Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
7071/17.9T8VNF-F.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: EXERCÍCIO DE DIREITOS SOCIAIS
NULIDADE DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
ORDEM DE CONHECIMENTO DAS EXCEPÇÕES DILATÓRIAS
COMPETÊNCIA MATERIAL
CUMULAÇÃO DE PEDIDOS
LEGITIMIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/14/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

“I- Na versão anterior do CPC, o legislador, no art. 510º, impunha que o conhecimento das excepções dilatórias devia ser efectuado de acordo com a ordem estabelecida no art. 288º (actual, art. 278º do CPC). Ora, embora o legislador do Novo CPC não tenha mantido expressamente essa ordem de conhecimento das excepções dilatórias, a verdade é que o conhecimento dos pressupostos processuais deve, obviamente, continuar a ser efectuado de acordo com uma determinada precedência lógica;

II- Assim, estando em causa várias excepções dilatórias que determinam a absolvição de instância, o Juiz deverá apreciar, em primeiro lugar, aquelas que digam respeito ao Tribunal (como é o caso da incompetência absoluta) e só depois aquelas que se reportem às partes, por ordem de gravidade (neste último caso, a ordem seria, por exemplo, a personalidade judiciária, a capacidade judiciária e legitimidade, pois não faz sentido apreciar se determinada entidade tem ou não legitimidade para intervir como autor ou réu numa dada acção quando a mesma não pode sequer ser parte numa causa, por não ter personalidade judiciária);

III- Se o Autor, invocando a qualidade de sócio e de gerente da Ré Sociedade, pretende que seja reconhecida a nulidade de deliberação social que o destituiu da função de gerente, deve-se entender o tribunal competente em razão da matéria é o Juízo de Comércio, porque a acção, nos termos em que mostra configurada por aquele na petição inicial, integra aquele tipo de acções relativa ao exercício de direitos sociais a que alude a al. c) do nº 1 do art. 128º da LOSJ.

IV. Se nessa mesma acção, o Autor deduz, de uma forma cumulada, um pedido subsidiário de indemnização fundado no facto de aquela destituição ter sido realizada sem justa causa, já aquele Tribunal não é materialmente competente para conhecer desse pedido, pois que, com ele, não se pretende exercer qualquer direito social, mas sim peticionar um direito de crédito, para o qual são competentes os Tribunais Cíveis.

V. Nesta situação, obstando o art. 37º, nº 1 do CPC (aplicável por força nº 2 do art. 554º do CPC) à cumulação desse pedido subsidiário, por força da aludida incompetência em razão da matéria do Tribunal do Comércio, a acção, quanto a tal pedido, não pode prosseguir e, nessa medida, deve a instância, quanto a ele, ser considerada extinta.

VI- A legitimidade para a instauração de uma acção de declaração de nulidade de uma deliberação social não se mostra atribuída em exclusivo aos sócios da Sociedade Comercial;

VII- Com efeito, à nulidade das deliberações sociais, enquanto negócios jurídicos, é aplicável o regime comum dos negócios jurídicos nulos, pelo que“ a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal” (art. 286º do CC). Nessa medida, entre os interessados (cfr. art. 30º do CPC) contam-se, além dos especialmente visados no art. 57º (órgãos de fiscalização da sociedade e gerente, caso aqueles não existam), os administradores das sociedades por acções, quaisquer sócios e alguns terceiros, desde que tenham interesse (processual) no litígio (por exemplo, os credores sociais, os trabalhadores da sociedade quando esteja em causa deliberação de distribuição de lucros fictícios, ou um gerente ou um membro do conselho fiscal, mesmo que não sócios, que tenham sido destituídos sem justa causa) ”.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

António veio interpor a presente acção declarativa de simples apreciação contra X design- Unipessoal, Lda., pedindo que a acção seja julgada procedente e por provada e, consequentemente:

I – ser reconhecida ao A. a qualidade de sócio da R. e detentor da totalidade dos € 5.000,00 que constituem o capital social da empresa;
II – ser declarada nula e de nenhum efeito a deliberação de destituição do A. como gerente, com invocação de justa causa, constante da Acta n.º 1 datada de 17/11/2014, por não ter sido realizada por via judicial, em violação expressa das disposições conjugadas subjacentes aos arts. 257.º/5, 56.º/d), 57.º/4, do Código das Sociedades Comerciais e por imposição do estipulado pelos arts. 980º e 981º, do Código Civil, com todos os efeitos legais, designadamente os inerentes ao estipulado pelo art. 286º, do Código Civil;
IIIainda que assim não se entenda, o que apenas como mera hipótese se equaciona,
-ser declarada nula e de nenhum efeito, a deliberação de destituição do A. como gerente, constante da Acta n.º 1 datada de 17/11/2014, por configurar abuso de direito, em violação expressa do disposto pelo art. 334.º do Código Civil e dos arts. 56.º/d) e 57.º/4, do Código das Sociedades Comerciais, com todos os efeitos legais, designadamente os inerentes ao estipulado pelo art. 286.º, do Código Civil;
IV – ser ordenado o cancelamento do registo comercial operado com base na deliberação constante da Acta n.º1 de destituição do A. da gerência da R.;
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(Não obstante e sem prescindir…- conforme decorre do item 76º da petição inicial)

V – dando como não fundamentados e não provados cada um dos argumentos invocados pela R. na Acta n.º 1 datada de 17/11/2014 para destituir o A. do cargo de gerente e considerando que esta destituição foi realizada sem justa causa, nos termos e para os efeitos do disposto pelo n.º 7 do art. 257.º do CSC e, consequentemente,
VI – condenando a R. a indemnizar o A. por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos e, assim, a pagar-lhe uma quantia global de € 99.620,20 (noventa e nove mil, seiscentos e vinte euros e vinte cêntimos), dos quais:

a) € 69.620,20 (sessenta e nove mil, seiscentos e vinte euros e vinte cêntimos), a título de danos patrimoniais;
b) € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais;
c) condenando a R. a pagar ao A. os juros vencidos sobre os danos patrimoniais sofridos que, desde 18/11/2014 e até à presente data, perfazem a quantia de € 8.239,98 (oito mil, duzentos e trinta e nove euros e noventa e oito cêntimos) e vincendos até efectivo e integral pagamento.
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A Ré veio apresentar contestação, onde invoca:

- a excepção de incompetência absoluta (em razão da matéria);

Alegando, para o efeito, que: “O pedido formulado, salvo melhor entendimento, não cabe no âmbito de nenhuma das alíneas supra enunciadas (do art. 128º da LOSJ), e como tal, cai fora do âmbito restrito de competência do Juízo de Comércio, que está especialmente vocacionado”.
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- e impugna os factos alegados pelo Autor na petição inicial.
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Replicou, ainda, o A. a fls. 218 e ss., formulando o seguinte pedido:

- que se julgue improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta invocada pela Ré.
Para esse efeito, alegou que a competência do Tribunal mostra-se atribuída pela al. c) do nº 1 do art. 128º da LOSJ.
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A fls. 245, o Tribunal Recorrido convidou as partes a pronunciarem-se sobre “a falta de legitimidade do Autor para interpor a presente acção pedindo a nulidade da deliberação social da X design- Unipessoal, Lda.”.
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Na sequência desse convite, as partes vieram pronunciar-se a fls. 255 e ss. e 259 e ss..
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Cumprido o princípio do contraditório, o Tribunal Recorrido proferiu, de seguida, a seguinte decisão:

“Pelo que, nos termos do disposto nos artigos 30º, nº1 e 2 e 288º, nº1, alínea d) CPC, o A. é parte ilegítima na presente demanda, o que se declara, determinando a consequente absolvição da R. da instância.
Custas pelo A- artigo 527º,nº2 CPC.
Registe e Notifique”.
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É justamente desta decisão que o Autor/Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“II – CONCLUSÕES

