Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01546/08.8BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/17/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Tiago Miranda
Descritores:RETENÇÃO NA FONTE, DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL, PROVA DA RESIDÊNCIA FISCAL DO SUBSTITUÍDO TRIBUTÁRIO EM PAÍS CONVENCIONADO
Sumário:I – Apesar de a caducidade da impugnação judicial ser de conhecimento oficioso, não é nula, nos termos de artigo 125º nº 1 do CPPT, a sentença que não se pronunciou expressamente sobre a questão da caducidade da acção e conheceu de meritis, quando tal questão não havia sido suscitada antes. Poderá incorrer em erro de julgamento, se porventura ocorria essa caducidade.

II - O prazo de caducidade da impugnação de um indeferimento tácito de um pedido de revisão oficiosa de acto tributário relativamente a uma autoliquidação de retenção na fonte de IRS ou IRC é de 90 dias a contar da entrega dos respectivos declaração e pagamento, conforme artigo 102º do CPT. O prazo de apresentação desse pedido de revisão – 4 anos desde a liquidação cf. artigo 78º nº 1 da LGT – interrompe-se com a apresentação desse pedido (nº 7 do mesmo artigo) e o seu esgotamento só releva para a legalidade material da revisão.

III – Padece de nulidade parcial, nos termos do artigo 125º nº 1 co CPPT, suprível nos termos do artigo 662º do CPC, a sentença que selecciona os factos relevantes para a decisão sobre o pedido principal, julgado procedente, mas fica silente sobre um facto relevante para uma decisão sobre um pedido subsidiário.

IV - Não era “prova legal” a prova a fazer, pelos beneficiários da dispensa de retenção na fonte, perante entidade pagadora dos rendimentos, de que tinham residência fiscal em país convencionado, em ordem a evitarem a dupla tributação internacional, conforme os artigos 18º nº 1 do DL nº 42/91 e 90º nº 2 do CIRC, aplicáveis até 1 de Janeiro de 2003. Por isso, uma vez que no procedimento inspectivo a própria AT verificou a residência desses beneficiários nos respectivos países, tanto bastava para não serem devidas as retenções na fonte do IRS e do IRC sobre esses pagamentos e, logo, não haver fundamento legal para as autoliquidações objecto do pedido de revisão oficiosa.

V – Tendo a autoliquidação e o pagamento, legalmente indevidos e judicialmente anulados sido efectuados no decurso de uma inspecção tributária em e conformidade com o nela sugerido pela AT, há lugar a juros indemnizatórios nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*
I - Relatório

A Autoridade Tributária interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 29 de Março de 2018, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial movida pela V(...)”, NIPC (…), com sede na Rua (…), contra o indeferimento tácito do pedido de revisão do acto tributário da autoliquidação de retenções na fonte de IRS e de IRC relativamente a pagamentos a não residentes realizados nos anos de 2000, 2001 e 2002, no valor total de 400.976,17 €, e subsidiariamente, de revisão, ao menos, da parte dessa autoliquidação, no valor de 292 183,29 €, correspondente aos pagamentos relativamente aos quais foram exibidos em juízo certificados de residência fiscal.

As alegações de recurso terminam com as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra o indeferimento tácito do pedido de revisão do acto de autoliquidação de imposto referente a retenções na fonte de IRS e IRC sobre pagamentos a não residentes realizados nos anos de 2000 a 2002, no valor de € 400.976,17 ou, subsidiariamente, a quantia de € 292.183,29, correspondente aos pagamentos relativamente aos quais foram exibidos certificados de residência fiscal.
B. A impugnante alegou, em síntese, que durante os anos de 2000, 2001 e 2002, efectuou pagamentos de rendimentos referentes a propriedade intelectual, royalties, assistência técnica, artistas e profissionais de espectáculo, trabalho independente, prestação de serviços e rendimentos em espécie, a entidades não residentes com domicílio fiscal em países com os quais Portugal celebrou convenções para evitar a Dupla Tributação.
C. No seu entendimento, tais rendimentos deviam ser tributados nesses Estados, não podendo ser objecto de retenção na fonte em território nacional ou, sendo-o apenas por aplicação das taxas de impostos previstas nessas Convenções, que, em regra, são inferiores às taxas nacionais.
D. Discordando da posição da Administração Fiscal segundo a qual os rendimentos atribuídos a não residentes deveriam ser tributados por aplicação das taxas nacionais, pelo facto de a impugnante não ter accionado as Convenção para Evitar a Dupla Tributação.
E. Em sede decisória, a douta decisão sob recurso concluiu que, até às alterações legislativas decorrentes da entrada em vigor da Lei n.º 32-B/2002, de 30.12, a lei admitia que a prova da residência no estrangeiro das entidades beneficiárias de rendimentos em Portugal fosse realizada por outros meios que não os formulários aprovados pela Administração Fiscal.
F. Determinando que as autoliquidações de retenção na fonte impugnadas são ilegais “(…) na exacta medida em que se fundaram na falta de posse de tais certificados e não levaram em linha de conta o disposto nas Convenções para Evitar a Dupla Tributação aplicáveis, quer quando estas excluem a competência tributária de Portugal, quer quando prevêem a sua competência cumulativa com o estado da residência do beneficiário do pagamento, por via da redução da taxa de imposto aplicável.”
G. Contrariamente ao assim decidido, considera a Fazenda Pública, sempre com o devido respeito, que o inciso decisório incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, fazendo uma errada interpretação e subsunção da lei ao caso em apreço, bem como erro de julgamento em matéria de facto, por errada valoração da prova produzida.
Vejamos,
H. Em consequência de uma acção inspectiva, foi verificado que a impugnante não reteve imposto sobre os rendimentos pagos a entidades não residentes nem accionou as Convenções para Evitar a Dupla Tributação, não possuindo os certificados de residência fiscal dessas entidades.
I. No decurso da acção a impugnante procedeu à regularização dessas retenções, tendo efectuado o pagamento do imposto devido em 30.07.2004, 01.09.2004 e 06.09.2004.
J. Em 18.12.2007, deduziu reclamação graciosa nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 132.º do CPPT e na mesma data apresentou também pedido de revisão oficiosa nos termos do artigo 78º da LGT.
K. A reclamação graciosa não foi objecto de decisão final expressa, tendo sido junta ao processo de impugnação no estado em que se encontrava, devendo ser considerada, para todos os efeitos, no âmbito do processo de impugnação, tal como o pedido de revisão oficiosa.
L. Em 17.07.2008 foi apresentada a presente impugnação judicial contra o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa e contra a ilegalidade da liquidação.
M. Efectivamente, a pretensão da impugnante, devidamente explanada no intróito da sua petição inicial, visa atacar de forma mediata as retenções na fonte de IRS e IRC sobre os pagamentos efectuados a não residentes nos anos de 2000, 2001 e 2002.
N. Sendo objecto imediato da impugnação judicial o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa através do qual requer a restituição do imposto pago, acrescido dos juros indemnizatórios, no montante de € 400.976,11, ou, subsidiariamente, a restituição parcial do montante de € 292.183,29, correspondente aos pagamentos relativamente aos quais foram exibidos certificados de residência fiscal, com fundamento em erro de direito na liquidação efectuada pela Administração Tributária.
O. No caso, a douta sentença apreciou o mérito da causa, determinando a anulação do montante de € 400.976,11, bem como a condenação da Administração Tributária no pagamento dos juros indemnizatórios, sem ter feito a prévia apreciação dos pressupostos legais para a mesma, nomeadamente, a eventual caducidade do direito à acção.
P. Como vimos a impugnante deduziu simultaneamente uma reclamação graciosa nos termos do disposto no art.º 132.º do CPPT e um pedido de revisão oficiosa nos termos do art.º 78º da LGT e sem esperar pela decisão final sobre os procedimentos administrativos graciosos, a impugnante apresentou a presente impugnação considerando estar tacitamente indeferido o pedido de revisão oficiosa.
Q. E fê-lo, ainda que de forma não expressa, alicerçada na alteração legislativa introduzida no artigo 90-º-A do CIRC, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, que conferiu eficácia retroactiva ao determinar, no n.º 2 do art.º 46º e n.º 4 do art.º 48º que a nova redacção dos citados preceitos: (…) é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação”.
R. Ora, tendo por base a data de último pagamento realizado – 06.09.2004 – e considerando o prazo legal de dois anos para a dedução de reclamação graciosa previsto no art.º 132.º do CPPT, a contar do final do ano em que efectuou o pagamento realizado, é forçoso concluir que na data da apresentação da reclamação graciosa – 18.12.2007 – tal prazo já se encontrava largamente esgotado ocorrendo a respectiva intempestividade.
S. O mesmo sucederá no que concerne ao pedido de revisão oficiosa, que deveria ter sido deduzido no prazo da reclamação administrativa para ficar abrangido pelo regime transitório introduzido pela Lei n.º 67-A/2007.
T. Deste modo, a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento tácito de um processo administrativo gracioso – reclamação e/ou revisão oficiosa – deduzido intempestivamente acarreta como consequência a intempestividade do processo judicial.
U. Estamos perante um prazo de caducidade, peremptório e de conhecimento oficioso, consequenciando o seu decurso a extinção do direito de praticar o acto, cf. art. 145º n.° 3, do CPC. Conta-se de forma contínua, sem suspensão e interrupção, nos termos do art. 279° CCivil e art. 20° n.° 1 CPPT.
V. Assim, in casu, a douta sentença ora recorrida faz errada interpretação dos artigos n.º 46.º n.º 2 e 48º n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31.12, conjugado com o artigo 132.º do CPPT e 78º da LGT, e é nula porquanto omite a pronúncia sobre a caducidade do direito à acção decorrente da intempestividade do pedido de revisão oficiosa, facto este de conhecimento oficioso para o julgador por se tratar de um facto extintivo de um direito.
W. É de realçar ainda que, perante a natureza jurídica dos actos tributários impugnados – retenção na fonte a título definitivo -, a impugnação judicial teria de ser apresentada nos termos, prazos e fundamentos do disposto no art.º 132.º do CPPT.
X. Estamos perante uma situação equiparada legalmente a “autoliquidação”, paga por meio de guia emitida pela própria impugnante, como corolário da regularização voluntária realizada e não perante uma liquidação adicional promovida pela Administração Fiscal, pese embora os valores em falta terem sido quantificados em sede inspectiva.
Y. Pelo que, a condenação da Administração Fiscal ao pagamento de juros indemnizatórios é ilegal por erro nos pressupostos de facto e de direito, desde logo, por inexistência de qualquer erro imputável aos serviços, uma vez que estamos perante uma autoliquidação não resultante directa ou indirectamente de qualquer orientação genérica publicada pelos serviços.
Caso assim não seja entendido e sem prescindir,
Z. A douta sentença incorreu em erro de julgamento em matéria de facto, por errada valoração da prova produzida nos autos, na medida em que ordena a anulação total das liquidações impugnadas.
AA. Pese embora tenha sido considerado como provado que os beneficiários dos rendimentos a que se reportam as declarações de retenção na fonte apresentadas pela impugnante têm residência fiscal em países com os quais Portugal celebrou CDTs, não vem expressamente referido que a impugnante dispunha ou apresentou alguns certificados de residência fiscal dos beneficiários dos rendimentos pagos.
BB. Todavia, foi a própria impugnante que requereu a junção aos autos desses certificados e quantificou o valor das retenções que se encontrariam abrangidas por essa prova documental, ou seja, quantificou esse pedido subsidiário no montante de € 292.183,29.
CC. Assim sendo, afigura-se à Fazenda Pública que a anulação total do acto tributário impugnado é indevida e enferma de erro de julgamento em matéria de valoração da prova produzida nos autos.
DD. De harmonia com a prova produzida nos autos apenas será admissível ordenar a anulação parcial do acto tributário, correspondente à diferença entre o valor de imposto para o qual não existe qualquer meio de prova e o valor do imposto para o qual a própria impugnante dispõe de prova documental, fez juntar aos autos e foi aceite pelo Tribunal.
EE. Destarte, é entendimento da Fazenda Pública que a douta sentença não poderá manter-se, sendo imperioso que se conclua pela improcedência da impugnação judicial, por não estar a liquidação ora em apreço ferida de ilegalidade, sendo que esta por ser legal, deverá manter-se na ordem jurídica.
FF. Assim, in casu, a douta sentença ora recorrida faz errada interpretação dos artigos n.º 46.º n.º 2 e 48º n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31.12, conjugado com o artigo 132.º do CPPT e 78º da LGT, e é nula porquanto omite a pronúncia sobre a caducidade do direito à acção decorrente da intempestividade do pedido de revisão oficiosa, facto este de conhecimento oficioso para o julgador por se tratar de um facto extintivo de um direito.
termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.
Mais requer a dispensa do pagamento do acréscimo de taxa de justiça devida por cada € 25.000,000 ou fracção acima dos € 275.000,00, nos termos do n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

