Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
206/17.3T8VRL.G1
Relator: RAQUEL BAPTISTA TAVARES
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PROCESSO ESPECIAL PARA ACORDO DE PAGAMENTO
NULIDADE DA DECISÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/23/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - O Decreto-lei n.º 79/2017 de 30 de Junho, entrado em vigor no dia 01 de Julho de 2017, veio limitar o recurso ao Processo Especial de Revitalização apenas para o devedor/empresa e consagrar um novo procedimento, o Processo Especial Para Acordo de Pagamento, para as situações em que o devedor, não sendo uma empresa, mas encontrando-se também comprovadamente em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, possa estabelecer negociações com os credores e concluir com estes um acordo de pagamento.

II. Ao criar um novo processo, pensado em termos essencialmente idênticos ao Processo Especial de Revitalização (conforme decorre da análise do seu regime previsto nos referidos artigos 222º - A a 222º - J), clarificando dessa forma a situação das pessoas singulares, que não devam ser consideradas empresa para este efeito, permitindo-lhes o acesso a este processo (e não apenas o recurso ao processo de insolvência), não foi intenção do legislador determinar a extinção dos Processos de Revitalização pendentes à data da sua entrada em vigor, e em que os devedores não sejam empresa, designadamente quando sejam pessoas singulares que não exerçam actividade profissional como agentes económicos, nada obstando a que o Processo Especial de Revitalização pendente à data da entrada em vigor Decreto-lei n.º 79/2017 possa ser convolado para Processo Especial Para Acordo de Pagamento.

III – Não constando da decisão recorrida qualquer pronuncia sobre o requerimento apresentado em 29/06/2017 solicitando a não homologação do plano, e não resultando dos autos, no momento em que a decisão foi proferida, que o mesmo não fosse tempestivo, é forçoso concluir que aquela não se pronunciou sobre questões que devia ter apreciado o que determina a sua nulidade nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

Inconformado com a sentença que homologou o plano de recuperação o BANCO A SA interpôs o presente recurso, concluindo a sua alegação nos seguintes termos:

1. O regime jurídico do Processo Especial de Revitalização previstos nos arts. 17.º-A a 17.º-I do CIRE foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 79/2017, de 30 de junho, o qual limitou a aplicação deste instituto a empresas, proibindo a sua aplicação a pessoas singulares.
2. O referido diploma entrou em vigor em 01-07-2017 e aplica-se aos processos pendentes, conforme expressamente previsto no art. 6º “norma transitória”.
3. Como tal, a sentença proferida em 04-07-2017, ao abrigo da legislação em vigor, não deveria ter homologado o plano, mas declarado a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
4. Neste sentido o Supremo Tribunal de Justiça teve já oportunidade de se pronunciar – doc.1.
5. Em 29-06-2017, o aqui Recorrente requereu a não homologação do plano.
6. Em 04-07-2017 foi proferida a sentença homologatória do plano, fundamentada unicamente na aprovação pela maioria dos créditos, não se pronunciando e não fundamentando as razões de facto e de direito quanto à procedência ou improcedência do requerimento de recusa de homologação do plano.
7. Nos termos do art. 615.º n.º 1 al. b) e d) do CPC, ex vi art. 17.º do CIRE , é nula a sentença que “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão” e que “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)”.
8. O processo especial de revitalização deu entrada em 10-02-2017; o prazo para negociações decorreu até 29-06-2017.
9. O aqui Recorrente enviou carta aos Devedores a manifestar intenção de participar nas negociações, carta que os Devedores se recusaram a receber – vide requerimento de 30-03-2017.
10. O aqui Recorrente apenas foi notificado, pela primeira vez, pelo mandatário dos Devedores, em 26-06-2017, pelas 23:14 horas, na qual lhe era dado conhecimento do plano já totalmente redigido sobre o qual apenas poderia limitar-se a imitir voto a favor ou contra, “impreterivelmente até às 18 horas do dia 28”.
11. Por um lado, quanto ao aqui Recorrente, foi-lhe vedada a participação nas negociações, jamais foi consultado, jamais ocorreu um verdadeiro processo de negociação, ao contrário do pressuposto e que é corolário do processo especial de revitalização.
12. Por outro lado, o plano apresentado, estrategicamente, prevê o pagamento das dívidas aos Credores cujo voto teria influencia na votação (Autoridade Tributária, protegida por normas imperativas e Credor Garantido com 72,13 % dos votos), enquanto aos demais credores, cujo voto não teria influência prática na aprovação ou rejeição do plano, foi proposto/imposto plano com perdão da quase totalidade da quantia em dívida – manietando, nestes moldes, o processo de revitalização!
13. Os Devedores, nem encetaram negociações com todos os Credores como seria suposto, nem atuaram de boa-fé na busca de uma solução construtiva que satisfizesse todos os credores. 14. Em clara violação do Primeiro e Segundo Princípios Orientadores da Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011, que, nos termos do art. 17.º n.º 10 do CIRE, regem as negociações no âmbito do Processo Especial de Revitalização. 15. Termos pelos quais deveria ser recusada a homologação do plano por violação não negligenciável das regras procedimentais, nos termos dos arts. 17.º-F n.º 5 e 215.º do CIRE.
