Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2678/17.7T8STR.E1
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: PRINCÍPIO DA ADESÃO DA ACÇÃO CÍVEL EM PROCESSO PENAL
ACÇÃO CÍVEL CONEXA COM A ACÇÃO PENAL
CAUSA PREJUDICIAL
CASO JULGADO PENAL
Data do Acordão: 11/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I – O Código de Processo Penal consagra, como regra, o princípio da adesão obrigatória da ação cível ao processo penal, e como exceção a dedução do pedido civil em separado do processo penal, visando este princípio estruturante, para além de evidentes razões de economia processual, obviar à existência de julgamentos contraditórios, mormente entre a jurisdição civil e a criminal.
II – Não obstante, verificada alguma exceção ao princípio da adesão, o sistema constituído conforma-se com a possibilidade de que se desenrolem processos separados nos quais se considerem diferentemente os factos – provados ou não provados – nas duas instâncias, a cível e a criminal.
III – A pendência de inquérito crime e de um eventual julgamento criminal que eventualmente se lhe siga não constituem causa prejudicial, ao abrigo do artigo 92.º do CPC, resultando também do disposto nos artigos 623.º e 624.º, n.º 1, CPC que não há, em rigor, nenhuma prejudicialidade da ação penal em relação à ação respeitante à indemnização civil, que possa legitimar a suspensão da instância.
IV – Porém, no caso, apesar de se verificar uma das exceções ao princípio da adesão e de ter sido instaurada esta ação cível, foi posteriormente deduzido e admitido o pedido de indemnização civil formulado na ação criminal, tendo a factualidade também fundadora desta ação cível, sido (grosso modo) julgada não provada no processo-crime, e tendo o pedido de indemnização civil ali deduzido sido julgado improcedente.
V – Por isso, já não curamos apenas das incoerências resultantes do regime legal atinente à eficácia da decisão penal no processo civil, tendo de convocar também as que emergem do julgamento da ação civil enxertada na penal, ou seja, da verificação dos requisitos da litispendência e do caso julgado, previstos nos artigos 580.º e 581.º do CPC, com vista a evitar que este tribunal civil seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior, na parte em que estas têm a mesma natureza.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 2678/17.7T8STR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém[1]
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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I. RELATÓRIO
1. Após a realização da audiência final, em 15-11-2021, foi proferido o despacho com a referência n.º 88207227, com o seguinte teor:
«Suspensão do processo
Na presente acção a primitiva A., AA, intentou a presente acção contra BB, CC e DD, pedindo, em síntese, a sua condenação solidária no pagamento da quantia de € 39.100,00, a condenação do 1º R. a restituir-lhe as quantias que levantou indevidamente das suas contas do Novo Banco e do Montepio Geral, cujo montante será apurado a final, quantias a que acrescem juros, pedindo ainda que sejam declarados nulos os documentos particulares autenticados contendo os contratos de compra e venda que transmitiu os seus imóveis, ordenando-se o cancelamento dos respectivos registos.
A A. fundamenta a sua pretensão no facto de ter contratado o 1º R. na qualidade de advogado para tratar da documentação necessária à doação dos seus bens imóveis à sua afilhada, com reserva de usufruto a seu favor, e este, com a colaboração das 2ª e 3ª RR., se ter aproveitado da sua debilidade, levando-a a assinar documentos, que lhes permitiu terem acesso às suas contas bancárias e à transmissão dos seus bens, designadamente, do seu veículo e de bens imóveis de que era titular, nunca lhe tendo sido entregue quaisquer valores.
Na contestação, no essencial, os RR. impugnam os factos alegados pela A., alegando que os actos foram validamente praticados e correspondem ao neles mencionado.
A situação vertida nos autos foi objecto de procedimento criminal, correndo termos no Juízo Central Criminal de Santarém Juiz 3, sob Procº nº 1700/16.9T9TMR, tendo o julgamento ocorrido no dia 09.11.2021.
A decisão a proferir no procedimento criminal tem uma óbvia implicação nos presentes autos, pois que, estando em causa a mesma matéria de facto, haverá que acautelar a eventual contradição de julgados. Por outro lado, a condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer ações civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infração. Importa, assim, apreciar e decidir a suspensão do presente processo, pelo que, haverá que verificar se nos encontramos diante de uma causa prejudicial, no sentido de que fala o artº. 272º, nº 1, CPC.
Diz-se que uma causa é prejudicial em relação a outra, quando a decisão da primeira, possa fazer desaparecer o fundamento ou a razão de ser da segunda (art. 276º, nº 2), fundando-se a razão de ser da suspensão por pendência de causa prejudicial é a economia e coerência dos julgamentos.
Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.10.2019, em que foi relatora Gabriela Marques: Subjacente à suspensão prevista no art. 272º do CPC, já não é a incompetência do tribunal para apreciar uma questão de natureza criminal ou administrativa prevista no artº 92º do mesmo diploma, mas sim a mera circunstância de estar já pendente uma outra acção onde se discute uma determinada questão (independentemente da sua natureza e independentemente de ela se integrar ou não no âmbito de competência do tribunal da causa) da qual depende o julgamento que nesta ação importa efectuar.
Entende-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia.
Ora, no caso em apreço temos que a decisão a proferir no processo criminal pode afectar o desenvolvimento destes autos, pois a matéria de facto que vier a ser demonstrada apresenta-se relevante para o desenvolvimento deste processo.
Nestes termos, verifica-se que estão preenchidos os requisitos do art. 272º, nº 1, CPC, pelo que, em obediência aos referidos princípios de economia processual e de desenvolvimento da instância, por ele reflectidos, importa que a presente acção fique com a sua instância suspensa até que seja decidido, com trânsito em julgado, o Procº nº 1700/16.9T9TMR, do Juízo Central Criminal de Santarém Juiz 3.
Notifique.»

2. Inconformado, o Réu BB, interpôs o presente recurso de apelação, que finalizou com as seguintes conclusões:
«a) A presente ação declarativa cível deu entrada em juízo, em data anterior à dedução do pedido cível enxertado na ação penal n.º1700/16.9T9TMR;
b) Em ambos os feitos existe igualdade de sujeitos, pedido e causa de pedir;
c) Logo, verificando-se litispendência, e para evitar contradição de julgados, deve ser apreciada e decidida aquela ação que deu entrada em juízo em primeiro lugar;
d) Ou seja, a decisão deve ser proferida nesta ação, agora com a instância suspensa porque esta é que constitui causa prejudicial da outra;
e) Ao ter decidido em contrário, o tribunal violou por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 272.º, n.º1, 276º, nº2 e 582º, todos do C.P.C.;
f) A instância também não deve ser suspensa, porquanto está em causa o comando taxado no artigo 72.º, n.2 do C.P.P;
g) A apreciação e decisão desta ação declarativa, em primeiro lugar, mostra-se assim necessária para proteger o direito dos arguidos no processo penal;
h) Pelo que, se mostra igualmente violado por errada interpretação e aplicação, o disposto no artigo 72.º, nº2 do C.P.P.
Termos em que, se não pelo exposto, mas sim, pelo que V. Exas., Colendos Julgadores, terão de suprir, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, em consequência, ser o despacho sob censura substituído por douto acórdão que ordene o prosseguimento dos autos com visto á prolação da sentença».

3. Não foram apresentadas contra-alegações.

4. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II.1. – Objeto do recurso
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, a única questão a apreciar no presente recurso é a de saber se existe ou não fundamento para a decretada suspensão desta instância até ao trânsito da decisão a proferir no processo-crime.
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II.2. – Incidências processuais relevantes
Para além da tramitação processual constante do despacho transcrito no relatório supra, importa ainda considerar na decisão do presente recurso[4], que:
1. A presente ação deu entrada em juízo em 04.10.2017.
2. Tendo sido invocada a violação do princípio da adesão e a caducidade do direito de peticionar indemnização cível pela seguradora chamada, a Autora apresentou resposta, invocando a verificação da exceção do artigo 72.º, n.º 1, alínea a), do CPP, justificando que o inquérito n.º 1700/16.9T9TMR teve início em 26.10.2016, tendo o seu prazo máximo de duração sido ultrapassado, conforme despacho proferido pelo Senhor Conselheiro Vice-Procurador-Geral da República, no despacho que deferiu a requerida aceleração processual (cfr. fls. 470 e ss.).
3. Por despacho proferido em 29.09.2020, foi julgada improcedente a invocada exceção, considerando-se que “nada obsta a que a A. demande os RR. nesta acção”, com o fundamento de que já havia decorrido o prazo de dedução a acusação “sem que tenha tido andamento o processo-crime, pelo que está verificado o requisito que permite à A. a dedução do pedido de indemnização em separado”.
