Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
922/15.4T8PTM.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
DENÚNCIA CALUNIOSA
BOM NOME
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Os incómodos, as dores, os custos que implica a situação de ser arguido num processo-crime são consequência do próprio processo e não de ter sido o mesmo instaurado por quem pensava ter razões fundadas para isso.
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 922/15.4T8PTM.E1

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

(…) e (…) intentaram a presente ação comum contra (…) e mulher (…) e (…), com fundamento em responsabilidade civil por prejuízos decorrentes de ofensa ao seu bom nome, fundamentalmente, por promoção de processo penal infundado contra si instaurado (e que veio a terminar por decisão de não pronúncia).
Pediram que fossem os RR. condenados a pagar solidariamente às AA. as seguintes quantias:
a) À A. (…) e a título de danos não patrimoniais, quantia não inferior a € 120.000,00;
b) À A. (…) e a título de danos não patrimoniais, quantia não inferior a € 130.000,00,
tudo com o acréscimo do pagamento dos juros de mora, contabilizados à taxa legal, a contar da citação, bem como nos juros vincendos até integral pagamento.
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Os RR. (…) e mulher (…) contestaram, defendendo a improcedência da acção, e deduziram o seguinte pedido reconvencional (com fundamento na circunstância de a dedução da presente ação pelas AA. lhes causar danos, nomeadamente ao nível de angústia e ansiedade que daí decorreram para si, obrigando-os a tomar medicação): que fossem as autoras condenadas, solidariamente, a pagar aos réus a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros, até efetivo e integral pagamento, assim discriminada:
- a título de danos não patrimoniais já sofridos pela ré (…): um valor não inferior a € 30.000,00;
- a título de danos não patrimoniais já sofridos pelo réu (…): um valor não inferior a € 20.000,00.
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O R. (…) contestou pugnando igualmente pela improcedência da ação.
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Depois de realizado o julgamento, foi proferida sentença que absolveu todas as partes dos pedidos contra si formulados.
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Desta sentença recorrem as AA. impugnando a matéria de facto bem como a solução de direito.
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O R. (…) contra-alegou defendendo que a impugnação da matéria de facto deve ser rejeitada e o recurso julgado improcedente.
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Começando por esta última questão, temos de concordar com o recorrido.
Com efeito, as recorrentes indicam o início e fim da gravação de cada depoimento sem que se faça qualquer indicação quanto às partes concretas e específicas do depoimento que entendem ser relevantes. Por exemplo, informam (e não é mais do que isto, uma informação) que a testemunha (…) prestou depoimento que se registou entre 00:00:00 a 01:05:30, numa dada sessão de julgamento. Da mesma forma, e ainda como exemplo, informam que as declarações da A. (…) «se encontram registadas em suporte técnico/aplicação informática/Sistema Habilus Media Studio de 00:00:01 a 00:21:57 e de 00:00:01 a 00:36:02 da ata de audiência de julgamento do dia 22.06.2017, com continuação em 07.09.2017, conforme respetiva ata e registo em suporte técnico/aplicação informática/Sistema Habilus Media Studio de 00:00:00 a 01:51:59». Mas isto é já o que consta das actas de julgamento.
E não é isto o que a lei exige no art.º 640.º, n.º 2, al. a), Cód. Proc. Civil. Como se escreve no acórdão da Relação de Coimbra, objecto de revista no recente ac. do STJ, de 18 de Junho de 2019 (que o confirmou também quanto a este aspecto): «Note-se que ao referir-se a “concretos meios probatórios” a lei está a colocar a exigência de que se alegue o porquê da discordância, que se apontem as passagens precisas dos depoimentos que fundamentam a concreta divergência, que se explique em que é que os depoimentos contrariam, ou são insuficientes, para a conclusão factual do tribunal recorrido».
Por outro lado, a transcrição da quase totalidade dos depoimentos, sem que se esclareça para que factos eles hão-se servir para alterar as respostas do tribunal e sem que se citem as passagens que interessam concretamente, não cumpre a determinação da lei pois que o que esta exige é que se proceda à «transcrição dos excertos que considere [o recorrente] relevantes» (do citado preceito legal). A reprodução integral ou quase dos depoimentos é incumprimento do ónus imposto no mesmo artigo.
A consequência é que o recurso sobre a impugnação da matéria de facto deve ser rejeitado, sem que haja lugar a convite ao aperfeiçoamento.
Pelo exposto, rejeita-se o recurso nesta parte.
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A matéria de facto é a seguinte:
1- Os RR. (…) e (…) são emigrantes em Caracas, Venezuela.
2- A R. (…) é irmã da arguida (…).
3- Os RR. (…) e (…) decidiram investir na aquisição de imóveis em Portugal, e bem assim na construção de edifícios para venda das respetivas frações, com vista a obter um lucro.
4- Para tanto, e porque não residiam em Portugal, concederam poderes à A. (…), nos termos que adiante se mencionarão, tendo esta mais tarde, e nomeadamente, feito uso desses poderes para, entre outros, mandar proceder à construção de dois edifícios, o Edifício (…) e o Edifício (…), em prédios adquiridos para esse efeito.
5- Para a compra de prédios, para a construção dos edifícios, e aplicação de valores, os RR. (…) e (…) realizam transferências de valores pecuniários para a conta bancária nº (…) titulada pela R. (…) no banco (…), e para a conta nº (…) titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda. no banco (…).
6- Os valores transferidos para a conta nº (…) e titulada pela R. (…) no banco (…), no período que mediou entre 21 de Setembro de 1995 e 20 de Julho de 2001, ascenderam a € 786.728,54.
7- E, os valores assim transferidos para a conta nº (…) titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda. no banco (…), no período que mediou entre 31 de Janeiro de 2002 e 7 de Abril de 2003 ascenderam a € 222.365,55.
8- A 16 de Agosto de 1990, no Cartório Notarial de Ribeira Brava, foi lavrada procuração, na qual os ora RR. (…) e (…) declararam constituir sua procuradora a ora A. (…), conferindo-lhe “os poderes, com os substabelecer”, para – entre o mais – “reger e gerir com livre e geral administração civil todos os seus bens, direitos e acções “, “comprar”, “promover todos e quaisquer actos de Registo Predial”,” movimentar contas ao abrigo do sistema de Poupança-emigrante”, “depositar e levantar dinheiro em Bancos”, “assinando os necessários cheques”, e “representá-los em quaisquer Repartição Públicas”.
9- A 27 de Outubro de 1995, no Segundo cartório Notarial de Faro, foi outorgada escritura pública de compra e venda, em que interveio como segunda outorgante a ora A. (…), como procuradora da R. (…) e na qual a A. (…) declarou aceitar a venda à sua representada, pelo preço de 7.500.000$00 (€ 37.409,84), do prédio rústico sito em (…), freguesia de Tunes, concelho de Silves, inscrito na matriz respetiva sob o artigo (…) da Secção (…), e descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/040188, freguesia de Tunes.
10- A 9 de Novembro de 1998, no Segundo Cartório Notarial de Loulé foi celebrada escritura pública de contrato de sociedade, em que foram outorgantes … (também irmã da R. … e da A. …), e as ora AA. (…) e (…), esta última procuradora da ora R. (…), e onde as outorgantes declararam celebrar um contrato de sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com a denominação “Construções (…) e (…), Lda.”.
11- A sociedade Construções (…) e (…), Lda., teve como sócias a R. (…), (…) e a A. (…), sendo que a gerência ficou a cargo de todas as sócias.
12- A 1 de Março de 1999, na Chancelaria do consulado Geral de Portugal em Caracas, Venezuela, os RR., (…) e (…), outorgaram “Procuração Pública” declarando constituir sua bastante procuradora a ora A. (…), advogada, a quem, com a faculdade de substabelecer, conferiram poderes para em nom e deles mandantes e pelos preços, termos e condições que entendesse por convenientes, outorgar “escritura pública de constituição de regime de propriedade horizontal do edifício construído sobre o prédio rústico, sito em (…), freguesia de Tunes, concelho de Silves, e descrito na (…), conferindo lhe ainda poderes para, em nome deles mandantes, e pelos preços e condições que entendesse, vender as frações autónomas do edifício construído sobre esse prédio, conferindo-lhe ainda poderes para os representar perante quaisquer Repartições Públicas, e de um modo geral para os representar em todos os assuntos necessários ao bom e integral cumprimento desse mandato, o que aliás foram os únicos serviços que lhe foram solicitados, no que se reporta ao mandato em causa.
