeu à alienação conforme escritura de compra e venda lavrada no C.N. de R… – (…) em 2005-06-16, do prédio .. sito na freguesia de (...), -(...), inscrito na matriz predial respectiva sob o art. n.º .., fracção .., pelo valor de 105 000,00 €.
Como valor de aquisição, tem-se em atenção o valor patrimonial inicial -33 085,26 € que adveio da inscrição matricial do ano de 1 994 do imóvel, por parte do s.p.
Porém, o s.p. não entregou qualquer Anexo G junto à dec. De rendimentos de 2005, omitindo desta forma rendimentos da categoria G, rendimentos de Mais ou Menos Valias, e por consequência uma omissão dos ganhos derivados da transmissão atrás referida, sujeitos nos termos da alínea a) do nº 1 do art. 10º do CIRS e de englobamento obrigatório, nos termos do art. 22º do mesmo Diploma legal.
Assim, face aos valores referidos, a Mais Valia resultante da alienação corresponde à apurada no quadro que segue, tendo ainda em atenção o coeficiente de desvalorização da moeda, nos termos do art. 50º do CIRS.

ANOVALOR REALIZAÇÃOVALOR AQUISIÇÃOCOEF.MAIS-VALIA
(1)
2005105 000,00 €33 085,26 €1,3560 334,90 €
No entanto, nos termos do n.º 2 do art. 43º do CIRS, apenas 50% destas Mais -Valias são consideradas para efeitos de englobamento. Assim constitui rendimento omisso a importância de 30 167,45 €.
Desta forma, do rendimento identificado resulta o seguinte rendimento coletável a corrigir no quadro que segue:

Rendimento colectável2005
1. Resultante da declaração44 704,70 €
2. Acréscimo resultante da omissão:30 167,45 €
3. Rendimento corrigido (1+2)74 872,15 €
[…]
IX-DIREITO DE AUDIÇÃO-FUNDAMENTAÇÃO
1-Por carta registada – ofício nº 006101 de 2009-05-22, foi o sujeito passivo notificado para usar o direito de audição prévia, nos termos dos art. 60º da Lei Geral tributária e do RCPIT, tendo esta, sido enviada para o domicílio constante do cadastro fiscal-(…).
2-Em sequência o sujeito passivo envia por Fax que se anexa, informação onde consta que entregou a dec.de substituição mod 3 de IRS/2005 com o respectivo Anexo G preenchido quer nos seus valores de realização, quer no de aquisição. Mais informa que usou da prerrogativa constante do art. 10º, nº 5 do CIRS: reinvestimento do valor de realização do imóvel destinado a habitação própria e permanente do s.p. ou do seu agregado familiar (imóvel sito em (...), concelho de (...)).
3-Analisada a situação apresentada pelo contribuinte, verificou -se que o reinvestimento que diz ter efectuado, não foi aplicado em habitação própria e permanente dele ou do seu agregado familiar porquanto esta está sita – declarado pelo próprio e, (...) e aqui não houve qualquer reinvestimento.
ASSIM, não de manter todos os valores apurados no Projecto de Correcções decorrentes da análise interna.
[…]”.

9. As correções foram sancionadas superiormente. – cfr. fls. 6 do processo administrativo apenso.

10. O relatório de inspeção tributária foi notificado ao Impugnante marido em 08.07.2005. – cfr. fls. 19 e 20 do processo administrativo apenso.

11. Na sequência da ação inspetiva, a Administração Tributária emitiu a liquidação de IRS n.º 2009 5004870022, no montante global de 9 688,97 €. – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.

12. Em 01.06.2009 o Sr. Presidente da Junta de Freguesia de (...) declarou que V.H.., filho dos Impugnantes, reside naquela freguesia há 4 anos, morando na Praceta (...), n.º 1... (...), concelho da (...). – cfr. doc. 2 junto com a petição inicial.

13. Em 01.01.2005 os Impugnantes constam do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes como tendo domicílio fiscal em (...), Lote.., freguesia de (...), concelho de (...). – cfr. doc. 2 junto com a contestação.

14. Em 31.12.2005 os Impugnantes constam do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes como tendo domicílio fiscal em (...), Lote.., freguesia de (...), concelho de (...). – cfr. doc. 1 junto com a contestação.

