Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1365/17.0T8PVZ.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR
HERANÇA
DISTRIBUIÇÃO DE RENDIMENTOS
RESTITUIÇÃO DE BENS DOADOS
LEGITIMIDADE PASSIVA DA CABEÇA DE CASAL
SUPRIMENTO DA FALTA DE PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/14/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

I. Enquanto não tomar posse quem vier substituir o cabeça-de-casal, o cabeça de casal que requereu escusa e obteve deferimento, mantém-se em funções e como tal poderá ser demandado. É que, embora o cabeça-de-casal não seja um mandatário, em muito se lhe assemelha, pelo que a solução tem resposta no instituto do mandato – artºs 1175º e 1176ºdo CC – devendo continuar no exercício da função enquanto o que for nomeado em sua substituição não tomar posse do cargo, sempre que da vacância possam resultar prejuízos para a herança.

II. Enquanto a partilha não estiver efectivada e terminada, no decurso do exercício do cabecelato, qualquer dos herdeiros ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça de casal distribua por todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem necessários, mesmo nessa parte, para satisfação dos encargos da administração.

III. A regra de que o herdeiro apenas tem direito a exigir até metade dos rendimentos que lhe caibam, só se aplica durante a anuidade respectiva. Finda esta, há lugar à prestação de contas, na qual se tomam em consideração tanto as despesas, como os rendimentos que foram já entregues aos herdeiros e apurado o saldo este é distribuído pelos interessados na proporção dos seus direitos, deduzida a quantia necessária para fazer face aos encargos ao novo ano.

IV. A entrega dos rendimentos pode ser exigida em qualquer altura pelos herdeiros, não impondo a lei ao cabeça de casal que tome a iniciativa de entregar os rendimentos (2093º, nº 1 do CC). O sujeito passivo da obrigação é pois o cabeça de casal, pelo que relativamente ao pagamento dos rendimentos da herança, não tem o presente procedimento que ser instaurado contra todos os herdeiros.

V. Os bens doados em vida pelo de cujus, não obstante puderem ser levados em consideração no cálculo da legítima (artº 2162º, nº 1 do CC), não são considerados parte integrante da herança e por isso ficam fora da alçada dos deveres de administração do cabeça de casal, sendo administrados pelo seu donatário, seu efectivo proprietário.

VI. Consequentemente, estando o dinheiro doado na posse do cabeça de casal, como alega a apelante, é este parte legítima para estar na acção, não se impondo a presença dos demais herdeiros, uma vez que está em causa a restituição de um bem próprio da apelante e não de um direito relativo à herança.

VII. Uma vez que funciona como doação, a partilha em vida tem efeitos imediatos, designando quem fica com que parte dos bens, ficando os donatários com os bens a partir da data da partilha em vida e ficando obrigados a pagar tornas aos demais naquela data ou posteriormente, uma vez que com a partilha em vida pretende-se a igualação de todos os quinhões.

VIII. De acordo com o artº 6º, nº 2 do CPC, o juiz providencia oficiosamente pela suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo. Trata-se de uma das vertentes do dever de gestão processual. No caso, não podendo as intervenções de terceiros ser ordenadas oficiosamente, deve o julgador convidar a parte a praticar o acto.

IX. E este dever, quando conduz ao suprimento da falta de pressupostos ou à realização de actos que visam a regularidade da instância, é vinculado, visando permitir que o processo possa prosseguir com regularidade e possibilitar uma decisão sobre a pretensão das partes.

X. A lei processual é expressa quanto à sanabilidade do pressuposto processual consistente na falta de litisconsórcio necessário.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

Maria instaurou procedimento cautelar comum com inversão do contencioso para entrega de créditos, contra A. G., na qualidade de representante da herança indivisa aberta por óbito de S. C..
Alegou que a requerida retém indevidamente no património da herança indivisa créditos que são da sua pertença e não da herança, pedindo que a requerida seja condenada a entregar-lhe a quantia de 637.338,44 e que seja fixada uma sanção compulsória por cada dia de atraso na entrega da referida quantia.

A requerida invocou a sua ilegitimidade, alegando que foi demandada como “Representante da Herança”, sendo o objeto do procedimento a entrega de valores pertencentes à herança, aplicando-se, necessariamente, o nº 1 do artigo 2091º do Código Civil, tendo de ser demandados todos os herdeiros.

Acrescenta que não é herdeira, pois que cedeu o seu quinhão hereditário aos filhos e pediu escusa do cargo de cabeça de casal, o que foi aceite em 10 de Outubro de 2017, estando apenas a assegurar a gestão corrente até à nomeação de novo cabeça de casal.

A Requerente exerceu o contraditório argumentando que a herança indivisa tem personalidade judiciária, mesmo depois da aceitação por todos os herdeiros, acrescentando que o seu direito de propriedade lhe proporciona o gozo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposições das coisas que lhe pertencem, tendo sido no exercício desse direito e da ação possessória que demandou a cabeça de casal.

Foi proferida sentença que absolveu a requerida da instância por ilegitimidade, por se entender que o procedimento deveria ter sido instaurado contra todos os herdeiros.

A A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído do seguinte modo as suas alegações:

A- O presente recurso tem por objeto a Sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 1, que absolveu da instância o Requerido - Cabeça de Casal da Herança Indivisa -, A. G., com fundamento na verificação ilegitimidade passiva, nos termos dos art. 278º, nº1 alínea d), 576º, nº 2, 577º, alínea e), 595º, nº 1, alínea a) do Código do Processo Civil, sendo que a Requerente considera que a decisão ora posta em crise, é proferida em total contradição com o Direito conjugado à factualidade vertida e prova documental que carreou, tanto na Petição Inicial que impulsionou os autos, como através da específica demonstração apresentada em sede do exercício do Contraditório.

B- A Sentença recorrida, afastou-se deliberadamente do critério legal prescrito no nº 3 do art. 30º do Código de Processo Civil, que define a regra de determinação da legitimidade das partes em função da titularidade da relação material controvertida, tal como foi descrita na petição inicial: “na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares de interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.”

C- A Recorrente fundamentado a Petição Inicial comprovando que a legitimidade passiva estava regularmente assegurada pela presença do Cabeça de Casal da Herança Indivisa de S. C. - porquanto esta, encontra-se a administrar, ilicitamente, certos dos bens que lhe pertencem e portanto lhe são próprios, pois foram adquiridos tanto por Doações recebidas em Vida da Inventariada, sua Mãe, como por instrução que recebeu da própria para que declarasse no âmbito do seu IRS rendimentos da Herança Indivisa -, e instrumentalizado o Contraditório devidamente.

D- A Sentença recorrida, afastando-se do critério-regra para a determinação da legitimidade processual da Parte contrária, veio, suportar a sua decisão, numa apreciação errónea da qualidade jurídica dos bens reclamados pela Recorrente, a qual nem sequer deveria ter sido tida em conta, decidindo in meritis sobre a natureza jurídica dos mesmos ao mesmo tempo que considerou, também, dever defender a preservação do património financeiro, no seio da Herança.

E- E com tais argumentos foi proferida uma Sentença nula, pois contrariou a aplicação dos preceitos jurídicos invocados pela Recorrente na tramitação processual apresentada, os quais apontavam, inequivocamente, para diversa qualificação jurídica sobre a natureza dos bens reclamados.

F- A Sentença recorrida, na verdade, com desacertada interpretação e aplicação do direito, violou o disposto no art.º 30º do Código do Processo Civil, art.º 2029º, 2087º, nº2 e art.º 2088º, nº2 do Código Civil introduzindo nessa decisão o vício da nulidade, importando necessariamente a sua reparação, o que se requer a este Tribunal Superior.

G- E também, na Sentença recorrida, o Juiz a quo, fixou o valor do procedimento cautelar em 637.338,44EUR, nos termos dos artigos 304º, nº1, alínea d) e 306º do Código do Processo Civil, não tendo equacionado e decidido sobre o pedido de correção do valor da ação vertido em sede de Contraditório, onde foi pedida a correção para 588.217,26EUR.

H- A Sentença recorrida também não teve em linha de conta o vertido nessa sede quanto ao pedido de correção do valor, tendo decidido em contravenção ao disposto no art.º 304º, nº 1 e nº 3, alínea d) e 306º do Código do Processo Civil, por um valor que houvera sido corrigido, o qual é, como acima referido, de 588.217,26EUR (quinhentos e oitenta e oito mil, duzentos e dezassete euros e vinte e seis cêntimos), razão pela qual, igualmente nesta valência, deve ser substituída a decisão recorrida por outra, que integre a fixação do valor indicado pela Recorrente nos autos.