13- No referido prédio descrito sob o nº …/040188 veio a ser construído um edifício denominado “Edifício (…)”, constituído por 8 (oito) frações autónomas, designadas pelas letras A, B, C, D, E, F, G, e H, tendo a constituição de propriedade horizontal sido inscrita no respetivo registo a 15 de Abril de 1999, sempre sobre a administração direta da A. (…), a qual se dedicava a tempo inteiro a tal atividade e também, por vezes, pelo R. (…), quando se encontrava em Portugal.
14- As escrituras públicas de venda de oito frações do Edifício (…) foram realizadas no período compreendido entre 28 de Junho de 1999 e 30 de Março de 2000.
15- Assim, a 2 de Novembro de 1999, no Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante o Dr. (…), na qualidade de procurador substabelecido dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou, em nome dos seus representantes, vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de 13.500.000$00 (€ 67.337,72) já recebido, a fração autónoma designada pela letra A daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº …/040188.
16- A 8 de Novembro de 1999, no Cartório Notarial de Ourique, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…), e onde aquela declarou vender à outorgante (…), pelo preço de 7.000.000$00 (€ 34.915,85) que os seus representados já receberam, a fração autónoma designada pela letra B daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº …-B, Tunes.
17- A 7 de Julho de 1999, no Cartório Notarial de Silves, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos ora RR. (…) e (…), e onde aquela declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de 15.300.000$00 (€ 76.316,08), já recebidos, a fração autónoma designada pela letra C daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
18- A 7 de Julho de 1999, no Cartório Notarial de Silves, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos ora RR. (…) e (…), e onde aquela declarou, em nome dos seus representantes, vender ao outorgante (…), pelo preço de 17.000.000$00 (€ 84.795,64), já recebidos, a fração autónoma designada pela letra D daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
19- A 8 de Novembro de 1999, no Cartório Notarial de Ourique, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos ora RR. (…) e (…), e onde aquele declarou vender à outorgante (…), pelo preço de 7.000.000$00 (€ 34.915,85) que os seus representantes já receberam, a fração autónoma designada pela letra E daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
20- A 28 de Junho de 1999, no Cartório Notarial de Loulé, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de 11.500.000$00 (€ 57.361,76), que já recebeu, a fração autónoma designada pela letra F daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
21- A 12 de Outubro de 199, no Cartório Notarial de Olhão, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou, em nome dos seus representantes, vender ao outorgante (…), pelo preço de 14.500.000$00 (€ 72.325,70), já recebido, a fração autónoma designada pela letra G daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/040188.
22- A 30 de Março de 2000, no Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante (…), na qualidade de procurador substabelecido dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou, em nome dos seus representantes, vender à outorgante (…), pelo preço de 15.500.000$00 (€ 77.313,67), já recebido, a fração autónoma designada pela letra H daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/040188.
23- O total do valor dos preços declarados naquelas escrituras ascendeu a € 505.282,277 (resposta aos artºs 23º da p.i. e 13º e 18º da contestação dos RR. … e …).
24- A 25 de Julho de 1995, foi aberta a conta bancária nº (…), no banco (…), agência de Albufeira, titulada pelos RR. (…) e (…), e como procuradora a A. (…), a qual foi removida apenas a 25 de Novembro de 2010.
25- A 9 de Julho de 1999, foi aberta a conta bancária nº (…), no (…), titulada pela R. (…), com o depósito, nessa data, de numerário 28.000.000$00, sendo que esse depósito foi efetuado pela autora (…), com procuração.
26- O valor da venda da fração A (13.500.000$00) do Edifício (…) foi depositado no banco (…), conta nº (…), a 8 de Novembro de 1999.
27- O valor percebido com a venda da fração B do Edifício (…) foi de 13.500.000$00, e foi depositado no banco (…), conta nº (…), a 12 de Novembro de 1999.
28- O valor real percebido com a venda da fração C do Edifício (…) foi de 15.300.000$00 e foi depositado no banco (…).
29- O valor real percebido com a venda da fração D foi de 17.000.000$00 e foi depositado no banco (…).
30- O valor real percebido com a venda da fração E do Edifício (…) foi de 13.640.000$00, do qual foram depositados 5.640.000$00, a 18 de Agosto de 1999, na conta nº (…) aberta no banco (…).
31- O valor real percebido com a venda da fração F do Edifício (…) foi de 13.500.000$00, e o mesmo foi objeto de depósito de 1.000.000$00 a 7 de Junho de 1999, de 2.150.000$00 a 30 de Junho de 1999 e de 10.350.000$00 a 30 de Junho de 1999, todos na conta (…) aberta no banco (…).
32- O valor real percebido com a venda da fração G do Edifício (…) foi de 14.500.000$00, o qual foi depositado a 14 de Outubro de 1999 na conta nº (…) aberta no banco (…).
33- O valor real percebido com a venda da fração H do Edifício (…) foi de 15.500.000$00, o qual foi depositado a 4 de Abril de 1999 na conta nº (…) aberta no banco (…).
34- Os valores reais percebidos com as vendas das frações do Edifício (…) ascenderam a 116.440.000$00 (€ 580.800,27).
35- Entre Junho de 1999 e Março de 2000 foram depositados mais de 123.259.000$00 (€ 614.813,29) na conta nº (…) aberta no banco (…) e 28.000.000$00 (€ 139.663,41) na conta bancária (…) aberta no (…).
36- A 23 de Maio de 1996, no Cartório Notarial de Lagoa, foi celebrada escritura pública, outorgada também pela ora A. (…), em representação da R. (…), tendo a A. (…) declarado aceitar a venda para a sua mandante, pelo preço de 18.000.000$00 (€ 89.783,62) do prédio misto sito em Tunes, concelho de Silves, inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo (…) da secção (…), e na matriz predial urbana sob o artigo (…), não descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves.
37- Veio a ser desanexado deste prédio um outro urbano, que corresponde à descrição nº (…)/20020906, da Conservatória do Registo Predial de Silves, freguesia de Tunes, com a inscrição do respetivo direito de propriedade a favor da R. (…), pela Ap. …/19980605.
38- Neste prédio foi erguido o denominado “Edifício (…)”, constituído em propriedade horizontal.
39- A 19 de Setembro de 2001, os RR. (…) e (…) outorgaram procuração, tendo declarado constituir sua bastante procuradora a ora A. (…), a quem com a faculdade de substabelecer conferiram poderes para em nome deles mandantes e pelos preços, termos e condições que entender por convenientes, outorgar escritura pública de constituição em regime de propriedade horizontal do edifício construído sobre o prédio misto, na freguesia de Tunes, concelho de Silves, inscrito na respetiva matriz cadastral sob o artigo nº (…), secção … (Silves) e na respetiva matriz urbana sob o artigo nº (…), descrito na competente Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…); a quem conferiram ainda poderes para, em nome deles mandantes e pelos preços e condições que entender convenientes, vender as respetivas frações autónomas do prédio identificado outorgar as respetivas escrituras públicas, bem como os seus contratos-promessa; a quem conferiram também poderes para representar os mandantes perante quaisquer Repartições Públicas, e de um modo geral para os representar em todos os assuntos necessários ao bom e integral cumprimento desse mandato.
40- A A. (…) veio a proceder à venda de nove frações do denominado “Edifício (…)”.
41- (…) veio a proceder à venda de duas frações do denominado “Edifício (…)”.
42- As escrituras de compra e venda outorgadas pela A. (…) e pelo (…) realizaram-se entre Setembro de 2002 e Março de 2003.
43- A 21 de Março de 2003, no segundo Cartório Notarial de Loulé, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…), e onde aquela declarou vender ao outorgante (…), pelo preço global de € 74.819,69, já recebido, a fração autónoma identificada pela letra C e a fração autónoma identificada pela letra T, daquele prédio urbano sito em Tunes-Gare descrito sob o nº (…).