Notificada, a Recorrida respondeu à alegação, concluindo nos seguintes termos:
«IV – DAS CONCLUSÕES
A. Nos presentes autos discute-se a legalidade da liquidação de imposto, no montante de € 400.976,17, referente a retenções na fonte de IRS e IRC a efectuar sobre os pagamentos a não residentes realizados nos anos de 2000 a 2002. B. O douto tribunal de primeira instância veio, por sentença datada de 29 de Março de 2018, a julgar a impugnação judicial totalmente procedente, “e, em consequência:
a) Anular a autoliquidação de imposto referente a retenções na fonte de IRS e IRC sobre pagamentos a não residentes realizados nos anos de 2000 a 2002;
b) Condenar a Fazenda Pública a:
a. Restituir à impugnante a quantia paga a título de imposto correspondente à autoliquidação anulada;
b. Pagar à impugnante de juros indemnizatórios sobre a quantia paga a título de imposto correspondente à autoliquidação anulada desde a data do respectivo pagamento até à emissão da respectiva nota de crédito, à taxa legal.”
C. A RFP, não se conformando com a decisão, invoca, em síntese, os dois seguintes argumentos:
1) O pedido de revisão do acto tributário que precedeu a impugnação judicial foi intempestivo e, por conseguinte, também a própria impugnação judicial;
Entende a RFP que o pedido de revisão do acto deveria ter sido apresentado no prazo de 2 anos, de reclamação administrativa, contados da data da autoliquidação, e não no prazo de 4 anos, em face do preceituado no regime transitório introduzido pela Lei n.º 67-A/200, de 31 de Dezembro.
2) A decisão proferida pelo tribunal a quo padece de erro de julgamento da matéria de facto por errada valoração da prova produzida nos autos;
Considera a RFP que pese embora tenha sido considerado provado que os beneficiários “dos rendimentos a que se reportam as declarações de retenção na fonte apresentadas pela recorrida têm residência fiscal em países com os quais Portugal celebrou CDT’s, não vem expressamente referido que a recorrida dispunha ou apresentou alguns certificados de residência fiscal dos beneficiários dos rendimentos pagos”.
D. Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão à RFP, não merecendo a sentença proferida pelo tribunal a quo qualquer censura do ponto de vista da matéria factual dada por assente, e, muito menos quanto à aplicação do direito aos referidos factos.
E. Ora com relevância para o presente recurso, ficaram provados os seguintes factos:
a. Com data de 07.09.2004, foi elaborada “informação”, por referência à impugnante, com o seguinte teor (...) (cfr. facto A da factualidade assente);
b. Em 15.09.2004, foi remetida, via correio registado, carta dirigida à impugnante sob o assunto “Notificação do resultado da acção inspectiva – sem correcções (....) (cfr. facto C da factualidade assente);
c. Em 18.12.2007, a impugnante deduziu reclamação graciosa contra as liquidações de retenção na fonte referidas nos pontos anteriores (...) (facto D da factualidade assente);
d. Não foi proferida decisão relativa à reclamação graciosa referida no ponto anterior (facto E da factualidade assente);
e. Em 18.12.2007 a impugnante efectuou pedido de revisão do acto tributário relativamente às liquidações impugnadas (facto F da factualidade assente); f. Não foi proferida decisão relativa ao pedido de revisão de acto tributário referido no ponto anterior (facto G da factualidade assente); g. Em 17.07.2008, foi remetida a este Tribunal a petição inicial de impugnação que deu origem aos presentes autos (facto H da factualidade assente); h. Durante os anos de 2000, 2001 e 2002, a impugnante efectuou os seguintes pagamentos a não residentes – facto alegado em 9.º e 10.º da p.i. e não impugnado e anexos n.ºs 1 a 6 e documentos 2 a 7 juntos com a pi:
i. Rendimentos de propriedade intelectual correspondentes a aquisições de obras de arte efectuadas aos próprios artistas, no valor total de € 1.217.565,06;
ii. Royalties correspondentes, fundamentalmente, à utilização de imagens para catálogos e, em casos pontuais, a “fees” de exposições em que houve referência específica a uma utilização de um direito de autor, no valor total de € 11.201,30;
iii. Assistência técnica correspondente ao uso ou concessão do uso dos direitos de autor;
iv. Rendimentos de artistas e profissionais de espectáculos no valor total de € 144.499,28;
v. Rendimentos de trabalho independente, no valor total de € 226.764,02;
vi. Rendimentos de trabalho independente, no valor total de € 451.233,88;
vii. Rendimentos em espécie correspondentes aos valores de aquisição de molduras compradas pela impugnante para expor obras de arte de terceiros sempre que aquelas molduras tenham sido devolvidas no final das exposições juntamente com as obras, no valor total de € 60.568,51 (facto J da factualidade assente);
i. Em 27.06.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS / IRC e Imposto de Selo – Retenções a Não Residentes” – para o ano de 2000 –, (...), no valor total de € 81.077,40 e em 30.07.2004 entregou o respectivo montante (...) (facto K da factualidade assente);
j. Em 31.08.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS / IRC e Imposto de Selo – Retenções a Não Residentes” – para o ano de 2001 –, (...), no valor total de € 93.936,78 e em 01.09.2004 entregou o respectivo montante (...) (facto M da factualidade assente);
k. Em 31.08.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS / IRC e Imposto de Selo – Retenções a Não Residentes” – para o ano de 2002 –, (...), no valor total de € 225.962,23 e em 06.09.2004 entregou o respectivo montante (...) (facto N da factualidade assente);
l. As retenções na fonte a que se referem as declarações indicadas nos pontos anteriores foram efectuadas sobre rendimentos do trabalho independente, propriedade intelectual e actividade de profissionais de espectáculos, em sede de IRS, e sobre rendimentos de prestação de serviços, propriedade intelectual e actividade de profissionais de espectáculos em sede de IRC (...) (facto O da factualidade assente);
m. Os beneficiários dos rendimentos a que se reportam as declarações de retenção na fonte referidas nos pontos anteriores têm residência nos seguintes países: Reino Unido, Estados Unidos da América, Alemanha, Holanda, Suíça, Espanha, Suécia, Bélgica, França, Liechtenstein, Brasil, Áustria, Itália, Noruega, Croácia, Austrália, Japão e Polónia – cfr. anexos 6, 10 e 14, ao processo de inspecção, a fls, 27 do PA apenso e informação a p. 737 do processo do SITAF (facto P da factualidade assente);
F. Em face dos factos, e no plano do direito, está bom e ver que não assiste qualquer razão à RFP.
G. Sobre a alegada intempestividade da apresentação da presente impugnação judicial, por intempestividade da apresentação do pedido de revisão de acto tributário, salvo o devido respeito, nem sequer consegue a recorrida entender o percurso cognitivo da RFP para sustentar essa intempestividade;
H. Basta pensar que a recorrente, RFP, pretende que a recorrida tenha apresentado um pedido de revisão de acto tributário em 18 de Dezembro de 2017 Querer-se-ia dizer “2007”.
alicerçado numa Lei aprovada em 31 de Dezembro desse mesmo ano para perceber que esta tese – peregrina e absolutamente nova, dado que em momento algum da presente impugnação foi sugerida a intempestividade da acção – não pode prevalecer.
I. A recorrida apresentou o pedido de revisão de acto tributário nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 78.º da LGT, dentro dos 4 anos contados da data da autoliquidação. Fê-lo porquanto entendeu, à luz das disposições legais em vigor para os anos de 2000 a 2002, e, bem assim, da jurisprudência dos tribunais superiores que se veio a consolidar, não ser devida qualquer Retenção na Fonte pelos pagamentos efectuados a não residentes.
J. O pedido de revisão do acto tributário, assim como a presente impugnação, teve por objecto um acto de autoliquidação que a recorrida reputou e reputa de ilegal, por ter sido emitido ao abrigo de uma interpretação e aplicação erradas do Direito, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 78.º da LGT, dado que, nos termos legais, se presumia, para efeitos de “erro imputável aos serviços” o erro na autoliquidação.
K. Com efeito, estabelecem os artigos 266º, n.º 2, da Constituição e 55º da LGT a obrigação genérica de a AT actuar em plena conformidade com a lei, pelo que qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável à própria Administração. Aliás, esta imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa de qualquer dos seus funcionários envolvidos na emissão da liquidação afectada por erro.
L. Neste sentido se pronuncia o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 12/12/2001, proferido no recurso n.º 026233, disponível in “Antologia de Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo”, ano V, tomo 1, pág. 161, aludido, com assentimento, por DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in “Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada”, 3.ª edição, Lisboa 2003, pág. 406, nota de rodapé n.º 225;
M. Por outro lado, nos termos do (agora revogado) n.º 2 do dito artigo 78.º da LGT “considera-se imputável aos serviços, para efeitos do número anterior, o erro na autoliquidação”. Assim, a única questão – e que só agora é levantada pela RFP, perante a procedência total da impugnação judicial – é a de saber se (e em que circunstâncias) o contribuinte pode utilizar o prazo de 4 anos ou outro mais lato caso o tributo ainda não tenha sido pago para requerer a revisão oficiosa do acto de liquidação
N. O entendimento da recorrida – e, bem assim, da Doutrina e Jurisprudência fiscal maioritária – é favorável a essa possibilidade pois uma vez que tudo o que pode ser feito oficiosamente, pode ser também feito a pedido dos interessados, nada impede que, mesmo nos casos em que, segundo o artigo 78.º da LGT, a revisão é da iniciativa da AT, aqueles lhe requeiram esse procedimento.
O. Aliás, os termos em que se encontra redigido o actual n.º 7 do daquele artigo (“[i]interrompe o prazo de revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização”) permitem concluir que o contribuinte tem, de facto, a possibilidade de solicitar essa revisão.
P. Por outro lado, uma vez recebido o pedido, a AT terá de sobre ele se pronunciar, nos termos do princípio da decisão previsto no artigo 56º da LGT, devendo, no caso de se verificarem os pressupostos da revisão, proceder à mesma, por imposição dos princípios da justiça e do respeito pelos direitos e interesses legítimos do administrados, plasmados nos artigos 266º, n.º 1, da Constituição e 55º da LGT.
Q. E, portanto, se o contribuinte estiver dentro dos prazos em que a AT pode rever o acto e solicitar essa revisão com base num dos fundamentos com que a mesma àquela é permitida (onde se inclui o erro imputável aos serviços), o pedido é tempestivo.
R. Veja-se, por todos, DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in Ob. cit, págs. 407 e seguintes, bem como os Acórdão do STA de 13/07/2005, proferido no processo n.º 320/05, de 20/03/2002, proferido no processo n.º 26.580, de 02/04/2003, proferido no processo n.º 1771/02, de 16/10/2002, proferido no recurso n.º 834/02, de 23/10/2002, proferido no recurso n.º 899/02, de 04/12/2002, proferido no recurso n.º 1261/02 e de 26/03/2003, proferido no recurso n.º 1770/02. E ainda acórdão do STA, proferido no âmbito do Processo n.º 01524/15, em 9 de Novembro de 2016;
S. Improcede, portanto e integralmente, a alegada nulidade da decisão, por não considerar a caducidade do direito à impugnação por intempestividade do pedido de revisão do acto tributário;
T. Já quanto ao alegado erro de julgamento da matéria de facto por errada valoração da prova produzida nos autos é forçoso dizer que a recorrente não compreendeu a informação e documentação junta pela recorrida ou, simplesmente, não quer compreender; já o douto tribunal, por seu turno, compreendeu correctamente;
U. A impugnante, ora recorrida, dispunha da prova suficiente à data dos pagamentos para atestar a não residência dos beneficiários dos rendimentos e a mesma foi carreada para os autos – não dispunha era da prova que a AT queria e exigia, exigência essa que, agora se confirma, era ilegal;
V. A própria AT, através dos serviços de inspecção tributária, da informação prestada aos autos e demais documentação junta pela própria, atestou a residência dos beneficiários dos rendimentos em apreço para concluir, somente, que seria exigida documentação específica para evitar a retenção na fonte pela requerida;
W. E, portanto, andou bem o tribunal a quo, ao decidir que “Não está em causa nos presentes autos, o estatuto de residente dos beneficiários dos pagamentos em questão, efectuados pela impugnante porquanto a própria Administração Tributária verificou, em face das diligências pela mesma encetadas, que os beneficiários dos pagamentos em questão não são residentes em Portugal, mas sim residentes nos respectivos países elencados nos mapas de trabalho por ela elaborados.”;
X. Também a jurisprudência, para além de abundante, é absolutamente consentânea na questão em apreço – Confrontado com a realidade jurídica anterior à exigência legal de prova dos requisitos formais para a dispensa de retenção na fonte (antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 42/91, de 22.01 (IRS) e da Lei n.º 32-B/2002, de 30.12 (IRC)), o Tribunal Central Administrativo Norte no Acórdão de 20 de Abril de 2017, proferido no âmbito do processo n.º 01422/07.1BEVIS, considerou que: “até lá, a lei admitia a prova de residência no estrangeiro das sociedades beneficiárias de rendimentos em Portugal por outros meios que não os formulários aprovados pela Administração tributária portuguesa, expressando que não devem tais formulários constituir o único meio de prova necessário para certificar a sua residência – vd. Acs. do STA (Pleno do CT), de 20/01/2006, tirado no proc.º 01479/13 e de 13/04/2016, tirado no proc.º 01444/13 e deste TCAN, de 28-06-2007, tirado no proc.º 00129/03-Braga e de 11/10/2007, tirado no proc.º00796/05.3BEVIS”;
Y. Aliás, mesmo após a entrada em vigor da legislação que exige prova da residência fiscal mediante formulários oficiais, veja-se o raciocínio do Supremo Tribunal Administrativo plasmado no Acórdão de 14 de Dezembro de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 0141/14;
Z. Ora dada a comprovação, quer pela impugnante quer pela própria AT, da residência dos beneficiários dos rendimentos que nos presentes autos nos atêm, resta concluir pela absoluta suficiência dos meios de prova para atestar a não necessidade de Retenção na Fonte sobre os pagamentos efectuados e, consequentemente, pela ilegalidade dos actos de autoliquidação, demonstrando-se assim, a imaculada decisão proferida pelo tribunal a quo.
TERMOS EM QUE SE CONCLUI PELA IMPROCEDÊNCIA DO RECURSO EM APREÇO, MANTENDO-SE A DECISÃO PROFERIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.»

