Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00660/13.2BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/17/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:CENTROS INSPECÇÃO VEÍCULOS, PRAZOS PROCEDIMENTAIS, ORDENADORES, LICITUDE, DIREITO INDEMNIZAÇÃO
Sumário:1 . A circunstância do IMT não ter observado certos prazos procedimentais, de cariz meramente ordenador ou disciplinador, não envolve uma ilegalidade traduzível em omissão ilícita, geradora de responsabilidade civil.

2 . Não se podendo asseverar que o acto administrativo – enquanto aplicável aos procedimentos concretos em curso – possa ofender quaisquer princípios sejam eles a nível constitucional ou sub constitucional, ou seja, legais, inexiste o requisito cumulativo ilicitude para verificação e positivação da responsabilidade civil extracontratual.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:N., LDA
Recorrido 1:INSTITUTO da MOBILIDADE e dos TRANSPORTES
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Condenação à Prática Acto Devido (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . N., L. da", com sede no (...) inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 14 de Julho de 2021, que julgou improcedente a acção administrativa especial instaurada contra o (i) INSTITUTO da MOBILIDADE e dos TRANSPORTES, IP", (ii) MINISTÉRIO da ECONOMIA e do EMPREGO e contra o (iii) ESTADO PORTUGUÊS (estes, entretanto, em sede de audiência prévia, absolvidos da instância) - onde peticionava:
--- a título principal:
a) Que fosse reconhecido e declarado que o Réu IMT não celebrou o contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...) no prazo legalmente estipulado;
b) Que fosse reconhecido e declarado que a A. tem direito a que seja celebrado o contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...), em virtude de a sua candidatura ter sido admitida e aprovada e de ser o único candidatura que fora apresentada;
c) Que fossem condenados os dois primeiros Réus a proceder à celebração do contrato de gestão com a A. para a abertura do centro de inspecções em (...), tanto mais que a sua situação não é subsumível à provisão do nº 1 do artº 4º do Dec. Lei 26/2013 e, se o fosse, tal preceito era materialmente inconstitucional;
d) Anulada a decisão que, em 27 de Fevereiro de 2013, declarou anulado o procedimento de candidatura à celebração do contrato de gestão para o Centro de Inspecções de (...);
e) que sejam condenados os Réus a indemnizar a A. pelos danos sofridos até à presente data em consequência da não celebração do contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...), no montante de 70.461,13 € e dos que ocorrerem após a presente data e cuja liquidação se deverá relegar para sede de execução de sentença; e ainda,
f) que sejam condenados os Réus a pagar juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
--- subsidiariamente:
a) Que sejam condenados os Réus a indemnizar a A. no montante total de 1.207,908 €, resultante da omissão ilícita e culposa da celebração do contrato de gestão para abertura do centro de inspecções de (...), a qual, se não tivesse ocorrido, teria permitido que a A. tivesse celebrado o contrato de gestão antes de 20 de Fevereiro de 2013 e a afastaria da previsão do artº 4º do DL nº 26/2013 (se por hipótese por ela estivesse abrangida), o que lhe asseguraria o direito de explorar por dez anos tal centro; ou,
b) Que sejam condenados os Réus a indemnizar a A. pelos prejuízos especiais e anormais que sofreu em consequência do interesse público subjacente à anulação imposta pelo nº 1 do artº 4º do DL nº 26/2013, no montante total de 1.218,980€, acrescidos dos que se liquidarem em sede de execução de sentença.
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Nas suas alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões:
"1.ª O aresto em recurso julgou improcedente a acção pela qual se peticionava a condenação do Réu no pagamento de uma indemnização em virtude da omissão ilícita e culposa da celebração do contrato de gestão para abertura do centro de inspecções de (...) por entender que os prazos fixados na lei para esse efeito eram meramente ordenadores, cujo incumprimento não constituía um acto ilícito nem fonte de responsabilidade civil da Administração.
2.° Salvo o devido respeito, o aresto em recuso incorreu em flagrante erro de julgamento, desde logo por ser inaceitável do ponto de vista jurídico que num Estado de Direito Democrático a Administração não cumpra impunemente os prazos fixados pelo legislador e o administrado tenha de suportar todas as consequências e todos os prejuízos que a omissão da Administração lhe cause.
Na verdade,
3.° Resulta da factologia alegada e dada por provada que o IMT não respeitou os prazos legalmente impostos para a conclusão do procedimento concursal e para a celebração do contrato de gestão para a instalação do centro de inspecções de (...) e que se tivesse respeitado tais prazos a A./Recorrente não seria abrangida na previsão do DL n.° 26/2013, razão pela qual se estes prazos tivessem sido respeitados até teria o centro de inspecções em funcionamento desde, pelo menos, Setembro de 2012.
Ora
Resulta claramente do art.° 22° da Constituição que os administrados têm direito a ser indemnizados por actos e omissões da Administração Pública dos quais resulte a violação de um direito ou um prejuízo para outrem, pelo que, como bem nota a nossa doutrina, "...para que haja responsabilidade dos entes públicos basta que da acção ou omissão dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes resulte prejuízo para outrem, sem necessidade de violação de direitos" (v. JOSÉ LUIS MOREIRA DA SILVA, Da responsabilidade civil da administração Pública por actos ilícitos, in Responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública, coordenação de Fausto de Quadros, pág. 156 e 157).
Consequentemente, do ponto de vista constitucional, qualquer incumprimento da lei por parte da Administração representará um acto ilícito e será fonte da obrigação de indemnizar sempre que esse mesmo incumprimento cause prejuízos ao administrado.
Acresce que,
Também do ponto de vista legal haverá responsabilidade da Administração sempre que esta omita um comportamento no prazo que para esse efeito é concedido pela lei, uma vez que "A violação do dever de agir concretiza a ilicitude do facto omissivo (...) o incumprimento do prazo definido na lei para a administração emitir a decisão, pode justificar um dever indemnizatório, no ponto em que a dilação ocorrida na satisfação da pretensão do requerente pode ter efeitos lesivos autónomos..." (cfr. CARLOS CADILHA, Regime da Responsabilidade Civil extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, págs. 116 e 117).
Para além disso,
Para efeitos de ilicitude "... é indiferente que os prazos procedimentais devam ser entendidos, em geral, como prazos ordenadores, que não impeçam a emissão do acto para além do seu decurso. Ainda que se trate de um prazo ordenador, cujo incumprimento, em regra, apenas tem consequências disciplinares, o facto é que se a demora na prolação do acto acarreta prejuízos indemnizáveis, segundo o critério da causalidade adequada, ela é susceptível de geral responsabilidade civil" (cfr. CARLOS CADILHA, Regime da Responsabilidade Civil extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, pág 117).
Consequentemente,
O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao considerar que o desrespeito do prazo legalmente fixado para a decisão do concurso e para a celebração do contrato de gestão não era ilícito por os prazos serem meramente ordenadores, uma vez que, independentemente da natureza ordenadora ou não de tais prazos, do ponto de vista legal e constitucional qualquer incumprimento da lei por parte da Administração representará uma ilicitude que gerará o dever de indemnizar sempre que da omissão decorram prejuízos para o administrado (v., neste sentido, CARLOS CAD1LHA, Regime da Responsabilidade Civil extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, págs. 116 e 117).