44- A 26 de Junho de 2000, a A. (…) havia subscrito, em representação dos RR. (…) e (…), contrato-promessa de compra e venda sobre aquela fração T, com o adquirente (…), tendo ali sido ajustado o preço de esc. 18.000.000$00 (€ 89.783,62).
45- Para pagamento da parte do preço de aquisição dessas frações designadas pelas letras C e T, foi feito um pagamento de 2.000.000$00 e emitidos os cheques nº (…), no valor de esc. 2.000.000$00, e nº (…), no valor de € 59.855,75, ambos sacados sobre a conta nº (…), titulada por (…) no banco (…) a 26 de Setembro de 2000 e depositado na referida conta nº (…), no banco (…), e tendo o segundo sido depositado a 24 de Março de 2003 a benefício da R. (…) na conta off-shore (…), titulada pelo Banco (…).
46- A 14 de Janeiro de 2003, no Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…) e onde aquela declarou, em nome dos seus representantes, vender ao outorgante (…) pelo preço de € 62.350,00, já recebido do comprador, a fração autónoma designada pela letra E daquele prédio urbano descrito na Conservatória Predial de Silves sob o nº (…)/20020906.
47- O preço real percebido com a venda da fração E do Edifício (…) foi de € 97.265,00, que foi depositado a 16 de Janeiro de 2003 na conta (…) titulada pela sociedade de Construções (…) e (…), Lda., no banco (…).
48- Esse preço foi pago mediante o cheque nº (…), no valor de € 62.350,00, datado de 14 de Janeiro de 2013, sacado sobre a conta (…), titulada por (…), no banco (…), o qual foi depositado na conta nº (…) titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda. no banco (…) e o cheque nº (…), no valor de € 34.915,00, depositados na mesma conta nº (…) titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda. no banco (…).
49- A 26 de Setembro de 2002, no Cartório Notarial de Ourique, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…) e onde aquela declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de € 78.560,67 que os seus representantes já receberam, a fração autónoma designada pela letra F daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
50- A 10 de Dezembro de 2002, no Cartório Notarial de Silves, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…) e onde aquela declarou vender à outorgante (…), pelo preço de € 79.807,06, já recebido, a fração autónoma designada pela letra G daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
51- O preço declarado da venda da fração G, € 79.807,06, foi depositado a 12 de Dezembro de 2002 na conta nº (…), titulada pela sociedade de Construções (…) e (…), Lda., no banco (…).
52- A 30 de Setembro de 2002, perante o ajudante principal do Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante (…), na qualidade de procuradora substabelecido dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou, em nome dos seus representados, vender ao outorgante (…), pelo preço de € 72.325,00, já recebido, a fração autónoma designada pela letra I daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/20020906.
53- A 30 de Setembro de 2002, perante o ajudante principal do Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante (…), na qualidade de procurador substabelecido dos RR. (…) e (…) e onde aquele declarou, em nome dos seus representados, vender à outorgante (…), pelo preço de € 72.325,00, já recebido, a fração autónoma designada pela letra L daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/20020906.
54- A 23 de Janeiro de 2003, no Cartório Notarial de Loulé, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos ora RR. (…) e (…) e onde aquela declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de € 79.807,66, já recebido, a fração autónoma designada pela letra M daquele prédio urbano sito em Tunes-Gare, descrito sob o nº (…).
55- O preço real percebido pela venda da fração M foi de € 97.265,58.
56- Para pagamento da parte do preço a respeito da aquisição da fração M, foram utilizados os cheques nº (…), no valor de € 79.807,66, sacado sobre conta titulada no banco (…), que foi depositado a 24 de Janeiro de 2003 na conta nº (…), titulada pela sociedade (…) e (…), Lda. no banco Banif, e o cheque nº (…), no valor de € 17.457,92, e que foi depositado a 24 de Janeiro de 2003 na conta nº (…), titulada pela sociedade (…) e (…), Lda. no banco (…).
57- A 14 de Janeiro de 2003, no Cartório Notarial de Albufeira, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…) e onde aquela declarou, em nome dos seus representantes, vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de € 69.830,00, já recebido, a fração autónoma designada pela letra P daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº …/20020906.
58- Para pagamento do valor real acordado para aquisição da fração P foi utilizado o cheque nº (…), no valor de € 94.772,00, datado de 14.01.2003, sacado sobre a conta nº (…), titulada por (…) no Crédito Predial Português, o qual foi depositado na conta nº (…) titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda. no Banco (…).
59- A 11 de Fevereiro de 2003, no Primeiro Cartório Notarial de Loulé, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…) e onde aquela declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de € 78.000,00, já recebido, a fração autónoma designada pela letra R daquele prédio urbano sito em Tunes-Gare, descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…)/20020906.
60- Para pagamento do preço real acordado para a fração R foi utilizado o cheque nº (…), no valor de € 97.265,59, o qual foi depositado a 13 de Fevereiro de 2003 na conta nº (…), titulada pela sociedade Construções (…) e (…), Lda., no banco (…).
61- A 26 de Setembro de 2002, no Cartório Notarial de Ourique, foi lavrada escritura pública, na qual foi outorgante a A. (…), na qualidade de procuradora dos RR. (…) e (…), e onde aquele declarou vender aos outorgantes (…) e (…), pelo preço de € 78.560,67 que os seus representados já receberam, a fração autónoma designada pela letra S daquele prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Silves sob o nº (…).
62- Os valores reais percebidos com as vendas das frações I e L do Edifício (…) foram € 92.277,61 e € 92.277,61, respetivamente, valores que foram depositados a 7 de Outubro de 2002 na conta nº (…), titulada pela sociedade “Construções (…) e (…), Lda.” no Banco (…).
63- Os valores reais percebidos com as vendas das frações S e F do Edifício (…) foram € 94.771,60 e € 92.277,61, valores que foram depositados a 30 de Setembro de 2002 na conta nº (…). titulada pela sociedade “Construções (…) e (…), Lda.” no Banco (…).
64- Os valores totais percebidos pela venda das frações por parte da A. (…) e por (…) ascenderam a não menos de € 927.763,28.
65- O custo de construção das frações A, B, C, E e F do Edifício (…) sito em Tunes foi de € 27.607,90 cada e o das frações D, G e H foi de € 37.350,08 cada, o que perfaz um valor de € 250.089,72 euros.
66- Até 18 de Junho de 2003, detinham poderes de movimentação da referida conta bancária nº (…) titulada pela sociedade “Construções (…) e (…), Lda.”, a R. (…), a A. (…) e a irmã destas, (…), na qualidade de procuradoras.
67- A partir de 18 de Junho de 2003, a referida conta bancária nº (…) titulada pela sociedade “Construções (…) e (…), Lda.”, passou a ser movimentada apenas por (…), na qualidade de procurador.
68- Aquando da construção do primeiro prédio, era a A. (…) quem promovia a venda das frações, definia os preços e todas as demais condições relativas ao negócio, pois era a pessoa que tratava com repartições públicas, técnicos, trabalhadores, prestadores de serviços, efetuava as compras, bancos, lidava com o contabilista e comparecia nas escrituras, sendo que a A. (…) procedia apenas à instrução dos processos e assinava as mesmas, e aquela, A. (…), recebia os respetivos preços e depositava na conta bancária.
69- À data existia uma sociedade informal entre as três irmãs, (…), (…) e (…), no pressuposto que a R. (…) e seu marido, o R. (…), seriam os sócios de capital, pois entravam com dinheiro para o negócio e (…) e (…) eram sócias apenas de trabalho, tendo sido acordado que a divisão dos lucros seria na proporção dos mesmos: 70% para a R. (…) e 15% para cada uma das restantes irmãs.
70- Mais tarde, em 09.11.1998, veio a ser constituída a firma “Construções (…) e (…), Lda.”.
71- O preço das oito frações vendidas do primeiro prédio construído, foi na sua totalidade depositado em duas contas bancárias, de que a R. (…) era titular, uma junto do Banco (…), agência de Silves, com o nº (…) e outra junto do Banco (…), agência de Albufeira, com o nº (…).