Em seu despacho proferido nos termos do artigo 617º nº 1 do CPC, a Mª Juiz a qua apreciou a arguição de nulidade da sentença, nos seguintes termos:
«Nas conclusões das suas alegações de recurso, a recorrente afirma que a sentença “apreciou o mérito da causa (…) sem ter feito a prévia apreciação dos pressupostos legais para a mesma, nomeadamente, a eventual caducidade do direito à acção”, pelo que “é nula porquanto omite a pronúncia sobre a caducidade do direito à acção decorrente da intempestividade do pedido de revisão oficiosa, facto este de conhecimento oficioso para o julgador por se tratar de um facto extintivo de um direito.”
Vejamos.
A sentença recorrida, tendo conhecimento do mérito da causa, julgou a impugnação procedente.
Nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, “Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.”
Está em causa a nulidade relativa à falta de pronúncia do juiz sobre questões que omesmo deva apreciar, ou seja, a nulidade por omissão de pronúncia, concretamente por o juiz não ter apreciado a extemporaneidade da acção.
Todavia, inexiste qualquer omissão de pronúncia na medida em que a extemporaneidade não foi invocada. Note-se que a Fazenda Pública nem sequer apresentou contestação, pelo que não tinha o Tribunal o dever legal de emitir pronúncia sobre tal questão, a não ser que entendesse que a mesma se verificava.
Pelo exposto, inexiste a nulidade da sentença por omissão de pronúncia nos termos
em que a recorrente a invoca.»

O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, redutível aos seguintes excertos:
«Alega a Fazenda Pública, em resumo, que a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia (artigo 125° n°1 do CPPT) em relação ao não conhecimento da excepção peremptória e de conhecimento oficioso de caducidade do direito de acção.
Mais invoca, resumindo, o erro de julgamento de facto e de direito por a referida liquidação preencher os requisitos legais.
(…)
Citando o Ac. do TCAS de 26/6/2014, no processo 07784/14, in www.dgsi.pt:
“(…) Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr. art.º 608, n°. 2, do C.P. Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr. art°s. 577º e 578º, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no art.º 133º, n°.2, do C.P. Administrativo (cfr. ac. S.T.A – 2ª Secção, 28/5/2003, rec. 1757/02; ac. T.C.A. Sul - 2.aSecção, 25/8/2008, proc. 2569/08; ac. T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc. 3171/09; ac. T.C.A. Sul - 2a.Secção, 12/12/2013, proc. 7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365)."
A caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr. art°. 333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do art.º 576, n°. 3, do C.P. Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos [factos] articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento "de meritis" e a consequente absolvição oficiosa do pedido — v. Ac. citado.
O [prazo para o] pedido de revisão do acto tributário por iniciativa do sujeito passivo é de quatro anos, a contar da data da liquidação, artigos 78° n° 1 e 2 e 131°, ambos do CPPT, não sendo necessário nem pressuposto de tal a obrigatoriedade de ser precedida por reclamação graciosa: v. Ac. do STA de 12/9/2012, no processo 0476/12, in www.dgsi.pt.
No caso e conforme resulta do probatório em 27/6/2004, 30/7/2004, 31/8/2004, 1/9/2004 e 6/9/2004 (alíneas K.L.M.N.Q.R.), [a recorrida] procedeu à regularização das retenções de imposto sobre os rendimentos, efectuando o seu pagamento à AT, o que é confirmado pela recorrente na alínea I das conclusões.
Em 17/7/2008 intentou a presente impugnação judicial (alínea H.), pelo que a mesma é atempada. Não se verificando a alegada caducidade do direito de acção.
Quanto á questão dirimir, nomeadamente, se são aplicáveis as Convenções para evitar a Dupla Tributação celebradas entre Portugal e os países onde os beneficiários dos rendimentos têm domicílio fiscal e, em caso afirmativo, se da respectiva aplicação resulta imposto a pagar pela recorrida, acompanhamos o parecer do Ministério Público, na 1ª instância bem como a argumentação da V (...).
Constam da sentença as razões de facto e de direito em que esta assentou. A Mma Juiz analisou a prova e fundamentou a decisão, em nosso entender, merecedora de confirmação, não se verificando os invocados vícios.
O recurso não merece provimento.»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

II- Âmbito do recurso e questões a decidir
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.
Assim, as questões suscitadas pelo recurso são, por ordem lógica, as seguintes:

1ª Questão
É nula, a sentença recorrida, nos termos do artigo 125º nº 1 do CPPT, por não se ter pronunciado sobre a questão, de conhecimento oficioso, da caducidade da acção?
2ª Questão
De qualquer modo, errou de direito por apreciar de meritis a impugnação, apesar da caducidade da acção, pois, estando em causa, em último termo, uma autoliquidação de uma retenção na fonte, a impugnação do indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto tributário tinha de ser instaurada até 2 anos a contar do termo do ano do pagamento supostamente indevido e precedida de reclamação graciosa, conforme resultaria dos artigos 131º e 132º do CPPT?
3ª Questão
A sentença recorrida fez indevida aplicação doa dos artigos n.º 46.º n.º 2 e 48º n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31.12, conjugado com o artigo 132.º do CPPT, pois, atenta a sua caducidade, a pendência da impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa das retenções na fonte não habilitava a Impugnante a beneficiar da retroactividade da desnecessidade de especial prova documental da residência fiscal, consagrada por aquelas normas?
4ª Questão
De qualquer modo, a sentença recorrida errou na apreciação da prova, por não ter dado como provado um facto relevante, designadamente, que a impugnante apresentou alguns certificados de residência fiscal no respectivo país estrangeiro?
5ª Questão
Em consequência do erro objecto da terceira questão, a sentença recorrida errou de direito por ter anulado todas as liquidações e não apenas aquelas relativamente a cujos sujeitos passivos substituídos a Impugnante apresentou certificados de residência fiscal no respectivo país estrangeiro?

6ª Questão
Em todo o caso, errou, a sentença recorrida, em matéria de direito, ao julgar procedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, pois, tratando-se de um pedido de revisão de uma autoliquidação – não de uma liquidação adicional feita pela AT – só se poderia atribuir o erro aos serviços da AT se o contribuinte tivesse seguido, na liquidação, orientações genéricas da AT – cf. artigo 43º nº 2 da LGT – o que não foi o caso?

III – Apreciação do Recurso
Em matéria de facto, a decisão recorrida tem o seguinte teor.
«É a seguinte a matéria de facto provada com relevância para a decisão da causa, por ordem lógica e cronológica:
A. Com data de 07.09.2004, foi elaborada “Informação”, por referência à impugnante, com o seguinte teor - cfr. fls. 27 e ss. do PA apenso:
“(...) Ordem de Serviço/Despacho n.°60019 e n.°56510
(...)
I – SUJEITO PASSIVO
SP V (...)
NIPC: (…)
Sede Rua (…)
Serviço Finanças: (3182)
Actividade: outras actividades associativas, n.e. (CAE 91 333)
Tipo de Sujeito Passivo: V instituída peio Decreto-Lei n.° /89 de /07, com alteração dos respectivos estatutos através do Decreto-Lei n.° /2003 de /06.
Enquadramento:
IVA: - Suj. passivo com operações sujeitas, não isentas (art. 3o e 4.° do CIVA) e isentas (art. 9.° do CIVA)
- Regime do Pro-Rata (art.23.° e 24.° do CIVA)
- Periodicidade Trimestral
IRC: - Suj. passivo isento subjectivamente, de acordo com a alínea c) do n.° 1 do art. 10.° do Código do IRC (…).
II – CREDENCIAL, MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL
Credenciais: Despacho n.° 56 510 e Ordem de Serviço n.° 60 019
Motivo: PNAIT 62 111 - Controlo de Rendimentos Pagos a Não Residentes - Modelo 130 (Processos n.°s 665/02 e 2595/03 da Direcção de Serviços de Benefícios Fiscais, remetidos pelo Ofício n.° 009621)
Âmbito: Parcial - Consulta, Recolha e Cruzamento de Elementos - Controlo de IR não retido e não entregue (Rendimentos Pagos a Não Residentes - Modelo 130)
Incidência Temporal: Exercícios de 2000, 2001 e 2002.

