Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1450/20.1T8CLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: CONTRATO A TERMO INCERTO
SUBSTITUIÇÃO DE TRABALHADORA EM ESTADO DE DOENÇA
MORTE DA TRABALHADORA SUBSTITUÍDA
CADUCIDADE DO CONTRATO
Data do Acordão: 05/27/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE CALDAS DA RAINHA DO TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 140.º, N.ºS 1 A 3 E 5, 147.º, N.ºS 1 E 2, 343.º E 345.º, N.º 1, TODOS DO CÓDIGO DO TRABALHO
Sumário: I – Constando do contrato a termo incerto celebrado pelas partes como motivo justificativo da contratação da autora a substituição de trabalhadora carteira temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar em situação de doença, aquele motivo consubstancia necessidade temporária prevista na al. a) do n.º 2 do art. 140.º do Cód. Trabalho, permitindo a contratação a termo incerto.

II – A morte da trabalhadora substituída por doença determina a caducidade do respetivo contrato de trabalho e, consequentemente, a caducidade do contrato a termo incerto da trabalhadora substituta, por ter terminado a necessidade de substituição.

Decisão Texto Integral:

Apelação n.º 1450/20.1T8CLD.C1

Acordam[1] na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

AA, residente em ...

intentou a presente ação de processo comum, contra

CTT – Correios de Portugal, SA, com sede em ...,

alegando, em síntese que:

Celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo incerto, cujo motivo justificativo é falso e cuja cessação por caducidade é inválida, devendo considerar-se o contrato celebrado sem termo e a comunicação da cessação por caducidade um despedimento ilícito.

Termina, pedindo que:

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO REQUER A V.EXª. DIGNE JULGAR A PRESENTE ACÇÃO PROCEDENTE POR PROVADA           E, CONSEQUENTEMENTE:

I. DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONSIDERA SEM TERMO POR INSUFICIÊNCIA DE CONCRETIZAÇÃO DO MOTIVO JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO OU POR FALSIDADE DO MOTIVOS JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO, UMA VEZ QUE NÃO SE TRATA DE UMA NECESSIDADE TEMPORÁRIA MAS SIM PERMANENTE,

OU

DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONVERTEU EM CONTRATO DE TRABALHO SEM TERMO, POR NÃO VERIFICAÇÃO DO EVENTO E/OU DA DATA DA CADUCIDADE INDICADA NA COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DA RÉ,

OU

DECLARAR QUE A COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES É INVÁLIDA E ILEGAL POR TER OCORRIDO SEM QUE SE VERIFICASSE O EVENTO PREVISTO NO CONTRATO PARA O SEU TERMO,

E

II. DECLARAR QUE A COMUNICAÇÃO DA À AUTORA, ATRAVÉS DA MISSIVA ORA JUNTA AOS AUTOS COMO DOC. 2, DATADA DE 14/04/2020 E RECEBIDA PELA AUTORA A 14/04/2020, ATRAVÉS DA QUAL A TRANSMITIU A ESTA QUE O SEU CONTRATO DE TRABALHO CESSARIA POR CADUCIDADE A 14/04/2020, CONSUBSTANCIA UM DESPEDIMENTO ILÍCITO, E, CONSEQUENTEMENTE:

a. CONDENAR A A REINTEGRAR A AUTORA NO MESMO ESTABELECIMENTO ONDE ANTERIORMENTE PRESTOU O SEU TRABALHO, SEM PREJUÍZO DA SUA CATEGORIA E ANTIGUIDADE,

OU

b. ALTERNATIVAMENTE, CASO A AUTORA VENHA A OPTAR PELA SUBSTITUIÇÃO DE TAL REINTEGRAÇÃO POR UMA INDEMNIZAÇÃO, O QUE PODERÁ EFECTUAR ATÉ AO TERMO DA DISCUSSÃO EM AUDIÊNCIA FINAL DE JULGAMENTO,

c. CONDENAR A NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO, A FIXAR ENTRE 30 E 45 DIAS DE RETRIBUIÇÃO BASE POR CADA ANO COMPLETO OU FRACÇÃO DE ANTIGUIDADE, ATENDENDO AO VALOR DA RETRIBUIÇÃO BASE E AO GRAU DE ILICITUDE DA CONDUTA DA RÉ, ATENDENDO PARA EFEITOS DE ANTIGUIDADE, AO PERÍODO DE TEMPO COMPREENDIDO ENTRE A DATA DE INÍCIO DO CONTRATO DE TRABALHO (22 DE JANEIRO DE 2019) E A DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO JUDICIAL QUE DECLARE ILÍCITO O DESPEDIMENTO, SENDO QUE TAL INDEMNIZAÇÃO NUNCA PODERÁ SER INFERIOR A TRÊS MESES DE RETRIBUIÇÃO BASE, ACRESCITA DE JUROS DE MORA, QUE SE VENCERÃO DESDE A DATA DA CITAÇÃO DA E ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO;

d. CONDENAR A A PAGAR À AUTORA AS RETRIBUIÇÕES QUE A MESMA DEIXOU DE AUFERIR, DESDE 30 DIAS ANTES DA PROPOSITURA DA PRESENTE ACÇÃO E ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO DO TRIBUNAL QUE DECLARE A ILICITUDE DO DESPEDIMENTO, NELAS SE INCLUINDO AS RETRIBUIÇÕES MENSAIS, AS RETRIBUIÇÕES POR FÉRIAS NÃO GOZADAS QUE SE VENCERIAM DURANTE ESSE PERÍODO, RESPECTIVO SUBSÍDIO DE FÉRIAS, SUBSÍDIO DE NATAL E RETRIBUIÇÃO POR HORAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL NÃO MINISTRADAS E/OU RETRIBUIÇÃO POR CRÉDITO DE HORAS PARA FORMAÇÃO QUE SE FORMASSEM, ACRESCIDAS DE JUROS DE MORA, QUE SE VENCERÃO DESDE A DATA EM QUE CADA UM DESSES VALORES PARCELARES SERIA DEVIDO, NÃO TIVESSE OCORRIDO O DESPEDIMENTO ILÍCITO, E ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO;

III. CONDENAR A A PAGAR À AUTORA A QUANTIA DE 739,38 €, A TÍTULO DE RETRIBUIÇÃO CORRESPONDENTE AO PERÍODO DE AVISO PRÉVIO EM FALTA, ACRECIDA DE JUROS DE MORA, VENCIDOS E VINCENDOS, DESDE A DATA DE 14/04/2020 E ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO, CONTANDO-SE VENCIDOS, À PRESENTE DATA (11/11/2020), NO VALOR DE 17,18€;

IV. CONDENAR A A PAGAR À AUTORA A QUANTIA DE 290,92 €, A TÍTULO DE RETRIBUIÇÃO CORRESPONDENTE AO NÚMERO MÍNIMO DE HORAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL A QUE A AUTORA TINHA DIREITO E QUE NÃO LHE FORAM MINISTRADAS, ACRECIDA DE JUROS DE MORA, VENCIDOS E VINCENDOS, DESDE A DATA DE 14/04/2020 E ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO, CONTANDO-SE VENCIDOS, À PRESENTE DATA (11/11/2020), NO VALOR DE 6,73€;

V. SEM PREJUÍZO DA POSSIBILIDADE DE V.EXª. CONDENAR A EM QUANTIDADE SUPERIOR AOS PEDIDOS FORMULADOS OU EM OBJETO DIVERSO DELES, EM FUNÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA, DE FACTOS NOTÓRIOS OU DE PRECEITOS INDERROGÁVEIS DE LEIS OU INSTRUMENTOS DE REGULAMENTAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO, AO ABRIGO DA CONDENAÇÃO EXTRA VEL ULTRA PETITUM”, PREVISTA NO ARTIGO. 74º DO CÓDIGO DO PROCESSO DE TRABALHO.

*

A Ré contestou alegando, em sinopse, que:

O motivo constante do contrato é válido e verdadeiro e ocorreu uma caducidade automática do contrato por falecimento da trabalhadora substituída, não consubstanciando a comunicação da caducidade qualquer despedimento ilícito.

Termina dizendo que:

“Termos em que, sempre com o Douto suprimento de V. Exa., deve a presente ação ser julgada improcedente por não provada e, em consequência, deve a Ré ser absolvida dos pedidos formulados pela Autora, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”

                                                             *

Foi proferido despacho saneador.

                                                             *

Procedeu-se a julgamento conforme resulta da respetiva ata.

                                                             *

Foi, depois, proferida sentença e cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Pelo exposto, julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente acção, e, em consequência, condeno o R., “CTT – Correios de Portugal, S.A.”, a pagar à A., AA:

- a quantia total de € 739,38 (setecentos e trinta e nove Euros e trinta e oito cêntimos), a título de falta de aviso prévio para a cessação do contrato de trabalho, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, contados desde 14/4/2020 e até integral pagamento;

- a quantia total de € 170,10 (cento e setenta Euros e dez cêntimos), a título de créditos de formação, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, contados desde 14/4/2020 e até integral pagamento.”

                                                             *

A Autora, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

I. Destina-se o presente Recurso a impugnar a decisão proferida pelo Tribunal da Primeira Instância, que decidiu indeferir a pretensão da Autora, julgando “parcialmente procedente por parcialmente provada, a presente acção, e, em consequência, condeno o R., “CTT – Correios de Portugal, S.A.”, a pagar à A., AA:”, mas absolveu a Ré dos demais pedidos formulados, condenando ainda a Autora em custas na proporção de 97%;

II. Salvo o devido respeito por mais douto entendimento, mal ando a Mma. Juiz a quo na Sentença proferida, mormente na subsunção jurídica dos factos resultantes dos autos, o que conduziu à improcedência do demais peticionado na ação pela Autora, ao que não nos acomodamos.

A Apelante está convicta que Vossas Excelências, reapreciando a factualidade descrita nos autos, bem como, a tramitação ali aduzida, e subsumindo a mesma às normas legais efetivamente aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão, de revogar a Sentença recorrida, e de a substituir por uma que julgue procedentes os pedidos formulados em sede de Peça inaugural.

