Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1121/18.9T8FAR.E1
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
AGENTE DE EXECUÇÃO
CAUSALIDADE ADEQUADA
MÁ FÉ
Data do Acordão: 10/24/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário:
I - A responsabilidade civil delitual assacável à ré assenta na omissão por banda desta de um comportamento profissional devido, em concreto, da comunicação aos titulares do direito de preferência na aquisição do imóvel, do projecto de venda e respectivas condições, que motivou a procedência da acção por estes intentada contra a autora para se lhe substituírem na posição de adquirentes.
II - Se a Agente de Execução tivesse levado a cabo o comportamento devido, o mesmo é dizer o comportamento lícito alternativo à ilícita omissão daquele, ou seja, a oportuna comunicação para o exercício do direito de preferência que os titulares do direito vieram exercer judicialmente, nunca a autora teria adquirido o imóvel, pelo que, caso a ré tivesse cumprido com o dever omitido, nunca se constituiria na esfera jurídica da Autora a possibilidade da venda do imóvel com lucro, e tanto sempre bastaria para a improcedência da pretensão indemnizatória fundada quer em lucro cessante quer em perda de chance.
III - O artigo 563.º do CC, consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, o que significa que a omissão ilícita da agente de execução, ora ré, só deixa de ser considerada causa adequada da produção do dano decorrente da realização das despesas que um proprietário diligente tomaria no sentido da manutenção e valorização do imóvel indevidamente adquirido, sem o conhecimento deste e mercê da omissão daquela, quando o comportamento omissivo se revelar de todo indiferente para a produção do dano.
IV - No caso em presença, a omissão da ré deu causa à indevida aquisição do imóvel pela autora que, sem qualquer culpa da sua parte, a determinar o funcionamento do artigo 570.º do CC, actuou como proprietária, realizando despesas que suportou, na convicção de ter adquirido a seu favor essa qualidade, a qual veio a perder na sequência da procedência da acção de preferência por omissão da devida actuação da ré quanto à comunicação aos preferentes.
V - Portanto, ao omitir o dever profissional que sobre si impendia, permitindo com tal omissão a aquisição por banda da autora, em detrimento dos preferentes, a esfera de responsabilidade da ré abrange ainda as despesas acima referidas, as quais não podem sequer ser qualificadas como alguma especial idiossincrasia da adquirente que agravasse desproporcionalmente a esfera de risco que o comportamento omitido espoletou.
VI - Justifica-se a condenação da autora como litigante de má fé, se a mesma omitiu parcialmente a verdade de factos essenciais, que eram evidentemente do respectivo conhecimento, com o fito de tentar obter também da ré indemnização que já havia recebido parcialmente na acção de preferência.
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 1121/18.9T8FAR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]
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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. BB, Unipessoal, Lda., instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra CC, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 703.240,10€ a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos em consequência da sua actuação, acrescida de juros legais, contados desde a propositura da acção até integral pagamento.
Em fundamento, alegou, em síntese, que adquiriu um imóvel no âmbito de uma acção executiva, na qual a ré desempenhava funções de agente de execução e encarregada da venda, o qual veio a ser adquirido por terceiros preferentes aos quais aquela não notificou oportunamente para exercer o direito de preferência, causando-lhe os indicados danos patrimoniais cujo ressarcimento peticiona.

2. Regularmente citada, a Ré contestou, por excepção, invocando a sua ilegitimidade passiva[3] e, no mais, impugnando os factos alegados, defendendo que não se encontrava obrigada a notificar os preferentes e que a autora actua em abuso de direito, pretendendo locupletar-se a suas expensas.
Deduziu ainda pedido de intervenção principal provocada da seguradora DD-Companhia de Seguros, S.A., que veio a ser admitido como intervenção principal acessória para exercício de direito de regresso.
Citada a interveniente, não apresentou articulado.

3. Na audiência prévia, foi reduzido o pedido para o montante de 694.419,17€, proferido despacho saneador, declarada improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

4. Realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar à autora a quantia de 9.732,58€, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de juros legal de 4%, ou outra que lhe sobrevier, contados desde a data da citação até integral pagamento; absolvendo a ré do demais peticionado; e condenando a autora como litigante de má-fé, na multa de 5 (cinco) UC´s.

5. Inconformada, a Autora apelou, terminando a respectiva minuta com as seguintes conclusões (transcrição da parte relevante):
«C) Deverá ser substituída a resposta à matéria de facto dando-se como PROVADO que:
D) A A. despendeu com deslocações, alimentação, estacionamento, portagens, combustível para tratar questões relacionadas com o prédio misto a quantia de 1.446,79€;
E) Que a A. pagou 2.500,00€ a Nuno F… pelos serviços enquanto primeiro encarregado de venda;
F) Que a A. pagou 1.230,00€ para pagamento de serviços de avaliação de imóvel;
G) Que a A. pagou ao arquitecto a quantia adicional de 4.224,68€;
H) Que a A. pagou 294,00€ para serviços de tradução da avaliação;
I) Que a A. pagou 7.380,00€ à empresa EE, Lda pelos serviços prestados de limpeza e nivelamento do imóvel.
J) Que a A. deve ao Sr. José S… por todos os serviços prestados por aquele no imóvel a quantia de pelos serviços 12.988,80€.
K) Que a A. teve um interessado na aquisição do prédio misto pelo valor 800.000,00€
L) O tribunal a quo julgou bem a questão de direito ao considerar que estamos no âmbito da responsabilidade civil por factos iícitos, plasmada no art.º 483º do Código Civil. (…)
N) Todavia, não obstante os inúmeros danos e prejuízos que a A. teve em consequência da omissão da R. alguns já constantes dos factos provados e outros indevidamente incluídos nos factos julgados como demonstrado supra, a sentença recorrida apenas condenou a R. a ressarcir a A. na quantia de 9.732,58€, referente aos honorários e custas judiciais da acção em que foi demandada pelos preferentes.
O) A A. adquiriu o imóvel no âmbito de um processo judicial de execução, o que obviamente criou nas A. a expectativa de que toda a venda tinha sido efectuada obedecendo aos trâmites legais aplicáveis e que não iria ter qualquer problema.
P) Foi perante essa segurança que a A. fez inúmeros investimentos no sentido de reabilitar e valorizar o prédio, já constantes da sentença recorrida e que a recorrente por uma questão de economia processual se absterá de voltar a repetir. (…)
R) Ora, se não se tivesse verificado o evento a A. não teria investido em projectos de arquitectura, em reparações, em obras, em terraplanagens, etc.
