Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:
RELATÓRIO
«AA», residente na Rua ... ..., instaurou ação administrativa contra MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, «BB», «CC», «DD», «EE», «FF», funcionários do Ministério da Educação e com domicílio profissional na Avenida 24 de julho, 142, ... ..., «GG» E «HH» E «II», com domicílio profissional na Rua ..., ... ..., formulando os seguintes pedidos:
“(...) a) Declarar-se ser os Réus condenados a pagarem solidariamente ao Autor o montante de € 100.000,00 (cem mil euros) a título de dano causado pelos factos alegados nos art.°s 65.° a 81.° supra;
b) Declarar-se ser o 1.° Réu condenado a reconhecer o direito do Autor à aposentação reportada a 16.12.2003, conforme o alegado no art.°s 83.°, 84.° e 85.° supra;
c) Declarar-se serem os Réus condenados a pagarem solidariamente ao Autor a quantia de € 270.999,18 (duzentos e setenta mil, novecentos e noventa e nove euros e dezoito cêntimos) a título de dano causado pelos factos alegados nos art.°s 82.° a 86.° supra;
d) Declarar-se ser os Réus condenados a pagarem solidariamente ao Autor o quantitativo a liquidar em execução de sentença e correspondente aos montantes a título de pensão de aposentação que se vencerem desde 14.07.2010 até ao efetivo e integral pagamento tal como vem alegado nos art.°s 82.° 87.° supra;
e) Declarar-se ser os Réus condenados a pagarem solidariamente ao Autor a quantia de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) a título de danos não patrimoniais pelos danos causados pelos factos alegados nos art.°s 65.° a 131.° supra;
f) Condenar-se os Réus nas custas e no mais que for de Lei (...)”
Foi realizada audiência prévia (fls. 1564 do SITAF) e, de seguida, proferido despacho saneador, que decidiu pela inutilidade superveniente da lide parcial quanto aos pedidos nas alíneas b) e de parte do pedido elencado sob a alínea d) - o quantitativo correspondente aos montantes a título da pensão de aposentação que se venceram a partir de 01/10/2011 até ao efetivo e integral pagamento (alínea d) do petitório), prosseguindo os autos para conhecimento dos demais pedidos, ou seja, pedidos das alíneas a), c) (neste até 30 de Setembro de 2011), d), e) e f), ficando, assim, prejudicado o conhecimento da exceção do caso julgado. Decidiu, também, o indeferimento do incidente de intervenção subsidiária do SINDEP e das exceções da ilegitimidade passiva dos réus «GG», «HH» e «II» e «FF», bem como da ineptidão da petição inicial. Determinou, ainda, a absolvição do Ministério da Educação por falta de personalidade judiciária e a improcedência da exceção perentória da prescrição, tendo sido proferidos os despachos destinados a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas de prova a submeter a audiência final.
Por requerimento a fls. 2824 do SITAF veio o Autor desistir dos pedidos formulados contra a demandada «EE».
Por sentença a fls. 2832 do SITAF foi considerada válida a desistência apresentada pelo Autor absolvendo-se a demandada «EE» do pedido.
Por decisão proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada improcedente a ação administrativa e absolvidos os Réus dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
1º) Reclama-se a modificação da matéria de facto dada como provada nos termos e com os fundamentos expostos na parte III das presentes alegações de recurso, cuja motivação, por uma questão de metodologia e economia processual aqui dá como integralmente por reproduzida, devendo em consequência:
a) Aos factos dados como provados e referenciados da douta sentença em recurso, sob os nºs 41, 43, 44, e 48, deve ser aditada a matéria factual pretendida pelo Autor ora Recorrente, atendendo-se os fundamentos que para o efeito se invocam;
b) Aos factos dados como provados deve ser aditada os factos indicados pelo Autor ora Recorrente, atendendo-se os fundamentos que para o efeito se invoca.
c) Por erro de julgamento e tendo em conta os fundamentos invocados, os factos dados como não provados sob a referência F), H), K). L), M), N), O), R), S), T) e V) ao contrário do decidido devem ser dado como provados.
2°) Interpretação do artigo 498°, n° 3 do Código Civil que para efeito do seu preenchimento normativo considere a data do acto confirmativo (no caso a data de 29.01.2003) e não a data da decisão jurisdicional anulatória (no caso a data de 27.09.2007), padece de inconstitucionalidade material por violação do principio constitucional da tutela efectiva, formal e materialmente consagrada no artigo 268°, n° 4 da CRP;
3°) Juridicamente será discutível, atenta a natureza distinta, a aplicação dos efeitos da prescrição penal na contagem e conhecimento da prescrição civil, no entanto e mesmo assim, o Tribunal “a quo” erra na consequente contagem tendo em conta a existência de actos suspensivos e interruptivos previstos nos artigos 120° e 121° do Código Penal.
4°) Tendo em conta o processo de inquérito n° 487/07.... que culminou em 05.02.2009 com o despacho de arquivamento, nos termos do disposto no artigo 277°, n° 2 do C.P. Penal, tendo, porém sido requerida a instrução, o prazo de prescrição do n° 1 do artigo 498° do CC foi interrompido e só começou a correr nos termos do disposto no artigo 326° do Código Civil, pelo que dúvidas não restam que o Tribunal “ a quo' decidiu de forma errada a excepção peremptória da prescrição e, por isso é de direito e de justiça a sua reversão.
5°) O Tribunal “a quo” não só errou no conhecimento e aplicação da excepção de comportamento alternativo licito excluindo, em consequência, a imputação causal, mas também omitiu juízo critico e dogmático sobre o núcleo da questão que se traduz em saber se os pressupostos do artigo, 42°, n° 1 do Estatuto Disciplinar configuram natureza essencial e, em sequência, apurar e ajuizar se o acto que o TCAS, 1° Juízo Liquidatário, conheceu, declarou e invalidou por sentença proferida no processo que aí correu termos sob o n° ...08/2003, assume a natureza de uma formalidade essencial.
6°) A norma do artigo 42°, n° 1 do Estatuto Disciplinar emanação directa do artigo 32°, n° 1 e 5 da CRP, destinando-se a garantir a estrutura acusatória do processo disciplinar, o exercício do contraditório e o direito de audição e defesa do arguido e, por isso, em vinculação jurídica e essa densidade axiológica e normativa fulmina com nulidade os actos que se alheiem a essa imposição, duvidas não restarem to que o acto que o TCAS, 1° Juízo Liquidatário, conheceu, declarou e invalidou por sentença proferida no processo que aí correu termos sob o n° ...08/2003, assume a natureza de uma formalidade essencial.
7°) Estando em causa no plano procedimental direitos fundamentais, como aqui acontece, exclui-se e é inaplicável a excepção do comportamento licito, na medida em que os direitos, liberdades e garantias procedimentais estão sempre protegidos ao nível do ressarcimento dos danos no plano procedimental, porque assim é, o acto da administração anulado por sentença do TCAS, 1° Juízo Liquidatário, no processo n° 7208/2003, além de ilícito e culposo e causador de danos como se decidiu, é também causal e imputável ao nível da ilicitude e da culpe, encontrando-se assim, reunidos todos os pressupostos da responsabilidade civil e a consequente, obrigação de indemnizar.
8°) Sem prejuízo, mas conexionado com esta questão, refere-se que o princípio do dispositivo veda ao Tribunal o conhecimento oficioso da excepção do comportamento alternativo licito, sendo que no caso ora aqui em recurso, a administração está onerada com a alegação e a prova dessa excepção, na medida em que materialidade factual ínsita no documento junto com pelo Autor com a petição inicial sob o n° 5, cujo aditamento à matéria de facto dada como provada é sugerido no presente recurso, o Autor/ lesado prova que os danos verificados estão abrangidos pela esfera do risco assumido a montante pela Administração no momento da prática da conduta ilícita em causa e, por isso, será a Administração lesante que deve suportar o “ónus da prova” da excepção do comportamento alternativo licito, pelo que também pelo plano probatório se mostra excluída a excepção do comportamento alternativo licito e consequente erro de julgamento por violação das regras de direito probatório material.
9°) Não é posto em causa a autonomia entre o processo disciplinar e o processo criminal, o que se questiona é o critério da “ eficácia da decisão penal absolutória” na tutela jurídica dos artigos 623° e 624° do Código do Processo Civil e por força destas imposições legais o juízo penal interfere na apreciação civil através da figura da presunção legal, daí e tal como vem suscitado, a relevância do aditamento à matéria de facto dada como não provada no processo criminal que correu termos no 1° Juízo do Tribunal de ... sob o n° 61/03.0, que foi causa de exclusão de culpa e consequente absolvição do Autor.
10°) Da decisão ora em recurso não se descortina a ilisão de tal presunção legal e assim sendo, o decidido em sede penal está por natureza fixado, com reflexos na exclusão da ilicitude e culpa do Autor ora recorrente e ao invés, demonstrada a ilicitude e a culpa dos demandados, tal como demonstrado se mostra o nexo de causalidade, na media em que Autor alegou e provou, conforme decorre da matéria de facto dada como provada e como lhe competia, a condicionalidade dos danos em consequência da conduta ilícita e culposa, ao passo que os demandados não provaram, conforme decorre da matéria de facto dada como provada e como lhes competia, nos termos do disposto no artigo 563° do CC, a inadequação da conduta lesiva, pelo que ao invés do decidido, encontra-se verificada esta causa de ilicitude e culpa e, bem assim, verificado o nexo causal quanto aos factos e quanto aos danos e consequentemente verificados todos os pressupostos da obrigação de indemnizar.
11°) Há data da verificação e consumação dos factos disciplinares imputados ao Autor, vigorava a Lei 115/97 de 19/09 ( Diploma que alterou a Lei de Bases do Sistema Educativo), cujos artigos 2°, n° 2 e 13°, n° 6, revogou o artigo 55° do Decreto Lei 139/A/90 de 28.04 (Estatuto da Carreira Docente) e, por isso, o Despacho Regulamentar 243/ME/96 que regulamentava esse mesmo artigo 55°, caducou, nos termos da norma do artigo 112°, n°2 da Constituição da Republica Portuguesa ( CRP), deixando de ter operacionalidade e validade, ao invés a Portaria 469/95 de 17/05 ( Diploma que autoriza a Escola Superior ... a ministrar o curso superior de educação visual) apenas caducou e deixou de ter operacionalidade e eficácia, com a entrada em vigor do Decreto Lei n° 74/2006 de 24/03 que procedeu à regulamentação da norma do n° 6 do artigo 13° da Lei 115/97 de 19/09 ( Diploma que alterou a Lei de Bases do Sistema Educativo).
12°) Os demandados, ao sustentar, avaliar e punir conduta do Autor em diploma sem operatividade e ao agir com falta de rigor quer na instrução quer na conclusão do procedimento disciplinar, descurando a relevância da prova e legalidade dos factos integrativos da infracção disciplinar com total alheamento à densificação dos parâmetros da justiça, em clara colisão com o princípio constitucional da presunção da inocência, formalmente consagrado no artigo 32°, n° 2 da CRP e de constitucionalidade jurídica vinculada por imposição do artigo 18° da CRP, praticaram uma conduta, ilícita e culposa causadora de violação de direitos e de danosa que conduz em sede de responsabilidade civil à obrigação de indemnizar.
13°) A Doutrina fixada no Parecer da Procuradoria da Republica de 7-12-95-Processo 24/1995 vai no sentido de não excluir a legitimidade e o juízo de oportunidade da administração na valoração dos factos como criminais, no entanto estabelece parâmetros a esse limite tendo em conta o principio da presunção da inocência, como não podia deixar de ser, tendo em conta a densidade axiológica e normativa do artigo 32, n° 2 da CRP e, nessa medida, impõe à administração a elisão da presunção da inocência.
14°) Onerada com a prova dos factos constitutivos da infracção e tendo em conta os princípios garantistes e o dever de fundamentação consagrados nos artigos 32° e 268°, n° 3 da CRP, a valoração e a decisão dos factos apurados em sede disciplinar como constitutivos de crime, exige e impõe em protecção aos direitos fundamentais do arguido, que os eventuais pressupostos criminais e as possíveis causas de justificação do ilícito e exclusão da culpa sejam criticamente valorados e dissecados até ao pormenor, não se compadecendo, como aconteceu no caso sub judice, a uma inserção mecânica, automática, casuísta e atomista no tipo criminal;
15°) Resulta da matéria de facto dada como provada que o acto decisório que determinou a convolação criminal do quadro fáctico apurado em sede de procedimento disciplinar, não seguiu o rigor que as garantias constitucionais a que está vinculada a administração no âmbito na perseguição disciplinar e sancionatório e, por isso, não só violou o limite ponderativo a que se refere o Parecer da Procuradoria da Republica de 7-12-95-Processo 24/1995, como não diminuiu ou anulou o risco de uma decisão contrária e absolutória em sede de processo penal, como efectivamente veio a acontecer com o decidido no processo crime que correu termos no 1° Juízo do Tribunal de ... sob o n° 61/03.0 em que o Autor por via da certidão extraída no procedimento disciplinar foi absolvido da prática dos crimes de peculato e abuso de poder.
16°) Tal conduta é constitutiva da obrigação de indemnização pelos danos em sede de responsabilidade civil extra contratual, por se encontrarem verificados todos os pressupostos exigíveis, nomeadamente, o nexo de causalidade, configurado numa imputação objectiva por violação ilícita e culposa da tutela do direito disciplinar punitivo em desrespeito ao dever objectivo de cuidado consagrado no artigo 32°, n° 2 da CRP .
17°) Conforme resulta da petição inicial e, bem assim, do decidido, em sede de despacho saneador, além dos pedidos genéricos de natureza patrimonial e extra patrimonial, são igualmente formulados pedidos autónomos pelo biológico na vertente patrimonial e na vertente extra patrimonial e, ainda, pelo dano da perda de chance em consequência do impedimento causal no preenchimento do requisito previsto no artigo 121°, n° 2 do Estatuto da Carreira Docente, daí a relevância e essencialidade do aditamento à matéria de facto que vem reclamada e sugerida no presente recurso.