I- Passando a contextualizar cada ato processual submetido nos autos, iniciando pela propositura da Ação, a Recorrente promoveu: A – A identificação dos seus três créditos, dois deles, provenientes de doações feitas em vida da Inventariada, e um terceiro, proveniente de rendimentos que o Cabeça de Casal instruiu fossem declarados na esfera patrimonial dos herdeiros; B – A explicação acerca do vencimento da obrigação de pagamento sobre os créditos que detinha em relação a cada um deles: B. 1 - Sobre os rendimentos que o Cabeça de Casal a mandou declarar em sede de IRS e não entregou à Recorrente, e que lhe originaram uma penhora, por falta de pagamento da Nota de Liquidação; B. 2 - Sobre o Crédito constituído em vida da Inventariada decorrente de Convenção de Partilha das joias desta, cujo crédito aceite no valor de 176.534,00€ a Recorrente não quis receber nesse momento; B. 3 - Sobre o crédito no montante de 200.100,00€ proveniente de distribuições dos rendimentos auferidos em vida da agora Inventariada, e que a Recorrente não quis receber naquele momento. B. 4 - Sobre a demonstração do seu Direito de propriedade quanto aos créditos reclamados. C – A demonstração e prova do Periculum in mora.

J- Em sede de Contestação veio-se alegar: - Que os bens em crise, não eram próprios da ali Requerente, mas Bens da Herança; - Confundiu o Requerido, Cabeça de Casal com a Herdeira que desempenha o cargo, alegando ainda, que esta não é Herdeira, pois cedeu o seu Quinhão Hereditário aos seus dois filhos; - Que a ali Requerente tinha mau carácter.

K- Em sede de Contraditório a agora Recorrente veio desde logo requerer:
VI- Dedução de Incidente de Litigância de Má-fé contra o Requerido e o seu Ilustre Mandatário onde demonstrou:
A - A Má-fé instrumental do Ilustre Mandatário do Cabeça de Casal comprovada pelos artifícios que criou com vista a poder vir invocar a exceção dilatória da ilegitimidade do Requerido que representa na presente demanda, através da transmutação da natureza dos Bens reclamados aos quais quis atribuir, por sua mão, uma natureza de Bens Próprios à Herança;
B – Discorreu e comprovou a verdadeira natureza de cada um dos Bens reclamados a pagamento:
B.1 Sobre a Titularidade do Crédito que lhe pertencia quanto ao montante que foi titulado por um cheque que se extraviou no montante de 200.100,00€
B.2 Sobre a titularidade do Crédito que lhe pertencia quanto ao montante de 176.534,00€ adquirido por Convenção de Partilha em Vida da Inventariada
B.3 Sobre os Frutos distribuídos e não entregues no montante de 176,258,00€.
VII- Das Exceções Perentórias
VIII- Sobre a Exceção da Ilegitimidade
IX- Sobre a Exceção Dilatória da litispendência
X- Do incidente de Litigância de Má-fé deduzido pelo Requerido

L- E assim promoveu no elenco das suas alegações e do libelo probatório que carreou aos autos, matéria assente sobre a natureza, vencimento e quantificação dos créditos que peticionou, tendo identificado: Através de Certidão de Óbito, a data do falecimento da Inventariada – Cf. Doc. nº 30 da petição inicial; A natureza e vencimento das obrigações de pagamento dos créditos que peticionou, individualmente:

- Crédito resultante dos rendimentos da herança indivisa relativos aos anos de 2014, 2015 e 2016, no montante de 176.258,00€ – cf. Doc. nº 1, 2, 3, 7, 8, 9, 10, 11 e 12 da petição inicial, vencidos, respetivamente, nos anos civis de 2015, 2016 e 2017, num valor total apurado, em sede de Contraditório, com pedido de atualização do valor da ação, como segue: Rendimentos da herança no ano de 2014, vencidos desde 27 de maio de 2015, valor de 30.578,90EUR, acrescidos de juros de mora à taxa legal no valor de 3.019,35EUR, Rendimentos da herança no ano de 2015, vencidos desde 12 de maio de 2016, no valor de 97.587,38EUR, acrescidos de juros de mora à taxa legal no valor de 5.881,98EUR, Rendimentos da herança no ano de 2016, vencidos desde 4 de maio de 2017, no valor de 48.092,05EUR, acrescidos de juros de mora à taxa legal no valor de 1.017,18EUR;
- Crédito relativo à doação de joias no valor de 176.534,00EUR, - Cf. Doc. nº 4 da
Petição, vencido desde 28 de julho de 2014, acrescido de juros de mora à taxa legal
no valor de 23.272,27EUR;
- Crédito relativo ao valor inscrito no cheque – Cf. Doc. nº 6 da Petição, vencido desde 8 setembro de 2014, no valor de 200.100,00EUR, acrescido de juros de mora à taxa legal, no valor de 25.459,30EUR, - Dedução do valor entregue pelo cabeça de Casal – Cf. Doc. nº 9 da Petição no valor de 23.325,00EUR, - Valor total dos créditos peticionados: 588.217,26EUR.

M- Ora, resultou, desta tramitação processual acabada de descrever, que o Meritíssimo Juiz a quo, talvez por confusão pelo impensável, veio dar provimento aos argumentos apresentados pelo Requerido, decidindo favoravelmente sobre a exceção dilatória da ilegitimidade passiva tal qual foi por este deduzido, e ultrapassando alegações e provas apresentadas pela agora Recorrente, considerou como válidos e garantidos os argumentos apresentados em sede de Contestação por aquele, concluindo pela ilegitimidade passiva deste, por virtude da atribuição que, em consonância com este, considerou dever ser atribuída à natureza dos bens ora reclamados, a par do interesse da preservação do património hereditário.

N- Tendo, com base nesse erro de apreciação, configurado na decisão proferida duas alternativas à Requerente:

- Esta deveria em fase de conferência preparatória em sede de Inventário, levantar a questão, já que estava a reclamar bens da Herança sobre os quais nem posse detinha (?), ou então
- Deveria intentar a Ação Cautelar contra os seus irmãos ao abrigo do art.º 2091 do Código Civil, referindo assim que “O efeito útil normal, no caso, apenas será alcançado com a presença em Juízo de todos os herdeiros – a Requerente no lado ativo e os restantes no lado passivo”. O itálico é nosso.

O- E assim, em face do exposto sumariamente, apresenta-se o presente recurso como necessário, pois que a reapreciação do decidido, que fundamentou a decisão da Ilegitimidade passiva do Requerido com fundamento no art.º 2091º do CC, NÃO SE APLICA AO PETICIONADO, já que os bens reclamados são próprios da ali Requerente e aqui Recorrente, e também, porque a questão da preservação patrimonial não se coloca nesta pendência.

P- Na verdade, o regime aplicável, ao contrário do decidido, é antes, tal como demonstrado pela Recorrente em toda a tramitação processual, o abrangido pela norma que o exceciona - o art.º 2088, n º. 2 do CC -, o qual permite a qualquer Herdeiro detentor de créditos constituídos em vida, vir a juízo interpelar o Cabeça de Casal para que este cumpra com a respetiva entrega.

Q- Tendo a decisão aqui recorrida, encontrado, assim, o seu fundamento não só na atribuição errónea sobre a natureza dos bens ora reclamados, como também, quanto à determinação das medidas necessárias à promoção da preservação patrimonial hereditária, acima indicada.

R- A Recorrente só agora, pela leitura da Contestação oferecida compreendeu o verdadeiro alcance de toda a arquitetura que presidiu desde longa data, à vontade patente e notória de o Requerido não lhe entregar os Bens que por direito lhe pertencem - visualizando no momento presente, com clareza assombrosa, a construção de todos os elementos neles apostos desde longa data, onde este tentou transmutar dolosa e artificial a natureza intrínseca dos bens reclamados - de Bens Próprios da Requerente e como tal, alheios à Herança, em Bens Próprios da Herança – não pôde aquela deixar de se insurgir clamorosamente contra a falsa fundamentação então apresentada na Contestação, a qual veio demonstrar terem tais falsidades sido preparadas para este momento, que o Requerido sabia com certeza absoluta ir chegar, pois certo seria que esta confrontada com a não entrega dos seu próprios bens iria indubitavelmente reclamar judicialmente a posse efetiva dos seus créditos mais cedo ou mais tarde, e tal compreensão, originou a dedução necessária do Pedido de Litigância de Má-fé deduzido pela Recorrente contra o Requerido e seu Ilustre Mandatário - logo no 1º. Capítulo oferecido em Contraditório.

S- E ainda, para além da decisão proferida ser desde logo nula, como já acima identificado, pois não poderia fundamentar-se in meritis sobre a natureza de tais bens para concluir pela ilegitimidade passiva ao abrigo do regime que regulamenta créditos sobre Bens da Herança, conforme o do art.º 2091 do Código Civil, veio ainda, o Juiz a quo em reforço da fundamentação apresentada proferir, conclusivamente -, e em franca contradição nos termos apresentados onde tinha mencionado que tal questão se resolveria em sede de Inventário -, que a Requerente poderia vir a reclamar os ditos Bens Hereditários, intentando a Providência Cautelar, onde através do litisconsórcio necessário passivo, intentaria uma Ação contra todos os seus irmãos, em que a própria se situaria no lado ativo e os restantes no lado passivo, como segue:

A situação não se subsume na previsão dos artigos 2.078º nº 1 ou 2.088º nº 2 do Código Civil, mas antes, na previsão geral do artigo 2.091º existindo uma situação de litisconsórcio necessário passivo na medida em que “é necessária a intervenção de todos os interessa dos” pois “pela natureza da relação jurídica” a mesma é “necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal”.
O efeito útil normal, no caso, apenas será alcançado com a presença em Juízo de todos os herdeiros – a Requerente no lado ativo e os restantes no lado passivo.”