Considerando a essência da douta decisão, contemplemos,

DA NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA

III. Na peça inaugural a Apelante peticionou o que infra se reproduz:

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO REQUER A V.EXª. DIGNE JULGAR A PRESENTE ACÇÃO PROCEDENTE POR PROVADA E, CONSEQUENTEMENTE:

I. DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONSIDERA SEM TERMO, POR INSUFICIÊNCIA DE CONCRETIZAÇÃO DO MOTIVO JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO OU POR FALSIDADE DO MOTIVOS JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO, UMA VEZ QUE NÃO SE TRATA DE UMA NECESSIDADE TEMPORÁRIA MAS SIM PERMANENTE,

OU

DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONVERTEU EM CONTRATO DE TRABALHO SEM TERMO, POR NÃO VERIFICAÇÃO DO EVENTO E/OU DA DATA DA CADUCIDADE INDICADA NA COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DA RÉ,

OU

DECLARAR QUE A COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES É INVÁLIDA E ILEGAL POR TER OCORRIDO SEM QUE SE VERIFICASSE O EVENTO PREVISTO NO CONTRATO PARA O SEU TERMO,”

IV.Sucede que na douta sentença proferida a quo, a Mma. Juiz não se debruça sobe os seguintes pedidos subsidiários. Alias, só se pronunciou, sem a devida fundamentação, acerca da insuficiência do termo e da sua falsidade, fazendo tábua rasa do depoimento das testemunhas que de forma credível demonstraram que o CDP em que a Autora estava inserida tinha necessidades permanentes e não transitórias e que a Ré contratava trabalhadores temporários e agenciados para suprir as suas necessidades permanentes.

V. Aquelas declarações, com a documentação que foi solicitada à Apelada e ao Instituto da Segurança Social, certamente, demonstrariam as necessidades permanentes da Apelada, e consequentemente, mostrariam que o motivo justificativo aposto ao contrato da Apelante é falso, porquanto a sua contratação não foi, só, para uma necessidade transitória. E relativamente aos pedidos subsidiários, o Tribunal a quo pronunciou-se de forma vaga, não fundamentando a improcedência dos pedidos formulados, como era o seu dever fazer.

VI.Neste sentido, o Ac. do STJ, de 24-10-2012I - A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetam à apreciação do tribunal (art. 660.º, n.º 2, do CPC), e as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deve conhecer, independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.”. no entendimento do Tribunal da Relação de Guimarães no douto Acórdão datado de 16-05-2016, pelo relator João Lee Ferreira é propalado que “A omissão de pronúncia significa a ausência de atitude ou de posicionamento pelo tribunal em caso ou sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. II) As questões que o juiz deve apreciar são todas aquelas que os sujeitos processuais interessadas submetam à apreciação do tribunal (artº 660º, 2, do CPC), e as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.”. Outrossim, e de acordo com o entendimento preconizado pelo douto Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão de 08-05-2019, pela relatora Maria da Graça Santos Silva, “A omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito e não quanto a todo e qualquer argumento aduzido. O vocábulo legal - “questões” - não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir.”.

VII. In casu, a Mma. Juiz do Tribunal a quo não tomou posição fundamentada dos pedidos formulados pela Autora, nem considerou devidamente toda a prova que lhe foi oferecida. Pelo exposto, salvo respeito por superior entendimento, padece a decisão proferida da nulidade inserida no artigo 615.º d), ex vi do artigo 666.º, por omissão de pronúncia, e, bem assim, da nulidade prevista no artigo 195.º, n.º 1, in fine, do Cód. de Processo Civil.

Da Matéria de Facto

VIII. Realizada a Audiência de Julgamento, e produzida a prova oferecida pela aqui Apelante, optou por a Mma. Juiz “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente acção (…)”, da qual discordamos, como supra referido.

IX. Mal andou o Tribunal a quo ao considerar como não provados, designadamente, os factos sob as alíneas a), b) e c), pois considerando a prova testemunhal produzida, parece-nos que deveria ter resultado em decisão absolutamente oposta à que foi proferida a quo.

Ora vejamos,

X. Considerou o Mma. Juiz, em suma, e com relevância para o presente Recurso que: “A decisão quanto aos factos não provados deve-se à ausência de prova sobre os mesmos que permitisse decisão diversa.”, no entanto, toda a prova produzida aponta no sentido inverso.

XI. No âmbito da Audiência de julgamento de 21 de outubro de 2021, inquirida a instâncias do mandatário da Autora, a testemunha BB prestou as declarações supratranscritas em sede de alegações, e em virtude das quais deveriam ter sido dados como provados os factos elencados sob as alíneas a), b) e c), conforme gravação 20211021102021_4008925_2870976 da audiência de discussão e julgamento de 21-10-2021, dos minutos 00:03:13 a 00:04:06 e 00:09:54 a 00:13:13).

XII. Ora, do compósito de tais declarações, facilmente de afere que, a Apelada para fazer face as suas necessidades permanentes contrata trabalhadores a termo, agenciados e trabalhadores temporários, que hé falta de pessoas, essencialmente na altura em que cessou o contrato de trabalho da Apelante, nos últimos seis anos “anos já morreram duas pessoas e uma foi reformada e nunca colocaram ninguém no lugar dessas pessoas”, essas pessoas nunca foram substituídas, e por fim que ao longo desses seis anos o trabalho só tem aumentado.

XIII. Também das inquirições, da testemunha CC, que prestou as declarações supratranscritas em sede de alegações, e em virtude das quais deveriam ter sido dado como provados os factos elencados sob as alíneas a), b) e c), conforme gravação gravação 20211021104421_4008925_2870976 da audiência de discussão e julgamento de 21-10-2021, dos minutos 00:02:00 a 00:05:50).

Destas declarações, facilmente se conclui que desde 2014 trabalham menos três trabalhadores no quadro da Apelada, que não houve substituição desses trabalhadores e que o trabalho nos últimos anos tem aumentado, que “Desde 2014 que me lembro de andar sempre a dobrar giros. Desde que para lá fui ando sempre a dobrar giros.”. Mas disse que “Advogado: Quando diz que a AA vem substituir a DD que ficou doente, mesmo que a DD não estivesse doente se a AA viesse era necessária (…) /Testemunha CC: Sim, sim, era precisa” e por fim, que o CDP se vu com menos duas trabalhadoras, a DD e a AA.

XIV. Por tudo o exposto e de toda a prova produzida, ficou demonstrado que deveriam ter sido dado com provados os factos elencados sob as alíneas a), b) e c). E em estrito cumprimento do ónus de impugnação de matéria de facto, veja-se a prova documental carreada pela Autora, designadamente os documentos 4 e 4.1 – que demonstram a sobrecarga do CDP ... (facto b) dos não provados, o qual deveria ter sido dado como provado) – e que impunham decisão absolutamente oposta à proferida.

Da matéria de direito

XV. Regulando a situação sub judicie, à legislação em vigor à data dos factos (Data da celebração do Contrato de Trabalho) e com interesse para a causa, de acordo com o preceituado no n.º 1, do artigo 140.º, do Cód. do Trabalho “1 - O contrato de trabalho a termo resolutivo pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.”. O n.º 1, do artigo 145.º do Cód. do Trabalho, preceitua “1 - Até 30 dias após a cessação do contrato, o trabalhador tem, em igualdade de condições, preferência na celebração de contrato sem termo, sempre que o empregador proceda a recrutamento externo para o exercício de funções idênticas àquelas para que foi contratado.”. De acordo com o preceituado na alínea c), do n.º 2 do artigo 147.º, do Cód. de Trabalho “Converte-se em contrato de trabalho sem termo o celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em actividade após a data da caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo.”. O artigo 53.º, da Constituição da Républica Portuguesa, estabelece que “É garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, (…)” .

XVI. No caso específico para a substituição de trabalhador, a data legalmente atendível, para a caducidade do Contrato de Trabalho da Autora é o “regresso do trabalhador substituído”, e que para o fundamento deste tipo de contratação, a lei, presume a transitoriedade da ausência, compreende-se, por isso, que só enuncie o “regresso” como o evento referencial para a cessação do vínculo. Logo, facilmente se alcança que essa ausência se possa tornar definitiva, principalmente quando é motivado por ausência do trabalhador, deixando de subsistir o requisito da transitoriedade, que fundamentou a aposição do termo contratual do trabalhador substituído.

XVII. A “ratio” deste preceito, id est, o fim pretendido pelo legislador e as soluções que se pretende alcançar com a norma impõe uma essencial comparação entre o “regresso” e o “não regresso definitivo” enquanto facto com virtualidade idêntica para efeitos de conversão do vínculo precário em vínculo sem termo. O que está em causa, na motivação do vínculo precário, é apenas uma ausência por doença, o que revela, para a extinção desse vínculo, é, tão-somente a certeza que a ausência se tornou definitiva.

XVIII. No entanto, nada impõe, ao contrário do que é referido pelo Tribunal a quo, que essa certeza só se obtenha com a cessação do Contrato de Trabalho do trabalhador substituído (morte do Trabalhador), a verdade é que tudo dependerá do condicionalismo de cada caso.

XIX. In casu, a trabalhadora substituída era doente oncológica em estado grave, cremos que a Ré, mesmo antes do falecimento da trabalhadora, conjeturou considerando a gravidade da doença – que esta ausência se iria tonaria definitiva. Mas, mesmo que assim não fosse, a substituição da trabalhadora doente, não se destinou, só, a suprir uma necessidade transitória de serviço, mas sim uma necessidade permanente, alias, como demonstrado pela prova testemunhal.

XX. Também, o que demonstra a necessidade permanente da Recorrida, e sempre será oportuno relembrar que, a Recorrente, no ano de 2018, concretamente entre 21-05-2018 e 05-11-2018, foi contratada pela Recorrida para as funções de CRT-Carteiro, no CDP ... ... (como a própria refere nos artigos 1.º a 3.º da Contestação apresentada). E logo, no início do ano se 2019, a Recorrente, foi, novamente, contratada para o mesmo posto de trabalho e para as mesmas funções.

XXI. Do supra referido, depreende-se que entre o primeiro contrato a termo e o segundo contrato a termo sucedeu um intervalo extremamente curto, sendo o contrato entre as mesmas partes e para o exercício das mesmas funções

XXII. A Apelada usa o recurso sucessivo á modalidade de contratação a termo, com vista a contornar os inconvenientes da vinculação sem termo, sendo o que se verificou in casu, e que o douto Tribunal a quo, certos de que erradamente, não vislumbrou.