S) Todos esses gastos foram decorrentes da omissão da R., existindo um claro nexo de causalidade entre os dois.
T) Foram despesas efectivas que a A. suportou e prejuízos que suportou que não existiriam caso a R. tivesse cumprido com as obrigações que sobre si impendiam.
U) Logo, recaindo sobre a R. a obrigação de reconstituir a situação material anterior, terá que ser condenada a restituir os valores que a A. despendeu no imóvel.
V) Deste modo, e de forma a reconstituir a situação material anterior ao evento que obriga à reparação terá a R. que ser condenada a restituir à A. todos os valores que aquela despendeu no imóvel, quer os que constam dos factos provados, quer os que constam dos factos não provados e que no entender da A. foram incorrectamente julgados conforme devidamente explanado supra.
W) Além disso a A. sendo uma sociedade visa o lucro.
X) E adquiriu o imóvel na perpectiva de valorizar o mesmo e ter lucro com a sua revenda.
Y) Conforme resulta do depoimento das testemunhas a A. tinha um potencial interessado na compra do imóvel pela quantia de 800.000,00€.
Z) A omissão da R. originou a perda do negócio por parte da A. e impediu-a de obter aquele expectável lucro.
AA) Motivo pelo qual deverá igualmente a R. ser condenada no pagamento à A. do montante indemnizatório de 590.000,00€ referente à perda de negócio resultante da sua omissão.
BB) Ou cautelarmente, o que apenas se concebe por mera cautela de patrocínio, sempre deverá pelo menos a A. ser condenada no valor do dano da perda de negócio a liquidar em sede de execução de sentença.
CC) Foi a A. condenada como litigante de má fé numa multa que foi fixada em 5UC’s.
DD) A A. pretende ser ressarcida pelos valores que despendeu e indemnizada pelos danos que sofreu mas não pretende obter qualquer vantagem indevida com a situação.
EE) Tanto que fez a redução do seu pedido em 11.506,37€, passando assim a ser de 682.912,80€, mal se apercebeu da duplicação dos pedidos nas acções, o que demonstra a boa fé da A. e a sua postura processual.
FF) Redução que foi aceite pelo tribunal a quo e que não foi objecto de julgamento.
GG) Além disso a referida duplicação não implicou nenhum prejuízo nem para a parte contrária nem para o tribunal já que:
HH) O montante pedido em duplicado foi retirado do pedido e o mesmo reduzido;
II) A R. teria sempre que intervir no presente processo, sendo que a parte duplicada correspondia a uma parte muito reduzida do pedido, vindo inclusive a ser condenada.
JJ) O tribunal a quo teria sempre que se debruçar sobre os demais factos e pedidos e não teve sequer que apreciar aqueles que foram reduzidos e que agora consubstanciam a alegada litigância de má fé. (…)
LL) Deste modo entende que deve ser revogada a sua condenação como litigante de má fé.
MM) Ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, ser pelo menos a multa reduzida para a quantia de 1UC tendo em conta tudo quanto se encontra supra explanado.
NN) Pelo exposto deve a sentença/decisão ora em crise ser revogada e substituída por outra que adeque os factos provados e não provados de acordo com a prova produzida, devidamente explanada supra, que condene a R. a pagar à A. todos os prejuízos e todos os montantes que suportou decorrentes da sua omissão e que revogue a condenação da A.como litigante de má fé».

6. A Seguradora Interveniente e a Ré apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência da apelação.

7. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II. O objecto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[4], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, as questões colocadas pela Recorrente são as de saber se deve ser modificada a indicada matéria de facto, bem como o enquadramento jurídico dado pelo tribunal a quo quanto ao grau de responsabilidade da R./agente de execução, nos alegados prejuízos suportados pela A./adquirente; e revogada, ou pelo menos reduzida, a sua condenação como litigante de má fé.
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III – Fundamentos
III.1. – De facto
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
«1- A autora é uma sociedade por quotas que se dedica à compra e venda de imóveis.
2- A ré é solicitadora de execução e titular da cédula profissional n.º …, com inscrição em vigor na Câmara dos Solicitadores.
3- Desempenhava funções como agente de execução no âmbito do processo de execução n.º 642/07.3TBTVR, no qual constava como exequente FF e executado GG (cfr. doc. de fls.319, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
4- No âmbito deste processo de execução, em 18.02.2008, foi penhorado o prédio misto, com a área total de 26 017m2, composto por terra de cultura, pomar de citrinos e de pereiras, vinha e edifício térreo, destinado a habitação, com diversos compartimentos, com uma área total de 26.017 m2, sito no Sítio do P…, união das Freguesias de Luz de Tavira e Santo Estêvão, concelho de Tavira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana sob o art.º … e na matriz predial rústica sob o art.º … (cfr.320/321 doc. de fls., cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
5- A ré procedeu a diligências com vista à venda do prédio misto no âmbito do processo de execução, primeiro através de venda por proposta em carta fechada e, frustrada essa venda, através de negociação particular, na qual interveio na qualidade de encarregada da venda (cfr. doc. de fls. 19 e 323/337, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
6- A autora tomou conhecimento do anúncio da venda e apresentou uma proposta para aquisição do prédio misto pelo preço de €210.100,00, da qual a ré notificou exequente e executado naqueles autos (cfr. doc. de fls.338/341, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
7- Face às respostas recebidas de exequente e executado a ré aceitou a proposta apresentada pela autora (cfr. doc. de fls.339/341, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
8- Comunicando, em 13.02.2014, a decisão de aceitação da proposta ao Tribunal, exequente e executado (cfr. doc. de fls.339/341, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
9- Através de título de compra e venda, outorgado no Balcão de Casa Pronta de Olhão, em 23.04.2014, a autora adquiriu, por compra, o referido prédio misto, pelo preço global de €210.100,00, sendo o valor de €208.650,00 para a parte urbana e o valor de € 1.450,00 para a parte rústica (cfr. doc. de fls.343/346, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
10- A ré não comunicou a Diamantino S…, Nuno S… e Soraia S…, proprietários do prédio rústico confinante denominado “Porto da …”, sito no Sítio do P…, concelho de Tavira, o qual se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …, a intenção de venda e respectivas condições.
11- Para que estes pudessem pronunciar-se acerca da aquisição do prédio misto em relação aos demais interessados antes da outorga da compra e venda, porquanto ambos os prédios se inseriam em zona RAN.