III – INFORMAÇÃO
Através do ofício n.° 009 a Direcção de Serviços de Benefícios Fiscais remete os Processos n.°s /02 e /03 contendo os originais das Declarações Mod. 130 dos exercícios de 2000 e 2001 entregues pelo sujeito passivo, solicitando a Informação sobre a existência de omissões de que resulte a entrega de imposto inferior ao devido.
Ainda no referido ofício é noticiada a falta de entrega da Declaração Mod. 130 do exercício de 2002, apesar da existência de elementos fornecidos pelo IGAC (licenças requeridas pelo sujeito passivo em 2002) que indiciam que este teria efectuado pagamentos a sujeitos passivos não residentes nesse exercício.
Em face do informado, foi emitido o Despacho n.° 56 para os exercícios de 2000, 2001 e 2002 para acção inspectiva com o âmbito de controlo de rendimentos pagos a não residentes - Mod. 130.
A visita inspectiva foi iniciada em //2004 com base no referido Despacho tendo sido emitida, posteriormente, a Ordem de Serviço n.° 60, com o mesmo âmbito e extensão, e foi concluída em 07/09/2004.
Da acção inspectiva resultou o apuramento de imposto não retido sobre rendimentos pagos a não residentes no total de 400.976,41€, assim discriminado:
. em 2000 81.077,40€
. em 2001 93.936,78€
. em 2002 225.962,23€
O sujeito passivo procedeu à entrega voluntária nos Cofres do Estado do imposto apurado na acção inspectiva, antes do termo da visita.
Assim, em resultado da acção inspectiva realizada foi apurado o seguinte:
1. Retenção na fonte efectuada tempestivamente pelo sujeito passivo
O sujeito passivo procedeu à entrega tempestiva das Declarações Mod. 130 dos exercícios de 2000, 2001 e 2002. Embora a DSBF refira a falta de entrega da declaração de 2002, verificamos a sua recepção com data de 29/07/2003, pelo que se anexa a respectiva fotocópia (anexo n.° 1). O sujeito passivo efectuou a retenção na fonte sobre parte dos rendimentos pagos a sujeitos passivos não residentes, imposto este que entregou pelos seguintes montantes:
(…)
2. Falta de Retenção na fonte de IRS/IRC sobre rendimentos pagos a não residentes
No decurso da análise efectuada verificou-se que o sujeito passivo não tinha efectuado a retenção na fonte sobre a totalidade de rendimentos pagos a não residentes.
2.1. Base da Auditoria Tributária
Para efeitos de apuramento e quantificação do imposto não retido, procedemos a uma análise para a detecção dos registos de pagamentos efectuados a não residentes, tomando os seguintes procedimentos:
Selecção das contas de terceiros (fornecedores e outros devedores e credores) das entidades "não residentes" (a contabilidade não desagrega as entidades residentes e não residentes);
Análise exaustiva das contas correntes seleccionadas e respectivos documentos de suporte;
Confronto da análise efectuada com o balancete de "extracto de contas segundo segmento - honorários", relativos aos centros de custo em cada exercício, para detecção de eventuais pagamentos a sujeitos passivos não residentes efectuados directamente pelo Diário de Bancos, ou seja, sem registo em contas de terceiros.
Refira-se que não foi efectuada uma análise exaustiva a todos os registos contabilísticos (relativos a entidades residentes e não residentes) dos três exercícios, atendendo ao grande número de operações e registos que a contabilidade revela em cada exercício.
Contudo, a selecção de registos a verificar foi efectuada de forma direccionada e tendo em atenção a sua relevância fiscal.
Relativamente ao exercício de 2000, a análise foi efectuada unicamente aos registos datados a partir de 19/05/2000 data em que suspendeu a caducidade do direito à liquidação nos termos do n.° 4 do art. 45.° da Lei Geral Tributária, por se tratar de retenções na fonte a título definitivo assumindo o imposto a natureza de obrigação única, conforme entendimento veiculado pela Circular n.° 12/2004 de 11/06, da DGCI.
2-2. Tipificação dos Rendimentos Pagos Sujeitos a Retenção na fonte
Após a análise aos registos e respectivos documentos de suporte seleccionados verificamos que o sujeito passivo não reteve imposto sobre a totalidade dos rendimentos pagos a entidades não residentes. Da análise efectuada resultou uma tipificação dos rendimentos e respectivo apuramento de imposto, que se encontra discriminado por entidade não residente nos mapas anexos n.°s 3 (exercido de 2000), 7 (exercício de 2001) e 11 (exercício de 2002).
Os rendimentos pagos foram tipificados em:
- IRS:
Rendimentos do trabalho independente, propriedade intelectual e da actividade de profissionais de espectáculos, previstos nas alíneas d), e), f) e o) do art. 18.° do Código do IRS, sujeitos às taxas de retenção previstas no art. 71.° do mesmo diploma.
- IRC:
Rendimentos de prestação de serviços realizados ou utilizados em território nacional, propriedade intelectual e rendimentos da actividade de profissionais de espectáculos, previstos no art. 4.°, n.° 3, c), n.°s 1, 7 e 8 do Código do IRC, sujeitos a retenção na fonte nos termos do art. 88.°, às taxas previstas no art. 80.°, n.° 2, alíneas a) e e) do mesmo diploma legal.
Refira-se que o sujeito passivo não accionou as Convenções para evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal, não possuindo certificados atestando a residência fiscal e a sujeição a Imposto sobre o Rendimento no respectivo país da entidade beneficiária, excepto para um pagamento detectado em 2000 para um residente nos EUA (cfr. mapa anexo n.° 3).
2.3. Regularização Voluntária efectuada pelo Sujeito Passivo
A informação recolhida e sistematizada nos mapas mencionados (anexos n.°s 3,7 e 11) foi fornecida ao sujeito passivo que manifestou a sua concordância e procedeu à regularização voluntária da sua situação tributaria, efectuando o pagamento do imposto apurado, antes do termo da visita, cfr. art. 58.° do RCPIT.
O imposto pago pelo sujeito passivo em resultado da acção inspectiva totalizou 400.976,41€, que a seguir se discrimina:
- EXERCÍCIO DE 2000:
1 períodoimp. em falta
POR PERÍODO
N.° DE
DECLARAÇÃO DE PAGTO
N.° DE
) COMPROVATIVO de PAGTO (cf. anexo 4)
DATA DE PAGTO (cf. anexo 5)
574.93€ IRC
391.99€ IRS
(maio966.92€800222541535610210006638002225415330/07/2004
5,528.95'EIRC
19,656.51 <E IRS
Junho25,185.46 <E 800222545955610210006648002225459530/07/2004
1,157.801EIRC
1,178.57 íEIRS
Julho2,336.37 í800222546765610210006648002225467630/07/2004
3,253.00 €IRC
422.44 €IRS
Agosto3,675.43 €800222550525610210006648002225505230/07/2004
1,989.62 €IRC
71.30 €IRS
(Setembro2,060.92 €800222550955610210006688002225509530/07/2004
309.88 €IRC
566.24 €IRS
OUTUBRO876.12 €800222552065610210006638002225520630/07/2004
84.08 €IRC
308.15 €RS
Novembro392.23 ے500222553385610210006688002225533830/07/2004
10,693.30 €lRC
34,890.64 € IIRS
Dezembro45,583.94 € 80022255567 51610210006648002225556730/07/2004
totais81,077.40 €
- EXERCÍCIO DE 2001:
períodoIMP. EM FALTA
P/PERÍODO
TIPO
IRSARC
R* DE
DECL. DE PAGTO
N.*DE
COMPROVAT. DE PAGTO fcfr.anexo 5)
DATA
DE PAGTO (cfr. anexo 9)
3,465.61RC
874.9(RS
JANEIRO4,340.5190025451570561021000668800254515701/09/2004
5,373.4<RC
450.5'RS
Fevereiro5,633.9180025451788561021000662900254517661109/2004
1.959.0CRS
MARÇO1,959.0C9002545192856102100066280025451920179/2004
1.562.0ÍRC
4,047.5:RS
ABRIL5,609.5790025455466561021000660800254554661/3/2004
1,014,60RC
4,895.71RS
MAIO5,910.301002545228256102100068000025452282179/2004
3,790.81RC
164.06RS
JUNHO3.954.8B80025452541561021000680600254525411/9/2004
9.715.57RC
21.933.69IRS
JULHO31,649.2690025452873561021000664800254526731/9/2004
145.90RC
AGOSTO145.9080025462959561021000668800254529591/9/2004
842.63RC
O.00IRS
SETEMBRO842.639002545305056102100066280025453050179/2004
10.978.57RC
18,76073RS
OUTUBRO29,747.3610025453181561021000669800254531011/9/2004
904.41RS
NOVEMBRO904.4110025453297561021000661800254532971/9/2004
3,039 34RC
O.OÍRS
3EZEM0RO3,039.84002545336056102100066960025453360179/2004
TOTAIS93,936.78
EXERCÍCIO DE 2002:
IMP.FALTAIMP.FALTAN.* DEN* DEDATA
PERÍODOPORP7T1PODECLARAÇÃOCOMPROVAT DE PAGTODÊ PAGTO
PeríodoIMP.ÍIRS7IRCDE PAGTO{CFR. ANEXO 13
4.225.4CIRC
38.04IRS
JANEIRO4.261,4480025710001561021000660600257100016-8-2004
9.814,03IRC
329.84IRS
FEVERÊIRO10.141.8760025710460561021000681600257104606-6-2004
644.15IRC
1.076.87IRS
MARÇO1.721,0280025756044561021000665800257560446-9-2004
3.462.08IRC
62.341,11IRS
ABRIL85.803,1980025711083561021000660600257110836-9-2004
4.824.15IRC
76.796.40IRS
MAIO81.620,5580025711253561021000661800257112536-4-2004
5389.17IRC
175.60IRS
JUNHO5.564,77*0025711644561021000668800257116446-9-2004
5.831.32IRC
833,35IRS
JULHO6 664,6780025711806561021000868800257116066-9 2004
1 964,41IRC
6196.58IRS
ACOSTO2.660,9980025712004561021000668800257120046-9-2004
9.003.67IRC
1.952,46IRS
SETEMBRO10.956,1360025712144561021000661800257121446-9-2004
6.945.76IRC
1.379.25IRS
OUTUBRO8.325,0160025712756561021000683800257127566-9-2004
1.017,92RC
266,03RS
NOVEMBRO1.265,9580025712629561021000662800257128296-9 2004
1.465,45RC
5.487,19RS
DEZEMBRO6.952,65MH2S712965561021000662800257128296-9-2004
TOTAIS225.962,23225 96223
VALORES TOTAIS:
EXERCÍCIOSVALORES
DECLARADOS INI CIALM ENTE
VALORES APURADOS NA INSPECÇÃOVALORES
TOTAIS
EX 200011.657.58 €01,077.40 €92.734.98 í
EX 2001(a) 29.339.49 €93,936.786123.276.27 €
EX 200230496.81 €225,962.23 €256.4S9.04 €
TOTAIS 71,493,88 €400.978.4t €472,470.29 €

a) inclui 1333.93€ de imposto retido na fonte e pago em 2001 o qual foi incluído na guia n.º ‘41012381504 do 19/2/2001, tendo sido acrescido ao valor das retenções efectuadas sobre residentes