16. O plano proposto, prevê a seguinte diferenciação nos pagamentos:
a) Quanto ao Credor Autoridade Tributária (salvaguardado por normas imperativas quanto ao conteúdo do plano): pagamento da totalidade da dívida, em 36 prestações mensais, início imediato após a aprovação (sem perdão de quaisquer valores, como custas, coimas ou juros);
b) Quanto ao Credor Garantido, Banco B S.A. (com 72,13% dos votos): pagamento de 100% do capital, dos juros vincendos e das despesas associadas à dívida de “€ 2.441,52, a que acresce aquelas que forem devidas até à data do transito em julgado”, em 444 prestações mensais, com início em um ano;
c) Quanto aos Credores Comuns: pagamento de 20% do capital, em 10 prestações anuais (não mensais) e com período de carência de 3 anos – com “perdão incondicional de 80% do capital”, com perdão dos juros de mora vencidos e vincendos e com o perdão de todas as despesas associadas às dívidas.
17. Votaram a favor os Credores Autoridade Tributária e Banco B, votaram contra o plano os Credores Banco A, S.A. e Banco C, respetivamente, os credores que viram o pagamento da sua dívida garantia e os credores a quem se está a tentar impor o perdão da quase totalidade da dívida – vide requerimento de 07-07-2017.
18. Ora, o princípio da igualdade é orientado pela máxima “tratar igual o que é igual, e tratar diferente o que é diferente”. 19. Contudo, as diferenciações não são admitidas a qualquer preço, pois que o princípio da proporcionalidade e o princípio da proibição do livre arbítrio baliza, limita, estas diferenciações.
20. E é desproporcional o plano que prevê o pagamento integral e mensal dos dois credores que reunião condições para, com a sua votação, influírem na aprovação ou rejeição do plano; enquanto aos Credores cujo voto não poderia ter qualquer influência na votação foi imposto – repete-se imposto – que se considerem liquidados mediante o pegamento de apenas 20% do capital, em prestações anuais e período de carência de 3 anos, “perdoando” 80% do capital, da totalidade dos juros e das despesas.
21. Mormente é desproporcional quando tal plano é ditado exclusivamente pelo voto favorável dos Credores que não são afetados nas suas dívidas!
22. Configurando uma manifesta violação do princípio da proporcionalidade, o plano é inadmissível e deverá ser recusada a homologação do mesmo, nos termos dos arts. 17.º-F e 215.º do CIRE.
23. Quanto à sua situação concreta, o aqui Recorrente foi-lhe reconhecido um crédito no valor de € 29.686,75, crédito esse garantido pela reserva de propriedade sobre o veículo automóvel da marca Volkswagen Passat e com matrícula CP.
24. Por seu turno o plano prevê:
- o pagamento de € 3.911,21 (20% do capital);
- em 10 prestações anuais de 391,12;
- vencendo-se a primeira no ano de 2020;
- os Devedores continuam na posse do veículo e adquirirão a propriedade plena do mesmo nas condições apresentadas.
25. Os mesmos Devedores que, apesar de se encontrarem economicamente debilitados, pretendem continuar a usufruir de um veículo automóvel manifestamente acima das suas possibilidades, nunca equacionaram entregar o veículo para reduzir a dívida e pretendem impor um plano de revitalização sem estares dispostos a abicar dos luxos a que se foram habituando – aliás, o que já vinha a acontecer na ação executiva a correr desde 2012, onde os Devedores têm vindo a obstaculizar a recuperação do veículo que usufruem sem procederem a qualquer pagamento!
26. Ou seja, nos termos do plano, o aqui Recorrente teria de esperar 13 anos para se ver ressarcido em €3.911,21, enquanto, não sendo aprovado o plano, é-lhe possível recuperar o veículo cuja propriedade reservou.
27. A situação do plano é menos favorável ao aqui Recorrente, pelo que, jamais poderia ser homologado o plano, nos termos dos arts. 17.º-F n.º 5 e 216.º n.º 1 al. a) do CIRE.
28. Finalmente, o aqui Credor não consentiu, opôs-se e não aceita o plano que importa que o seu crédito de €29.686,75 seja reduzido para €3.911,21, a pagar em 10 prestações anuais de €391,12 e período de carência de 3 anos!
29. Não pode aceitar ou consentir que Credores que não vêm sacrificadas as dívidas que lhes correspondem, ditem a aprovação de um plano que, contra a vontade expressamente manifestada pelo Recorrente, reduz o seu crédito a 20% do capital, implica um perdão – IMPOSTO - quase total do seu crédito!
30. Não pode um Credor ou Assembleia de Credores dispor do crédito do credor que não anuiu em reduzir o seu crédito, pelo que, ainda que não se revogue a sentença que homologou o plano de revitalização, o plano não deve ser oponível ao aqui Recorrente, por força do regime da ineficácia jurídica”.