12- Levando a que estes tivessem intentado acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra a autora e a ré, a qual correu termos na Instância Central Cível de Faro-J3, com o n.º869/15.4T8FAR, pedindo o reconhecimento do direito de preferência na alienação do referido prédio misto e declaração de ineficácia da transmissão efectuada a favor da autora, com o direito de haverem para si o prédio, sub-rogando-se a esta na compra e venda (cfr. doc. de fls.350/422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
13- No âmbito da referida acção declarativa a ré foi julgada parte ilegítima e absolvida da instância (cfr. doc. de fls.423/437, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
14- E foi proferida sentença na qual se reconheceu o direito legal de preferência na venda aos ali autores, declarando a transmissão para estes do direito de propriedade sobre o prédio misto (cfr. doc. de fls.350/422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
15- A autora despendeu na aquisição do prédio misto a quantia de €210.100,00 a título de preço, €1.680,80 a título de imposto de selo, €6.514,88 a título de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis e €355,25 a título de pagamento de ónus que recaiam sobre o prédio misto.
16- Os referidos montantes foram-lhe pagos no âmbito da acção referida, através dos montantes depositados pelos ali autores (cfr. doc. de fls.350/422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
17- Após a aquisição do prédio misto a autora despendeu €20.275,32 referentes a prestação de serviços por gabinete de arquitectura, com vista a elaborar um projecto.
18- E despendeu no Cartório Notarial de Faro o montante de €304,00, com a realização de registo predial.
19- E despendeu com pagamento de serviços de contabilidade o montante de €1.844,14.
20- E despendeu com o seguro do imóvel o montante de €1.033,86.
21- E despendeu com a apreciação do pedido de licença ou da comunicação prévia, fornecimento de fotocópias de processo urbanísticos, de cartografia e plantas topográficas o montante de €211,20.
22- E despendeu com os consumos de água e saneamento o montante de €1.368,96.
23- E despendeu com consumos de electricidade o montante de €741,70.
24- E despendeu com materiais de construção/reparação o montante de €9.016,60.
25- E despendeu com custas judiciais referentes à acção identificada em 12. o montante de €2.917,20.
26- E despendeu com honorários de advogado nessa acção o montante de €6.815,38.
27- E despendeu com serviços de topografia o montante de €495,08.
28- E despendeu com deslocações, alimentação, estacionamento, portagens, combustível para tratar questões relacionadas com o prédio misto montante não apurado.
29- Pelas despesas realizadas no prédio misto foram os autores na acção n.º869/15.4T8FAR condenados a pagar à autora o montante de €8.698,37, acrescido de juros de mora, a contar da notificação da reconvenção até integral pagamento (cfr. doc. De fls.350/422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
30- Montante que aqueles pagaram à autora.
31- A autora pretendia aprovar projecto de arquitectura para melhoramento do prédio misto para posteriormente revendê-lo.
32- Entre a Câmara dos Solicitadores e a seguradora “DD-Companhia de Seguros, S.A. foi celebrado contrato de seguro, titulado pela apólice n.º …96, através do qual foi coberto o risco decorrente da actividade profissional desenvolvida pela ré pela prática de factos ilícitos, com capital de €100.000,00 (cfr. doc. de fls.442/461, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)».
E foram considerados não provados os seguintes factos:
«a) a autora despendeu €35.879,21 referentes a pagamentos efectuados a Miguel A…, dos quais €20.000,00 foram para pagamento de dívidas bancárias, €2.500,00 para pagamento a Nuno F… pelos serviços enquanto primeiro encarregado da venda, €1.230,00 para pagamento dos serviços de avaliação do imóvel, €4.224,68 para pagamento adicional ao arquitecto, €780,53 para pagamento final do projecto, €294,00 para pagamento de serviços de tradução e €7.380,00 para pagamento de serviços prestados pela empresa “EE, Lda”;
b) a autora despendeu pelos serviços prestados por José S… a quantia de €12.988,80;
c) a autora teve um interessado na aquisição do prédio misto pelo valor de €800.000,00;
d) as obras realizadas pela autora valorizaram o prédio misto em €590.000,00».
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III.2. – O mérito do recurso
III.2.1. – Da impugnação da matéria de facto
(…).
Pelo exposto, julgamos improcedente a pretensão recursiva formulada pela Autora, com vista à modificação dos indicados pontos de facto, mantendo-se intocada a matéria de facto, tal como vem fixada por via do julgamento da mesma em primeira instância.
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III.2.2. – Da responsabilidade civil
A autora instaurou a presente acção com fundamento na responsabilidade civil extracontratual da ré, decorrente da omissão da prática de um acto no exercício das suas funções de agente de execução, que em seu entender lhe provocou os peticionados danos patrimoniais. A ré defendeu ter actuado no âmbito de um processo executivo e a coberto de decisões judiciais, parecendo implicitamente inculcar que seria do Estado a eventual obrigação de indemnizar.
Na sentença recorrida, com apoio designadamente no Acórdão deste Tribunal da Relação de 06.04.2017[5], concluiu-se pelo enquadramento jurídico do caso na responsabilidade civil por factos ilícitos, assentando a responsabilidade da Ré, agente de execução, na omissão da devida comunicação aos preferentes, que vieram a exercer judicialmente, e com sucesso, o respectivo direito de preferência na alienação do prédio misto em causa, entendimento que não vem colocado em causa e com o qual, na economia dos autos, igualmente concordamos[6].
Na verdade, como sublinha TOMÉ GOMES[7], nada de específico se prevendo quanto à responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício das funções de agente de execução, haverá que “recorrer aos meios de tutela comuns, tendo em linha de conta que se trata do exercício de uma profissão liberal independente[8], mas pautada por deveres estatutários específicos, aliás postulados pela natureza pública da função de administração da justiça em que se inscrevem”.
Insurge-se a Recorrente contra a decisão recorrida, por entender que o Tribunal a quo pese embora tenha efectuado uma correcta subsunção jurídica do caso, não procedeu à reconstituição da situação material anterior ao evento, por não ter condenado a Ré a restituir à Autora todos os valores que aquela despendeu no imóvel.
Por seu turno, tanto a Ré como a Interveniente, sufragam o entendimento da primeira instância, considerando que apenas são devidos os honorários e as custas judiciais da acção em que a ora Apelante foi demandada pelos preferentes, não sendo devidas as demais despesas efectuadas.