3. Substituição da Declaração Modelo 130 actual Modelo 30) previsto no n.° 7 do artigo 119º do Código do IRS
No que respeita à obrigação declarativa prevista no n.° 7 do art 11.° do Código do 1RS, e de acordo com a Portaria n.° 438/2004 de 30 de Abril, o sujeito passivo deveria enviar, por transmissão electrónica de dados, as Declarações Modelo 30 de Substituição para os exercidos de 2000, 2001 e 2002. Contudo, não pôde fazer esse envio, uma vez que ainda não se encontra disponível no respectivo Site da Internet essa opção.
Não obstante, o sujeito passivo preencheu as Declarações Modelo 130 de Substituição, em suporte papel, para os exercícios analisados, as quais também não puderam ser aceites no Serviço de Finanças da área da sua sede, em face das orientações previstas na referida Portaria n.° 438/2004.
Anexamos as fotocópias das Declarações Modelo 130 preenchidas (anexos n.s 6, 10 e 14), mas não recepcionadas, tendo o sujeito passivo sido advertido da obrigatoriedade das Declarações Modelo 30, por transmissão electrónica de dados até 30 de Novembro de 2004.”
B. Em 09.09.2004, sobre a informação que antecede recaiu despacho de concordância - cfr. fls. 27 do PA apenso.
C. Em 15.09.2004, foi remetida, via correio registado, carta dirigida à impugnante sob o assunto “Notificação do resultado da acção inspectiva — sem correcções (artigo 61.° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária)” - cfr. fls. 25 e 26 do PA apenso.
D. Em 18.12.2007, a impugnante deduziu reclamação graciosa contra as liquidações de retenção na fonte referidas nos pontos anteriores - cfr. petição da reclamação, a fls. 2 do processo de reclamação graciosa.
E. Não foi proferida decisão relativa à reclamação graciosa referida no ponto anterior - cfr. informação do serviço de finanças do Porto 2, a fls. 3 do PA apenso.
F. Em 18.12.2007, a impugnante efectuou pedido de revisão do acto tributário, relativamente às liquidações impugnadas - cfr. artigo 5º da p.i. e informação, a fls. 173 do processo no SITAF.
G. Não foi proferida decisão relativa ao pedido de revisão de acto tributário referido no ponto anterior - cfr. artigo 6º da petição inicial e ofício da Autoridade Tributária, a fls. 169 do processo no SITAF.
H. Em 17.07.2008, foi remetida a este Tribunal a petição de impugnação que deu origem aos presentes autos - cfr. fls. 1 do processo físico.
I. Em 19.01.2011, pelo Chefe da Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa foi proferido despacho a determinar a notificação da impugnante relativamente ao projecto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa pela mesma apresentado - cfr. fls. 3 do PA apenso.
J. Durante os anos de 2000, 2001 e 2002, a impugnante efectuou os seguintes pagamentos a não residentes - facto alegado em 9º e 10° da p.i. e não impugnado e anexos n.°s 1 a 6 e documentos 2 a 7 juntos com a p.i.:
a. Rendimentos de propriedade intelectual correspondentes a aquisições de obras de arte efectuadas aos próprios artistas, no valor total de € 1.217.565,06;
b. Royalties correspondentes, fundamentalmente, à utilização de imagens para catálogos e, em casos pontuais, a fees de exposições em que houve referência específica a uma utilização de um direito de autor, no valor total de € 11.201,30;
c. Assistência técnica correspondente ao uso ou concessão do uso dos direitos de autor;
d. Rendimentos de artistas e profissionais de espectáculos no valor total de € 144.499,28;
e. Rendimentos de trabalho independente, no valor total de € 226.764,02;
f. Rendimentos de prestação de serviços, no valor total de € 451.233,88;
g. Rendimentos em espécie correspondentes aos valores de aquisição de molduras compradas pela impugnante para expor obras de arte de terceiros sempre que aquelas molduras tenham sido devolvidas no final das exposições juntamente com as obras, no valor total de € 60.568,51.
K. Em 27.06.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS/IRC e Imposto de Selo - Retenções a Não Residentes” - para o ano de 2000 -, com os n.°s 80022254153 (Maio),80022254595 Junho), 800022254676 Julho), 800022255052 (Agosto), 80022255095 (Setembro), 80022255206 (Outubro), 80022255338 (Novembro) e 80022255567 (Dezembro), no valor total de € 81.077,40, e em 30.07.2004 entregou o respectivo montante - cf. fls. 33 do PA apenso e respectivos anexos n.°s 4 e 5.
L. Em 30.07.2004, a impugnante efectuou o pagamento do imposto apurado pela Administração Tributária a título de “retenções a não residentes” relativamente ao ano de 2000 - cf. anexos 4 e 5 da “Informação” que se segue, constante do PA apenso.
M. Em 31.08.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS/IRC e Imposto de Selo -Retenções a Não Residentes” - para o ano de 2001 com os n.°s 80025451570 (Janeiro), 80025451766 (Fevereiro), 80025451928(Março), 80025455486 (Abril) 80025452282 (Maio), 80025452541 (Junho), 80025452673 (Julho), 80025452959 (Agosto),80025453050 (Setembro), 80025453181(Outubro) 80025453297 (Novembro) e 80025453360 (Dezembro), no valor total de € 93.936,78, e em 1.09.2004 entregou o respectivo montante - cf. fls. 34 do PA apenso e respectivos anexos n.°s 8 e 9.
N. Em 31.08.2004, na sequência da acção inspectiva referida, a impugnante entregou oito declarações de “Retenções na fonte de IRS/IRC e Imposto de Selo -Retenções a Não Residentes” - para o ano de 2002 -, com os n.°s 80025710001 (Janeiro), 80025710460 (Fevereiro), 80025756044 (Março), 80025711083 (Abril) 80025711253 (Maio), 80025711644 (Junho), 80025711806 (Julho), 80025712004 (Agosto), 025712144 (Setembro), 80025712756 (Outubro) 80025712829 (Novembro) e 80025712985 (Dezembro), no valor total de € 225.962,23, e em 6.09.2004 entregou o respectivo montante - cfr. fls. 35 do PA apenso e respectivos anexos n.°s 11 e 12.
O. As retenções na fonte a que se referem as declarações indicadas nos pontos anteriores foram efectuadas sobre rendimentos do trabalho independente, propriedade intelectual e actividade de profissionais de espectáculos, em sede de IRS, e sobre rendimentos de prestação de serviços, propriedade intelectual e actividade de profissionais de espectáculos, em sede de IRC - cfr. fls. 32 do PA apenso.
P. Os beneficiários dos rendimentos a que se reportam as declarações de retenção na fonte referidas nos pontos anteriores têm residência nos seguintes países: Reino Unido, Estados Unidos da América, Alemanha, Holanda, Suíça, Espanha, Suécia, Bélgica, França, Liechtenstein, Brasil, Áustria, Itália, Noruega, Croácia, Austrália, Japão e Polónia - cfr. anexos 6, 10 e 14, ao processo de inspecção, a fls. 27 do PA apenso e informação a p. 737 do processo no SITAF.
Q. Em 01.09.2004, a impugnante efectuou o pagamento do imposto apurado pela Administração Tributária a título de “retenções a não residentes” relativamente ao ano de 2001 - cfr. anexos 8 e 9 da “Informação” que se segue, constante do PA apenso.
R. Em 06.09.2004, a impugnante efectuou o pagamento do imposto apurado pela Administração Tributária a título de “retenções a não residentes” relativamente ao ano de 2002 - cfr. anexos 12 e 13 da “Informação” que se segue, constante do PA apenso.
Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos com relevância para a decisão da causa.
Motivação
A decisão da matéria de facto assentou na análise dos documentos constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, e nas posições das partes, manifestadas nos respectivos articulados. O depoimento da testemunha arrolada pela autora, corroborando a factualidade extraída dos documentos juntos aos autos, nada acrescentou em relação aos mesmos.»

Quanto à fundamentação de direito da sentença recorrida, chamá-la-emos à colação quando e na media em que pelo seu conteúdo – não pelo que alegadamente omite – relevar para a abordagem de cada questão a resolver.
Abordemos, então, as questões acima enunciadas.

1ª Questão:
É nula, a sentença recorrida, nos termos do artigo 125º nº 1 do CPPT, por não se ter pronunciado sobre a questão, de conhecimento oficioso, da caducidade da acção?

Na resposta a esta questão, que é negativa, pouco mais se logra dizer do que quer a Mª Juiz a qua quer a Recorrida já aduziram.
Em suma, se é certo que, como mui bem já expôs o MP, a caducidade do direito a impugnar judicialmente o acto tributário é de conhecimento oficioso pelo que pode e deve ser conhecida pelo tribunal, também o é que, a não ter sido alegada pelas partes, não tem de ser objecto de pronúncia expressa, a não ser que ocorra, mas nesse caso, o que ocorre com o silêncio da sentença é um erro de julgamento de direito, por tacitamente se ter deixado decidido que não ocorria.
Assim, a caducidade da acção poderá ser apreciada em sede de erro de direito, mas a falta da sua apreciação expressa, in casu, não é causa de nulidade da sentença, nulidade cuja arguição, portanto, improcede.