18°) No caso dos presentes, tendo em conta os pedidos formulados, e a matéria de facto dada como provada, é legítimo, de direito e de justiça, reconhecer ao autor a reversibilidade tanto do dano biológico como do dano da perda de chance, autonomizados, em relação aos restantes danos patrimoniais e extra patrimoniais que são genéricos.
19°) No que concerne ao dano biológico a situação objectivada no presente processo aponta para uma vertente patrimonial no período compreendido entre 25.o7.2002 a 20.07.2011 (data da instauração do procedimento disciplinar e a data da concessão da reforma), na medida em que o Autor durante este período em consequência do processo disciplinar, entrou em fase degradativa, tal como verte da matéria de facto dada como provada conjugada com os exames periciais elaborados nos presentes autos, o que implicou um esforço no âmbito profissional, social e familiar superando de longe a normalidade.
20°) No que concerne ao dano da perda de chance, o Autor apesar de reunir os pressupostos para a atribuição da aposentação, não a conseguiu obter, por causa do processo disciplinar, por ausência do requisito imposto no nº 2 do artigo 121º do Estatuto da Carreira Docente, apesar de ter obtido ganho de causa no Processo 409/04 BEPNF TAF, o que só conseguiu em 30.05.2011 conforme verte dos documentos junto aos autos e, dai, a relevância da reclamação da matéria de facto e o pedido de aditamento formulado nas presentes alegações de recurso.
21°) Tendo em conta a matéria dada como provada e o principio estabelecido no artigo 566°, n° 3 do Código Civil é de direito e de Justiça autor ser compensado em equidade pelos danos autónomos biológico ( vertente patrimonial e extra patrimonial) da perda de chance (vertente patrimonial e não patrimonial) e, bem assim, pelos danos genéricos (patrimoniais e extrapatrimonias) na quantia pedida em sede de petição inicial.
22°) A douta decisão ora em recurso, violou entre outros, 18°, 32° e 268°, n° 3 e 4 da CRP; artigo 6° da D.U.D.H; Lei 115/97 de 19/09; Decreto-lei 115/97 de 19/09; artigos 323°, 326°, 327°, 342° 498°, 563° todos do Código Civil e artigos 623° e 624° do Código do Processo Civil
Pelo que deve o presente recurso, merecer integral provimento.
No que farão a Inteira e Costumada.
JUSTIÇA.
Entretanto o Autor e Recorrente veio, nos termos do disposto no artigo 249° do Código Civil, rectificar a 1ª e 20ª conclusão das suas alegações de recurso, com os seguintes fundamentos:
Por erro evidente na 1ª (primeira) conclusão, fala-se em acto consolidativo, quando se pretende dizer acto confirmativo, conforme claramente o é referido no corpo das alegações (conferir pág 4).
Por outro lado:
Por erro evidente as conclusões das alegações 19° e 20°, estão repetidas, pelo que de harmonia com o conteúdo ínsito nas alegações (conferir pág. 13) o teor da conclusão sob o n° 20 deverá ser substituído pela seguinte redacção e conteúdo:
Conclusão 20º) No que concerne ao dano da perda de chance, o Autor apesar de reunir os pressupostos para a atribuição da aposentação, não a conseguiu obter, por causa do processo disciplinar, por ausência do requisito imposto no n° 2 do artigo 121° do Estatuto da Carreira Docente, apesar de ter obtido ganho de causa no Processo 409/04 BEPNF TAF, o que só conseguiu em 30.05.2011 conforme verte dos documentos junto aos autos e, dai, a relevância da reclamação da matéria de facto e o pedido de aditamento formulado nas presentes alegações de recurso.
Os Réus «BB», «CC» e «DD» juntaram contra-alegações, sem conclusões, finalizando assim:
Consequentemente, dada a prévia improcedência da matéria de facto, não havendo questões de natureza oficiosa, nada mais terá este Tribunal a apreciar.
TERMOS EM QUE, negando-se a apelação se fará justiça.
O Ministério Público na ação administrativa identificada à margem que «AA» move ao Estado Português e outros também apresentou contra-alegações, concluindo:
1 - Na presente ação, pretende o Autor responsabilizar o Réu Estado Português pelos danos patrimoniais e não patrimoniais provocados no seguimento do processo disciplinar que contra ele foi instaurado, a apurar nos termos do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, publicado no Decreto-Lei n.° 48051, de 21/11/1967.
2 - Em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado - artigo 5.°, n.° 1, do mencionado Decreto-Lei n.° 48051, de 21 de novembro, conjugado com o art.° 498.° do C.C. – na situação do autos o Autor não beneficia do prazo prescricional mais longo mas somente do prazo geral de 3 anos;
3 - Tal prazo prescricional teve o seu início em 29/01/2003 e atingiu o seu termo em 29/01/2006, muito antes da participação criminal apresentada pelo Recorrente contra os Réus, que foi em 11/6/2007, e que seria a única causa que teria a virtualidade de interromper o prazo da prescrição.
4 - A sentença do Tribunal a quo ao ter decidido que, no caso concreto, não se verificava o pressuposto do nexo de causalidade adequada, fez correta avaliação, interpretação e aplicação da matéria de facto apurada em audiência de julgamento com as disposições entre si conjugadas dos artigos 483.° e sgts. do Código Civil.
5 - A teoria da causalidade adequada assenta num juízo de prognose póstuma a empreender pelo julgador, tendo em conta as circunstâncias cognoscíveis à data dos factos por um observador experiente;
6 - Os alegados danos nunca poderiam considerar-se ter sido causados pela apontada ilicitude, ocorrida no processo disciplinar em que o Autor era visado, pela preterição da audiência de interessados, por se tratar de um mero vício de forma ou de violação de lei.
7 - Nesta conformidade, deve o recurso improceder e a douta sentença recorrida ser mantida.
No entanto, decidindo, farão, como habitualmente,
Justiça
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. O Autor é detentor do Curso de Formação Eletromecânica – cf. fls. 22 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
2. O Autor iniciou funções de docente na Escola Secundária ... no ano letivo de 82/83 – cf. fls. 22 verso do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
3. Em data não concretamente apurada, mas pelo menos em 1985, o Autor concluiu o Curso de Complemento de Formação – cf. fls. 22 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
4. Em 11/12/1998 o Autor concluiu o Curso de Estudos Especializados em Educação Visual e Tecnológica – cf. fls. 21 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
5. O Autor exerceu funções de Presidente do Conselho Diretivo da Escola Secundária ... entre os anos letivos de 1982/1983 e 1996/1997– cf. fls. 23 verso do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
6. O Autor exerceu funções de Presidente do Conselho Executivo da Escola Secundária ... entre os anos letivos de 1997 a 2002 – cf. fls. 23 verso do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
7. Entre 18/02/1997 e 03/11/1997 o Autor, na qualidade de Presidente do Conselho Executivo, remeteu à Direção Regional da Educação do Norte, ofícios com o assunto “ARTIGOS 54.º E 55 DO ECD(...)” relativos a reposicionamentos na carreira das docentes «JJ» e «KK» - cf. fls. 57 a 59 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
8. Em data não concretamente apurada, mas pelo menos em 01/01/99, o Autor entregou nos serviços administrativos da Escola Secundária da ... o certificado de habilitações do curso referido no ponto 04) - cf. fls. 111 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
9. Em 01/01/99 e até 31/08/2002 o Autor passou a auferir uma remuneração equivalente ao 10.º escalão da Estrutura da Carreira Docente – Facto não controvertido.
10. O Autor, antes de 01/01/99, não remeteu ao Diretor Regional de Educação do Norte requerimento de reposicionamento na carreira - Facto não controvertido.
11. Em 09/09/1999 o Autor, na qualidade de Presidente do Conselho Executivo, remeteu à Direção Regional da Educação do Norte, um ofício com o assunto “ART.° 55 DO ECD – Despacho n.° ...6 de 31 de Dezembro com as alterações introduzidas pelo Despacho n.° ...8 de 17 de Julho e pelo Despacho n.° ...9 de 01 de Julho” do qual se extrai, ademais, o seguinte: “(...) Dando seguimento ao ofício ...21 de 29/07/99, junto envio a V.Ex.ª o requerimento da Docente do Q.N.D. «KK», a fim de proceder a uma nova reapreciação quanto ao reposicionamento na carreira, art.° 55 do ECD-Desp. 243 ME 96 de 31.12 (...)”- cf. fls. 60 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
12. Em 31/01/2001 o Autor, na qualidade de Presidente do Conselho Executivo, remeteu ao Diretor Regional da Educação do Norte, um ofício com o assunto “REPOSICIONAMENTO NA CARREIRA”, do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) Segue em anexo o pedido de Reposicionamento na Carreira, do professor do Quadro de Nomeação Definitiva, «LL» (...)” - cf. fls.56 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
13. Em 03/05/2002, na sequência de uma exposição subscrita em 28/12/2001 por docentes do 7° e 8° grupos de docência do ensino básico e/ou do 12° grupo de docência do ensino secundário da Escola EB 3/S de ..., o Delegado Regional do Norte da IGE, por despacho, determinou a instauração do processo de averiguações n° ...0.05/106/02 ao Autor. – cf. fls. 4 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
14. Em 06/05/2002 foi nomeado instrutor, «BB», no processo n.° ...2..., pelo Delegado Regional do Norte – cf. fls. 61 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
15. Em 14/05/2002 foi elaborado, pelo instrutor referido no ponto anterior, um “Auto de Exame” do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) foi-me dado examinar exaustivamente todos os documentos constantes do Processo Individual do Senhor Professor «AA», Presidente do Conselho Executivo da Escola, incluindo o respectivo registo biográfico, não constando desse Processo o requerimento a que se refere o n.° 4 do Despacho 243/ME/96, publicado no Diário da República II Série, n.º ...02, de 31/12/96; do mesmo Processo consta o certificado de habilitações emitido pela Escola Superior de Educação de ..., comprovando que o acima referido professor concluiu em 11/12/1998 o Curso de Estudos Superiores Especializados em Educação Visual e Tecnológica, sendo reconhecida equivalência ao Grau Académico de Licenciado em Educação Visual e Tecnológica.(...)” – cf. fls. 61 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
16. Em 15/05/2002 foi remetido, pelo Autor na qualidade de Presidente do Conselho Executivo da Escola Secundária ..., ao Diretor Regional de Educação do Norte, um ofício com o assunto “Reposicionamento na carreira”, acompanhado de requerimento de reposicionamento na carreira – cf. fls. 53 e 54 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
17. Em 20/05/2002, foi elaborado, pelos serviços da delegação Regional do Norte da Inspeção Geral da Educação, em que é inspetor nomeado o referido no ponto 14), e arguido o Autor, o “Auto de Declarações” do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) Perguntado sobre se tinha conhecimento de que o seu eventual reposicionamento estava dependente de requerimento dirigido ao Senhor Director Regional de Educação do Norte, por força do disposto no n.º 4 do Despacho 243/ME/96 de 31 de Dezembro, respondeu que não tinha até ao passado dia catorze conhecimento da norma legal que obrigava a esse requerimento, pelo que julgava que o reposicionamento era automático a partir do momento em que fizesse a entrega nos serviços administrativos da escola das habilitações que entendia necessárias para o concretizar; --------------------------------------
----- Perguntado sobre se possuía o entendimento de que a escola, através do respectivo Presidente do Conselho Executivo, detinha competência para homologar o reposicionamento salarial na carreira, independentemente da intervenção da Direção Regional de Educação, respondeu que sim;--------------------------------------------------------
----- Perguntado sobre se era seu entendimento, à data de treze de Janeiro de mil novecentos e noventa e nove, data em que fez entrega nos serviços administrativos da Escola E.B.3/S da ..., que o Certificado de Habilitações do Curso de estudos Superiores Especializados em Educação Visual e Tecnológica, emitido pela Escola Superior de Educação de ..., lhe permitia o reposicionamento salarial na carreira, com o acesso ao 10.º escalão do vencimento, respondeu que sim; aliás, obteve esse entendimento também no âmbito de uma reunião de vários professores então inscritos no Curso com a Direcção Superior de Educação de ... e com o coordenador do Curso.(...)” – cf. fls. 75 e 76 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
18. Em 07/06/2002 foi elaborada, pelo Inspetor Geral da Inspeção Geral da Educação, «MM», a informação n.° ...2...(AJD), no âmbito do processo n.° ...2..., com o assunto “Processo de Averiguações na Escola EB3/S de ..., Concelho ..., acerca de eventual irregularidade no processo de reposicionamento na carreira do docente e Presidente do Conselho Executivo (PCE), «AA»”, da qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...)
Conclui, em síntese, o Senhor Averiguante:
3.1. que “os comportamentos do docente «AA», simultaneamente Presidente do Conselho Executivo e do Conselho Administrativo (...) configuram uma sucessão de infracções disciplinares por violação dos deveres das funções que exerce;
3.2.que os referidos comportamentos põem em causa o dever geral de “criar no público confiança na acção da Administração Pública, em especial no que à sua imparcialidade diz respeito”;
3.3.que o dito docente e PCE terá violado também os deveres de isenção, zelo e lealdade, demonstrando, mesmo, “tratamento de favor de determinada pessoa, ele próprio, neste caso”.
4. Propõe, em decorrência, a instauração do processo disciplinar ao referido docente e PCE, proposta que, por bem fazer a leitura dos elementos dos autos, merece inteiro acolhimento (...)" - cf. fls. 9 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
19. Em 05/07/2002 foi elaborada, pelo Inspetor Superior Principal da Inspeção Geral da Educação, a informação n.º ...02, no âmbito do processo de averiguações referido no ponto anterior, com o assunto “Processo de averiguações n.° ...0.05/106/02 (DRN-076/02-AV) na Escola EB3/S. de ... - Concelho ... - Distrito ...”, da qual se extrai, ademais, o seguinte:
"(...) 2. Tendo em vista o apuramento dos factos o Sr. averiguante promoveu as seguintes diligências instrutórias:
a) Recolheu as declarações do Sr. Presidente do Conselho Executivo da Escola Prof. «AA», constantes de fls. 48/49 e 58/59;
b) Elaborou em 14/05/002 o auto de exame de todos os documentos constantes do processo individual do Sr. Prof. «AA», Presidente do C. E. da Escola, nos termos referidos na fl. 17;
c) Integrou no P.A. os documentos descritos nos termos de juntada insertos sob fls. 19, 37, 50, 61 e 67.