4. Tendo a autora falecido no dia .../.../2019, EE, foi admitida a intervir como assistente no NUIPC 1700/16.9T9TMR, e, na qualidade de única herdeira de AA, em 21-01-2020, deduziu nesses autos pedido de indemnização civil contra os arguidos, formulando a pretensão que se transcreve:
«a) Sejam declarados nulos todos os contratos que estão na base das transmissões para o património dos demandados dos bens imóveis e do veículo, supramencionados, melhor descritos nos artigos 40º, 44º e 47º e consequentemente ser ordenado o cancelamento dos respetivos registos;
b) Serem os demandados condenados solidariamente a entregar à herança, representada pela cabeça-de-casal EE, os bens móveis e imóveis supra descritos;
c) Serem os demandados condenados, solidariamente, a entregar à herança, representada pela cabeça-de-casal, EE, a quantia monetária global de € 116.886,09 (cento e dezasseis mil, oitocentos e oitenta e seis mil euros e nove cêntimos), que estes ilegitimamente fizeram sua;
d) Serem os demandados condenados, solidariamente, a entregar à herança, representada pela cabeça-de-casal EE, a quantia monetária de 19.377,68 e, correspondente às rendas que a ofendida deixou de auferir, relativas aos anos 2016 e 2018, pagas pelos inquilinos, dos prédios que ilicitamente passaram para a propriedade da demandada CC;
e) Serem os demandados condenados, solidariamente, a entregar à herança, representada pela EE, a quantia monetária que se vier apurar como tendo sido pagas pelos inquilinos, dos prédios que ilicitamente passaram para a propriedade da demandada CC, correspondente às rendas relativas aos anos de 2019 e 2020, bem como todas as que venham a ser pagas até ao transito em julgado do presente pleito;
f) Improceder por não provada a douta promoção do Ministério público onde pugna pela perca a favor do Estado das quantias monetárias, bens imóveis e veículo e rendas vencidas e vincendas objeto do presente processo, sendo ordenada a entrega dos mesmos à ora requerente, cabeça-de-casal da herança aberta por óbito da ofendida».
5. Após a prolação do despacho recorrido foi junto aos autos o acórdão proferido no processo comum coletivo, em 04.03.2022, com o seguinte dispositivo (transcrição parcial):
«4.1. Da pronúncia:
4.1.1. ABSOLVER os arguidos BB, DD e CC da prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de burla qualificada, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 217º, 218º, nº 2, alíneas a) e c), ex vi do artigo 202, alínea b), todos do Código Penal, e de quatro crimes de falsificação de documentos, previstos e punidos pelos artigos 255º, alínea a), e 256º, nº 1, alínea d), e nº 3 do Código Penal, pelos quais foram pronunciados e sujeitos a julgamento nestes autos.
4.1.2. Indeferem o requerimento de perda de bens a favor do Estado.
4.1.3. Determinam, após trânsito em julgado, o levantamento das apreensões, devendo ser comunicado às Conservatórias competentes e às arrendatárias já identificadas nos autos e, especificamente quanto ao veículo automóvel, determinam que se notifique a arguida CC para proceder ao seu levantamento, no prazo máximo de 60 dias, findo o qual, se não o fizer, se considera perdido a favor do Estado. (…)
4.2. Do pedido de indemnização civil:
Julgar improcedente, por não provado, o pedido de indemnização formulado por EE contra BB, DD e CC e, consequentemente:
4.2.1. Absolvem os demandados do pedido.
4.2.2. Condenam a demandante nas custas processuais (artº 446.º, nsº 1 e 2, do Código de Processo Civil)».
6. Inconformada, a assistente interpôs recurso, defendendo perante este Tribunal ad quem que deve:
«1. Revogar-se a Acórdão proferido e substituindo-o por outro que condene os arguidos pela prática dos crimes de que estão pronunciados;
2. Julgar procedente por provado o pedido cível junto ao processo;
3. Com todas as consequências legais.»
7. Após a junção a estes autos daquele aresto, a primeira instância solicitou ao processo comum coletivo remessa de certidão do pedido de indemnização civil ali deduzido pela herdeira da falecida. Efetuada essa junção, foi proferido despacho determinando a notificação das partes para se pronunciarem quanto à eventual existência de litispendência.
8. Por acórdão proferido no passado dia 27.10.2022, ainda não transitado, os juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora, acordaram em negar provimento ao recurso, em suma, porque a recorrente não cumpriu qualquer dos requisitos de impugnação da matéria de facto, à luz da previsão do artigo 412º do C.P.P., não sendo «evidente (notório) que exista no texto da decisão recorrida e das regras de experiência comum, únicos elementos de que nos podemos socorrer neste ponto (v.g. artigo 410º do C.P.P.), qualquer vício de conhecimento oficioso, “erro notório na apreciação da prova”, “contradição insanável na fundamentação” ou “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”», concluindo que «Como a totalidade do recurso da assistente assenta na eventualidade de procedência da sua insatisfação quanto ao apuramento da matéria de facto, o recurso deve ser declarado totalmente improcedente pois que prejudicadas ficam as possibilidades de subsunção nos tipos penais de que os arguidos foram acusados».