Depois de assinalar que as despesas em que a Autora incorreu para adquirir o prédio misto identificado em 4., mormente o pagamento do preço de €210.100,00, as despesas com IMT, imposto de selo e pagamento de ónus, no valor de €6.514,88, de €1.680,80 e de €355,25, respectivamente, encontravam-se depositadas pelos preferentes e foram pagas à autora no âmbito da acção de preferência, por ter sido reconhecido aos preferentes o direito de adquirir o prédio misto em causa, tendo havido redução do pedido nesta acção, em conformidade, afirmou-se na decisão recorrida, a respeito das demais despesas peticionadas que «a autora teve despesas com materiais de construção utilizados no prédio misto adquirido, também ressarcidos, na generalidade, no âmbito de acção de preferência (a título de despesas com melhoramentos e que beneficiaram o imóvel).Por conseguinte, também aqui, o prejuízo não subsiste, não podendo a autora obter ressarcimento em dobro, sob pena de se entender que, efectivamente, como alega a ré, a título de excepção, se pretende locupletar à sua custa.
Porém, mesmo que tal não tivesse sucedido, entendemos que as despesas com materiais ressarcidas ou não ressarcidas (outras são peticionadas nesta acção que não foram naqueloutra), não decorrem ou têm origem na omissão de actos praticados pela ré, no âmbito da acção executiva.
Na verdade, é facto que se apura que a autora decidiu efectuar no prédio misto adquirido melhoramentos, aprovando um projecto de arquitectura para posterior revenda, contratando serviços de topografia, despendendo as quantias apuradas em 17., 18., 21. e 27..
Porém, tal corresponderá à sua vontade e não pode ser assacado a qualquer acto ou omissão da ré. O que vale por dizer que o que decidiu fazer no prédio adquirido apenas lhe diz respeito, não tem qualquer relação com a omissão da ré. (…)
Em relação a gastos com luz, com saneamento, com electricidade e com o seguro, tratam-se, salvo outra opinião, de custos associados à aquisição e manutenção de qualquer imóvel, os quais terão sido realizados em seu benefício.
E em relação a despesas de contabilidade são inerentes a qualquer sociedade que recorra a tais serviços, sendo que as despesas com transportes, deslocações, portagens e alimentação, as quais suportou fruto do destino que traçou para o imóvel, para além de não se apurar o respectivo montante, resulta precisamente do destino que decidiu atribuir-lhe.
Donde, consideramos que as únicas despesas que comprova ter suportado e que surgem como consequência adequada da omissão da comunicação aos preferentes relacionam-se com a aquisição do imóvel (preço, IMT, imposto de selo e pagamento de ónus) e com a acção em que foi demandada pelos preferentes (honorários e custas judiciais), as quais, não fosse a omissão da ré, não teriam surgido.
Logo, existe nexo de causalidade entre a omissão (falta de notificação dos preferentes) e o dano (despesas com a aquisição e custos judiciais pela demanda), não existindo quanto aos demais prejuízos.
Aliás, diremos, que a alegada perda de negócio nunca revelaria, na medida em que a mesma nunca teria direito a adquirir o imóvel, caso a preferência tivesse sido dada antecipadamente aos preferentes.
Por conseguinte, concluindo, mesmo apuradas outras despesas que tenha suportado, apenas as mencionadas despesas seriam devidas pela ré, porquanto podem ser imputadas à omissão da notificação dos preferentes, a qual é adequada a causar tal resultado que, provavelmente, não se teria verificado se não fosse a conduta da ré».
Vejamos.
De acordo com o preceituado no artigo 483.º do CC, que consagra os princípios gerais da responsabilidade civil extracontratual, «[a]quele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação».
Em face do disposto no artigo 342.º do CC, atento o pedido formulado e a causa de pedir na presente acção, à Autora incumbe a prova dos factos consubstanciadores do direito invocado, enquanto fundamentadores dos pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito, que tradicionalmente se consideram num elenco de cinco, a saber: a) o facto; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) um nexo de causalidade entre o facto e o dano[9].
Assim, quanto ao facto, na responsabilidade civil extracontratual o mesmo é ilícito quando viola um direito subjectivo de outrem, de natureza absoluta, ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, como ocorre quando a norma violada protege interesses particulares, mas sem conceder ao respectivo titular um direito subjectivo, dependendo, então, a indemnização a arbitrar que a tutela dos interesses particulares figure, de facto, entre os fins da norma violada e que o dano se tenha registado no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar[10].
Já quanto à imputação do facto ao lesante, a responsabilidade civil pressupõe, em regra, a culpa, que se traduz numa determinada posição ou situação psicológica do agente perante o facto, consistindo, em sentido amplo, na referida imputação do facto ao agente[11], ou ainda num enquadramento normativo, entendido como a omissão da diligência que seria exigível ao agente medida de acordo com o padrão de conduta que a lei impõe[12], sempre apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (artigo 487.º, n.º 2, do CC).
Note-se que esta imputação do facto ao agente, para além do dolo em qualquer uma das suas modalidades, pode ainda resultar, no âmbito da denominada mera culpa, de negligência consciência - quando o agente prevê a produção de um facto ilícito como possível, mas, por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria, crê na sua não verificação, e só, por isso, não toma as providências necessárias para o evitar –, ou mesmo de negligência inconsciente, que ocorre quando o agente não chega sequer a conceber a possibilidade de o facto se verificar, por imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão, podendo e devendo prevê-lo e evitar a sua verificação, se usasse da diligência devida[13].
Por seu turno, no tocante ao nexo de causalidade entre o facto e o dano, o artigo 563.º do CC, consagrou a doutrina da causalidade adequada, segundo a qual, na sua formulação positiva, para que um facto seja causa de um dano é necessário, antes de mais, que no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se teria verificado, e ainda que, em abstracto ou em geral, o facto seja causa adequada do dano; e, na sua formulação negativa, a condição deixa de ser causa do dano sempre que, segundo a sua natureza geral, a mesma era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo, portanto, inadequada para a ocorrência desse dano[14].
Na realidade, dispõe o artigo 563.º do CC que a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, significando isto que “não é de modo nenhum necessário que o facto, só por si, sem a colaboração de outros, tenha produzido o dano”, sendo apenas essencial que o “facto seja condição do dano, mas nada obsta a que, como vulgarmente sucede, ele seja apenas uma das condições desse dano”.
Acresce que, conforme explicam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, “a fórmula usada no artigo 563.º deve, assim, interpretar-se no sentido de que não basta que o evento tenha produzido (naturalística ou mecanicamente) certo efeito para que este, do ponto de vista jurídico, se possa considerar causado ou provocado por ele; para tanto, é necessário ainda que o evento danoso seja uma causa provável, como quem diz adequada desse efeito”[15].
Já no que respeita à existência de um dano, este é condição essencial da obrigação de indemnizar: o facto ilícito e culposo tem que causar um prejuízo a alguém, entendido como o sofrimento de uma perda nos seus interesses patrimoniais ou não patrimoniais.