15. No anexo G junto com a declaração de substituição, os impugnantes declararam a venda do artigo 728, fração J, da freguesia …, pelo montante de 105 000,00 € e a intenção de reinvestir a quantia de 80 000,00 €. – cfr. fls. 115 e ss. dos autos.

16. Os Impugnantes procederam ao pagamento do imposto em falta em 30.09.2010. – cfr. fls. 28 do processo administrativo apenso.

3.2. Factos não provados:

Para além dos referidos supra, não foram provados outros factos com relevância para a decisão da causa.

Motivação da matéria de facto:
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada resultou dos elementos especificamente identificados em cada um dos pontos do probatório, resultando essencialmente da análise crítica dos documentos constantes dos autos e dos processos de reclamação graciosa e recurso hierárquico apensos.
Da prova testemunhal resultou que o Impugnante marido e seu agregado familiar nunca residiram no imóvel alienado, inscrito na matriz sob o artigo .., fração J. Com efeito, V.H.., foi perentório sobre este facto afirmando que “não chegou a viver lá [apartamento alienado em 2005] e os pais também não”. Acrescentou ainda que o apartamento era apenas usado pontualmente aos fins de semana.
Mais referiu que em 2005, antes de ir viver para a (...), residia em (...), concelho de (...), e que durante o curso os pais permaneceram em (...), visitando-o nos fins de semana.
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 28 de Outubro de 2015, que julgou improcedente a pretensão impugnatória deduzida pelos Recorrentes contra a Autoridade Tributária e Aduaneira, atinente à impugnação judicial da liquidação de IRS referente ao ano 2005, inserta na Demonstração de Acerto de Contas n.º 2009 00001683602, com valor a pagar de €8.791,70, e consequentemente, prejudicado o conhecimento do direito a juros indemnizatórios.

Dispõe o n.º 1 do artigo 627.º do Código de Processo Civil [anterior artigo 676.º do mesmo Código], que “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos.”, ou seja, que o recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida e nesse tempo, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.

Os recursos jurisdicionais constituem os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, razão pela qual é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso, os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Conforme é jurisprudência firme e reiterada, a garantia do duplo grau de jurisdição não faz subverter o princípio da livre apreciação das provas, a que se reporta artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil [Cfr. anteriores artigos 655.º, 658.º e 659.º do mesmo Código], no âmbito do qual o Juiz a quo, em torno da decisão sobre a matéria de facto, aprecia livremente as provas colhidas durante a instrução dos autos, e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que, é pela fundamentação apresentada para a decisão que se afere da correcção do juízo crítico sobre as provas produzidas, e a final, sobre o julgamento prosseguido pelo Tribunal recorrido.

Cumpre então apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações, ou seja, as conclusões delimitam a área de intervenção do tribunal ad quem, e que se centram em saber se a Sentença recorrida padece da invocada nulidade, por erro na pronúncia sobre questões que o Tribunal recorrido devia apreciar, assim como de erro de julgamento de facto e de direito.

Apreciando e decidindo.

Segundo o disposto no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, a Sentença é nula quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, tratando-se de uma nulidade que está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz pelo artigo 660.º, n.º 2 do CPC [a que é atinente o artigo 608.º, n.º 2 do NCPC], de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão dessas questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia.

Compete assim ao juiz a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, ou seja, os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio, tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas, ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras.

Conforme assim foi julgado pelo Douto Acórdão do STA, datado de 19 de Setembro de 2012, proferido no Processo n.º 862/12, “só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio”, sendo que, “questões”, para efeitos do contencioso tributário, são tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.

Desta forma, só há omissão de pronúncia “quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões” – Cfr. Douto Acórdão do STA, datado de 28 de Maio de 2014, proferido no Processo n.º 514/14.

Ora, atenta a causa de pedir e o pedido imanente à Petição inicial, e bem assim, depois de cotejada a fundamentação da Sentença recorrida, mormente, no quanto foi fixada a questão a apreciar e a decidir, no sentido de que se impunha saber se “… os ganhos provenientes da transmissão onerosa do imóvel identificado no ponto 4 do probatório se encontram excluídos de tributação de IRS por verificação dos pressupostos de exclusão prevista no artigo 10.º, n.º 5 do CIRS.”, julgamos que a pretensão recursiva dos Recorrentes não pode por aqui proceder.