Em qualquer dos casos,
Mesmo quem queira restringir a amplitude do dever constitucional e legal de indemnizar - de forma a que este não dependa apenas de um acto ou omissão ilegal e da existência de prejuízos, mas também da violação de uma norma destinada a salvaguardar um direito ou interesse legalmente protegido - a verdade é que sempre o aresto em recurso teria igualmente incorrido em erro de julgamento ao considerar que o incumprimento do prazo de decisão não constituía uma omissão ilícita, uma vez que a imposição do prazo máximo de 90 dias para a decisão do concurso fora instituída igualmente no interesse do administrado que apresentara a candidatura e iniciara o procedimento, pelo que sempre o incumprimento do prazo traduziria a violação de uma norma legal que se destinava igualmente a proteger os interesses do administrado e, portanto, representaria uma omissão ilícita para efeitos de efectivar a responsabilidade civil do Estado.
Por fim,
10° Não obstante não tenha conhecido dos demais pressupostos da efectivação da responsabilidade civil, é inegável que o incumprimento dos prazos para a decisão do concurso e para a celebração do contrato de gestão era não só ilícito como culposo - até por nem um só facto se tenha dado por provado que pudesse justificar o incumprimento da lei por parte do IMT -, sendo igualmente causa adequada dos prejuízos sofridos durante 4 anos pela A./Requerente e que facilmente estão comprovados e se podem quantificar face à matéria de facto dada por provada nos ns. 15.° a 26.° do aresto em recurso.
11° Assim sendo, deve o cresto em recurso ser revogado e ordenada a baixa dos autos à 1ª instância para curar do preenchimento dos demais pressupostos e quantificar os danos e o montante da indemnização ou, caso assim não se entenda, ser fixada a indemnização tendo em conta a factologia dada por provada nos n.°s 15.° a 26.° do aresto em recurso, em montante não inferior a 539.114.60€ a título de perdas de exploração no período compreendido entre Setembro de 2012 e Dezembro de 2016”.
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Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, veio o R./Recorrido “IMT, IP”, apresentar contra alegações que assim sintetizou, concluindo:
1 . Não está a douta sentença recorrida ferida de qualquer irregularidade, invalidade ou nulidade.
2. Não ocorreu erro de julgamento do Tribunal a quo por julgar a acção administrativa especial totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, manter o acto impugnado na ordem jurídica.
3. Bem decidiu a sentença em apreço”.
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A Digna Magistrada do M.º P.º, notificada nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
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Sem vistos, mas com envio prévio do projecto às Ex.mas Juízas Desembargadoras adjuntas, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não são questionados:
1. A empresa “N., LDA.”, ora Autora, é uma sociedade comercial que tem por objecto o exercício da actividade de inspecção técnica de veículos a motor [cf. factualidade não controvertida].
2. Em 18 de Julho de 2011, o “INSTITUTO DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES I.P.”, ora Réu, publicitou a Deliberação n.º 1366/2011, na 2ª série do Diário da República, nos termos da qual e além do mais, procedeu à abertura de procedimento concursal para a instalação de novos centros de inspecção técnica de veículos a motor, em quarenta e nove concelhos (entre os quais, o concelho de Terras de Bouro) [cf. Factualidade não controvertida; cf. art. 6.º, n.º 9, da Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril; cf. Deliberação n.º 1366/2011 publicada na 2ª série do Diário da República de 18 de Julho de 2011].
3. O procedimento concursal referido em 2) foi tramitado em bloco e da mesma forma, tendo-se iniciado, para todos os quarenta e nove concelhos, na mesma data e tendo sido apresentadas 494 candidaturas ao mesmo [cf. factualidade não controvertida].
4 . A Autora submeteu a sua candidatura ao procedimento concursal referido em 2) respeitante ao concelho de Terras de Bouro - tendo-lhe sido atribuído o número de candidatura 2011 0726 0000 220 [cf. candidatura constante de fls. 1/97 do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
5. Em 02 de Dezembro de 2011, o Réu ordenou, provisoriamente, as candidaturas e divulgou no seu site esse acto de ordenação provisória, abrindo o trâmite da audiência prévia [cf. Ofício junto sob o n.º 1 com a petição inicial e constante de fls. 100 e versos do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
6. Em Fevereiro de 2012, o Réu divulgou, no seu site, um comunicado onde anunciava os resultados da audiência prévia dos interessados, no âmbito do procedimento concursal referido em 2), a introdução de eventuais alterações nas listas de ordenação provisória das candidaturas se encontravam em fase de ponderação e que a publicitação/notificação da ordenação final das candidaturas estaria prevista para Fevereiro, a que se seguiria a fase da assinatura dos contratos [cf. factualidade não controvertida; cf. Ofício constante de fls. 105 do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
7. Findo o mês de Fevereiro de 2012, o Réu divulgou, no seu site, um novo comunicado de idêntico teor ao referido em 6) [cf. factualidade não controvertida; cf. Ofício constante de fls. 105 do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
8. A publicitação da lista de ordenação definitiva, no âmbito do procedimento concursal referido em 2), nunca chegou a ser feita [cf. factualidade não controvertida; cf. Ofício
constante de fls. 105 do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
9. Em 19 de Fevereiro de 2013, foi publicado o Decreto-Lei n.º 26/2013 que, no n.º 1, do seu art. 4.º, determinou o seguinte: “Sem prejuízo do disposto no nº 4, todos os procedimentos de candidatura à celebração de contratos administrativos de gestão de novos centros de
inspecção, em curso e iniciados após a data de entrada em vigor da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, são anulados com a entrada em vigor do presente diploma” [cf. factualidade não controvertida].
10. A Autora foi a única empresa que apresentou candidatura, no âmbito do procedimento concursal referido em 2), no tocante ao concelho de Terras de Bouro - candidatura, essa, que teve a menção de “Aceite”, por parte do Réu [cf. Relatório de Análise de Candidatura constante de fls. 98/99 e versos do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
11. Mediante Ofício datado de 27 de Fevereiro de 2013 - na sequência do circunstancialismo descrito em 9) -, o Réu comunicou à Autora, a anulação do procedimento concursal referido em 2), nos seguintes termos, a saber:
“…
Assunto: Candidatura n.º 201107260000220, no âmbito da Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, Concelho Terras de Bouro
Em resposta ao solicitado, serve o presente para informar que, de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de fevereiro, “…Todos os procedimentos de candidatura à celebração de contratos de gestão de novos centros de inspeção, em curso e instalados após a data de entrada em vigor da Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, são avaliados com a entrada em vigor do presente diploma” (cfr. N.º 1 do artigo 4.º).
Assim, e dando cumprimento ao legalmente previsto, não vai o IMT, I.P. proceder à publicação da ordenação final das candidaturas resultantes do procedimento iniciado com a publicação da Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, facto este que impossibilita a celebração de qualquer contrato de gestão no âmbito da referida lei.
…” [cf. Ofício junto sob o n.º 2 com a petição inicial e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido] - acto ora impugnado.
12. Em meados do ano de 2013, o Réu voltou a abrir um novo procedimento concursal para a instalação de novos centros de inspecção para diversos concelhos, nos termos do Decreto-lei n.º 26/2013, de 19 de Fevereiro [cf. factualidade não controvertida].
13. A Autora - ao abrigo do Decreto-lei n.º 26/2013, de 19 de Fevereiro -, submeteu nova candidatura, no âmbito do procedimento concursal referido em 12) para o concelho de (...), tendo em conta a possibilidade de reformulação da mesma consignada no n.º 4, do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de Fevereiro [cf. factualidade não controvertida].