72- Posteriormente à venda das frações do 1º edifício, os 1º e 2º RR. manifestaram à A. (…) e a sua irmã (…) a intenção de que, ao invés de dividirem os lucros dessa venda, fosse transferido o dinheiro que à data se encontravam nas referidas contas do (…) e (…), em nome da R. (…), para a conta da firma “(…) e (…), Lda.”, para que esta procedesse ao reinvestimento daqueles proveitos, que ao invés de serem divididos entre as sócias, serviriam (como serviram) para a compra do prédio misto, sito também na freguesia de Tunes, concelho de Silves, e descrito na conservatória do registo predial sob o nº (…), onde se projetava construir novo edifício.
73- A A. (…) foi a pessoa que tratou da construção e comercialização deste novo prédio, desta feita composto por 18 apartamentos e 8 garagens.
74- E foi a A. (…) quem providenciou pela constituição em propriedade horizontal do prédio, organizou e preparou toda a documentação para outorga das respetivas escrituras de venda, procedendo à sua outorga, sempre sob as ordens e com a presença da A. (…), a qual administrava todo o negócio, incluindo os preços e respetivo recebimento.
75- As 11 frações vendidas do Edifício (…) tiveram um custo total de construção de € 364.773,61, valor este distribuído, de forma discriminada pelas onze frações como segue:
- a primeira, denominada pela letra “C”, com uma área (coberta) de 89,54 m2, com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “E”, com uma área de 89,54 m2, tem um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “F”, com uma área de 78,64 m2, tem um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “G”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção de € 441,08 por m2, perfazendo um total de 42.645,61 euros;
- a fração denominada pela letra “I”, tem uma área de 81,14 m2, com um custo de construção de € 441,08 por m2, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “L”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “M”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção de € 441,08 por m2, perfazendo um total de € 34.925,93;
- a fração denominada pela letra “P”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “R”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “S”, tem uma área de 88,14 m2, com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 34.925,93 euros;
- a fração denominada pela letra “T”, com uma área de 21,60 m2 (garagem), com um custo de construção por m2 de € 441,08, perfazendo um total de 7.794,63 euros.
76 - Nunca foram prestadas contas pelas autoras aos réus, os quais a partir do final do ano de 2002 receberam 3 transferências por parte das autoras, nomeadamente, uma no valor € 70.000 euros, outra no valor de € 97.265,58 euros e a terceira, no valor € 30.000 euros.
77- O produto das vendas das escrituras outorgadas até Março de 2003 e relativas às frações do 2º prédio então construído foram depositados na identificada conta bancária junto do (…), cujo titular era a sociedade (…) e (…), Lda., sendo que as três irmãs (…, … e …) estavam autorizadas a movimentá-la.
78- A R. (…) tinha acesso, em termos de movimentação e consulta, às contas do (…), (…) e (…).
79- Todas as contas bancárias eram, fruto das procurações emitidas pelos réus (…) e (…) a favor das autoras, livremente movimentadas pelas AA., quer através de transferências bancárias, quer através de cheques, sendo que houve dinheiro transferido para as contas bancárias da ré (…), mas o dinheiro saía livremente também para a conta da autora (…).
80- A outorga de nova procuração referida em 39 destes factos provados, devera-se ao facto de nessa altura ainda não existir o clima de desconfiança posteriormente sentido pela ré (…) relativamente às restantes sócias da sociedade, suas irmãs, em quem confiava.
81- A última escritura outorgada pela A. (…) ocorreu em 21.03.03, uma vez que A. (…) e sua irmã (…), respetivamente em 27.01.03 e 31.03.03 transferiram da conta existente junto do (…) em nome da firma (…) e (…), Lda., para as suas contas pessoais, o valor de € 95.000,00 cada uma, por conta da repartição de lucros a efetuar, uma vez que entenderam que os 1º e 2º RR. vinham protelando no tempo tal situação.
82- A quebra de confiança entre a A. (…) e sua irmã, (…), por um lado, e os RR. (…) e (…), por outro, ocorreu quando a A. (…) e sua irmã (…), temendo chegar a uma situação em que não restasse nada para dividir, conforme já havia acontecido aquando da construção do 1º imóvel, procederam ao levantamento de € 95.000,00 cada uma, sendo que os 1º e 2º RR. sempre quiseram a devolução desses € 95.000,00 retirados por cada uma das outras sócias (… e …).
83- Nessa altura os RR. (…) e (…) decidiram revogar as procurações conferidas às AA. em 16.08.90 e 19.09.01, o que ocorreu em 05.05.2003.
84- Um relatório contabilístico pedido pelos RR. (…) e (…), a respeito dos extratos das contas bancárias referidas nos autos, manifestou que em depósitos referentes a escrituras públicas de imóveis, os valores que entraram nas referidas contas foram de 1.116.707,83 euros.
85- Pela disparidade dos preços escriturados e dos preços de facto pagos pelas frações do Edifício (…), os réus (…) e (…), no período que compreende os anos fiscais de 2003 a 2005, tiveram de pagar, em sede de IRS, montantes que ascenderam ao valor de € 345.029,90 por forma a retificar a situação fiscal irregular verificada.
86- Os RR (…) e (…), quebrada a relação de confiança anteriormente mantida com a A. … (da qual a A. … era advogada, sendo por isso também abrangida por essa quebra de confiança) e sua irmã (…), tentaram pressionar as AA., no sentido de obterem a restituição do que consideravam ser-lhes devido pela A. (…) e pela irmã (…), recorrendo designadamente, quando entenderam oportuno, ao patrocínio do R. Dr. (…), e vindo este a lançar mão dos meios que julgou adequados para alcançar o fim pretendido pelos seus clientes, nomeadamente a via judicial.
87- Em 11.05.2007, foi apresentada oralmente pela R. (…) queixa-crime contra as aqui AA., junto da Diretoria de Faro da Polícia Judiciária, tendo a R. (…) referido então que “…sem que nenhuma delas [ora AA.] alguma vez tenha apresentado qualquer lucro à denunciante…encontra-se lesada em valor que ascende a um milhão de euros…”, tendo tal queixa originado o processo nº 288/07.6JAFAR.
88- Nessa mesma data de 11.05.2007 a aqui R. (…) fez também “…entrega de queixa mais detalhada, elaborada pelo seu advogado, bem como de uma pasta contendo cópia de todos os documentos que sustentam a denúncia por si apresentada…”.
89- Constam dessa queixa reduzida a escrito pelo advogado da R. (…), imputações às AA. como:
“…os valores das vendas nunca foram entregues aos queixosos, nem nunca foram apresentadas contas…os queixosos desconhecem o real paradeiro do dinheiro declarado nas escrituras… [as AA.] apresentam um património sem justificação aparente…as denunciadas [ora AA.]…construíram um esquema de maneira a que os queixosos enviassem o dinheiro para posteriormente ficarem com ele…com a sua atuação causaram aos queixosos um prejuízo (ora RR. … e …) o que estimam ser muito superior a € 1.000.000,00 … suspeitam que as denunciadas … tenham branqueado o dinheiro proveniente da simulação de preços das vendas dos apartamentos…”.
90- Os autos 288/07.6JAFAR vieram a ser arquivados pelo Mº Pº, tendo os RR. (…) e (…) requerido a abertura de instrução.
91- No requerimento de abertura de instrução os RR. (…) e (…) imputam às aqui AA., o facto de estas nunca terem prestado contas da venda de apartamentos construídos e vendidos, o facto de nunca lhes ter sido entregue quaisquer valores das vendas efetuadas, desconhecendo o real paradeiro do dinheiro declarado nas escrituras, bem como o dinheiro resultante da simulação realizada nas escrituras.
92- O RR (…) e (…) afirmaram em sede de requerimento de abertura de instrução, subscrito pelo R. (…), que as AA. nunca lhes prestaram contas e que nunca lhes foram entregues quaisquer valores da vendas efetuadas, desconhecendo o real paradeiro do dinheiro declarado nas escrituras, bem como o dinheiro resultante da simulação realizada nas escrituras.