3. Tendo o P.A. sido instaurado com a finalidade de se proceder ao apuramento dos factos referidos nos n.°s 9) e 10) da informação n.° ...02... - vide fl. 13, isto é, à verificação dos termos do processo que conduziu ao reposicionamento do docente «AA», Presidente do C.E. da EB3/S da ... no 10.° Escalão da respectiva escala salarial, o Sr, averiguante deu como apurados os factos enumerados no Cap. III - Factos, a fls. 73/76, sendo de evidenciar, como mais relevantes, os seguintes:
3.1.O processo de reposicionamento nos escalões salariais obriga a que o docente interessado elabore e envie ao Sr. Diretor Regional de Educação respectivo um requerimento, de acordo com o disposto no n.° 4 do Despacho 243/ME/96, publicado no D.R. n.° 302, II Série, de 31/12/96;
3.2. Conforme se pode verificar pelas folhas para pagamento a fls. 31/36 do P.A. o auto-reposicionamento salarial do Sr. Prof. «AA», também Presidente do Conselho Administrativo, produziu efeitos a partir de 01/01/99;
3.3. O prof. «AA», na qualidade de Presidente do Conselho Executivo, para além de não ter elaborado e apresentado o requerimento referido em 3.1., supra, assumiu uma competência que a lei não lhe conferiu, na medida em que se reposicionou na carreira à revelia da DREN – configurando-se tal actuação como uma manifesta violação das competências atribuídas ao Presidente do Conselho Executivo;
3.4. A referida actuação do presidente do Conselho executivo, além de implicar uma irregularidade formal/processual envolveu também a prática de uma ilegalidade de carácter substantivo por falta do requisito de habilitações exigidas, na medida em que a titularidade do Curso de Estudos Superiores Especializados em Educação Visual e Tecnológica, conforme certificado de fls. 20 e 40, não habilita neste caso ao reposicionamento na carreira ao docente «AA», que é PQND de 12.º Grupo - A/Mecanotecnia, código 27-vejam-se os anexos I-II do referido Despacho 243/ME/96-situações que não foram alteradas pelo Despacho n.º 10786 (2.ª Série) do D.R. n.º 127, II série, de 01/06/99, pg. 8087 e segs.
4. Em consequência, foram extraídas pelo Sr. Instrutor as conclusões discriminadas a fls. 77/78 que se sintetizam:
4.1 A actuação do docente «AA», simultaneamente Presidente do Conselho Executivo e do Conselho Administrativo da Escola EB3/S. da ..., indicia a prática de sucessivas infracções disciplinares por violação dos deveres inerentes às funções que exerce;
4.2. Na verdade esses comportamentos configuram infracções ao dever de isenção, ao dever de zelo e ao dever de lealdade, previstos no art.º 3.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84 de 16/01;
4.3. Essa actuação atenta ainda gravemente contra a dignidade e prestígio das funções em que o mesmo se encontra investido:
4.4. Por outro lado, entende-se que a conduta do docente «AA» implicou a prática de ilícito grave por ter faltado aos deveres dos seus cargos com intenção de obter para si benefício económico ilícito, lesando desse modo os interesses patrimoniais do Estado, que, em razão das suas funções, lhe cumpre acautelar.
5. Assim, em conformidade com a proposta final do Sr. Averiguante e de acordo com os termos da anexa informação n.º ...02... (AJD) de 07/06/02, proponho:
5.1. Que se instaure processo disciplinar ao docente «AA», presidente do C.E. da Escola EB3/S de ..., ao abrigo do disposto na alínea c) do n.° 3 do art.° 88.° do estatuto Disciplinar em virtude de lhe serem imputáveis os ilícitos descritos nos n.°s 3 e 4 antecedentes.
5.2. Que, em sede do processo disciplinar, o Sr. Instrutor proceda ao apuramento das quantias indevidamente recebidas pelo arguido com vista à sua reposição, funcionando a reposição voluntária como circunstância atenuante na graduação da pena disciplinar (...)” – cf. fls. 4 a 7 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
20. Em 15/07/2002 a Inspetora Geral da Educação da Inspeção Geral da Educação proferiu despacho de concordância com a informação referida no ponto anterior e determinou a instauração de processo disciplinar ao Autor – cf. fls. 4 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
21. Em 14/08/2002 o Delegado Regional do Norte da Inspeção Geral da Educação, nomeou como instrutor do processo disciplinar n.º ...2..., em que é arguido o Autor, o Inspetor Prof. «CC» – cf. fls. 2 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
22. Em 26/08/2002 foi remetida, pelo instrutor do processo disciplinar, ao Autor uma carta notificando-o para prestar declarações no dia 28/08/2002 – cf. fls. 19 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
23. Em 28/08/2002 foi elaborado, pelo instrutor do processo disciplinar, “Auto de inquirição de testemunhas “, em que é arguido o Autor, do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) compareceu o Professor e Presidente do Conselho Executivo, «AA», Professor do Quadro de Nomeação Definitiva, do 12.° Grupo-A da referida Escola, para este acto devidamente notificado, que prestou depoimento da forma seguinte: --------
----- Declarou que confirma as declarações prestadas nos dias vinte e vinte e um de Maio de 2002, em sede de Processo de Averiguações n.° DRN-076/02-AV, páginas quarenta e oito e cinquenta e oito do referido Processo de Averiguações, disse ainda que a progressão na carreira foi feita de acordo com o anexo I da Portaria n.° 39/94 de 14 de Janeiro, que corresponde aos anos em que os diferentes escalões podem ser atingidos e define o número de anos de permanência nos diferentes módulos, em consequência da recuperação do tempo de serviço para efeitos de Progressão na Carreira, nos termos do Artigo 142.° do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos professores do Ensino Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 139-A/90 de 28 de Abril, mais declara que a falta de resposta ao Ofício n.° ..., de 4 de Janeiro de 96, dirigido ao Senhor Diretor Regional de Educação do Norte dando conhecimento do seu posicionamento na Carreira, entendeu a Escola que estava tudo dentro da normalidade, visto tratar-se de um Professor Licenciado, conforme Certificado de Habilitações. ------------------------------------
----- Declarou ainda que exerce funções de Presidência na referida Escola há vinte anos e que se orgulha do trabalho desenvolvido em prol da Educação com reflexo a nível local e nacional e nunca ter tido influência nas decisões Administrativas que contraia-se a legislação em vigor(...)” – cf. fls. 63 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
24. Em 29/08/2002 o instrutor do processo disciplinar remeteu uma carta ao Chefe dos Serviços da Administração Escolar da Escola Secundária de ... para prestar declarações no dia 30/08/2002 – cf. fls. 68 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
25. Em 30/08/2002 foi elaborado, pelo instrutor do processo disciplinar, um “Auto de inquirição de testemunhas “, em que é arguido o Autor, do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) compareceu o Chefe dos Serviços de Administração Escolar desta Escola Secundária de ... (...)
----- Declarou que quando o Presidente do Conselho Executivo, professor «AA», Professor do Quadro de Nomeação Definitiva, do 12.° Grupo-A, quando transitou ao 10.° Escalão já era Chefe dos Serviços de Administração Escolar da referida Escola. --------------------------------------------------------------------------------------------------
----- Declarou ainda que depois de consultar documentos constantes no Processo do referido Professor verificou que o mesmo tinha sido colocado em Janeiro de 1996 no 9.° Escalão conforme ofício enviado à Direção Regional de Educação do Norte, em 4 de Janeiro de 1996 conforme anexo I da Portaria 39/94 de 14 de janeiro, possuindo nesta data vinte anos de serviço em 31 de Dezembro de 1989, tendo transitado ao 10.° Escalão, em 1 de Janeiro de 1999, conforme estipulado na mesma Portaria. ---------------------------
----- Disse ainda que tinha conhecimento que o Despacho 243/ME/96 de 31 de Dezembro obriga a que seja feito requerimento ao Exmo. Senhor Diretor Regional de Educação do Norte para reposicionamento na carreira, mas como o referido Professor transitou ao abrigo da Portaria 39/94 de 14 de Janeiro na qual apenas obriga a que se cumpra o tempo de serviço constante da mesma (...)” – cf. fls. 70 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
26. Em 11/09/2002 foi elaborada, pelo instrutor da Delegação Regional do Norte da Inspeção Geral da Educação, nota de culpa, da qual se extrai, ademais, o seguinte: “(...) «CC», Inspector na Delegação Regional do Norte da Inspecção Geral da Educação, nos termos do Artigo 57°, n° 2 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n° 24/84, de 16 de Janeiro, adiante designado, apenas por Estatuto Disciplinar, deduz na qualidade de instrutor do Processo Disciplinar mandado instaurar pela Exmª Senhora Inspectora-Geral da Educação, ao Professor e Presidente do Conselho Executivo da Escola 3/S de ..., «AA» ... e residente... ...44, ..., os seguintes artigos de acusação:
1° Artigo
Por ter progredido ao 10° Escalão a partir de 1 de Janeiro de 1999, passando a ser abonado desde essa data pelo vencimento correspondente [índice 340, previsto na Portaria n° 39/94, de 14 de Janeiro], situação em que se mantém até ao presente.
Esta progressão foi consequência de acto pelo próprio assumida na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo, como se constata nas folhas para pagamento de pessoal do quadro n° 2118 e 4870, conferidas e verificadas em 8-199 e 9-2-99, cujos pagamentos foram determinados em 22-1-99 e 22-2-99, na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo, Folhas 43 a 47 e 48 a 52, do presente Processo Disciplinar.
Esta determinação de pagamento verificou-se, igualmente, nos meses seguintes daquele ano económico e nos anos económicos seguintes até à presente data, conforme se constata na Certidão a folhas 72 e 73 do presente Processo Disciplinar.
O arguido é professor profissionalizado do Quadro de Nomeação Definitiva da Escola 3/S de ..., tendo a sua profissionalização em exercício sido concluída em 31-8-77, com a classificação de 15 valores e a habilitação académica do Curso de Formação Electromecânica, tendo ainda, posteriormente, concluído o Curso de Complemento de Formação, conforme publicação no Diário da República n° 84, de 11-4-85, com os direitos aí conferidos, assim o seu acesso ao último escalão da Carreira Docente, em 1-1-99 estava sujeito aos requisitos previstos no artigo 11° do Decreto-Lei n° 409/89, de 18 de Novembro, nomeadamente no seu número 2 e, ao previsto no artigo 55° do Estatuto da Carreira Docente, republicado em anexo ao Decreto-Lei n° 1/98, de 2 de Janeiro, pelo que a sua progressão ao 10° escalão estava dependente de requerimento ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte, conforme o regulamentado nos Despachos n° ...6 [D.R. n° 302, II Série, de 31-12-96, e Despacho n° ...7, II Série, alterado pelo Despacho n° ...7 e Despacho n° ...9, 2ª Série].
O arguido entregou, em 13-1-99, na Secretaria da Escola 3/S de ..., o Certificado de habilitações datado de 17 de Dezembro de 1998, referente ao Curso de Estudos Especializados em Educação Visual e Tecnológica concluído na Escola Superior de Educação de ... e criado pela Portaria n° 889/93, de 16 de Setembro, mas não deu cumprimento aos requisitos previstos no Despacho n° ...43...)96, com as alterações já referidas, designadamente não tendo apresentado qualquer requerimento ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte, para efeitos de progressão, quando sabia ou tinha obrigação de saber que o referente curso não era considerado para efeitos do disposto no artigo 55° do Estatuto da Carreira Docente, pois não constava do Anexo I e II do Despacho n° ...6, publicado em 31-12-96, e alterado pelo Despacho n° ...7, publicado em 1 de Abril de 1997, pelo que só poderia ser objecto de decisão fundamentada nos termos do n° 6 do Despacho n° ...6.
Com este comportamento, ilícito, o arguido violou os deveres de imparcialidade, zelo e lealdade a que se encontrava obrigado por força das alíneas b) e d) do número 4 do Artigo 3° do Estatuto Disciplinar a que constitui infracção disciplinar prevista no n° 1 do Artigo 25° do Estatuto Disciplinar e designadamente na alínea c) do mesmo Artigo, a que corresponde a pena de inactividade.
2° Artigo
A progressão do arguido ao 10° escalão determinado nos termos provados nos Autos e constantes do artigo 1° da presente nota de culpa ocorreu em violação da Lei, sendo o arguido incompetente para a determinar, faltando-lhe um elemento essencial [requerimento dirigido ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte e proposta de decisão fundamentada ao Exm° Ministro da Educação] pelo que é nulo e de nenhum efeito [artigo 133° do Código do Procedimento Administrativo], estando o arguido obrigado a repor, nos termos da Lei [Decreto-Lei n° 155/92 e legislação complementar] todas as quantias a mais e indevidamente recebidas e que de seguida se discriminam: ano económico de 1999 – 4.517,12 euros, ano económico de 2000 – 4.427,33 euros, ano económico de 2001 – 4.594,93 euros e ano económico de 2002 – 3.033,45 euros.
Fixo ao arguido o prazo de vinte [20] dias úteis a contar da data em que receber cópia desta nota de culpa para, querendo, por si ou advogado constituído consultar o processo e deduzir defesa que entender, oferecendo a prova testemunhal e documental que julgar necessária, tudo nos termos dos artigos 61°, 62° e 63° do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei n° 24/84, de 16 de Janeiro.” – cf. fls. 79 a 81 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
27. Em 12/09/2002 foi entregue ao Autor cópia da nota de culpa referida no ponto anterior – cf. fls. 85 a 87 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
28. Em 11/10/2002 foi entregue, ao instrutor do processo disciplinar, resposta do Autor à nota de culpa – cf. fls. 91 a 96 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
29. Em 23/10/2002, o instrutor do processo disciplinar, em que é arguido o Autor, elaborou Relatório Final, do qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) II – FACTOS DE ORIGEM
Este Processo Disciplinar teve origem em exposição de 28-12-2001, subscrita por docentes do 7º e 8º Grupos de docência do ensino básico e/ou do 12º Grupo de docência do ensino secundário.