A) A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre um conjunto de factos e fundamentos alegados pelo A., ora Apelante, que se mostram essenciais para a presente demanda.
B) Para além do mais nada diz sobre o conjunto de pedidos formulados pelo A. na sua petição inicial.
C) De todo o petitório, a douta sentença pronuncia-se apenas quanto à questão da legitimidade do A., enquanto sócio, mas ignora por completo a qualidade de gerente que o mesmo também invoca na petição inicial em total contradição com o que, a final, acaba por decidir quando, para justificar a alegada ilegitimidade do A. refere “com os fundamentos que invoca tinha o A. interesse em interpor acção de simulação contra a sócia da Ré ou acção de indemnização por ter sido destituído de gerente sem fundamento legal, mas não vir pedir a nulidade da deliberação social e o reconhecimento da sua qualidade de detentor da totalidade do capital social da R.”
D) Para além do mais, em sede de contestação, a R. invocou a excepção dilatória da incompetência absoluta do tribunal a quo, em razão da matéria, para conhecer do presente litígio, não obstante o A. ter considerado que tal excepção é manifestamente improcedente por se tratar de matéria enquadrada no disposto pela al. c) do art. 128.º da Lei n.º 62/2013, acções relativas ao exercício de direitos sociais e, nesses termos, da competência das secções de comércio. No entanto, sobre esta questão, desconhece-se em absoluto a posição do próprio Tribunal.
E) A incompetência material (incompetência absoluta) é uma excepção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à remessa dos autos para o tribunal competente, caso o primeiro se considere incompetente para a julgar, pelo que a omissão de pronúncia sobre esta questão é manifestamente essencial.
F) A douta sentença não se pronunciou sobre todos os pedidos formulados pelo A., considerando-os procedentes (como deveria) ou não procedentes, não obstante não poderem ser considerados prejudiciais relativamente à questão da (i)legitimidade decidida.
G) Tais omissões enquadram-se no vício de omissão de pronúncia previsto na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC ou quando assim não se entenda deverão ser sempre consideradas erro de julgamento, por violação expressa do disposto pelo n.º 2 do art. 5.º e do n.º 4 do art. 607.º do CPC, cuja correcção se requer seja realizada por este Venerando Tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto pelos n.º 1 e n.º 2, al. c) do art. 662.º do CPC,
H) Considerando tais factos e fundamentos como provados ou anulando a decisão, nos termos legalmente previstos pelos normativos citados.
I) Na douta sentença recorrida, o Tribunal a quo reduz todo o petitório do A. ao pedido de “declaração de nulidade de deliberação social que o destituiu de gerente da X design.”
J) No caso ora em apreço, o A. intervém, como se viu, na qualidade de sócio, pedindo o seu reconhecimento formal e a declaração de nulidade da deliberação supra identificada e, também, na qualidade de gerente, através da qual requer a apreciação da destituição operada pela R. e formula um pedido de indemnização por inexistência de justa causa, com todas as legais e inerentes consequências.
K) O tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com excepção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. A falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso constitui omissão de pronúncia.
L) Toda a prova produzida, com especial relevo para a prova documental que instruiu a petição inicial apresentada pelo A. e os seus requerimentos subsequentes impõe que os fundamentos alegados pelo A. sejam considerados procedentes por provados os factos a estes subjacentes, alterando-se, em conformidade, a decisão proferida, nos termos do disposto pelo referido n.º 1 do art. 662.º do CPC.
M) O Tribunal a quo não se pronunciou sobre toda a factualidade supra invocada, bem como sobre o petitório do A., pelo que, nos termos e para os efeitos do disposto pela al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, a decisão recorrida está ferida de nulidade por omissão de pronúncia, com todas as consequências legais.
N) De harmonia com o disposto no n.º 4 do art. 607.º do CPC, “na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência.”
O) Da análise do teor da sentença recorrida é por demais evidente que o dever de fundamentação subjacente à norma supra citada não foi respeitado pelo Tribunal a quo.
P) No caso sub judice, a sentença recorrida limitou-se a conhecer da questão da legitimidade do A. enquanto sócio, fazendo “tábua rasa” da prova documental produzida e desconsiderando toda a matéria de facto articulada pelo A.
Q) Por outro lado, na fundamentação da decisão também não foram explicitados os meios probatórios que se revelaram fundamentais para a formação da convicção do Juiz, não satisfazendo a exigência legal subjacente ao normativo constante do citado n.º 4 do art. 607.º, do CPC.
R) A omissão de tal formalidade constitui nulidade processual, com todas as legais consequências.
S) Conjuntamente com o pedido de reconhecimento da sua qualidade de sócio e de nulidade da deliberação social supra referida, o A. deduziu um pedido de indemnização contra a R. por destituição do cargo de gerente sem justa causa, pelo que, não obstante a omissão de pronúncia sobre esta questão, o Tribunal a quo, em total e flagrante contradição com a fundamentação exposta na douta sentença, entende que o A. tem “interesse em interpor acção de indemnização por ter sido destituído de gerente sem fundamento legal”.
T) Existe, assim, uma contradição inegável e flagrante entre a fundamentação exposta e a decisão tomada a final, sendo a mesma causa de nulidade nos termos e para efeitos do disposto pela alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, ou, quando menos, erro de julgamento, que a Relação pode e deve suprir, nos termos legais.
U) Acresce que, a douta sentença, para além de não se ter pronunciado sobre factos essenciais, fundamentos e pedidos alegados pelo A., julgando-os provados pelos motivos que ficaram esboçados, de ter omitido a necessária e legal fundamentação e de ter incorrido na apontada contradição incorreu ainda em erro de julgamento ao considerar o A. parte ilegítima na presente demanda.
V) Desde logo porque desconsiderou todo o quadro factual supra exposto e explicitado pelo A. na sua petição inicial.
W) Depois porque desconsiderou toda a prova documental produzida e especificamente o teor dos documentos juntos pelo A. nos quais a R. expressamente confessa, aceita e reconhece ao A. a qualidade de sócio e que, por si só, o legitimam a ser parte no presente litígio, em pleno gozo da relação de socialidade com a R. que a própria lhe reconhece.
X) A apreciação judicial sub judice deverá ser sempre considerada erro de julgamento, por violação expressa do disposto pelo n.º 2 do art. 5.º e do n.º 4 do art. 607.º do CPC, cuja correcção se requer seja realizada por este Venerando Tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto pelos n.º 1 e n.º 2, al. c) do art. 662.º do CPC.
Y) A prova produzida, com especial relevo para a prova documental que instruiu a petição inicial apresentada pelo A. e os seus requerimentos subsequentes impõe que os fundamentos alegados pelo A. sejam considerados procedentes por provados os factos a estes subjacentes, alterando-se, em conformidade, a decisão proferida, nos termos do disposto pelo referido n.º 1 do art. 662.º do CPC.
Z) Assim o determina a confissão realizada pela Ré, bem como pela sua sócia gerente, patente no teor dos documentos juntos como Doc. 26 a 30 da petição inicial, especificamente nas peças processuais das quais se juntou a correspondente certidão (cfr. requerimento datado de 23 de Janeiro de 2018, com a referência 27985283), patentes nos Doc. 29 e 30.
AA) É a própria Ré quem reconhece ao A. a qualidade de sócio, por confissão expressa.
BB) A confissão realizada pela R., bem como pela sua sócia gerente, S. M., de que o A., ora Apelante, é proprietário de 50% do capital social da X design Unipessoal, Lda., ora Apelada nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 358.º do Código Civil (e ainda que tenha que considerar-se extrajudicial porque proferida no âmbito de outro processo), através de mandatário com procuração outorgada com poderes especiais para, designadamente, confessar (nos termos da procuração junta em anexo a cada uma das peças processuais referidas) tem força probatória plena, é um facto inquestionável, que não poderá estar sujeito a diferentes interpretações porque se revela claro e cristalino!
CC) A confissão expressa da R. e o reconhecimento da qualidade de sócio do A., ora Apelante, que a própria realiza determinam o reconhecimento formal de tal qualidade pelo Tribunal!
DD) Assim o impõe também o n.º 4 do art. 607.º do CPC!
EE) Ao decidir do modo referido, o Tribunal a quo violou expressamente as normas reguladoras da força probatória plena que os documentos supra referidos possuem, especificamente o disposto pelo n.º 2 do art. 358.º do Código Civil, ignorando por completo o teor dos documentos juntos pelo A..
FF) Nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 30.º do CPC, o Autor é parte legítima quando tem interesse em demandar, aferindo-se tal interesse pela “utilidade derivada da procedência da acção” (cfr. n.º 2 do citado normativo), bem como, conforme o n.º 2 do art. 362.º do CPC refere, num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor.
GG) No caso sub judice, o interesse do A., ora Apelante, advém de um direito existente, cujo reconhecimento formal foi requerido ao Tribunal, mas que é igualmente reconhecido pela própria R., ora Apelada!
HH) Quanto ao mais, o Tribunal desconsiderou toda a factualidade alegada pelo A. na sua petição inicial e comprovada pela documentação anexa.
II) A este propósito são especialmente relevantes os factos articulados nos arts 1. a 44. da petição inicial.
JJ) Destarte é por demais evidente que o A. é parte legítima na presente demanda, contrariamente ao doutamente decidido pelo Tribunal a quo, pelo que deverá tal decisão ser revogada, por erro de julgamento.
KK) O reconhecimento da qualidade de sócio ao A. impõe ainda que a deliberação constante da Acta n.º 1 datada de 17 de Novembro de 2014 lhe deveria ter sido comunicada, o que não aconteceu, estando assim esta deliberação ferida de nulidade atento o preceituado pelos artigos 56º, nº 1, alínea d), do CSC.
LL) Para além do mais, a decisão foi tomada em Assembleia Geral não convocada e da qual o A. nunca teve conhecimento prévio (subjacente a esta deliberação está, assim, um vício de formação, penalizado com a nulidade da mesma, nos termos e para os efeitos do disposto pela al. a) do art. 56.º do CSC).
MM) Admitindo a sócia gerente da R. que o A. é proprietário de 50% da empresa (conforme se referiu e comprovou), a sua destituição como gerente e a eventual exclusão como sócio teria necessariamente que respeitar o disposto pelo n.º 5 do art. 257.º do CSC, bem como o estipulado pelo art. 1003.º do Código Civil, o que não aconteceu.
NN) Em suma, considerando o A. parte legítima deverá a decisão recorrida ser revogada, com todas as legais consequências.