Pugna o Recorrente pela integral procedência do recurso, com a consequente revogação da decisão recorrida.
Os Devedores contra alegaram pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Delimitação do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do Código de Processo Civil).
As questões a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela Recorrente e pela Credora quanto à ampliação do objecto do recurso, são as seguintes:

1. Saber se a entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017 de 30 de Junho determina a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide;
2. Saber se a sentença é nula nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea b) e d) do Código de Processo Civil, ex-vi do artigo 17º do CIRE;
3. Saber se ocorre violação dos Princípios orientadores das Negociações;
4. Saber se ocorre violação do Principio da Proporcionalidade;
5. Saber se a homologação do plano deve ser recusada por o plano ser menos favorável ao Recorrente do que a ausência de qualquer plano;
6. Saber se sendo de manter a homologação do plano este não deve ser oponível ao Recorrente por força do regime da ineficácia jurídica.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A primeira questão que importa decidir no presente recurso consiste em saber se a entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017 de 30 de Junho tem por efeito determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
A Recorrente entende que por força da entrada em vigor do referido diploma legal não poderia ter sido proferida sentença a homologar o plano de revitalização, antes deveria ter sido proferida sentença a julgar a extinção da instância uma vez que o Decreto-lei n.º 79/2017 de 30 de Junho estabelece no seu artigo 6º que é imediatamente aplicável aos processos pendentes e uma das alterações introduzidas seria a de vedar o Processo Especial de Revitalização às pessoas singulares, destinando tal procedimento apenas às empresas.
Apreciemos então a questão suscitada sendo que para análise da mesma ter-se-á em consideração a seguinte factualidade constante dos autos:

- Os Devedores apresentaram através do citius requerimento datado de 28/06/2017 juntando aos autos o Plano de Revitalização que fora sujeito à votação dos credores;
- O banco B SA veio apresentar nos autos em requerimento datado de 28/06/2017 o seu voto favorável ao plano apresentado com as rectificações introduzidas em 28/06/2017, juntando como documento o Plano de Revitalização;
- Os devedores remeteram aos autos email datado das 17.30 horas do dia 28/06/2017 dirigido aos credores e à Senhora Administradora onde consta: “Serve o presente no seguimento do Plano de recuperação remetido a votação no processo em assunto, para notificar V. Exas. de rectificação ao texto do mesmo que, ocorrida por lapso, só agora se constatou”, onde solicitam seja considerada a rectificação cujo teor fazem constar e mencionando ainda que “recordamos que o Plano deve ser votado impreterivelmente até às 18.00 horas do presente dia 28 de Junho de 2017, mediante preenchimento da Declaração de Voto igualmente em anexo, a remeter à Senhora Administradora Judicial Provisória (…) por email (…) ou por fax (…)”, juntando ainda a versão integral e corrigida do Plano e Declaração de Voto.
- O Banco A SA apresentou nos autos requerimento em 29/06/2017 solicitando a não homologação do plano apresentado;
- No dia 04/07/2017 foi proferida sentença homologando o plano de recuperação;
- No dia 07/07/2017 a Senhora Administradora apresentou requerimento onde consta ter sido notificada da decisão de homologação do plano e não ter ainda comunicado o resultado da votação das negociações e entender ser seu dever juntar aos autos esses resultados pelo que requer a junção de um requerimento, quatro documentos (votos) e 2 anexos, sendo o anexo II o resultado da votação; no seu requerimento a Senhora Administradora informa que o prazo das negociações terminou a 29/0672017, sem que tivesse sido alcançada a aprovação unânime dos credores relativamente ao plano de revitalização apresentado pelos devedores, que estes já tinham remetido aos autos, informa ainda a necessidade de submeter o plano à votação dos credores a quem foi solicitado que enviassem preferencialmente o voto para o seu email, mas podendo também fazê-lo via fax ou correio, tendo por isso aguardado para apresentar o resultado da votação ao tribunal face à eventualidade de recepcionar algum voto pelo correio; mais informa que os credores votantes foram 4, o sentido dos votos e que o número de votos favoráveis foi superior a metade do total dos créditos reclamados e relacionados pelo que considerou formalmente aprovado o plano de revitalização.
Considerando tais factos analisemos a questão.
O Decreto-lei n.º 79/2017 entrou em vigor no dia 01 de Julho de 2017 (artigo 8.º) e estipula efectivamente no n.º 1 do artigo 6.º que as disposições no mesmo previstas (com excepção do disposto nos números 2 a 6) são imediatamente aplicáveis aos processos pendentes na data da sua entrada em vigor revitalização, foi proferida no dia 04 de Julho de 2017, pelo que se encontrava já em vigor o referido diploma.
Relembra-se aqui o teor da decisão recorrida:
“Atendendo a que votaram mais de 1/3 do total dos créditos com direito de voto e que proposta do plano de recuperação teve a aprovação de mais de 2/3 da totalidade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados, nos termos do art. 212º do CIRE, aplicável ex vi art. 17º-F, 3 do mesmo diploma legal, considera-se o mesmo aprovado.