2ª Questão
Errou, a sentença recorrida de direito por apreciar de meritis a impugnação, apesar da caducidade da acção, pois, estando em causa, em ultimo termo, uma autoliquidação de uma retenção na fonte, a impugnação do indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto tributário tinha de ser instaurada até 2 anos a contar do termo do ano do pagamento supostamente indevido e precedida de reclamação graciosa, conforme resultaria dos artigos 131º e 132º CPPT?
A recorrente sustenta que a presente impugnação é extemporânea por, se bem entendemos, sendo o seu objecto mediato a autoliquidação de uma retenção na fonte, se lhe aplicar o regime de caducidade e de pressupostos processuais decorrente dos artigos 131º e 132º da LGT, os quais artigos passamos a transcrever na íntegra, na redacção que vigorava ao tempo do da instauração da Impugnação, isto é, ainda com o nº 2 do artigo 131º, que viria ser revogado, sem mais, pela Lei nº 82-E/2014 de 31/12:
Artigo 131.º
Impugnação em caso de autoliquidação
“1 - Em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao dirigente do órgão periférico regional da administração tributária, no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração.
2 - Em caso de indeferimento expresso ou tácito da reclamação, o contribuinte poderá impugnar, no prazo de 30 dias, a liquidação que efectuou, contados, respectivamente, a partir da notificação do indeferimento ou da formação da presunção do indeferimento tácito
3 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o prazo para a impugnação não depende de reclamação prévia, devendo a impugnação ser apresentada no prazo do n.º 1 do artigo 102.º
Artigo 132.º
Impugnação em caso de retenção na fonte
1 - A retenção na fonte é susceptível de impugnação por parte do substituto em caso de erro na entrega de imposto superior ao retido.
2 - O imposto entregue a mais será descontado nas entregas seguintes da mesma natureza a efectuar no ano do pagamento indevido.
3 - Caso não seja possível a correcção referida no número anterior, o substituto que quiser impugnar reclamará graciosamente para o órgão periférico regional da administração tributária competente no prazo de 2 anos a contar do termo do prazo nele referido.
4 - O disposto no número anterior aplica-se à impugnação pelo substituído da retenção que lhe tiver sido efectuada, salvo quando a retenção tiver a mera natureza de pagamento por conta do imposto devido a final.
5 - Caso a reclamação graciosa seja expressa ou tacitamente indeferida, o contribuinte poderá impugnar, no prazo de 30 dias, a entrega indevida nos mesmos termos que do acto da liquidação.
6 - À impugnação em caso de retenção na fonte aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo anterior.
A recorrente, talvez pelas dificuldades com que se depararia na demostração de todos os pressupostos disso, não desce ao concreto na aplicação destas normas ao nosso caso. Invoca indiscriminadamente os artigos, deixando ao intérprete da sua peça processual a eleição das normas de que eles são compostos.
Supomos que, do artigo 131º nº 1 e 2 e do artigo 132º nº 3 e 5, retira a necessidade de, em qualquer caso, a impugnação da autoliquidação ser precedida de reclamação graciosa, a apresentar dentro de dois anos após a apresentação da declaração de aurtoliquidação e ou da entrega do meio de pagamento, e bem assim que o prazo de impugnação da retenção autoliquidada é de trinta dias a contar do indeferimento expresso ou tácito da reclamação.
Segundo a Recorrente, tendo sido extemporânea a reclamação graciosa, porque apresentada mais de dois anos após a última entrega, ao fisco, do valor das retenções supostamente devidas, extemporânea teria de ser, também, a impugnação que a tinha por pressuposto processual.
Contudo, o objecto da Impugnação sub judicio não é, formal e imediatamente, a autoliquidação das retenções na fonte, nem mesmo uma hétero-liquidação feita a posteriori pela AT, nem, ainda, o indeferimento tácito da reclamação graciosa efectivamente apresentada, se não o indeferimento, in casu tácito, de um pedido de revisão oficiosa do acto tributário das sobreditas autoliquidações, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 78º e 95º nº 2 alª d) da LGT.
Ora, para uma impugnação judicial com esse objecto, posto que a Lei não prevê um especial, o prazo não pode ser outro se não o previsto no nº 1 do artigo 102º do CPPT, isto é, 90 dias, e conta-se, conforme a alínea d) do mesmo nº 1, desde a formação do acto tácito a impugnar.
É certo que a recorrente alega que também o acto tácito de indeferimento do pedido de revisão tinha de ser impugnado no prazo decorrente do artigo 132º acima transcrito, mas não diz o que quer que seja em abono disso.
Vejamos, portanto, qual era o prazo de caducidade do direito a instaurar a presente impugnação judicial.
Nos termos o artigo 78º nº 1 da LGT, “1 - A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável ao serviço”.
Tem-se entendido que o contribuinte tem direito a suscitar, ele mesmo, a iniciativa da Autoridade tributária, dentro do prazo de 4 ano referido neste número, o que é uma decorrência lógica do princípio da legalidade da actuação da Administração.
Isto mesmo é hoje em dia suposto pelo Legislador ao consagrar, no nº 7 do mesmo artigo 78º, a interrupção do prazo de revisão oficiosa por força do pedido dessa revisão, apresentado pelo contribuinte.
Assim, em regra, o contribuinte tem 4 anos, a contar da liquidação, para requerer a revisão oficiosa em caso de qualquer ilegalidade que ocorra na liquidação, seja no seu an seja no seu quantum. Desde que apresentado nesse prazo, tal pedido interrompe o prazo de 4 anos em que a Administração deve rever o acto tributário que tenha sido ilegal.
A autoliquidação e o pagamento das retenções relativas ao ano de 2000 (os mais remotos) ocorreram em 30/7/2004).
O Requerimento de revisão oficiosa das retenções na fonte sub judicio foi entregue em 18/12/2007, isto é, dentro dos 4 anos posteriores, em tempo, portanto.
Contudo, não é a temporaneidade deste pedido gracioso que está em causa, mas sim a da impugnação “contenciosa” do indeferimento (tácito) do pedido gracioso.
Para esta impugnação judicial ser temporã basta que tenha sido apresentada nos 90 dias seguintes à formação do acto tácito de indeferimento daquele pedido gracioso. A eventual extemporaneidade do pedido de revisão – mero reflexo do esgotamento do período em que a revisão oficiosa poderia ocorrer – essa, apenas pode relevar com fundamento substantivo do indeferimento desse pedido.
Assim:
O Requerimento de revisão oficiosa das retenções na fonte sub judicio, como dissemos, foi entregue em 18/12/2007.
Nos termos do artigo 57º da LGT, na versão em vigor ao tempo da apresentação do pedido de revisão oficiosa – a resultante de sucessivas alterações até às introduzidas pela nº Lei 53-A/2006 de 29/12: “- O procedimento tributário deve ser concluído no prazo de seis meses, devendo a administração tributária e os contribuintes abster-se da prática de actos inúteis ou dilatórios” (nº 1) e “Sem prejuízo do princípio da celeridade e diligência, o incumprimento do prazo referido no n.º 1, contado a partir da entrada da petição do contribuinte no serviço competente da administração tributária, faz presumir o seu indeferimento para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial”.
Portanto, o acto tácito de indeferimento formou-se em 19/6/2008.
A PI destes autos deu entrada em juízo menos de um mês depois dessa data – 17 de Julho de 2008, bem dentro dos 90 dias mencionados no artigo 102º do CPPT.
Pelo exposto, a sentença recorrida não errou ao julgar reunidos os pressupostos processuais para apreciar o mérito da impugnação, designadamente o requisito da tempestividade, pelo que o recurso, com base nesta alegação, improcede.

3ª Questão
A sentença recorrida fez indevida aplicação dos artigos n.º 46.º n.º 2 e 48º n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31.12, conjugados com o artigo 132.º do CPPT, pois, atenta a sua caducidade, a pendência da impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa das retenções na fonte não habilitava a Impugnante a beneficiar da retroactividade da desnecessidade de especial prova documental da residência fiscal, consagrada por aquelas normas.
Como vimos, a impugnação é tempestiva, o que prejudica a apreciação desta questão.

4ª Questão
De qualquer modo, a sentença recorrida errou na apreciação da prova, por não ter dado como provado um facto relevante, designadamente, que a impugnante apresentou alguns certificados de residência fiscal no respectivo país estrangeiro?

Seguramente, atentas as alegações e as conclusões do recurso, não será contra um erro na apreciação da prova que a Recorrente efectivamente se quer, aqui, insurgir, aliás, não concretiza factos nem meios de prova. Pelo contrário, afirma que não quer “colocar em crise a matéria de facto dada como provada”.
Supomos que a Recorrente, no encalço de abundantes doutrina e jurisprudência nesse sentido, pretendia invocar outrossim erro no julgamento de facto, consistente na falta de especificação, como provado, de um facto tido por importante para a decisão da causa, a saber: que a Impugnante “dispunha ou apresentou alguns certificados de residência fiscal dos beneficiários dos rendimentos pagos” – cf. artigo 48 das alegações de recurso – com base na junção dos quais, a estes autos, fez o pedido subsidiário de serem anuladas liquidações no valor de 292 183,29 € - artigo 49 das alegações.
Vejamos se e com que qualificação jurídica procede esta alegação.
Não vemos como qualificar como erro de julgamento o que não é mais do que silêncio, antes propendemos para qualificar este vício da sentença como nulidade da mesma, conforme artigos 125º nº 1 do CPPT, se bem que parcial e suprível.
Vejamos:
Nos termos do artigo 123º nºs 1 e 2 do CPPT:
1 - A sentença identificará os interessados e os factos objecto de litígio, sintetizará a pretensão do impugnante e respectivos fundamentos, bem como a posição do representante da Fazenda Pública e do Ministério Público, e fixará as questões que ao tribunal cumpre solucionar.
2 - O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.
As causas de nulidades da sentença em processo tributário estão previstas no artigo 125º nº 1 do CPPT:
1 - Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.
Onde esta norma for auto-suficiente no seu dispositivo, a norma do CPC que enuncia as causas de nulidade da sentença em processo civil não é subsidiariamente aplicável.
Como assim, o critério da nulidade ou não da sentença tributária por, alegadamente, não especificar os fundamentos de facto que fundamentam a decisão reside, à partida, no artigo 125º do CPPT citado, e não no artigo 615º do CPC.
O mesmo já não sucede com a norma do CPPT que enuncia o objecto da sentença (123º). Com efeito, este dispositivo, ao omitir qualquer referência à estrutura da sentença e uma delimitação exaustiva do objecto da pronúncia do juiz, remete o intérprete para o artigo 608º nº 2 do CPC, ex vi artigo 2º do CPPT.
No presente caso o intérprete não é reenviado para o CPC, pois o elemento da estrutura da sentença cuja falta é alegada está directamente previsto no nº 2 do artigo 123º acima transcrito.
É de notar, a propósito da interpretação desta norma, que em processo tributário não existe a cisão entre decisão de facto e decisão de direito que existia no código de processo civil que vigorou até 2013, nem, consequentemente, a prévia fixação dos factos assentes, de modo que não pode haver reclamação das partes na selecção da matéria de facto pertinente para discussão e a decisão da causa. Esta peculiaridade do processo tributário face ao civil, que, entretanto, com a aprovação do novo CPC, deixou de acontecer, requer do julgador o maior cuidado em trazer para a discriminação de factos provados e não provados todos os factos alegados e relevantes para a decisão da causa – não apenas os que interessam às suas abordagem e resolução do litígio.
Como vimos, dispõe o artigo 123º nº 2 do CPPT que na sentença tributária o juiz “discriminará a matéria provada da não provada, fundamentando as decisões”.
Matéria provada e não provada a discriminar haverá de ser, logicamente, aquela que, alegada pelas partes, releva para a discussão da causa em qualquer das soluções plausíveis do litígio, designadamente as sustentadas pelas partes, mas não só, também aquela que, de natureza instrumental ou complementar tiver resultado da discussão da causa e sobre os quais tenha sido acautelado o devido contraditório (cf. artigo 5º do CPC).
Não se diga que basta a menção dos factos provados se estes são suficientes para a solução preconizada pelo tribunal e, quando muito, dos não provados cuja não prova releve para a mesma solução.
Na verdade, se o direito ao contraditório é um direito processual que se filia num direito liberdade e garantia constitucional (artigo 20º nº 1 da Constituição) é dever do juiz pronunciar-se sobre a prova ou não prova de todos os factos alegados e relevantes, ainda que só para a solução do litígio preconizada por uma parte, de modo a que as partes possam exercer o contraditório e a apelação também quanto à solução jurídica por si preconizada para o litígio.
Esta afirmação pede, contudo, um grano salis: quando da prova de um facto, devidamente fundamentada, resulta logicamente a não prova de outro, também ele alegado, o que sucede, verdadeiramente, é haver pronúncia, tácita, mas clara, e até fundamentada, pela não prova deste, não sendo, assim, indispensável, para cumprir com a artigo 123º citado, uma expressa referência à sua não prova.
Se assim é, isto é, se está em causa a garantia do contraditório e do processo equitativo, então, em princípio, padece de nulidade a sentença que deixe de discriminar, como provados ou não provados, quaisquer factos que integravam a causa de pedir ou a contestação ou que resultaram da discissão da causa, nas condições do citado artigo 5º do CPC), e que eram relevantes para a tese sustentada por uma parte.
Nesta matéria a nulidade existirá mesmo que a falta de indicação dos factos provados e não provados seja meramente parcial. Neste sentido se pronuncia o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa em anotação ao artigo 125º do CPPT, no seu CPPT anotado, 6ª edição, II volume, pág. 360:
8 - Omissão ou deficiência parcial na indicação da matéria de facto
Como se deduz do que ficou referido, quanto à falta de indicação da matéria de facto provada ou deficiência, obscuridade ou contradição, a nulidade existirá mesmo que se trate de uma omissão ou deficiência parcial.”
Bem se compreende que assim seja, pois sem uma decisão sobre determinado ou determinados factos que alegou e que são relevantes para a solução de direito, plausível, que sustentou a sua petição ou a sua oposição, não pode a parte pugnar por elas, designadamente mediante recurso, ou até conformar-se racionalmente com veredicto do tribunal.
Sem embargo de tudo o que vai dito – last but not least – atentos os poderes conferidos ao tribunal de apelação pelo, hoje, artigo 662º do CPC, essas omissões ou deficiências quanto à matéria de facto provada e não provada não serão causa de anulação da sentença sempre que forem supríveis nos termos ali dispostos (cf. infra).
Voltando ao caso concreto, vejamos se, ante os critérios acima delineados, está em falta a especificação, como provado, que a Impugnante “dispunha ou apresentou alguns certificados de residência fiscal dos beneficiários dos rendimentos pagos”, com base na junção dos quais fez o pedido subsidiário de serem anuladas liquidações no valor de 292 183,29 €.
Para estar em falta a apreciação discriminada da sua prova é necessário, antes de mais, que, mesmo que não literalmente alegados, tais factos sejam redutíveis à alegação constitutiva da causa de pedir, veiculada pela Petição Inicial.
Passada tal peça em revista, verifica-se que no artigo 39º da PI a Impugnante alegou que só subsequentemente obtivera alguns de tais documentos das autoridades respectivas e que a formulação do pedido contém efectivamente o pedido subsidiário de serem anuladas as liquidações correspondentes aos sujeitos passivos substituídos a que se reportavam esses certificados, computadas em 292 183,29 €.
Ora a procedência do pedido subsidiário era uma das soluções plausíveis para a causa, pelo que se impunha, efectivamente a menção – como provado – desse facto.
Assim sendo, a omissão da selecção do mesmo na matéria de facto provada e relevante foi indevida e em princípio conforma uma nulidade parcial da sentença (eventualmente suprível, como vimos).
Mas terá a Impugnada legitimidade para arguir esta nulidade?
É que – artigos 196º e 197º e 615º do CPC – a nulidade da sentença que não consista na falta de assinatura não é conhecida oficiosamente, tem de ser arguida pelo interessado, isto é, não por qualquer parte, mas pela parte interessada.
Será a Demandada AT interessada, para estes efeitos, quando é certo que o que está em causa é a omissão de um facto que interessava à Impugnante, enquanto causa de pedir do pedido subsidiário?
Pensamos que sim.
Atento o vencimento do pedido principal, a selecção dos factos fundamento do pedido subsidiário deixou de interessar actualmente à Impugnante, mas interessa-lhe potencialmente, desde logo em caso de recurso da Impugnada, mas não deixa de interessar também a esta última, ora Recorrente, por a procedência do pedido subsidiário ser preferível a uma procedência do principal.
Assim, impõe-se a este Tribunal de Recurso julgar que, efectivamente, a sentença recorrida padece da nulidade (no caso, parcial) prevista no artigo 125º nº 1 do CPPT, por falta de descriminação de um facto provado e relevante para a decisão da causa.
Porém:
Nos termos do artigo 662º nº 1 do CPC o Tribunal de Apelação deve alterar a decisão recorrida sobre a matéria de facto se se impuser decisão diversa.
Por sua vez, o nº 2 alª c) do mesmo artigo dispõe que a Relação deve “c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;”
Da conjugação destas normas resulta que a nulidade, parcial, da falta de indicação discriminada de factos provados e ou não provados necessários para o julgamento da causa só tem como efeito a anulação da decisão da primeira instância se não for possível à 2ª instância, atenta a prova produzida, suprir essa invalidade mediante a alteração da decisão em matéria de facto nos termos da primeira delas.
Ora, o facto cuja referência a sentença recorra omite não é sequer um facto controvertido e está provado documentalmente.
Aditamento à matéria de facto provada
Como assim, impõe-se alterar a decisão em matéria de facto, acrescentando-lhe o sobredito facto, nos seguintes termos:
S. Entretanto, subsequentemente aos pagamentos supra-referidos, a Impugnante obteve os certificados de residência de alguns dos sujeitos passivos substituídos, o valor de cujas retenções pagas totalizava 292 183,29 €.
Cf. docs 1 e 2 juntos coma PI.
Julgada a procedência, ainda que com diversa qualificação jurídica, da alegação de falta, na discriminação dos provados e não provados, de facto relevante para a decisão; e alterada a decisão da matéria de facto no sentido de se lhe acrescentar a discriminação, como provado, do sobredito facto, prossigamos para a abordagem da questão seguinte, que a pressupunha.