NESTES TERMOS E, NOS MELHORES DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS MUI DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE A PRESENTE APELAÇÃO SER JULGADA TOTALMENTE PROCEDENTE, REVOGANDO-SE A SENTENÇA ORA RECORRIDA”.
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Foram apresentadas contra-alegações, onde a Ré pugna pela manutenção da decisão recorrida.
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O Tribunal Recorrido limitou-se a admitir o recurso, não se tendo pronunciado sobre as nulidades invocadas.
Ponderando a indispensabilidade da sua audição, considera-se que não se justifica, atenta a decisão proferida e as questões que são colocadas, determinar que o Tribunal Recorrido se pronuncie sobre as invocadas nulidades (cfr. art. 617º, nº 5 do CPC).
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, o Recorrente coloca as seguintes questões que importa apreciar:

I)-omissão de pronúncia (art. 615, nº1, al. d) do CPC), com os seguintes fundamentos:

a. o Tribunal Recorrido omitiu totalmente a pronúncia sobre a excepção dilatória da incompetência absoluta do tribunal, em razão da matéria, para conhecer do presente litígio, expressamente invocada nos autos;
b. o Tribunal Recorrido omitiu totalmente a pronúncia sobre toda a factualidade alegada e sobre todos os pedidos formulados pelo A., considerando-os procedentes ou não procedentes, não obstante não poderem ser considerados prejudiciais relativamente à questão da (i)legitimidade decidida.
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- o dever de fundamentação na fundamentação da decisão e o dever de explicitar os meios probatórios que se revelaram fundamentais para a formação da convicção do Juiz (subjacente ao disposto no art. 607º, nº 4 do CPC) não foi respeitado pelo Tribunal a quo na decisão recorrida.
*
- Existe uma contradição entre a fundamentação e a decisão tomada a final, sendo a mesma causa de nulidade nos termos e para efeitos do disposto pela alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC

Alega que, conjuntamente com o pedido de reconhecimento da sua qualidade de sócio e de nulidade da deliberação social, deduziu um pedido de indemnização contra a R. por destituição do cargo de gerente sem justa causa, pelo que, não obstante a omissão de pronúncia sobre esta questão, o Tribunal a quo, em total e flagrante contradição com a fundamentação exposta na douta sentença, entende que o A. tem “interesse em interpor acção de indemnização por ter sido destituído de gerente sem fundamento legal”.
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- o Tribunal Recorrido incorreu ainda em erro de julgamento ao considerar o A. parte ilegítima na presente demanda, desde logo, porque desconsiderou todo o quadro factual alegado pelo A. na sua petição inicial.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Os factos relevantes para a apreciação e decisão do presente recurso são os que constam do relatório elaborado.
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Cumpre decidir.
Comecemos por analisar a questão da omissão de pronúncia imputada ao Tribunal Recorrido.
Segundo o disposto no art. 615º, nº 1 al. d), do CPC é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Interessa-nos, no caso concreto, apenas a primeira hipótese, ou seja, a omissão de pronúncia.
Como é sabido, a previsão deste art. 615º, nº 1, al. d) do CPC está em consonância com o comando do nº 2 do art. 608º do mesmo Código, em que se prescreve que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».

De uma forma pacífica, vem-se entendendo que, nestas situações, importa não confundir questões colocadas pelas partes, com os argumentos ou razões, que estas esgrimem em ordem à decisão dessas questões neste ou naquele sentido. As questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
Coisa diferente das questões a dirimir/decidir são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do art. 608º, n.º 2 do CPC; assim, se na apreciação de qualquer questão submetida ao conhecimento do julgador, este não se pronuncia sobre algum ou alguns dos argumentos invocados pelas partes, tal omissão não constitui uma qualquer nulidade da decisão por falta de pronúncia (1).
A não apreciação de algum argumento ou razão jurídica invocada pela parte pode, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões suscitadas; porém, daí apenas pode decorrer um, eventual, erro de julgamento (error in iudicando), mas já não um vício (formal) de omissão de pronúncia.

Efectuadas estas distinções, importa reverter para o caso concreto.

Ora, compulsados os autos, constata-se que, tendo sido invocada expressamente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria do Tribunal Recorrido para conhecer da presente acção, este omitiu completamente a pronúncia sobre essa excepção, limitando-se a proferir decisão sobre o pressuposto processual da legitimidade, excepção dilatória essa que, após cumprimento do princípio do contraditório, veio a conhecer oficiosamente.
Importa dizer que não se compreende a decisão do Tribunal Recorrido.

Na verdade, é perfeitamente pacífico, mesmo à luz do novo CPC, que a aferição da verificação dos pressupostos processuais deve obedecer a uma ordem lógica do seu conhecimento.

Como é sabido, na versão anterior do CPC, o legislador, no art. 510º, evidenciava essa necessidade de dar obediência a essa ordem, quando impunha que o conhecimento das excepções dilatórias devia ser efectuado de acordo com a ordem estabelecida no art. 288º (actual, art. 278º do CPC).
Ora, embora o legislador do Novo CPC não tenha mantido expressamente essa ordem de conhecimento das excepções dilatórias, a verdade é que o conhecimento dos pressupostos processuais deve, obviamente, continuar a ser efectuado de acordo com determinada ordem.

Na verdade, “…em sede de apreciação de questões processuais existe uma precedência lógica que o Juiz deverá respeitar, conforme previsto no art. 608º, nº 1 do CPC.
Assim, deverá começar por decidir as excepções dilatórias que imponham a remessa do processo para outro Tribunal e só depois as que dão lugar à absolvição de instância…

Do mesmo modo, estando em causa várias excepções dilatórias que determinam a absolvição de instância, o Juiz deverá apreciar, em primeiro lugar, aquelas que digam respeito ao Tribunal (como é o caso da incompetência absoluta) e só depois aquelas que se reportem às partes, por ordem de gravidade (neste último caso, a ordem seria, por exemplo, a personalidade judiciária, a capacidade judiciária e legitimidade, pois não faz sentido apreciar se determinada entidade tem ou não legitimidade para intervir como autor ou réu numa dada acção quando a mesma não pode sequer ser parte numa causa, por não ter personalidade judiciária) …” (2).

Tudo isto, aliás, é absolutamente inquestionável, como decorre do exposto, quanto ao pressuposto processual da competência do Tribunal, pois, como já referia Lopes do Rego, existindo “… uma ordem de procedência lógico-jurídica entre vários pressupostos em falta (v. g. a competência do Tribunal, que naturalmente precede a apreciação de outras quaisquer questões) deverá o Tribunal apreciá-lo em primeiro lugar” (3).

Assim, tal como sucedia no anterior CPC, a excepção de incompetência absoluta (competência em razão da matéria), pela sua própria natureza, terá que necessariamente ser a primeira excepção dilatória a ser conhecida, pois que da sua decisão decorre a própria competência do Tribunal para decidir a acção em obediência aos critérios de especialização das matérias que o legislador entendeu merecerem especial configuração- como iremos ver mais à frente.

Ora, acontece que o Tribunal Recorrido, não dando obediência a este comando legislativo, optou- já se vê que mal- por decidir, de uma forma oficiosa, que se verificava uma situação de ilegitimidade activa do Autor para deduzir as pretensões que apresentou na presente acção, sem previamente se pronunciar sobre a excepção de incompetência em razão da matéria que havia sido expressamente invocada (e discutida pelas partes) nos articulados.

Como se referiu, esta opção do Tribunal viola a lei processual que impõe (continua a impor) uma precedência lógica de conhecimento dos pressupostos processuais, e não encontra apoio em qualquer outro preceito processual que permitisse a decisão proferida- o nº 3 do art. 278º do CPC (que não foi invocado pelo Tribunal Recorrido) não tem aqui aplicação por não estarem verificados os respectivos pressupostos (desde logo, porque a excepção de incompetência absoluta não visa tutelar o interesse de qualquer das partes- 1º requisito do aludido preceito legal- pois que “visa tutelar o interesse público na boa administração da justiça”).

Aqui chegados, pode-se, assim, concluir que, além de ter omitido completamente a pronúncia sobre a excepção de incompetência absoluta do Tribunal, expressamente invocada pelas partes (e que, de qualquer forma, seria de conhecimento oficioso- art. 97º, nº 1 do CPC), o Tribunal Recorrido violou frontalmente a já referida precedência lógica de conhecimento das excepções dilatórias.

