Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2929/21.3T8FAR-A.E1
Relator: MANUEL BARGADO
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS
LITISCONSÓRCIO
Data do Acordão: 06/09/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I - Destinando-se o seguro a transferir para a seguradora a responsabilidade civil do réu decorrente da prestação de cuidados de saúde hospitalar, é de admitir o chamamento da seguradora como litisconsorte voluntária.
II - O contrato de seguro tem as feições de um contrato a favor de terceiro, pelo que o réu tem o direito de suscitar a intervenção principal da seguradora, já que são ambos solidariamente responsáveis nos termos do artigo 497º do Código Civil.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível no Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
S., N. e T., instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra A., E. e Hospital de Loulé, S.A., pedindo que os réus sejam condenados a pagar-lhes a quantia global de € 554.686,32 relativa a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais causados no âmbito do exercício de atos médicos.
Invocam a responsabilidade contratual do réu Hospital, em nome, por conta e no interesse de quem as rés atuaram, e a responsabilidade extracontratual pela atuação ilícita destas rés, médicas especialistas na área da obstetrícia naquele Hospital, as quais incumpriram os deveres gerais de zelo e diligência a que estavam obrigadas, e também não deram cumprimento aos deveres contratuais que sobre elas impediam no quadro da relação obrigacional que as ligava à autora S..
Nas suas contestações, os réus requereram:
- a ré E., a intervenção provocada acessória da Ageas Portugal - Companhia de Seguros, S.A;
- a ré A., a intervenção principal provocada da Ageas Portugal - Companhia de Seguros, S.A., ou subsidiariamente a sua intervenção acessória;
- o réu Hospital, a intervenção principal provocada da Generali Seguros, S.A. e da Companhia de Seguros Fidelidade, S.A., e subsidiariamente a intervenção acessória de tais seguradoras.
Sustentam as requeridas intervenções na existência de contratos de seguro através dos quais transferiram a sua responsabilidade civil por atos médicos para aquelas seguradoras, e pelo direito de regresso que existe no caso dos prejuízos que a eventual procedência da ação lhes possa vir a causar, sendo que o réu Hospital defende estar em causa um seguro obrigatório.
Notificados, os autores nada disseram.
Foi proferida decisão a admitir «a intervenção acessória provocada» de todas as referidas seguradoras.
Inconformado, o réu Hospital apelou do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem:
«a) O réu Hospital de Loulé é uma unidade privada que prossegue atividades no âmbito da prestação de serviços de saúde e que dispõe de internamento pelo que está obrigada a contratar e manter em vigor um seguro de responsabilidade civil e profissional que cubra os riscos inerentes à respetiva atividade e à atividade dos seus profissionais, conforme dispõe o artigo 5º da Portaria nº 290/2012 de 24 de setembro.
b) Os AA. deduziram contra o Réu Hospital de Loulé um pedido de indemnização civil, por danos que alegadamente as rés pessoas singulares, médicas ao serviço do réu, causaram no âmbito da prestação de serviços médicos.
c) Os alegados danos peticionados pelos AA. decorreram da prestação de serviços médicos.
d) Por contrato de seguro o réu transferiu para as seguradoras Generali Seguros, S.A e Companhia de Seguros Fidelidade, S.A a responsabilidade civil de exploração da sua actividade, que inclui, erros ou omissões profissionais causadas por médicos ao serviço do réu
e) Ainda que, afinal, o réu venha a ser condenado, caso venha a demonstrar-se a sua responsabilidade perante os AA., tal responsabilidade recairá nas companhias de seguros face aos contratos de seguro celebrados, pelo menos, até ao limite do capital seguro.
f) Os alegados lesados têm o direito de exigir o pagamento da indemnização directamente às seguradoras, nos termos do nº1 do artigo 146 do regime jurídico do contrato de seguro.