93- Da documentação junta pelo R. Dr. (…) com o requerimento de abertura de instrução consta o extrato de conta do (…) de que é titular a firma (…) e (…), Lda., donde constam vários depósitos e transferências.
94- Em 9 e 10 de Abril de 2012, foram as aqui AA. (…) e (…), respetivamente, notificadas do requerimento de abertura de instrução, no âmbito do processo-crime nº 288/07.6JAFAR.
95- Momento em que tiveram o primeiro contato com o teor da queixa-crime em causa, bem como dos factos que diretamente lhes imputavam os RR. (…) e (…).
96- No âmbito do dito processo 288/07.6JAFAR não juntaram os RR. aos autos os extratos das contas bancárias do (…), agência de Silves, com o nº (…) e do (…), agência de Albufeira, com o nº (…), entre 01.01.1999 e 31.05.2000, pese embora, tal tenha sido requerido pelas aqui AA., vindo essa junção a ser determinada oficiosamente.
97- A R. Lucília a fls. 343 daqueles mesmos autos, com o processo nº 288/07.6JAFAR, do então 2º Juízo, do Tribunal Judicial de Albufeira, referiu que “…os lucros que lhe foram distribuídos, resultantes da atividade da sociedade, do arrendamento e venda dos apartamentos, foram irrisórios…”.
98- E a fls. 687 e segs., em requerimento subscrito pelo seu mandatário, aqui 3º R., refere “Aos assistentes não foram entregues valores”.
99- No âmbito dos autos 288/07.6JAFAR, admitiram os RR. (…) e (…) ter recebido € 125.000,00, manifestando ter ficado por receber de acordo com as suas contas, o valor de € 1.268.151,91.
100- Posteriormente, o Juiz de Instrução criminal veio a decidir-se pela não pronúncia das aqui AA. pela prática dos crimes que os RR. lhes imputavam, referindo:
“…não há o mínimo indício de que não tenha correspondido à realidade o percebimento na esfera dos assistentes [ora RR.], nas contas bancárias de que eram titulares, da quase totalidade dos valores das vendas das fracções…” – considerando que se excepciona aqui os € 95.000,00 retidos pela A. (…), e igual valor pela outra sócia e irmã, (…)” e que se decidia pela não pronúncia:
“…face à total inexistência de indícios de quaisquer factos que se subsumam aos crimes que lhe vêm imputados…”.
101- No dia 22.06.12, o 3º R. (…), em sede de alegações finais no âmbito do processo nº 639/04.5TBABF-A, que correu termos junto do então 2º Juízo daquele Tribunal de Albufeira, o qual tinha como objeto o pagamento de um cheque, em que o R. … era exequente e …, marido da irmã … (sócia da aqui sociedade … e …, Lda.) era executado (vindo a ser totalmente absolvido), aproveitando a presença na sala de audiências das aqui AA., que assistiam ao dito julgamento, o R. Dr. …, em sede de alegações finais disse olhando para as mesmas, que na venda dos edifícios “(…)” e “(…)”, levada a cabo pelas ora AA., e cujos valores montaram a cerca de € 1.000.000, os clientes não tinham recebido a contrapartida pelo seu investimento, “pelo que tiveram um prejuízo de € 1.000.000,00…”, e acrescentou ainda “…seguir-se-ão muitas outras ações, para além do processo-crime que corre contra elas junto deste tribunal…”.
102- As AA. sentiram-se ofendidas e ameaçadas com as imputações que lhes foram feitas pelos RR. (…) e (…), e também com o ocorrido no mencionado dia 22.06.12, aquando das alegações o R. Dr. (…), e referido em 101 destes factos provados.
103- Os RR., ao atuarem de forma pública, fizeram com que as imputações feitas às AA. se tornassem do conhecimento público, lançando suspeição sobre as AA..
104- As AA. ficaram tristes, deprimidas e contrariadas com o sucedido.
105- Ambas são pessoas inseridas social e profissionalmente, a A. (…) no ramo da restauração e a A. (…) no ramo da advocacia (profissão esta que exerce em Albufeira há mais de 20 anos, possuindo clientela), sendo conhecidas e respeitadas.
106- A A. (…) constitui o único sustento da própria e do seu agregado familiar, onde constam também dois filhos menores, sendo que a A. (…) tem que trabalhar para criar os seus próprios filhos e fazer face aos seus encargos.
107- E, durante cerca de 18 (dezoito) meses (ou seja, desde que foram notificadas do despacho de abertura de instrução em Abril de 2012 até à respetiva decisão instrutória que culminou com a não pronúncia em 31.10.2013), as ora AA viveram com a angústia e amargura de saber que sobre si caíam as acusações feitas pelos RR (…) e (…), pela mão do R. Dr. (…), ficando inquietas e nervosas e temendo pelo seu futuro, bem como pelo futuro daqueles que dela dependiam.
108- A A. (…) é advogada com inscrição na Ordem dos Advogados desde 1994 e não tem averbada no seu registo disciplinar, até hoje, qualquer infração disciplinar.
109- A Autora (…) sentiu-se envergonhada e comprometida perante os seus colegas, perante o teor das imputações que sobre si impendiam.
110- A ré (…) nunca se reuniu com a autora (…).
111- As Autoras, quando intentaram a presente ação, pretenderam retorquir relativamente à ação dos Réus (…) e (…) ao mover-lhes um processo-crime, prevalecendo-se da decisão de não pronúncia, no sentido de serem compensadas pelo transtorno que haviam sentido e sabendo que criariam aos RR (…) e (…) um sentimento de angústia, como as mesmas antes haviam vivido.
112- Após consulta com o médico, (…), foi declarado medicamente que: «Para os devidos efeitos declaro que a Sra. (…) padece de síndrome ansio-depressivo de difícil controle, para a qual está medicada».
113- À Ré (…) foram prescritos dois medicamentos, encontrando-se neste momento a tomar Venlafaxina e Mexazolam, medicamentos estes prescritos pelo médico (…) para a doença de que a ré padece para tentar aliviar a síndrome ansio-depressivo.
114- Quanto ao réu (…), após consulta com o médico, (…), foi declarado medicamente que «Para os devidos efeitos declaro que o Sr. (…) padece de: hipertensão, gota, espondilólise, depressão», tendo sido prescritos quatro medicamentos e encontrando-se a tomar Escitalopram, Etoricoxib, Alopurinol e Olmesartan Medoxomilo mais Hidroclorotiazida, medicamentos estes prescritos pelo médico (…) para as doenças de que o réu padece.
115- Os réus têm-se sentido perturbados no seu direito ao sossego, já que se sentem injustiçados e prejudicados com toda a situação ocorrida, incluindo a presente ação, e despojados de dinheiro que consideram que lhes pertencia.
116- As AA. apresentaram queixa-crime contra os RR por denúncia caluniosa e difamação, vindo a mesma a dar origem ao processo nº 1165/12.4TAABF.
117- Encerrado o inquérito o Ministério Público ordenou o arquivamento dos autos, em despacho onde, após reproduzir o declarado pelo R. (…), refere que:
“o inquérito n.º 288/07.6JAFAR (ainda sem decisão de mérito em fase de instrução) foi arquivado por critérios dubitativos e não por um juízo categórico de inexistência da matéria denunciada”, conforme consta de fls. 304 dos autos.
118- Mais vem referido nesse despacho que:
“Assim sendo, em face de toda a prova carreada para os autos, conclui-se que não existem indícios suficientes que permitam concluir que os denunciados sabiam que as imputações que formularam ou reiteraram eram falsas”.
119- Mais conclui o despacho que:
“Com efeito, o direito de queixa não é, por si só, uma utilização abusiva do processo.
É preciso que se comprove não ter havido crime ou de os denunciados não o terem praticado a qualquer título ou de ser legalmente inadmissível o procedimento”.
120- Continua ainda o despacho referindo que:
“Um uso meramente incorrecto ou involuntário do processo, a ter ocorrido, mais ainda no exercício de uma retorsão processual, dificilmente enquadra o conceito de uso do processo excessivo, imoderado, contra os bons usos ou boas práticas e fortemente doloso”.