Nos termos do disposto no art. 17º-F, 5 do CIRE homologa-se o plano de recuperação de fls. 162 a 166.
Custas pela devedora – cfr. art. 17º-F, 7 do CIRE.
Notifique – cfr. art. 17º-F, 6 do CIRE”.
Conforme decorre da decisão recorrida não é feita na mesma qualquer menção ao diploma acabado de entrar em vigor e da análise da mesma constata-se, pelas normas invocadas, que manifestamente não procedeu à sua aplicação.
De facto, o artigo 17º F do CIRE foi alterado pelo referido Decreto-lei n.º 79/2017, designadamente os seus números 3, 5, 6 e 7 expressamente referenciados na decisão recorrida, que passaram a ter a seguinte redacção:
“(…) 3 - Findo o prazo previsto no número anterior é publicado no portal Citius anúncio advertindo da junção ou não junção de nova versão do plano, correndo desde a publicação referida o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216.º, com as devidas adaptações.
4 - Concluindo-se a votação com a aprovação unânime de plano de recuperação conducente à revitalização da empresa, em que intervenham todos os seus credores, este é de imediato remetido ao processo, para homologação ou recusa da mesma pelo juiz, acompanhado da documentação que comprova a sua aprovação, atestada pelo administrador judicial provisório nomeado, produzindo tal plano de recuperação, em caso de homologação, de imediato, os seus efeitos.
5 - Sem prejuízo de o juiz poder computar no cálculo das maiorias os créditos que tenham sido impugnados se entender que há probabilidade séria de estes serem reconhecidos, considera-se aprovado o plano de recuperação que:
a) Sendo votado por credores cujos créditos representem, pelo menos, um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 17.º-D, recolha o voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções; ou
b) Recolha o voto favorável de credores cujos créditos representem mais de metade da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, calculados de harmonia com o disposto na alínea anterior, e mais de metade destes votos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções.
6 - A votação efetua-se por escrito, aplicando-se-lhe o disposto no artigo 211.º, com as necessárias adaptações, e sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório, que os abre em conjunto com a empresa e elabora um documento com o resultado da votação, que remete de imediato ao tribunal.
7 - O juiz decide se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 194.º a 197.º, no n.º 1 do artigo 198.º e nos artigos 200.º a 202.º, 215.º e 216.º
(…) 10 - A decisão vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 4 do artigo 17.º-C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal.
11 - Compete à empresa suportar as custas do processo de homologação. (…)”
Da análise deste preceito e do confronto com as normas invocadas na decisão recorrida conclui-se que esta não teve em consideração a redacção introduzida pelo referido Decreto-lei n.º 79/2017, já em vigor à data da sua prolação, e com aplicação imediata aos processos pendentes, sendo certo que a mesma também é omissa quanto à questão de não proceder à aplicação do diploma, nada se referindo quanto às alterações introduzidas por aquele diploma, designadamente no que toca à questão suscitada pela Recorrente do Processo Especial de Revitalização passar a ser destinado apenas ao devedor/empresa.
Conforme se lê no preâmbulo daquele diploma o “Ministério da Justiça foi identificado como responsável por uma das medidas do eixo da simplificação e pela maioria das medidas do eixo da reestruturação empresarial, dado que as mesmas visam o aperfeiçoamento e o aumento da eficiência dos procedimentos de revitalização e de insolvência. Em face deste quadro, estabeleceu-se como prioritário proceder a alterações ao Código das Sociedades Comerciais e ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. (…) Apostou-se na credibilização do processo especial de revitalização (PER) enquanto instrumento de recuperação, reforçou-se a transparência e a credibilização do regime e desenhou-se um PER dirigido às empresas, sem abandonar o formato para as pessoas singulares não titulares de empresa ou comerciantes”.
Assim, o artigo 1º Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas passou a prever no seu n.º 2 que estando em situação económica difícil, ou em situação de insolvência meramente iminente, a empresa pode requerer ao tribunal a instauração de processo especial de revitalização, de acordo com o previsto nos artigos 17º - A a 17º - J, e no seu n. º 3 que tratando-se de devedor de qualquer outra natureza em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, este pode requerer ao tribunal processo especial para acordo de pagamento, previsto nos artigos 222º - A a 222º - J, criando ao lado do Processo Especial de Revitalização, destinado ao devedor/empresa, um novo procedimento, o Processo Especial Para Acordo de Pagamento.
E o artigo 222º - A, aditado ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, veio dispor que o processo especial para acordo de pagamento se destina a permitir ao devedor que, não sendo uma empresa e comprovadamente se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo de pagamento.
O processo pode ser utilizado por qualquer devedor que, preenchendo os requisitos ali previstos, o ateste, mediante declaração escrita e assinada e tem carácter urgente, aplicando-se-lhe todas as regras previstas no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas que não sejam incompatíveis com a sua natureza.