g) A Portaria 290/2012, de 24.09, em matéria de organização e funcionamento das unidades de saúde estabelece no artigo 5º que "as unidades privadas que prossigam atividades no âmbito da prestação de serviços de saúde e que disponham de internamento devem contratar e manter em vigor um seguro de responsabilidade civil e profissional que cubra os riscos inerentes à respetiva atividade e à atividade dos seus profissionais".
h) O regime da Lei do Contrato de Seguro aprovado pelo DL 72/2008, de 16.04 (cfr. artº 2º), nas disposições especiais relativas ao seguro obrigatório, prevê o direito do lesado de exigir o pagamento da indemnização directamente ao segurador (artigo 146º, nº1), isoladamente ou em litisconsórcio voluntário com o tomador do seguro.
i) A considerar-se facultativo o seguro, a intervenção pode ser provocada pelo segurado, nos termos do nº1 do artigo 140º,
j) Porque o seguro se destinou a transferir para as seguradoras a responsabilidade civil da ré/recorrente causada a terceiros com a prestação de cuidados de saúde na unidade hospitalar, é de admitir a chamada das seguradoras como litisconsortes voluntárias. Isto é, o contrato de seguro tem as feições de um contrato a favor de terceiro (artigo 444º, nº2, do Código Civil), pelo que o réu/recorrente tem o direito de suscitar a intervenção principal das seguradoras, pois são ambos solidariamente responsáveis nos termos do artigo 497º do Código Civil.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente Recurso, revogando-se o despacho recorrido, admitindo-se o incidente de intervenção principal das Companhias de Seguros Generali Seguros, S.A e Companhia de Seguros Fidelidade, S.A, assim se fazendo Justiça».

Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigos 608°, n° 2, 635°, nº 4 e 639°, n° 1, do CPC), a questão essencial a decidir consubstancia-se em saber se o incidente de intervenção principal é o adequado para chamar à lide, como associadas do réu Hospital, as seguradoras para quem aquele transferiu a responsabilidade civil pelos danos emergentes da prestação de cuidados de saúde hospitalar.

III - FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
Os factos e as ocorrências processuais relevantes para o conhecimento e decisão do recurso, são os que constam do relatório precedente.

O DIREITO
Os incidentes de intervenção de terceiros foram estruturados na base dos vários tipos de interesse na intervenção e das várias ligações entre esse interesse, que deve ser invocado como fundamento da legitimidade do interveniente e da relação material controvertida desenvolvida entre as partes primitivas.
No quadro geral dos incidentes de intervenção de terceiros integram-se a intervenção principal, a intervenção acessória e a oposição.
No primeiro tipo, ou seja, na intervenção principal – como importa ao tema do recurso – ela integra «…os casos em que o terceiro se associa, ou é chamado a associar-se, a uma das partes primitivas, com o estatuto de parte principal, cumulando-se no processo a apreciação de uma relação jurídica própria do interveniente conexa com a relação material controvertida entre as partes primitivas, em termos de tornar possível um hipotético litisconsórcio ou coligação iniciais»[1].
Compreende-se a assunção desse estatuto de parte principal, visto que está em causa «…um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu» – art. 312º do CPC.
Essa assunção verifica-se a partir do momento em que é admitida a intervenção do terceiro (se ela for espontânea) ou em que ele intervém efetivamente na causa (se for provocada).
A intervenção principal, espontânea ou provocada, não é, naturalmente, admissível se forem contrapostos os interesses substantivos ou processuais do chamado e da parte ao lado de quem se pretende que intervenha.
Como não permite que o autor substitua o réu contra quem, por erro, dirigiu a ação.
Sobre o âmbito da intervenção principal provocada, rege o art. 316º do CPC, que dispõe:
«1. Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária.
2. Nos casos de litisconsórcio voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39º.
3. O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este:
a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida;
b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor».