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II.3. – O mérito do recurso
Alega ainda o Recorrente, que “o presente feito deu entrada em juízo em data muito anterior à dedução do pedido cível na instância criminal. Ou seja: temos sem necessidade de dar mais explicitações, duas ações cíveis ou dois pedidos cíveis com identidade de sujeitos, de objeto e de causa de pedir. Daqui resultando a existência de litispendência.
E quando esta vem ao mundo, a lei adjetiva civil dá prioridade na realização do julgamento, e consequente prolação da decisão, àquela ação que primeiro foi instaurada (artigo 582.º C.P.C.)
In casu, a ação cível precedeu o pedido de indemnização deduzido no processo penal. Mas em ambas, as partes são as mesmas, o objeto repete-se, e o mesmo acontece com a causa a pedir. Assim sendo, a ação declarativa cível é que ostensivamente constitui causa prejudicial relativamente ao enxerto efetuado no processo penal.
Logo, ela mesma é que deve trazer ao mundo, e em primeiro lugar, a decisão final do julgamento já foi efetuado”.
Vejamos.
De harmonia com o disposto no artigo 272.º, n.º 1, do CPC, “O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado”.
No caso em apreço, entendeu a primeira instância que o julgamento da causa criminal é prejudicial ao deste processo de natureza cível, aduzindo em fundamento que «a decisão a proferir no procedimento criminal tem uma óbvia implicação nos presentes autos, pois que, estando em causa a mesma matéria de facto, haverá que acautelar a eventual contradição de julgados. Por outro lado, a condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer ações civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infração».
Salvo o devido respeito, não subscrevemos a ponderação efetuada pela julgadora, de que no caso concreto estejamos perante uma causa prejudicial.
Afirmava ALBERTO DOS REIS[5] que “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir ou modificar o fundamento ou a razão da segunda”. Assim, “sempre que numa acção se ataca um acto ou facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, aquela é prejudicial em relação a esta”.
E, no mesmo sentido, avançava MANUEL DE ANDRADE[6], “verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é a reprodução, pura e simples, da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal”.
Mais recentemente, JOSÉ LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE[7] referem também que “é questão prejudicial toda aquela cuja resolução constitui pressuposto necessário da decisão de mérito, quer esta necessidade resulte da configuração da causa de pedir, quer da arguição ou existência duma exceção, perentória ou dilatória, quer ainda do objeto de incidentes em correlação lógica com o objeto do processo, e seja mais ou menos direta a relação que ocorra entre essa questão e a pretensão ou thema decidendum”. Acrescentam ainda estes autores que “verificada a questão prejudicial, o juiz pode prosseguir na apreciação e no julgamento da ação, decidindo-a previamente ele próprio, ou, em alternativa, sobrestar na decisão até ao seu julgamento pelo tribunal competente. Trata-se de uma faculdade que a lei confere ao juiz e que este pode exercer oficiosamente (…)”.
E quando assim é, ou seja, quando existe verdadeira prejudicialidade e dependência, parafraseando o que já ponderou o Supremo Tribunal de Justiça[8], prosseguindo as acções simultaneamente – não nos parece curial jogar aqui com o factor aleatório de saber qual delas transitará em julgado primeiramente – (…) Assim, nesta perspetiva, «o que releva para efeito de decretar ou não a suspensão da instância, é o facto de a decisão da primeira acção tirar a razão de ser à segunda, sob o ponto de vista do efeito jurídico pretendido, e não ser pressuposto desta última, porque o efeito que esta visa, caso aquela proceda, já está decidido logo que transite em julgado. Se a acção intentada pela Autora improceder, a segunda acção retomará o seu curso não havendo, agora, qualquer desprestigiante contradição entre os objectos processuais submetidos à apreciação judicial.
Esta deve ser a preocupação dos Tribunais – evitar a possibilidade de decisões contraditórias e inconciliáveis – não atendendo tanto aos conceitos e à sua positivista interpretação mas antes aos interesses reais dos cidadãos e ao prestígio das decisões judiciais».