121- Continua ainda dizendo que:
“Parece-nos, assim, que do conteúdo das denúncias apresentadas e dos actos e diligências processuais que se lhe seguiram, tendo em conta o contexto situacional em que tudo aconteceu, não resulta a imputação, em termos objectivos, aos queixosos (Dr. … e Dra. …) de factos ofensivos da sua honra e consideração, não se encontrando preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo de ilícito previsto no artigo 180.º do Código Penal”.
122- O Ministério Público ordenou o arquivamento do inquérito.
123- Inconformada, requereu a A. (…) a abertura de instrução e deduziu acusação particular não acompanhada pelo M.P. por entender que não existe imputação de ofensa à A..
124- Declarada aberta a instrução foi proferida decisão instrutória, de que resultou a não pronúncia, tendo aí sido referido que;
“Saliente-se que, nos termos gerais, o exercício de um direito e o cumprimento de um dever imposto por lei constituem de igual modo causas com aptidão para excluir a ilicitude do facto (art. 31º, nº 2, als. b) e e), do Cód. Penal).Assim sucede, nomeadamente, com o exercício do direito de acção, entendido este como o direito ao recurso aos Tribunais para fazer valer um direito. Na verdade, segundo estabelece o art. 20º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, "A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (...)". A não ser assim, o sistema estaria a criar nos cidadãos o receio do recurso aos Tribunais, sobe pena de, sem mais, poderem ser responsabilizados criminalmente.
Mais em concreto no âmbito do exercício do direito de acesso à justiça, o domínio específico do exercício da advocacia não prescinde de uma especial garantia da sua liberdade de expressão, quando em exercício de funções. A liberdade de expressão do advogado, no exercício das suas funções, maxime nos Tribunais, tem um estatuto jurídico específico, na parte em que pode sacrificar o bom nome e reputação de terceiros (Alfredo Gaspar, O Advogado e a sua liberdade de expressão nos Tribunais, Coimbra Editora, 1994, pág. 11), o que se compreende, de molde a garantir que lhe não é coarctada a efectiva defesa do seu cliente, em independência, sendo certo que o advogado é também ele um protagonista essencial na administração da justiça.
E, com efeito, logo resulta dos nºs 1 e 3, do art. 114º, da Lei nº 3/99, que a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato, através do reconhecimento legal do direito ao não sancionamento pela prática de actos conformes ao seu estatuto forense.
Trata-se apenas de uma directriz legal, a qual vem concretizada na lei processual civil e processual penal.
Assim, segundo estabelece o artigo 154.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não é considerado ilícito o uso das expressões e imputações necessárias à defesa da causa.
A necessidade aparece, deste modo, como dirimente da ofensa, excluindo a ilicitude do facto ofensivo, o que, a nosso, ver, constitui também a prossecução de interesses legítimos”.
125- Nesse mesmo despacho vem referido que:
“Naquele requerimento para abertura da instrução, apresentado pelos ali assistentes, afirmava-se que eles desconheciam o real paradeiro do dinheiro declarado nas escrituras e daquele resultante da sua simulação, porque não lhes fora entregue (artigos 23º e 24º daquele requerimento para abertura da instrução).
Afirmava-se, também, que os valores das vendas nunca foram entregues aos ali assistentes, e que nunca lhes foram apresentadas contas.
E, efectivamente, a ora assistente (…) nunca lhes prestou contas.
O arguido Dr. (…) interveio naquele procedimento criminal com o propósito de exercer o mandato forense que os ali assistentes … e … lhe haviam conferido.
126- O decidido abrangeu a conduta praticada no processo nº 639/04.5TABF-A.
127- Mais consta da decisão instrutória, que:
“Ao invés, não se encontram suficientemente indiciados os seguintes factos:
Que não era verdade que os valores das vendas nunca foram entregues aos ali assistentes (…) e (…).
Que a assistente (…) não chegou a prestar contas é, em bom rigor, um facto admitido, nestes e naqueles autos de procedimento criminal.
O depósito de parte dos valores das vendas das fracções dos dois supracitados edifícios, em contas bancárias tituladas por (…) e (…) alicerça-se também na documentação bancária, que o Ministério Público carreou para os presentes autos, na fase de inquérito, e que acabou por encontrar continuidade na factualidade julgada indiciada naqueles autos 288/07.6TAFAR.
Entre o mero depósito de dinheiros (provenientes do valor das vendas) em contas bancárias tituladas pelos referidos (…) e (…), de que aliás, como se extrai dos factos julgados indiciados naqueles autos 288/07.6TAFAR, em parte também a ora assistente detinha poderes de que a assistente (…) não chegou a prestar contas é, em bom rigor, um facto admitido, nestes e naqueles autos de procedimento criminal.
O depósito de parte dos valores das vendas das fracções dos dois supracitados edifícios, em contas bancárias tituladas por (…) e (…) alicerça-se também na documentação bancária que o Ministério Público carreou para os presentes autos, na fase de inquérito, e que acabou por encontrar continuidade na factualidade julgada indiciada naqueles autos 288107.6TAFAR.
[…]
Importa sublinhar, a este respeito, o seguinte. Entre o mero depósito de dinheiros (provenientes do valor das vendas) em contas bancárias tituladas pelos referidos (…) e (…), de que aliás, como se extrai dos factos julgados indiciados naqueles autos 288/07.6TAFAR, em parte também a ora assistente detinha poderes de movimentação, e a não entre dos dinheiros percebidos com a alienação das fracções vai uma longa distância. Tanto mais que naqueles outros autos foi impossível seguir todo o rasto das sucessivas movimentações bancárias ocorridas nas diversas contas em que esses dinheiros ingressaram. Essa falta de equivalência não pode deixar de ser reconhecida no ponto 1 dos factos que temos por não suficientemente indiciados: a efectiva entrega aos assistentes nunca foi demonstrada.
E importa, ainda, salientar um outro dado. Em bom rigor, aquele requerimento para abertura da instrução também não afirmava que a ora assistente (…) havia alienado as fracções e recebido o valor das vendas, antes sim, que quem o fizera fora a Dr.ª (…) e o procurador substabelecido Dr. (…). O escopo das intervenções e promoções processuais dos ora arguidos, naqueles outros processos, plasmado nos pontos 14, 15 e 16, sustenta-se na finalidade mencionada pelo arguido Dr. (…), e encontra pleno apoio no próprio teor dos actos praticados naqueles procedimentos.
De igual modo, os pontos 23 e 24, encontram o seu apoio probatório nas declarações prestadas pela ora assistente, nestes nossos autos, na fase de inquérito, e prolongamento nos depoimentos aqui prestados pela Dr.ª (…), (…), (…) e (…), que assistiram às ditas alegações orais.
Contudo, uma coisa é certa, não obstante a ofensividade manifesta, para a honra e consideração da ora assistente, o teor das alegações assim realizadas pelo ora arguido Dr. (…) não surgiu descontextualizado da prova a que se propunha o seu constituinte naquele processo de oposição à execução, em que a matéria atinente ao "negócio da venda dos apartamentos", ao recebimento ou não recebimento efectivos dos valores percebidos nesse negócio, e ao merecimento de credibilidade de (…) e aos interesses que envolviam a actuação deste e da ora assistente (…), não era propriamente alheia àquela causa, e assim também ao desempenho do mandato forense pelo ora arguido Dr. (…). Razão pela qual surgiu também ela na resposta à matéria de facto controvertida e na respectiva fundamentação realizada pelo Tribunal.
E o que concluir dos factos assim apurados, pela sua concatenação com os não apurados.
Não demonstrada a falta de verdade das afirmações atribuídas aos ora arguidos, as afirmações por eles respectivamente produzidas nos mencionados actos praticados nos processos encontram-se, em suma, a coberto da causa de exclusão da ilicitude consubstanciada no exercido de um direito, o direito de acção junto dos Tribunais – cfr. art. 31º, nº 2, al. b), do Cód. Penal.
Daí a inexistência de elementos que permitam concluir por uma probabilidade razoável de, em julgamento, vir a ser aplicada uma pena aos arguidos relativamente ao crime que lhes foi imputado, razão porque não deverão ser pronunciados.