14. Em 9 de Setembro de 2014 - na sequência de a candidatura da Autora ter sido aceite e ficado ordenada, definitivamente, em 1º lugar -, no âmbito do procedimento concursal referido em 12), o Réu celebrou com a Autora o contrato de gestão, acesso e permanência da actividade de inspecção técnica a veículos para a instalação do Centro de Inspecções de (...) [cf. contrato de gestão junto aos autos, em 24-10-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Depoimento prestado pela Autora (em sede de declarações de parte); cf. depoimento prestado pela testemunha Ana Cristina Barbosa].
15. Em 16 de Dezembro de 2016, entrou em funcionamento o Centro de Inspecções (CITV) de (...) [cf. depoimento prestado pela Autora (em sede de declarações de parte); cf. depoimento prestado pela testemunha Ana Cristina Barbosa].
16. No período compreendido entre 01 de Dezembro de 2014 e 15 de Janeiro de 2017, os valores das tarifas das inspecções, reinspecções, atribuição de segunda matrícula, e emissão de segunda via foram os seguintes: (i) Ligeiros: € 24,83; (ii) Pesados: € 37,17; (iiii) Motociclos, triciclos e quadriciclos (com cilindrada superior a 250 cm3): €12,50; (iv) Reboques e Semirreboques: € 24,83; (v) Reinspecções de inspecções periódicas: €6,23; (vi) Nova matrícula: € 61,99; (vii) Extraordinárias: € 86,70; (viii) Emissão de segunda via da ficha de inspecção: € 2,34 [cf. documento (doc.) n.º 1 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Portaria n.º 378-A/2013, de 31 de Dezembro, e as Deliberações do IMT n.º 2017/25, n.º 4-A/2018 e n.º 1408-A/2018 e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
17. No período compreendido entre 16 de Janeiro de 2017 e 31 de Dezembro de 2017, os valores das tarifas das inspecções, reinspecções, atribuição de segunda matrícula, e emissão de segunda via foram os seguintes: (i) Ligeiros: € 24,96; (ii) Pesados: € 37,36; (iiii) Motociclos, triciclos e quadriciclos (com cilindrada superior a 250 cm3): € 12,57; (iv) Reboques e Semirreboques: € 24,96; (v) Reinspecções de inspecções periódicas: € 6,26; (vi) Nova matrícula: € 62,31; (vii) Extraordinárias: € 87,15; (viii) Emissão de segunda via da ficha de inspecção: € 2,35 [cf. documento (doc.) n.º 1 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Portaria n.º 378-A/2013, de 31 de Dezembro, e as Deliberações do IMT n.º 2017/25, n.º 4-A/2018 e n.º 1408-A/2018 e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
18. No período compreendido entre 01 de Janeiro de 2018 e 31 de Dezembro de 2018, os valores das tarifas das inspecções, reinspecções, atribuição de segunda matrícula, e emissão de segunda via foram os seguintes: (i) Ligeiros: € 25,29; (ii) Pesados: € 37,85; (iiii) Motociclos, triciclos e quadriciclos (com cilindrada superior a 250 cm3): € 12,74; (iv) Reboques e Semirreboques: € 25,29; (v) Reinspecções de inspecções periódicas: € 6,34; (vi) Nova matrícula: € 63,13; (vii) Extraordinárias: € 88,30; (viii) Emissão de segunda via da ficha de inspecção: € 2,38 [cf. documento (doc.) n.º 1 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Portaria n.º 378-A/2013, de 31 de Dezembro, e as Deliberações do IMT n.º 2017/25, n.º 4-A/2018 e n.º 1408-A/2018 e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
19. No período compreendido entre 01 de Janeiro de 2019 e 30 de Novembro de 2019, os valores das tarifas das inspecções, reinspecções, atribuição de segunda matrícula, e emissão de segunda via foram os seguintes: (i) Ligeiros: € 25,55; (ii) Pesados: € 38,23; (iiii) Motociclos, triciclos e quadriciclos (com cilindrada superior a 250 cm3): € 12,87; (iv) Reboques e Semirreboques: € 25,55; (v) Reinspecções de inspecções periódicas: € 6,40; (vi) Nova matrícula: € 63,77; (vii) Extraordinárias: € 89,19; (viii) Emissão de segunda via da ficha de inspecção: € 2,40 [cf. documento (doc.) n.º 1 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Portaria n.º 378-A/2013, de 31 de Dezembro, e as Deliberações do IMT n.º 2017/25, n.º 4-A/2018 e n.º 1408-A/2018 e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
20. Sobre o valor da tarifa de cada inspecção é devida uma contrapartida financeira ao Réu, fixada nas seguintes percentagens, a saber: (a) em 2013: 10%; (b) em 2014: 12,5%; (c) desde o ano de 2015 até ao ano de 2019: 15% [cf. documento (doc.) n.º 2 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido; cf. Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de Fevereiro, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
21. No período compreendido entre 16 de Dezembro de 2016 e 30 de Setembro de 2019, a Autora realizou no Centro de Inspecções (CITV) de (...) 19.647 inspecções, obtendo um valor total sem IVA de € 463.205,88, nos seguintes termos, a saber:
Motivo de inspeçãoCategoria do veículoTotal de inspeçõesValor cobrado sem IVA (€)Data da primeira inspeção
1 – Inspeção periódica1 – Ligeiro17.4224404,6716-12-2016 14:54
1 – Inspeção periódica2 – Pesado2238445,4703-01-2017 15:38
1 – Inspeção periódica3 – Tractor19721,2107-03-2017 10:33
1 – Inspeção periódica6 – Reboque16404,1603-01-2017 15:41
1 – Inspeção periódica7 – Semi-Reboque37934,4414-02-2017 17:15
2 - Reinspecção1 – Ligeiro1.89912.037,0920-12-2016 10:29
2 - Reinspecção2 – Pesado26164,5711-01-2017 17:29
2 - Reinspecção3 – Tractor16,407-01-2019 11:06
2 - Reinspecção425,5422-03-2018 18:44
19.64746 3205,88
[cf. documento (doc.) junto aos autos pelo Réu, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
22. No período compreendido entre Dezembro de 2016 e Setembro de 2019, o valor médio mensal respeitante às despesas do Centro de Inspecções (CITV) de (...) com água e electricidade foi cerca de € 201,68 (duzentos e um euros e sessenta e oito cêntimos) [cf. documentos (docs.) n.º 3 e n.º 4 juntos aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
23. No período compreendido entre Dezembro de 2016 e Setembro de 2019, o valor médio mensal respeitante às despesas do Centro de Inspecções (CITV) de (...) com telecomunicações foi cerca de € 19,62 (dezanove euros e sessenta e dois cêntimos) [cf. 1/6 do valor consignado no documento (doc.) n.º 5 junto aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
24. No período compreendido entre Dezembro de 2016 e Setembro de 2019, o valor médio mensal respeitante às despesas com vencimentos e seguros dos trabalhadores do Centro de Inspecções (CITV) de (...) foi cerca de € 1.535,24 (mil e quinhentos e trinta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos) [cf. documentos (docs.) n.º 6 a n.º 8 juntos aos autos pela Autora, em 04-11-2019, e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].