A consequência desta conduta processual do Tribunal Recorrido é a indicada pelo Recorrente, ou seja, a omissão de pronúncia constitui uma nulidade da decisão nos termos da al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC (cfr. nº 2 do art. 608º do CPC).

Sucede que decorre do disposto no art. 665º do CPC que, “ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o Tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação…”.

Decorre, pois, deste preceito legal que o legislador impõe, quanto às consequências ou procedimento subsequente à constatação da nulidade, por razões de economia processual, e desde que o processo contenha todos os elementos necessários, que, em princípio, se cumpra a regra da substituição ao Tribunal Recorrido (v. epígrafe do art. 665º, nº 1 do CPC), ao invés da regra do reenvio do processo ao Tribunal Recorrido para colmatar as omissões.
Assim, ainda que o presente Tribunal tenha confirmado a arguição da nulidade da decisão proferida, por omissão de pronúncia, a consequência dessa constatação não impõe a remessa do Tribunal Recorrido para suprir aquela omissão.

Na verdade, se o processo contiver todos os elementos necessários que permitam a pronúncia do Tribunal da Relação, devem os autos prosseguir na presente Instância, com a apreciação da matéria cuja pronúncia foi omitida (e demais questões que tenham sido levantadas), na medida em que a(s) mesma(s) possam ser conhecidas, por que o processo contém os elementos necessários a que essa pronúncia possa ser efectuada.

Com efeito, só na eventualidade de assim não acontecer é que “se justifica a devolução do processo para o Tribunal a quo” (4).

Ora, no caso concreto, tendo sido constatada a omissão de pronúncia do tribunal Recorrido- quanto à incompetência absoluta do Tribunal invocada pelas partes- não se pode deixar de concluir que o processo contém todos os elementos necessários que permitem que o Tribunal se possa pronunciar sobre a identificada excepção dilatória.

Assim sendo, no cumprimento da aludida regra da substituição ao Tribunal Recorrido, impõe-se que o presente Tribunal entre na referida “tarefa” de substituição, suprindo a nulidade da decisão quanto a essa omissão de pronúncia- que é o que iremos efectuar de seguida.
*
Conforme resulta dos autos, foi invocada expressamente a excepção de incompetência absoluta do Tribunal para conhecer da presente acção.

Invoca-se que o pedido formulado não cabe no âmbito de nenhuma das alíneas supra enunciadas (do art. 128º da LOSJ), e, como tal, cai fora do âmbito restrito de competência do Juízo de Comércio.

Cumpre decidir.

Como é sabido, a incompetência material do tribunal – incompetência absoluta – constitui uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição do réu da instância (arts. 60º, nº 2, 96º, 97º, 99º, nº 1, 278º, nº 1, al. a), 576º, nºs 1 e 2 e 577º, al. a), todos do CPC).
A competência do tribunal, como já vimos, constitui um pressuposto processual, sendo, assim, um dos elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz proferir decisão sobre o pedido formulado, concedendo ou indeferindo a pretensão deduzida.
A competência, como qualquer outro pressuposto processual, é aferida em relação ao objecto apresentado pelo autor (pedido e causa de pedir).
Na verdade, para decidir qual das normas corresponde a cada um dos “índices” de competência, deve olhar-se aos termos em que foi posta a acção, isto é, há que atender, apenas, ao modo como o autor delineia o pleito na petição inicial, quer quanto aos elementos objectivos – causa de pedir e pedido –, quer quanto aos elementos subjectivos – identidade dos sujeitos.

Assim, a competência afere-se pelo pedido do autor, sendo uma questão a resolver, unicamente, de acordo com os termos da sua pretensão (compreendidos, aí, os respectivos fundamentos) (5).
Como é sabido, a competência em razão da matéria contende com as diversas espécies de tribunais, comuns ou especiais, estatuindo-se as normas delimitadoras da jurisdição desses tribunais de acordo com a matéria ou o objecto do litígio.

Nos termos do art. 65º do CPC (cfr. art. 40º, nº 2 da LOSJ) são as leis de organização judiciária que determinam quais as causas que, em razão da matéria, são da competência dos tribunais judiciais dotados de competência especializada, sendo que, se a matéria da causa não se integrar em qualquer um daqueles Tribunais especializados, a causa é da competência do Juízo Local ou de competência genérica, que assumem uma competência residual.

Com efeito, lê-se na al. a) do nº 1 do art. 130º da LOSJ que “…Os juízos locais cíveis… e de competência genérica possuem competência na respectiva área territorial, tal como definida em decreto-lei, quando as causas não sejam atribuídas a outros juízos ou tribunal de competência territorial alargada … “ (cfr. também art. 80º da LOSJ).

Por outro lado, ainda nesta matéria cível, importa ter em consideração o disposto no art. 117.º onde se estabelece que:

“1 - Compete aos juízos centrais cíveis:
a) A preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de processo comum de valor superior a (euro) 50 000,00;
(…)
2 - Nas comarcas onde não haja juízo de comércio, o disposto no número anterior é extensivo às acções que caibam a esses juízos”.

Assim, no plano interno, o poder jurisdicional divide-se por diversas categorias de tribunais – que se situam no mesmo plano horizontal –, de acordo com a natureza da matéria das causas.
Na base da competência em razão da matéria está o princípio da especialização, com o reconhecimento da vantagem de reservar para órgãos judiciários diferenciados o conhecimento de certos sectores do Direito, pela vastidão e pela especificidade das normas que os integram.
Trata-se, assim, de uma competência “ratione materiae”: a instituição de diversas espécies de tribunais e da demarcação da respectiva competência obedece a um princípio de especialização, com as vantagens que lhe são inerentes (6).
“Na verdade, a especificidade ou a complexidade de determinadas matérias justificam a existência de tribunais e secções de competência especializada… “ (7).
*
Aqui chegados, importa analisar o caso concreto, dentro destes princípios atrás enunciados.

Conforme decorre do exposto, e do teor da decisão que constitui o objecto do Recurso, o Tribunal Recorrido omitiu completamente a sua pronúncia sobre a invocada excepção de incompetência em razão da matéria.
No entanto, tendo em conta a assinalada precedência lógica de conhecimento das excepções, devia, antes de se ter pronunciado sobre a legitimidade das partes, ter apreciado aquela excepção dilatória.

Como se referiu, incumbe ao presente Tribunal sanar tal nulidade da decisão proferida, pelo que, nessa medida, importa, pois, que o presente Tribunal se pronuncie sobre a competência, em razão da matéria do Tribunal Recorrido (Tribunal de Comércio) para decidir a presente acção, tendo em conta os argumentos apresentados pelas partes e o assinalado princípio de que a competência afere-se pelo pedido do autor, sendo uma questão a resolver, unicamente, de acordo com os termos da sua pretensão (compreendidos, aí, os respectivos fundamentos).

Conforme resulta do relatório do presente Acórdão, o Autor na presente acção formula os seguintes pedidos cumulados- cfr. art. 555º do CPC:

I – ser reconhecida ao A. a qualidade de sócio da R. e detentor da totalidade dos € 5.000,00 que constituem o capital social da empresa;
II – ser declarada nula e de nenhum efeito a deliberação de destituição do A. como gerente, com invocação de justa causa, constante da Acta n.º 1 datada de 17/11/2014, por não ter sido realizada por via judicial, em violação expressa das disposições conjugadas subjacentes aos arts. 257.º/5, 56.º/d), 57.º/4, do Código das Sociedades Comerciais e por imposição do estipulado pelos arts. 980º e 981º, do Código Civil, com todos os efeitos legais, designadamente os inerentes ao estipulado pelo art. 286º, do Código Civil;

Além destes pedidos (principais), formula ainda os seguintes pedidos subsidiários- art. 554º do CPC (para o caso de não procederem aqueles primeiros pedidos- o que decorre da expressão utilizada “ainda que assim não se entenda, o que apenas como mera hipótese se equaciona”)
-ser declarada nula e de nenhum efeito, a deliberação de destituição do A. como gerente, constante da Acta n.º 1 datada de 17/11/2014, por configurar abuso de direito, em violação expressa do disposto pelo art. 334.º do Código Civil e dos arts. 56.º/d) e 57.º/4, do Código das Sociedades Comerciais, com todos os efeitos legais, designadamente os inerentes ao estipulado pelo art. 286.º, do Código Civil;
IV – ser ordenado o cancelamento do registo comercial operado com base na deliberação constante da Acta n.º1 de destituição do A. da gerência da R.;
*
Deduz, finalmente, os seguintes pedidos subsidiários (8)- o que decorre da expressão “Não obstante e sem prescindir…”- conforme decorre do item 76º da petição inicial)

V – dando como não fundamentados e não provados cada um dos argumentos invocados pela R. na Acta n.º 1 datada de 17/11/2014 para destituir o A. do cargo de gerente e considerando que esta destituição foi realizada sem justa causa, nos termos e para os efeitos do disposto pelo n.º 7 do art. 257.º do CSC e, consequentemente,
VI – condenando a R. a indemnizar o A. por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos e, assim, a pagar-lhe uma quantia global de € 99.620,20 (noventa e nove mil, seiscentos e vinte euros e vinte cêntimos), dos quais:
a) € 69.620,20 (sessenta e nove mil, seiscentos e vinte euros e vinte cêntimos), a título de danos patrimoniais;
b) € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais;
c) condenando a R. a pagar ao A. os juros vencidos sobre os danos patrimoniais sofridos que, desde 18/11/2014 e até à presente data, perfazem a quantia de € 8.239,98 (oito mil, duzentos e trinta e nove euros e noventa e oito cêntimos) e vincendos até efectivo e integral pagamento.
*
A questão que se coloca, então, é a de saber, se tendo em conta os pedidos formulados e os fundamentos invocados pelo Autor (independentemente do mérito que os mesmos venham a obter), se pode entender que o Tribunal de Comércio é competente para os apreciar.