XXIII. A Apelada, pelo menos desde 2014, que tem aumentado o fluxo de trabalho, devido ao express mail e as encomendas provenientes da china, por outro lado, ficou sem 3 trabalhadores do quadro, ou seja, trabalhadores com contrato a termo indeterminado. Aqui chegados, a questão que se coloca é: Se o trabalho e serviços aumentaram e se o n.º de trabalhadores que satisfazem necessidades permanentes diminuiu, como é que a Ré faz face para suprir estas necessidades? A resposta parece-nos obvia, a Ré escuda-se no manto da contratação a termo para suprir carências que não são esporádicas, mas permanentes.

XXIV. No contrato de trabalho, vide cláusula segunda do contrato de trabalho da Autora junto como Doc. 1, com a Petição Inicial, o contrato foi celebrado, também ao abrigo do n.º 1 do artigo 140.º do CT “1 - O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para   a satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades.”, elencando o legislador, no nº 2, e de forma exemplificativa (“nomeadamente”), situações que considera corresponderem a necessidades temporárias da empresa, sendo que a tais situações não poderá ser alheio o conceito de necessidade temporária constante da cláusula geral do nº 1; “Por necessidades temporárias da empresa, por contraposição a necessidades permanentes ou estáveis, entendemos que serão aquelas que sejam, quer pela sua natureza, quer pela sua duração, transitórias, limitadas no tempo, no contexto da atividade da empresa, sendo essa transitoriedade que justifica    que o princípio da segurança no emprego, constitucionalmente consagrado, e da consequente perenidade do vínculo laboral”, in Acordão do Tribunal da Relação do Porto ;

XXV. A Autora não foi, só, contratada para substituir a trabalhadora ausente, como foi desmontado pela prova produzida em sede de audiência de julgamento, a contratação da Autora, além, da substituição, foi para colmatar necessidades duradouras da Ré que já perduram pelo menos desde 2014. A verdade é que a trabalhadora substituída faleceu no dia .../.../2020, e a Ré comunicou a caducidade do contrato de trabalho à Autora com efeitos a dia 14 de abril de 2020, ou seja, a necessidade deixou de ser temporária (o que já não seria no entendimento da Autora) para ser uma necessidade permanente.

XXVI. Posto isto, não obstante a Apelada se encontrar sob o manto da necessidade de substituição de trabalhadora ausente, o facto é que, essa necessidade se caracteriza por ser, não temporária, mas antes permanente. Esta deveria ter sido a convicção do Tribunal a quo mas que não foi pelo descrédito na prova produzida.

XXVII. Por tudo o exposto, facilmente concluímos que as funções que a Autora vinha a exercer eram necessidades permanentes, pois já na data em que foi celebrado o contrato de trabalho com a Apelada, esta, estava com sobrecarga de trabalho, e não estava a conseguir fazer face às necessidades permanentes que detinha.

Por fim,

XXVIII. Por tudo o supra exposto, deverão V. Exa., no mais alto e ponderado critério, judiciar a presente Apelação, revogando a decisão a quo e substituindo-a por uma que determine a procedência total da ação.

Nestes termos e nos melhores de direito que Vossas Excelências mui doutamente cuidarão de suprir, deve a presente Apelação ser julgada totalmente procedente, alterando a decisão sobre a matéria de facto e revogando in totum a decisão a quo, substituindo-a por uma outra que determine a total procedência da ação,

Alterando a douta decisão apelada, farão vossas excelências, inteira e JUSTIÇA.”

                                                             *

A Ré respondeu sustentando que:

“Tal como resulta da factualidade provada, antes do contrato que está em causa nos presentes autos, entre a Recorrente e a Recorrida foi celebrado um outro contrato, a termo certo, para substituição de trabalhadores em gozo de férias.

Ao abrigo deste contrato, a Recorrente foi contratada para as funções de CRT-carteiro, no CDP ... ..., com motivo justificativo a substituição de trabalhadores em gozo de férias, sendo que o contrato teve a duração de 169 dias, iniciando-se em 21.05.2018 e  terminando em 05.11.2018.

Assim, e ao contrário do que a Recorrente pretende fazer crer a este Tribunal esta primeira contratação está justificada e assente em necessidades transitória da Recorrida derivadas do gozo de férias dos seus trabalhadores, não existindo – tal como parece ser o  entendimento da Recorrente – qualquer necessidade permanente.

Seguidamente, entre a Recorrente e a Recorrida foi celebrado, em 22.01.2019, um contrato de trabalho a termo incerto para substituição da trabalhadora DD que se encontrava impedida de prestar trabalho por se encontrar na situação de doença.

Por conta do contrato supra, a Recorrente foi desempenhar as funções inerentes à categoria de CRT-Carteiro, no CDP de ..., cumprindo os horários praticados no referido local de trabalho e auferindo uma remuneração base inicial de € 622,00 (que em 2020 passou a  ser de € 635,00).

Assim, a verdade – tal resulta amplamente da prova documental e mesmo da prova testemunhal transcrita pela Recorrente nas alegações que apresenta – é que a Recorrente foi contratada para substituir a trabalhadora DD, ausente por doença.

Sucede, porém, que a referida trabalhadora nunca regressou ao serviço porque, infelizmente, acabou por falecer.

Assim, tal como bem decidido pelo Tribunal a quo, não existiu qualquer ilicitude, invalidade ou falsidade do motivo justificativo aposto no contrato já que a Recorrente, de facto, foi contratada para substituir um trabalhador ausente.

Aliás, a própria Recorrente não coloca em causa que, no período da sua contratação, a trabalhadora DD esteve, de facto, ausente.

O que a Recorrente alega – erradamente, em nosso entender – é que o falecimento da trabalhadora substituída implicaria que o seu contrato se convertesse em contrato sem termo por – espante-se – não ter havido regresso da trabalhadora!!

A Recorrente entende que o facto de a trabalhadora substituída não ter regressado consubstanciaria, por si só, que a Recorrida ficava com uma necessidade permanente…

…quando tal nunca sucedeu já que basta ver-se que após a caducidade do contrato com a Recorrente mais ninguém foi contratado para o CDP em causa (aliás, nem sequer a Recorrente conseguiu provar que assim tenha sido, sendo certo que como muito bem entendeu o Tribunal a quo, ainda que tal tivesse acontecido quem seria beneficiado era o novo trabalhador contratado e não a aqui Recorrente…)

Mas a verdade é só uma: a Recorrente foi contrata, ao abrigo de um contrato de trabalho a termo incerto para substituir uma trabalhadora que se encontrava ausente por doença, a qual, infelizmente acabou por falecer em .../.../2020,

O que só por si significa, como entende a nossa jurisprudência, que o contrato a termo celebrado termina/caduca.

(…)

Ou seja, e regressando ao caso concreto, verificamos que o falecimento da trabalhadora substituída consubstancia uma caducidade automática do contrato de trabalho celebrado com a Recorrente, sendo certo que a aqui Recorrida o fez denunciar, expressamente, 4 dias após o falecimento da trabalhadora DD que, relembre-se, ocorreu em .../.../2020.

Pelo que verificamos, sem margem para dúvidas – e porque a Recorrente não põe em causa o motivo da sua contratação, ou seja, que esteve, de facto, a substituir trabalhadora ausente – que o fundamento aposto no contrato é perfeitamente válido, verdadeiro e cumpre todos os requisitos legais.

Assim, face a tudo quanto supra se expendeu, verificamos que o contrato de trabalho celebrado entre a Recorrente e a Recorrida em 22.01.2019 é perfeitamente válido e terminou por caducidade, e não por despedimento como alega a Recorrente.

Efectivamente, a partir do óbito da trabalhadora substituída deixou de haver motivo que fundamentasse o contrato em apreço, daí que a aqui Recorrida o tenha feito cessar dentro dos circunstancialismos legais.

Assim, é convicção da Recorrida – tal como o foi do Tribunal a quo - que o contrato de trabalho a termo incerto não pode ser considerado ilícito porque foi celebrado dentro dos condicionalismos legais,

Nem nulo porque conforme se verificou a causa justificativa se encontra devidamente identificada e comprovada,

Nem ineficaz porquanto produziu efeitos e regulou a relação jurídica laboral até ao momento da sua cessação.

Efectivamente, da vasta exposição de motivos da Recorrente não resulta qualquer facto susceptível de contrariar os fundamentos invocados pelas partes na celebração do contrato de trabalho em análise.

Sendo certo que a aqui Recorrida cumpriu com o ónus que sobre si impendia de demonstrar a veracidade e a validade dos factos por si adiantados para justificar a necessidade de recurso à contratação a termo, o que fez e hoje reitera.

Pelo que carece totalmente de qualquer suporte legal ou factual a alegação por parte da Recorrente no sentido de que a denúncia do contrato de trabalho a termo incerto celebrado 22.01.2019 tenha na realidade consubstanciado um despedimento ilícito.

Para que consubstanciasse um despedimento ilícito haveria que anteriormente demonstrar que os requisitos legais da contratação ao abrigo de termo resolutivo haviam sido negligenciadas por parte da Recorrida,

O que não sucedeu, conforme, sobejamente, já se clarificou!

E em bom rigor dificilmente se poderá agora reclamar, como faz a Recorrente, a conversão em contrato de trabalho por tempo indeterminado,

Pelo que nenhuma razão assiste à Recorrente ao vir peticionar a sua reintegração com base num alegado despedimento ilícito.

Configurando-se, antes, a cessação do contrato de trabalho operada por via da caducidade, resultante da denúncia do contrato de trabalho a termo incerto promovida e comunicada pela Recorrida.

Por último – e já em desespero de causa, diremos nós – vem a Recorrente referir que as necessidades da Recorrida em CRT- Carteiros são necessidades permanentes e não transitórias, pelo que tendo a Recorrida ficado sem uma trabalhadora (a trabalhadora que a mesma foi substituir) é lógico que se contratasse a Recorrente para a substituir.

Ora, não poderia estar mais errada a Recorrente.

Com efeito, e como já supra demonstrado, a contratação da Recorrente deveu-se a uma necessidade transitória da Recorrida que consistiu na substituição da trabalhadora DD que se encontrava ausente por doença.

De igual modo não logrou a Recorrente provar que após o terminus do seu contrato a Recorrida procedeu à contratação de trabalhador para a substituir (já que, de facto, tal nunca sucedeu!)