25. A percentagem de lucro obtida pela Autora, com cada inspecção é, no mínimo, de 50% do valor da tarifa de cada inspecção [cf. depoimento da Autora (em sede de declarações de parte); cf. depoimento das testemunhas Ana Cristina Barbosa e Carlos Alberto da Silva Cunha].
26. Tem-se aqui presente o teor de todos os documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo-Instrutor (PA) [cf. documentos (docs.) constantes dos autos e do Processo Administrativo-Instrutor (PA) e cujo teor integral, aqui, se dá por reproduzido].

2 . MATÉRIA de DIREITO

Tendo em consideração, por um lado, a sentença recorrida, e, por outro, as alegações apresentadas pela recorrente, sintetizadas nas supra transcritas conclusões, importa verificarmos se aquele incorreu em erro de julgamento
A decisão judicial em recurso jurisdicional concluiu com a improcedência da acção com base na seguinte fundamentação:
Desde logo, se adianta que, compulsada a factualidade supra julgada provada em 1) a 26) - e para a qual, aqui, se remete, por uma questão de economia processual -, não assiste razão à Autora.
Senão, vejamos.
Como é sabido, a actividade de inspecção técnica de veículos consubstancia uma atribuição do Estado Português - como é reconhecido pela regulamentação interna e pela Directiva n.º 96/96/CE do Conselho de 20 de Dezembro de 1996 - que pode ser executada por entidades de natureza pública ou por “organismos ou estabelecimentos por ele designados, eventualmente de carácter privado, autorizados para o efeito”. Foi, pois, a natureza pública do controlo técnico de veículos (com reflexos na segurança rodoviária) que justificou a adopção dos requisitos internos, mormente os consignados na Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril, que fixou o Regime Jurídico de Acesso e de Permanência na Actividade de Inspecção Técnica de Veículos a motor e seus reboques, bem como o Regime de Funcionamento dos Centros de Inspecção.
Ora, é aplicável à primitiva candidatura da Autora o seguinte enquadramento normativo, a saber: (i) a Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril (que fixou o Regime Jurídico de Acesso e de Permanência na Actividade de Inspecção Técnica de Veículos a motor e seus reboques, bem como o Regime de Funcionamento dos Centros de Inspecção); (ii) a Deliberação n.º 1366/2011, de 18 de Julho, do Conselho Directivo do Réu (que regulamenta, nos termos do n.º 4, do art. 14.º da aludida Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril, e estabelece os procedimentos a observar e os documentos a apresentar para efeitos de candidatura à aprovação de centros de inspeção técnica de veículos (CITV)); e, (iii) a Portaria n.º 1165/2000, de 9 de Dezembro (que fixa os requisitos técnicos a observar pelos centros de inspeção (anexos I e II)).
Constata-se que, no caso dos autos, o procedimento concursal com vista à celebração de contratos administrativos de gestão para abertura de novos centros de inspecção em quarenta e nove concelhos (municípios), iniciou-se a pedido dos interessados, conforme dispõe o n.º 1, do art. 6.º da Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril, ou seja, ocorreu com a entrada em vigor da referida lei (em 26 de Julho de 2011). Sendo que tal procedimento concursal desenrolou-se, de acordo com os prazos definidos na lei, de que resultou a publicação das listas provisórias de ordenação de candidaturas no dia 02 de Dezembro de 2011, no site do Réu. Com efeito, o n.º 6, do art. 6.º da Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril, obriga a que o Réu decida sobre as candidaturas no prazo de 90 (noventa) dias a contar da respectiva apresentação, sob pena de indeferimento. E, efectivamente, o Réu publicou a lista de ordenação provisória das 494 candidaturas dentro de tal prazo. Mais, no período compreendido entre 02 de Dezembro de 2011 (data da publicação da lista de ordenação provisória das candidaturas) e 19 de Fevereiro de 2013 (data da publicação do Decreto-Lei n.º 26/2013), decorreram cerca de catorze meses - período, dentro do qual, também ocorreu o processo de audiência de interessados (iniciado em 02 de Dezembro de 2012 com a publicação da lista de ordenação provisória das candidaturas a tal procedimento concursal). De facto, tal procedimento concursal foi tramitado em bloco e da mesma forma: (i) iniciou-se para todos os quarenta e nove concelhos, na mesma data; (ii) em 02 de Dezembro de 2011, foram ordenadas, provisoriamente, as 494 candidaturas e divulgado no site do Réu esse acto de ordenação provisória, abrindo o trâmite da audiência prévia.
(iii) Acresce que, em Fevereiro de 2012, o Réu divulgou, no seu site, um comunicado onde anunciava os resultados da audiência prévia dos interessados, a introdução de eventuais alterações nas listas de ordenação provisória das candidaturas se encontravam em fase de ponderação, e que a publicitação/notificação da ordenação final das candidaturas estaria prevista para Fevereiro, a que se seguiria a fase da assinatura dos contratos. (iv) Mais, findo o mês de Fevereiro de 2012, o Réu divulgou, no seu site, um novo comunicado de idêntico teor. Ora, a publicitação da lista de ordenação definitiva, no âmbito de tal procedimento concursal nunca chegou a ser feita; pelo que, necessariamente, nenhum contrato de gestão poderia ter sido celebrado com o Réu legalmente. Acresce que, em 19 de Fevereiro de 2013, foi publicado o Decreto-Lei n.º 26/2013 que, no n.º 1, do seu art. 4.º, determinou o seguinte: “Sem prejuízo do disposto no nº 4, todos os procedimentos de candidatura à celebração de contratos administrativos de gestão de novos centros de inspecção, em curso e iniciados após a data de entrada em vigor da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, são anulados com a entrada em vigor do presente diploma”. Pelo que, em observância de tal dispositivo normativo, o Réu notificou a Autora bem como todas as demais candidatas que apresentaram a sua candidatura a tal procedimento concursal que o mesmo fora anulado, por força da lei.
Ora, contrariamente ao alegado pela Autora, certo é que face à natureza do procedimento concursal em questão, ao número de candidaturas apresentadas, e à tramitação procedimental a observar, o Réu actuou dentro dos parâmetros normais e adequados a tal circunstancialismo fáctico (não se olvidando que os prazos procedimentais em questão detêm um cariz meramente ordenador e disciplinador). Pelo que, contrariamente, ao alegado pela Autora, o Réu somente estaria obrigado a celebrar o contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...), caso a Autora tivesse ficado ordenada nas listas finais (listas, essas, que não chegaram a ser publicadas). Da mesma forma, claudica a pretensão da Autora quanto ao pretenso direito a que seja celebrado o contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...), em virtude de a sua candidatura ter sido aceite e ter sido a única. Claudicando, também, a sua pretensão a no que respeita à condenação do Réu a proceder à celebração do contrato de gestão com a Autora para a abertura do centro de inspecções em (...), já que a sua situação é, efectivamente, subsumível ao consignado no n.º 1, do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 26/2013 (não sendo tal preceito materialmente inconstitucional). Ademais, a decisão que, em 27 de Fevereiro de 2013, declarou anulado o procedimento concursal de candidatura à celebração do contrato de gestão para o Centro de Inspecções de (...) também não se afigura inválida, ilegal, nem violadora do princípio da confiança dos administrados. De facto, o Réu não violou o consignado no art. 6.º da Lei n.º 11/2011, nem violou nenhum acto constitutivo de direitos (na medida em que a candidatura da Autora não detém essa natureza tendo ficado ordenada em 1º lugar [e único], a título provisório), e nem violou o princípio constitucional da protecção da confiança.