1º – Por o Professor «AA», na qualidade de Presidente do Conselho Executivo não ter elaborado e apresentado o requerimento ao Exmº Senhor Director Regional de Educação do Norte, para a progressão na carreira [subida ao 10º escalão] de acordo com o disposto no nº 4 do Despacho nº ...6, publicado no D.R. nº 302, II Série, de 31-12-96.
2º – Por ter assumido uma competência que a Lei lhe não conferiu, configurando-se tal actuação como uma manifesta violação das competências atribuídas ao Presidente do Conselho Executivo.
III – DILIGÊNCIAS EFECTUADAS E FACTOS APURADOS
No desenvolvimento do Processo Disciplinar ouvi em auto de inquirição de testemunhas o Chefe dos Serviços de Administração Escolar, «NN», e o arguido «AA».
1º – Que quando o Presidente do Conselho Executivo, «AA», Professor do 12º Grupo-A, transitou ao 10º escalão já era Chefe dos Serviços de Administração Escolar da Escola S/3 de ....
2º – Que quando consultou os documentos do processo do referido Professor, verificou que o mesmo tinha sido colocado em Janeiro de 1996, no 9º escalão, conforme anexo I da Portaria n° 39/94, de 14 de Janeiro, possuindo nesta data, o referido, vinte anos de serviço em 31 de Dezembro de 1989, tendo transitado ao 10° escalão em 1 de Janeiro de 1999, conforme estipulado na mesma Portaria.
3° - Que tinha conhecimento que o Despacho n° ...6, de 31 de Dezembro, obriga que seja feito requerimento ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte para reposicionamento na carreira.
4° - Que não tinha conhecimento que a progressão na carreira [subida ao 10° escalão] dependia de requerimento dirigido ao Senhor Director Regional de Educação do Norte, por força do disposto no n° 4 do Despacho n° ...6, de 31 de Dezembro.
5° - Que possuía o entendimento, que a Escola através do respectivo Presidente do Conselho Executivo, detinha competência para homologar o reposicionamento salarial na carreira, independentemente da intervenção da Direcção Regional ....
6° - Que era seu entendimento que bastava entregar nos serviços administrativos da Escola S/3 da ... o Certificado de Habilitações do Curso de Estudos Superiores Especializados em Educação Visual e Tecnológica, emitido pela Escola Superior de Educação de ..., para ser reposicionado na carreira.
7° - Disse, ainda, que a progressão na carreira foi feita de acordo com o anexo I da Portaria n° 39/94, de 14 de Janeiro, que corresponde aos anos em que os diferentes escalões podem ser atingidos e define o número de anos de permanência nos diferentes módulos, em consequência da recuperação do tempo de serviço para efeitos de progressão na carreira, nos termos do artigo 142° do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n° 139-A/90, de 28 de Abril.
8° - Declarou, que a falta de resposta ao Ofício n° ..., de 4 de Janeiro de 1996, dirigido ao Senhor Director Regional de Educação do Norte, dando conhecimento do seu posicionamento na carreira, entendeu a Escola que estava tudo dentro da normalidade.
IV – ACUSAÇÃO
No dia 11 de Setembro de 2002, foi deduzida a acusação, contra o arguido, professor e Presidente do Conselho Executivo da Escola S/3 de ..., constituída por dois artigos que no essencial se transcrevem:
"... 1° Artigo – É acusado o arguido de ter progredido ao 10° escalão a partir de 1 de Janeiro de 1999, passando a ser abonado desde essa data pelo vencimento correspondente [índice 340, previsto na Portaria n° 39/94, de 14 de Janeiro], situação em que se mantém até ao presente.
Esta progressão foi consequência de acto pelo próprio assumida na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo, como se constata nas folhas para pagamento de pessoal do quadro n° 2118 e 4870, conferidas e verificadas em 8-199 e 9-2-99, cujos pagamentos foram determinados em 22-1-99 e 22-2-99, na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo, folhas 43 a 47 e 48 a 52, do presente Processo Disciplinar.
Esta determinação de pagamento verificou-se, igualmente, nos meses seguintes daquele ano económico e nos anos económicos seguintes até à presente data, conforme se constata na Certidão a folhas 72 e 73 do presente Processo Disciplinar.
O arguido é professor profissionalizado do Quadro de Nomeação Definitiva da S/3 de ..., tendo a sua profissionalização em exercício sido concluída em 31-8-77, com a classificação de 15 valores e a habilitação académica do Curso de Formação Electromecânica, tendo ainda, posteriormente, concluído o Curso de Complemento de Formação, conforme publicação no Diário da República n° 84, de 11-4-85, com os direitos aí conferidos, assim o seu acesso ao último escalão da Carreira Docente, em 1-1-99 estava sujeito aos requisitos previstos no artigo 11° do Decreto-Lei n° 409/89, de 18 de Novembro, nomeadamente no seu número 2 e, ao previsto no artigo 55° do Estatuto da Carreira Docente, republicado em anexo ao Decreto-Lei n° 1/98, de 2 de Janeiro, pelo que a sua progressão ao 10° escalão estava dependente de requerimento ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte, conforme o regulamentado nos Despachos n° ...6 [D.R. n° 302, II Série, de 31-12-96, e Despacho n° ...7, II Série, alterado pelo Despacho n° ...7, e Despacho n° ...9, 2ª Série].
O arguido entregou, em 13-1-99, na Secretaria da Escola S/3 de ..., o Certificado de habilitações datado de 17 de Dezembro de 1998, referente ao Curso de Estudos Especializados em Educação Visual e Tecnológica concluído na Escola Superior de Educação de ... e criado pela Portaria n° 889/93, de 16 de Setembro, mas não deu cumprimento aos requisitos previstos no Despacho n° ...6, com as alterações já referidas, designadamente não tendo apresentado qualquer requerimento ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte, para efeitos de progressão, quando sabia ou tinha obrigação de saber que o referente curso não era considerado para efeitos do disposto no artigo 55° do Estatuto da Carreira Docente, pois não constava dos Anexos I e II do Despacho n° ...6, publicado em 31-12-96, e alterado pelo Despacho n° ...7, publicado em 1 de Abril de 1997, pelo que só poderia ser objecto de decisão fundamentada nos termos do n° 6 do Despacho n° ...6.
Com este comportamento, ilícito, o arguido violou os deveres de imparcialidade, zelo e lealdade a que se encontra obrigado por força das alíneas b) e d) do número 4 do Artigo 3° do Estatuto Disciplinar a que constitui infracção disciplinar prevista no n° 1 do Artigo 25° do Estatuto Disciplinar e designadamente na alínea c) do mesmo Artigo, a que corresponde a pena de inactividade.
"... 2° Artigo – A progressão do arguido ao 10° escalão determinado nos termos provados nos autos e constantes do Artigo 1° da presente nota de culpa ocorreu em violação da Lei, sendo o arguido incompetente para a determinar, faltando-lhe um elemento essencial [requerimento dirigido ao Exm° Senhor Director Regional de Educação do Norte e proposta de decisão fundamentada ao Exm° Ministro da Educação] pelo que é nulo e de nenhum efeito [artigo 133° do Código do Procedimento Administrativo], estando o arguido obrigado a repor, nos termos da Lei [Decreto-Lei n° 155/92 e legislação complementar] todas as quantias a mais e indevidamente recebidas e que de seguida se discriminam: ano económico de 1999 - 4.517,12 euros, ano económico de 2000 - 4.427,33 euros, ano económico de 2001 - 4.594,93 euros e ano económico de 2002 - 3.033,45 euros.
V - DEFESA
Dentro do prazo marcado, o arguido apresentou a sua defesa por escrito.
Juntou rol de três testemunhas que foram inquiridas à matéria para que foram indicadas e cinco documentos.
1° - Na defesa o arguido tenta descaracterizar as infracções que lhe são imputadas, dizendo no essencial e no que à matéria da acusação diz respeito.
2° - Que o instaurar procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre a data em que a falta houver sido cometida [Artigo 4°, n° 1 do Estatuto Disciplinar].
3° - Que resulta inequívoco dos autos que a infracção foi cometida em Janeiro de 1999.
4° - Que vem o arguido acusado de ter progredido ao 10° Escalão a partir de 1 de Janeiro de 1999, e que com esta conduta ilícita aliada ao facto de tal progressão ter sido consequência de acto próprio assumida na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo, como consta nas folhas para pagamento de pessoal do quadro n° 2118 e 4870.
5° - Que o arguido não admite ter cometido a infracção de que é acusado. 6° - Diz que o desconhecimento da Lei tem de ser avaliado perante os circunstancialismos de facto e de direito que rodearam a questão do prosseguimento de estudos em 1999, que levou a que pessoas na mesma situação e que investiram tudo nesse mesmo prosseguimento se vejam agora, ou sem o seu diploma, ou com o diploma e sem o reposicionamento, ou reposicionados, ainda que mal, mas sem qualquer processo disciplinar.
7° - Que dos depoimentos prestados se não pode tirar a ilação de que o arguido teria agido de má fé, condição "sine qua non" para a existência dos ilícitos de que vem acusado.
8° - De que pelo facto do arguido ser Presidente do Conselho Administrativo não chega para se pressupor que o mesmo agiu de má fé, e muito menos quando se está perante um docente com uma longa carreira.
9° – Que não há nada no presente processo disciplinar que torne o arguido diferente de tantos outros colegas que viram o seu reposicionamento feito e convalidado pelo decurso de um ano e que por não serem Presidentes do Conselho Administrativo, não lhes foi mandado instaurar qualquer processo disciplinar. 10° – Que não há nada no presente processo disciplinar que com consistência abale o depoimento do arguido, que convicto de que tudo se estava a passar de forma legal, não fez mais do que faria qualquer outra pessoa no seu lugar.
11° – Por último pugna pelo arquivamento do processo.
VI – ANÁLISE DA DEFESA
Analisada a defesa, no tocante à matéria que diz respeito à Acusação, cumpre responder aos seus argumentos:
1° – Não colhe razão o que alega o arguido nos artigos 7° e 10° da defesa apresentada, por quanto desde logo se diga que não há igualdade na ilegalidade. Se o comportamento do arguido é ilícito [como se prova] não é o facto de alguma situação similar que invoca, mas não demonstra, que poderia afastar a ilicitude do seu próprio comportamento.
2° – Quanto ao invocado no artigo 9° da defesa, ou seja a ausência de dolo no comportamento do arguido também não pode ser excluído, de facto se o comportamento do arguido num primeiro momento se poderia conceber fundado na ignorância ou mesmo compreensão da Lei, a verdade é que o seu comportamento sucessivo e reiterado só é compreensível se o agente podendo e devendo prever a ilicitude da sua conduta quis, apesar disso, manter e obter o resultado desse comportamento, ou seja, o vencimento correspondente ao 10° Escalão, mesmo quando já sabia que não tinha direito ao mesmo, o que aliás nem contesta.
Podia e devia ter o arguido outro comportamento, não só porque efectivamente o teve em relação a outros professores da sua própria Escola, como ainda pelo facto de desde a instauração do Processo de Averiguações não poder desconhecer a situação de facto e de direito e o problema da sua ilicitude.
Por isso, também, não colhe razão o que alega nos artigos 11° e 12° da defesa.
VII – CONCLUSÕES
1° - Estão provados os factos levados ao artigo 1° da acusação, como resulta das provas juntas ao processo disciplinar ai referidas, aliás o arguido, como vimos não contesta a situação de facto e de direito descritas no artigo 1° da acusação, invocando, apenas, uma circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar [não exigibilidade de conduta disciplinar] que não se pode ter por verificada.
2° - Assim, em termos de matéria de facto:
3° - a) - Por prova documental no processo disciplinar e informação obtida junto do Chefe de Administração Escolar, constatou-se que o Professor «AA», se mantém a ser abonado do vencimento correspondente ao 10° escalão, até à presente data, não obstante as conclusões do processo de averiguações e a acusação deduzida em sede deste processo disciplinar, facto este que não poderá deixar de relevar em sede de ponderação do comportamento do arguido.
b) - Constatou-se de igual modo que o processamento de vencimento pelo 10° escalão foi realizado mês após mês sem acto administrativo válido de suporte, encontrando-se ferido de nulidade.
4° - Em termos de matéria de direito:
5° - a) - Invoca a defesa que teria ocorrido a prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar por força do disposto no n° 1 do artigo 4° do Estatuto Disciplinar.
Para tal argumenta a defesa que a infracção foi cometida em Janeiro de 1999.
- b) - Mas não tem razão a defesa, de facto a infracção tem natureza continuada ou sucessiva, ocorrendo a partir de Janeiro de 1999 e em todos os meses desde essa data até ao presente, quando o arguido foi abonado de vencimento correspondente a um escalão que não tinha direito [10° escalão].
c) - É verdade que se poderão considerar prescritas as infracções verificadas até Maio de 2002, porquanto tendo sido a infracção participada por diversos docentes ao Senhor Director Regional de Educação do Norte, em exposição que deu entrada na Direcção Regional de Educação do Norte em 11-1-2002, e da qual resulta suficientemente indiciada a infracção e o seu autor como se constata da própria informação/proposta nº ...02, da Direcção Regional de Educação do Norte, não foi instaurado pelo Superior Hierárquico o competente processo disciplinar, apesar de expressamente reconhecida a irregularidade [conforme fls. 13 do processo de averiguações].
d) – O processo de averiguações só foi instaurado pela Delegação Regional do Norte da Inspecção Geral de Educação, em 3 de Maio de 2002, devendo por tanto considerar-se prescrito o direito de instauração de processo disciplinar às infracções verificadas antes de 3-2-2002, por força do disposto no nº 2 do artigo 4º do Estatuto Disciplinar, já que o Senhor Director Regional de Educação do Norte podia e devia ter instaurado processo disciplinar às faltas constatadas pelos seus próprios serviços.
e) – Todavia não se encontra prescrito o direito de instaurar processo disciplinar aos factos ocorridos posteriormente, designadamente a todos os actos praticados pelo arguido na qualidade de Presidente do Conselho Administrativo quando autorizou e processou o seu próprio vencimento pelo 10º escalão da Carreira Docente, até ao presente momento.