Efectivamente, como assim foi apreciada e sustentada a não ocorrência da invocada nulidade [por excesso de pronúncia, como assim fixou o Mm.ª Juíza no seu despacho datado de 18 de janeiro de 2017], o Tribunal a quo apenas conheceu das questões que lhe foram suscitadas, porquanto como resulta da Petição inicial, a sua causa de pedir ancorava-se no facto de a peticionada anulação da liquidação ter por fundamento a exclusão tributária a que se reporta o artigo 10.º, n.º 5 do CIRS, o que foi prosseguido pelo Tribunal e nesse conspecto julgado que os termos e os pressupostos para a ocorrência dessa exclusão não se verificavam, e assim, que a sua pretensão não podia proceder.
Ora, o assim julgado não contende com qualquer tipo de excesso de pronúncia [erro na pronúncia sobre as questões que a Juíza deva apreciar, como assim alegaram e concluíram os Recorrentes], antes apenas com eventual erro de julgamento em torno da apreciação da matéria de facto e de direito.

Prosseguindo.

Sob as conclusões 3, 4 e 5, os Recorrentes sustentam que na prova produzida deve ser dado como provado que os Recorrentes fizeram o reinvestimento, e que o prédio objeto desse reinvestimento era habitação própria e permanente do agregado familiar.

Para esse efeito alegaram que fizeram prova testemunhal, por decorrência da inquirição prestada em Audiência final [realizada em 11 de abril de 2016], da testemunha V. H.. [filho dos Recorrentes], da testemunha E. R.. [vizinho dos Recorrentes], e da testemunha A. B. [que enquanto economista prestou serviços para uma empresa de que o Recorrente marido era sócio], tendo no âmbito das Alegações de recuso apresentadas transcrito os excertos dos seus depoimentos, nas partes em que sustentam esse pedido de alteração dos factos dados como provados.

Quanto ao que constituiu a base dos depoimentos das testemunhas E. R. e A. B.., como identificado/extraído nas Alegações de recurso, as mesmas não contribuem em absolutamente nada para que possa ser alterada/aditada a matéria de facto que o Tribunal recorrido deu como provado, mormente, para dar como provada a factualidade vertida sob os pontos 3 e 4 das conclusões, por se tratarem de depoimentos imprestáveis para tanto.

Já quanto ao depoimento prestado pelo filho dos Recorrentes [Cfr. extracto a fls. 162 dos autos em suporte físico], e como dele se extrai, o mesmo depôs de forma expressiva e fundamental, no sentido de que nunca viveu no anterior apartamento, e que pensa que também aí nunca viveram os seus pais, cujo depoimento se reporta, óbviamente, ao apartamento sito no 2.º andar direito da rua (…), que os ora Recorrentes venderam em 16 de junho de 2005 por €105.000,00 – Cfr. pontos 3 e 4 das conclusões.

Por outro lado, desse seu depoimento também resulta, de forma muito clara, que a sua irmã aí vive no novo apartamento há cerca de 4 anos a essa data [portanto, desde 2012], e o seu irmão há dois [portanto, desde 2014], cujo depoimento se reporta, óbviamente, ao apartamento sito no r/c direito, que os ora Recorrentes compararam em 12 de maio de 2005 por €80.000,00 – Cfr. pontos 1 e 2 das conclusões.

Daí que este depoimento, também não contribui em absolutamente nada para que possa ser alterada/aditada a matéria de facto que o Tribunal recorrido deu como provada, mormente, para dar como provada a factualidade vertida sob os pontos 3 e 4 das conclusões, por se tratar de depoimento imprestável para tanto.

Bem pelo contrário, o que resulta claro face ao depoimento do filho dos Recorrentes, é que no apartamento que venderam, nenhum dos seus filhos lá viveu, e que também aí não terão os mesmos vivido, pois que, como o próprio [filho] testemunhou, antes de 2005 sempre viveu com os seus pais, os ora Recorrentes, em (...), no concelho de (...).