Ora, decorre do nº 1 do art. 128º da LOSJ que essa competência tem o seguinte âmbito:

“…1 - Compete aos juízos de comércio preparar e julgar:

a) Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização;
b) As acções de declaração de inexistência, nulidade e anulação do contrato de sociedade;
c) As acções relativas ao exercício de direitos sociais;
d) As acções de suspensão e de anulação de deliberações sociais;
e) As acções de liquidação judicial de sociedades;
f) As acções de dissolução de sociedade anónima europeia;
g) As acções de dissolução de sociedades gestoras de participações sociais;
h) As acções a que se refere o Código do Registo Comercial;
i) As acções de liquidação de instituição de crédito e sociedades financeiras. …”.
*
Ora, ponderada cada uma das destas alíneas, julga-se que, tendo em conta os pedidos formulados pelo Autor (com excepção, como a seguir referiremos, do pedido formulado quanto à apreciação da inexistência de justa causa para a destituição como gerente e respectiva indemnização), não podem existir dúvidas que a competência, em razão da matéria, se fixará no Juízo de Comércio.

Com efeito, não há dúvidas que, independentemente da apreciação dos demais pressupostos processuais e, principalmente, do mérito da pretensão do Autor (e da prova dos factos alegados), olhando para os pedidos formulados (e para as respectivas causas de pedir), a competência em razão da matéria se deve fixar no Tribunal Recorrido, pois que o Autor, invocando a qualidade de sócio e de gerente da Ré, pretende que seja reconhecida a nulidade da deliberação social e, nesse sentido, a acção, nos termos em que é configurada pelo A., integra aquele tipo de acções relativa ao exercício de direitos sociais a que alude a citada al. c) do nº 1 do art. 128º da LOSJ (9).

Numa primeira perspectiva, os direitos sociais podem ser vistos como uma das manifestações da situação ou posição jurídica (conjunto de direitos, deveres, ónus, expectativas jurídicas) dos sócios perante a sociedade.

Nesta linha de entendimento, o direito social traduz sempre a situação jurídica de quem participa numa sociedade, titular do direito social é o sócio e pressuposto dessa titularidade é a existência de uma sociedade, a cujo corpo ele pertence.
Mas, sendo os sócios os sujeitos do contrato de sociedade, os direitos sociais não se esgotam na sua titularidade, desde logo, porque, gozando as sociedades de personalidade jurídica, será difícil recusar a qualificação de sociais aos direitos de que ela, uma vez constituída, é titular e que emergem especificamente do contrato de sociedade ou da lei societária (imperativa ou meramente supletiva).

Assim, uma vez constituída a sociedade, titulares dos direitos sociais tanto podem ser os sócios, como a própria sociedade; logo, os direitos sociais são os direitos cuja matriz, directa e imediatamente, se funda na lei societária (lei que estabelece o regime jurídico das sociedades comerciais) e/ou no contrato de sociedade.

Mas, além da sociedade e dos sócios, a verdade é que os credores sociais e terceiros, como o órgão de fiscalização ou o gerente (cf., v. g., os arts. 57º, 78º e 79º do CSC), podem também ser titulares de direitos sociais, porque expressamente conferidos pela lei societária (se o não forem pelo contrato de sociedade) (10).
No fundo, a competência dos tribunais de comércio prende-se com questões relacionadas com a actividade das sociedades comerciais.
Ademais, na atribuição de competência especializada aos Juízos de Comércio para preparar e julgar as acções relativas ao exercício dos direitos sociais e que têm por objecto questões relacionadas com a actividade das sociedades comerciais, releva a circunstância de estarmos perante matérias que exigem especial preparação técnica e sensibilidade e envolvem dificuldades/complexidades que podem repercutir-se também na respectiva solução.

Nesta conformidade, importa, pois, concluir, sem necessidade de mais alongadas considerações, que deve, aqui, declarar-se que o Juízo de Comércio, com excepção dos referidos (últimos) pedidos, é o Tribunal competente em razão da matéria para conhecer da presente acção.

Com efeito, a competência material incumbe ao Juízo de Comércio (art. 128º, nº 1 e nº 3 da LOSJ), e não às Instâncias Cíveis, que só teriam competência residual, caso a matéria aqui em discussão não integrasse a competência daquele Tribunal.

Aqui chegados, importa, no entanto, ressalvar dessa competência, a parte do pedido correspondente às pretensões do Autor relativas à eventual declaração de que inexiste justa causa para a sua destituição como gerente (e respectiva indemnização) – pedidos subsidiários formulados sob as als. V) e VI) do petitório.
Em primeiro lugar, importa dizer que se julga que estes pedidos terão sido mal interpretados pelo Tribunal Recorrido (quando sobre eles se pronuncia no âmbito do pressuposto da legitimidade).
Na verdade, conforme resulta do exposto, o Autor formula este pedido apenas a título subsidiário e não o formula como decorrência do pedido principal de declaração da nulidade da deliberação social.

Com efeito, o pressuposto da sua dedução é justamente o contrário.

Ou seja, entende o Autor que, para o caso de se julgar que a deliberação (de destituição de gerente) não é nula, então sempre se deve considerar que tem direito a uma indemnização com fundamento no facto de aquela destituição ter sido realizada sem justa causa.
Ora, sendo essa a pretensão do Autor, fica obviamente sem sentido a afirmação proferida pelo Tribunal Recorrido de que o A., em vez desta acção, teria “interesse em interpor acção de indemnização por ter sido destituído de gerente sem fundamento legal”- ficando também esclarecido, por esta via, que inexiste o vício invocado de contradição entre a fundamentação e a decisão tomada a final- que seria causa de nulidade nos termos e para efeitos do disposto pela alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC-, pois que tal resulta apenas do manifesto lapso existente na interpretação do pedido formulado pelo Autor.

Finalmente, importa dizer que o facto de os aludidos pedidos subsidiários serem substantivamente incompatíveis com os pedidos principais formulados não obsta à sua dedução, pois que tal admissão decorre do disposto no nº 2 do art. 554º do CPC.

Na verdade, “… a incompatibilidade substantiva entre pedido principal e pedido subsidiário não obsta à sua dedução, sendo essa até a situação normal: a contraditoriedade entre os pedidos explica, precisamente, que eles sejam deduzidos de modo a que só um possa ser atendido pelo Tribunal” (11).

O que obstará, como iremos ver, a essa cumulação será, antes, o facto de se verificar uma das “circunstâncias que impedem a coligação de autores e réus” (2ª parte do nº 2 do art. 554º do CPC) - no caso, a incompetência em razão da matéria aferida em função dos aludidos pedidos subsidiários.
Esclarecido este ponto, importa, então, entrar nesta questão da competência do Tribunal para apreciar estes pedidos formulados, a título subsidiário, pelo Autor.
Na verdade, quanto a estes pedidos, entendemos que o Tribunal de Comércio não é competente em razão da matéria.

Com efeito, com esses pedidos (subsidiários), o Autor já não pretende exercer qualquer direito social, mas sim peticionar um direito de crédito.
Tal decorre do facto de se poder constatar que a pretensão subsidiária do Autor consiste em pedir uma indemnização com fundamento de, na qualidade de gerente, ter sido destituído das suas funções sem justa causa.
Ora, uma acção que tenha por objecto esta pretensão não é da competência do Tribunal Comércio, mas sim dos Tribunais Cíveis, pois que tal pretensão já não contende com o exercício de direitos sociais (nem com qualquer outra das alíneas que definem o âmbito da competência dos Juízos de Comércio).

Com efeito, como refere Paulo Olavo Cunha (12) deve-se estabelecer aqui uma diferença entre direito de crédito e direito social, chamando a atenção para o facto de não deverem, necessariamente, ser dirimidas pelo Tribunal do Comércio, todas as acções judiciais que envolvam as sociedades e os membros dos respectivos órgãos sociais.
E dá, justamente, como exemplo a acção de indemnização proposta por administrador ou gerente destituído sem justa causa, dado que se trata de uma acção para o exercício de um direito de crédito e não de um direito social.