6º – Considera-se provado e milita a favor do arguido a circunstância atenuante especial prevista na alínea a) do artigo 29º do Estatuto Disciplinar, ou seja, a prestação de mais de 10 anos de serviço com exemplar comportamento e zelo, tendo em conta a sua longa carreira e provas dadas na Gestão da Escola S/3 de ... e nos serviços à comunidade.
7º – Tendo em conta a comprovada nulidade dos actos administrativos correspondentes ao abono de vencimentos ao arguido pelo 10º escalão, desde Janeiro de 1999 até ao presente, deverá ser superiormente determinado que o arguido reponha as quantias a mais e indevidamente recebidas, como se determinou no artigo 2º da acusação e que perfazem o total de 16.572,83 euros, até Agosto de 2002.
VIII – PROPOSTA
Pelo exposto e tendo em conta o disposto nos artigos 28° e 33° do Estatuto Disciplinar, propõe-se:
a) – Que seja aplicada a pena de inactividade, graduada num ano e suspensa por um período de dois anos, tendo em conta as conclusões que antecedem, nomeadamente nos pontos 5° e 6°.
b) – Que seja determinada a reposição da quantia líquida total de 16.572,83 euros correspondente às quantias indevidamente e a mais recebidas no 10° escalão, nos períodos de 1 de Janeiro de 1999 a Agosto de 2002, inclusive.” – cf. fls. 108 a 117 do processo disciplinar em suporte físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
30. Em 29/01/2003, o Diretor Regional de Educação do Norte aplicou ao recorrente a pena de inatividade, graduada em um ano e a reposição da quantia ilíquida de € 16.572,83, e determinou que se comunicasse ao Ministério Público os factos objeto do processo disciplinar. – cf. doc. ... junto com a contestação a fls. 456 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
31. Em data não concretamente apurada, mas anterior a 03/04/2003, o Autor apresentou recurso hierárquico da decisão referida no ponto anterior – cf. Facto não controvertido.
32. Em 03/04/2003 o Inspetor Superior da Inspeção Geral da Educação, «DD», elaborou a informação ...03, parecer n.º 144/GAJ/2003, com o assunto “Recurso Hierárquico-Proc. Dis. N.° DRN-156/02-DIS Prof. «AA»-Escola Secundária da ...”, da qual se extrai, ademais, o seguinte:
“(...)
1 - Constitui objecto do presente recurso hierárquico o despacho, com data de 29.01.03, do Senhor Director Regional de Educação do Norte que, na sequência da instrução do processo disciplinar em referência, decidiu:
a) aplicar ao arguido, ora recorrente, a pena de inactividade graduada em um ano;
b) mandar repor nos cofres do Estado a quantia de € 16 527,83 (dezasseis mil quinhentos e vinte e sete euros e oitenta e três cêntimos), decorrente de vencimentos ilegalmente processados e recebidos;
c) comunicar ao Dig.° Delegado do Procurador da República junto aos Tribunal da Comarca de Felgueiras os factos objecto do processo disciplinar, por indícios de constituírem também infracção criminal.
Fundamentam a decisão disciplinar a instrução do processo disciplinar e a Informação/Proposta n.° ...1, da Direcção Regional de Educação do Norte, cujos fundamentos de facto e de direito o despacho recorrido explicitamente acolhe.
3-Na respectiva petição, alega o recorrente, em síntese:
a) prescrição do direito de instaurar o processo disciplinar, nos termos do art.°4, n.°1, do Estatuto Disciplinar (decurso de três anos sobre a data em que a falta foi cometida);
b) falta de audiência do arguido, porquanto o ponto 5.5 da citada Informação/Proposta n.°...1 refere matéria de facto que não resulta da acusação nem das alegações da defesa;
c) alega ainda direito do arguido à progressão na carreira e ao 10.° escalão de vencimento, sendo que esta progressão é automática, face ao título de licenciatura que demonstra;
d) e que tendo decorrido mais de um ano na progressão, “estabilizou o direito do recorrente ao 10.° escalão, sendo os actos de processamento posteriores meros actos de execução”
e) finalmente, alega o recorrente a verificação da circunstância atenuante especial prevista na alínea a) do art.° 29 do ED (mais de dez anos de serviço com exemplar comportamento e zelo).
4 - Cumpre informar:
4.1 - Considera a citada Informação/Proposta n.°...1 da Direcção Regional de Educação do Norte que o direito à instauração do processo disciplinar não prescreveu pois que a conduta do arguido “integra ilícito criminal” e, neste quadro, o prazo prescricional será, não de três, mas de cinco anos, nos termos conjugados do art.°4 n.° 3 do Estatuto Disciplinar e do art.° 118 alínea c) do Código Penal.
4.2 - Alega, por sua vez, o recorrente, em matéria de prescrição, que “não competindo à Administração aquilatar se há ou não crime na conduta (...) é gratuito alongar o prazo prescricional disciplinar com juízo de valor de responsabilidade criminal...”
pelo que o procedimento disciplinar está prescrito nos termos do art.° 4 n.° 1 do estatuto disciplinar.
4.3 - Não procede, porém, a arguição do recorrente; de facto, na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, considera-se que para o prazo de prescrição do procedimento disciplinar, previsto no n.° 1 do art.° 4 do E.D., seja superior a três anos “não importa saber se os factos se provaram ou não em processo crime, sendo apenas necessário que da acusação constem factos susceptíveis de enquadrarem infracção penal e que o prazo de prescrição do procedimento criminal seja superior a três anos (v.p.t. Acórdão n.° 02867-STA de 02.02.95).
4.4 - Julgamos que também não procede alegação quanto ao direito a progressão para o 10.° escalão; de facto, como se sustenta na fundamentação do despacho punitivo, a habilitação de estudo superiores, adquirida pelo recorrente, não pode determinar tal progressão, pois não consta do anexo I e anexo II do Despacho n.° ...6 e dos despachos subsequentes.
4.5 - Assim, faltando um elemento essencial (a falta de habilitações próprias) e, por outro lado, tendo presente a qualificação jurídica dos factos, o acto de nomeação no 10.° escalão é nulo, nos termos do n.° 1 e n.° 2 alínea c) do art.° 133 do Código de Procedimento Administrativo; como são nulos os actos subsequentes, de processamento e pagamento indevido de vencimentos, conforme dispõe a alínea i) n.° 2 do citado art.° 133 do CPA.
Não procede, portanto, a alegação do recorrente, de que “estabilizou o direito do recorrente ao 10.° escalão” porquanto, conforme ficou referido, o acto de nomeação é nulo e não apenas anulável.
4.6 - por outro lado, considera-se que não se verifica falta de audiência do arguido, conforme alegado; de facto, como bem se sustenta na Informação/Proposta n.°...4, emitida em instância de recurso hierárquico, os factos invocados relevantes para a compreensão do teor da acusação, constam efectivamente da nota de culpa.
Efectivamente, é explicita a nota de culpa a afirmar que o arguido “não deu cumprimento aos requisitos previstos no Despacho n.° ...6, (...) designadamente não tendo apresentado qualquer requerimento ao Ex.° Senhor Director Regional de Educação do Norte, para efeitos de progressão, quando sabia ou tinha obrigação de saber que o referente curso não era considerado para efeitos do disposto no art.° 55 do Estatuto da Carreira Docente, pois não constava do Anexo I e II do Despacho n.º ...6(...)”
4.7 - Importa referir, por último, que também não se verifica a circunstância atenuante especial prevista na alínea a) do art.° 29 do ED (mais de dez anos de serviço com exemplar comportamento e zelo).
De facto não basta alegar tal circunstância: é indispensável demonstrar (ou que tal decorra dos autos) que o exemplar comportamento e zelo decorre de serviços relevantes e extraordinários prestados e não apenas traduza o normal comportamento e zelo exemplares, inerentes e sempre devidos no desempenho de tarefas públicas.
5 - Termos em que não procedendo as alegações do recorrente deve ser mantido o teor integral do despacho recorrido negando-se provimento ao recurso.
O que, em conformidade, se propõe (...)” – cf. fls. 2 a 5 do documento n.° ... junto a fls. 638 do SITAF cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
33. Em 10/04/2003 a Subinspetora Geral da Inspeção Geral da Educação, «EE», proferiu despacho de concordância com a informação referida no ponto anterior – cf. fls. 2 do documento n.° ... junto a fls. 638 do SITAF cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
34. Em 17/04/2003 o Secretário de Estado da Administração Educativa, «FF», proferiu despacho de concordância com a informação referida no ponto 32) mantendo a decisão disciplinar de inatividade pelo período de um ano – cf. fls. 2 do documento n.° ... junto a fls. 638 do SITAF cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
35. Em data não concretamente apurada, foi remetido ao Autor, na pessoa do seu mandatário, pelo Diretor Regional da Inspeção Geral da Educação, «GG», um ofício informando-o de que foi negado provimento ao recurso apresentado – cf. documento n.° ... junto a fls. 638 do SITAF cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
36. Em data não concretamente apurada foram os factos disciplinares participados ao Ministério Público, cujo processo correu termos no ... Juízo do Tribunal de ... sob o n.° 61/03.0, que acusou o Autor da prática dos crimes de peculato e abuso de poder -cf. Facto não controvertido.
37. Em 04/02/2004 a Diretora-Geral do Ministério da Educação elaborou proposta de indeferimento do pedido de reposicionamento na carreira referido no ponto 16) da qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) 1. Em cumprimento do ponto 8 do Despacho n.º ...6 de 15 de Novembro, na redacção dada pelo Despacho n.º ...7 de 10 de Março, foi apreciado pelo Grupo de Trabalho o pedido de reposicionamento na carreira apresentado pelo docente acima identificado, com base na obtenção do Curso de Estudos Superiores Especializados em Educação Visual e Tecnológica.
2. A análise do presente requerimento assentou no critério de indeferimento, definido na reunião de 14 de Janeiro de 2003, que a seguir se transcreve:
“5 b) cursos realizados por docentes em domínio directamente relacionados com a docência, mas cuja formação de base é apenas reconhecida como equiparada a bacharelato para fins profissionais.
Nota :Relativamente à alínea b) do ponto 5 não é reconhecido aquele grau para efeitos de prosseguimento de estudos, pelo que, nos termos dos artºs 13.º e 31.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovado pela Lei n.º 4/86 de 14 de Outubro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 115/97 de 19 de Setembro, não lhes pode ser reconhecido o grau de licenciatura.”
3. Assim, tendo em consideração o citado critério, deliberou o Grupo de Trabalho que a presente situação não se enquadra no âmbito do art. 55.º do Estatuto da Carreira Docente, pelo que se propõe o indeferimento da pretensão do docente requerente (...)” – cf. documento n.º ... junto com a contestação a fls.2515 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
38. Em 07/02/2004 o Diretor de Serviços dos Recursos Humanos do Ministério da Educação proferiu despacho de concordância com a proposta n.º ...04 que propôs o indeferimento do pedido de aposentação do Autor, da qual se extrai, de entre o mais, o seguinte:
“(...) 1. Em requerimento de 2003-12-16 o(a) PQND – «AA», da Escola Secundária ..., solicita aposentação.
2. À data do requerimento o(a) docente reunia as condições para aposentação nos termos do n.° 1 do Dec.-Lei 116/85 de 19 de Abril- 52 anos de idade e 36 anos de serviço.
3. No presente ano escolar não deu cumprimento ao disposto no n.° 2 do art. 121.° do ECD, em virtude de se encontrar em inactividade por força de processo disciplinar até 14/05/2004.
4. O(A) docente em questão pertence ao 12.° Grupo A para o qual têm sido feitos, anualmente, contratos anuais, pelo que da sua aposentação resultaria inconveniência para o serviço.
5. Face ao exposto, pensamos ser de indeferir o solicitado (...)” – cf. documento n.° ...2 junto com a p.i. a fls. 184 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
39. Em 02/03/2004 o Ministro da Educação proferiu despacho de concordância com a proposta de indeferimento referida no ponto 37)– cf. documento n.° ... junto com a contestação a fls.2515 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
40. Em 31/04/2004 foi remetido ao Autor, pelo Ministério da Educação, o ofício com a referência DSRH-PD3, informando-o do indeferimento do pedido de reposicionamento na carreira acompanhado da proposta referida no ponto 37) – cf. documento n.° ... junto com a contestação a fls.2515 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
41. Em 29/11/2006, o Autor foi absolvido dos factos participados no ponto 36) pelo Tribunal Judicial de Felgueiras - cf. Facto não controvertido.