Efectivamente, e tal como a própria Recorrida referiu em sede de Contestação- e juntou prova documental -, após a cessação deste contrato com a Recorrente as contratações por si efectuadas (entre 15.04.2020 e 12.11.2020) foram para substituição de trabalhadores em gozo de férias e substituição de trabalhadores ausentes por motivo de doença, não tendo havido no período em apreço qualquer deslocação ou transferência de trabalhadores para o CDP ... ....

Assim, ao contrário do alegado pela Recorrente, não estão nem nunca estiveram em causa necessidades permanentes da aqui Recorrida mas sim necessidades transitórias, verificáveis e comprovadas.

De facto, no CDP em causa (CDP ... ...) desde o momento em que a Recorrente saiu e até Novembro de 2020 houve oscilações de tráfego (-50%); a sobrecarga da equipa diminuiu (verificável pela diminuição dos giros em dobra); etc.

Ainda assim, sempre diremos que nunca esteve ou poderia estar em causa o mesmo posto de trabalho da Recorrente – como a mesma parece entender - porque no que respeita à (alegada) sucessividade contratual propriamente dita, é entendimento da aqui Recorrida que a sucessividade contratual só existe quando os contratos (sucessivos) são celebrados para o mesmo posto de trabalho, sendo que decorre da própria lei laboral que o posto de trabalho não está associado unicamente às funções exercidas mas, sobretudo, aos trabalhadores individualmente considerados.

(…)

Face ao exposto, é convicção da Recorrida que mesmo nas contratações efectuadas após o terminus do contrato com a Recorrente – e que, mais uma vez, frise-se, em nada beneficiam a mesma -não estamos perante o mesmo posto de trabalho porquanto no caso da Recorrente a mesma foi substituir uma trabalhadora ausente (e que acabou por não regressar) ao passo que nos contratos celebrados após a sua saída a substituição foi de outros trabalhadores totalmente diferentes e que se encontravam em gozo de férias ou ausentes.

É de relevar, igualmente, que só mais de dois meses após o terminus do contrato com a aqui Recorrente é que a Recorrida celebrou novo contrato, pelo que facilmente verificamos que as necessidades da aqui Recorrida são, de facto, temporárias e transitórias, devidamente justificadas e comprovadas, e não necessidades permanentes.

Não estando – como não estamos – perante o mesmo posto de trabalho, não existe qualquer violação da lei.

Pelo que, novamente, não existiu qualquer despedimento ilícito nem sequer a conversão em contrato sem termo,

Devendo este Venerando Tribunal julgar válida e lícita a caducidade operada pela Recorrida, ainda que sem cumprimento integral do pré-aviso (o qual, no estrito cumprimento da sentença recorrida, já foi pago à Recorrente, bem como os juros de mora e créditos de formação), com a consequente manutenção da sentença recorrida.

Acresce que de igual modo não existe nenhuma errada valoração da prova testemunhal ou documental pelo que a factualidade considerada como não provada o foi tendo em consideração tudo o que foi carreado para os autos.

Aliás, mesmo com a impugnação que a Recorrente faz da matéria de facto, sempre a factualidade C) dada por não provada tem que se manter tal e qual como está porquanto, de facto, nenhuma prova fez a Recorrente que a Recorrida fez contratações a termo para preenchimento do mesmo posto de trabalho que a Recorrente desempenhava, aliás, como sobejamente demonstrado e como resulta, à saciedade, dos depoimentos transcritos pela mesma.

Mas mesmo a factualidade A) não deverá ser mexida porquanto, de facto, o que as testemunhas vêm referir é que antes mesmo de a Recorrente ter ido para lá trabalhar já (alegadamente) o CDP em causa estaria com menos pessoas,

O que é substancialmente diferente do que a Recorrente pretende trazer ao processo de que essa diminuição de trabalhadores ocorreu concomitantemente ou posteriormente à sua saída, o que não foi de todo o caso.

Pelo que mais uma vez resulta claro que não resulta provado em lado nenhum – nem sequer nas alegações que apresenta – que o CDP em causa se viu com menos um trabalhador, para além da Recorrente,

O que só por si deita por terra a factualidade não provada B) já que é um corolário/consequência do ponto A).

Assim, deve a impugnação da matéria de facto efectuada pela Recorrente improceder, na sua totalidade.

Pelo supra exposto, e sempre com o douto entendimento deste Venerando Tribunal da Relação, deverá a decisão recorrida ser mantida.

Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com o Douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser considerado improcedente!”        

*

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

                                                             *

II – Questões a decidir:

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do CPC), com exceção das questões de conhecimento oficioso.

Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela Autora recorrente, quais sejam:

1ª – Nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

2ª – Reapreciação da matéria de facto.

3ª – Se o termo aposto no contrato de trabalho é falso.

                                                             *

                                                             *

III – Fundamentação

a) Factos provados

1) No dia 22 janeiro de 2019, a A. e a R. celebraram um contrato de trabalho a termo incerto, em documento escrito, através do qual esta admitiu aquela ao seu serviço, com início nesse dia, para, sob as ordens e direção da R., desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de carteiro com o grau de certificação II no centro de distribuição postal ... ...;

2) Consta do contrato, como motivo justificativo da contratação da A., a substituição da carteira (...) DD, temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar em situação de doença;

3) A A. auferia a retribuição base mensal de € 612,00, acrescida de subsídio de alimentação diário de € 9,01, sendo os subsídios de férias e de Natal pagos em duodécimos mensais;

4) No dia 13 de abril de 2020, a R. expediu carta à A. através da qual lhe comunicava que o seu contrato caducava no dia 14 de abril de 2020, porquanto o motivo que lhe deu origem cessou;

5) A A. cumpria um período normal de trabalho semanal de 39 horas máximo diário de 8 horas;

6) DD faleceu no dia .../.../2020;

7) A R. não ministrou formação profissional à A.;

8) À data da celebração do contrato mencionado em 1), DD encontrava-se ausente do trabalho, por estar doente;

9) Ultimamente, a A. auferia a retribuição base mensal de € 635,00;

Mais ficou provado, por ter relevância para o cálculo dos créditos de formação profissional, resulta do boletim de vencimento referente a Dezembro de 2019 (fls. 27) e é aceite pela R. conforme se extrai da fórmula de cálculo apresentada no artigo 63 da contestação:

10) A retribuição base mensal auferida pela A. de outubro a dezembro de 2019 foi de € 622,00.

FACTOS NÃO PROVADOS:

A) O centro de distribuição postal ... viu-se com menos um trabalhador, além da A.;

B) Ficando os trabalhadores com uma enorme subcarga [supõe-se que a A. quis dizer "sobrecarga"], o que tornou impossível efetuar a distribuição postal;

C) A R. fez contratações a termo para preenchimento do mesmo posto de trabalho que a A. desempenhava.

 “FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO:

Na formação da sua convicção o Tribunal teve em conta as diligências de prova realizadas em sede de audiência de julgamento e, bem assim, os documentos juntos aos autos, os quais analisou conjugada e criticamente, lançando mão sempre que tal se justifique, e seja admissível, a regras de experiência comum.

*

Antes, porém, explique-se o seguinte:

Apenas os factos com relevo para a decisão da causa a lei manda enunciar na sentença, e apenas os factos, sendo de afastar, por isso, afirmações genéricas sem base factual e expressões de natureza conclusiva e/ou que envolvam juízos de valor destituídas de conteúdo fáctico.

“Factos” são as ocorrências da vida real; os fenómenos da natureza e as manifestações concretas dos seres vivos, nomeadamente os actos e os factos praticados pelo Homem.

Daí que o Tribunal não tenha considerado, nem para os factos provados, nem para os não provados, todo o acervo constante dos articulados das partes (em especial da petição inicial com abundantes generalidades) sem qualquer base factual.

*

As testemunhas, nos termos que se mostram registados em suporte digital, depuseram, no essencial, com isenção, revelando a sua razão de ciência relativamente à matéria de facto a que foram inquiridas. Narraram os factos de que têm conhecimento, por via das relações de trabalho que mantiveram com a A., por serem todos trabalhadores da R., inclusive a testemunha BB irmã da A. e carteira, com segurança, denotando isenção e conhecimento pessoal e directo sobre os mesmos. Estando os depoimentos gravados, afigura-se despiciendo proceder ao resumo de cada um deles ou à enunciação do que as testemunhas disseram para além do que seja necessário à explicação das razões que fundam a decisão do Tribunal.

*

Concretamente acerca da decisão sobre a matéria de facto:

Os factos consignados nos números 1 a 6 e 9, não foram impugnados pelo R., pelo que a demonstração dos mesmos assenta no acordo entre as partes. Quanto ao facto 6 atendeu-se, igualmente, ao assento de óbito com cópia junta a fls. 153.

A prova produzida acerca da formação profissional ministrada à A. não foi suficientemente segura e concludente acerca do acerto do documento junto pela R. a fls. 165-166.

Foi unanime entre as testemunhas BB, CC e EE que a formação profissional foi ministrada por este último, após o termo do dia de trabalho, mas dentro do horário de trabalho, pelo que nunca ocorreu uma acção de formação com a duração de várias horas mencionadas naquele documento. Solicitado a esclarecer o modo como foi prestada a formação profissional, a testemunha EE revelou pouca segurança na explicação do que consta daquele documento, podendo os períodos que dele constam ser, afinal, a soma de diversos módulos e incluir, também, a formação que os colegas deram à A. no terreno.

A lei estabelece que a formação profissional contínua dá lugar à emissão de certificado.

Aceita-se que a realização de formação profissional possa ser provada por outros meios que não o certificado, uma vez que não estamos perante facto para o qual a lei exija um concreto meio de prova, no caso, documental, porém, no caso dos autos, o Tribunal entende que não foi produzida prova bastante acerca da formação profissional realizada pelo R., nomeadamente as acções de formação indicadas na contestação com base do documento de fls. 165-166.

A matéria de facto julgada provada sob o número 8 foi assim afirmada por todas as testemunhas, e a mesma ressalta da análise do documento de fls. 146-152.

A decisão quanto aos factos não provados deve-se à ausência de prova sobre os mesmos que permitisse decisão diversa.