T -Estranhando-se, pois, que em face da solução jurídica que sugeriu, não lhe tivesse então, conferido convite ao aperfeiçoamento da ali verificada exceção dilatória da ilegitimidade, por aplicação do princípio da adequação formal e do dever de gestão processual inscrito no artigo 6º e 547º ambos do Código do Processo Civil, subsumindo à causa, por emprego analógico do incidente de intervenção provocada, com as necessárias adaptações – art.º 261º e 316º e ss. do Código do Processo Civil.

U- Em suma, aponta-se à Decisão uma apreciação errónea sobre a natureza dos bens reclamados, a qual foi, para além do mais, inserta numa apreciação errónea sobre a defesa dos interesses da Herança, que veio viciar a pendência da causa, por alteração dos pressupostos básicos permitidos por lei quanto à interposição de ação possessória por Herdeiro nos termos do art.º 2088 n º. 2 do CC,

V- Constatando-se a invalidade de todo um pressuposto em que foi fundamentada, e onde foi decidida uma ilegitimidade passiva do Cabeça de Casal da Herança Indivisa, representado por A. G., quando na verdade, perante o caso concreto reclamado, este é o único que detém a legitimidade para responder em tal demanda.

W- Destaca-se, não ter a Recorrente se escusado a esforços perante o embuste na qualificação atribuída pelo Ilustre Mandatário do Requerido quanto à natureza dos Bens, tendo dedicado ao seu esclarecimento e prova, em aditamento ao já comprovado processualmente na PI, um longo Primeiro Capítulo composto por 22 páginas e 108 itens, onde pormenorizadamente demonstrou a natureza dos Bens Próprios reclamados, cujos créditos foram constituídos em vida da Inventariada: os reclamados no montante de 200.100,00€ e montante de 176.534,00€, bem como os que que foram constituídos por decisão do Requerido – o caso dos rendimentos da Herança Indivisa que mandou a Requerente declarar no montante de 176.258,33€.

X- Natureza esta também confirmada pelo próprio Requerido - quanto ao reclamado crédito dos 200.100,00€, e também quanto aos frutos distribuídos no montante de 176,258,33€ -, muito embora este em peripécia extraordinária, tenha vindo dizer por um lado, que o crédito dos 200.100,00€ apesar de ter sido constituído em vida, era um Bem que iria integrar o passivo da Herança! – atendendo à atitude assumida pela Reclamante na Reclamação, como segue:

“11.
O valor e 200.100,00 que pertence à reclamante sempre esteve ao seu dispor, tendo sido emitido o cheque referido no art.º 12º do articulado, que aquela confessa ter sido emitido a seu favor na ocasião, pelo que não há dúvidas sobre o seu direito a tal valor. Contudo perante a posição assumida pela Reclamante na Reclamação, a cabeça de casal vai aditar na relação de activos e passivos que vai apresentar aos autos este valor.”
SIC REQ. 285115, item 11, junto ao Processo pela recorrente em contraditório através do DOC. n.º1 O bold, itálico e sublinhados são nossos.

Y- E que os frutos distribuídos da Herança apesar de Bens próprios da Requerente, não lhe tinham sido entregues por sua própria culpa, já que integravam contas bancárias que aquela não desbloqueava, tentando com tal argumento fazer crer o Tribunal - o qual desconhece todo o imbróglio que envolve esta Partilha -, que os Bens da Recorrente deveriam permanecer na Herança, no sentido da preservação do património!

Z- Tendo todos os argumentos deduzidos na Contestação pelo Requerido coadjuvado, pois, o surpreendente alcance da subtração preparada, cuja dimensão ainda não tinha sido plenamente entendida, e que só agora foi possibilitada pela demonstração que em desespero este veio apresentar na sede acima indicada.

AA- Por outro lado, veio ainda, o Ilustre Mandatário do Requerido, em falsidade alegar - à qual a Recorrente respondeu em Contraditório, com demonstração de prova - que o crédito relacionado à Convenção de Partilha de Jóias não tinha sido executado, como o comprovava a própria Reclamação à Relação de Bens que a ali Reclamante e aqui Recorrente tinha apresentado, esquecendo, que tal Reclamação tinha sido substituída, pois a Ex-Mandatária da Recorrente que a apresentou, plagiou-a de uma anterior peça que tinha sido rejeitada pela lá Requerente diante do primeiro Mandatário, seu autor, ato este que originou, pela sua gravidade, apresentação de queixa crime contra essa senhora advogada.

BB- Por outro lado, demonstrado se dá, ter o Juiz a quo tido em mente, a possibilidade de os Bens que pertencem à Recorrente não lhe serem pagos, como exemplificou colacionando a reclamação de recebimento que esta fez quanto aos frutos da Herança que a mando do Cabeça de Casal declarou em sede de IRS, por virtude da defesa do superior interesse do património da Herança!,relegando, assim, tão simplesmente, os Direitos próprios da Recorrente, numa apreciação processual extemporânea e por esse motivo também inválida.

CC- A Recorrente apresentou uma Petição Inicial que impulsionou os autos no Tribunal recorrido, no âmbito de um Procedimento Cautelar Antecipatório com inversão do Contencioso contra o Cabeça de Casal, e em resumo, uma providência cautelar para entrega de valores que lhe pertencem por direito próprio, os montantes de 200.100,00€ e 176.534,00€ – os quais resultaram de doações celebradas em vida da Inventariada, e também o montante de 176.258,33€, referente a rendimentos da Herança Indivisa que o Requerido mandou a Requerente declarar em sede tributária, valores estes, acrescidos de juros à taxa legal, dirigindo o seguinte pedido: “Termos em que, e nos melhores em direito que Vª. Exª tão proficientemente suprirá, requer se a Vª. Exª. o decretamento da presente Providência Cautelar com Inversão do Contencioso, tutelando em definitivo a entrega dos créditos retidos pelo Requerido à aqui Requerente, condenando consequentemente o Requerido a entregar à Requerente, de imediato, a quantia de 640.672,29 (seiscentos e quarenta mil seiscentos e setenta e dois euros e vinte e nove cêntimos), acrescido de juros vencidos, calculados á taxa legal nesta data, no valor de 63.678,71€ (sessenta e três mil, seiscentos e setenta e oito euros e setenta e um cêntimos), num montante global de 704.351,00€ (setecentos e quatro mil, trezentos e cinquenta e um euros), deduzido do valor já pago e recebido pela Requerente, conforme Doc. nº 9, já junto, no montante de 23.325, 25€ (vinte e três mil trezentos e vinte e cinco euros e vinte e cinco cêntimos) assim como os juros que que lhe corresponderam desde a data da entrega a 24 de maio de 2017 até ao momento presente, computando-se em 439,66€ (quatrocentos e trinta e nove euros e sessenta e seis cêntimos), no valor total de 23.764,91€ (vinte e três mil, setecentos e sessenta e quatro euros e noventa e um cêntimos, perfazendo, nesta data, o montante total de 680.586,09€ (seiscentos e oitenta mil, quinhentos e oitenta e seis euros e nove cêntimos), valor ao qual acrescerão juros vincendos desde a presente data até efetivo e integral pagamento. “

DD- Valor que foi corrigido em sede de Contraditório.

EE- Os bens reclamados integram o património financeiro da Recorrente.

FF- A Requerente, por vontade expressa do Cabeça de Casal, viu os três créditos que detém na qualidade de Bens Próprios, serem-lhe subtraídos antes que lhe fossem entregues: - O montante de 200.100,00€ pela vontade expressa de integrar este valor no passivo da Herança, - O montante de 176.534,00€ pela integração indevida na relação de Bens, e -
O montante de 176.258,33€ com a escusa de as contas estarem bloqueadas por culpa da Recorrente.

GG- O montante de 200.100,00€ estava titulado por um cheque recebido em vida da Inventariada, e extraviou-se quando após o seu depósito, o Banco sacado em erro manifesto o devolveu por virtude de ter considerado não dever ser pago por virtude de as contas estarem bloqueadas, conforme o comprovou nos doc. n º s 6, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da P.I.

HH-O montante de 176.534,00€, resultou de uma Convenção que foi celebrada em vida da Inventariada no mês de novembro de 2008, em virtude de no mês de outubro do mesmo ano a Recorrente o ter exigido com condição à sua aceitação das jóias distribuídas e entregues, conforme o comprovou nos doc. n º. S 4, 5, 19 e 20 da PI.