Finalmente, não tendo o Réu praticado nenhum acto ilícito culposo, não incorre na obrigação de indemnizar a Autora por pretensos danos sofridos até à presente data em consequência da não celebração do contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de (...), no montante de € 70.461,13, acrescido dos respectivos juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento. Nem incorre na obrigação de indemnizar a Autora no montante de € 1.218,980 – acrescido dos juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento -, por pretensos prejuízos anormais e especiais nem por prejuízos hipotéticos decorrentes da anulação decretada por via legislativa.
Aliás, sobre situação análoga aos autos (e respectivas questões suscitadas), pronunciou-se já o COLENDO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO (STA), no seu douto Acórdão de 29 de Abril de 2014 (proferido no âmbito do processo n.º 0966/13) – tendo reiterado o já dito no seu douto Acórdão de 09 de Abril de 2014 (proferido no âmbito do processo n.º 0928/13), e mantido no seu douto Acórdão de 29 de Maio de 2014 (proferido no âmbito do processo n.º 0927/13) - e o qual, com a devida vénia, se passa a transcrever, porque se adere na íntegra à sua fundamentação, a saber:
“…A……., Lda, intentou a presente acção administrativa especial contra o Instituto da Mobilidade e dos Transportes, IP (IMT), o Conselho de Ministros e sete contra-interessados, cuja identificação está na petição e aqui se reproduz, formulando os seguintes pedidos:
(i) ser o IMT condenado à prática de acto administrativo devido, de ordenação final das candidaturas apresentadas no âmbito do procedimento iniciado ao abrigo da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, e assinatura do contrato administrativo de gestão para abertura de novo centro de inspecção de veículos no distrito de Santarém, concelho de Constância; (ii) ser o IMT condenado à prática de acto administrativo devido, de ordenação final das candidaturas apresentadas no âmbito do procedimento iniciado ao abrigo da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, e assinatura do contrato administrativo de gestão para abertura de novo centro de inspecção de veículos no distrito de Évora, concelho de Mourão; (iii) ser o IMT condenado à prática de acto administrativo devido, de ordenação final das candidaturas apresentadas no âmbito do procedimento iniciado ao abrigo da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, e assinatura do contrato administrativo de gestão para abertura de novo centro de inspecção de veículos no distrito de Beja, concelho de Alvito; (iv) cumulativamente, deverão as Entidades Demandadas ser condenadas no pagamento à Autora de uma indemnização, a título de responsabilidade civil pelo exercício ilícito, acrescida dos competentes juros legais, na medida em que o IMT causou danos à autora por não ter propulsionado atempadamente o procedimento e o Conselho de Ministros a prejudicou por ter praticado um acto administrativo ou legislativo, de anulação do mesmo procedimento. […]
Na presente acção a autora pede, a título principal, dada a ilegalidade do acto administrativo contido no art. 4º/1 do DL nº 26/2013, de 19 de Fevereiro, que se condene o IMT.IP, a: (i) emitir os actos administrativos devidos de ordenação das candidaturas apresentadas nos procedimentos por ela iniciados, ao abrigo da Lei nº 11/2011, de 26 de Abril, relativos à instalação de centros de inspecção técnica de veículos nos concelhos de Constância, Mourão e Alvito; (ii) celebrar consigo os respectivos contratos de gestão. Pede ainda, cumulativamente, que as entidades demandadas sejam condenadas a indemnizá-la pelos danos emergentes e lucros cessantes, perdas supostamente decorrentes da actividade das mesmas no âmbito dos anteditos procedimentos.
Ora, as pretensões da autora nesta acção são idênticas às formuladas na acção similar que foi já decida por este Supremo Tribunal pelo acórdão de 2014.03.20 - procº nº 0965/13.
Nesse aresto o STA emitiu pronúncia sobre as questões que importa apreciar para julgar esta acção. E fê-lo do modo que passamos a citar, na parte que interessa:
«(…) Conforme se disse no relatório deste acórdão e consta da factualidade provada, a autora candidatou-se à celebração de um contrato de gestão relativo a um centro de inspecção técnica de veículos automóveis, segundo o regime constante da versão inicial da Lei n.º 11/2011, de 26/4. O procedimento, que correu junto do IMT, avançou até à fase da ordenação provisória das candidaturas, onde a da autora figurava no primeiro lugar. Esse posicionamento conferia-lhe a expectativa de que a candidatura aprovada seria a sua e de que o IMT celebraria com ela o correspondente contrato de gestão. Contudo, o procedimento imobilizou-se nessa fase – ao arrepio dos prazos previstos nos ns.º 6 e 8 do art. 6º da referida Lei n.º 11/2011.
Entretanto, foi publicado e entrou em vigor o DL n.º 26/2013, de 19/2, cujo art. 4º, n.º 1, dispôs
que todos os procedimentos do género ainda em curso ficavam «anulados».
Perante isto, são imediatamente claras duas coisas: que, a partir da emergência do DL n.º 26/2013, o IMT não podia retomar, «sponte sua», o procedimento em que a autora interviera; e que, por isso mesmo, a almejada condenação judicial do IMT a fazê-lo parece pressupor a prévia eliminação da pronúncia ínsita nesse art. 4º, n.º 1. Portanto, a análise da problemática posta nos autos tem de começar pela legalidade da estatuição acolhida naquele art. 4º, n.º 1. É certo que a autora também censura o IMT pela paralisia a que votou o procedimento, a qual é cronologicamente anterior ao início de vigência do DL n.º 26/2013. Mas, sejam quais forem a natureza e os efeitos da denunciada omissão do IMT – questão que, por ora, fica em aberto – não há a mínima dúvida de que a procedência do pedido de condenação do IMT na prática do acto procedimental que a autora crê ser devido pressupõe que o procedimento, anulado pelo art. 4º, n.º 1, ressurja na ordem jurídica tal e qual fora antes, de modo a poder prosseguir com os contornos definidos na versão inicial da Lei n.º 11/2011.
O DL n.º 26/2013 introduziu alterações várias a essa Lei n.º 11/2011, em que avulta o estabelecimento de «novos requisitos técnicos» para os centros de inspecção, justificados pela necessidade de neles se inspecionarem também os «motociclos, triciclos e quadriciclos com cilindrada superior a 250 cm3», assim como os «reboques e semirreboques com peso superior a 750 Kg» (cfr. o preâmbulo do diploma, com reflexo directo na obrigatoriedade imposta na al. c), acrescentada ao n.º 2 do art. 4º da Lei n.º 11/2011). Perante essas novas exigências, o art. 4º do DL n.º 26/2013, de 19/2, cuja epígrafe é «disposição transitória», anulou todos os procedimentos do referido género ainda em curso (n.º 1) e substituiu-os por outros, tidos por imediatamente abertos (n.º 2), permitindo que neles fossem apresentadas novas candidaturas (n.º 3) e possibilitando que os candidatos nos procedimentos anulados reformulassem «as candidaturas apresentadas», por forma a adaptá-las aos critérios impostos no próprio diploma (n.º 4).
Como se disse no saneador, essa anulação dos procedimentos em curso, incidindo de forma autoritária sobre todos, configurou uma pronúncia plural que se refractava sobre cada um deles; de modo que o art. 4º, n.º 1, do DL n.º 26/2013 se apresenta como um autêntico acto administrativo, ainda que sob forma legislativa (cfr. o art. 52º, n.º 1, do CPTA) – já que visou produzir efeitos jurídicos, de cariz anulatório ou supressivo, em procedimentos individuais e concretos (art. 120º do CPA).