Neste conspecto, para aqui extraímos a motivação da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal recorrido, que no domínio da apreciação da prova testemunhal fundamentou que “Da prova testemunhal resultou que o Impugnante marido e seu agregado familiar nunca residiram no imóvel alienado, inscrito na matriz sob o artigo .., fração J. Com efeito, V.H..., foi perentório sobre este facto afirmando que “não chegou a viver lá [apartamento alienado em 2005] e os pais também não”. Acrescentou ainda que o apartamento era apenas usado pontualmente aos fins de semana.
Mais referiu que em 2005, antes de ir viver para a (...), residia em (...), concelho de (...), e que durante o curso os pais permaneceram em (...), visitando-o nos fins de semana.”

De maneira que a pretensão recursiva dos Recorrentes, também nesta parte, atinente à modificação da matéria de facto, tem de improceder.

Sob as conclusões 2, 6 e 7 das Alegações de recurso, os Recorrentes sustentam que “… o que está em causa nos autos é saber se existiu reinvestimento ou não.”, pois que, para além do mais, “… demonstraram a sua morada em (...) através de "factos justificativos", tais como o atestado da freguesia de (...) …” e que “… não obsta ao preenchimento do pressuposto de "habitação permanente" […] a não comunicação da alteração do domicílio fiscal.”

Ora, como se extrai da Sentença proferida pelo Tribunal recorrido, e como assim vertido na respectiva fundamentação de direito,
“[…]
O thema decidendum dos presentes autos prende-se em saber se os ganhos provenientes da transmissão onerosa do imóvel identificado no ponto 4 do probatório se encontram excluídos de tributação de IRS por verificação dos pressupostos de exclusão prevista no artigo 10.º, n.º 5 do CIRS.
[…]
Como é consabido, a exclusão de tributação sobre as mais-valias é um benefício cuja atribuição está dependente de prova a efetuar pelo sujeito passivo, maxime a prova de que o produto da alienação tenha sido utilizado na aquisição de outro imóvel destinado a habitação, para o que são admitidos todos os meios de prova permitidos em direito.
Volvendo ao acaso em apreço, do quadro probatório resulta desde logo que o imóvel de partida, ou seja, o imóvel alienado não constituía habitação própria e permanente do Impugnante marido e respetivo agregado familiar uma vez que sempre residiram em (...), (...), sendo aquele apenas utilizado pontualmente, aos fins de semana. Falece assim o pressuposto base para a exclusão da tributação prevista no artigo 10.º, n.º 5 do CIRS pelo que terá de improceder a pretensão dos Impugnantes.
[…]”

Ora como resulta do probatório – Cfr. pontos 1 e 2 -, o ora Recorrente V., casado com a também ora Recorrente M., compraram a A.. por escritura pública de compra e venda outorgada em 12 de maio de 2005, para habitação e pelo preço de €80.000,00, a fracção autónoma designada pela letra “B” correspondente ao r/c direito, sito na Praceta (...), número 1 - C, com traseiras para a Estrada do (...), número 75, na freguesia de (...), descrito na Segunda Conservatória do Registo predial da (...) sob a ficha 260 da referida freguesia, inscrita na respectiva matriz urbana sob o artigo .., com o valor patrimonial de 46 199,06 €.

Mais resultou provado – Cfr. pontos 3 e 4 -, que os ora Recorrentes venderam a F. C. e I. L. por escritura pública de compra e venda outorgada em 16 de maio de 2005, pelo preço de €105.000,00, a fracção autónoma designada pela letra “J”, destinada a habitação, sita na rua (…), com traseiras para a Estrada do (...), números.. e …, na freguesia de (...), descrito na Segunda Conservatória do Registo predial da (...) sob a ficha 201 da referida freguesia, inscrita na respectiva matriz sob o artigo…, com o valor patrimonial de € 42.349,13.