II- E o montante de 176.258,33€ resultou do cumprimento de instruções recebidas pelo Cabeça de Casal para que apresentasse as Declarações de IRS a eles correspondentes, o que a Recorrente fez na sua Boa fé de os ir receber, já que aceitou a alteração da sua Capacidade Contributiva, conforme o comprovou nos doc. n º. S 1, 2, 3, 7, 8, 10, 11 e 12 da PI.

JJ- Resulta inequívoco da natureza de tais bens Próprios que a ação possessória deve ser dirigida contra o Cabeça de Casal, pois no caso dos montantes de 200.100,00€ e no caso do montante de 176.534,00€ é sobre o mesmo que impende a obrigação tanto do registo dos bens doados em vida em sede de imposto de selo, como da respectiva entrega nos termos do art.º 2088º, n º 2 do Código Civil, e quanto aos rendimentos que mandou os Herdeiros declarar em sede de IRS tal obrigação de entrega encontra assento em princípios constitucionais que interligam o Principio da igualdade, art. 13º, n. 2 da Constituição da República Portuguesa, com os corolários que o integram constituídos pelo Principio da Capacidade Contributiva e da Equivalência.

KK- Assim, é fora de qualquer dúvida que caso o Cabeça de Casal não os entregue, ou os subtraia, escusando-se apoiado numa errada qualificação de bens hereditários, é ele quem responde civil e criminalmente pelos atos praticados contra o património dos credores que assim se veem privados dos seus bens, pois na verdade, é efectivamente sobre o Cabeça de Casal, enquanto administrador dos bens que compõem o acervo hereditário – doados e deixados - que recaem tais deveres de entrega, uma vez reclamados.

LL- E, a acrescentar à ilicitude de retenção de tais bens próprios de Herdeiro no património da Herança pelo Cabeça de Casal – dinheiro no montante de 200.100,00€ e dinheiro no montante de 176.258,33€, é-lhe igualmente negada a possibilidade de os deter, quando - como é o caso gritante quanto ao montante dos 200.100,00€ que foi por todos distribuído em dinheiro entre os nos de 2008 e 2012 -, apenas o reclama quanto a uma única herdeira.

MM- Quanto ao montante de 200.100,00€ o Cabeça de Casal não pode reter essa importância, pelos motivos acima indicados, onde para além do mais tal retenção não é sequer compaginável à luz do Direito, porquanto os bens doados em vida, deixam de pertencer ao futuro património sucessório, para serem administrados pelo donatário, em concreto.

NN- Quanto ao montante de 176.534,00€, a simplória alegação aventada pelo Requerido de que as joias não foram distribuídas, é redundantemente falsa como o comprovam, por um lado, os documentos que a Recorrente apresentou em prova, e também a ausência de revogação por todos assinada onde tivesse sido requerida a assinatura da Recorrente.

OO- Tal documento não existe, pelo simples facto que a não execução não aconteceu.

PP- Aliás, esta distribuição com tradição das mesmas, aconteceu antes da própria Convenção, e em prova, a Recorrente juntou um documento pelo qual atesta que a própria devolveu em OUTUBRO do ano de 2008 a sua quota-parte em espécie que recebeu ao lado das suas irmãs, seja antes da celebração da Convenção de Partilha.

QQ- Tendo comprovado judicialmente através da junção de toda a correspondência que trocou com todos os seus irmãos, que a Convenção que a própria preconizou, veio no seguimento da devolução que a mesma fez das joias por si escolhidas, tendo a Recorrente, por esse único meio - que pressupunha uma Avaliação oficial que também requereu dever ser feita, que sustentasse a dita Convenção de Partilha das ditas joias em Vida da sua Mãe, agora Inventariada, que exigiu, - tentado salvaguardar a sua quota parte nesses bens em momento posterior de Partilha – seja após o óbito da doadora.

RR- No texto convencionado em Partilha ficou estipulado que a Requerente receberia o equivalente noutros bens, onde sempre teve em mente pertencer-lhe a escolha que tinha preconizado – em dinheiro – como o comprovou pela junção dos emails relacionados a este assunto, o qual foi junto em prova junto da petição inicial. O facto de ter permitido que ficasse escrito que receberia a sua quota parte em Partilha, e a ser paga através de outros bens, apenas significou que sendo esse momento aquele que ocorreria após o óbito da sua mãe, não pretendeu de modo nenhum sugerir uma ofensa à sua Mãe doadora, pois quem gerou as condicionantes pelas quais devolveu a sua quota parte foi o Requerido e outra irmã, já que teria tido muito gosto em receber as suas joias, em vida da sua Mãe, como aliás o comprovou pela tradição que recebeu e só depois veio a devolver, fruto de circunstâncias que a tal a impeliram, ocasionadas pelo aparecimento posterior da pedra que compunha um anel, que tinha sido dado como não existente na altura em que a própria e cada uma das suas irmãs escolheram e receberam o respetivo Lote, pedra essa, que era só a joia mais valiosa de todas com um valor de 370.000,00€!

SS- Convém também esclarecer, que nesta Herança Indivisa o património financeiro declarado em sede de Inventário, no ano de 2015, ronda os 9.373.700,00 EUR, pelo que também, em nada encontra justificação o não pagamento à Recorrente dos créditos que lhe pertencem, o qual continua a não ser acompanhado por qualquer pedido de devolução pelo Requerido a si próprio na qualidade de herdeiro donatário e restantes irmãos, do valor que receberam entre 2008 e 2012 no montante de 200.100,00€.

TT- Pois, como já acima mencionado, a devolução do montante dos 200.100,00€, não foi pedida pelo Cabeça de Casal aos restantes Herdeiros que mantêm no seu património o valor que o Cabeça de Casal continua a negar à Recorrente, e quanto às joias, estas foram efetivamente entregues e recebidas, pois a par do Lote de cada uma das suas irmãs que a Recorrente viu receberem - e onde assistiu à declaração da Herdeira que desempenha o cargo de Cabeça de Casal, aqui Requerido, que delas nunca mais se separaria -, apareceu mais tarde a tal pedra mais valiosa desse conjunto de bens -, no valor de 370.000,00€, pedra esta que juntamente com outras joias que na altura da escolha não foram repartidas, nem pela própria Recorrente, nem por nenhuma das irmãs, iriam integrar o lote que supostamente, segundo informação que consta nos emails apresentados, iria ser vendido no estrangeiro com vista a ressarcir os dois irmãos, que na altura nada tinham escolhido, sempre tendo dito que preferiam receber o dinheiro, às joias propriamente ditas.

UU- Assim através da Convenção que foi celebrada em novembro de 2008, ficou certo para a Recorrente, que a sua parte lhe seria entregue em momento posterior – o da Partilha – para não escrever óbito da doadora, já que esta também a assinava – e que os seus irmãos com a tal pedra que apareceu, entretanto, a juntar ao Lote não distribuído, iriam vende-las no estrangeiro para obterem o pagamento imediato.

VV- Constitui, assim, um ilícito a sua inscrição na Relação de Bens e furto a não entrega da quota parte acordada à Recorrente.

WW- Assim, a decisão recorrida falha, inequivocamente quanto à qualificação dos bens jurídicos em pauta, bem como erra quanto à designação de quem tem interesse em contradizer a presente demanda, porquanto, o Cabeça de Casal, é quem ilegitimamente, se encontra a administrar bens doados em vida do autor da sucessão, os quais obviamente, não são hereditários, já que a sua administração cabe, em exclusivo, ao donatário desses bens, in casu, à Recorrente, nos termos do art.º 2087º, nº2 do Código Civil: “Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser administrados pelo donatário.”

XX- E, pese embora, o mérito da ação não seja objeto do presente recurso, é necessário clarificar a natureza dos bens in questio, pois que a decisão recorrida só poderia encontrar fundamento nos termos do art.º. 2091 do CC, caso os bens fossem hereditários e não próprios da Recorrente, tendo o próprio Requerido confirmado em sede processual a natureza dos ditos bens, pois confirmou quanto a dois deles o momento da sua distribuição: o montante de 200.100,00€ em vida da Inventariada e quanto aos rendimentos da Herança Indivisa confirmou terem estes sido distribuídos pelo Cabeça de Casal a todos os Herdeiros, através da instrução a estes para que pagassem o respetivo IRS.

YY- Convém igualmente relembrar que nessa Convenção todos declararam ter já recebido a sua quota parte, com exceção da aqui Recorrente!

ZZ- Assim, a obrigação de pagamento ao Herdeiro que não quis receber a sua quota parte sobre a Partilha convencionada, a qual só existiu por exigência da Recorrente, como forma de ratificar a distribuição com entrega já realizada, recai sim sobre o Cabeça de Casal e não sobre os restantes Herdeiros, pois é sobre este que recai, não só a obrigação de identificar em sede de Imposto de Selo as respetivas doações em vida, como também cumprir com a respetiva execução de entrega.