Escreveu-se na decisão recorrida:
«Na situação dos autos, os intervenientes não têm, em relação ao objeto da causa, um interesse igual ao dos Autores ou das Rés, nem foram diretamente demandados para pagamento da indemnização com fundamento em responsabilidade civil, pelo que nunca poderão ser condenados no pagamento de qualquer quantia nos autos, ainda que se possa entender que há uma obrigação solidária entre as Rés e as referidas seguradoras, nos termos do artigo 497º do Código Civil.
Mas, considerando que o segurado poderá exercer o direito de regresso se vier a ser reconhecida a sua responsabilidade pelo sinistro, a intervenção das seguradoras pode ser alcançada através do incidente de intervenção acessória provocada, nos termos dos artigos 330º e seguintes do Código de Processo Civil, permitindo estender-lhe, desde logo, os efeitos do caso julgado que se formar com a eventual sentença condenatória.
Assim, demandado um réu para efetivação de responsabilidade civil, a existência de um contrato de seguro entre o demandado e uma seguradora não legitima a intervenção principal na causa por parte desta, mas justifica a sua intervenção acessória, na medida em que existe um direito de regresso do réu contra a seguradora, sendo legítima a correção oficiosa da forma de incidente de intervenção de terceiro (neste sentido, v.g., Ac. RL de 02-12-2008, proferido no processo n.º 6533/2008-1, que tem como Relator Rui Vouga e Ac. RL de 22-04-2004, proferido no processo n.º 745/2004-6, que tem como Relatora Fátima Galante, ambos com texto integral disponível em www.dgsi.pt.»
Defende o recorrente que a considerar-se facultativo o seguro, a intervenção pode ser provocada, nos termos do nº 1 do artigo 140º da Lei do Contrato de Seguro (LCS), aprovada pelo DL 72/2008, de 16.04, «porque o seguro se destinou a transferir para as seguradoras a responsabilidade civil da ré/recorrente causada a terceiros com a prestação de cuidados de saúde na unidade hospitalar, é de admitir a chamada das seguradoras como litisconsortes voluntárias. Isto é, o contrato de seguro tem as feições de um contrato a favor de terceiro (artigo 444º, nº2, do Código Civil), pelo que o réu/recorrente tem o direito de suscitar a intervenção principal das seguradoras, pois são ambos solidariamente responsáveis nos termos do artigo 497º do Código Civil».
Vejamos.
Da análise das respetivas apólices decorre que os contratos de seguro invocados não foram celebrados para vigorar associados a qualquer sinistro em particular, mas antes no sentido de garantir, de um modo geral, a responsabilidade civil do réu Hospital perante terceiros relativamente a riscos inerentes à sua atividade de prestação de serviços de saúde hospitalar.
A questão que se coloca é, pois, a de saber se o incidente de intervenção principal é o adequado para chamar à lide, como associadas do réu/recorrente, as seguradoras para quem aquele transferiu a responsabilidade civil pelos danos emergentes de sinistros ocorridos no decurso daquela atividade.
Esta questão, como dá nota o acórdão desta Relação de 11.01.2018[2], não tem tido um tratamento unívoco nem na jurisprudência, nem na doutrina, sendo frequentemente convocada quando se analisa qual o tipo de incidente suscetível de fazer intervir na ação a seguradora, nas situações para as quais inexiste seguro obrigatório.
Daí que se justifiquem, antes de mais, algumas breves considerações sobre a natureza do contrato de seguro e os seus efeitos nas relações entre as partes e face a terceiros.
A este respeito escreveu-se no acórdão da Relação de Guimarães de 06.01.2011[3]:
«Através do contrato de seguro, a seguradora obriga-se a suportar o risco. Ou seja, como contrapartida do recebimento do prémio, a seguradora passa a estar disponível para fazer face às consequências da eventual realização do sinistro.
Desta forma, pode afirmar-se que, por força do contrato, nas relações internas, a seguradora coloca-se na posição de quem é obrigada a indemnizar e o segurado na posição de quem tem que demonstrar o dano, a sua relação com o sinistro, bem como a sua extensão e valorização.