5ª Questão
Em consequência do vício objecto da anterior questão, a sentença recorrida errou de direito por ter anulado todas as liquidações e não apenas aquelas relativamente a cujos sujeitos passivos substituídos a Impugnante apresentou certificados de residência fiscal no respectivo país estrangeiro?
Relava para esta questão o seguinte excerto da sentença recorrida:
Importa começar por aferir se pode ou não pode a Administração Tributária e Aduaneira exigir que a prova da residência fiscal de beneficiários de pagamentos se faça por via de certificado de residência, de modo a accionar as convenções para evitar a dupla tributação celebradas por Portugal com cada um dos países de residência dos beneficiários dos pagamentos.
No que à retenção na fonte de IRS diz respeito, lê-se no artigo 91.°, n.° 1, do CIRS (redacção em vigor até à dada pela Lei n.° 30-G/2000, de 29.12) que “(...)a entidade devedora dos rendimentos sujeitos a retenção na fonte é obrigada, no acto do pagamento, do vencimento, ainda que presumido, da sua colocação à disposição, da sua liquidação ou do apuramento do respectivo quantitativo, consoante os casos, ou, tratando-se de comissões devidas pela intermediação na celebração de quaisquer contratos, no acto do seu pagamento ou colocação à disposição, a deduzir-lhes as importâncias correspondentes à aplicação das taxas neles previstas por conta do imposto respeitante ao ano em que esses actos ocorrem''.
Com a reforma levada a cabo com a Lei n.° 30-G/2000, de 29.12, este artigo 91.°, n.° 1, passou a prever que (...)a entidade devedora dos rendimentos sujeitos a retenção na fonte é obrigada, no acto do pagamento do vencimento, ainda que presumido, da sua colocação à disposição, da sua liquidação ou do apuramento do respectivo quantitativo, consoante os casos, a deduzir-lhes as importâncias correspondentes à aplicação das taxas neles previstas por conta do imposto respeitante ao ano em que esses actos ocorrem”, cuja norma, com a renumeração implementada pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 03.07, passou a estar prevista no artigo 98.°, n.° 1.
As taxas de retenção na fonte a que estão sujeitos os rendimentos auferidos por não residentes são as taxas liberatórias previstas no artigo 74.° do CIRS (antes da remuneração do código, aprovada pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 3.07), e no artigo 71.° (após esta remuneração), que prevê a taxa de retenção na fonte de 25% para rendimentos de trabalho independente e a taxa de retenção na fonte de 15% para rendimentos da propriedade intelectual [cfr. n.° 2, alínea c) e n.° 4, alínea c), respectivamente].
O Decreto-Lei n.° 80/2003, de 23.04, aditou, com produção de efeitos reportada a 01.01.2003, dois novos capítulos ao Decreto-Lei n.° 42/91, de 22.01 (que estabelecia, à data, o regime de retenção na fonte em sede de IRS), passando o artigo 18.° a ter o seguinte teor:
“Dispensa de retenção e reembolso
1 Não existe obrigação de efectuar a retenção na fonte de IRS, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no artigo 71.º do Código do IRS quando, por força de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente do outro Estado contratante não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada;
2 Nas situações referidas no número anterior, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova, perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais que resultem de convenção destinada a evitar a dupla tributação, consistindo na apresentação de um formulário de modelo aprovado por despacho do Ministro das Finanças, certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência.
3 Quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
4 O sujeito passivo não residente, quando não tenha efectuado a prova no prazo referido no número anterior, pode requerer à Direcção-Geral dos Impostos o reconhecimento dos benefícios resultantes de convenção destinada a evitar a dupla tributação e solicitar o reembolso, no todo ou em parte, do imposto retido na fonte, no prazo de dois anos a contar da data da verificação do facto gerador do imposto, mediante apresentação de formulário de modelo aprovado por despacho do Ministro das Finanças
No que se refere ao IRC, O artigo 75.° (antes da remuneração do código, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3.07), e o artigo 88° (após a remuneração) estabelecem a obrigação de retenção na fonte dos “rendimentos provenientes da propriedade intelectual ou industrial e bem assim da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico” [n.° 1, alínea a], rendimentos referidos na alínea d) do n.° 3 do artigo 4o obtidos por entidades não residentes em território português, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à actividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade[n.° 1, alínea f)], “rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com excepção dos relativos a transportes, comunicações e actividades financeiras[n.° 1, alínea g)], sendo as taxas de retenção a que estão sujeitos as previstas para efeitos de retenção na fonte de IRS, relativas a residentes, nos termos do n.° 4 dos artigos em referência.
Quanto à dispensa de retenção na fonte de IRC, pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 03.07, a mesma estava prevista no artigo 76.° do CIRC (antes da remuneração do código, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3.07) e no artigo 90.° (após a remuneração), ao qual foi aditado o n.º 2 pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3.07, segundo o qual “[não existe ainda obrigação de efectuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, quando os sujeitos passivos beneficiem de isenção total ou parcial relativa a rendimentos que seriam sujeitos a essa retenção na fonte, feita que seja a prova, pelos sujeitos passivos, perante a entidade pagadora, da isenção de que aproveitam'
Com a Lei n.° 32°-B/2002, de 30.12 (Lei de orçamento de estado para 2003), este artigo 90°, com o aditamento dos n.°s 3, 4 e 5, passou a ter a seguinte redacção:
2 - Não existe ainda obrigação de efectuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no n.° 1 do artigo 88.°, quando os sujeitos passivos beneficiem de isenção total ou parcial ou, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente do outro Estado contratante não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.
3 - Nas situações referidas no número anterior, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação, consistindo neste último caso, na apresentação de um formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência.
4 - Quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
5-0 sujeito passivo não residente, quando não tenha efectuado a prova no prazo referido no número anterior, pode requerer à Direcção-Geral dos Impostos o reconhecimento dos benefícios resultantes de convenção destinada a eliminar a dupla tributação e solicitar o reembolso do imposto retido na fonte, no prazo de dois anos a contar da data da verificação do facto gerador do imposto, mediante apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças.”
Importa considerar a evolução normativa reguladora desta matéria, sendo evidente que nos anos de 2000, 2001 e 2002 as normas que disciplinavam o regime de retenção na fonte de IRS e de IRC não impunham um formalismo específico para prova dos pressupostos de que dependia a dispensa de retenção na fonte, mormente no que respeita à dispensa prevista em das Convenção para Evitar a Dupla Tributação, nem, tampouco, que a prova da não residência em Portugal tivesse que ser efectuada por via de um Certificado de Residência.
É certo que para que a entidade pagadora de rendimento não proceda à retenção na fonte a que está, à partida, obrigada é necessário que o beneficiário do mesmo invoque a sua qualidade de não residente para beneficiar da respectiva Convenção para Evitar a Dupla Tributação aplicável, devendo, para tal, a entidade pagadora munir-se dos elementos necessários que permitam aferir a residência alegada, sob pena de ser responsabilizada pelas quantias não retidas indevidamente, à luz do artigo 28.° da LGT.
No entanto, apenas com o aditamento do artigo 18.° ao Decreto-Lei n.° 42/91, de 22.01, em sede de IRS, e com a alteração ao artigo 90.° do CIRC, em sede e IRC, pela Lei n.° 32-B/2002, de 30.12 (Lei de orçamento de estado para 2003) - ambas em vigor a partir de 01.01.2003-, é que a lei interna passou a exigir que a prova da residência da verificação dos pressupostos de cada uma das convenções fosse efectuada através de um formulário de modelo aprovado pelo Ministro das Finanças, certificado pelas autoridades de residência do beneficiário do pagamento, sob pena do substituto tributário ficar obrigado à entrega do imposto não retido.
Conclui-se, portanto, que até àquelas alterações legislativas a lei admitia a prova de residência no estrangeiro das sociedades beneficiárias de rendimentos em Portugal por outros meios que não os formulários aprovados pela Administração Tributária portuguesa, expressando que não devem tais formulários constituir o único meio de prova necessário para certificar a sua residência. Neste sentido, no que ao IRC diz respeito, o entendimento vertido no Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 20.01.2016, processo n.° 01479/13 In www.dgsi.pt., segundo o qual, “[s]ó com a redacção introduzida pela Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro na norma do n.° 3 do artigo 90° do CIRC, é que passou a ser obrigatório que o devedor fizesse prova dos requisitos formais, sob pena de não obtenção dos benefícios previstos em matéria de tributação de IRC, designadamente o da retenção, pelo substituto tributário, ser feita por valores inferiores aos da taxa normal’’.
Descendo aos autos, constata-se que as autoliquidações de retenção na fonte de IRS e IRC dos anos de 2000, 2001 e 2002 resultaram da regularização voluntária da impugnante efectuada no âmbito de procedimento inspectivo a que foi sujeita. Extrai-se também da matéria provada que tal regularização voluntária resultou da verificação, por parte do serviço de inspecção tributária, de que a impugnante não reteve o imposto sobre a totalidade dos rendimentos pagos a entidades não residentes, sem que tenha accionado as Convenções para Evitar a Dupla Tributação, não possuindo Certificados atestando a residência fiscal e a sujeição a Imposto sobre o rendimento no respectivo país de residência da entidade beneficiária.
Não está em causa nos presentes autos, portanto, o estatuto de não residente dos beneficiários dos pagamentos em questão, efectuados pela impugnante porquanto a própria Administração Tributária verificou, em face das diligências pela mesma encetadas, que os beneficiários dos pagamentos em questão não são residentes em Portugal, mas sim residentes nos respectivos países elencados nos mapas de trabalho por ela elaborados. Isto é, as declarações de autoliquidação de retenção na fonte de IRS e IRC em questão foram apresentadas em consequência do entendimento do serviço de inspecção tributária da exigência formal de posse de Certificado de Residência que atestasse o estatuto de não residente dos beneficiários dos pagamentos efectuados, extraindo daí a conclusão de que não foram accionadas as Convenções para Evitar a Dupla Tributação celebradas por Portugal com cada um dos países de residência em questão, não obstante ter concluído pela não residência em Portugal dos beneficiários dos pagamentos de rendimentos a que se referem as autoliquidações de retenção na fonte impugnadas.
Todavia, o que decorre do quadro legal exposto é que apenas a partir de 01.01.2003 os certificados de residência modelo aprovado pelo Ministro das Finanças passaram a ser exigidos como meio ad substantiam para prova do estatuto de residência do beneficiário do pagamento e, assim, uma condição de aplicação das convenções para evitar a dupla tributação.
Uma vez que, aquando a realização dos pagamentos dos rendimentos aqui em questão - nos anos de 2000, 2001 e 2002 -, não era exigida a posse dos referidos certificados para activar as convenções para evitar a dupla tributação, resta concluir pela ilegalidade das autoliquidações de retenção na fonte impugnadas, na exacta medida em se fundaram na falta de posse de tais certificados e, em consequência, não levaram em linha de conta o disposto nas Convenções para Evitar a Dupla Tributação aplicáveis, quer quando estas excluem a competência tributária a Portugal, quer quando prevêem a sua competência cumulativa com o estado de residência do beneficiário do pagamento, por via de redução da taxa de imposto aplicável.
Em face da ilegalidade das liquidações impugnadas, procede a presente impugnação, impondo-se a sua anulação e o reembolso à impugnante das quantias pagas a tal título.»