AAA- A dita Convenção de Partilha em Vida não resultou duma pré-Partilha a ser executada após a morte da sua donatária, pois, aquela Convenção de Partilha das joias resultou apenas e só, como já acima referido, da exigência que a própria Recorrente apresentou, como forma de ratificar a distribuição com tradição já realizada.

BBB- E por todos os motivos apresentados, comprovado fica que NUNCA PODERIA EXISTIR UM PACTO SUCESSÓRIO NUMA PARTILHA QUE SÓ SE APLICASSE A UM DOS SUBSCRITORES DA MESMA, decorrendo tais direitos reclamados de uma Partilha celebrada em Vida, não revogada, conforme se comprovou, onde cabe ao Cabeça de Casal o seu cumprimento, nada mais!

CCC- Através da dita Convenção, a Doadora, agora Inventariada, despojou-se jurídica e irrevogavelmente da titularidade e posse sobre os bens nela avocados, os quais ficaram assim excluídos da sucessão, conferindo através da dita tradição, um Direito Próprio a todos os Herdeiros, onde se incluem aqueles que abdicaram da respetiva posse naquele momento, in casu a Recorrente.

DDD- Na sentença recorrida, parece confundir-se o instituto da posse com o direito de propriedade que efetivamente se consolidou na esfera jurídica da Recorrente, com a efetivação do ato translativo de propriedade da Doadora, para a Donatária Recorrente.

EEE- Assim, neste capítulo atinente à Partilha das Joias da Inventariada, através da qual à Recorrente correspondeu um crédito, peticionado na presente Providencia Cautelar, conclui-se com toda a certeza, que o Direito que lhe subjaz, não se extrai do Direito Sucessório, onde a qualificação de tais bens se enquadraria na aplicação do regime subsumido aos Bens Hereditários, como erradamente se concluiu na sentença recorrida, mas sim e antes, decorre de uma Doação celebrada em Vida, por todos aceite e acordada, com transmissão da respetiva propriedade e posse, a qual foi deferida unicamente pela Recorrente, que exigiu que tal compensação lhe fosse entregue após o momento do óbito “momento da partilha” sob a forma de outros bens, in casu dinheiro.

FFF- Pela Providência interposta, a Recorrente veio, assim reclamar, não o direito de propriedade que é seu, mas a tomada de posse, identificando claramente o modo como pretende ser ressarcida, resultando este seu Direito de propriedade de uma doação recebida em Vida, onde através de uma Convenção que a própria exigiu como forma de ratificar a tomada de posse por parte dos outros Herdeiros donatários, deferiu a respetiva tomada de posse identificando prescindir das mesmas, e onde foi determinado o valor pecuniário a receber.

GGG- É pois como titular de um Bem próprio que a Recorrente se apresentou nesta Providência reclamando a posse que o Requerido com estratagemas lhe nega entregar, estando tal direito consagrado nos termos do art.º 2088, n º. 2 do Código Civil, o qual lhe confere o direito de reclamar a dita posse judicialmente contra o Cabeça de Casal.

HHH- É ao Cabeça de Casal que cabe declarar tais doações em vida em sede de Imposto de Selo, também é ao próprio que cabe prover ao cumprimento da obrigação que se originou por Ato celebrado em vida onde o próprio foi subscritor e donatário pleno, como bem o refere o texto da Convenção por todos assinada.

III- Donde resulta que não tendo cumprido com as suas obrigações voluntariamente, apesar de a tal instado, só resta ao respetivo beneficiário vir judicialmente apresentar a reclamação pela sua posse, a qual só poderá ser levada a cabo no predito âmbito do art.º 2088º, nº 2 do Código Civil, diante do incumpridor Cabeça de Casal, único que detém a legitimidade passiva para ser instado ao respectivo cumprimento em falta.

JJJ- No que concerne ao valor de 200.100EUR proveniente de distribuição em vida feita pelo Requerido sob o âmbito de poderes totais de gestão que lhe foram conferidos no âmbito de uma Procuração que a Inventariada com ele celebrou, na sua qualidade de Herdeira, juntamente com outros dois herdeiros, o mesmo regime se extrai, pelo que, a administração deste valor pertence ao donatário, e não ao Cabeça de Casal da Herança, que ilicitamente, tem vindo a administrar e recusar a entrega à aqui Recorrente, usurpando-lhe a posse que lhe pertence por direito.

KKK- E, o mesmo se confere, em regime diferente, ao até aqui prolatado, no que respeita ao pagamento peticionado dos rendimentos gerados pela Herança Indivisa e ordenados à declaração fiscal, em sede de IRS, que o Cabeça de casal preconizou aos herdeiros, os quais porque distribuídos apesar de não entregues, entraram no património jurídico da aqui Recorrente, tendo esta o direito ao seu recebimento, como inferiu concludentemente a Autoridade Tributária que face ao pedido de anulação do IRS declarado veio em resposta dizer que se a Recorrente não recebeu o dinheiro proveniente dos rendimentos da Herança Indivisa, tal então deverá ser reclamado por esta em sede judicial contra o Cabeça de Casal que indevidamente “guardou/apropriou-se de dinheiro que lhe pertence”, como segue:“Cabe a cada herdeiro questionar o cabeça-de Casal da Herança da prestação de contas e caso não concorde com as mesmas, intentar uma ação judicial, uma vez que, pelo que decorre da exposição da reclamante, um terceiro "guardou"/apropriou-se de dinheiro que lhe pertence.
Não cabe à Autoridade Tributária dirimir conflitos entre particulares. Em sede de IRS os rendimentos têm que ser declarados, conforme já anteriormente mencionados (ponto 8 a 11 ), no momento em que os rendimentos são auferidos, não alterando os valores declarados a distribuição por cada herdeiro dos resultados da Herança.” O bold, itálico e sublinhado são nossos,

LLL- De facto, os rendimentos da Herança, não distribuídos pelo Cabeça de Casal, mas que através das suas funções ordenou aos Herdeiros a respetiva declaração em sede de IRS, estão de momento, a ser indevida e inconstitucionalmente administrados por si, ao invés da sua entrega à aqui Herdeira e Recorrente, e tal comportamento gera uma administração de bens alheios à Herança, razão pela qual, a Recorrente, instou o Cabeça de Casal, administrador ilegítimo desses bens, que lhe pertencem por Direito na predita Providência Cautelar.

MMM- A decisão recorrida, talqualmente se afere pela sua leitura, debruçou-se sobre a invocada exceção dilatória da ilegitimidade com o fundamento nos “direitos da herança”.

NNN- A este respeito, refere a decisão recorrida que “Se atentarmos na redação do art.º 2091º constatamos que se trata do regime regra para o exercício dos direitos da herança, sendo as restantes situações as respectivas exceções.” e, fundamentando a opção normativa que o tribunal a quo enquadrou no caso concreto, refere que “Contrariamente ao argumento esgrimido no exercício do contraditório, a Requerente não é proprietária de bens concretos da herança nem tão pouco possuidora – a presente providência tem em vista fazer ingressar no seu património bens cuja posse nunca deteve,
- pois até à partilha, nenhum dos herdeiros tem um direito efetivo sobre bens determinados no património hereditário, mas apenas tem, cada um deles, um direito próprio e exclusivo à herança enquanto universalidade, mais propriamente uma quota ideal um função do título do seu chamamento para encabeçar as relações patrimoniais do de cuius.” O itálico é nosso.

OOO- Ora, a opção normativa selecionada pelo tribunal recorrido é completamente desacertada, porquanto, não encontra qualquer suporte-eixo com a factualidade adiantada pela aqui Recorrente, nem na Petição Inicial interposta, nem no Contraditório oferecido quanto a esta questão, a qual, se diga, veio imprimir clareza a qualquer ambiguidade que se pudesse assacar ao caso em concreto.

PPP- Tal como já identificado supra, a sentença recorrida, afastou-se deliberadamente do critério legal prescrito no nº 3 do art.º 30º do Código de Processo Civil, que define a regra de determinação da legitimidade das partes em função da titularidade da relação material controvertida, tal como foi descrita na petição inicial:

“na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares de interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.”

QQQ- Com esta norma consagrou-se, decididamente, a tese sustentada por BARBOSA DE MAGALHÃES, no sentido de que, quando a legitimidade deva ser determinada apenas em função da titularidade da relação material controvertida, esta deve ser considerada com a configuração dada unilateralmente na petição inicial (LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2.ª edição, 2004, pág. 59).

RRR- Desta forma, está definido o critério de determinação da legitimidade das partes, como pressuposto processual, em função da titularidade da relação material controvertida, tal como é descrita na Petição Inicial.

SSS- Ora a Recorrente, indicou na Petição Inicial que impulsionou os autos, que a legitimidade passiva estava regularmente assegurada pela presença do Cabeça de Casal da Herança Indivisa de S. C., porquanto esta, encontra-se a administrar, ilicitamente, no domínio das suas funções de Cabeça de Casal, bens próprios da Recorrente, que não são bens hereditários, adquiridos por doação em vida da Inventariada, e rendimentos que providenciou junto dos herdeiros, para que estes os declarassem em sede tributária, e também indicou que o Cabeça de Casal os retinha indevidamente, sem que lhos tivesse entregue. Assim, o Juiz recorrido, afastou-se inegavelmente da previsão normativa acima identificada, para o suporte da sua decisão, e incorreu na apreciação prévia relacionada à natureza dos bens reclamados.