“A este propósito cumpre estabelecer uma distinção fundamental acerca de uma confusão que, por vezes, surge: uma coisa é o exercício do direito social- por exemplo de destituição de um gerente ou administrador -, outra é a pretensão contra a sociedade que daí pode resultar, como efeito de a destituição não ter sido baseada em justa causa. Se o destituído não põe em causa a destituição, que até aceita eventualmente- porque pode ser decidida ad nutum -, então a sua pretensão judicial é extrassocietária, mesmo que ele seja sócio (/accionista), não fazendo sentido discuti-la num tribunal que dirime exclusivamente questões entre sócios ou entre estes e a sociedade…” (13).

No mesmo sentido se vem pronunciando a Jurisprudência, entendendo esta que “para a acção em que o Administrador de uma sociedade pede indemnização pela destituição é competente o Tribunal Comum” (14).

Aqui chegados, importa retirar as consequências necessárias desta conclusão.

É que, conforme decorre do disposto no nº 2 do art. 555º do CPC (parte final), “as circunstâncias que impedem a coligação de autores e réus ”obstam a que os pedidos (subsidiários) sejam deduzidos de uma forma cumulada”.
Ora, uma dessas circunstâncias impeditivas é justamente “a ofensa das regras de competência em razão da matéria” (art. 37º, nº 1 do CPC).
Pode-se ler neste preceito legal que “a coligação (leia-se, a cumulação do pedido subsidiário) não é admissível quando … a cumulação possa ofender regras de competência… em razão da matéria…”.
É o que, como vimos, sucede no caso concreto.
A questão que se coloca, de seguida, é a de saber qual a consequência dessa inadmissibilidade processual.
A solução que era preconizada pelo Prof. Alberto dos Reis era a de que “…a circunstância de se cumularem pedidos com infracção dos requisitos relativos a forma do processo e à competência do tribunal dá em resultado ficar sem efeito um ou alguns dos pedidos. Qual ou quais? Naturalmente aquele ou aqueles a respeito dos quais a forma do processo empregada é imprópria ou o tribunal é incompetente em razão da matéria ou da hierarquia. Se é a incompetência ou o erro de forma que faz cair o pedido, para que o efeito esteja em correlação com a causa tem necessariamente de admitir-se que o pedido posto fora de campo é precisamente aquele a que se não ajusta a forma de processo adoptada ou de que o tribunal não pode conhecer em razão da matéria ou da hierarquia” (15).

No mesmo sentido, o Prof. Castro Mendes, confrontado com o problema da ilegalidade da coligação resultante de incompatibilidades processuais (incompetência do tribunal e erro na forma de processo) escreveu “Se (a ilegalidade) resultar de incompatibilidade processual, por violação do art. 31º, nº 1 (…) o que se verifica é – quanto a um ou aos dois pedidos – um vício de incompetência ou de erro na forma de processo. Assim, aqui a consequência será a absolvição da instância quanto àquele ou aqueles dos pedidos para que o tribunal for incompetente ou a forma de processo inadequada” (16).
Igualmente o Prof. Lebre de Freitas defende esta posição: “A separação das causas tem também lugar quando só quanto a alguns pedidos o tribunal é incompetente ou a forma de processo é inadequada, mantendo-se no tribunal da propositura a apreciação dos restantes” (17).
Julga-se também que é esta a melhor solução processual para o caso concreto.
Ou seja, tendo em conta a inadmissibilidade processual da dedução do pedido subsidiário, decorrente da incompetência em razão da matéria do Tribunal do Comércio, a presente acção, quanto a tais pedidos (pontos V) e VI)), não pode prosseguir e, nessa medida, deve a instância, quanto a eles, ser considerada extinta.

Entende-se, assim, que os obstáculos à coligação (e à cumulação de pedidos subsidiários) a que alude o art. 37º CPC (cfr. art. 555º, nº2 do CPC) são impedimentos à inclusão no processo das causas a que eles se referem, pelo que impedem apenas que certas causas sejam cumuladas no mesmo processo, mas não que outras, relativamente às quais, inexistam obstáculos, o sejam.
Logo, a absolvição da instância deverá atingir, não todo o processo (isto é, todas as acções ou causas cumuladas), mas apenas aquelas relativamente às quais se verificam os referidos obstáculos.

Conclui-se, pois, o seguinte, quanto à excepção de incompetência em razão da matéria:

- julgar, nos termos dos dispositivos legais citados, parcialmente procedente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria invocada pela Ré e, em consequência:

a) declarar que o Juízo de Comércio, com excepção dos referidos (últimos) pedidos, é o Tribunal competente em razão da matéria para conhecer da presente acção;
b) declarar, pelas razões expostas (inadmissibilidade da cumulação), o Tribunal Recorrido incompetente, em razão da matéria, para conhecer dos referidos pedidos (pontos V) e VI) e, nessa medida, julgar extinta a instância quanto a esses pedidos.
c) assim, se sanando a nulidade da decisão recorrida que havia sido reconhecida com fundamento na omissão de pronúncia.
*
Avancemos agora para apreciação da decisão proferida quanto à excepção de ilegitimidade activa.

Como decorre do relatório elaborado, a Recorrente levanta as seguintes questões:

- o Tribunal Recorrido omitiu totalmente a pronúncia sobre toda a factualidade alegada e sobre todos os pedidos formulados pelo A., considerando-os procedentes ou não procedentes, não obstante não poderem ser considerados prejudiciais relativamente à questão da (i)legitimidade decidida.
- o dever de fundamentação na fundamentação da decisão e o dever de explicitar os meios probatórios que se revelaram fundamentais para a formação da convicção do Juiz (subjacente ao disposto no art. 607º, nº 4 do CPC) não foi respeitado pelo Tribunal a quo na decisão recorrida.
- o Tribunal Recorrido incorreu ainda em erro de julgamento ao considerar o A. parte ilegítima na presente demanda, desde logo, porque desconsiderou todo o quadro factual alegado pelo A. na sua petição inicial.
*
Cumpre decidir.

Em primeiro lugar, importa liminarmente refutar toda a argumentação da Recorrente que contende com a alegada ausência de julgamento fáctico (decisão sobre a matéria de facto e fundamentação/meios de prova) no que concerne à excepção de ilegitimidade propriamente dita (e quanto aos pedidos formulados).
Na verdade, a argumentação da Recorrente, nesta sede do conhecimento da excepção dilatória de ilegitimidade, não tem qualquer campo de aplicação.

Com efeito, e conforme já se referiu, os pressupostos processuais não têm que ser apreciados em função da factualidade que venha a ser julgada provada, mas deve sim ser aferida em função dos factos e dos pedidos formulados pelo Autor na petição inicial.
No caso do pressuposto da legitimidade, aliás, o legislador fez questão- já iremos ver porquê- de esclarecer que o seu conhecimento deve ser realizado em função da relação controvertida, “tal como ela é configurada pelo autor”- art. 30º, nº 3 do CPC.

Nesta conformidade, não há dúvidas que, neste âmbito (e nesta fase processual), o Tribunal Recorrido não tinha, nesta sede:

-que efectuar qualquer julgamento sobre a matéria de facto alegada;
-nem tinha que se pronunciar sobre todos os pedidos formulados pelo A. considerando-os procedentes ou não procedentes (porque efectivamente, julgando procedente a excepção de ilegitimidade, a instância foi julgada extinta quanto a todos os pedidos, prejudicando o respectivo julgamento);
- nem muito menos tinha o dever de explicitar quaisquer meios probatórios.

Importa dizer, ainda, que o eventual vício da decisão recorrida também nunca poderá ser configurado no âmbito do erro de julgamento (sobre a matéria de facto).

Na verdade, o Tribunal Recorrido não tinha que desenvolver qualquer uma destas actuações, tão simplesmente porque a pronúncia sobre a excepção de ilegitimidade deveria ser efectuada, como foi, em função do objecto da acção proposto pela Autora (pedido e causa de pedir).
Aqui chegados, importa, pois, verificar se o Tribunal Recorrido, tendo em conta aquela configuração, decidiu bem quando considerou que o Autor não era parte legítima (excepção dilatória de ilegitimidade activa).

Esta conclusão, a que chegou o Tribunal Recorrido, teve por base a seguinte ideia:

- só o sócio tem legitimidade e reconhecido interesse directo na procedência da acção de declaração de nulidade de uma deliberação social.

Vejamos se assim é.

Como é sabido, nos termos do nº 1 do art. 30º do CPC, o Autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar; e o Réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer - devendo estas posições ser aferidas em função da utilidade derivada da procedência da acção e do prejuízo que da procedência da acção advenha, respectivamente (cfr. nº 2 do citado preceito legal).
Como critério subsidiário, o nº 3 do artigo citado considera que devem ser considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade, os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo A..