A questão decidenda neste momento centra-se, pois, apenas no pressuposto da responsabilidade civil concernente ao estabelecimento do nexo causal entre a omissão ilícita e os danos reclamados ou, noutro prisma, no âmbito do prejuízo reparável.
Pese embora não tenhamos procedido a qualquer alteração na matéria de facto não provada, não podemos primeiramente deixar de mencionar a razão pela qual referimos acima que, em nosso entender, seria irrelevante no caso em apreço a reapreciação do facto correspondente à alegada existência de um interessado na compra do imóvel pelo preço de 800.000,00€, e o cômputo pela Autora do prejuízo sofrido (lucro cessante) no montante de 590.000,00€, correspondente à diferença entre o valor pelo qual adquiriu o prédio e aquele indicado valor.
É que, quer perspectivada num sentido tradicional, como uma indemnização para ressarcimento de um lucro cessante, quer numa visão mais recentemente desenvolvida, como resultante da perda de chance[16] de venda do prédio por aquele indicado valor, o referido pedido nunca poderia proceder na situação em apreço, porque desde logo falharia a previsibilidade futura duma sequer eventual concretização do negócio em causa.
Na verdade, para se chegar a esta conclusão, basta pensar que a responsabilidade civil delitual assacável à ré assenta na omissão por banda desta de um comportamento profissional devido, em concreto, da comunicação aos titulares do direito de preferência na aquisição do imóvel, do projecto de venda e respectivas condições, que motivou a procedência da acção por estes intentada contra a autora para se lhe substituírem na posição de adquirentes.
Assim, importa ter presente que se a Senhora Agente de Execução tivesse levado a cabo o comportamento devido, o mesmo é dizer o comportamento lícito alternativo à ilícita omissão daquele, ou seja, a oportuna comunicação para o exercício do direito de preferência que os titulares do direito vieram exercer judicialmente, nunca a autora teria adquirido o imóvel.
Na realidade, conforme alerta MAFALDA MIRANDA BARBOSA[17], “deve-se, de facto, admitir a invocação do comportamento conforme ao direito como expediente de exclusão da imputação que se traça. A este nível colhe a invocação do comportamento alternativo conforme ao direito, porque, ao mostrar que a lesão surgiria do mesmo modo independentemente da licitude ou ilicitude do comportamento, consegue-se obter a prova do não incremento do risco. No fundo, o lesante demonstra que o dano que emerge não se conexiona funcionalmente com a esfera de responsabilidade atualizada a partir da obliteração dos deveres de conduta”.
Revertendo este ensinamento ao caso em presença, podemos concluir que caso a ré tivesse cumprido com o dever omitido, nunca se constituiria na esfera jurídica da Autora a possibilidade da venda do imóvel com lucro, pela simples mas evidente razão que o mesmo teria sido adquirido pelos titulares do direito que com aquela omissão foram preteridos... E tanto sempre bastaria para a improcedência de tal pretensão, impondo-se, a final, a confirmação da sentença recorrida nesta parte.
Igualmente sufragamos a decisão ora sindicada relativamente à declarada improcedência da pretensão da autora no segmento referente às despesas com o pagamento de serviços de contabilidade (ponto 19), porquanto não se vislumbra qualquer correlação entre a sua realização e qualquer actuação da ré, antes se devendo naturalmente ao normal funcionamento da sociedade autora, e que sempre existiriam independentemente da aquisição deste imóvel; e ainda, pelos fundamentos indicados na sentença, e não impugnados motivadamente na apelação, a improcedência relativa à prova de que a Autora despendeu em materiais de construção/reparação o montante de 9.016,60€ (ponto 24.), já que, conforme se afirmou na sentença recorrida «o prejuízo não subsiste» por corresponder a valores ressarcidos, na generalidade, no âmbito da acção de preferência.
Porém, discordamos do entendimento vertido na sentença recorrida a respeito das demais despesas comprovadas, mormente sobre as despesas que se apurou terem sido suportadas pela autora por ter decidido contratar um projecto de arquitectura para posterior revenda, e serviços de topografia, e com isso despendendo as quantias apuradas em 17., 18., 21. e 27..
A primeira instância, seguida pelas Apeladas, considerou que tais valores não são ressarcíveis, pois que essas despesas ocorreram por vontade da Autora, não podendo ser assacadas a qualquer acto ou omissão da ré.
Em suma, entendeu-se que o que a ora Apelante decidiu fazer no prédio adquirido apenas a si diz respeito, não tendo qualquer relação com a omissão da ré, o mesmo ocorrendo relativamente aos gastos com luz, com saneamento, com electricidade e com o seguro do imóvel, que considerou tratarem-se “de custos associados à aquisição e manutenção de qualquer imóvel, os quais terão sido realizados em seu benefício”.
Salvo o devido respeito, não podemos concordar com esta visão.
Efectivamente, é uma evidência que foi a autora quem tomou a decisão de realizar as elencadas despesas. Fê-lo, portanto, por vontade própria.
Porém, conforme sublinha nas suas alegações, não podemos olvidar que a Apelante adquiriu o imóvel no âmbito de um processo judicial de execução, tendo consequentemente a fundada expectativa de que tal aquisição a seu favor se manteria e, foi naturalmente imbuída dessa convicção que, após a aquisição, registou o prédio a seu favor, contratou o respectivo seguro (pontos 18. e 20.), contratou os serviços de electricidade, água e saneamento (pontos 22. e 23., realçando-se que nestas facturas consta que se trata de contador de obra), e tomou as iniciativas que, no seu entender de proprietária, sublinhe-se, levariam a uma maior valorização da propriedade que adquirira para posterior revenda, especificamente as relativas à realização de um projecto de arquitectura para melhoramento do prédio misto, cfr. pontos 17. e 31, com as inerentes despesas para a documentação necessária à apreciação do pedido e aos serviços de topografia (pontos 21. e 27.).
Assim, os custos associados à aquisição e manutenção do imóvel, habitualmente realizados em benefício do proprietário, convolaram-se em prejuízos instalados na esfera jurídica da autora quando, sem culpa sua, e na decorrência da procedência da acção de preferência, se viu substituída pelos preferentes, perdendo aquela condição que justificara a realização das despesas.
Ora, conforme acima referido, tanto a doutrina como a jurisprudência têm admitido que o artigo 563.º do CC, consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, o que significa que a omissão ilícita da agente de execução, ora ré, só deixa de ser considerado causa adequada da produção do dano decorrente da realização das despesas que um proprietário diligente tomaria no sentido da manutenção e valorização do imóvel indevidamente adquirido, sem o conhecimento deste e mercê da omissão daquela, quando o comportamento omissivo se revelar de todo indiferente para a produção do dano.