As testemunhas BB e CC, inquiridas sobre a matéria, foram claras, e fizeram-no sem hesitações, na afirmação de que para o lugar da A. não foi contratado ninguém, nem sequer para o lugar de DD. Por outro lado, o que os trabalhadores se queixam é da generalizada falta de trabalhadores, por ausência de pessoas – as testemunhas indicaram que, no período em que se encontram a trabalhar no centro de distribuição postal de ..., se reformou uma pessoa em 2016, e faleceram dois outros trabalhadores (um dos quais antes de DD), trabalhadores que nunca foram substituídos.”

                                           *

                                           *

b) - Discussão

Apreciando as questões suscitadas pela Autora recorrente:    

1ª questão

Nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Alega a recorrente que a sentença recorrida:

- Não se pronunciou sobre os pedidos subsidiários, só se pronunciou sem a devida fundamentação acerca da insuficiência do termo e da sua falsidade, fazendo tábua rasa do depoimento das testemunhas que demonstraram que o CDP tinha necessidades permanentes e não transitórias;

- Relativamente aos pedidos subsidiários pronunciou-se de forma vaga, não fundamentando a improcedência dos pedidos formulados;

- Não tomou posição fundamentada dos pedidos formulados pela A., nem considerou devidamente toda a prova que lhe foi oferecida;

- Padece da nulidade inserida no artigo 615.º, d) do CPC, por omissão de pronúncia e da nulidade prevista no artigo 195.º, n.º 1 do CPC.

Vejamos:

Conforme resulta do artigo 615.º, n.º 1, d), do CPC a sentença é nula quando:

<<O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…);>>.

Na verdade, conforme impõe o n.º 2 do artigo 608.º do CPC, <<o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.>>

O tribunal deve apreciar todas as questões que lhe foram apresentadas pelas partes, sob pena de nulidade da decisão, o que já não ocorre com a falta de discussão de todas as razões ou argumentos invocados.

Nas palavras do Professor Alberto dos Reis[2], <<são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão>>.

Pois bem, conforme resulta da petição inicial a Autora formulou os seguintes pedidos:

“I. DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONSIDERA SEM TERMO POR INSUFICIÊNCIA DE CONCRETIZAÇÃO DO MOTIVO JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO OU POR FALSIDADE DO MOTIVOS JUSTIFICATIVO DO TERMO APOSTO NO CONTRATO, UMA VEZ QUE NÃO SE TRATA DE UMA NECESSIDADE TEMPORÁRIA MAS SIM PERMANENTE,

OU

DECLARAR QUE O CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES SE CONVERTEU EM CONTRATO DE TRABALHO SEM TERMO, POR NÃO VERIFICAÇÃO DO EVENTO E/OU DA DATA DA CADUCIDADE INDICADA NA COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DA RÉ,

OU

DECLARAR QUE A COMUNICAÇÃO DE CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO INCERTO CELEBRADO ENTRE AS PARTES É INVÁLIDA E ILEGAL POR TER OCORRIDO SEM QUE SE VERIFICASSE O EVENTO PREVISTO NO CONTRATO PARA O SEU TERMO.”

Por outro lado, consta da sentença recorrida o seguinte:

A primeira questão a determinar prende-se com a validade do termo aposto no contrato que a A. entende, primeiro, não ser suficientemente concretizado, e, depois, ser falso.

O regime jurídico dos contratos de trabalho a termo sofreu alterações introduzidas pela Lei 93/2019, de 4 de Setembro.

Porém, por se tratar de questão referente às regras de celebração do contrato em equação nos autos, será considerada a redacção da lei vigente à data de Janeiro de 2019, em obediência ao estabelecido no art.º 12.º do Código Civil.

«A admissibilidade do contrato a termo assenta numa cláusula geral (art.º 140.º, n.º 1 do CT): “satisfação de necessidade temporária da empresa” e, de modo acessório, em dois outros fundamentos (art.º 140.º, n.º 4 do CT).

«Daí aludir-se a três fundamentos para a celebração de um contrato a termo.

«A razão de ser do contrato a termo encontra-se primeiramente relacionada com a transitoriedade do contrato a efectuar (…), constante das diversas alíneas do n.º 2 do art.º 140.º do CT.

«Em segundo lugar, aceita-se o recurso à contratação a termo como meio de redução do risco empresarial (…) (art.º 140.º, n.º 1, alínea a) do CT).

«O terceiro fundamento aparece relacionado com a política de emprego, de molde a evitar ou reduzir o número de desempregados (…), nos termos previstos na alínea b) do n.º 4 do art.º 140.º do CT. (…)

«O contrato a termo não só é formal (art.º 141.º, n.º 1 do CT), como está também na dependência de várias formalidades, cuja indicação consta das alíneas do n.º 1 do mesmo artigo. Excepcionalmente, o contrato a termo de muito curta duração (art.º 142.º do CT) não está sujeito à forma escrita. O contrato a termo deve ser celebrado por escrito, com as indicações constantes do n.º 1 do art.º 141.º do CT, que se devem conjugar com as obrigações de informação dos art.os 106.º e segs. do CT e, em especial, com a justificação do termo (art.º 140.º, n.º 5 do CT). (…)

«Como se determina no art.º 141.º, n.º 3 do CT, a indicação do motivo justificativo deve ser feita mencionando de forma expressa os factos que o integram; não basta remeter para a previsão legal, pois torna-se necessário fazer referência à situação concreta, devendo estabelecer-se, na redacção da cláusula, uma relação entre o motivo indicado e o termo estipulado» - Pedro Romano Martinez, “Direito do Trabalho”, 9.ª edição, Almedina, 2019, pp. 684-688.

«A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade ad substantiam, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova, donde resulta que o contrato se considera sem termo, ainda que depois se venha a provar que na sua génese estava uma daquelas situações em que a lei admite a celebração de contratos a termo.

«Isto significa que só podem ser considerados como motivo justificativo da estipulação do termo os factos constantes na pertinente cláusula contratual.» - acórdão S.T.J., 18/6/2008, P. 08s936, www.dgsi.pt.

A exigência legal (constante do art.º 141.º, n.º 3 do Código do Trabalho) de justificação com a menção expressa dos factos que a integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, visa permitir a verificação e o controlo da conformidade da situação concreta subjacente à celebração do contrato com as situações em que a lei permite a contratação a termo.

A celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo encontra-se prevista nos art.os 139.º a 149.º do Código do Trabalho.

Aí se prevê, quanto aos contratos a termo, que deverão cumprir as regras de forma elencadas no art.º 141.º e só são permitidos nos casos previstos no art.º 140.º, de entre os quais está a contratação de trabalhadores para substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar – cfr. n.º 2, al. a)

As possibilidades de contratação a termo incerto estão restringidas às previsões das alíneas a) a c), e) a h) – cfr. n.º 3.

No contrato em apreço foi clausulado o seguinte para justificar a contratação da A. a termo incerto: o contrato é celebrado ao abrigo do n.º 1, alínea a) do n.º 2, e do n.º 3 do artigo 140.º do Código do Trabalho, pelo tempo necessário à substituição da CRT (...) DD, temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar na situação de doença.

Crê-se que a simples leitura desta cláusula basta para se compreender a contratação da A. – a carteira DD encontrava-se impedida de trabalhar por se encontrar doente.

Esta justificação integra-se na previsão da alínea a) do n.º 2 do art.º 140.º que permite a contratação a termo certo.

Conclui-se, pois, pela improcedência do primeiro argumento invocado pela A. para sustentar a nulidade do termo.

A A. alega, em segunda linha, que o termo é nulo porque a justificação é falsa.

Apurou-se que, efectivamente, a carteira DD estava doente e, por isso, impedida de trabalhar – o que afasta, só por si, o juízo de falsidade invocado pela A.

Por outro lado, a A. não alegou quaisquer factos concretos que permitam concluir que a substituição de DD não fosse uma necessidade transitória.

Conclui-se, pois, também, pela improcedência do argumento da falsidade para sustentar a nulidade do termo.

O termo aposto no contrato celebrado entre a A. e o R. é válido e, por isso, o contrato celebrado é um contrato a termo incerto.

Em face da improcedência da nulidade do termo, naufraga a pretensão da A. de considerar a cessação do contrato de trabalho levada a cabo pelo R. como sendo um despedimento ilícito.

Tão pouco se pode considerar que o falecimento da trabalhadora substituída converta o contrato de trabalho a termo em contrato sem termo. Tal ocorrência é, antes, causa de caducidade do contrato de trabalho de DD por força do disposto no art.º 343.º, al. b) do Código do Trabalho e, por consequência, do contrato de trabalho da A. por força do art.º 345.º, n.º 1 do Código do Trabalho.

Com efeito, o termo incerto aposto no contrato da A. há-de ter-se por verificado quer em caso de regresso da trabalhadora substituída, quer no caso de cessação do contrato desta por caducidade (como ocorre no caso em análise) – cfr. neste sentido, acórdão T.R.P., 15/5/2017, P. 17148/16.2T8PRT.P1, www.dgsi.pt.

A eventual contratação, posterior à cessação do contrato da A., de pessoas para o mesmo posto de trabalho – facto que a A. não logrou demonstrar – nenhum efeito teria sobre a validade, vigência e cessação do contrato de trabalho da A., mas antes sobre a natureza do contrato das pessoas, eventualmente, contratadas após aquela cessação como decorre do disposto no art.º 147.º, n.º 1, al. c) do Código do Trabalho.

Tão pouco é caso para a aplicação do disposto no art.º 145.º do Código do Trabalho (que, aliás, a A. sequer peticiona) com a atribuição à A. do direito a ser indemnizada uma vez que a A. não provou, desde logo, a condição de atribuição de preferência, isto é, «até 30 dias após a cessação do contrato».

Em suma, o contrato de trabalho celebrado entre a A. e o R. caducou por verificação do respectivo termo incerto.”

Ora, basta ler o que ficou transcrito para se concluir que a sentença se pronunciou sobre todos os pedidos formulados pela Autora.

Na verdade, a mesma faz referência à suficiente concretização do termo aposto no contrato, à improcedência do argumento da falsidade; conclui pela validade do termo e, consequentemente, do contrato a termo incerto e, logicamente, tal contrato não se converteu num contrato sem termo.

Mais se refere na sentença recorrida que não se pode considerar que o falecimento da trabalhadora substituída converta o contrato a termo em contrato sem termo e, por fim, conclui-se que o contrato de trabalho da Autora caducou por verificação do respetivo termo incerto e, logicamente, pela validade da comunicação da caducidade.