No caso dos autos, a ação foi proposta fazendo-se a menção na petição inicial (artigo 46.º) a que “pela prática dos factos vertidos nesta PI foi apresentada queixa contra os 3 primeiros RR, a qual deu origem”, para o que ora importa, ao dito processo n.º 1700/16.9T9TMR”, tendo sido considerado que, pela falta de andamento do processo-crime, sem dedução de acusação à data da instauração desta ação civil, estaria verificado o requisito que permite à A. a dedução do pedido de indemnização em separado.
Na verdade, o artigo 71.º do Código de Processo Penal[9] impõe o princípio da adesão obrigatória do pedido cível à ação penal, estabelecendo que “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respetivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei”.
Por seu lado, o artigo 72.º, n.º 1, da codificação processual penal, elenca os casos em que o pedido civil pode ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, o que pode acontecer, designadamente quando “o processo penal não tiver conduzido à acusação dentro de oito meses a contar da notícia do crime, ou estiver sem andamento durante esse lapso de tempo” (alínea a).
É entendimento pacífico que da conjugação destes preceitos decorre que o Código de Processo Penal consagra, como regra, o princípio da adesão obrigatória da ação cível ao processo penal, e como exceção a dedução do pedido civil em separado do processo penal, visando este princípio estruturante, para além de evidentes razões de economia processual, obviar à existência de julgamentos contraditórios, mormente entre a jurisdição civil e a criminal.
Contudo, “[a] amplitude dos casos em que cessa a obrigatoriedade de adesão e a margem de livre decisão do lesado nessa sede revelam que o ordenamento tem subjacente a suscetibilidade de pendência simultânea de dois processos independentes fundados em factos constitutivos similares, um sobre a responsabilidade criminal e outro relativo à responsabilidade civil. Hipóteses em que a tramitação da ação civil é exclusivamente regulada pela lei processual civil, em sintonia com a sua independência. Independência da ação de responsabilidade civil fundada na prática de um crime relativamente ao processo penal que conforma as diferenças de estatutos dos sujeitos processuais, repercutidas na perda do estatuto de arguido e preservação apenas do de demandado civil, a qual foi objeto de apreciação pelo Tribunal Constitucional no acórdão de fiscalização concreta n.º 269/97 (Bravo Serra)”[10].
De facto, de acordo com o disposto no artigo 91.º, n.º 1, do CPC, que rege sobre as “questões prejudiciais”, “se o conhecimento do objeto da ação depender da decisão de uma questão que seja da competência do tribunal criminal ou do tribunal administrativo, pode o juiz sobrestar na decisão até que o tribunal competente se pronuncie”.
Como já dissemos e concordantemente com o que decorre destes preceitos legais, estes autos foram prosseguindo sempre, até à realização do julgamento, sem que a sua suspensão tivesse sido sequer cogitada. Pensamos que tal aconteceu porque, tal como a ação se encontra configurada nos seus fundamentos e atentos os pedidos formulados, designadamente na parte correspondente ao pedido de declaração de nulidade da procuração e dos contratos de compra e venda, aos tribunais cíveis está, sem dúvida, cometida a competência para o julgamento desta causa, ainda que parte da factualidade subjacente à mesma possa/pudesse consubstanciar a prática de ilícitos criminais, tanto mais que, tendo decorrido o prazo de inquérito sem que a acusação tenha sido deduzida, havia ocorrido na espécie a verificação da exceção ao princípio da adesão, oportunamente declarada nos autos. Ora, assim sendo, não haveria justificação para a suspensão desta ação. Conforme notam J. DE CASTRO MENDES e M. TEIXEIRA DE SOUSA, «Apenas há que observar um princípio de especialidade: a decisão tem de provir de um tribunal com competência originária, isto é, de um tribunal que, não sendo competente, não tenha visto a sua competência estendida à apreciação da questão apreciada. É, aliás, esse princípio que justifica a restrição do caso julgado em matéria penal ou administrativa, que se encontra estabelecida no art. 92.º, n.º 2, 2.ª parte», ou seja, neste caso e nessa perspetiva, o juiz desta ação decidiria a questão de facto e de direito, conexa com a criminal, mas a sua decisão não produziria efeitos fora deste processo.
Significa o que vimos de referir, que “a pendência do inquérito crime acima referido e de um eventual julgamento criminal que eventualmente se lhe siga não constituem causa prejudicial que possa legitimar a suspensão da instância, ao abrigo do artigo 92.º do CPC”, conformando-se o sistema constituído com a possibilidade de que, em algumas circunstâncias, se desenrolem processos separados nos quais se considerem diferentemente os factos – provados ou não provados – nas duas instâncias, a cível e a criminal[11].