Resultou ainda provado – Cfr. pontos 5, 6, 7, 8, 11, 12 e 15 -, que o Recorrente veio a ser alvo de uma acção inspectiva por parte da AT, no sequência do que foi elaborado em 23 de junho de 2009 o relatório final de inspecção, onde se apurou que o mesmo não juntou à sua declaração de rendimentos de 2005, o Anexo G, e que dessa forma omitiu rendimentos da categoria G, rendimentos de Mais ou Menos Valias, e por consequência uma omissão dos ganhos derivados da transmissão atrás referida, sujeitos nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do CIRS e de englobamento obrigatório, nos termos do art. 22º do mesmo Diploma legal, tendo sido identificada uma mais valia de € 60 334,90, de cujo 50% foi considerado para efeitos de englobamento, por força do disposto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS, o rendimento de 30 167,45 €, sendo que, cumprido o direito de audiência prévia, o ora Recorrente veio a entregar a declaração de substituição modelo 3 de IRS/2005 com o respectivo Anexo G preenchido, onde declarou a venda do artigo …, fração J, da freguesia …, pelo montante de €105 000,00 e a intenção de reinvestir a quantia de €80 000,00, ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 5 do CIRS, ou seja, que reinvestiu o valor de realização da venda do imóvel destinado à sua habitação própria e permanente ou do seu agregado familiar, sito em (...), concelho de (...), após o que, no seio da AT foi verificado e assim proferida decisão [que veio a ser objecto de Impugnação judicial], que o reinvestimento que o Recorrente diz ter efectuado, não foi aplicado em habitação própria e permanente dele ou do seu agregado familiar, porque a mesma está situada em (...), e que nesta não houve qualquer reinvestimento., após o que foi emitida a liquidação de IRS n.º 2009 5004870022, no montante global de € 9 688,97 €, que os Impugnantes, ora Recorrentes pagaram, em 30 de setembro de 2010.

Mais resultou provado – Cfr. pontos 12, 13 e 14 -, que os Impugnantes, ora Recorrentes, nas datas de 01 de janeiro de 2005 e 31 de dezembro de 2005, constavam do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes como tendo domicílio fiscal em (...), Lote 11, freguesia de (...), concelho de (...), e que em 01 de junho de 2009 o Presidente da Junta de Freguesia de (...) emitiu atestado no sentido de que V.H.., filho dos Impugnantes, reside naquela freguesia há 4 anos, morando na Praceta (...), n.º.., em (...), concelho da (...).

Como assim concluíram os Recorrentes na conclusão 2 das Alegações, no sentido de que o que estava em causa era saber se existiu reinvestimento ou não do produto da venda da fracção J na aquisição da fracção B, em face ao que resultou provado, mesmo considerando que os Recorrentes possam ter de facto reinvestido esses €80.000,00 na aquisição do novo apartamento, todavia, essa sua actuação não tem a virtualidade por si perspectivada, ou seja, os efeitos fiscais por si pretendidos, visando a exclusão da tributação a que se reporta o artigo 10.º, n.º 5 do CIRS.

Com efeito, os Recorrentes não lograram provar que tivessem fixada a sua habitação permanente na fracção J, a qual venderam, nem que o reinvestimento foi feito na aquisição de apartamento onde a tenham vindo a fixar, pois que residiam e continuam a residir em (...), no concelho de (...).

Neste patamar.

Este Tribunal já apreciou e decidiu pelo Acórdão deste TCA Norte, datado de 31 de outubro de 2018, proferido no Processo n.º 01450/08BEVIS, as questões nucleares que também neste recurso jurisdicional são suscitadas pelos ora Recorrentes, pelo que, por semelhança ao caso sub judice e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito [cfr. artigo 8.º n.º 3 do Código Civil], aqui acolhemos a argumentação jurídica aí aduzida, por não ocorrer justificação para nos afastarmos dessa jurisprudência, pelo que para aqui extraímos, por facilidade, a fundamentação vertida naquele Acórdão, aderindo a todo o seu discurso fundamentador, com as adaptações indispensáveis à situação jurídica em análise, quando se justifiquem, como segue:

“[…]
Em suma - do ponto de vista do imóvel de «partida» - não sendo o imóvel do qual resultaram as mais-valias impugnadas a habitação própria e permanente do sujeito passivo não poderia beneficiar da exclusão de tributação prevista no art.º 10º n.º 5 do CIRS.
Do mesmo modo, o imóvel de «chegada» terá que ter como destino exclusivamente a habitação própria e permanente do sujeito passivo - “Qualquer outro destino de ambos, ou só de um deles, destrói as condições de aplicação da exclusão da incidência e a mais-valia realizada no imóvel “de partida” será tributável” e conforme referido aquando do procedimento de reclamação graciosa, cuja factualidade deveria ter sido levada ao probatório nos termos acima propostos, o impugnante e respectivo agregado familiar constituiu e sediou a sociedade “C., Lda.” no imóvel cuja aquisição o impugnante pretendia reinvestir os ganhos provenientes da transmissão onerosa do primitivo imóvel e no mesmo local os impugnantes exercem a actividade da sociedade em causa (cujo início de actividade data de 05-08-2005) - Organização de feiras, congressos e outros eventos similares, motivo porque, e bem, a entidade decisora da reclamação graciosa indeferiu o pedido dos impugnantes, quer por não ter sido feita prova que o imóvel de partida constituía a habitação própria e permanente dos sujeitos passivos nem tão pouco o imóvel de chegada se destinou exclusivamente a tal propósito - requisitos de que o art.º 10º n.º 5 do CIRS faz depender a exclusão de tributação que o impugnante pretende fazer valer.
[…]
Nesta matéria, é sabido que o art. 10º nº 5 do Código do IRS dispõe que “são excluídos de tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar”, sendo claro que a norma postula a necessária simultaneidade da propriedade e da permanência da habitação na titularidade do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, não se referindo a lei a qualquer limite temporal mínimo para a observância de tais requisitos, mas exigindo a destinação do imóvel a esse fim.
Além disso, o legislador não se bastou em referir que são excluídas de tributação as mais-valias resultantes da transmissão onerosa de imóveis que consistam na habitação própria e permanente do sujeito passivo, antes refere, expressamente, que são excluídas de tributação as mais-valias derivadas da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar.

Tal significa que se o legislador distingue, deve o intérprete também distinguir (uma vez que, de igual forma, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir - ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus), deve entender-se que essa habitação que é sua (porque apenas aquilo que se encontra na sua titularidade poderá ser sujeito a alienação), esse imóvel que é seu, tem também de consistir num imóvel dirigido / determinado a consistir não apenas na sua habitação permanente, mas igualmente na sua habitação própria. Ou, por outras palavras, da alusão feita pela lei ao “destino” do imóvel, resulta a exigência legal de que o imóvel alienado tenha sido destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar em momento anterior ao da constituição do facto tributário.
Esta interpretação do preceito legal, para além de ser aquela que encontra reflexo na letra da lei, é também aquela que encontra eco na finalidade da norma, sendo que importa atentar que a norma em análise não é um mero benefício à aquisição de casa própria, nem sequer ao reinvestimento de qualquer mais-valia na aquisição de habitação própria, pois que não é indiferente a origem ou natureza do bem alienado. Ao legislador interessa também a “origem” da mais-valia, ou seja, interessa-lhe que a mesma tenha resultado da aquisição, e posterior alienação, de um imóvel destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo.
Tal como aponta o Prof. Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, Almedina, Coimbra, 2006, pág. 114, “o objectivo da lei é claro: eliminar obstáculos fiscais à mudança de habitação, em casa própria, por parte das famílias”, referindo também José Guilherme Xavier de Basto, “IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos”, Coimbra Editora, 2007, que “o objectivo do regime de exclusão da incidência é pois, o de não embaraçar a aquisição, imediata ou mediata, de habitação própria e permanente financiada com o produto da alienação de um outro imóvel a que fora dado o mesmo destino. Usa-se uma técnica de roll-over, que torna não tributáveis essas mais-valias enquanto os valores de realização forem reinvestidos em imóveis também destinados à habitação (...). A exclusão referida só vale pois para as mais-valias de imóveis destinados à habitação própria e permanente quando o reinvestimento se opera em imóveis com o mesmo destino. O imóvel «de partida» e o «de chegada» têm de ser destinados à habitação própria e permanente»”. (cfr. Ac. do S.T.A. de 22-11-2017, Proc. nº 0384/16, www.dgsi.pt).
Como já ficou dito, a decisão recorrida valorizou o facto de os impugnantes terem sempre mantido a sua vida cívica, social e politica (o impugnante marido) em B..., São..., aí permanecendo no imóvel sua propriedade, ai recebendo familiares e amigos e aí desenvolvendo as suas actividades de labor particular, ou seja, utilizando o seu imóvel como habitação própria com permanência, desvalorizando a sua relacionada com a casa de função, apontando que a casa de função que foi atribuída ao impugnante marido por efeito das suas funções públicas, não constitui habitação própria, nem tal atribuição determinava que nela residisse com carácter permanente.
[…]
Isto para dizer que o domicílio fiscal descrito não é algo isolado, tratando-se efectivamente da morada dos Impugnantes, pois que só assim se podem compreender as declarações vertidas nas duas escrituras referidas nos autos, do mesmo modo que o tal requerimento de Agosto de 1994 está perfeitamente enquadrado neste âmbito.