Ora, se atendermos a este critério, que, no fundo, veio plasmar na lei a tese do Prof. Barbosa de Magalhães, temos que considerar efectivamente que o Autor é parte legítima na presente acção, tendo em conta os pedidos que formula.

Com efeito, do ponto de vista desta tese, para se aferir da legitimidade das partes deve-se atender à configuração subjectiva que o Autor dá unilateralmente à relação que pretende submeter à ponderação do tribunal.
Assim, as partes legítimas, conforme a lei processual impõe, são as pessoas que o A. aponta como sujeitos da relação controvertida.

Ora, se atendermos à relação controvertida, na forma como é configurada pelo A. na p.i., verificamos que, independentemente do apuramento dos efectivos sujeitos da relação material controvertida (no pressuposto de que esta relação existisse), o A, de acordo com a sua própria versão apresentada na petição inicial, coloca-se como sujeito activo da relação por si descrita (invoca que é sócio e que é gerente da Sociedade Ré) (18).

Como se referiu, na presente acção, a legitimidade (activa) deve ser aferida em função da relação jurídica que o Autor pretendeu submeter à apreciação do tribunal.
E se assim é, no caso concreto, tal relação jurídica estabelece-se em função do pedido de nulidade da deliberação social formulado, pelo que este só poderá ser parte legítima, na medida em que assumisse, na alegação efectuada na petição inicial, a posição de titular desse direito.

Ora, o Autor, na configuração que deu à sua pretensão na petição inicial (que é aquela que aqui tem se valorar), alegou que era sócio e que era gerente da Sociedade Ré.

Nesta conformidade, para efeito da averiguação deste pressuposto processual, importa verificar, em abstracto, se o titular do referido pedido de nulidade da deliberação social de destituição do Autor como gerente pode coincidir com as referidas qualidades invocadas pelo Autor.

Entendeu o Tribunal Recorrido que não, por considerar que “só o sócio tem legitimidade e reconhecido interesse directo na procedência da acção de declaração de nulidade de uma deliberação social” (e decorreria da prova documental que o Autor não assume aquela qualidade).

No entanto, esta posição do Tribunal Recorrido não pode aqui merecer acolhimento.
Em primeiro lugar, porque, como decorre do exposto, não ponderou devidamente a forma como deve ser apreciada legitimidade das partes.

Com efeito, para efectuar essa ponderação, o Tribunal Recorrido devia apenas ter efectuado a averiguação atrás referida, ou seja, devia ter verificado, em abstracto, se o titular do pedido de nulidade da deliberação social de destituição pode coincidir com as qualidades de sócio e gerente, invocadas pelo Autor na petição inicial- independentemente do apuramento dos efectivos sujeitos da relação material controvertida (no pressuposto de que esta relação existisse).
Na verdade, esta última questão contende já com o mérito da acção e não com o pressuposto da legitimidade das partes.

Em segundo lugar, contrariamente ao que defende o Tribunal Recorrido, a legitimidade para a instauração de uma acção de declaração de nulidade de uma deliberação social não se mostra atribuída em exclusivo aos sócios da Sociedade Comercial.

Na verdade, coerentemente com aquilo que defendemos atrás, quanto ao preenchimento do conceito de “ exercício de direitos sociais” (19) também aqui se julga que podem existir outros interessados directos na declaração de nulidade de deliberações sociais.

Senão vejamos.
Estabelece o art. 56º do CSC (Código das Sociedades Comerciais) um quadro geral das deliberações sociais que poderão ser consideradas nulas.
E o art. 60º esclarece apenas contra quem deve ser instaurada a acção de declaração de nulidade: contra a Sociedade (legitimidade passiva).

No entanto, quanto à legitimidade activa, o legislador aparentemente nada refere, limitando essa indicação às acções de declaração de anulação de deliberação social (cfr., no entanto, o art. 57º do CSC).
Como se referiu, o Tribunal Recorrido entendeu que apenas os sócios teriam essa legitimidade activa (aceitando a tese de António Luz Pardal (20)).

Sucede que esse não é o melhor entendimento que resulta da lei.
Desde logo, porque, em face do regime legal vigente, se deve entender que qualquer interessado pode, nos termos gerais (do art. 286º do CC), instaurar a acção de declaração de nulidade de deliberação social, desde que, obviamente, justifique, para tanto, o seu interesse, traduzido na utilidade que para si deriva da procedência do pleito (art. 30º, nº 2 do CPC) - como, em certa medida, aqui fez o Autor.

Na verdade, embora o legislador no CSC não tenha referido, especificamente, estes efeitos do regime legal geral da nulidade, neste âmbito das deliberações dos sócios, é evidente que aquele regime geral não pode considerar-se afastado, pois que não existem quaisquer particularidades que tenham sido levadas ao Código das Sociedades Comerciais que impeçam, em termos interpretativos, essa aplicação.

Com efeito, “quanto à declaração de nulidade- que não se encontra pendente de prazo, para além do interesse processual que deve subsistir no momento da propositura da respectiva acção- aplica-se o disposto nos arts. 60º e 57º do CSC.

Assim, a acção- tal como a acção anulatória – deve ser proposta por qualquer interessado contra a Sociedade (art. 60º, nº 1) e não está dependente de prazo (legal).
A lei não estabelece limitações à legitimidade activa, reconhecendo especial interesse à intervenção do órgão de fiscalização, cuja iniciativa conhece uma grande latitude… (e, acrescentamos nós, “ao gerente”, nas Sociedades que não tenham órgão de fiscalização- nº 4 do art. 57º do CSC).
Por isso qualquer stakeholder- designadamente os credores da sociedade- pode requerer a declaração de nulidade de uma deliberação social, desde que tenha interesse (processual) no litígio…” (21).

No mesmo sentido se pronuncia Pinto Furtado (22), quando afirma que: “O código reportou-se unicamente ao âmbito social, mas para além deste, é aplicável ainda, sem dúvida alguma, o direito comum – e assim temos que, em face do disposto no art.º 286 do C.C. para o negócio jurídico, a nulidade da deliberação é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente para o Tribunal.
Estes aspectos do regime legal da nulidade não foram reproduzidos para as deliberações dos sócios, mas evidentemente, não podem considerar-se afastados pelas particularidades de regime levadas ao C.S. Comerciais”.
Conclui-se, assim, que “… evidentemente, nem todo o regime da arguição e declaração de nulidade das deliberações dos sócios está no art. 57º. Este artigo apresenta especialidades ao regime geral previsto no CC.
À nulidade das deliberações, enquanto negócios jurídicos, é aplicável (o) regime comum dos negócios jurídicos nulos: “ a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal” (art. 286º do CC).
Entre os interessados (cfr. art. 26º, nº 1 e 2 do CPC, actual art. 30º do CPC) contam-se, além dos especialmente visados no art. 57º, os administradores das sociedades por acções, quaisquer sócios e alguns terceiros. (…)
Terceiros com legitimidade activa são, por exemplo, os credores e trabalhadores da sociedade quando esteja em causa deliberação de distribuição de lucros fictícios, ou um membro do conselho fiscal não sócio destituído sem justa causa…” (23).

Nesta conformidade, e por todas as razões expostas, julga-se ser esta a melhor interpretação para a questão da legitimidade activa que aqui era colocada (24).
Desta interpretação resulta, assim, que qualquer interessado, mesmo estranho à sociedade poderá instaurar a presente acção, justificando para tanto o seu interesse.
Ora, revertendo para o caso, dentro desta interpretação, fica evidenciado que o Autor invocando, no mínimo, a qualidade de gerente tem, tal como a sua pretensão se mostra configurada na petição inicial, legitimidade activa para interpor a presente acção.

Com efeito, a nosso ver, e salvo o devido respeito pela opinião contrária, não podem subsistir dúvidas que, para efeitos da invocação da nulidade da deliberação social, o Autor, de acordo com os factos alegados na petição inicial, assume a qualidade de interessado (exigida em termos gerais), qualidade que lhe permite a invocação da nulidade da deliberação social que directamente, aliás, o afecta (veja-se que o objecto da deliberação social impugnada é justamente a sua destituição das funções de gerente).

Além disso, tal legitimidade poderia ainda derivar do disposto no nº 4 do art. 57º do CSC onde expressamente se prevê que o “gerente” nas sociedades em que não tenham órgão de fiscalização tem legitimidade activa para promover a respectiva declaração de nulidade da deliberação social que alegadamente padeça do vício de nulidade.

Nesta conformidade, e tendo em consideração toda esta argumentação, julga-se que não pode aqui ser mantida a decisão recorrida, seja porque não se pode acompanhar a apreciação que foi efectuada quanto ao pressuposto processual da legitimidade, seja porque também não se a pode acompanhar quanto à questão da inadmissibilidade da invocação da nulidade da deliberação social por parte do aqui Autor à luz das regras legais estabelecidas no Código das Sociedades Comerciais.