Não obstante, deparando-se com a óbvia probabilidade de ocorrência de eventual contradição de julgados, que, tanto quanto possível os tribunais devem ter a preocupação de evitar, a primeira instância veio a decidir suspender estes autos até à decisão com trânsito no processo criminal.
Pelas razões expostas, a decretada suspensão neste processo não se justificaria com o fundamento em causa prejudicial.
Mas, lembrando a necessidade, acima sublinhada, de evitar a possibilidade de decisões contraditórias e inconciliáveis, o caso em presença remete-nos neste momento para questões que evidenciam como o regime pode ser incongruente, sendo ambas atinentes à eficácia da decisão proferida no processo penal neste processo civil.
Em primeiro lugar, atentemos na concernente à eficácia da decisão penal no âmbito do processo civil.
Neste conspeto, a primeira precisão que se impõe fazer no tocante ao despacho recorrido, concerne à menção no mesmo efetuada quanto aos efeitos da condenação definitiva em processo penal, a que alude o artigo 623.º do CPC, relativamente a terceiros, inaplicável, portanto, e tal qual, na situação em presença. Na verdade, o pedido de indemnização cível deduzido no processo penal, foi efetuado por pessoa física diversa da autora neste processo cível, mas que tem a mesma qualidade jurídica, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 581.º, n.º 2, do CPC, porque, tendo falecido AA, lhe sucedeu EE.
Salientando a incongruência decorrente de haver dois regimes distintos para a mesma indemnização, em função apenas da forma pela qual a mesma seja pedida em juízo, MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA[12] explica que “[o] art. 623.º CPC é o pendant do art. 624.º, n.º 1, CPC para a sentença penal condenatória. Estabelece-se aí o seguinte:
A condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer ações civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infração.
Em relação ao art. 624.º, n.º 1, CPC, o art. 623.º CPC apresenta uma diferença fundamental: é que este preceito se refere, como logo se adverte na sua epígrafe, à oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória. Portanto, a contrario sensu, o que o tribunal penal tiver decidido vale em qualquer acção civil que venha a decorrer entre as mesmas partes.
Portanto, o que está subjacente ao disposto no art. 623.º CPC é que o caso julgado da sentença penal condenatória vale como tal entre as partes do processo penal. Para terceiros, não podendo (por opção do legislador) valer como caso julgado, vale como como presunção ilidível. Noutros termos: o art. 623.º CPC parte do princípio de que a sentença condenatória é vinculativa para as partes (uma solução que não levanta nenhum óbice) e resolve, de acordo com a opção tomada pelo legislador, a força probatória dessa sentença em relação a terceiros”.
A segunda precisão que o despacho recorrido convoca, reporta-se à ausência de referência no mesmo ao contraponto daqueles efeitos, ou seja, à eficácia da decisão penal absolutória, consagrada no artigo 624.º da mesma codificação, que no seu n.º 1 estabelece a presunção legal decorrente da decisão penal absolutória, de inexistência dos factos que consubstanciem a prática do aludido ilícito criminal, ilidível por prova em contrário, mas que, nos termos do n.º 2, prevalece sobre quaisquer outras presunções de culpa estabelecidas na lei civil. Significa isto que, transitada a sentença absolutória que declarou não provados os factos consubstanciadores do ilícito criminal, “o autor da ação civil continua onerado, tal como se não tivesse havido sentença penal, com a prova dos factos constitutivos do seu direito”[13], de tal forma que ilidida a presunção da sua inexistência que a sentença penal absolutória faz presumir.
No citado paper MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA assume que “[e]ste preceito suscita alguma perplexidade, dado que o recurso à presunção legal parece querer ressuscitar a construção oitocentista do caso julgado como "presunção de verdade". Com efeito, apesar de inserido na matéria reguladora do caso julgado, o preceito não estabelece que o caso julgado penal absolutório vale como tal "em quaisquer acções de natureza civil", mas antes, ainda que entre as mesmas partes do processo penal, como "simples presunção legal da inexistência desses factos".
Trata-se, como resulta da parte final do preceito, de uma presunção iuris tantum. Isto significa que, apesar de o tribunal criminal ter considerado não provados certos factos, se admite que estes factos possam vir a ser provados numa posterior acção civil, mesmo que esta decorra entre as mesmas partes. Supõe-se que o preceito não comporta outra interpretação.