TTT- Assinalando-se como segundo erro da decisão recorrida a denominação atribuída juridicamente aos bens reclamados como Bens da Herança, quando in casu, a Recorrente veio reclamar o recebimento dos seus Bens próprios que estavam indevidamente retidos na Herança pelo Cabeça de Casal.

UUU- A Recorrente bem sabe, que não é proprietária de qualquer um dos Bens da Herança em exclusivo, até porque é jurista. Bem como sabe, com certeza absoluta, que é proprietária dos bens partilhados em vida da doadora, sua Mãe e daqueles que declarou em sede de IRS por instrução do Cabeça de Casal.

VVV- O tribunal recorrido tomou, pois, conhecimento da natureza dos bens que originaram os valores pedidos em pagamento ao Cabeça de Casal da Herança Indivisa, através da exposição factual expressa na Petição Inicial, nos documentos de suporte que acompanharam a Petição Inicial e por fim no contraditório apresentado.

WWW- Ainda assim, em relação aos bens doados em vida da Inventariada, o Juiz a quo veio apodar os Bens in questio, como Bens da Herança.

XXX- E, tal como aventado em apartado precedente, a constituição do valor requerido em pagamento relativo às joias, e ao cheque, distribuídos em vida pela Mãe da Recorrente, integram o património da Recorrente, definitivamente.

YYY- A doação em vida não é um contrato sucessório – art.º 2029º do Código Civil.

ZZZ- O contrato sucessório é um negócio mortis causa e a doação e a partilha em vida são contratos inter vivos, destinados por conseguinte, a produzir efeitos em vida.

AAAA- A partilha em vida, segundo Pereira Coelho, in Direito da Sucessões, 1992, pág. 33 e seguintes, prevista no artigo 2029º do Código Civil “não configura um pacto sucessório porque os bens são doados em vida, não são deixados pelo doador e não fazem parte da herança.”

BBBB- E, também, tais bens não foram doados por conta da Legítima, só podendo ser chamados à colação caso ofendam a quota indisponível, desde que requerido pelo Herdeiro Legitimário, o que foi já feito.

CCCC- O Juiz a quo não observou adequadamente o pedido e a pretensão formulada pela ali Requerente e agora Recorrente, pois, não estão em causa bens da Herança Indivisa, mas antes, bens doados em vida, que pertencem à Recorrente, apenas e só por determinação, fraudulenta e intencional do Cabeça de Casal, o montante relacionado à Partilha das Joias foi integrado na Relação de Bens da Herança Indivisa de S. C., em inventário que corre termos no Cartório Notarial.

DDDD- Assim como, igualmente, o mesmo tipo de intenção presidiu ao alegado pelo Ilustre Mandatário do Requerido ao dizer que iria relacionar que o montante distribuído por todos entre 2008 e 2012 que perfaz a quantia de 200.100,00€ no passivo da Herança, o que, porém, não concretizou até ao dia de hoje, e muito bem! Mostrando se este montante sem qualquer relacionação nem em sede de Relação de Bens ou mesmo de Bens doados em vida!

EEEE- O que constitui sonegação inclusive, na medida em que todas as doações têm de ser declaradas fiscalmente.

FFFF- O facto de a descrição detalhada da natureza dos bens ter fundamentado esse Capítulo, não obsta ao conhecimento do alegado por parte do Juíz a quo, o qual, mesmo não tendo de se pronunciar sobre o mérito do pedido de litigância de Má fé, não poderia desconhecer dos fundamentos que o legitimavam, principalmente quanto àqueles de natureza material, como alegado, e que se reportavam à natureza específica desses Bens, como sendo próprios da Recorrente.

GGGG- O Juiz a quo, confunde salvo melhor opinião, a pretensão deferida nestes autos, com uma pretensão de caracter hereditário:

O artigo 2.078º do Código Civil determina que, sendo vários os herdeiros, qualquer deles tem legitimidade para pedir separadamente a totalidade dos bens em poder do demanda do, sem que este possa opor-lhe que tais bens não lhe pertencem por inteiro.
O nº 2 clarifica que a norma anterior não prejudica o direito que assiste ao cabeça de casal a entrega dos bens que deva administrar, nos termos definidos pelos artigos 2.079º a 2090º.
Por sua vez, o artigo 2091º estatui que fora dos casos previstos nas normas anterior- mente citadas, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros.
(…)
Se atentarmos na redação do artigo 2.091º constatamos que se trata do regime regra para o exercício dos direitos da herança, sendo as restantes situações as respectivas exceções.

Contrariamente ao argumento esgrimido no exercício do contraditório, a Requerente não é proprietária de bens concretos da herança nem tão pouco possuidora – a presente providência tem em vista fazer ingressar no seu património bens cuja posse nunca deteve – , pois até à partilha, nenhum dos herdeiros tem um efetivo e exclusivo direito sobre bens determina- dos no património hereditário21, mas apenas tem, cada um deles, um direito próprio e exclusivo à herança enquanto universalidade22, mais propriamente uma quota ideal em função do título do seu chamamento para encabeçar as relações patrimoniais do de cuius.
Os direitos previstos nos artigos 2.078º nº 1, 2.088º nº 2 e 2.091º nº 1 do Código Civil visam conservar o património hereditário, evitando a sua perda ou deterioração, sendo a ratio dessas normas o interesse de todos os herdeiros na preservação do seu conteúdo23, compreendendo a última norma, pela sua abrangência, também, as situações em que um ou vários herdeiros têm uma pretensão própria relativamente a bens da herança.”

IIII- E, tal erro notório de apreciação, conduziu a uma decisão contrária à verdade material e à lei, Tendo, assim, incorrido o Tribunal recorrido, num erro na apreciação da matéria subjacente à Ação formulada pela agora Recorrente, e que deve ser fustigado com a inversão da decisão dada e que absolveu a Requerida da instância.

JJJJ - Foi ainda aventado naquela decisão, em prol de determinar a absolvição da instância da Requerida, que “Os direito previstos nos artigos 2078º,nº1 e 2, art.º 2088º,nº2 e 2091º,nº1 do Código Civil visam conservar o património hereditário, evitando a sua perda e deterioração, sendo a ratio dessas normas o interesse de todos os herdeiros na preservação do seu conteúdo, compreendendo a ultima norma, pela sua abrangência, também as situações em que um ou vários herdeiros tem uma pretensão própria relativamente aos bens da herança.” O itálico é nosso.

KKKK- A Recorrente convocou, para a defesa da legitimidade passiva dada na sua petição inicial, conferindo-a em exclusivo ao Cabeça de Casal, o nº 2 do art.º 2088º do Código Civil e acertadamente conforme se infere.
LLLL - O art.º 2088º do Código Civil é uma das exceções à regra prevista no artigo 2091º do Código Civil, e o seu numero 2 refere que “O exercício de ações possessórias cabe igualmente aos herdeiros ou a terceiro, contra o cabeça de casal.”

MMMM- A redita previsão normativa abrange especialmente o caso sub judice: refere-se aos casos em que o Cabeça de Casal detém bens pertencentes aos herdeiros ou a terceiros, dispondo que a ação deve ser movida contra o Cabeça de Casal.

NNNN - Assim, em face do acima explanado, atenta a natureza dos bens doados em vida à aqui Recorrente, esta só podia demandar o Cabeça de Casal nos presentes autos, e não ao contrário do que o Juiz a quo veio aventar na sua decisão quando refere “ Contrariamente ao argumento esgrimido no exercício do contraditório, a Requerente não é proprietária de bens concretos da herança nem tão pouco possuidora – a presente providência tem em vista fazer ingressar no seu património bens cuja posse nunca deteve – pois até à partilha, nenhum dos herdeiros tem um efectivo e exclusivo direito sobre bens determinados no património hereditário, mas apenas tem, cada um deles, um direito próprio e exclusivo à herança enquanto universalidade, mais propriamente uma quota ideal em função do titulo do seu chamamento para encabeçar as relações jurídicas do património do de cuius.” O itálico é nosso.

OOOO - O Juiz a quo, confundiu efetivamente a natureza dos bens que a Recorrente peticionou na ação cautelar: a Recorrente reclama o pagamento de Bens Próprios, adquiridos nos termos do art.º 2029º do Código Civil e não de bens hereditários, e devido ao desacertado enquadramento jurídico dos referidos bens, o Juiz a quo convocou o art.º 2091º do Código Civil, erradamente, afastando com a sua opção, o devido enquadramento da pretensão da Recorrente no âmbito do art.º 2088º, nº2 do mesmo Diploma.