No caso, em face das circunstâncias de facto demonstradas, não se nos afigura que, mesmo numa visão tradicional, se pudesse considerar aquela omissão de todo indiferente para a produção do dano, porquanto a autora só as realizou por ter adquirido indevidamente o imóvel em virtude da falta de comunicação aos preferentes para o exercício do direito e, nessa sequência, actuado como sua proprietária.
Mas, ainda que assim se entendesse, então afigura-se-nos que um olhar sobre as novas perspectivas da responsabilidade civil nos levaria à mesma solução, se pensarmos na perspectiva do nexo de imputação de que desenvolvidamente trata MAFALDA MIRANDA BARBOSA, quando afirma que “o julgador só deve recusar a imputação quando haja prova da efetiva causa do dano ou quando haja prova da elevada probabilidade de que a lesão se teria realizado mesmo sem o desvio na conduta”.
Aplicando o que vimos de dizer ao caso em presença temos que a omissão da ré deu causa à indevida aquisição do imóvel pela autora que, sem qualquer culpa da sua parte, a determinar o funcionamento do artigo 570.º do CC, actuou como proprietária realizando despesas que suportou, na convicção de ter adquirido a seu favor essa qualidade, a qual veio a perder na sequência da procedência da acção de preferência por omissão da devida actuação da ré quanto à comunicação aos preferentes. Portanto, ao omitir o dever profissional que sobre si impendia, permitindo com tal omissão a aquisição por banda da autora, em detrimento dos preferentes, a esfera de responsabilidade da ré abrange ainda as despesas acima referidas, as quais não podem sequer ser qualificadas como alguma especial idiossincrasia da adquirente que agravasse desproporcionalmente a esfera de risco que o comportamento omitido espoletou[18].
Nestes termos, considerando-se que, a acrescer às despesas já consideradas na decisão recorrida (pontos 25. e 26.), a responsabilidade da ré abrange ainda as despesas suportadas pela autora, a que aludem os pontos 17., 18., 20. a 23., 27. e 28., procede parcialmente o recurso, quanto ao valor destas despesas, computado em 24.430,12€, atribuindo-se assim a indemnização global de 34.162,70€ (9.732,58€+24.430,12€).
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III.2.3. - Da litigância de má fé
Insurge-se a Recorrente quanto à sua condenação como litigante de má-fé, invocando, em suma, que não pretendeu qualquer vantagem indevida mas pretende apenas ser ressarcida dos prejuízos que efectivamente teve.
Vejamos.
Dispõe o artigo 542.º, do CPC, para o que releva na apreciação da questão relativa à litigância de má fé, o seguinte:
“1. Tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.

2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; (…)

d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”

Trata-se de norma que reproduz o que anteriormente constava no artigo 456.º do CPC, relativamente ao qual havia já abundante jurisprudência, com entendimento firmado e que continua a ter plena aplicação.
Efectivamente, a redacção do preceito nos termos em que actualmente se encontra, foi introduzida pelo DL n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, “como reflexo e corolário do princípio da cooperação”, visando consagrar “expressamente o dever de boa fé processual, sancionando-se como litigante de má fé a parte que, não apenas com dolo, mas com negligência grave, deduza pretensão ou oposição manifestamente infundadas, altere, por acção ou omissão, a verdade dos factos relevantes, pratique omissão indesculpável do dever de cooperação ou faça uso reprovável dos instrumentos adjectivos”.
Visou-se assim estender a possibilidade de condenação da parte como litigante de má fé, também aos casos de actuação com negligência grave, já que anteriormente se cingia apenas à respectiva actuação dolosa. “O elemento subjectivo é, pois, um pressuposto constitutivo da figura”[19].
Portanto, “com a reforma de 95/96 passou-se a sancionar a litigância temerária (sublinhado nosso) ao lado da litigância dolosa, como integrando o conceito de litigância de má fé.
As partes devem, em obediência ao princípio da sua auto responsabilidade, praticar os actos indispensáveis e idóneos a fundamentar e desenvolver os seus respectivos posicionamentos em termos de adequação ao fim que visam e de não contraditoriedade com a verdade material, assim devendo agir de acordo com a boa fé, expondo os factos em juízo sem formularem pretensões que sabem ser destituídas de qualquer razoável fundamento”[20].
De facto, quer o direito de levar determinada pretensão ao conhecimento do órgão jurisdicional competente, solicitando a abertura de um processo com vista à composição do litígio com emissão de pronúncia final mediante decisão fundamentada, quer o direito de defesa por banda daquele contra o qual a pretensão é deduzida, assenta, dentro do quadro normativo vigente, no respeito por parte daquele que o exerce e daquele que se lhe opõe, dos deveres de probidade e de leal colaboração, de boa fé processual e de recíproca correcção, devidos ao tribunal e à parte contrária, deveres cujo cumprimento e escopo último visam afinal uma pronta, justa e serena aplicação da justiça ao caso concreto. Daí que o legislador tenha entendido, para potenciar a salvaguarda do respectivo cumprimento, sancionar aqueles que adoptam condutas reprováveis à luz daqueles princípios, constituindo o elenco das consagradas no n.º 2 do referido artigo 542.º do CPC, seguramente actuações censuráveis, a merecer reprovação pelos tribunais e que nem sequer estão dependentes do pedido das partes nesse sentido.
Acresce que, a litigância de má fé assenta sobre o comportamento processual das partes, apreciado com base na sua actuação na lide, globalmente considerada, daí que a decisão possa ser alicerçada quer nos factos alegados pelas partes quer ainda em quaisquer outros factos ou actuações que constem dos autos e que evidentemente são do conhecimento das partes podendo consequentemente estas pronunciar-se sobre tal, como ocorreu no caso em apreço e flui da decisão recorrida [21].
Podemos, pois, assentar que, constituindo a má fé um claro limite ao exercício do direito de acção ou de defesa, a conduta das partes só deve ser censurada por via deste instituto quando tenham actuado de forma ilícita em qualquer uma das circunstâncias referidas nas várias alíneas do n.º 2 do art. 542.º do CPC. Por isso que, não se encontram abrangidas pela previsão da norma as meras situações de discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, ou na defesa de uma posição que, ainda assim, não se venha a provar, em virtude de a parte não ter conseguido convencer o tribunal da bondade do invocado.