A acção civil que pode vir a decorrer após o processo penal que terminou com uma decisão absolutória por falta de provas será, na maior parte dos casos, uma acção de indemnização. Isto conduz às seguintes soluções:
-- Se a indemnização civil for pedida, como impõe, em regra, o art. 71.º CPP, na própria acção penal, é claro que o tribunal criminal está vinculado aos factos que ele próprio considerou não provados (o que, note-se, não significa que o pedido de indemnização não possa ser julgado procedente);
-- Se a indemnização civil for solicitada, como o permite o art. 72.º CPP, fora do processo penal, o disposto no art. 624.º, n.º 1, CPC (que então encontra o seu verdadeiro campo de aplicação) impõe que o tribunal civil não esteja vinculado à decisão do tribunal penal e, portanto, que, na acção civil, possam ser considerados provados factos que não foram dados como provados na acção penal.
Quer dizer: a mesma indemnização, mas dois regimes distintos em função apenas da forma pela qual a indemnização é pedida em juízo. Em suma: um regime incoerente”.
Numa “observação a latere” o citado Mestre pondera ainda: “como nunca se sabe se o tribunal criminal vai proferir uma decisão condenatória ou absolutória do acusado e porque, mesmo que venha a proferir uma decisão absolutória, o lesado não está impedido de vir a provar que os factos não provados no processo penal são verdadeiros, do disposto no art. 624.º, n.º 1, CPC resulta que não há, em rigor, nenhuma prejudicialidade da acção penal em relação à acção respeitante à indemnização civil. A bondade desta solução -- que é um corolário lógico da "solução O. J. Simpson" do art. 624.º, n.º 1, CPC -- é mais do que discutível”.
Subscrevendo integralmente estas e as demais questões e incoerências do regime legal respeitante à eficácia da decisão penal no processo civil, sobre as quais discorreu o Ilustre Autor a respeito das reflexões suscitadas pelo ali citado aresto do Tribunal da Relação de Coimbra, ousamos dizer que o caso que ora no preocupa, traz à liça ainda outras.
Com efeito, na situação em presença, já após a prolação do despacho que decretou a suspensão deste processo cível, veio aos autos o conhecimento de que, apesar de bem conhecer que esta ação pendia, a ora autora, por sucessão da primitiva, veio a deduzir pedido de indemnização civil na ação penal, formulando ali pedidos coincidentes com os aqui deduzidos, tendo tal dedução sido admitida e sido julgada pelo tribunal criminal, ainda que a decisão, que ali julgou improcedente o pedido de indemnização cível, não se mostre ainda transitada em julgado, pese embora já tenha sido proferido acórdão que julgou improcedente o recurso interposto.
Trata-se de tramitação processual a que não pode deixar de atender-se em sede de recurso, na mesma medida em que a codificação processual civil manda atender aos factos jurídicos supervenientes, de harmonia com o disposto no artigo 611.º aplicável aos acórdãos ex vi artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC, já que tem evidente repercussão nestes autos e coloca o enfoque das habituais considerações sobre a eficácia da decisão penal no processo civil, pensadas para uma tramitação coberta pelo disposto no artigo 72.º do CPP, num patamar diverso.
Efetivamente, bem ou mal, a verdade é que o pedido de indemnização civil foi admitido e a factualidade também fundadora desta ação cível, foi (grosso modo) julgada não provada no processo-crime, tendo o pedido de indemnização civil ali deduzido sido julgado improcedente.
Significa o que vimos de referir que, no caso, já não curamos apenas das incoerências resultantes do regime legal atinente à eficácia da decisão penal no processo civil, tendo de convocar também as que emergem do julgamento da ação civil enxertada na penal, ou seja, da verificação dos requisitos da litispendência e do caso julgado (que cremos já se verificará aquando da baixa dos autos ao tribunal recorrido), previstos nos artigos 580.º e 581.º do CPC, com vista a evitar que este tribunal civil seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior, na parte em que tem a mesma natureza.
Com efeito, na fundamentação do acórdão proferido em primeira instância, na parte atinente ao “pedido de indemnização civil”, consignou-se que “o pedido deduzido no processo penal é sempre um pedido de indemnização, não sendo o princípio da adesão adequado a que se questione a validade jurídica dos atos, confirmando-a ou declarando a sua nulidade”, sendo certo que as peças processuais também são passíveis de interpretação e, nos termos do artigo 621.º do CPC, «a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga».
Acresce ainda que o artigo 84.º do CPP sob a epígrafe “Caso Julgado” estabelece que «[a] decisão penal, ainda que absolutória, que conhecer do pedido civil constitui caso julgado nos termos em que a lei atribui eficácia de caso julgado às sentenças civis».