42. Em data não concretamente apurada, o Autor interpôs recurso contencioso de anulação do despacho referido no ponto 34) no ... Juízo Liquidatário do TCA Sul, que correu termos sob o n.° ...09/2003 – cf. fls. 139 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
43. Em 27/09/2007 o TCA Sul anulou o despacho referido no ponto 34) com fundamento em violação do direito de audiência no processo disciplinar – cf. fls. 139 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
44. Em 11/06/2007 o Autor participou criminalmente, ao Ministério Público do Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras, factos suscetíveis de consubstanciar os crimes de abuso de poder, denúncia caluniosa e denegação de justiça por parte dos Réus «BB», «CC», «GG», «DD», «FF» e «HH» e «II» – cf. fls. 165 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
45. Em 14/04/2008 o Autor tinha uma dívida de € 33.379 à Banco 1... - cf. documento n.° ... junto com a p.i. a fls. 172 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
46. Em 11/09/2008 o Autor tinha um incumprimento bancário à Banco 1... no montante de € 43183,13 - cf. documento n.° ... junto com a p.i. a fls. 172 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
47. Em data não concretamente apurada, mas em Outubro de 2008, foi devolvida ao Autor a quantia total de € 53 429,86 correspondente ao montante de € 16 527,83[cuja reposição pelo autor tinha sido determinada no processo disciplinar] e dos diferenciais entre o 9.° e 10.° escalão – cf. documento n.° ... junto com a contestação a fls. 2433 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
48. Em 05/02/2009 foi arquivado, por despacho do Ministério Público, o inquérito do processo referido no ponto 44) – cf. fls. 774 a 791 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
49. Em 20/07/2011 a Caixa Geral de Aposentações, por despacho, e na sequência de sentença proferida pelo TAF de Penafiel, reconheceu ao autor o direito de aposentação, de acordo com a situação existente em 01/01/2004, cujo abono teve início em 01/10/2011 – cf. fls. 771 do processo físico cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
50. O Autor, durante o cumprimento da pena disciplinar, teve dificuldades económicas - cf. Prova testemunhal.
51. Em data não concretamente apurada, o Autor entrou em incumprimento perante instituições de crédito - cf. Prova testemunhal.
52. Em data não concretamente apurada o Autor celebrou contrato de arrendamento com opção de recompra com a Caixa Arrendamento Fiiah, Fundo de Investimento Imobiliário de Arrendamento Habitacional do Grupo Banco 1... - cf. documento n.° ...1 junto com a petição inicial a fls. 183 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. Prova testemunhal.
53. O Autor fundou na ... as instituições ..., ... e Cooperativa de Bordados da ...-doc. N.° 15 junto com a petição inicial. – cf. Prova testemunhal.
54. O Autor foi o impulsionador da organização da Feira de Artesanato Agricultura levada a cabo pela ... e de colóquios sobre agricultura e bordados manuais - cf. documentos n.° ...5 a ...2 juntos com a petição inicial a fls.1 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
55. O Autor, após instauração do processo disciplinar, passou a isolar-se socialmente - cf. Prova testemunhal.
56. O Autor, após instauração do processo disciplinar, passou a padecer de sintomatologia depressiva - cf. relatórios periciais a 2042 e 2641 do SITAF. Prova testemunhal.
57. O Autor, após instauração do processo disciplinar, passou a necessitar de acompanhamento médico nas especialidades de psicologia e psiquiatria - cf. Prova testemunhal.
58. Em 26/08/2010 a petição inicial deu entrada neste TAF.
DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
Do erro de julgamento de Facto -
Conforme tem sido sistematicamente entendido, quer pela doutrina quer pela jurisprudência, no que respeita à modificação da matéria de facto dada como provada pela 1ª instância, o Tribunal de recurso só deve intervir quando a convicção desse julgador não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se, assim, a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova, bem como à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto - cfr., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19/10/2005 no proc. 0394/05. Aí se refere, no que aqui releva, que “o art. 690º-A do CPC impõe ao recorrente o ónus de concretizar quais os pontos de facto que considera incorretamente julgados e de indicar os meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida. Este artigo deve ser conjugado com o 655° do CPCivil que atribui ao tribunal o poder de apreciar livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. Daí que, dos meios de prova concretamente indicados como fundamento da crítica ao julgamento da matéria de facto deva resultar claramente uma decisão diversa. É por essa razão que a lei utiliza o verbo “impor”, com um sentido diverso de, por exemplo, “permitir”. Esta exigência decorre da circunstância de o tribunal de recurso não ter acesso a todos os elementos que influenciaram a convicção do julgador, só captáveis através da oralidade e imediação e, muitas vezes, decisivos para a credibilidade dos testemunhos. (É pacífico o entendimento dos Tribunais da Relação, neste ponto. Só deve ser alterada a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação - cfr. Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, II volume, 4ª edição, 2004, págs. 266 e 267, o Acórdão da Relação do Porto de 2003/01/09 e o Acórdão da Relação de Lisboa de 2001/03/27, em Coletânea de Jurisprudência, Ano XXVI-2001, Tomo II, págs. 86 a 88). Entendimento semelhante posto em causa no Tribunal Constitucional, por ofensa da garantia do duplo grau de jurisdição, foi considerado conforme à Constituição (...): “A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e fatores que não são racionalmente demonstráveis”, de tal modo que a função do Tribunal da 2.ª instância deverá circunscrever-se a “apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1.° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos” Acórdão de 13/10/2001, em Acórdãos do T. C. vol. 51°, pág. 206 e ss..)”. A este propósito e tal como sustentado pelo Professor Mário Aroso e pelo Conselheiro Fernandes Cadilha “(…) é entendimento pacífico que o tribunal de apelação, conhecendo de facto, pode extrair dos factos materiais provados as ilações que deles sejam decorrência lógica (…). Por analogia de situação, o tribunal de recurso pode igualmente sindicar as presunções judiciais tiradas pela primeira instância pelo que respeita a saber se tais ilações alteram ou não os factos provados e se são ou não consequência lógica dos factos apurados. (…) ” - em Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pág. 743).
“Retomando o que supra fomos referindo sobre a amplitude dos poderes de cognição do tribunal de recurso sobre a matéria de facto temos que os mesmos não implicam um novo julgamento de facto, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorretamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no artº 690º-A n.ºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialeticamente na base da imediação e da oralidade.
Como se consignou, entre outros, nos Acórdãos deste TCAN de 06/05/2010, proc. 00205/07.3BEPNF e de 22/05/2015, proc. 1625/07BEBRG: “Os poderes de modificabilidade da decisão de facto que o artigo 712º do CPC atribui ao tribunal superior envolvem apenas a deteção e correção de pontuais, concretos e excecionais erros de julgamento e não uma reapreciação sistemática e global de toda a matéria de facto.” “Para que seja alterada a matéria de facto dada como assente é necessário que, de acordo com critérios de razoabilidade, apreciando a prova produzida, “salte à vista” do Tribunal de recurso um erro grosseiro da decisão recorrida, aparecendo a convicção formada em 1ª instância como manifestamente infundada”.
Ressalta ainda do sumário do proc. 00242/05.2BEMDL, de 22/02/2013, acolhido por este TCAN em 22/05/2015 no âmbito do proc. 840/05.4BEVIS I.“Como tem sido jurisprudencialmente aceite, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas (art. 655º, n.º 1 do CPC) já que o juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que na formação dessa convicção não intervêm apenas fatores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para o registo escrito, para a gravação vídeo ou áudio.
II. Será, portanto, um problema de aferição da razoabilidade, à luz das regras da ciência, da lógica e da experiência da convicção probatória do julgador no tribunal «a quo», aquele que, no essencial, se coloca em sede de sindicabilidade ou fiscalização do julgamento de facto pelo tribunal «ad quem».
Assim, das considerações jurisprudenciais e doutrinais exemplificativamente referidas e em função dos elementos disponíveis, não se vislumbra a existência de fundamento para alterar a matéria de facto.
O Tribunal a quo explicou devidamente os alicerces da sua convicção. Em sede de factualidade não provada fez constar:
Não resultaram provados os demais factos alegados pelas partes, designadamente os seguintes:
A) Que os Réus tenham remetido certidão ao Ministério Público de ... com vista a alongar o prazo de prescrição do procedimento disciplinar e instaurar o competente procedimento disciplinar (artigo 34.° e 50.° da p.i.)
B) Que os Réus tenham perseguido disciplinarmente o Autor com o único objetivo de lhe aplicar a pena disciplinar de suspensão (artigos 42.° e 53.° da p.i)
C) Que os Réus sabiam que à luz do disposto no artigo 41.° o Decreto-Lei 223/87, de 30.05, competia aos serviços administrativos da Escola Secundária da ... a iniciativa e decisão para o escalonamento do Autor (artigo 46.° da p.i.).
D) Que os Réus sabiam que o Autor não praticou os crimes de peculato e abuso de poder (artigo 47.° da p.i.)
E) Que os Réus sabiam que o procedimento disciplinar se encontrava extinto por prescrição (artigo 49.° da p.i.)
F) Que os Réus sabiam que o Autor era o único sustentáculo económico do seu agregado familiar (artigo 55.° da p.i.)
G) Que os Réus tiveram como único desígnio privar o Autor da sua única fonte de rendimento escolhendo a pena de suspensão de funções bem como a sua exoneração do cargo de Presidente do Conselho Diretivo (artigos 57.° e 60.° da p.i.)
H) O Autor após aplicação da pena disciplinar tenha passado a viver da solidariedade e auxílio de familiares e amigos (artigo 71.° da p.i)
I) Que o imóvel do Autor, à data da celebração do contrato de arrendamento referido no ponto 52), tinha um valor de mercado de € 400.00,00(artigo p.i.)
J) Que com a celebração do contrato de arrendamento referido no ponto 52) o Autor teve um prejuízo de € 100.000,00 (artigo78.° a 81.° da p.i.)
K) Que o Autor tenha, desde o processo disciplinar, passado a ter constantes e permanentes ataques de choro, pânico e nostalgia (artigo 103.° da p.i.)
L) Que o Autor, quando convive com amigos e familiares, fale no processo disciplinar “insistindo e justificando a injustiça em que foi tratado e a sua total ausência de culpa” (artigo 104.° da p.i.)
M) Que o Autor dissesse repetidamente que a vida não tinha sentido e preferia a morte (artigo 107.° da p.i.).
N) Que os níveis de angústia e desespero do Autor tenham aumentado avassaladoramente pois estava impossibilitado de cumprir todos os seus compromissos, nomeadamente bancários, devido à privação do seu salário mensal (artigo 108.° da p.i.)
O) Que a sua filha apenas tenha prosseguido os estudos no ano letivo 2007/2008 devido aos problemas económicos provocados pelo processo disciplinar (artigo 109.° da p.i.)
P) Que nos círculos sociais e profissionais do Autor se discuta, constantemente, a sua situação profissional e pena de suspensão (artigos 110.° e 115.° da p.i.)
Q) Que nos círculos sociais do Autor conste que este teve comportamentos impróprios e indignos em benefício próprio prejudicando o interesse público (artigo 111.° da p.i.)
R) Que os amigos e colegas de profissão do Autor passaram a evitar o seu convívio e companhia desde o processo disciplinar (artigos 113.° e 114.° da p.i.)
S) Que o Autor passou a ser marginalizado, não sendo convidado para exercício de cargos ou funções (artigo 116.° da p.i.)
T) Que os familiares e vizinhos passaram a ter comportamentos diferentes com o Autor (artigos 117.° e 118.° da p.i.)
U) Que o Autor esteja incapacitado para o trabalho (artigo 123.° da p.i.)
V) Que o Autor sofra de permanente angústia e desânimo por não poder cumprir com as suas obrigações bancárias (artigo 130.° da p.i.)
W) Que tenham sido os serviços Administrativos da Escola Secundária da ... que tomaram a decisão e a iniciativa para o escalonamento do Autor no 10.° escalão (artigo 11.° da p.i.)
E, em sede de motivação, explicou detalhadamente:
A decisão da matéria de facto dada como provada efetuou-se com base na convicção do julgador e no exame crítico do Procedimento disciplinar e dos documentos que constam dos autos, consoante se anota em cada ponto do probatório.
Para sedimentar a sua convicção quanto aos factos dados como assentes nos pontos 50) a 53) e 55) a 57) o Tribunal atendeu, mormente, aos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelas partes bem como aos esclarecimentos prestados pelo perito, sendo que, quanto aos factos dados por não assentes. O Tribunal formou a sua convicção com base nos depoimentos prestados pelas testemunhas e nos depoimentos de parte prestados pelos Réus «CC» e «GG», nos termos que infra se passarão a enunciar.
Vejamos, então.
No que respeita aos pontos 50) a 52) dos factos provados, a convicção do Tribunal resultou, essencialmente, do depoimento das testemunhas «OO» [sócio de uma empresa de decoração de interiores e amigo do Autor] e de «PP» [aposentado, funcionário da Banco 1... à data dos factos] que afirmaram, perante o Tribunal, que após aplicação da pena disciplinar de inatividade, o Autor teve dificuldades económicas, tendo a primeira testemunha referido que soube do processo disciplinar movido contra o Autor pois tinha sido contratado para decorar a casa do Autor e este viu-se “forçado” a contar-lhe que não tinha dinheiro para pagar os seus serviços. Por sua vez, a testemunha «PP» informou o Tribunal que integrava o serviço de recuperação de crédito tendo-lhe sido atribuído o processo do Autor em virtude de incumprimento pelo mesmo dos créditos bancários que detinha, em data que não consegue precisar, e que os rendimentos auferidos pelo autor, à data do incumprimento, eram insuficientes para qualquer outra solução que não a da venda da sua casa de habitação a um Fundo imobiliário da Banco 1... mas com um contrato de arrendamento convencionado pelas partes com opção de recompra, tendo-lhe sido perdoados juros e capital, manifestando conhecimento da alteração da situação profissional do Autor na altura da renegociação dos créditos afirmando que “Os rendimentos que patenteava não eram suficientes para fazer face aos créditos que detinha”.
Ambas as testemunhas prestaram depoimentos que se revelaram sérios, espontâneos e com conhecimento direto da factualidade narrada, tendo convencido o Tribunal da sua veracidade.
No que tange ao ponto 53) dos factos provados, as testemunhas «QQ»[ geógrafo e amigo do Autor], «RR» [professor e Presidente do Conselho Diretivo desde 2003 do Agrupamento de Escolas da ..., antigo colega do autor] e «SS» [reformado da indústria do calçado e amigo do Autor] afirmaram, de forma assertiva e segura, que o Autor foi o fundador da ... e ... bem como organizador de feiras de associativismo pelo que, concatenado o seu depoimento com o teor das notícias constantes nos recortes de jornais locais juntos como documentos n.º ...5 a ...2 com a petição inicial, convenceram o Tribunal a dar o facto como provado.
Ademais, atendendo a que os depoimentos das testemunhas foram seguros, credíveis e coincidentes, o Tribunal relevou tal prova ficando totalmente esclarecido e convencido acerca da sua veracidade.