Porém, atenta a natureza do contrato de seguro de responsabilidade civil, assumidamente concebido como um contrato a favor de terceiro (art. 444º, do Código Civil), a seguradora obriga-se, também, para com o lesado a satisfazer a indemnização devida, ficando aquele com o direito de demandar directamente a seguradora, ou o segurado, ou ambos, em litisconsórcio voluntário (considerando que o contrato de seguro de responsabilidade civil consubstancia um contrato a favor de terceiro podem ver-se, entre outros, os Acs. do STJ de 16.01.1970, BMJ, nº 193, pág. 359, e de 30.03.1989, BMJ, nº 385, pág. 563, e o Acs. da RL de 07.11.2006, proc. 7576/2206-7, e da RP de 06.07.2009, proc. 721/08.0TVPRT-A.P1, ambos disponíveis in www.dgsi.pt; na doutrina cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 99º, pág. 56, nota 1; Diogo Leite de Campos, Contrato a favor de terceiro, 1991, págs. 13 a 16, Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. I, 6ª ed., pág. 372 e segs.; José Vasques, Contrato de Seguro, pág. 258 e 259)
Acresce que, perante o lesado, segurado e seguradora são solidariamente responsáveis, nos termos do art. 497º, do Código Civil, pelo que o segurado não fica desonerado perante o terceiro-lesado por virtude da existência de um contrato de seguro. Na verdade, pelo contrato de seguro apenas se transferiu o pagamento do quantum indemnizatório para a seguradora, mas não a responsabilidade jurídica pelo evento (cfr. Ac. STA de 01.02.2000, Acórdãos Doutrinais, 466º-1231).»
Como refere Salvador da Costa[4], «o que verdadeiramente parece distinguir a intervenção principal provocada da intervenção acessória provocada é a real posição do interveniente relativamente à relação jurídica invocada pelo autor na petição inicial, pois se o chamamento daquele se basear na relação jurídica invocada pelo autor na p.i. estaremos perante o incidente de intervenção principal provocada, ao passo que se o chamamento se estribar numa relação jurídica conexa com aquela já se tratará do incidente de intervenção acessória provocada».
Atendendo à natureza do contrato de seguro como contrato a favor de terceiro, seguimos a posição de que o segurado demandado ou o lesado tem o direito a fazer intervir a seguradora, a título principal, pois tudo se resume à mesma relação jurídica invocada pelo demandante, uma vez que o contrato de seguro obriga a seguradora a suportar o risco, como contrapartida do recebimento do prémio.
Escreveu no acórdão da Relação de Guimarães 09.07.2015[5]:
«… é necessário atentar na especificidade do caso, que se prende com a responsabilidade civil da ré/recorrente pelos danos causados no exercício da sua actividade da prestação de serviços de saúde, responsabilidade que está transferida para a chamada por via do alegado contrato de seguro, o que desde logo reclama que se convoquem as normas da Lei do Contrato de Seguro aprovada pelo DL 72/2008.
O Decreto-Lei 279/200, de 06.10, aprovou o regime jurídico das unidades privadas de saúde que têm por objecto a prestação de serviços de saúde e disponham, remetendo o início da sua vigência para a data da publicação da Portaria que aprove os respectivos requisitos técnicos (artigo 27º).
Ao abrigo dos artigos 5º, 9º, 25º e 27º desse diploma legal foi publicada a Portaria 290/2912, de 14.09, que em matéria de organização e funcionamento dessas unidades de saúde estabelece no artigo 5º que «as unidades privadas que prossigam atividades no âmbito da prestação de serviços de saúde e que disponham de internamento devem contratar e manter em vigor um seguro de responsabilidade civil e profissional que cubra os riscos inerentes à respetiva atividade e à atividade dos seus profissionais». Não nos parece que esse instrumento infra-legislativo contrarie o artigo 112º nº5 da Constituição da República – “nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos”, ou extravase sequer o âmbito da execução autorizada, porque embora o seguro de responsabilidade civil e profissional não seja propriamente um requisito técnico (v.g. de higiene, segurança e saúde pública) está no entanto directamente conexionado com as condições de aprovação do funcionamento dos estabelecimentos de saúde, visando salvaguardar os interesses dos utentes/lesados.»