Em face do regime vigente antes da entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017 vinha já sendo entendimento do Supremo Tribunal de Justiça que o regime jurídico do Processo Especial de Revitalização não era aplicável às pessoas singulares, que não exercessem a sua actividade profissional como agentes económicos, e que a estes apenas era possível o recurso ao processo de insolvência e ao plano de pagamentos aludido nos artigos 249º a 251º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (v. entre outros os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20/03/2017, 07/03/2017 e 27/10/2016, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt).
A opção do legislador no Decreto-lei n.º 79/2017 não foi contudo essa; de facto, ao consagrar o Processo Especial de Revitalização apenas para o devedor/empresa o legislador não veio restringir para os demais devedores a possibilidade de apenas recorrerem ao processo de insolvência e ao plano de pagamentos aí previsto, antes veio consagrar um novo procedimento, o Processo Especial Para Acordo de Pagamento, para as hipóteses em que o devedor, não sendo uma empresa, mas encontrando-se comprovadamente em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, possa estabelecer negociações com os credores e concluir com estes um acordo de pagamento.
Temos por isso para nós como certo, e indo de encontro à questão colocada no presente recurso pelo Recorrente, que a entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017 não tem de significar necessariamente a extinção dos Processos de Revitalização, pendentes à data da sua entrada em vigor, em que os devedores não sejam empresa, designadamente quando sejam pessoas singulares que não exerçam actividade profissional como agentes económicos.
Parece-nos até que não terá sido de todo essa a intenção do legislador pois que veio instituir, ao lado do processo de revitalização, um novo processo pensado em termos essencialmente idênticos àquele (conforme decorre da análise do seu regime previsto nos referidos artigos 222º - A a 222º - J), clarificando dessa forma a situação das pessoas singulares, que não devam ser consideradas empresa para este efeito, e permitindo-lhes o acesso também a um processo idêntico (e não apenas o recurso ao processo de insolvência), deixando aquele para as empresas.
Em nosso entender nada obsta a que o processo de revitalização pendente à data da entrada em vigor possa ser convolado para Processo Especial Para Acordo de Pagamento.
Conforme decorre do preceituado no artigo 17º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas o Código de Processo Civil tem aplicação em tudo o que não contrarie as disposições daquele, e o artigo 547º do Código de Processo Civil dispõe que o juiz deve adoptar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos actos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.
Aliás, o principio de que todos têm direito não só ao processo mas a um processo equitativo tem consagração constitucional (artigo 20º da Constituição da República Portuguesa) admitindo o Tribunal Constitucional que o direito a um processo equitativo não tolera, num ordenamento constitucional que tutela também a confiança, “interpretações normativas que – de uma forma absolutamente inovatória e surpreendente (face aos textos legais em vigor e às orientações consolidadas na jurisprudência) – criam para as partes exigências formais que elas não podiam nem deviam razoavelmente antecipar, sancionando o (desculpável) incumprimento de tais requisitos em termos definitivos e irremediáveis, inviabilizando qualquer suprimento ou correcção” (Lopes do Rego, Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, página 840, citado por Jorge Miranda – Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2ª edição, página 440).
No caso concreto há que considerar que na data de entrada em vigor do diploma havia já sido efectuada a votação do plano pelos credores e terminado o prazo das negociações, estando apenas em causa a homologação ou não do plano apresentado.
Decorre dos autos, e desde logo da posição do Recorrente e dos Devedores/Recorridos, que a estes, pessoas singulares, em face da entrada em vigor do diploma em análise, estaria vedado o recurso ao Processo de Revitalização posto que o legislador veio consagrar o recurso a um novo procedimento, o Processo Especial Para Acordo de Pagamento.
Mas, tendo o legislador consagrado para estes devedores um novo procedimento especial, cujo regime é similar ao do processo de revitalização que reservou para o devedor/empresa, temos de concluir não ter sido sua intenção, designadamente ao prever a aplicação imediata aos processos pendentes, de provocar sem mais a extinção dos processos de revitalização que se encontravam em curso, instaurados por pessoas singulares.
Temos por isso para nós que nada obsta, atenta a similitude dos dois processos especiais, que se proceda, ouvidos os interessados e quando nisso os Devedores tenham interesse, à convolação do Processo Especial de Revitalização para o Processo Especial Para Acordo de Pagamento.
No caso em apreço a decisão recorrida, totalmente omissa quanto à entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017 e sua aplicação aos presentes autos, procedeu à homologação do plano junto aos autos pelos Devedores fazendo apelo a normas cuja redacção se encontrava revogada com a entrada em vigor daquele diploma, não curando de proceder à sua aplicação ou de analisar as consequências da sua entrada em vigor e aplicação imediata aos processos pendentes.
Para além disso, na decisão recorrida não é feita também qualquer referência ao requerimento apresentado pelo Recorrente no dia 29/06/2017 solicitando a não homologação do plano e a decisão é proferida (em 04707/2017) sem que a Senhora Administradora tivesse remetido aos autos o documento com o resultado da votação.