PPPP - Refere com efeito que “Sucede que ao arrogar-se direito ao montante de € 637.338,44, cuja entrega visa neste procedimento, a Requerente não tem em vista defender a integridade do património hereditário, mas antes deduz uma pretensão que afeta o seu conteúdo e, em consequência, o idêntico direito dos restantes herdeiros, mormente, no que diz respeito ao montante de € 176.534 relativo ao valor das joias (…)”

QQQQ- Ora acontece que o Tribunal recorrido não atentou sobre o alegado, nem sobre a prova apresentada nos autos, quanto à questão das joias a que se refere no parafraseado excerto da decisão judicial.

RRRR - Na Sentença recorrida sugere-se que os irmãos da Recorrente ainda não receberam 176.534EUR relativo ao valor das joias. Nada mais errado. Encontra-se junta aos autos, sob a designação Doc. nº 4 da Petição Inicial, uma Convenção de Partilha de joias, onde todos os irmãos da Recorrente, à sua exceção, declararam que já receberam esse valor.

SSSS - As jóias, mais uma vez se refere, foram recebidas por ato translativo da propriedade, conforme consta do teor do texto da Convenção, que nunca foi atacado.

TTTT- Nenhum dos herdeiros, à exceção da Recorrente, tem direito a receber qualquer valor relativo às jóias, porquanto, em vida da Inventariada, já receberam em espécie ou venderam o lote não selecionado pelo Requerido e outra irmã para pagamento aos seus irmãos.

UUUU - Refere-se ainda na Sentença: “O mesmo efeito terá a pretensão à entrega do montante titulado pelo cheque devolvido por bloqueio da conta devido ao óbito da progenitora, subsequentemente extraviado por funcionário do Banco onde domiciliara a sua correspondência bancária25, que segundo a sua própria sugestão foi relacionado como passivo da herança26, estando dependente da aprovação de 21 todos aos interessados do inventário na conferência preparatória, nos termos do artigo 48º nº 3 da Lei nº 23/2013 de 5 de Março, (…) O itálico é nosso.

VVVV- E, por referência ao alegado, o Juiz a quo, identifica o documento nº 10 oferecido na oposição feita pela Requerida.

XXXX - Esse documento, talqualmente foi referido em sede de Contraditório, foi impugnado pela Recorrente, porquanto, o mesmo já foi objeto de substituição e a explicação de tal substituição igualmente foi apresentada nessa predita sede de contraditório, onde se explicou que tal versão apresentada supostamente pela ali Requerente, tinha muito pelo contrário sido rejeitada pela mesma diante do autor da peça, e só por plágio não autorizado, foi submetida nos autos do Inventário como se tivesse sido por si aceite.

YYYY - Razão pela qual, o tribunal a quo, estava impedido de se pronunciar sobre esse requerimento, enquanto essa impugnação não fosse decidida.
Aliás, o documento, reparando o alegado na Sentença de que se recorre, que se refere à intenção de relacionação do crédito de 200.100EUR, relativo ao cheque, é o documento nº 14 junto com a Petição Inicial, e a sugestão para a sua relacionação no passivo na herança é do Ilustre Mandatário do Cabeça de Casal, e não da aqui Recorrente,

ZZZZ- A decisão recorrida, refere por fim, no que tange ao peticionado pagamento dos rendimentos gerados pela Herança, e que o Cabeça de Casal não entregou à Recorrente que:

“ (…)os rendimentos a que entende ter direito em função das declarações fiscais que alegadamente foi induzida a apresentar, os quais, em caso de procedência terão como consequência a modificação do conteúdo do património a partilhar.

A situação não se subsume na previsão dos artigos 2.078º nº 1 ou 2.088º nº 2 do Códi- go Civil, mas antes, na previsão geral do artigo 2.091º existindo uma situação de litisconsórcio necessário passivo na medida em que “é necessária a intervenção de todos os interessados” pois “pela natureza da relação jurídica” a mesma é “necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal”27.
O efeito útil normal, no caso, apenas será alcançado com a presença em Juízo de todos os herdeiros – a Requerente no lado ativo e os restantes no lado passivo.
Pelo exposto, nos termos dos artigos 278º nº 1 alínea d), 576º nº 2, 577º alínea e), 595º nº 1 alínea a) do Código de Processo Civil, no presente procedimento cautelar intentado pela Requerente Maria, o Tribunal absolve da instância a Requerida A. G.. “ o Itálico é nosso
.
AAAAA- Visualizando, mais uma vez, a Recorrente na decisão recorrida, uma solução desacertada no que concerne à aferição da ilegitimidade passiva do Requerido.

BBBBB - Os rendimentos foram gerados naturalmente pela Herança e foram distribuídos pelo Cabeça de Casal – vide doc. nº 1, 2, 3, 7, 8, 9 11 e 12 da Petição, e essa distribuição infere-se pela instrução por si dada a cada Herdeiro para que declarasse em sede de IRS, o recebimento desses rendimentos.

CCCCC - Tais rendimentos não foram pagos, nem postos à disposição da Recorrente, que ao declará-los, apenas alterou a sua capacidade contributiva positivamente perante a Autoridade Tributária, pois na verdade, essa capacidade não existe, por força do não recebimento desses rendimentos e estão retidos indevidamente pelo Cabeça de Casal, e não são igualmente bens hereditários, razão pela qual, a decisão proferida está igualmente ferida de erro de apreciação.

DDDDD - A distribuição pelos herdeiros dos rendimentos da Herança Indivisa, opera a transferência desses bens do acervo hereditário para o acervo pessoal de cada herdeiro, passando a integrar o património de cada um, não existe qualquer relação intrínseca entre a decisão que refere que “ (…)os rendimentos a que entende ter direito em função das declarações fiscais que alegadamente foi induzida a apresentar, os quais, em caso de procedência terão como consequência a modificação do conteúdo do património a partilhar.” com o objeto destes autos, porquanto, os bens peticionados a pagamento são bens da Recorrente e não bens hereditários,

EEEEE - O que obsta ao chamamento por colação do art.º 2091 do Código Civil, já que tais os bens não são hereditários, e também relativamente aos bens hereditários, a própria Recorrente defendeu incansavelmente esse património, tendo sobre ele, intentado a Providência Cautelar de Arrolamento, melhor identificada no doc. nº 11 da Oposição, conforme junto e atestado pelo próprio Recorrido, como forma de promover a sua conservação.

FFFFF- O que convoca a aplicação do art.º 2088º, nº2 do CC, porque os bens são próprios da Recorrente e esta demanda o Cabeça de Casal da herança, apoiada nesse normativo, pois este se encontra a administrar bens alheios à Herança.

GGGGG- Na senda do exaustivamente exposto, no sentido do apuramento autónomo da legitimidade, subsequente à luz da causa de pedir e pedido da própria providência cautelar, concluímos que no lado passivo, deve encontrar-se o sujeito que, na versão do Requerente, é responsável pelos atos ou omissões criadores do risco de lesão grave e dificilmente reparável a quem é imputada a conduta cujos efeitos se pretendem prevenir.

HHHHH- O objeto da ação cautelar é a entrega de bens próprios da Recorrente.

IIIII - O valor atinente ao crédito que detém sobre as joias identificadas no Doc. nº 5 da petição inicial, e decorrente da Convenção de Partilha dessas joias, celebrada em vida da Inventariada, Mãe da Recorrente, e melhor identificada no Doc. nº 4 da Petição, insere-se nas doações em vida.
e o mesmo acontece quanto ao valor indicado no cheque identificado no Doc. nº 6 da Petição Inicial, que correspondeu a uma distribuição preconizada pelo Requerido no âmbito de uma Procuração que detinha celebrada pela sua Mãe a seu favor e de dois outros irmãos, onde lhes conferiu poeres totais de gestão patrimonial doação em vida da Inventariada, que faleceu em 28 de julho de 2014.

JJJJJ - Refere o art.º 2029º, nº1 do Código Civil que “Não é havido por sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou de parte deles a algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.

LLLLL - Assim, efetuada a doação, o donatário recebe na sua esfera jurídica o objeto da mesma, configurando à luz do direito, um bem próprio, o qual não se confunde com o direito de posse, agora reclamado, apesar deste não poder existir sem a constituição prévia do respectivo direito de propriedade.

MMMMM - Todos os bens peticionados na ação cautelar, que pertencem à Recorrente, como proprietária dos mesmos, estão a ser ilicitamente administrados pelo Cabeça de Casal da Herança Indivisa, que apoiando-se na transmutação que o próprio operou à da natureza dos Bens da Recorrente, pretendeu inseri-los na Herança, como bens deixados e não no acervo hereditário como bens doados, privando-a da sua fruição.

NNNNN - Refere o Acórdão da Relação do Porto de 1. 3. 2007, proc. Nº 0636972, in www.dgsi.pt que:

”1- A administração da herança abrange, em principio, a totalidade dos bens do património hereditário, (…)
II – A mesma só não incide sobre os bens doados em vida do autor da sucessão, que não se consideram hereditários e cuja administração continua a caber ao donatário, (…).
OOOOO - Assim também o refere o artigo 2087º, nº2 do Código Civil que: “Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser administrados pelo donatário.”