Nesta linha de raciocínio, faz algum sentido a tese da obrigatoriedade do seguro que é defendida pela recorrente. (…). A considerar-se facultativo o seguro, o artigo 140º, nºs 2 e 3, da LCS, prevê o direito do lesado demandar directamente o segurador, isoladamente ou em conjunto com o segurado, caso essa possibilidade esteja prevista no contrato de seguro ou se no decurso das iniciais negociações, o segurado seja informado da existência do contrato de seguro. Mas se a seguradora não tiver sido demandada pela não verificação de qualquer uma dessas essas circunstâncias, a sua intervenção pode ser provocada pelo segurado, porque […] o nº1 do artigo 140º o admite (neste sentido, Abrantes Geraldes, in O Novo Regime do Contrato de Seguro, Antigas e Novas Questões).
Porque o seguro se destinou a transferir para a seguradora a responsabilidade civil da ré/recorrente causada a terceiros com a prestação de cuidados de saúde na unidade hospitalar, é de admitir a chamada da seguradora como litisconsorte voluntária. Isto é, o contrato de seguro tem as feições de um contrato a favor de terceiro (…), pelo que o réu/recorrente tem o direito de suscitar a intervenção principal da seguradora, pois são ambos solidariamente responsáveis nos termos do artigo 497º do Código Civil (cfr. ac. do TRG de 6.010.2011). Conforme também decidiu o acórdão do TRP de 14.06.2010 “a intervenção principal respeita às situações em que está exclusivamente em causa a própria relação jurídica invocada pelo autor ou em que os terceiros sejam garantes da obrigação a que a causa principal se reporte, abrangendo todos os casos em que a obrigação comporte pluralidade de devedores, sob condição de o réu ter algum interesse atendível em os chamar a intervir na causa, quer com vista à defesa conjunta, quer para acautelar o eventual direito de regresso ou de sub-rogação que lhe assista» (…)».
Temos, pois, que perante o lesado, segurado e seguradora são solidariamente responsáveis (art. 497º do Código Civil), pelo que o segurado não fica desonerado perante o terceiro-lesado por virtude da existência de um contrato de seguro, sendo o incidente de intervenção principal provocada o adequado para o réu assegurar a presença na causa das seguradoras para as quais havia transferido a responsabilidade civil decorrente da sua atividade de prestação de serviços de saúde hospitalar[6].
O recurso merece, pois, provimento.
Vencidos no recurso, suportarão os autores/recorridos as respetivas custas - artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC.

IV - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, admitindo-se o incidente de intervenção principal das chamadas Generali Seguros, S.A. e Companhia de Seguros Fidelidade, S.A..
Custas pelos recorridos.
*
Évora, 9 de junho de 2022
(Acórdão assinado digitalmente no Citius)
Manuel Bargado (relator)
Francisco Xavier (1º adjunto)
Maria João Sousa e Faro (2º adjunto)

__________________________________________________
[1] Cfr. Lopes do Rego, Comentário ao Código do Processo Civil, p. 242.
[2] Proc. 2812/16.4T8PTM-A.E1, in www.dgsi.pt.
[3] Proc. 5907/09.7TBBRG-A.G1, in www.dgsi.pt, relatado pelo ora Relator.
[4] In Incidentes da Instância, pp. 117-118.
[5] Proc. 4077/14.3TBBRG-A.G1, in www.dgsi.pt.
[6] Neste sentido, o citado acórdão da Relação de Évora de 11.01.2018.