Aliás, no dia 07/07/2017 a Senhora Administradora apresentou requerimento onde consta ter sido notificada da decisão de homologação do plano e não ter ainda comunicado o resultado da votação das negociações e entender ser seu dever juntar aos autos esses resultados pelo que requereu então a junção de um requerimento, quatro documentos (votos) e 2 anexos, sendo o anexo II o resultado da votação.
No seu requerimento a Senhora Administradora informa que o prazo das negociações terminou a 29/06/2017, sem que tivesse sido alcançada a aprovação unânime dos credores relativamente ao plano de revitalização apresentado pelos devedores, que estes já tinham remetido aos autos, informa ainda a necessidade de submeter o plano à votação dos credores a quem foi solicitado que enviassem preferencialmente o voto para o seu email, mas podendo também fazê-lo via fax ou correio, tendo por isso aguardado para apresentar o resultado da votação ao tribunal face à eventualidade de recepcionar algum voto pelo correio; mais informa que os credores votantes foram 4, o sentido dos votos e que o número de votos favoráveis foi superior a metade do total dos créditos reclamados e relacionados pelo que considerou formalmente aprovado o plano de revitalização.
Cumpre aqui referir que o nº 4 do artigo 17º - F, na redacção anterior à que foi introduzida pelo Decreto-lei n.º 79/2017, previa que a votação era efectuada por escrito e os votos remetidos ao administrador judicial provisório e que este os abria em conjunto com o devedor e elaborava um documento com o resultado da votação, decidindo o juiz se deve homologar ou recusar a homologação do plano nos 10 dias seguintes à junção aos autos do plano e do referido documento (n.º 5 do artigo 17º - F).
O artigo 17º - F, na redacção introduzida pelo Decreto-lei n.º 79/2017 continua a prever no n.º 6 que a votação efectua-se por escrito, sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório, que os abre em conjunto com a empresa e elabora um documento com o resultado da votação, que remete de imediato ao tribunal.
E o actual artigo 222º - F n.º 4 prevê também que a votação efectua-se por escrito, sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório, que os abre em conjunto com o devedor e elabora um documento com o resultado da votação, que remete de imediato ao tribunal.
No caso dos autos a decisão recorrida que procedeu à homologação do plano de revitalização foi proferida após a junção aos autos do plano mas antes da junção pela Senhora Administradora do documento com o resultado da votação, sendo certo que o requerimento que apresentou após a notificação da decisão também é omisso quanto à data da abertura dos votos em conjunto com os devedores e sua contagem. Aliás, do teor do requerimento que apresenta parece resultar que a abertura dos votos em conjunto com os devedores e respectiva contagem e elaboração do respectivo documento (em regra uma acta mencionando a respectiva data e retratando a abertura e contagem dos votos) nem terá existido posto que do requerimento consta que “aguardou até agora para apresentar o resultado da votação ao tribunal, face à eventualidade de se recepcionar algum voto pelo correio”.
Tais factos assumem no caso concreto particular relevo considerando as questões colocadas no presente recurso, designadamente da nulidade da decisão recorrida que se não pronunciou sobre o requerimento do Recorrente solicitando a não homologação do plano, o qual foi apresentado em 29/07/2017.
Sendo ponto assente que não houve qualquer pronuncia sobre o referido requerimento importa indagar se devia ter havido.
Os Recorridos defendem que não uma vez que em seu entender tal requerimento foi apresentado após a aprovação do plano e por isso o tribunal a quo não tinha de se pronunciar quanto ao pedido de não homologação por extemporâneo.
Posição contrária, como já vimos, é defendida pelo Recorrente que invoca a nulidade da sentença proferida por se não ter pronunciado sobre tal requerimento, nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alíneas b) e d) do Código de Processo Civil.
Dispõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
O dever de fundamentar a decisão decorre expressamente do disposto no artigo 154º do Código de Processo Civil que prevê que as decisões são sempre fundamentadas, sendo que a justificação não pode, em princípio, consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou oposição.
“Significa tal que não basta que o Juiz decida a questão que lhe é colocada, tornando-se indispensável que refira as razões que o levaram a ditar aquela decisão e não outra de sentido diferente; torna-se necessário que demonstre que a solução encontrada é legal e justa (Acórdão do STJ de 06/07/2017, disponível em www.dgsi.pt).
No entanto, não pode confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a primeira constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 615º citado.
A insuficiência ou mediocridade da motivação, como ensinava já o Prof. Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, Volume V, página 140) afecta o valor doutrinal da sentença, mas não produz nulidade.
No mesmo sentido se pronunciam A. Varela, M. Bezerra e S. Nora (Manual de Processo Civil, 2ª edição, 1985, página 670 672) ao consignarem que “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
No caso em apreço, a decisão recorrida especifica não só os factos em que se baseia como as razões de direito determinantes da decisão, não ocorrendo manifestamente falta absoluta de fundamentação, pelo que se não verifica a nulidade prevista na referida alínea a).