E a questão seguinte, de magno relevo, é a de saber se tal acto foi, ou não, praticado «secundum legem». Ao acometer esse acto, a autora foi clara e precisa num único ponto: quando o disse eivado de violação de lei por ele constituir uma ilegal revogação – sobretudo incidente sobre o acto procedimental que, ao ordená-la provisoriamente no primeiro lugar, teria reconhecido essa sua vantajosa posição subjectiva (cfr. o art. 140º, n.º 1, al. b), do CPA). Já os demais ataques que a autora esgrimiu na petição respeitam à violação de princípios, constitucionais ou legais, não sendo muitas vezes óbvio se a autora reportou a ofensa deles ao acto do Conselho de Ministros, de que agora curamos, ou à conduta omissiva do IMT.
Ora, e antes de vermos se as diversas críticas da autora têm razão de ser, temos de interpretar o acto acolhido no art. 4º, n.º 1, do DL n.º 26/2013; pois, só sabendo o que ele exactamente disse, poderemos avaliar se ele se afastou do que, «ex vi legis», deveria dizer.
O DL n.º 26/2013, ao alterar a Lei n.º 11/2011, mudou o regime jurídico de acesso à actividade de inspecção técnica de veículos, tendo inclusivamente introduzido novos requisitos técnicos a que deveriam futuramente obedecer os centros de inspecção. Este novo regime legal (ou seja, esta «lex nova») era de aplicação imediata aos procedimentos ainda pendentes - como flui das regras da aplicação da lei administrativa no tempo (cfr., v.g., Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, I, pág. 139, e Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, pág. 170), aliás detectáveis no art. 12º do Código Civil. É óbvio que as múltiplas candidaturas apresentadas nos procedimentos então em curso, iniciados sob a égide da «lex praeterita», não satisfaziam aqueles «novos requisitos técnicos», reclamados pelo DL n.º 26/2013. Daí que o IMT, mesmo na ausência da «disposição transitória» do art. 4º deste diploma, nunca pudesse aprovar quaisquer candidaturas nesses procedimentos após surgir a «lex nova», pois, se acaso o fizesse, estaria a ofender o regime jurídico já em vigor, que tais actos de aprovação tinham de respeitar (tendo em conta o princípio «tempus regit actum»); e, se não podia aprovar essas candidaturas, o IMT também não poderia celebrar os consequentes contratos de gestão.
Percebe-se agora por que motivo o acto em apreço disse que os procedimentos ficavam «anulados». Ficavam-no porque eles se tornaram imprestáveis para o fim em vista - o fim de contratar a instalação de centros de inspecção com as características impostas pela lei vigente ao empo de contrato - dada a mudança de paradigma entretanto introduzida pelo legislador. Era impossível que os procedimentos em curso – os que foram tidos por «anulados» - ainda frutificassem, pois isso ofenderia fatalmente a «lex nova», já aplicável. Daí que o acto incluso naquele art. 4º, n.º 1, seja mais do que uma mera decisão de não contratar (cfr., a propósito, o art. 79º, n.º 1, al. d), do CCP); e antes traduza o reconhecimento da absoluta impossibilidade dessa contratação, sendo os procedimentos «anulados» por já não se adequarem às exigências que a lei viera estabelecer.
Em termos secos e chãos, tais procedimentos foram «anulados» porque tudo indicava que já não serviam para nada. Embora pudessem ainda servir como ponto de partida para os novos procedimentos, que os substituiriam «in situ»; daí a abertura destes «ope legis» (art. 4º, n.º 2, do DL n.º 26/2013, de 19/2), bem como o estabelecimento de regras de reformulação de candidaturas e de ampliação da concorrência (ns.º 3 e 4 do mesmo artigo). Encarado «a se», o acto incluso no art. 4º, n.º 1, aparentava-se a um «coup de grâce» infligido a procedimentos estéreis; visto em conjunto com os números seguintes, o referido acto insere-se já num plano reconstrutivo desses procedimentos, por forma a adequá-los às novas exigências legais.
Eis-nos, assim, perante uma situação singular: se o DL n.º 26/2013 não contivesse a «disposição transitória» do seu art. 4º, o procedimento em que a autora interveio haveria de avançar e de findar; porém, o interesse material por ela aí perseguido nunca obteria satisfação, esvaindo-se também qualquer posição vantajosa que a autora tivesse porventura atingido no mesmo procedimento. Tudo isto mostra bem que o verdadeiro obstáculo à pretensão material última da autora – a de celebrar o contrato de gestão – não está no acto contido no art. 4º, n.º 1, do DL n.º 26/2013, mas sim na mudança de regime trazida por este diploma, enquanto «lex nova». E assim se vê que o acto anulatório dos procedimentos é uma mera consequência desses novos parâmetros legislativos – em vez de ser, como a autora sugere, um antecedente lógico necessário da aplicação do novo regime. Sendo esse o sentido do acto, é claro que ele não tem o cariz revogatório que a autora lhe assinala. Embora incidisse sobre o procedimento da autora e lhe pusesse imediatamente fim, o acto, ao fazê-lo, não a privou de quaisquer vantagens procedimentais já constituídas – pela razão singela de que, à luz da concomitante «lex nova», tais vantagens, a terem existido, estavam já irremediavelmente perdidas.
Por outro lado, e porque simplesmente secundou uma alteração legislativa, o mesmo acto está imune às críticas de que teria ofendido, «per se», os princípios jurídicos da boa fé e da confiança (os quais, aliás, a autora parece referir apenas, ou sobretudo, à conduta omissiva do IMT) ou o da proporcionalidade. Objectar-se-á, eventualmente, que todas as censuras deste género são transponíveis para os novos critérios de instalação dos centros de inspecção, que o legislador introduziu no DL n.º 26/2013, de 19/2, e para o modo como ele intentou renovar os procedimentos não concluídos. Mas, encarado o assunto por este prisma, logo se constata que a posição da autora não melhora – dado que o legislador é livre na imposição dos requisitos dos centros e na definição dos respectivos procedimentos pré-contratuais, nada sugerindo que ele, ao editar o DL n.º 26/2013, se haja excedido no exercício dessa sua liberdade.
Até porque, ao tomar os procedimentos «anulados» como base de outros, adaptados às novas exigências legais, o legislador intentou salvar o que era salvável, não se divisando na opção assim tomada a ofensa de quaisquer normas ou princípios constitucionais. Assim, nenhuma desproporção se detecta na solução acolhida nos ns.º 2 e ss. do art. 4º do DL n.º 26/2013 e, «maxime», no n.º 3 desse artigo, a qual é explicável pela necessidade de, perante as novas regras de instalação dos centros, se proporcionar aos eventuais interessados o exercício do direito de concorrência. E, em geral, podemos afastar a tese de que constituiria motivo de desaplicação duma «lex nova» a confiança que alguém pusera na estabilidade da «lex praeterita». Por último, também não se vê – nem a autora explica porque deveria ver-se – que o mesmo acto anulatório haja ferido os vários «princípios gerais informadores da actividade administrativa» que a autora elencou no art. 203º da petição e que constam dos arts. 3º, 4º, 5º, 6º-A e 9º do CPA. Estando tal acto na linha de um novo desenho legislativo, é vã a ideia de que ele exercitou uma discricionariedade ofensiva dos limites internos postos por aquelas quatro primeiras normas; e, contendo ele uma decisão, é impossível que tivesse violado a última.