Quanto ao alegado pela recorrente a propósito do depoimento das testemunhas e dos documentos, nada se impõe dizer, na medida em que (independentemente de outras considerações a propósito da aplicação (ou não) do regime previsto no artigo 615.º à decisão sobre a matéria de facto), não foi invocada a omissão de pronúncia relativamente a factos essenciais alegados mas sim sobre os pedidos formulados[3].

E no que respeita à alegação da recorrente de não ter sido considerada devidamente toda a prova oferecida, a mesma devia ter sido feita em sede de reapreciação da matéria de facto e não de arguição de nulidade da sentença.

A recorrente alega, ainda, que a sentença recorrida padece da nulidade prevista no artigo 195.º, n.º 1, do CPC, no entanto, por um lado, a nulidade dos atos prevista neste normativo é processual (ainda que possa originar a anulação da sentença) e, por outro, respeita “à própria existência do ato ou às suas formalidades[4], ao invés das nulidades da sentença que “respeitam a vícios de conteúdo[5], pelo que, sendo certo que a recorrente apenas arguiu a citada nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nada mais se impõe dizer.

Pelo exposto, improcede a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

2ª questão

Reapreciação da matéria de facto.

A Autora recorrente interpôs o presente recurso visando a reapreciação da prova gravada.

Conforme o disposto no artigo 640.º, do C.P.C.:

<<1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de poder proceder à respectiva transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)>>.

Acresce que, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação nos casos previstos no artigo 662.º, do N.C.P.C..

Lidas as alegações e respetivas conclusões, constatamos que a recorrente indica os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios, ou seja, os depoimentos das testemunhas e os documentos que identifica e que impõem decisão diversa, com indicação das passagens da gravação (respetivos minutos) e, ainda, a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Assim sendo, a A. recorrente cumpriu na totalidade o ónus que sobre si impendia, pelo que, este tribunal pode proceder à reapreciação da matéria de facto.

                                                             *

Alega a recorrente que os factos não provados constantes das alíneas a) a c) deviam ter sido julgados provados com base no depoimento das testemunhas BB e CC e nos documentos 4 e 4.1 juntos aos autos.

Os factos não provados são os seguintes:

A) O centro de distribuição postal ... viu-se com menos um trabalhador, além da A.;

B) Ficando os trabalhadores com uma enorme subcarga [supõe-se que a A. quis dizer "sobrecarga"], o que tornou impossível efetuar a distribuição postal;

C) A R. fez contratações a termo para preenchimento do mesmo posto de trabalho que a A. desempenhava.

Ouvimos toda a prova produzida em audiência de julgamento e analisámos os documentos juntos aos autos e desde já avançamos que não acompanhamos a recorrente.

Na verdade, a testemunha BB disse que nem sempre têm funcionários que cheguem mas na altura da A. não se recorda se era assim; que fizeram greves por haver falta de pessoal e muito trabalho; que morreram duas pessoas e outra reformou-se e não colocaram ninguém no lugar delas e que têm falta de pessoal pelo menos desde 2015.

Por sua vez, a testemunha CC referiu que no CDP estão menos três funcionários, dois que morreram e um que se reformou, desde 2014 e que não foram substituídos; que o trabalho não diminuiu; que a A. foi substituir a funcionária DD que estava doente mas mesmo que não fosse assim era necessária e que ninguém foi contratado logo a seguir à A. ter saído.

Pois bem, certo é que o CDP ficou sem a funcionária que a A. foi substituir e que, entretanto, faleceu e, depois, sem a A., no entanto, o que ressalta dos citados depoimentos é que desde 2014/2015 o CDP ... ficou sem três funcionários e que os trabalhadores tinham sobrecarga de trabalho, sendo certo que não foi feita prova bastante de que tal sobrecarga de trabalho resultou do facto de o CDP ter ficado com menos um trabalhador além da A. e que aquela tornou impossível efetuar a distribuição postal.

E no que concerne aos documentos juntos com os n.ºs 4 e 4.1 - notícia da greve dos trabalhadores do CDP de ... reivindicando a contratação de mais pessoas -, mesmo conjugados com os citados depoimentos, aqueles não consubstanciam prova bastante de que os trabalhadores ficaram com uma enorme sobrecarga de trabalho que tornou impossível efetuar a distribuição postal.

Por fim, no que respeita à matéria descrita na alínea C) não feita qualquer prova da mesma, sendo certo que a testemunha CC referiu que ninguém foi contratado logo a seguir à A. ter saído.

Desta forma, porque se encontra conforme com a prova produzida, a matéria descrita nas alíneas A), B) e C) do elenco dos factos não provados deve manter-se.

Improcede, assim, a pretendida alteração da matéria de facto.

3ª questão

Se o termo aposto no contrato de trabalho é falso.

Alega a recorrente que:

- O que está em causa, na motivação do vínculo precário, é apenas uma ausência por doença, o que revela, para a extinção desse vínculo, é, tão-somente a certeza que a ausência se tornou definitiva.

- No entanto, nada impõe, ao contrário do que é referido pelo Tribunal a quo, que essa certeza só se obtenha com a cessação do Contrato de Trabalho do trabalhador substituído (morte do Trabalhador), a verdade é que tudo dependerá do condicionalismo de cada caso.

- In casu, a trabalhadora substituída era doente oncológica em estado grave, cremos que a Ré, mesmo antes do falecimento da trabalhadora, conjeturou considerando a gravidade da doença – que esta ausência se iria tonaria definitiva. Mas, mesmo que assim não fosse, a substituição da trabalhadora doente, não se destinou, só, a suprir uma necessidade transitória de serviço, mas sim uma necessidade permanente.

- Também, o que demonstra a necessidade permanente da Recorrida, e sempre será oportuno relembrar que, a Recorrente, no ano de 2018, concretamente entre 21-05-2018 e 05-11-2018, foi contratada pela Recorrida para as funções de CRT-Carteiro, no CDP ... .... E logo, no início do ano se 2019, a Recorrente, foi, novamente, contratada para o mesmo posto de trabalho e para as mesmas funções.

- A Apelada usa o recurso sucessivo à modalidade de contratação a termo, com vista a contornar os inconvenientes da vinculação sem termo, sendo o que se verificou in casu, e que o douto Tribunal a quo, certos de que erradamente, não vislumbrou.

- A Ré escuda-se no manto da contratação a termo para suprir carências que não são esporádicas, mas permanentes.

- A contratação da Autora, além da substituição, foi para colmatar necessidades duradouras da Ré que já perduram pelo menos desde 2014. A verdade é que a trabalhadora substituída faleceu no dia .../.../2020, e a Ré comunicou a caducidade do contrato de trabalho à Autora com efeitos a dia 14 de abril de 2020, ou seja, a necessidade deixou de ser temporária (o que já não seria no entendimento da Autora) para ser uma necessidade permanente.

- As funções que a Autora vinha a exercer eram necessidades permanentes, pois já na data em que foi celebrado o contrato de trabalho com a Apelada, esta, estava com sobrecarga de trabalho, e não estava a conseguir fazer face às necessidades permanentes que detinha.

Antes de mais, cumpre dizer que o contrato de trabalho é, aliás, como os seus semelhantes, uma figura negocial privada, subordinada ao princípio da autonomia da vontade, seja na vertente genérica da liberdade de celebração, seja na cambiante, mais específica, da liberdade de conformação concreta. É também um negócio jurídico bilateral, nominado, típico, causal, oneroso e sinalagmático. É um contrato de execução continuada e – ainda hoje, intuitu personae.

De forma simplista, podemos afirmar que o contrato de trabalho, enquanto acordo vinculativo, tem como finalidade a troca da atividade, do serviço, da “força do trabalho” pela retribuição, dinheiro ou equivalente. Ambos os lados da troca são objeto do negócio mas é a atividade que especialmente caracteriza o vínculo.

O contrato de trabalho a termo resolutivo encontra-se hoje regulado nos artigos 139.º a 146.º do Código do Trabalho de 2009, alterado a 22ª e última vez, pela Lei n.º 1/2022, de 03/01.  

Como é sabido, a relação de trabalho é uma relação duradoura ou, pelo menos, tendencialmente duradoura, na medida em que, na generalidade das situações, visa a satisfação de interesses duradouros de ambas as partes. Consequência disso, o contrato de trabalho, que origina tal relação laboral, é um contrato normalmente estabelecido por tempo indeterminado.

A estabilidade do emprego constitui um dos princípios basilares do moderno direito do trabalho (com tutela constitucional art.º 53º da C.R.P.) e essa estabilidade não depende somente da vigência de um regime jurídico da extinção do contrato de trabalho que retire à entidade patronal a liberdade de desvinculação sem justa causa mas também da vigência de um regime jurídico que restrinja a liberdade da empresa em recorrer ao trabalho precário. Desta forma, apenas se admite a contratação a termo quando exista uma razão objetiva para limitar temporalmente a relação de trabalho; em consonância a nossa lei é exigente e, além de exigir essa razão, expressamente indica quais as situações em que aquela contratação é admissível.

O regime jurídico aplicável ao contrato a termo parte de uma ideia central: a contratação por tempo determinado só deve ser admitida para satisfazer necessidades de trabalho objetivamente temporárias, de duração incerta ou de política de emprego.

Em conformidade, o artigo 140.º, n. 1, do C.T. (redação da Lei n.º 14/2018, de 19/03[6]) estabelece que <<o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade>>, considerando-se necessidade temporária da empresa, nomeadamente: <<a) substituição direta ou indireta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar;>> - nº 2 do mesmo normativo.

E só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto em situação referida em qualquer das alíneas a) a c) ou e) a h) do número anterior – n.º 3 do mesmo artigo 140.º.

Mais resulta deste normativo que compete ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo (n.º 5, do artigo 140.º, do C.T.)

O contrato a termo não só é formal, como está também na dependência de vários requisitos formais, cuja indicação se elenca no art.º 141.º do C.T..

Acresce que, conforme resulta do artigo 147.º do CT:

<<1 - Considera-se sem termo o contrato de trabalho:

a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;

b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.ºs 1, 3 ou 4 do artigo 140.º;

(…)

2 – Converte-se em contrato de trabalho sem termo:

(…)

c) O celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em atividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo. (…)>>.