Inversamente, as condutas que integram tais comportamentos censuráveis a título de dolo ou negligência grave, e de lide considerada temerária, são amiúde alvo de condenação pelos tribunais, confirmadas, mormente pelo Supremo Tribunal de Justiça, extraindo-se dos vários exemplos de condenação o ensinamento de que o incumprimento doloso ou gravemente culposo do dever de cooperação e/ou das regras de boa fé processual, mormente das relativas ao exercício de actividade processual com o conhecimento pela parte de que a mesma é desconforme à verdade material, é sancionado civilmente através do instituto da litigância de má fé[22], sendo exemplo de situações consideradas como de correcta condenação por litigância de má fé pelo STJ aquelas em que: “o Autor, durante quase toda a lide, alterou a verdade acerca dos salários auferidos (…), é de considerar que o mesmo não foi apenas confuso e imprudente; foi temerário, actuando na «cobiça» da indemnização a qualquer título querida”[23].
Ora, extrai-se de todos estes mencionados exemplos o ensinamento de que o incumprimento doloso ou gravemente culposo do dever de cooperação e/ou das regras de boa fé processual, mormente das relativas ao exercício de actividade processual com o conhecimento pela parte de que a mesma é desconforme à verdade material, é sancionado civilmente através do instituto da litigância de má fé.
Assentes estes princípios e enquadrados pelos exemplos que antecedem, voltemos ao caso dos autos para decidir afirmando desde já que, independentemente do desfecho da acção lhe ser parcialmente favorável, a litigância da autora configura claramente uma actuação temerária da sua parte, porque não podia deixar de ter conhecimento da anterior acção e do pedido que ali formulou, repetindo-o parcialmente nesta e “atirando” documentos para os autos para que o tribunal os confrontasse com os anteriores, nunca sequer indicando quais aqueles que repetira quando reduziu o pedido, e escudando-se na mudança de mandatário e na quantidade de documentos juntos, sequer cotejando aqueles que se reportavam a reparações/materiais já pedidos na acção de preferência, e pagos, que manteve pelo menos em grande parte, conforme comprova o facto provado em 24. quase coincidente com o valor da condenação dos adquirentes naquela primeira acção.
Louvamo-nos nesta parte no segmento mais relevante da fundamentação da Senhora Juíza, quando referiu que «a autora, para além de ter inicialmente deduzido pedido global sem correspondência com as parcelas que indicou, o qual corrigiu em sede de audiência prévia, apenas confrontada pelo Tribunal com a existência de eventual litigância de má-fé veio reduzir o pedido, excluindo, precisamente, as verbas relativas a tais despesas.(…)
A justificação que a autora apresenta também não colhe, pois que não é verdade que o mandatário seja diverso, pois, após a sentença proferida, foi o mandatário que agora a representa que formulou o pedido de pagamento dessas despesas (cfr. fls.16 e 400 destes autos).
Donde, concluímos a posição assumida pela autora nos autos excedeu os indicados limites para além dos quais se considera ilegítimo o exercício dos direitos processuais, na medida em que sabia ter sido ressarcida de despesas com a aquisição e com obras realizadas no prédio misto adquirido, omitiu tal ressarcimento e procurou ser ressarcida pela ré pelo mesmo dano.
Ora, em síntese clara do sobredito louvamo-nos no juízo efectuado pelo Supremo Tribunal de Justiça, onde se afirmou que “as partes, recorrendo a juízo para defesa dos seus interesses, estão sujeitas aos deveres de cooperação, probidade e boa fé com o tribunal, visando a obtenção de decisões conformes à verdade e ao Direito, sob pena de a protecção jurídica que reclamam não ser alcançada, no que muito saem desacreditadas a Justiça e os tribunais.
A actuação processual do litigante de boa fé postula uma actuação verdadeira, correcta no tempo e modo processuais, não se compadecendo com subterfúgios e meias verdades, que mais não visam senão uma egoísta defesa de posições próprias que, prejudicando o opositor, acabam por não conduzir o tribunal à célere e correcta percepção da realidade.
Uma das condutas em que se exprime a litigância de má fé consiste na alegação, voluntária e consciente, de factos que seriam relevantes para a decisão da causa, mas que a parte sabe que, ao alegar como alega, desvirtua a realidade por si conhecida, visando, por isso, intencionalmente um objectivo censurável. (…)
Se é certo que o direito de recorrer aos tribunais para aceder à justiça constitui um direito fundamental – art. 20.º da CRP – já o mau uso desse direito implica uma conduta abusiva, sancionada nos termos do art. 456.º do CPC”[24].
Assim, à luz do preceito legal supra citado e dos ensinamentos retirados dos referidos arestos do Supremo Tribunal de Justiça, a outra conclusão não se pode chegar do que àquela que levou a Senhora Juíza à condenação da Autora como litigante de má fé, ou seja, que a mesma omitiu parcialmente a verdade de factos essenciais, que eram evidentemente do respectivo conhecimento, tudo fazendo com o fito de tentar obter também da ré indemnização que já havia recebido, actuação que se reputa inaceitável em face da lisura e probidade processual que a lei impõe às partes, visando a descoberta da verdade material e a justa-composição do litígio.
Desta sorte, conclui-se que a Autora foi, e bem, condenada como litigante de má-fé, em montante que reputamos igualmente adequado, posto que, de acordo com o disposto no artigo 27.º, n.º 3, do Regulamento das Custas Processuais, a multa deve ser fixada entre 2 e 100 unidades de conta, tendo sido fixada em 5 UC´s, portanto mais próximo do mínimo que do máximo que, aliás, não contempla a multa correspondente a 1 UC, preconizada pela Apelante.
Nestes termos, improcede a pretensão da Recorrente quanto à revogação da respectiva condenação como litigante de má-fé.

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III.2.4. - Da responsabilidade tributária
Atento o princípio da causalidade vertido no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, e o preceituado no artigo 529.º, n.ºs 1 e 4, ambos do CPC, as custas em primeira instância e as custas de parte do recurso, deverão ser suportadas pelas partes, na proporção do respectivo decaimento. Porém, beneficiando a Ré de apoio judiciário, não terá que suportar a parte correspondente.
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III.3 Síntese conclusiva
I - A responsabilidade civil delitual assacável à ré assenta na omissão por banda desta de um comportamento profissional devido, em concreto, da comunicação aos titulares do direito de preferência na aquisição do imóvel, do projecto de venda e respectivas condições, que motivou a procedência da acção por estes intentada contra a autora para se lhe substituírem na posição de adquirentes.