A questão suscitada pelo Recorrente prende-se, em nosso entender, com o disposto na alínea d) do referido preceito que prevê que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
Conforme já vimos na decisão recorrida foi homologado o plano junto aos autos sem qualquer menção ao Decreto-lei n.º 79/2017, já em vigor na data em que a mesma foi proferida, o qual não foi tido em consideração, não obstante ter aplicação imediata aos processos pendentes, antes tendo sido aplicadas normas na redacção anterior à introduzida por este diploma.
E a decisão recorrida, que homologou o plano, foi proferida sendo também completamente omissa quanto ao requerimento apresentado pelo Recorrente solicitando a sua não homologação.
Assim, e ainda que se nos afigure que sobre o requerimento sempre deveria ter recaído despacho, ainda que apenas sobre a sua intempestividade se fosse esse o entendimento da 1ª Instância, a verdadeira questão que aqui se coloca é se tal requerimento era tempestivo de forma a exigir que o juiz se pronunciasse sobre os fundamentos invocados para a não homologação do plano.
Conforme a este propósito se pronunciaram Carvalho Fernandes e João Labareda (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2ª edição, 2013, página 174), ainda que tendo por base o regime anterior à entrada em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017, coloca-se a “questão de saber quais as vias disponibilizadas aos interessados para agir em defesa da sua pretensão de recusa da homologação (…) No quadro descrito, apesar da omissão da lei não pode razoavelmente recusar-se ao interessado a faculdade de em requerimento autónomo dirigido ao tribunal (…) solicitar a não homologação (…)” podendo fazê-lo mesmo antes de concluído o processo de votação ou até conjuntamente com o exercício do seu direito de voto.
Também neste sentido se pronunciou Fátima Reis Silva (Processo Especial de Revitalização, Notas Práticas e Jurisprudência Recente, 2014, página 64 e seguintes) considerando que os dez dias a que se referia o nº 5 do artigo 17º - F não eram um prazo utilizável para requerer a não homologação e que não havia “necessidade de conhecer o resultado da votação para invocar as razões de não homologação que se achem pertinentes, bastando conhecer o conteúdo do plano”, podendo também o pedido ser formulado conjuntamente com o voto (negativo).
Assim, não se encontrando estipulado um prazo para requerer a não homologação, o pedido podia ser formulado em requerimento autónomo dirigido ao tribunal ou formulado conjuntamente com o voto (negativo), mas sempre antes de aprovado o plano.
Como referem também Carvalho Fernandes e João Labareda, em anotação ao artigo 216º (ob. cit. página 831), constitui pressuposto de atendibilidade do pedido que a oposição deduzida à aprovação do plano, seja manifestada anteriormente à aprovação do plano, devendo o processo documentar essa circunstância, seja por referência feita em acta de diligência processual ou requerimento atempadamente deduzido.
Era pois pressuposto para apreciação do pedido de recusa de homologação do plano que o mesmo fosse formulado anteriormente à aprovação do plano, sendo que do ponto de vista formal a aprovação do plano de recuperação só se poderá considerar perfeita com o encerramento da votação e subsequente contagem dos votos.
O Decreto-lei n.º 79/2017 veio agora dispor no n.º 1 do artigo 17º - F que até ao último dia do prazo de negociações a empresa deposita no tribunal a versão final do plano de revitalização sendo de imediato publicada no portal Citius a indicação do depósito e que no prazo de cinco dias subsequente à publicação, qualquer credor pode alegar o que tiver por conveniente quanto ao plano depositado pela empresa, designadamente circunstâncias susceptíveis de levar à não homologação do mesmo, dispondo a empresa de cinco dias após o termo do primeiro prazo para, querendo, alterar o plano em conformidade, e, nesse caso, depositar a nova versão (n.º 2).
E no n.º 3 veio estipular-se um prazo de votação de dez dias, a correr desde a publicação, prevendo-se expressamente que no seu decurso qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216.º, com as devidas adaptações.
No mesmo sentido, o nº. 2 do artigo 222º - F veio também estipular que concluindo-se as negociações com a aprovação (não unânime) de acordo de pagamento, o devedor remete-o ao tribunal, sendo de imediato publicado anúncio no portal Citius, e correndo desde a publicação o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216.º, com as devidas adaptações.
Prevê-se agora expressamente o prazo em que qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano.
Voltando ao caso concreto o Recorrente apresentou o seu requerimento em 29/06/2017 e a decisão foi proferida em 04/07/2017 sem que a Senhora Administradora tivesse junto aos autos documento onde conste a data em que conjuntamente com os devedores procedeu à abertura e contagem dos votos e com o respectivo resultado; apenas em momento posterior à notificação da sentença apresentou requerimento nos autos informando o resultado da votação, desconhecendo-se contudo a data em que conjuntamente com os devedores procedeu à abertura e contagem dos votos uma vez que não juntou aos autos a respectiva acta.