Por fim, o contrato de trabalho caduca verificando-se o seu termo (artigo 343.º, a), do CT), sendo que, <<o contrato de trabalho a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador comunique a cessação do mesmo ao trabalhador, com a antecedência mínima de sete, 30, ou 60 dias conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses a dois anos ou por período superior.>> - n.º 1 do artigo 345.º do CT.

Voltando à questão suscitada pela Autora recorrente:

Resulta da matéria de facto provada que:

- No dia 22 janeiro de 2019, a A. e a R. celebraram um contrato de trabalho a termo incerto, em documento escrito, através do qual esta admitiu aquela ao seu serviço, com início nesse dia, para, sob as ordens e direção da R., desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de carteiro com o grau de certificação II no centro de distribuição postal ... ...;

- Consta do contrato, como motivo justificativo da contratação da A., a substituição da carteira (...) DD, temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar em situação de doença;

- No dia 13 de abril de 2020, a R. expediu carta à A. através da qual lhe comunicava que o seu contrato caducava no dia 14 de abril de 2020, porquanto o motivo que lhe deu origem cessou;

- DD faleceu no dia .../.../2020;

- À data da celebração do contrato mencionado em 1), DD encontrava-se ausente do trabalho, por estar doente.

A este propósito consta da sentença recorrida o seguinte:

 <<A primeira questão a determinar prende-se com a validade do termo aposto no contrato que a A. entende, primeiro, não ser suficientemente concretizado, e, depois, ser falso.

O regime jurídico dos contratos de trabalho a termo sofreu alterações introduzidas pela Lei 93/2019, de 4 de Setembro.

Porém, por se tratar de questão referente às regras de celebração do contrato em equação nos autos, será considerada a redacção da lei vigente à data de Janeiro de 2019, em obediência ao estabelecido no art.º 12.º do Código Civil.

«A admissibilidade do contrato a termo assenta numa cláusula geral (art.º 140.º, n.º 1 do CT): “satisfação de necessidade temporária da empresa” e, de modo acessório, em dois outros fundamentos (art.º 140.º, n.º 4 do CT).

«Daí aludir-se a três fundamentos para a celebração de um contrato a termo.

«A razão de ser do contrato a termo encontra-se primeiramente relacionada com a transitoriedade do contrato a efectuar (…), constante das diversas alíneas do n.º 2 do art.º 140.º do CT.

«Em segundo lugar, aceita-se o recurso à contratação a termo como meio de redução do risco empresarial (…) (art.º 140.º, n.º 1, alínea a) do CT).

«O terceiro fundamento aparece relacionado com a política de emprego, de molde a evitar ou reduzir o número de desempregados (…), nos termos previstos na alínea b) do n.º 4 do art.º 140.º do CT. (…)

«O contrato a termo não só é formal (art.º 141.º, n.º 1 do CT), como está também na dependência de várias formalidades, cuja indicação consta das alíneas do n.º 1 do mesmo artigo. Excepcionalmente, o contrato a termo de muito curta duração (art.º 142.º do CT) não está sujeito à forma escrita. O contrato a termo deve ser celebrado por escrito, com as indicações constantes do n.º 1 do art.º 141.º do CT, que se devem conjugar com as obrigações de informação dos art.os 106.º e segs. do CT e, em especial, com a justificação do termo (art.º 140.º, n.º 5 do CT). (…)

«Como se determina no art.º 141.º, n.º 3 do CT, a indicação do motivo justificativo deve ser feita mencionando de forma expressa os factos que o integram; não basta remeter para a previsão legal, pois torna-se necessário fazer referência à situação concreta, devendo estabelecer-se, na redacção da cláusula, uma relação entre o motivo indicado e o termo estipulado» - Pedro Romano Martinez, “Direito do Trabalho”, 9.ª edição, Almedina, 2019, pp. 684-688.

«A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade ad substantiam, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova, donde resulta que o contrato se considera sem termo, ainda que depois se venha a provar que na sua génese estava uma daquelas situações em que a lei admite a celebração de contratos a termo.

«Isto significa que só podem ser considerados como motivo justificativo da estipulação do termo os factos constantes na pertinente cláusula contratual.» - acórdão S.T.J., 18/6/2008, P. 08s936, www.dgsi.pt.

A exigência legal (constante do art.º 141.º, n.º 3 do Código do Trabalho) de justificação com a menção expressa dos factos que a integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, visa permitir a verificação e o controlo da conformidade da situação concreta subjacente à celebração do contrato com as situações em que a lei permite a contratação a termo.

A celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo encontra-se prevista nos art.os 139.º a 149.º do Código do Trabalho.

Aí se prevê, quanto aos contratos a termo, que deverão cumprir as regras de forma elencadas no art.º 141.º e só são permitidos nos casos previstos no art.º 140.º, de entre os quais está a contratação de trabalhadores para substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar – cfr. n.º 2, al. a)

As possibilidades de contratação a termo incerto estão restringidas às previsões das alíneas a) a c), e) a h) – cfr. n.º 3.

No contrato em apreço foi clausulado o seguinte para justificar a contratação da A. a termo incerto: o contrato é celebrado ao abrigo do n.º 1, alínea a) do n.º 2, e do n.º 3 do artigo 140.º do Código do Trabalho, pelo tempo necessário à substituição da CRT (...) DD, temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar na situação de doença.

Crê-se que a simples leitura desta cláusula basta para se compreender a contratação da A. – a carteira DD encontrava-se impedida de trabalhar por se encontrar doente.

Esta justificação integra-se na previsão da alínea a) do n.º 2 do art.º 140.º que permite a contratação a termo certo.

Conclui-se, pois, pela improcedência do primeiro argumento invocado pela A. para sustentar a nulidade do termo.

A A. alega, em segunda linha, que o termo é nulo porque a justificação é falsa.

Apurou-se que, efectivamente, a carteira DD estava doente e, por isso, impedida de trabalhar – o que afasta, só por si, o juízo de falsidade invocado pela A.

Por outro lado, a A. não alegou quaisquer factos concretos que permitam concluir que a substituição de DD não fosse uma necessidade transitória.

Conclui-se, pois, também, pela improcedência do argumento da falsidade para sustentar a nulidade do termo.

O termo aposto no contrato celebrado entre a A. e o R. é válido e, por isso, o contrato celebrado é um contrato a termo incerto.

Em face da improcedência da nulidade do termo, naufraga a pretensão da A. de considerar a cessação do contrato de trabalho levada a cabo pelo R. como sendo um despedimento ilícito.

Tão pouco se pode considerar que o falecimento da trabalhadora substituída converta o contrato de trabalho a termo em contrato sem termo. Tal ocorrência é, antes, causa de caducidade do contrato de trabalho de DD por força do disposto no art.º 343.º, al. b) do Código do Trabalho e, por consequência, do contrato de trabalho da A. por força do art.º 345.º, n.º 1 do Código do Trabalho.

Com efeito, o termo incerto aposto no contrato da A. há-de ter-se por verificado quer em caso de regresso da trabalhadora substituída, quer no caso de cessação do contrato desta por caducidade (como ocorre no caso em análise) – cfr. neste sentido, acórdão T.R.P., 15/5/2017, P. 17148/16.2T8PRT.P1, www.dgsi.pt.

A eventual contratação, posterior à cessação do contrato da A., de pessoas para o mesmo posto de trabalho – facto que a A. não logrou demonstrar – nenhum efeito teria sobre a validade, vigência e cessação do contrato de trabalho da A., mas antes sobre a natureza do contrato das pessoas, eventualmente, contratadas após aquela cessação como decorre do disposto no art.º 147.º, n.º 1, al. c) do Código do Trabalho.

Tão pouco é caso para a aplicação do disposto no art.º 145.º do Código do Trabalho (que, aliás, a A. sequer peticiona) com a atribuição à A. do direito a ser indemnizada uma vez que a A. não provou, desde logo, a condição de atribuição de preferência, isto é, «até 30 dias após a cessação do contrato».

Em suma, o contrato de trabalho celebrado entre a A. e o R. caducou por verificação do respectivo termo incerto.” fim de transcrição.

Vejamos:

Como já referimos, apurou-se que do contrato a termo celebrado pelas partes consta como motivo justificativo da contratação da A., a substituição da carteira (...) DD, temporariamente impedida de prestar trabalho, por se encontrar em situação de doença.

Assim sendo, dúvidas não existem de que o motivo justificativo consubstancia uma necessidade temporária prevista na alínea a) do n.º 2 do art.º 140.º do CT que permite a contratação a termo incerto (n.º 3 do mesmo normativo).

Acresce que, resultou provado que a carteira DD, à data da celebração do contrato, estava doente, pelo que, facilmente se conclui que o termo aposto no contrato não é falso.

Alega a recorrente que a Ré, antes o falecimento da trabalhadora, conjeturou, considerando a gravidade da doença, que esta ausência se iria tornar definitiva mas, mesmo que assim não fosse, a substituição da trabalhadora doente não se destinou só a suprir uma necessidade transitória de serviço mas sim uma necessidade permanente que já perdura pelo menos desde 2014.

Acontece que, não resulta da matéria de facto provada aquela alegada conjetura da Ré nem quaisquer factos de onde se possa extrair que a contratação da A. se destinou a suprir uma necessidade permanente e não temporária da empresa, sendo certo que a pretensão da recorrente no sentido da alteração da matéria de facto foi julgada improcedente. E também não resulta da matéria de facto provada que a estipulação do termo tenha tido por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo.

Desta forma, tal como se refere na sentença recorrida, o termo aposto no contrato celebrado entre a A. e o R. é válido e, por isso, o contrato celebrado é um contrato a termo incerto.

A recorrente alega, ainda, que a trabalhadora substituída faleceu no dia .../.../2020 e a Ré comunicou a caducidade do contrato de trabalho à A. com efeitos a dia 14 de abril de 2020, ou seja, a necessidade deixou de ser temporária para ser uma necessidade permanente.

Na verdade, resulta da matéria de facto provada que no dia 13 de abril de 2020, a Ré expediu carta à A. através da qual lhe comunicava que o seu contrato caducava no dia 14 de abril de 2020, porquanto o motivo que lhe deu origem cessou, ou seja, porque a trabalhadora substituída faleceu no dia .../.../2020.

Como já referimos, o contrato de trabalho a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador comunique a cessação do mesmo ao trabalhador.