No que respeita ao ponto 55), as testemunhas «QQ», «OO» e «RR», coincidiram nos seus depoimentos ao revelarem que o autor “desapareceu” após a conclusão do processo disciplinar, que deixou de ter uma presença ativa na ... pelo que tendo sido prestados depoimentos seguros e credíveis, corroborados entre si quando interpelados, convenceram o Tribunal dos factos dados por provados.
Já no que respeita aos pontos 56) e 57) dos factos provados, o Tribunal assentou a sua convicção quer nos relatórios periciais juntos aos autos, quer dos esclarecimentos prestados pelo perito «TT» [psicólogo que elaborou o relatório pericial] e «UU» [médica psiquiatra a desempenhar funções no CHTS, unidade de saúde mental de ..., que acompanha o Autor].
O perito esclareceu o Tribunal que pese embora nem todas as pessoas sujeitas a um processo disciplinar desenvolvam uma sintomatologia depressiva perante um procedimento disciplinar, da análise que efetuou ao Autor verificou que este evento teve consequências a vários níveis da sua vida demonstrando caraterísticas próprias dessa sintomatologia. Quando confrontado com o facto de o Autor ter cumprido serviço militar nas colónias, que por si só poderia traduzir-se em vários traumas psicológicos, o perito referiu que o Autor mencionou que “não esteve em cenário de guerra pois era mecânico” descrevendo tal evento desprovido de reatividade emocional pelo que não consegue estabelecer um nexo de causalidade entre esse evento e a sintomatologia que apresenta.
Já a testemunha, «UU», revelou que o Autor é seu paciente desde 2006, apresentando uma sintomatologia depressiva prolongada, que demanda a prescrição de ansiolíticos, pois a ocorrência que mais o marcou foi o procedimento disciplinar instaurado contra si e que, à medida que os anos vão avançando, o estado de saúde do Autor tem vindo a agravar-se.
Referiu que apesar de na primeira consulta com o Autor este tenha mencionado o cumprimento do serviço militar, não conseguiu estabelecer uma correlação entre o estado depressivo em que se encontrava e uma situação de “stress de guerra”, mas sim com o procedimento disciplinar e todas as consequências legais que dele advieram.
Ambos os depoimentos referiram que o Autor revelou dificuldades de concentração e de atenção, sendo que esta última testemunha referiu que ainda acompanha o Autor pelo menos em duas consultas anuais pois que o estado depressivo em que ainda se encontra manifesta-se “crónico” e irá sempre demandar acompanhamento e tratamento médico.
O perito e a testemunha tiveram um depoimento espontâneo e convicto, confirmando as conclusões do relatório pericial que consta dos autos, tendo sido credíveis, desde logo por se verificar coincidência na descrição da sintomatologia do Autor e estabelecendo o respetivo nexo de causalidade com o processo disciplinar movido contra ele, revelando pormenores circunstanciais que corroboravam o que tinha sido, por ambos, afirmado e sem hesitações, o que convenceu o Tribunal da sua veracidade.
Relativamente aos factos dados como não provados em A), B), C) , D), E), F), G), H), I), J), K),L),M).N),O),P),Q),R),S),T),U),V),e W) a prova testemunhal produzida levou o Tribunal a considerar que os mesmos não correspondem à realidade dos factos.
Na verdade, quanto aos factos não provados A) a E) e G), o depoimento de parte dos Réus, «CC» e «GG», convenceu o Tribunal de que o facto de terem remetido certidão ao Ministério Público de ... não visava alongar o prazo prescricional e instaurar o competente processo disciplinar, nem que tenham tido os Réus a intenção de perseguir disciplinarmente o Autor com o intuito de lhe aplicar a pena disciplinar de suspensão como, ainda, não sabiam que competia aos serviços administrativos da Escola Secundária a iniciativa e decisão de escalonamento do Autor ou que o procedimento disciplinar encontrava-se prescrito e que o Autor não tinha praticado os crimes de peculato e abuso de poder, tendo como único desígnio privar o Autor da sua única fonte de rendimento e ser exonerado do cargo de Presidente do Conselho Diretivo. Ora não só foram unânimes e assertivos ao rejeitarem tais acusações como o seu depoimento foi corroborado pela testemunha «VV» [jurista da Área Metropolitana do Porto, que à data dos factos era jurista no Direção Regional da Educação do Norte] que afirmou ser o autor de uma informação relativa ao processo disciplinar instaurado contra o Autor e que foi remetida para decisão superior, manifestando não ter havido qualquer indicação para “ter especial atenção ao processo[disciplinar do Autor] ou outro pedido que fosse diferente de outro processo com um decurso normal”. Sublinhou, ainda, que, regra geral, os processos disciplinares vinham bem instruídos, com a respetiva prova testemunhal, tendo concordado com a pena disciplinar proposta, caso contrário teria divergido da que apresentou, e que o Diretor Regional da Educação, «GG», concordou com a sua proposta, tendo este processo tido uma tramitação processual normal.
Acresce que, as testemunhas «WW» [inspetor da educação à data dos factos, mas atualmente aposentado], «XX» [inspetor da educação], «YY» [inspector da educação à data dos factos, mas atualmente aposentado] «ZZ» [inspetor da educação à data dos factos, mas atualmente aposentado] e «AAA» [jurista no Ministério da Educação mas, à data dos factos, jurista na Direção Regional da Educação Norte], apesar de não terem tido intervenção direta no processo disciplinar em causa nos presentes autos, são pessoas com bastante experiência em processos disciplinares, e foram unânimes em afirmar não só da seriedade, isenção e competência dos Réus particulares como referiram, com toda a convicção, que estes eram pessoas íntegras que “não misturam as duas coisas” pois que “seriam alvo de processo interno de averiguações”, o que criou no Tribunal a convicção de que os Réus particulares se limitaram a seguir os trâmites normais de um processo disciplinar, não tendo o Autor logrado provar que tenham agido com qualquer outra intenção que não o exercício normal das suas funções, ónus probatório que sobre ele recaía.
Assim, concatenados os depoimentos dos Réus com as declarações das testemunhas referidas, ficou firmada a opinião do Tribunal em dar estes factos como não provados.
O factos F) foi dado como não provado pois não só do depoimento dos Réus, «CC» e «GG», ficou o Tribunal plenamente convencido de que desconheciam a vida pessoal do Autor, o que, aliás, é perfeitamente natural não tendo o Autor invocado qualquer facto que pudesse justificar tal conhecimento, como decorre das regras da experiência comum que não pertencendo os Réus do círculo pessoal do Autor, sendo a sua relação puramente profissional, não tinham como saber que ele era o único sustentáculo económico do seu agregado familiar. Ademais, as testemunhas «SS» e «OO», amigos do Autor, referiram que a esposa do Autor trabalhou na ourivesaria do pai e teve uma loja, pelo que, apesar de não conseguirem precisar se ainda teriam a loja à data dos factos, levaram o Tribunal a considerar que o Autor não carreou prova suficiente para os presentes autos de que era efetivamente o sustentáculo económico do seu agregado e que os Réus particulares eram conhecedores desse facto pelo que não o considerou como assente.
A circunstância, invocada pelo Autor, de que após aplicação da pena disciplinar tenha passado a viver da solidariedade e auxílio de familiares e amigos (facto não provado H)) foi considerada pelo Tribunal como não provada pois que não só não foram carreados elementos que sustentem tal alegação como da prova testemunhal produzida, mormente as testemunhas «SS» e «OO», amigos do Autor, referiram que a esposa do Autor trabalhou na ourivesaria do pai e teve uma loja, pelo que, apesar de não conseguirem precisar se ainda teriam a loja à data dos factos, levou o Tribunal a dar este facto como não provado.
Quanto aos factos não provados I) e J), o Tribunal não os deu como provados pois que a testemunha «PP», que interveio no processo bancário em que o Autor e a sua esposa assinaram o contrato de arrendamento com opção de recompra do seu imóvel, quando questionado, afirmou categoricamente que não sabia qual o valor de mercado do imóvel à data nem se o Autor teve qualquer prejuízo com o referido contrato, o que, atendendo à ausência de qualquer outra prova efetuada pelo Autor, não convenceu o Tribunal da sua veracidade, considerando-o como não provado.
No que respeita aos factos dados como não provados nas alíneas K) a P), U) a V), da prova testemunhal produzida não foram trazidos ou concretizados quaisquer elementos quanto a estes factos pelo que recaindo o ónus probatório sobre o Autor o Tribunal deu-os como não provados.
Relativamente aos factos Q) a T), foram dados por não provados pois que, apesar das testemunhas «QQ» e «OO» referirem que houve um “zum zum”, a verdade é que não concretizaram se se tratou de um comentário isolado, se foi no círculo social, familiar ou profissional do Autor, tendo a testemunha «SS» afirmado, com assertividade, que o Autor não se “desligou” das atividades por ele desenvolvidas após o processo disciplinar, que apenas deixou de exercer a docência mas continuava a participar na Feira organizada pela ..., instituição da qual o Autor fazia parte, pelo que o Tribunal firmou a sua convicção quanto a estes factos considerando-os como não provados.
Por último, o Tribunal deu como não provado o facto W) pois que a testemunha «NN» [chefe de serviço da administração escolar à data dos factos] afirmou de forma clara, coerente e assertiva, que “quem manda processar não sou eu mas sim o Conselho Administrativo” o que concatenado com as folhas de pagamento de fls. 43 a 52 do processo disciplinar em que consta a assinatura do Presidente do Conselho Administrativo dando autorização para pagamento das quantias mensais pagas aos docentes bem como do Chefe dos Serviços da Administração Escolar, e decorrendo das regras da experiência comum que os estabelecimentos escolares têm orçamento próprio e cujo cabimento tem de ser aprovado pelo Conselho de Administração, sendo referido pela mesma testemunha que à data dos factos o Conselho de Administração era formado por ele próprio, pelo Autor e pela testemunha «BBB» [professora na Escola Secundária ..., membro do Conselho Diretivo da Escola à data dos factos], o que foi, também, corroborado por esta testemunha, criou a convicção do Tribunal de que o processamento salarial dos docentes, nomeadamente quando ocorre a progressão de escalão, não pode ser efetuada “automaticamente” pelos serviços mas apenas com autorização prévia do Conselho de Administração da Escola.
No que concerne ao depoimento prestado pela testemunha «CCC» [aposentado], o Tribunal não valorou o seu depoimento por denotar que o Autor, pelo facto de ter sido seu superior hierárquico, detém, ainda, um grau de ascendência sobre o mesmo, limitando-se a repetir que sempre cumpriram a lei e confirmando os procedimentos adotados para progressão ao 10.° escalão pelo Autor, para além de ter esclarecido o Tribunal que à data em que ocorreu a progressão do Autor para o 10.° escalão já não era Chefe dos Serviços da Administração Escolar mas sim a testemunha «NN».
Já a testemunha «DDD» [jurista da Caixa Geral de Aposentações] nada de relevante aportou aos presentes autos pois que o seu depoimento incidiu, essencialmente, sobre prova que já consta deste processo, nomeadamente o facto de o requerimento de aposentação feito pelo Autor à CGA ter sido indeferido por estar aquele a cumprir pena de inatividade e que, tendo sido anulada pelo TCA Sul a sanção disciplinar aplicada, a CGA revogou o ato e concedeu-lhe a aposentação com efeitos reportados a 01/01/2004, facto dado por provado no ponto 49), estando pendente no TCA Norte recurso quanto ao cálculo do montante da pensão.
Deste modo, o Tribunal firmou a sua convicção quanto aos factos provados e não provados, como referido ao longo da motivação, quer com base nas declarações dos Réus, cujas declarações foram espontâneas e mereceram credibilidade deste Tribunal, apesar de terem interesse pessoal no desfecho do presente processo, o que foi tido sempre em conta, quer complementadas com a prova testemunhal produzida em sede de audiência final que foi apreciada livremente.
Todas as testemunhas prestaram depoimento de forma credível e séria, tendo demonstrado conhecimento direto sobre os factos sobre os quais depuseram (exceto quanto aos que, no devido local, se refere o contrário), o que levou este Tribunal a valorar as suas versões sobre os factos e acontecimentos que carrearam através dos seus depoimentos, para estes autos.
O Tribunal, em conclusão, formou, a sua convicção quanto aos factos dados como provados com base na apreciação crítica e articulada de toda a prova carreada para os autos, conjugada com as regras da experiência comum, tudo conforme ficou descrito e patenteado supra (artigos 362.° e seguintes do Código Civil e 94.°, n.°s 3 e 4 do CPTA).
Assim, não se bulirá no probatório pois não se deteta qualquer erro, mormente grosseiro, palmar, ostensivo na avaliação dos factos levada a cabo pelo Tribunal. Pelo contrário, defrontámo-nos com um Tribunal extremamente empenhado na busca da verdade material.
E o que dizer do apontado erro de julgamento de direito?
Apenas que pouco há a acrescentar à fundamentação da sentença recorrida.
Como resulta da sua análise, o Tribunal a quo decidiu com acerto quer em termos fácticos quer jurídicos, pelo não merece reparo.
De qualquer forma como resulta das alegações do Recorrente, nenhuma questão de direito é especificamente arguida que não estivesse unicamente dependente da alteração da matéria de facto. Ora, dependendo a reapreciação da matéria de direito do recurso da procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto fixada e mantendo-se esta fixa, necessariamente, fica prejudicado o conhecimento daquela (nº 2, do artigo 608º, ex vi da parte final, do nº 2, do art. 663º, e, ainda, do nº 6, deste artigo, ambos do CPC.)
Em suma:
Na sentença a decisão sobre a matéria de facto encontra-se devidamente sustentada e fundamentada e outra não poderia ser.
O Recorrente limita-se a questionar a valoração da prova pelo Tribunal, valoração essa livremente formada e fundamentada. A censura quanto à forma de formação da convicção do tribunal não pode assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade de formação da convicção.
Doutra forma estaríamos perante uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão.