Concluímos, portanto, que o acto incluso no art. 4º, n.º 1, do DL n.º 26/2013 não pode ser eliminado da ordem jurídica, como a autora preconiza. A subsistência desse acto implica que o procedimento administrativo onde interveio a autora, e sobre o qual ele também recaiu, esteja efectivamente anulado. E, ante essa supressão do procedimento, tem necessariamente de improceder o pedido de condenação do IMT à prática do acto devido – por falta do substrato procedimental onde o acto se produziria e integraria.
Resta atentar nos pedidos indemnizatórios, fundados na actuação ilícita e culposa do Conselho de Ministros, por ter emitido o mencionado acto de anulação, e do IMT, pela inércia a que votou o procedimento. Porque nenhuma ilegalidade vislumbrámos no acto provindo do Conselho de Ministros, não se descortina, no seu comportamento, qualquer ilicitude – que é um requisito essencial da responsabilidade civil aqui invocada pela autora – justificativa da condenação dessa entidade no pagamento de uma indemnização. Note-se que a autora também pediu, a título subsidiário, a condenação do Conselho de Ministros a indemnizá-la pelos danos resultantes do «exercício ilícito da função legislativa».
No entanto, o que aqui deveras se nos depara é, não um simples pedido subsidiário, mas uma «causa petendi» subsidiária – que só se tomaria em conta se o acto constante do art. 4º, n.º 1, não fosse havido como administrativo, sendo «antes um acto de natureza legislativa» (cfr. O art. 229º da petição). Ora, nós arredámos esta última hipótese; e, afastada assim essa causa de pedir subsidiariamente invocada, o pedido que lhe corresponde, por falta do seu antecedente exclusivo, não é de conhecer.
Quanto ao IMT, o problema assume já diferentes contornos. A autora considera que a passividade desse demandado, ofensiva dos prazos procedimentais a que ele estava sujeito, constituiu uma actuação ilícita que a prejudicou; pois, se o IMT tivesse dado ao procedimento a propulsão legalmente prevista, ela teria celebrado o contrato de gestão antes disso se tornar impossível devido à emergência do DL n.º 26/2013 – o que poderia ter evitado que a autora sofresse todos ou alguns dos danos que invoca (danos esses cuja realidade ainda não temos por adquirida). As queixas da autora não são quiméricas, já que se ajustam ao desenvolvimento normal dos eventos. Mas, no plano da responsabilidade civil extracontratual, conexa com a própria actuação administrativa, a ilicitude das condutas danosas há-de normalmente provir de uma qualquer forma de ilegalidade invalidante. Ora, os prazos procedimentais desrespeitados pelo IMT eram meramente ordenadores ou disciplinadores, de modo que a sua ultrapassagem não significa a prática, por esse instituto público, de omissões fautoras de ilegalidade daquele género. E, não havendo esta, logo se tende a concluir que a inércia do IMT não consubstanciou qualquer ilicitude geradora de um dever de indemnizar. Tal ilicitude renasceria se pudéssemos afirmar duas sucessivas coisas: por um lado, que as disposições legais determinativas desses prazos se destinavam a proteger os interesses dos candidatos à contratação, em que se incluía a autora; por outro lado, que isso se incluía na 2.ª hipótese do art. 483º, n.º 1, do Código Civil.
Quanto ao primeiro ponto, cremos que a previsão desses prazos, que já qualificámos como ordenadores, visou a prossecução de um interesse público - o de que os procedimentos do indicado tipo não retardassem a abertura dos centros de inspecção e a sua frequência pelas populações. Mas concedemos que tais prazos também terão sido consagrados para protecção, mesmo que só secundária, dos interesses dos candidatos nos procedimentos, isto é, de quem estivesse na situação da autora.
Quanto ao segundo ponto, é de notar que o cariz puramente formal das normas sobre prazos ordenadores, incumpridos pelo IMT, exclui que, à mera inobservância desses prazos, imediata e necessariamente se siga um dever indemnizatório. É que os «interesses alheios» a que se refere o art. 483º, n.º 1, do Código Civil, são de natureza material, não se mostrando criterioso nem razoável fundar a responsabilidade civil dos entes públicos em qualquer atraso na propulsão de um procedimento. Só assim não será quando o incumprimento de prazos dessa espécie atingir proporções sérias, anormais e injustificadas, daí derivando prejuízos para algum beneficiário do prazo. E parece ser esta a posição da autora. Mas a inércia a que o IMT votou o procedimento a partir de 2/12/2011 não está destituída de razão de ser. Com efeito, percebe-se que a Administração, face à necessidade de se transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2010/48/EU, da Comissão, de 5/7/2010, tivesse em preparação - aparentemente, no 1.º semestre de 2012 - o novo regime jurídico a que se submeteria a inspecção técnica de veículos, regime que afinal começou a implantar-se em Julho desse ano, com a edição do DL n.º 144/2012, de 11/7, e a Portaria n.º 221/2012, de 20/7, e que veio alargar o universo dos veículos sujeitos a inspecção e o âmbito dos requisitos técnicos que, para tanto, os centros haveriam de possuir. Assim, a paralisia do procedimento administrativo agora em causa - e, porventura, de outros similares - prendeu-se com a tentativa de harmonizar, e «ab origine», os centros que abririam com as exigências técnicas que a Directiva antecipava e que a legislação nacional, em prossecução do interesse público, consagraria a breve trecho. Nesta conformidade, o atraso em que o IMT incorreu não foi fruto de mera negligência ou capricho, e antes apresenta uma justificação que ainda se ancora na satisfação do interesse público. Ademais, tal atraso só verdadeiramente se apresenta como tal até Julho de 2012 - ocasião em que a emergência dos referidos diplomas já começava a pôr em causa a conclusão dos procedimentos pendentes. E esse atraso de cerca de sete meses é também desvalorizável, mesmo que só numa restrita parte, pelo pormenor do procedimento ser da iniciativa da autora, o que significa que ele se iniciou e correu sem que o IMT houvesse enunciado, num qualquer momento, uma vontade expressa de contratar. Deste modo, não vemos que o incumprimento de prazos procedimentais por parte do IMT, aliás num «quantum» inferior ao denunciado, careça de justificação à luz dos interesses públicos prosseguidos por tal instituto. Donde se segue que tal atraso, não sendo excessivo nem irrazoável, não é fautor de um dever de indemnizar.
Assim, a autora não pode invocar a ofensa das normas relativas aos prazos, aliás de cariz puramente formal, para fundamentar o pedido indemnizatório que dirige ao IMT. Como, igualmente, não pode fundá-lo - nem, em boa verdade, o fez - numa ilicitude derivada da violação directa de um qualquer direito subjectivo seu. Portanto, não é possível divisar, no incumprimento de prazos por parte do IMT, uma conduta omissiva predicável como ilícita e, por via disso mesmo, justificadora, em termos de responsabilidade civil, da procedência do pedido indemnizatório formulado, Donde se conclui que a presente acção soçobra «in toto».»
Concordamos inteiramente com esta jurisprudência que é transponível para a situação dos presentes autos, sem necessidade de quaisquer outras ponderações…” [disponível para consulta online em www.dgsi.pt] – sublinhado nosso.