Por outro lado, a morte do trabalhador substituído não se pode prever, no entanto, ocorrendo, determina a caducidade do respetivo contrato (artigo 343.º, b), do CT) e, consequentemente, a caducidade do contrato a termo incerto, pois terminou a necessidade de substituição, pelo que, não vemos como poderia, por efeito daquela, a necessidade deixar de ser temporária para passar a ser permanente.

Tal como se refere no acórdão da RP, de 05/07/1999[7], a propósito de situação idêntica à do caso dos autos:

<<I – O trabalhador contratado a termo incerto para substituir um outro trabalhador com baixa por doença, e enquanto esta tivesse lugar não pode o seu contrato ser considerado como que transformado em contrato sem termo, por se verificar a impossibilidade do regresso do trabalhador substituído ao seu posto de trabalho, em virtude de ter passado à situação de pensionista. (…)

III – Pois à contratação a termo incerto não está inerente a condição resolutiva, visto que este tipo de contrato dura por todo o tempo necessário à substituição do trabalhador ausente e caduca quando terminar a necessidade de substituição que, na hipótese, se verificou com a passagem do trabalhador substituído à situação de reformado.>>

Acresce que, como se decidiu no acórdão da RP, de 15/05/2017, disponível em www.dgsi.pt, que acompanhamos:

<<Segundo a alínea c) do n.º 1 do artigo 147º, do CT/2009, converte-se em contrato de trabalho sem termo o celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo.

Por sua vez, dispõe-se no n.º 1 do artigo 345º do mesmo Código que o contrato de trabalho a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador comunique a cessação do mesmo ao trabalhador, com a antecedência mínima de sete, 30 ou 60 dias conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses a dois anos ou por período superior, sendo que, face ao n.º 3 do mesmo normativo legal, da não comunicação a que se alude no n.º 1 decorre como consequência que o empregador tenha de pagar ao trabalhador o valor da retribuição correspondente ao período de aviso prévio em falta.

No caso em apreço, a funcionária que estava ausente do serviço e que justificara a contratação da Autora faleceu em 8 de setembro de 2015, sendo que, como se provou também, tomou conhecimento desse facto na pessoa do seu diretor de recursos humanos, no dia seguinte, ou em 9 de setembro de 2015. No seguimento, enviou carta à Autora comunicando-lhe que considerava, com efeitos a partir de 9 de outubro de 2015, o contrato em apreço caducado. Resulta também que tal comunicação, como de resto o reconhece a própria Autora/recorrente logo no seu articulado inicial (ponto XXVII), foi efectuada em 10 de Setembro de 2015, ou seja, logo no dia a seguir ao aludido conhecimento do óbito da D….

Ora, chamando então ao caso assim configurado os normativos supra citados, para além dos ensinamentos dos Autores citados na decisão recorrida[11], seguimos de perto, também, o Acórdão desta Relação e Secção de 6 de Maio de 2013[12], secundando Jorge Leite[13], o que nos permite dizer, como aí, que “o contrato de trabalho a termo incerto se não extingue com a simples ocorrência do evento que determinou a sua celebração. Com efeito, a caducidade do contrato de trabalho a termo incerto continua a depender, como sucedia na vigência da lei anterior, de uma dupla condição: a) De um facto positivo – a ocorrência do evento de que as partes fizeram depender a cessação dos efeitos que o contrato vinha produzindo; b) De um facto negativo – a não continuação do trabalhador ao serviço para além do prazo de aviso prévio ou, na falta deste, para além dos quinze dias que se seguirem, conforme o caso, à conclusão da actividade, serviço, obra ou projecto para que haja sido contratado ou ao regresso do trabalhador substituído ou a cessação do seu contrato (art. 145.°)[14]. Enquanto se não verificar o primeiro dos referidos requisitos, o contrato não se extingue por caducidade (salvo se ocorrer outro motivo de caducidade como, por exemplo, a reforma). Porém, verificado o primeiro sem que se verifique o segundo, o contrato não só se não extingue como se converte em contrato sem prazo.” Conforme refere o mesmo Autor[15], «os contratos de trabalho a termo incerto só terminam quando o termo (evento) se verificar mas a sua extinção não é automática, tornando-se ainda necessário que o trabalhador se não mantenha ao serviço do empregador para além do prazo previsto no art. 389º». Sendo que a ausência de aviso prévio ou a falta de comunicação da cessação do contrato, por iniciativa do empregador, determina tão só a obrigação por parte deste de pagar ao trabalhador o valor da retribuição correspondente ao período de aviso prévio em falta (artigo 345º, nº 3 do Código do Trabalho de 2009). Significa isto que nestas situações nunca o contrato de trabalho a termo incerto se converte em contrato de trabalho sem termo, pois esta conversão apenas tem lugar quando o trabalhador permaneça em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo (artigo 147º, nº 2, alínea c) do Código do Trabalho de 2009).”

Como esclarece ainda Bernardo da Gama Lobo Xavier[16], nestes casos “sabe-se que há-de chegar o momento da verificação do termo, mas não se sabe o momento preciso em que ocorrerá (…). O contrato de trabalho a termo incerto dura por todo o tempo necessário à substituição do trabalhador ausente ou à conclusão da actividade cuja execução o justifique, estando, contudo, sujeito a um período máximo de duração de seis anos (art. 148.º, 4).” E, como o ensina também, no mesmo sentido, João Leal Amado[17], “[a] verificação do termo resolutivo constitui, portanto, condição necessária, mas também condição suficiente, para que o contrato caduque. Ou, dizendo as coisas de outro modo: o aviso prévio patronal não é condição indispensável para a caducidade do contrato. Caducando o contrato a termo incerto, o trabalhador sempre terá direito a uma compensação pecuniária, calculada nos termos dos n.ºs 2 e 3 do art. 344.º (art. 345.º, n.º 4). Se a caducidade ocorrer sem que o empregador tenha emitido o competente aviso prévio, a essa compensação adicionar-se-á o montante indemnizatório previsto no n.º 3 do art. 345.º. Mas, conquanto não possa ser renovado, o contrato a termo incerto poderá, contudo, converter-se num contrato sem termo, ao abrigo do disposto no art. 147.º, n.º 2, al. c) do CT. (…) A estatuição – conversão do contrato a termo incerto num contrato de duração indeterminada – aplicar-se-á, portanto, em duas hipóteses distintas: i) havendo comunicação patronal, isto é, cumprindo o empregador o dever de pré-avisar o trabalhador nos termos do art. 345.º do CT, caso o trabalhador se mantenha ao serviço após a data de produção de efeitos daquela comunicação; ii) não havendo comunicação patronal, caso o trabalhador ainda se mantenha ao serviço decorridos 15 dias depois da verificação do termo resolutivo (conclusão da actividade para que tinha sido contratado, regresso do trabalhador substituído, etc.).”

E, como o refere também Pedro Furtado Martins[18], com relevância para o caso que se decide, “a verificação do termo incerto a que este preceito alude[19] cobre quer a conclusão da actividade, do serviço, da obra ou do projecto para que o trabalhador foi contratado, quer o regresso do trabalhador substituído, quer ainda a cessação do contrato deste. As três hipóteses eram indicadas separadamente no artigo 145º, nº 1 do CT/2003, mas no actual Código foram substituídas por uma referência genérica à «verificação do termo».”[20]

O que se referiu anteriormente permite assim afirmar, tal como decidido na sentença, que no caso, porque a Ré comunicou à Autora (por decorrência do óbito da trabalhadora que aquela tinha sido contratada para substituir na sua ausência) a data da caducidade do contrato, nada se pode apontar em termos de cumprimento das normas aplicáveis.

É que, abrangendo como se viu a previsão da norma também os casos de cessação do contrato do trabalhador ausente e que justificara a substituição[21], assim no que agora importa por caducidade – artigo 343.º do CT/2009 –, o que ocorreu no caso, a comunicação efectuada pela Ré à Autora, logo no dia seguinte ao conhecimento desse facto, apontando como o da cessação do contrato a termo o dia 9 de Outubro, permite concluir, contrariamente ao que entende a Recorrente, que não ocorre o preenchimento da previsão da alínea c) do n.º 2 do artigo 147º do mesmo Código, pois que, como aí se exige, não se provou que tenha permanecido em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador – só na falta desta comunicação, como resulta do preceito, haveria que ter por aplicável o prazo de 15 dias a que aí se alude (após a verificação do termo) [22]. Só assim não seria se a Ré, apesar de ter conhecimento da caducidade do contrato com a trabalhadora substituída, deixasse que decorresse o aludido prazo de 15 dias, aceitando que nesse período a Autora prestasse o seu trabalho, sem fazer a denúncia do contrato, o que não se verificou no caso.”

Por tudo o que ficou dito, acompanhamos a sentença recorrida, inexistindo qualquer razão à recorrente.

                                                             *

Assim sendo, na improcedência das conclusões formuladas pela A. recorrente, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade.

                                                             *

                                                         *                                                        

IV – Sumário[8]

(…).

                                                               *

                                                             *

V - DECISÃO

Nestes termos, sem outras considerações acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença recorrida.

                                                             *

                                                             *

Custas a cargo da A. recorrente.

                                                             *

Coimbra, 2022/05/27

(Paula Maria Roberto)

(Azevedo Mendes)

 (Felizardo Paiva)




[1] Relator – Paula Maria Roberto
  Adjuntos – Azevedo Mendes
   Felizardo Paiva

[2] Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra Editora, 1984, pág. 143.
[3] A este propósito cfr. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao NCPC,  anotação 1 ao artigo 615.º, 2014, 2ª edição, volume I, Almedina e Lebre de Freitas, CPC Anotado, volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra Editora, págs. 733 e 734.
[4] Lebre de Freitas, CPC Anotado, volume 1.º, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 384.
[5] Lebre de Freitas, CPC Anotado, volume 1.º, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 384.
[6] Redação em vigor à data da celebração do contrato (22/01/2019), não sendo aplicável a Lei n.º 93/219, de 04/09 que introduziu alterações no regime do contrato a termo, face ao disposto no n.º 1 do seu artigo 11.º: “Ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com a redação dada pela presente lei, os contratos de trabalho celebrados antes da entrada em vigor desta lei, salvo quanto a condições de validade e a efeitos de factos ou situações anteriores àquele momento.  

[7] CJ, 1999, 4.º - 250.
[8] O sumário é da responsabilidade exclusiva da relatora.