Na realidade, o Tribunal ad quem poderá verificar se na sentença se seguiu um processo lógico e racional de apreciação da prova, ou seja, se a decisão recorrida não se mostra ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, mas, face aos princípios da oralidade e da imediação, é o Tribunal de 1ª instância que está em melhores condições para fazer um adequado uso do princípio de livre apreciação da prova.
Consequentemente, reitera-se, a sentença recorrida não merece censura neste segmento.
E o mesmo se diga da interpretação do Direito.
Como é sabido, o Tribunal está vinculado aos temas de prova fixados no Despacho-saneador e, pretendendo o Autor responsabilizar os Réus Estado Português e Outros pelos danos patrimoniais e não patrimoniais provocados pelo processo disciplinar que contra ele foi instaurado, cumprir-lhe-ia verificar, em face da matéria de facto provada, se estavam preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.
Contudo, num primeiro momento, o Recorrente suscita ainda questão, que nos parece pueril e sem interesse, como adiante se vai perceber, de que “tendo em conta o processo de inquérito n° 487/07.... que culminou em 05.02.2009 com o despacho de arquivamento, nos termos do disposto no artigo 277°, n° 2 do C.P. Penal, tendo, porém sido requerida a instrução, o prazo de prescrição do n° 1 do artigo 498° do CC foi interrompido e só começou a correr nos termos do disposto no artigo 326° do Código Civil, pelo que (...) o Tribunal a quo decidiu de forma errada a excepção peremptória da prescrição e, por isso é de direito e de justiça a sua reversão.
Ora, verifica-se que à data do facto gerador da responsabilidade, isto é, à data em que foi proferido o despacho punitivo da autoria do Diretor Regional de Educação do Norte, em 29/01/2003, que aplicou ao Autor a pena de inatividade pelo período de um ano, confirmada pelo despacho do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa de 17/04/2003, vigorava o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado regulada pelo Decreto-Lei n.º 48 051, de 21 de novembro de 1967.
De acordo com o seu artigo 5.°, n.° 1, :“O direito de indemnização regulado nos artigos anteriores prescreve nos prazos fixados na lei civil”, sendo, por isso, aplicável, em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado, o disposto no artigo 498.° do C.C. que estabelece o seguinte:
“1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.
2 - Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.
3 - Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
4 - A prescrição do direito de indemnização não importa prescrição da acção de reivindicação nem da acção de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra”.
Daqui resulta que o prazo geral de prescrição do direito de indemnização é de 3 anos, contado da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.
Na situação dos autos, o Recorrente assenta a sua pretensão indemnizatória na prática de atos que reputa ilegais e ilícitos, a saber: o despacho punitivo da autoria do Diretor Regional de Educação do Norte de 29/01/2003 que aplicou ao Autor a pena de inatividade pelo período de um ano, confirmado pelo despacho do Secretário de Estado da Administração Educativa de 17/04/2003.
Desta forma, logo em 29/01/2003, o Autor teve conhecimento do direito que lhe competia, para efeitos do disposto no artigo 498.° n.°1 do C.C., ou seja, tomou conhecimento do facto que considerava ilícito e gerador de responsabilidade, independentemente do conhecimento ou desconhecimento da extensão integral dos danos, ou melhor, tomou conhecimento da verificação dos pressupostos que definem essa responsabilidade, começando o prazo de prescrição a correr quando «o direito puder ser exercido» - v. art° 306°, n°1, do C.Civil.
Conhecimento esse que se consubstancia na mera consciência da possibilidade legal de ressarcimento dos danos, bastando que o lesado saiba que tem direito a indemnização pelos danos que o afetam.
E o referido conhecimento do direito que compete ao lesado tem sido interpretado, quer na doutrina, quer na jurisprudência, como o conhecimento dos pressupostos que condicionam a responsabilidade (Antunes Varela, Direito das Obrigações, 8.ª ed., pág. 639 e Ac. do STA de 21.01.2003, proc. nº 1233/02).
Não implicando um conhecimento jurídico, bastando que o lesado conheça os factos constitutivos desse direito, ou seja, que foi praticado ou omitido um ato que lhe causou danos, ou melhor ainda, que o lesado esteja em condições de formular um juízo subjetivo, pelo qual possa qualificar aquele ato como gerador da responsabilidade civil e seja percetível que sofreu danos em consequência dele (Ac. STA de 07.03.2006, proc. 889/05, e Acs. do STJ aí indicados).
Na verdade, para efeitos de prescrição, a expressão ter «conhecimento do direito» não é (ou não significa) necessariamente conhecer na perfeição e na sua integralidade todos os elementos que compõem o dever de indemnizar mas tão só a exigência de consciência empírica da produção dos danos (Ac. TCA Sul de 11.07.2013, proc. n° 09724/13), pois, desde logo, deriva do n.° 1 do art. 498.° do CC que o exercício do direito é independente do desconhecimento da «pessoa do responsável» e da «extensão integral dos danos» (Ac. STA de 25.09.2008, proc. n.° 0456/08), tanto mais que, quanto a este último aspeto, é possível que a fixação dos prejuízos seja remetida para momento posterior, em execução de sentença (Ac. TCA Norte de 13.11.2008, proc. n° 1366/07.7BEBRG).
É certo que o artigo 498.° n.° 3 do Código Civil remete para os prazos de prescrição do Direito Penal quando o facto ilícito constitua crime, constituindo, assim, uma exceção à regra vertida no n.°1 competindo ao lesado o ónus de alegar e provar que o facto gerador da obrigação de indemnizar preenche um dos tipos de crimes previstos no Código Penal, nos termos gerais do artigo 342.° n.°1 do C.C. Neste sentido, decidiu o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07/05/2003, processo n.° 0448/03, que afirma: “(...) XI – O lesado que pretenda usufruir de prazo de prescrição do direito de indemnização mais longo, previsto no n.° 3 do artigo 498.° do Código Civil, não está impedido de fazer a prova no processo cível em que exerce o direito de indemnização por responsabilidade civil de que os factos em que baseia a sua pretensão constituem crime. XII – É sobre o lesado que instaurar a acção indemnizatória fora do prazo previsto no n.°1 do art. 498.° do Código Civil que recai o ónus de alegar e demonstrar a natureza criminal do facto gerador dos danos (...)”.
No caso dos autos o Recorrente alega que os factos imputados aos Réus consubstanciam crime, tendo apresentado queixa-crime por denúncia caluniosa, abuso de poder e denegação da justiça, crimes para os quais está estabelecido o prazo de prescrição de 5 anos, como decorre do estatuído no artigo 118.°, n.° 1, alínea c), do C.P.
Contudo, para que o Recorrente beneficiasse do alongamento do prazo de prescrição teria que demonstrar o preenchimento do elemento subjetivo dos tipos de crime em causa, ou seja, que os Réus atuaram com dolo.
Só que, como decorre dos factos provados, o Autor não conseguiu provar que os Réus tenham remetido certidão ao Ministério Público apenas com vista a alongar o prazo de prescrição do procedimento disciplinar e instaurar o competente procedimento, que o tenham perseguido disciplinarmente com o objetivo único de lhe aplicar a pena disciplinar de suspensão; que sabiam que à luz do disposto no artigo 41.° o Decreto-Lei 223/87, de 30.05, competia aos serviços administrativos da Escola Secundária da ... a iniciativa e decisão para o escalonamento do Autor; que sabiam que o Autor não praticou os crimes de peculato e abuso de poder e que o procedimento disciplinar estava prescrito e, ainda, que os Réus tinham como único desígnio que o Autor fosse exonerado do cargo de Presidente do Conselho Diretivo o que infere que não atuaram com dolo, não tiveram qualquer intenção de prejudicar o Autor cumprindo, apenas, os trâmites processuais do processo disciplinar.
Deste modo, não poderá o Autor beneficiar do prazo prescricional mais longo mas somente do prazo geral de 3 anos, que tendo o seu início em 29/01/2003 atingiu o seu termo em 29/01/2006, muito antes da participação criminal apresentada pelo Recorrente contra os Réus, em 11/6/2007, a única causa que teria a virtualidade de interromper o prazo da prescrição.
O Recorrente insurge-se ainda contra a sentença recorrida por ter decidido que, no caso concreto, não se verificava o pressuposto do nexo de causalidade adequada, assim violando por erro de aplicação e interpretação, as disposições entre si conjugadas dos artigos 483.° e segs. do Código Civil.
Ora, tendo em consideração a data em que se produziram os supostos factos danosos, a eventual responsabilidade civil extracontratual do Réu Estado Português deverá ser apurada, como já vem sendo referido, nos termos do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas publicado no Decreto-Lei n.° 48051, de 21/11/1967.
Em face da matéria de facto provada que consta da sentença, apurou-se que o Autor apenas poderia progredir para o 10.° escalão da carreira docente se tivesse remetido um pedido de reposicionamento na carreira ao Diretor Regional de Educação do Norte, entidade competente para determinar o reposicionamento, como previsto no artigo 55.° do Estatuto da Carreira Docente e nos n.°s 4 e 6 do Despacho 243/ME/96, requisito ou formalidade legal que ele, conscientemente, não cumpriu.
Assim sendo, por força do Estatuto Disciplinar em vigor à data dos factos, tal comportamento consubstanciava a “violação dos deveres de isenção, zelo e lealdade pelo que, tendo o Autor atuado com culpa grave ou mesmo dolo, a sanção disciplinar aplicável era a da inatividade.”
Conclui assim, e bem, o Tribunal a quo, que mesmo “... que tivesse sido assegurado o direito de audiência ao Autor, haveria razões jurídicas para aplicar àquele a sanção disciplinar de inatividade, e, nessa medida, não há nexo de causalidade entre a preterição de audiência do Autor e os danos alegadamente sofridos pois que, determinante para a produção dos danos foi o comportamento do Autor, ao ter progredido para o 10.º escalão sem prévia autorização do órgão competente, Diretor Regional da Educação do Norte, e não o ato ilícito de preterição de audiência daquele no âmbito do processo disciplinar.”
“Por assim ser, não se verifica o nexo de causalidade entre os danos peticionados e a preterição da audiência do Autor, pelo que, não se verificando este pressuposto da responsabilidade civil extracontratual, e sendo eles de verificação cumulativa, fica prejudicada a análise dos demais requisitos nomeadamente dos danos.”
Cumpre recordar que nem todos os danos sobrevindos a um facto ilícito e culposo poderão integrar o círculo dos prejuízos indemnizáveis e, como tal, justificar a obrigação de indemnizar; sê-lo-ão apenas se constituírem consequência desse facto, isto é, aqueles em que seja possível identificar um nexo de causalidade adequada com o ato ou a omissão ilícita.
Tratando-se de matéria comum às diferentes formas de responsabilidade civil, e de acordo com a sistemática adotada pelo Código Civil, esta matéria encontra-se regulada, com carácter geral, a respeito da obrigação de indemnização e, em particular, no seu artigo 563°.
Merece hoje largo acolhimento, na nossa doutrina e jurisprudência, que a teoria da causalidade adequada é aquela que se encontra subjacente ao artigo 563° do Código Civil.
Esta teoria nasceu, todavia, com o objetivo de obviar aos inconvenientes da teoria da conditio sine qua non ou da equivalência das condições, segundo a qual devia ser considerada como causa do dano a condição sem cuja verificação aquele não teria ocorrido: no limite, a aplicação pura da teoria da conditio sine qua non teria como consequência a relevância de causas que, por si só, seriam imprestáveis para a produção do resultado ou dano a indemnizar.
A teoria da causalidade adequada assenta, pois, num juízo de prognose póstuma a empreender pelo julgador, tendo em conta as circunstâncias cognoscíveis à data dos factos por um observador experiente, delimitando como indemnizáveis apenas “os prejuízos que o lesado provavelmente não teria sofrido não fosse a lesão”.
Retomando o caso posto, e conforme já explanado, constata-se que os alegados danos em causa nunca poderiam considerar-se ter sido causados pela apontada ilicitude, no processo disciplinar em que o Autor era visado, da preterição da audiência de interessados.
A fundamentação jurídica vertida na sentença, no que aos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual diz respeito, está, assim, em linha com os ensinamentos que se podem colher da doutrina e jurisprudência: “Os tribunais administrativos consideram não existir nexo de causalidade entre actos administrativos materialmente válidos, mas padecendo apenas de vícios de forma ou de violação de lei por falta ou vício de fundamentação, e os danos eventualmente verificados: nestes casos, os danos ter-se-iam produzido na mesma se os actos administrativos em causa tivessem sido praticados sem o vício que os inquinava (assim, quanto a actos administrativos ilegais por falta de audiência de interessados, Ac. STA 25/1/2005, Proc. 01116/04 (...); (trata-se de uma aplicação, embora sem invocação expressa, da teoria do comportamento lícito alternativo. (Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado de Matos, in a “Responsabilidade Civil Administrativa, Direito Administrativo Geral”, Tomo III, pág. 33).
Improcedem, pois, as Conclusões das alegações.
Dito de outro jeito, a decisão ora em recurso não violou, entre outros, os artigos 18°, 32° e 268°, n°s 3 e 4 da CRP; artigo 6° da D.U.D.H; Lei 115/97 de 19/09; Decreto-lei 115/97 de 19/09; 323°, 326°, 327°, 342° 498°, 563° todos do Código Civil e artigos 623° e 624° do Código do Processo Civil.
De resto, mesmo relativamente à inconstitucionalidade conclusivamente invocada ou à violação do artº 6º da DUDH, sempre as mesmas teriam de estar acrescidamente justificadas, pois que não é de conhecer por omissão de substanciação no corpo de alegação, a violação de princípios Constitucionais/Internacionais, designadamente por interpretação desconforme à Lei Fundamental ou à DUDH, se o Recorrente se limita a afirmar a referida desconformidade de interpretação e de aplicação, sem apresentar, do seu ponto de vista, as razões de facto e de direito do discurso jurídico fundamentador nem, sequer, a modalidade a que reverte o vício afirmado. Ou seja, por falta de densificação tal matéria sempre sucumbiria.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário.
Notifique e DN.
Porto, 02/02/2024
Fernanda Brandão
Rogério Martins
Isabel Jovita |