II - Se a Agente de Execução tivesse levado a cabo o comportamento devido, o mesmo é dizer o comportamento lícito alternativo à ilícita omissão daquele, ou seja, a oportuna comunicação para o exercício do direito de preferência que os titulares do direito vieram exercer judicialmente, nunca a autora teria adquirido o imóvel, pelo que, caso a ré tivesse cumprido com o dever omitido, nunca se constituiria na esfera jurídica da Autora a possibilidade da venda do imóvel com lucro, e tanto sempre bastaria para a improcedência da pretensão indemnizatória fundada quer em lucro cessante quer em perda de chance.
III - O artigo 563.º do CC, consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, o que significa que a omissão ilícita da agente de execução, ora ré, só deixa de ser considerada causa adequada da produção do dano decorrente da realização das despesas que um proprietário diligente tomaria no sentido da manutenção e valorização do imóvel indevidamente adquirido, sem o conhecimento deste e mercê da omissão daquela, quando o comportamento omissivo se revelar de todo indiferente para a produção do dano.
IV - No caso em presença, a omissão da ré deu causa à indevida aquisição do imóvel pela autora que, sem qualquer culpa da sua parte, a determinar o funcionamento do artigo 570.º do CC, actuou como proprietária, realizando despesas que suportou, na convicção de ter adquirido a seu favor essa qualidade, a qual veio a perder na sequência da procedência da acção de preferência por omissão da devida actuação da ré quanto à comunicação aos preferentes.
V - Portanto, ao omitir o dever profissional que sobre si impendia, permitindo com tal omissão a aquisição por banda da autora, em detrimento dos preferentes, a esfera de responsabilidade da ré abrange ainda as despesas acima referidas, as quais não podem sequer ser qualificadas como alguma especial idiossincrasia da adquirente que agravasse desproporcionalmente a esfera de risco que o comportamento omitido espoletou.
VI - Justifica-se a condenação da autora como litigante de má fé, se a mesma omitiu parcialmente a verdade de factos essenciais, que eram evidentemente do respectivo conhecimento, com o fito de tentar obter também da ré indemnização que já havia recebido parcialmente na acção de preferência.
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IV - Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, na parcial procedência da apelação, em revogar parcialmente a sentença, condenando a ré a pagar à autora a indemnização global de 34.162,70€ (trinta e quatro mil, cento e sessenta e dois euros e setenta cêntimos), no mais confirmando a decisão recorrida.
Custas pela Autora e Ré, na proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo quanto à ré do benefício de apoio judiciário que lhe foi concedido.
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Évora, 24 de Outubro de 2019
Albertina Pedroso [25]
Tomé Ramião
Francisco Xavier
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[1] Juízo Central Cível de Faro, Juiz 3
[2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Tomé Ramião; 2.º Adjunto: Francisco Xavier.
[3] Notificada para o efeito, a autora respondeu à invocada excepção, concluindo pela sua improcedência.
[4] Doravante abreviadamente designado CPC, na redacção introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.
[5] Proferido no processo n.º 69/15.3T8ALR-A.E1, disponível em www.dgsi.pt, dando conta da divergência a respeito, com indicação da pertinente doutrina e jurisprudência ali mencionada.
[6] Para mais desenvolvimentos sobre as posições defendidas a este respeito na jurisprudência e na doutrina, cfr. a síntese efectuada por PEDRO EDGAR MINEIRO, in A Responsabilidade Civil pelo Exercício da Função de Agente de Execução, Almedina 2017, págs. 75 e ss.
[7] In Balanço da reforma da acção executiva: Benefícios e desvantagens da alteração do paradigma da Acção Executiva, Sub Judice, 29, pág. 32, citado na obra anteriormente referida.
[8] Evidenciando a obrigatoriedade legal de contratação pelo agente de execução do seguro de responsabilidade civil profissional.
[9] No entender do Professor ANTUNES VARELA, in Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, pág. 478, entendimento que é maioritariamente seguido. Já o Professor PESSOA JORGE, in Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, Coimbra 1995, pág. 55, reduz esses mesmos pressupostos a dois: acto ilícito e prejuízo reparável.
[10] Cfr. ANTUNES VARELA, obra citada, págs. 486 a 497.
[11] No dizer de GALVÃO TELES, in Direito das Obrigações, 7ª edição, revista e actualizada, 1997, pág. 346.
[12] Vd. MENEZES LEITÃO, in Direito das Obrigações, I, 8ª edição, 2009, pág. 313; MENESES CORDEIRO, Direito das Obrigações, 2º volume, AAFDL, 1990, pág. 309.
[13] Cfr. ANTUNES VARELA, obra citada, págs. 394 e 395.
[14] Idem, pág. 651 e ss..
[15] Cfr. Código Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, pág. 548.
[16] Cfr., com interesse a este respeito o Estudo de RUTE TEIXEIRA PEDRO, intitulado “Reflexões sobre a noção de Perda de Chance à Luz da Jurisprudência, pág. 183 e ss., publicado pelo CEJ, no e-book “Novos Olhares sobre a Responsabilidade Civil”, edição actualizada em Setembro de 2019.
[17] Cfr. para maior desenvolvimento a respeito da relevância do comportamento lícito alternativo, o seu Estudo intitulado “Do nexo de causalidade ao nexo de imputação”, pág. 66 e ss. do citado e-book.
[18] Cfr. neste sentido, autora e local citado, pág. 68.
[19] Cfr. PEDRO DE ALBUQUERQUE, in Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo, Almedina 2006, pág. 92.
Sobre este ponto, vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ, ABUSO DO DIREITO DE ACÇÃO E CULPA “IN AGENDO”, 2006, ALMEDINA, nomeadamente páginas 65 e ss.
[20] Cfr. Ac. STJ de 30-06-2011, Revista n.º 1103/08.9TJPRT.P1.S1 - 2.ª Secção, com sumário disponível no sítio www.stj.pt, Sumários de Acórdãos, do qual constam ainda todos os sumários de acórdãos que se irão referir sem outra menção de fonte.
[21] Ac. STJ de 26-04-2012, Agravo n.º 81-E/1999.S1 - 7.ª Secção.
[22] Cfr. a título exemplificativo o Ac. STJ 09-03-2010, Revista n.º 420/08.2TBFVN.C1.S1 - 6.ª Secção.
[23] Ac. STJ de 30-06-2011, Revista n.º 1103/08.9TJPRT.P1.S1 - 2.ª Secção.
[24] Ac. STJ 09-03-2010, Revista n.º 420/08.2TBFVN.C1.S1 - 6.ª Secção.
[25] Texto elaborado e revisto pela Relatora.