Pelo exposto, decide-se não pronunciar os arguidos (…), (…) e (…), quanto à prática, em autoria material, de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181.º, n.º 1, do Cód. Penal”.
128- As AA. não prestaram contas aos RR., nem quando foram notificadas por notificação judicial avulsa para o fazerem.
129- O que sempre foi transmitido ao R (…), pelos RR (…) e (…) era que as AA nunca prestaram contas e não sabiam do destino do dinheiro.
130- Nas suas alegações no processo 639/04.5TABF-A o R. (…) visou insurgir-se contra o facto de o executado nessa ação, pretender desonerar-se da responsabilidade do pagamento do valor de € 20.000,00 que lhe tinha sido emprestado, ligando esse empréstimo á construções e investimento do Edifício (…) em Silves e à alegada sociedade existente na família, ficando o exequente sem receber o que alegava ter emprestado, a exemplo do que não tinham, ele a e R. (…), recebido na realização da construção e vendas das frações dos Edifícios “(…)” e “(…)”.
131- O R. (…) requereu abertura de instrução em Junho de 2011, mas a queixa foi apresentada em 2007, tendo a R. (…) prestado declarações em 8/10/2008, e tendo o ora R. intervindo no processo só depois do despacho de arquivamento.
132- Correu termo o processo, nº 71/2007.9IDFAR, por indício de fraude fiscal, processo em que a R. (…), declarou em 21/05/2008 que:
“do preços atinentes às vendas em que as anteriormente tiveram intervenção, nada sabe, uma vez que as procuradoras se recusaram a prestar as devidas contas. Tem conhecimento das suas obrigações fiscais sabe que devia ter entregue as respectivas declarações de rendimentos o que não fez devido á incompatibilidade que se desenvolveu com as procuradoras que se recusam a entregar a documentação referente á construção dos imóveis”.
133- Neste processo o mandatário foi o Dr. (…).
134- Nesse processo, resultante da fiscalização fiscal, foram determinados os rendimentos por recurso a métodos indiretos.
135- Em 22/06/2007, a R. … (sem estar acompanhada pelo R. …) requereu junto da administração fiscal que fossem chamados os procuradores intervenientes nas escrituras, para serem confrontados, com os valores entretanto apurados, caso houvesse diferença, esclarecendo também quais as quantias recebidas, e apresentando os documentos demonstrativos das despesas que tivessem efetuado.
136- Mais disse:
“… que se torna necessário o apuramento dos valores reais efectivamente recebidos pelos procuradores, de forma a que as declarações sejam posteriormente rectificadas…
[…]
“apuramento esse que tem que ser levado a cabo pela Direcção de Finanças e Polícia Judiciária, única forma de chegar á verdade da transacções”, sendo que o R. (…) não era mandatário desse processo.
137- Em 08/10/2007, na Polícia Judiciaria, quando prestou declarações, a R. (…), e sem que o R. (…) estivesse presente, disse:
“A ora depoente suspeita que os apartamentos dos prédios (…) e (…), foram vendidos, por um preço superior ao declarado nas escrituras de compra e venda. Qua até à presente data, pese o facto de todo o investimento ter sido suportado pela denunciante (as suas irmãs nunca contribuíram com capitais próprios para a compra dos terrenos e construção dos prédios) apesar de diversas insistências, nunca foram prestadas contas á denunciante e os lucros distribuídos, resultante da actividade da sociedade, do arrendamento e venda dos apartamentos, forma irrisórios, quando comparado com os valores que as denunciadas se apropriaram ilicitamente.
Que considera que que actuação das denunciadas (…), (…) e inclusivamente a sua irmã (…) lhe causaram um prejuízo que estima ser muito superior a € 1.000.000,00 (um milhão de euros), pelo que deseja a instauração do procedimento criminal contra os denunciados”.
138- Em 9 de Maio de 2007 a R (…) declarou ainda que:
“…a denunciante agora apurou, os imóveis por si construídos foram vendidos pela denunciada (…) e também pela sua advogada (…), sem que nenhuma delas tenha apresentada qualquer lucro á denunciante”.
139- Perante aquilo que lhe tinham transmitido os seus clientes e perante o que julgava ser uma situação grave, e porque nada tinha contra a Dr.ª (…), o R. (…) contactou-a com vista à resolução do litígio, tendo a esse respeito não mais do que duas reuniões.
140- Em que a A. (…) transmitiu que iria analisar a situação e fazer uma proposta de resolução.
141- Mas não entregou quaisquer documentos relativos, quer às vendas, quer aos custos, quer aos comprovativos dos depósitos, nem mesmo copias das escrituras das vendas.
142- Veio a enviar, todavia, uma proposta por “fax”, em que referia que “a Dra. (…), e (…), convida à resolução extrajudicial da questão, e no interesse de todos, propõem o pagamento de 150.000,00 € + lote existente em nome da firma e em contrapartida os s/ Clientes desistem da acção instaurada contra o Sr. … (cunhado)”.
143- Os clientes (os RR. … e …) não aceitaram a proposta.
144- Tudo o que dizia respeito a contas, análises de extratos bancários, transferências e respetivos justificativos, era pedido aos clientes e ao seu contabilista limitando-se o R. (…) a enviar os elementos para o tribunal e para o processo, sempre que necessário e era pedido.
145- Pelo menos, alguns dos requerimentos e peças processuais eram vistos pelos seus clientes antes de serem enviados, a fim de serem confirmados.
146- Antes de subscrever o requerimento de instrução o R. enviou à Dra. (…) “fax” em que lhe comunicou a intenção de subscrever o requerimento de abertura de instrução, e bem assim reportando que nada tinha de pessoal contra ela, unicamente o que pretendia era a descoberta da verdade.
147- Do relatório da Polícia Judiciária no processo nº 288/07.6JAFAR consta que:
“A denunciante refere que todos os capitais empregues na aquisição dos quatro apartamentos sitos em Albufeira, na aquisição dos prédios rústicos e misto sitos no concelho de Silves e na posterior construção dos prédios urbanos nesses terrenos eram exclusivamente seus (conforme fls. 338). Que a sua irmã (…) nunca entregou à denunciante o valor das rendas dos quatro apartamentos sitos em Albufeira, bem como nunca recebeu daquela e da advogada (…) o valor referente à venda dos apartamentos dos prédios (…) e (…).
Os factos descritos evidenciam que (conforme o texto da denúncia) as denunciadas … e … (e inclusivamente a outra irmã da denunciante … – cfr. fls. 338, apropriaram-se de coisa móvel que lhe foi entregue por título não translativo da propriedade, dado que, na qualidade de procuradoras da denunciante, receberam quantias monetárias de terceiros (quer pela venda dos apartamentos sitos em Albufeira,) quer pelo preço recebido pela venda dos apartamentos dos Edifícios (…) e (…), não procedendo à entrega dessas quantias à denunciante.
Como forma de apropriação das quantias monetárias, cujo quantitativo não se encontra rigorosamente apurado, as denunciantes simplesmente recusaram proceder à entrega à denunciante, daqueles valores assim recebidos”.
148- Refere ainda o relatório que:
“Não nos parece portanto que, que o enriquecimento assim obtido tenha resultado erro ou engano sobre factos que astuciosamente foram provocados, para determinar a denunciada á pratica de actos que lhe tenham causado prejuízo patrimonial. Na situação, o empobrecimento da denunciante não resultou do engano produzidos pelas suspeitas, mas tudo se passou licitamente, sem qualquer engano ou ardil na aquisição do dinheiro, passando a actividade ilícita a verificar-se apenas quando se inicia a apropriação ilegítima.
149- O mesmo relatório conclui que os factos eram subsumíveis ao crime de abuso de confiança e infidelidade.
150- No processo-crime, as AA entenderam não prestar declarações.
151- O R. (…) exerce a advocacia sem que tenha averbada qualquer sanção disciplinar, mesmo após participação efetuada pela A. (…), a qual mereceu a decisão de arquivamento cuja cópia consta a fls. 1548 e 1549 dos presentes autos e a decisão final, em sede de recurso, do Conselho de Deontologia de Faro da Ordem dos Advogados que consta de fls. 1716 a 1718 dos presentes autos.