Do exposto se conclui que a decisão recorrida não só procedeu à homologação do plano sem ter em consideração que se encontrava já em vigor do Decreto-lei n.º 79/2017, com aplicação imediata aos processos pendentes, como não se pronunciou sobre o requerimento apresentado em 29/06/2017, não obstante no momento em que a decisão foi proferida não ser possível aferir da tempestividade do mesmo; isto é não se podendo saber se foi formulado antes da aprovação do plano uma vez que este só se pode considerar formalmente aprovado após a abertura e contagem dos votos, e nos autos não consta, no momento em que a decisão foi proferida, a data em que a Senhora Administradora juntamente com os devedores procedeu à abertura e contagem dos votos de forma a concluir pela aprovação do plano, uma vez que aquela não juntara ainda aos autos o respectivo documento.
Temos pois de concluir que a decisão recorrida não se pronunciou sobre questões que devia ter apreciado o que determina a sua nulidade nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil.
Decorre do artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil que ainda que declare nula a decisão o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação, isto é ainda que a Relação confirme a arguição de alguma das nulidades da sentença a que alude o artigo 615º, designadamente por omissão de pronúncia, deve prosseguir com a apreciação das demais questões que tenham sido suscitadas. A “anulação da decisão (v.g. por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objecto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários” (António Santos Abrantes Geraldes, recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª edição, 2014, página 277).
No presente recurso coloca-se por isso a questão de, não obstante declarar nula a sentença, se poder conhecer do pedido de não homologação do plano formulado pelo Recorrente bem como da apreciação das demais questões suscitadas.
No entanto, e quanto à pronuncia sobre o pedido de não homologação apresentado pelo Recorrente importa aferir da sua tempestividade; e conforme supra referido os autos não contém todos os elementos necessários a concluir se o mesmo foi ou não apresentado tempestivamente. E, por outro lado, a pronúncia sobre o requerimento de não homologação do plano apresentado em 29/06/2017 poderá tornar inútil o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso, sendo por isso a resolução daquela questão prejudicial ao conhecimento destas.
Em face do exposto impõe-se pois, julgar procedente o recurso, declarando nula a decisão recorrida nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil a qual deverá ser substituída por outra que, após audição dos interessados e sendo nesse sentido a vontade manifestada pelos Devedores, proceda à convolação dos presentes autos para Processo Especial Para Acordo de Pagamento e, averiguando da tempestividade do requerimento apresentado pelo Recorrente em 29/06/2017 decida se deve homologar o plano ou recusar a sua homologação nos termos solicitados.
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SUMÁRIO (artigo 663º n º7 do Código do Processo Civil):

I - O Decreto-lei n.º 79/2017 de 30 de Junho, entrado em vigor no dia 01 de Julho de 2017, veio limitar o recurso ao Processo Especial de Revitalização apenas para o devedor/empresa e consagrar um novo procedimento, o Processo Especial Para Acordo de Pagamento, para as situações em que o devedor, não sendo uma empresa, mas encontrando-se também comprovadamente em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, possa estabelecer negociações com os credores e concluir com estes um acordo de pagamento.
II. Ao criar um novo processo, pensado em termos essencialmente idênticos ao Processo Especial de Revitalização (conforme decorre da análise do seu regime previsto nos referidos artigos 222º - A a 222º - J), clarificando dessa forma a situação das pessoas singulares, que não devam ser consideradas empresa para este efeito, permitindo-lhes o acesso a este processo (e não apenas o recurso ao processo de insolvência), não foi intenção do legislador determinar a extinção dos Processos de Revitalização pendentes à data da sua entrada em vigor, e em que os devedores não sejam empresa, designadamente quando sejam pessoas singulares que não exerçam actividade profissional como agentes económicos, nada obstando a que o Processo Especial de Revitalização pendente à data da entrada em vigor Decreto-lei n.º 79/2017 possa ser convolado para Processo Especial Para Acordo de Pagamento.
III – Não constando da decisão recorrida qualquer pronuncia sobre o requerimento apresentado em 29/06/2017 solicitando a não homologação do plano, e não resultando dos autos, no momento em que a decisão foi proferida, que o mesmo não fosse tempestivo, é forçoso concluir que aquela não se pronunciou sobre questões que devia ter apreciado o que determina a sua nulidade nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil.
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IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, e, em consequência, declaram a nulidade da decisão recorrida nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do Código de Processo Civil, a qual deverá ser substituída por outra que, após audição dos interessados e sendo nesse sentido a vontade manifestada pelos Devedores, proceda à convolação dos presentes autos para Processo Especial Para Acordo de Pagamento e que, sendo esse o caso, averigúe da tempestividade do requerimento apresentado pelo Recorrente em 29/06/2017 e decida se deve recusar a homologação do plano nos termos solicitados ou proceder à sua homologação.
Custas pelos devedores/recorridos.

Guimarães, 23 de Novembro de 2017
Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária


(Raquel Baptista Tavares)
(Margarida Almeida Fernandes)
(Margarida Sousa)