Não se olvida que a prova produzida evidenciou que o Recorrente marido tinha grande ligação a B..., São..., aí desenvolvendo a sua vida cívica, social e política, aí permanecendo no imóvel sua propriedade, aí recebendo familiares e amigos e aí desenvolvendo as suas actividades de labor particular.
No entanto, trata-se de uma realidade que, ao contrário do decidido, não tem o significado apontado, dado que, sem prejuízo de toda actividade desenvolvida em São..., tal não pode escamotear o que ficou exposto, do qual se retira que o Recorrido e o seu agregado familiar residiam na morada indicada em V....
Diga-se ainda que os Recorridos juntaram aos autos um atestado de residência com data de 23 de Setembro de 2008, no qual se aponta o Recorrido, esposa e filha residem na freguesia de B... desde 1994.
Neste domínio, em circunstâncias normais, se nada houver que faça duvidar do facto atestado, sendo que o atestado é, apenas, um meio de prova da residência, terá de ser ponderado tal elemento nos termos descritos, pois que o atestado de residência é, sem dúvida, um documento autêntico (art.º 363º/2 do Cod. Civil). Como tal, a sua força probatória é a estabelecida no art.º 371º do Cod. Civil: faz prova plena dos factos que referem como praticados pelo oficial público, bem como dos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; porém, os meros juízos pessoais do documentador só valem como elemento sujeito à livre apreciação do julgador.
O art. 34º do D.L. nº 135/99, de 22 de Abril dispõe que:
"Artigo 34.º
Atestados emitidos pelas juntas de freguesia
1 - Os atestados de residência, vida e situação económica dos cidadãos, bem como os termos de identidade e justificação administrativa, passados pelas juntas de freguesia, nos termos das alíneas f) e q) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, devem ser emitidos desde que qualquer dos membros do respectivo executivo ou da assembleia de freguesia tenha conhecimento directo dos factos a atestar, ou quando a sua prova seja feita por testemunho oral ou escrito de dois cidadãos eleitores recenseados na freguesia ou, ainda, mediante declaração do próprio.
2 - Nos casos de urgência, o presidente da junta de freguesia pode passar os atestados a que se refere este diploma, independentemente de prévia deliberação da junta.

3 - Não está sujeita a forma especial a produção de qualquer das provas referidas, devendo, quando orais, ser reduzidas a escrito pelo funcionário que as receber e confirmadas mediante assinatura de quem as apresentar.
4 - As falsas declarações são punidas nos termos da lei penal.
5 - A certidão, relativa à situação económica do cidadão, que contenha referência à sua residência faz prova plena desse facto e dispensa a junção no mesmo processo de atestado de residência ou cartão de eleitor.
6 - As certidões referidas no número anterior podem ser substituídas por atestados passados pelo presidente da junta.".
No caso, em função da fonte de ciência da Junta, segundo o que no atestado se diz, não se alcança que a realidade em apreço (residência) tenha sido atestada com base na percepção da entidade documentadora, o que significa que o atestado em apreço não faz prova plena da residência, podendo tal matéria ser posta em crise através dos meios probatórios admissíveis no processo.
Ora, como se viu, a realidade documentada nos autos revela-se susceptível de colocar em crise o atestado apontado no que concerne à residência dos Recorridos.
Para além do exposto, cabe notar que uma pessoa, um agregado pode ter várias residências; no entanto, o que releva para efeitos de ponderação quanto à matéria em equação nos autos é a residência habitual, o lugar preparado para servir com estabilidade de base de vida, verificando-se que nesta sede a realidade aponta para outro local que não o exposto no atestado de residência e que é reclamado pelos Recorridos.
Assim sendo, como é, ganha acuidade o exposto pela Recorrente quando refere que o local da residência habitual do sujeito passivo, no exercício de 2004 (data da venda do imóvel que originou as mais valias impugnadas, sendo essa a data que releva para efeitos de reinvestimento - apenas poderá ser reinvestido se o imóvel de partida tiver como destino a habitação própria e permanente do sujeito passivo) é a casa de função atribuída pela Autoridade Florestal Nacional e utilizada pelo impugnante e respectivo agregado familiar, sendo que o mais apurado nos autos não contende com o facto de os Recorridos residirem na tal casa de função nos termos já apontados, pelo que, do ponto de vista do imóvel de «partida» - não sendo o imóvel do qual resultaram as mais-valias impugnadas a habitação própria e permanente do sujeito passivo não poderia beneficiar da exclusão de tributação prevista no art.º 10º n.º 5 do CIRS.