Conforme se referiu no aresto deste Tribunal da Relação de 18.10.2018[14][o] caso julgado pressupõe, tal como, aliás, a litispendência, uma tripla identidade: de sujeitos, de causas de pedir e de pedidos, havendo identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico e identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (arts. 580º nº 1, e 581º, nºs 2 a 4).
Daí que, «transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º …» (art. 619º, nº 1).
In casu, porque a decisão invocada para a ocorrência do caso julgado foi proferida em processo de natureza criminal, importa ainda considerar as disposições relativas a esse tipo de processo. (…)
Procurando clarificar o âmbito da indemnização a atribuir na ação penal ao abrigo do referido artigo 71º, o Assento n.º 7/99 do STJ [4], hoje com força de acórdão de uniformização de jurisprudência, fixou a seguinte jurisprudência:
«Se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artigo 377º, nº 1, do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em indemnização civil se o pedido se fundar em responsabilidade extracontratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual».
Do expendido resulta, por um lado, a natureza extracontratual da indemnização a apreciar em processo penal e, por outro lado, a formação do caso julgado em termos idênticos aos regulados pela lei para «as sentenças civis»”.
Daí que, para concluir da possibilidade da formação do caso julgado pela decisão do pedido de indemnização no processo penal, se imponha neste momento processual e em face dos desenvolvimento subsequentes, que o tribunal a quo averigue se no confronto deste processo com o pedido de indemnização civil deduzido no processo criminal, ocorre ou não a tríplice identidade estabelecida nos artigos 580.º, n.º 1, e 581.º, nºs 2 a 4, do CPC.
E para o efeito, impõe-se in casu, a revogação do despacho recorrido, para que o processo prossiga os seus termos e o tribunal a quo aprecie das consequências da absolvição do pedido cível deduzido no processo penal, designadamente se se verifica ou não aquela tríplice identidade, e mormente se a causa de pedir neste caso tem fundamentos factuais e jurídicos iguais àqueles, o mesmo é dizer, se aquela absolvição (presumindo-se que entretanto transitará), forma ou não caso julgado impeditivo do conhecimento desta ação cível.
Nestes termos, e sem necessidade de maiores considerações, ainda que por fundamentação diversa, procede o presente recurso.
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IV - Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o presente recurso, revogando a decisão recorrida e determinando o prosseguimento dos autos.
Sem tributação, uma vez que a Recorrida não contra-alegou.
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Évora, 10 de novembro de 2022
Albertina Pedroso [15]
Francisco Xavier
Maria João Sousa e Faro

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[1] Juízo Central Cível de Santarém - Juiz 3.
[2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Francisco Xavier; 2.ª Adjunta: Maria João Sousa e Faro.
[3] Doravante abreviadamente designado CPC.
[4] Em face do que decorre destes autos e da certidão das peças relevantes do processo comum coletivo, nº 1700/16.9T9TMR, do Juízo Central Criminal de Santarém Juiz 3, cujo acórdão proferido neste Tribunal no passado dia 27.10.2022, foi solicitado pela Relatora.
[5] In Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, págs. 268 e 269.
[6] In Lições de Processo Civil, págs. 491 e 492.
[7] In Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, 3.ª edição, Almedina, 2017, pág. 183.
[8] Cfr. Ac. STJ de 13.04.2010, proferido no processo n.º 707/09.7TBVR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt (o sublinhado é nosso).
[9] Doravante abreviadamente designado CPP.
[10] Cfr. CRISTINA DÁ MESQUITA, In “Prova na ação de responsabilidade civil fundada na prática de crime e factos provados na fundamentação da sentença penal”, Revista JULGAR Online, janeiro de 2018, págs. 7 e 8, que discorre ainda sobre a diferenciação de estatutos (arguido/parte civil) também analisada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sublinhando nomeadamente que as noções de equidade ou fair trial aplicáveis num e noutro processo são distintas.
[11] Cfr., neste sentido, o recente Acórdão deste Tribunal da Relação, de 27 de outubro de 2022, proferido no processo n.º 4205/20.0T8STB-C.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[12] No paper intitulado “Eficácia da decisão penal no processo civil: a "solução O. J. Simpson" do art. 624.º, n.º 1, CPC”, publicado em 02/06/2020, no Blog do Instituto Português do Processo Civil, disponível em https://blogippc.blogspot.com/2020/06/eficacia-da-decisao-penal-no-processo.html.
[13] JOSÉ LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 765.
[14] Prolatado no processo n.º 312/17.4T8PTM.E1, disponível em www.dgsi.pt, no qual a ora relatora foi primeira adjunta.
[15] Texto elaborado e revisto pela Relatora, e assinado eletronicamente pelos três desembargadores desta conferência.