Subjacente ao modo como a presente questão vem enunciada, está o entendimento da Recorrente, de que a prova da não residência fiscal e da residência fiscal no país outorgante de convenção para evitar dupla tributação tinha que ser feita pelo beneficiário do rendimento e entregue ao sujeito passivo pagador do rendimento, até ao vencimento do crédito, sem o que o pagador deveria fazer de todo o modo a retenção (e se não a fizesse seria responsável por ela nos termos do artigo 28º da LGT), mas, se obtido, o comprovativo, a posteriori, sempre teria direito à devolução das retenções feitas, o que teria acontecido com a exibição, a posteriori, dos “certificados de residência”, melhor, dos formulários a que se referem as normas acima transcritas, na versão em vigor após 1 de Janeiro de 2003.
Porém, a Mª Juiz a qua entendeu que, já que até 1 de Janeiro de 2003, atentos os termos, de então, das transcritas normas, a qualidade de residente em país quejando não tinha que ser feita pelo meio de prova legal, que designou como “meio ad substantiam”, supostamente exigido pelas novas redacções dos artigos 90º nº 3 do CIRC e 18º do DL nº 42/91, de 22.01 (que estabelecia o regime de retenção na fonte em sede de IRS); e uma vez que, no próprio procedimento inspectivo, haviam sido verificadas, pela AT as residências fiscais dos beneficiários nos respectivos países, então estava feita a prova necessária para não ser devida a retenção na fonte relativamente aos exercícios em causa – 200 a 2002.
As liquidações mediatamente aqui em causa foram feitas pelo próprio substituto tributário, portanto não têm nem carecem de ter fundamentação. Sabemos, contudo, que foram de facto determinadas, no seu an e no seu quantum, pela AT, a qual entendeu serem devidas ante a não exibição, pela inspeccionada, de qualquer comprovativo da residência em país estrangeiro “convencionado” (hoc sensu), com o que não teria sido activada a respectiva convenção.
Note-se, não decorre dos factos provados, designadamente do teor do RIT, que a AT exigiu como única prova o formulário que viria a ser preconizado de 2003 em diante. Apenas exigiu que a Impugnante, enquanto potencial substituto tributário, detivesse prova das residências fiscais.
A questão que está em causa, portanto, consiste apenas em saber se, sendo, em 2000, 2001 e 2002, legalmente exigido ao substituto tributário, para não ter de efectuar a retenção na fonte, obter do beneficiário do rendimento uma (qualquer) prova da sua residência fiscal no país convencionado, a sua responsabilidade como substituto tributário nos termos do artigo 28º da LGT fica excluída se no procedimento de inspecção (ou outro) a AT vem a apurar por si mesma as residências fiscais dos beneficiários nos respectivos países convencionados.
Entendemos que a resposta certa é a afirmativa.
Desde logo, ao não exigir um meio de prova legal, mas apenas que os beneficiários fizessem uma qualquer “prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais que resultem de convenção”, o legislador de antes de 2003 deixava em aberto a possibilidade de a dita prova não ser um documento que se exigisse ficar definitivamente na posse daquela entidade.
Depois: não se tratando de “prova legal”, a prova a exibir pela entidade pagadora dos rendimentos é meramente o meio para se atingir o fim que é o conhecimento da veracidade do facto com relevância tributária que é a residência fiscal em determinado país convencionado. De maneira que, obtida ex officio, pela AT, a verdade do facto tributariamente relevante, não lhe restava outro caminho senão o de seguir o princípio da legalidade da sua actuação, isto é, aplicar a esse facto, adquirido como verdadeiro, o disposto nos citados artigos 18º nº 1 do DL nº 42/91 e 90ºnº 2 do CIRC, por força dos quais não havia lugar a retenção na fonte.
Bem andou, portanto, a sentença recorrida em julgar ser indevido o pagamento das retenções sub juditiio, e em anular a totalidade das mesmas.

6ª Questão
Em todo o caso, errou, a sentença recorrida, em matéria de direito, ao julgar procedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, pois, tratando-se de um pedido de revisão de uma autoliquidação – não de uma liquidação adicional feita pela AT – só se poderia atribuir o erro aos serviços da AT se o contribuinte tivesse seguido, na liquidação, orientações genéricas da AT – cf. artigo 43º nº 2 da LGT – o que não foi o caso?
A fundamentação de direito da sentença recorrida, no que a esta questão diz respeito, é redutível à seguinte citação:
«Peticiona ainda a, impugnante, “juros legais” sobre a quantia a restituir, estando em causa o seu direito a juros indemnizatórios. Efectivamente, versando sobre os efeitos de decisão favorável ao contribuinte, o artigo 100.° da LGT preceitua que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
Os juros indemnizatórios visam a reparação do prejuízo sofrido pelo contribuinte que pagou imposto a mais do que o legalmente devido, presumindo-se o montante desse mesmo prejuízo.
Determina o n.° 1 do artigo 43.° da LGT que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido. ” Dispõe ainda o n.° 3 do artigo 61.° do CPPT que “Os juros serão contados desde a data do pagamento do imposto indevido até à data de emissão da respectiva nota de crédito. De tais normativos decorre que há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios em caso de procedência de impugnação judicial de liquidação sempre que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes dois requisitos: (i) Ter sido pago o imposto liquidado; e (ii) Ter havido erro imputável aos serviços na liquidação de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido. Tal erro pode ser de facto ou de direito mas abrange apenas os vícios substantivos (e não os vícios de forma do acto tributário), ou seja, os vícios respeitantes à relação jurídica tributária que tenham implicado a lesão de uma situação jurídica subjectiva (um prejuízo), consubstanciada na imposição ao contribuinte da efectivação de uma prestação patrimonial não admitida pelas normas fiscais substantivas.
(…)
No caso, assentando a autoliquidação impugnada em entendimento que se conclui agora ser desconforme com a lei, estamos perante erro gerador do pagamento de juros indemnizatórios, circunstância esta que, aliada à restituição do imposto pago correspondente à liquidação por parte da impugnante, confere a esta o direito a juros indemnizatórios sobre a quantia paga desde a data do respectivo pagamento e até à emissão da respectiva nota de crédito, sendo a Fazenda Pública condenada no respectivo pagamento, à taxa legal, nos termos do disposto nos artigos 43.°, n.° 4, e 35.°, n.° 10, da LGT».
A recorrente arrima-se no disposto no artigo 43º nº 2 da LGT e no facto de se tratar de autoliquidações, para sustentar não serem devidos por si juros indemnizatórios.
O teor da norma invocada é o seguinte:
“2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.”
Convimos em que uma autoliquidação nem por o ser deixa de ser uma liquidação feita com base em declarações do contribuinte, pelo que é subsumível a esse conceito ali verbalizado.
Porém, a Recorrente labora numa falácia que é denunciada pela presença, na primeira oração das que compõe aquele dispositivo, do advérbio “também”. Quer dizer, se também se considera ser devida a erro dos serviços a liquidação feita com base em declaração do contribuinte quando este tiver seguido orientação genéricas da Administração Tributária, então também são concebíveis outros casos de erro imputável aos serviços. Não se pode encontrar na norma do nº 2 a disposição de que nas liquidações quejandas o erro resultante do seguimento de instruções genéricas da Administração Tributária poderá ser imputável aos serviços para efeitos do direito a juros indemnizatórios por parte do contribuinte. Designadamente, poderão relevar, nos termos do nº 1 do mesmo artigo, tantas situações concretas quantas aqueles em que ocorrer um nexo de causalidade adequada entre uma actuação errónea e culposa da Administração (mesmo que só por “faute du service”) e uns liquidação e pagamento indevidos.
As autoliquidações cuja anulação o acto tácito aqui impugnado indeferiu foram efectuadas na pendência de uma inspecção tributária e sugeridas pela Inspecção, conforme resulta do facto provado “A” da sentença recorrida, mais concretamente no ponto 2.3 do capítulo III da informação aí transcrita.
É, portanto, patente o nexo de causalidade entre o pagamento indevido e um erro da AT. Quanto à culpa do serviço, a mesma é inerente à ilegalidade das liquidações.
Como assim, são devidos juros indemnizatórios desde o dia de cada pagamento, nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT, conforme o dispositivo da sentença recorrida.

Conclusão:
Do exposto resulta a total improcedência do recurso, devendo manter-se todo o dispositivo da sentença recorrida, com a presente fundamentação.

IV – Custas
A Recorrente pediu, nas alegações de recurso, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do nº 7 do artigo 6º do Regulamento das custas processuais.
Entendemos que se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso à luz do disposto nas normas invocadas, uma vez que as questões a decidir no recurso não se afiguraram particularmente complexas, a conduta processual das partes não é merecedora de qualquer censura e o concreto valor das custas a suportar pela parte vencida se afiguraria (não havendo dispensa do pagamento do remanescente) algo desproporcionado.
As custas (do presente recurso) ficam a cargo da Recorrente AT, conforme decorre do artigo 527º do CPC.

V- Dispositivo

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em julgar improcedente o recurso, mantendo o dispositivo da sentença recorrida, com a presente fundamentação.

Custas (do recurso) pela Recorrente, dispensando-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Porto, 17/2/2022

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina Santos da Nova
Cristina Travassos Bento
______________________________________

i) Querer-se-ia dizer “2007”.

ii) In www.dgsi.pt.