152- O R. (…) assumiu o patrocínio judicial depois do despacho de arquivamento, sem intenção de prosseguir interesses pessoais contra as AA..
153- Apesar do relatório final da Polícia Judiciária, do Relatório da Administração Fiscal, da queixa apresentada e subscrita pelos primeiros RR., quando subscreveu o requerimento de abertura de instrução logo recebeu das AA. a comunicação de que iria ser sujeito a processos crimes crime e cível.
154- No processo 639/04.5TABF-A as testemunhas (…) e (…) falaram do negócio da família e da construção dos apartamentos. 155- As imputações feitas pelo Réu (…) no requerimento de abertura de instrução, e bem assim as alegações que o mesmo fez no processo 639/04.5TBABF-A, tiveram por base informações e declarações dos clientes, relatórios da Polícia Judiciária, relatório da administração fiscal, e foram pelo R. (…) consideradas necessárias à defesa dos interesses do cliente.
156- Em Julho de 2015, e após os RR. (…) e (…) terem junto procuração a favor do R. (…) aos autos (em 29 de Junho de 2015), a R. (…), enquanto sócia-gerente da sociedade “Construções (…) e (…), Lda.”, vendeu o único bem imóvel da sociedade que possui com as suas duas irmãs, a A. (…) e (…), e sem que até hoje lhes tivesse prestado contas ou dado qualquer conhecimento, o que fez pelo preço de € 40.000,00 (quarenta mil euros), quando o seu valor patrimonial é de € 47.910,00.
157- Venda essa feita à sociedade “Construções (…), S.A.”, da qual o filho dos RR., de nome (…) é o único administrador, e que foi constituída em data anterior à entrada junto da Polícia Judiciária da queixa-crime contra as AA..
158- A A. (…) e a sua irmã (…) deixaram de participar na gerência da sociedade “Construções (…) e (…), Lda.”.
159- E foram notificadas para as assembleias gerais da sociedade por carta registada, mas não compareceram, levando a que a Ré (…) fosse a única presente nas referidas assembleias, nas quais foi deliberada a venda do imóvel.
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Diga-se desde já que concordamos na íntegra com a sentença recorrida.
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No início da fundamentação de Direito, escreve-se o seguinte:
As «AA. movem a presente ação com fundamento em responsabilidade civil por prejuízos decorrentes de ofensa ao seu bom nome, fundamentalmente, por promoção de processo penal infundado (e que veio a terminar por decisão de não pronúncia), visando, essencialmente, obter indemnização por parte dos réus na sequência das imputações que estes lhes fizeram no âmbito do referido processo-crime».
É este o objecto do presente processo. Foram as AA. lesadas pela queixa que foi contra elas apresentada, sendo certo que o processo penal terminou sem acusação e sem pronúncia? Existem razões para o pedido formulado, ao abrigo do art.º 70.º, n.º 1, Cód. Civil, e 26.º, n.º 1, da Constituição?
O art.º 70.º, embora de uma forma algo tautológica ou redundante, dispõe que a lei protege os indivíduos contra qualquer «ofensa ilícita». Por outro lado, o art.º 483.º faz depender a existência de responsabilidade civil da ocorrência de uma acto ilícito.
Assim, o problema que aqui se coloca é o da ilicitude da conduta dos RR..
Cremos que ela não existe.
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Os 1.ºs RR. tiveram as suas razões para apresentar a sua queixa dadas as suspeitas que tinham quanto ao comportamento das AA. em face das avultadas quantias que lhe foram entregues para investirem e de que não viram o completo retorno disso. Não se provaram as suspeitas mas isso não justifica a outra queixa que foi apresentada por denúncia caluniosa pelas AA. contra os 1.ºs RR. (processo este que também terminou sem pronúncia dos arguidos).
E, contudo, são as AA. que se consideram ofendidas pelo primeiro processo.
Em todo o caso, o que convém frisar, e a sentença refere este ponto, é que o «direito à honra e ao bom nome não protege os seus titulares de toda e qualquer ofensa, pois o direito não pode intervir sempre que a linguagem utilizada incomoda ou fere suscetibilidades do visado». As AA., no âmbito do processo penal em que foram arguidas, foram tratadas como tal, como suspeitas de terem praticado um crime. Daí que as expressões usadas em relação a elas não pudessem ser lisonjeadoras mas antes pejorativas. Findo o processo, este tipo de linguagem terminou (apenas para reaparecer no outro processo por denúncia caluniosa mas com inversão dos sujeitos).
Dentro do contesto do problema não nos parece que a conduta de algum dos RR. seja violadora do direito ao bem nome.
E note-se que o contexto é este:
«(…) perante o quadro factual apurado, o que se nos afigura é que AA. e RR. se envolveram num processo negocial que envolveu avultadas somas em dinheiro e que não terá sido concluído a contento de todas as partes. Acresce que não chegou a ser sequer efetuada uma prestação de contas dos negócios em causa, fosse a título particular, fosse em sede judicial, através da ação especial indicada para o efeito. Deste modo, ficou aberta a porta para a existência de suspeição e de acusações recíprocas entre as partes, que vieram a desembocar na concretização dessas acusações em tribunal por parte dos RR.. Não já em sede de ação de prestação de contas, mas antes por via de um processo criminal».
Tudo são suspeitas atrás de suspeitas sendo impossível ao tribunal afirmar quais são as infundadas e quais as que não são. De novo notamos que ambos os processos penais terminaram sem a pronúncia dos arguidos.
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Pode ter havido excessos, sem dúvida; mas aconteceram por vontade de todos os intervenientes.
De novo reproduzimos um excerto da sentença:
«Relembre-se que se provou que os RR. (…) e (…), quebrada a relação de confiança anteriormente mantida com a A. (…) (da qual a A. … era advogada, sendo por isso também abrangida por essa quebra de confiança) e sua irmã (...), tentaram pressionar as AA., no sentido de obterem a restituição do que consideravam ser-lhes devido pela A. (…) e pela irmã (…), recorrendo, designadamente, quando entenderam oportuno, ao patrocínio do R. Dr. (…), e vindo este a lançar mão dos meios que julgou adequados para alcançar o fim pretendido pelos seus clientes, nomeadamente a via judicial (ponto 86 dos factos provados).
«Mas, do mesmo modo, provou-se que as Autoras, quando intentaram a presente ação, pretenderam retorquir relativamente à ação dos Réus (…) e (…) ao mover-lhes um processo-crime, prevalecendo-se da decisão de não pronúncia, no sentido de serem compensadas pelo transtorno que haviam sentido e sabendo que criariam aos RR. (…) e (…) um sentimento de angústia, como as mesmas antes haviam vivido (ponto 111 dos factos provados).
«O que se verifica, pois, é que nos deparamos com um cenário em que, ainda e sempre as emoções têm prevalecido, o que, no fundo, por incómodo que possa ser (e será, certamente), não é senão uma parte do fluir corrente da vida, com as agruras que por vezes comporta e sobre o qual a tentação de emitir profusos juízos de valor se arrisca a desembocar num juízo de que os acertos e os erros de uns são melhores do que os acertos e erros dos outros, o que não é, pelo menos numa decisão judicial, aceitável.
«Acresce, fazendo-se uma referência adicional ao réu (…), que este acabou, no exercício do mandato forense, por aderir de alguma maneira a essa emotividade expressa pelas partes, o que, como se referiu, no caso seria perfeitamente compreensível».
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Sem dúvida que ser arguido num processo criminal não é não é bom; para mais se não há condenação. Mas a isto está sujeita qualquer pessoa cujo comportamento possa levantar suspeitas de ser criminoso. Os incómodos, as dores, os custos que isto implica para os arguidos são consequência do próprio processo e não dos seus intervenientes.
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Por estes motivos, entendemos que a sentença é de manter.
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Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso.
Custas pelas recorrentes.
Évora, 11 de Julho de 2019
Paulo Amaral
Francisco Matos
José Tomé de Carvalho