Com efeito, julga-se que, quanto à primeira parte, o Tribunal Recorrido devia, apenas, ter averiguado, em abstracto, se o titular do pedido de nulidade da deliberação social de destituição podia coincidir com as qualidades de sócio e gerente, invocadas pelo Autor na petição inicial- independentemente do apuramento dos efectivos sujeitos da relação material controvertida (no pressuposto de que esta relação existisse).

E uma vez que assim concluísse, devia ter afirmado a verificação da legitimidade activa do Autor para deduzir a pretensão de nulidade da deliberação social.
Apurar (provar) se o Autor era efectivamente sócio e/ou gerente, já é questão que contende com o mérito da acção e não com o pressuposto da legitimidade das partes.

Por outro lado, quanto à segunda parte, o Tribunal Recorrido devia ter atentado que, contrariamente ao que defendeu, o legislador do Código das Sociedades Comerciais atribuiu legitimidade para invocar a nulidade das deliberações sociais a qualquer interessado nos termos que resultam do regime geral de arguição da nulidade previsto no Código Civil.

Além disso, mesmo no que concerne às particularidades de regime levadas ao CSC, o legislador reconhece, neste âmbito, especial interesse à intervenção do órgão de fiscalização, e “ao gerente”, nas Sociedades que não tenham órgão de fiscalização- nº 4 do art. 57º do CSC).
Aqui chegados, resta-nos, pois, concluir pela procedência do Recurso interposto, devendo, em consequência ser julgado como parte legitima activa, o aqui Autor.

Nesta sequência, deverão os autos prosseguir em Primeira Instância (apenas quanto aos pedidos I) a IV)), seguindo os pertinentes trâmites processuais legais, nomeadamente: a fase de saneamento do processo (cfr. arts. 590º e ss. do CPC), aí se decidindo a verificação dos demais pressupostos processuais (sobre os quais ainda não houve pronúncia); e aí se ponderando se, em face do estado do processo, poder-se-á conhecer imediatamente do mérito da causa, sem necessidade de produção de mais provas (cfr. al. b) do nº1 do art. 595º do CPC), fixando-se, nesse caso, a matéria de facto que poderá, desde já, considerar-se provada, com indicação dos respectivos meios de prova.
Termos em que se tem que concluir pela procedência do Recurso.
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IV- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta procedente, e, em consequência, revogando-se a decisão recorrida, decide-se:

I)- a) declarar nula a Decisão Recorrida, por omissão de pronúncia sobre a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC);
E, em cumprimento da regra da substituição ao Tribunal Recorrido, sanar essa nulidade, proferindo a seguinte decisão:
b) julgar parcialmente procedente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria e, em consequência:
b.1.) declarar que o Juízo de Comércio, com excepção dos pedidos formulados sob os pontos V) e VI, é o Tribunal competente em razão da matéria para conhecer da presente acção;
b. 2.) declarar, pelas razões expostas (inadmissibilidade da cumulação), o Tribunal Recorrido incompetente, em razão da matéria, para conhecer dos referidos pedidos subsidiários (pontos V) e VI) e, nessa medida, absolver a Ré de instância quanto a esses pedidos.
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II) revogar a decisão do Tribunal Recorrido quanto à excepção de ilegitimidade, julgando que o aqui Autor é parte legítima (activa) para deduzir os pedidos formulados nos pontos I) a IV);
III) determinar que os autos prossigam em Primeira Instância (apenas quanto aos pedidos I) a IV)), seguindo os pertinentes trâmites processuais legais, nomeadamente, a fase de saneamento do processo (cfr. arts. 590º e ss. do CPC).
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Custas pela Recorrida (artigo 527º, nº 1 do CPC).
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Guimarães, 14 de Junho de 2018

Pedro Alexandre Damião e Cunha
Maria João Marques Pinto de Matos
José Alberto Moreira Dias



1. Vide, neste sentido, por todos, AC do STJ 8.02.2011 (relator: Moreira Alves), e AC RG de 24.11.2014, (relator: Filipe Caroço), ambos in dgsi.pt.
2. Helena Cabrita, in “A fundamentação de facto e de Direito da decisão civil”, pág. 49.
3. Lopes do Rego, in “Comentários ao CPC”, Vol. I, pág. 442. NO mesmo sentido, Paulo Pimenta, in “Processo civil declarativo”, pág. 240 e Abrantes Geraldes, in “Temas do Processo civil”, Vol. II, pág. 118 “… (apesar da alteração da letra da lei) nada obstará a que, pelo menos, em princípio continue a ser essa a ordem do conhecimento…”. Com interesse para esta questão, v. , por exemplo, os acs. da RL de 10.9.2009 (relator: Teresa Albuquerque) e da RP de 9.10.2012 (relator. Maria João Areias), in dgsi.pt. 4. Abrantes Geraldes, in “Recursos no NCPC”, págs. 288 e ss., em especial, pág. 289.
5. Alberto dos Reis, «Comentário ao Código de Processo Civil», vol. I, pág. 111, Manuel de Andrade, in “ Noções Elementares de Processo Civil “, pág. 91, e Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, pág. 104;
6. Manuel de Andrade, obra cit., pág. 94;
7. Paulo Pimenta, in “ Processo civil declarativo”, págs. 95;
8. Como referem os Profs. Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, in “CPC anotado”, Vol. I, pág. 501 “podem ser formulados vários pedidos subsidiários, cada um deles atendido no caso de o não ser o anterior”
9. V., quanto ao preenchimento dos requisitos desta alínea, por exemplo, o ac. da RP de 18.4.2016 (relator: Carlos Querido) onde se faz uma resenha da Jurisprudência mais recente e da Doutrina- tarefa que aqui nos escusamos a fazer.
10. V. o ac. do STJ de 08.5.2013 (relator: Fernando Bento), in dgsi.pt.
11. Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, in “CPC anotado”, Vol. I, pág. 502.
12. In “Lições de Direito Comercial”, págs. 149 e150.
13. Paulo Olavo Cunha, in “Direito das Sociedades comerciais”, pág. 733, nota 1047.
14. V. por ex. o ac. da RP de 19.12.2007 (relator: Canelas Brás), in Dgsi.pt.
15. Cfr. “Comentário ao CPC”, Vol. III, pág. 168
16. In “Direito processual Civil”, vol. II, págs. 274 e 275.
17. In “Código de Processo Civil”, vol. 1, p. 88
18. São conhecidas as críticas que, de uma forma implacável, o Prof. Alberto dos Reis formulou em oposição fundamentada à tese do Prof. Barbosa de Magalhães, v. para historiar a polémica, o “Manual de Processo Civil” do Prof. Antunes Varela, págs. 141 e ss. Aliás, como diz este Autor, ao aceitar-se o critério que agora passou a ser o legal "... a ilegitimidade passaria (passou) a cobrir somente os casos raros de divergência entre as pessoas identificadas pelo A. como adversários da sua pretensão e as pessoas efectivamente ingressadas em juízo e os casos não menos raros em que o A. chama a juízo pessoas que não são sujeitos da relação controvertida... ", ob. cit., pág. 148. V. Rui Pinto, no estudo "... Problemas de legitimidade processual... ", in “Aspectos do Novo Processo civil”, pág. 157 e ss., em especial, págs. 167 a 170.
19. Como aí se referiu, os direitos sociais, além dos sócios, podem ser exercidos pela Sociedade, pelos credores sociais e terceiros, como o órgão de fiscalização ou o gerente (cf., v. g., os arts. 57º, 78º e 79º do CSC).
20. In “A impugnação de deliberações sociais nas sociedades por quotas. Em particular a legitimidade activa dos cônjuges e do ex-cônjuge do sócio”, in Estudos de Direito Privado, (2014) (págs. 153 a 224), pág. 197 – estudo a que não tivemos acesso, mas que é mencionado também pelos autores aqui citados.
21. Paulo Olavo da Cunha, in “Impugnação de deliberações sociais”, págs. 215 e 216; no mesmo sentido, in “Direito das Sociedades Comerciais”, pág. 712. Também defendem esta posição, Carlos Olavo, no estudo publicado na CJ, 1998, T 3, pág. 21 e segs., máxime 27, e J. M. Coutinho de Abreu, in “CSC em comentário”, Vol. I, págs. 667/668, 688/9 e 696/7.
22. in “Deliberações dos Sócios”, Pág. 357.
23. J. M. Coutinho de Abreu, in “CSC em comentário”, Vol. I, págs. 667e 668.
24. Na Jurisprudência, v. por ex. os acs. da RP de 10.10.2002 (relator: Viriato Bernardo) e de 26.10.2004 (relator: Antas de Barros) e o ac. da RE de 7.7.2005 (Álvaro Rodrigues), in Dgsi.pt