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E continua a decisão do TAF de Braga, repetindo, de certo modo, o que havia transcrito do s Ac. do STA…
“Em suma, após a publicação do Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de Fevereiro, reitera-se que o Réu não tinha qualquer base legal para (a) proceder à publicação da lista de ordenação final das candidaturas, (b) nem para celebrar de qualquer contrato administrativo de gestão de CITV´S. Com efeito, o Réu limitou-se a dar execução ao consignado num diploma legal; pelo que qualquer outra opção - que não fosse anular o procedimento concursal em questão nos autos - afigurar-se-ia manifestamente ilegal.
Sendo que a anulação de tal procedimento iniciado, ao abrigo da Lei n.º 11/2011, ocorreu no estrito cumprimento de um diploma legal, não tendo sido por vontade discricionária do Réu. Por conseguinte, forçosamente, se constata que o Réu não praticou qualquer acto ilícito e culposo pelo qual deva ser responsabilizado nos termos legais. Ademais, sempre se diga, que o Réu não impôs à Autora qualquer sacrifício anormal e especial. Isto porque, todos os investimentos que fez para poder exercer a actividade de inspeção foram feitos por sua própria iniciativa; não se olvidando que um sacrifício especial e anormal consiste num sacrifício que não seja imposto à generalidade das pessoas atual (não eventual) e duradouro. Sendo necessário que, de um modo voluntário e final, exista um acto que se dirige à produção de um dano na esfera de outrem - o que não ocorreu no caso em apreço. Da mesma forma, o agente lesante tem a certeza consciência e vontade de causar um prejuízo - o que também não se verificou no caso dos autos. E, para que o acto seja ilegal é necessário que o sacrifício dele resultante se traduza num ataque grave contra determinado direito e não apenas uma simples limitação de um direito subjectivo. É, pois, necessário que o sacrifício tenha dignidade indemnizatória traduzindo-se na ablação ou limitação substancial de um direito e que seja imposto no interesse público. O que acarreta necessariamente a existência de uma relação de causalidade entre o acto ilícito e o dano – o que também não se verifica no caso em apreço. Pelo que inexistindo conduta ilícita por parte do Réu, o mesmo não incorre na obrigação de indemnizar a Autora pelos seus pretensos danos hipotéticos que não seriam passíveis de indemnização”
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Seguidamente, depois de fazer uma explanação dogmática e genérica acerca dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, continua, finalizando:
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Ora, compulsada a factualidade supra julgada provada em 1) a 26), constata-se que, no caso em apreço, não ocorre a verificação cumulativa dos pressupostos determinantes da responsabilidade civil extracontratual do Réu por actos ilícitos e culposos nem por pretensos (inexistentes) prejuízos anormais e especiais decorrentes da função legislativa.
Soçobra, assim, in totum, a pretensão da Autora formulada nos autos. Pelo que, sendo o acto impugnado legal, válido e eficaz na ordem jurídica, deverá manter-se; não podendo este Tribunal condenar o Réu no petitório condenatório que contra si foi formulado pela Autora, nos termos supra expostos”.
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Analisada a douta argumentação da recorrente, pese embora, numa primeira análise, seja conducente a uma reversão da decisão da 1.ª instância, verificamos que toda a argumentação já foi rebatida pelo STA, em termos que nos parecem ser suficientes – pese embora, nesta data, já com cerca de 7 anos, ainda se mostrem actuais e aplicáveis, na sua plenitude, ao caso dos autos.
Se, na verdade, atento o n.º1 do art.º 4 do Dec. Lei 26/2013, de 19/2, se tornaria manifestamente ilegal a prática, pelo IMT,IP, de quaisquer actos como os pretendidos pela A./Recorrente, vertidos nos pontos b), c) e d) do petitório Nas quais se peticiona:
b) Que fosse reconhecido e declarado que a A. tem direito a que seja celebrado o contrato de gestão para a abertura do centro de inspecções de Terras do Bouro, em virtude de a sua candidatura ter sido admitida e aprovada e de ser o único candidatura que fora apresentada;
c) Que fossem condenados os dois primeiros Réus a proceder à celebração do contrato de gestão com a A. para a abertura do centro de inspecções em Terras do Bouro, tanto mais que a sua situação não é subsumível à provisão do nº 1 do artº 4º do Dec. Lei 26/2013 e, se o fosse, tal preceito era materialmente inconstitucional;
d) Anulada a decisão que, em 27 de Fevereiro de 2013, declarou anulado o procedimento de candidatura à celebração do contrato de gestão para o Centro de Inspecções de Terras do Bouro;
, supra transcritos em sede de Relatório, também, falece o pedido indemnizatório, por inexistência da ilicitude motivante da culpa inerente à responsabilidade civil extracontratual dos entes públicos.
E a razão desta conclusão estriba-se na argumentaria contida, em especial nos Acs. do STA de 20/3/2014, transcrito, em parte, no de 29/4/2014, cuja tecnicidade e eloquência dispensam outras considerações.
Na verdade, com o Dec. Lei 26/2013 foram exigidas novas técnicas de que dependeria a abertura dos novos centros de inspecção técnica de veículos, nomeadamente por alargamento do universo de veículos a inspecionar, inexistentes na anterior regulamentação, as quais, sendo imediatamente aplicáveis aos procedimentos em curso, iniciados sob o regime previsto na Lei revogada - 11/2011, de 26/4, importavam que os procedimentos em curso --- ainda com listas provisórias aprovadas, em sede de apreciação de pronúncias em sede de audiência prévia – que não definitivas --- não pudessem, de todo, outorgados quaisquer contratos de gestão, até porque as candidaturas e condições técnicas apresentadas não estavam objectivamente de acordo com os novos requisitos e condições técnicas.
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Deste modo, não se pode asseverar que o acto administrativo – enquanto aplicável aos procedimentos concretos em curso – possa ofender quaisquer princípios sejam eles a nível constitucional ou sub constitucional, ou seja, legais, pelo que inexiste o requisito cumulativo ilicitude para verificação e positivação da responsabilidade civil extracontratual.
Como se refere e justifica no Ac. de 20/3/2014 – base de todos os demais – a circunstância do IMT não ter observado certos prazos procedimentais, de cariz meramente ordenador ou disciplinador, não envolve uma ilegalidade traduzível em omissão ilícita, geradora de responsabilidade civil, sendo que, embora a previsão desses prazos tivesse secundariamente em vista a protecção dos interesses dos candidatos aos centros de inspecção, a sua índole formal impede que se possa estribar uma pretensão indemnizatória na simples inobservância desse prazos.
Assim, como também se refere no aludido aresto do STA, uma vez que essa inobservância não adveio de pura negligência ou capricho – esperava-se a alteração legislativa, em cumprimento de legislação europeia vinculativa para os estados membros -, não foi excessiva e é ainda explicável pela necessidade de prossecução do interesse público, pelo não podemos daí retirara um qualquer dever de indemnizar.
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Em terminus conclusivos, rejeitam-se, assim, todas as argumentações da recorrente, impõe-se apenas e sem necessidade de outras considerações, por manifestamente despiciendas, a improcedência do recurso jurisdicional e consequente manutenção da sentença do TAF de Braga.

III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
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Custas pela recorrente.
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Notifique-se.
DN.
Porto, 17 de Dezembro de 2021

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Conceição Silvestre