[…]”

Portanto, embora o apartamento vendido pelos Recorrentes pudesse ser tido e havido como uma sua habitação, de todo o modo, para efeitos da exclusão da tributação prevista no artigo 10.º, n.º 5 do CIRS, como pretendido e pugnado pelos Impugnantes, ora Recorrentes, não constituindo o mesmo [apartamento] a sua habitação própria e permanente, nem tendo os Recorrentes cumprido o seu ónus de prova no sentido de que aí tinham o seu agregado familiar constituído, o reinvestimento efectuado de €80.000,00 que resultou da venda desse apartamento não pode ficar isento de tributação, em sede de mais valias.

E quanto à conclusão constante do ponto 6, no sentido de que os Recorrentes demonstraram a sua morada em (...), com base num atestado emitido pelo Presidente da respectiva Junta de freguesia, apesar de não terem cumprido com a obrigação de comunicação da alteração do domicílio fiscal, a mesma [conclusão] não pode proceder, pois que mesmo considerando que o filho dos Recorrentes vive na fracção B por eles adquirida, sempre aí não está constituída a habitação permanente dos Recorrentes [a sua residência habitual, pois que a prova produzida nos autos é demonstrativa de que está fixada em (...), (...)], e para além disso, também ainda não estava essa habitação permanente constituída na fracção J, sendo para tanto e por isso absolutamente irrelevante a suscitada questão [Cfr. conclusão 7] de os Recorrentes não terem comunicado a alteração do domicílio fiscal.

A tributação das mais-valias surge na medida em que a alienação de um determinado bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual o princípio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva, sendo que, uma mais-valia é, precisamente, nos termos do artigo 10.º, n.º 4, alínea a), a diferença entre o valor da realização [o montante da alienação do bem] e o valor da aquisição [o montante pelo qual o bem entrou na esfera patrimonial do alienante].

Sintetizando, o Tribunal recorrido decidiu em conformidade com a factualidade apurada, e consequentemente com a lei aplicável, improcedendo por isso as Conclusões de recurso apresentadas pelos Recorrentes, pelo que, sem mais considerandos por desnecessários, como assim tomada e atenta a sua fundamentação de facto e de direito, a Sentença recorrida não é merecedora de censura jurídica, pelo que tem de ser confirmada.

Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Impugnação judicial; IRS; Venda de imóvel; Habitação própria e permanente; Mais valias.

1 – O artigo 10.º, n.º 5 do CIRS exclui da tributação as mais valias provenientes da transmissão onerosa de imóveis [“de partida”] destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo e do seu agregado familiar, sendo que para esse efeito, no imóvel adquirido [imóvel “de chegada”] também nele tem de ser prosseguido o mesmo destino [da habitação própria e permanente].

2 - A tributação das mais-valias surge na medida em que a alienação de um determinado bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual o princípio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva, sendo que, uma mais-valia é, precisamente, nos termos do artigo 10.º, n.º 4, alínea a) do CIRS, a diferença entre o valor da realização [o montante da alienação do bem] e o valor da aquisição [o montante pelo qual o bem entrou na esfera patrimonial do alienante].
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IV - DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, Acordam em conferência em negar provimento ao recurso jurisdicional, confirmando a Sentença recorrida.
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Custas a cargo dos Recorrentes.
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Notifique.
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Porto, 23 de janeiro de 2020.


Paulo Ferreira de Magalhães
Maria do Rosário Pais
Fernanda Esteves