PPPPP - Estes bens, em suma, constituem pois, propriedade do donatário, e o mesmo se passa quanto aos rendimentos gerados pela Herança, pois que deixaram de ser hereditários, porque foram distribuídos, embora não entregues, pelo menos à Recorrente, e assim ingressaram no património desta.

QQQQQ- De acordo com o supra exposto, a Recorrente, seguindo as linhas orientadoras insertas no nº 2 do art.º 2088º do Código Civil, demandou o Cabeça de Casal da Herança, por se tratar de ação possessória que visa a entrega dos bens próprios que o Cabeça de Casal administra, ilicitamente.

RRRRR - A este respeito, refira-se que foi intencional e expressa a vontade do legislador em tomar expressa posição sobre a vexata questio do estabelecimento do critério de determinação da legitimidade das partes, assentando-a consequentemente na titularidade da relação material controvertida, tal como a configura o autor na sua petição inicial.

SSSSS - Neste contexto a Jurisprudência tem vindo a assegurar tanto a opção legislativa integrada no comando normativo, apreciando em concreto essa integração, como são exemplos:

Acordão da Relação de Lisboa, de 24.4.2008, proc. 2509/2008, in www.dgsi.net:

“ I – O julgador para aferir da legitimidade das partes tem apenas de atentar na relação material controvertida como o autor a apresenta na petição inicial para em face dela verificar se o autor e o réu são sujeitos com interesse direto em demandar ou contradizer.
II – Não importa saber se a relação é verídica ou não, não importa indagar da posição que o reu sobre ela venha a assumir, não importa considerar a relação que tenha resultado da discussão da causa, pois que esta vai interessar antes para o conhecimento de mérito.”
Acordão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14.11.2006, Proc. Nº 06ª3624, in www.dgsi.net: “ A legitimidade para o pedido da autora é aferida pela relação jurídica tal como aquela a configura.”
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.1.2010, proc. Nº 115/07.4TBVPT.L1.S1, in www.dgsi.net:
I – In casu, a legitimidade resultará simplesmente da afirmação, pela autora, da existência da situação jurídica absoluta, independentemente da sua efetiva existência e titularidade. (…)

TTTTT - Assim, e porque o Tribunal recorrido estava impedido de conhecer do mérito da causa, a sentença proferida advém nula, pois demonstrou na decisão em crise, considerandos sobre a natureza dos bens e do regime que julgou se lhes aplicar, neles se apoiando como suporte à decisão vertida nos autos, a qual é contrária ao disposto nos art.º 2029º, 2087º, nº 2 e 2088º, nº2 do Código Civil.

UUUUU - A sentença recorrida fez assim, uma errada interpretação e aplicação do direito, violando o disposto no art.º 30º do Código do Processo Civil, art.º 2029º, 2087º, nº2 e 2088º, nº2 do Código Civil introduzindo nessa decisão o vício da nulidade, importando necessariamente a sua reparação, o que se requer a este Tribunal Superior.

VVVVV- Não tendo tido em linha de conta o vertido em sede de Contraditório, facto que em concreto se alinha com o valor que foi aí corrigido e não considerado na Sentença proferida, pelo que decidiu em contravenção ao disposto no art.º 304º, nº 1 e nº 3, alínea d) e 306º do Código do Processo Civil, pelo que o valor do prejuízo que se pretende acautelar é 588.217,26EUR (quinhentos e oitenta e oito mil, duzentos e dezassete euros e vinte e seis cêntimos).

XXXXX - Estando, assim, também ferida de nulidade por este prisma considerado.

ZZZZZ - Na senda do vindo de referir, vem a Recorrente, insurgir-se contra a decisão recorrida, e requerer a Vs. Exs. Senhores Juízes Desembargadores, seja a mesma revogada, porque nula, e substituída por outra que declare a legitimidade passiva do Recorrido nestes autos.

Termos em que e nos melhores em direitos que os senhores juízes desembargadores suprirão, roga-se a revogação da sentença proferida, por outra decisão que declare a legitimidade passiva dos autos, tal como configurada pela aqui recorrente, revogando assim a decisão que declarou procedente a exceção dilatória da ilegitimidade.

A parte contrária contra-alegou, mas não ofereceu conclusões, tendo pugnado pela rejeição do recurso por falta de conclusões e assim não se entendendo, pela manutenção da sentença recorrida e pela condenação da apelante como litigante de má fé.

II – Objeto do recurso

Considerando que:

. o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,
as questões a decidir são as seguintes, de acordo com as conclusões da apelante:
. se a sentença é nula;
. se deve ser alterado o valor do procedimento; e
. se a Requerida é parte legítima e, em caso afirmativo, se a Mma. Juiz a quo deveria ter convidado a R a fazer intervir na acção os demais herdeiros;

III – Fundamentação

A situação factual é a supra descrita.

Da não admissão do recurso

Alega a apelada que o recurso deve ser rejeitado por não conter “verdadeiras” conclusões, uma vez que embora sob a epígrafe conclusões, a apelante se limitou a reproduzir o corpo alegatório do seu recurso.
A reprodução nas “conclusões” do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, pelo que, em lugar da imediata rejeição do recurso, nos termos do art. 641º, nº 2, al. b), do NCPC, é ajustada a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, nos termos do art. 639º, nº 3, do NCPC (cfr. se defende no Ac. do STJ de 09.07.2015, processo 818/07, relator Abrantes Geraldes).
No entanto, entende-se que neste caso não se impunha o convite ao aperfeiçoamento. A apelante fundamenta o seu recurso ao longo de 49 páginas e 183 artigos e apresenta 119 conclusões, ao longo de 20 páginas, pelo que, embora extensas, não se pode concluir que as conclusões sejam a total reprodução do corpo alegatório do recurso.
O recurso é pois de admitir.

Da nulidade da sentença

Alega a apelante que a sentença é nula porque errou na qualificação dos bens reivindicados pela apelante.
Ora, a sentença é nula nos casos consagrados taxativamente no artº 615º do CPC, não tendo a apelante invocando qualquer dos pressupostos da nulidade constantes das diversas alíneas do nº 1 do artº 615º do CPC.
O que a apelante aponta à sentença recorrida é um erro de julgamento – errada qualificação dos bens – o que pode conduzir à revogação da sentença, mas não é causa da sua nulidade, pelo que improcede a arguição de nulidade.

Do valor do procedimento

A Mma. Juiza a aquo fixou à causa o valor de 637.338,44. A apelante alega que por requerimento posterior alterou o valor dos créditos peticionados para o valor de 588.217,26EUR, no requerimento oferecido como resposta às exceções. Não obstante, a Mma. Juíza fixou à causa um valor diferente, não atentando na alteração.

No requerimento inicial a requerente indicou o valor de 637.338,44.

Posteriormente, tendo sido convidada a apresentar novo requerimento inicial aperfeiçoado, aumentou o valor da causa para 680.586,09 (fls 53 a 67).

Após a contestação, alegando vir a exercer o contraditório sobre as exceções invocadas, requereu a rectificação dos valores indicados, alegando ter havido lapso, e indicou o valor de 588.217,26 (fls 515).
Não estando em causa qualquer dos procedimentos nominados a que se reporta o artº 304º, nº 3 do CPC, deve atender-se à regra geral, constante dos artºs 296º e 297º do CPC, os quais dispõem que a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido (artº 296º, nº 1 do CC) e, se pela acção se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa (artº 297º, nº 1 do CPC).

A apelante pretende que a apelada lhe entregue determinados créditos, pelo que o valor do procedimento é determinado pelo valor que pretende obter, ou seja, a quantia de 588.217,26, alterando-se o valor do procedimento para este valor.

Da legitimidade da requerida

Está hoje pacificamente aceite, até porque recebeu consagração legal, que a legitimidade das partes se afere perante a sua posição na relação jurídica controvertida, tal como é configurada pelo autor/requerente (artº 30º, nº 3 do CPC).
A requerida nos presentes autos é A. G., na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa por morte de S. C.. Tal resulta dos termos em que a requerida é identificada no requerimento inicial, sendo identificada como representante da herança e não em nome próprio.
Entendeu-se na sentença recorrida que a apelante deduziu uma pretensão que afecta o conteúdo do património hereditário e como tal o procedimento deveria ter sido instaurado contra todos os herdeiros, aplicando-se o disposto no artº 2091º, nº 1 do CC e não o artº 2088º, nº 2 do CC, em que a apelante se fundamenta.

Dispõe o artº 2088º, n1 do CC que o cabeça de casal pode usar contra os herdeiros ou terceiros de acções possessórias a fim de ser mantido na posse da coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído.

O artº 2088º ilustra a importância das funções de administração do cabeça de casal quanto aos bens da herança e cuja administração lhe caiba, mostrando-se tal entrega necessária para o exercício dos poderes administrativos. A lei confere ao cabeça-de-casal tutela possessória, embora não o considerando como possuidor (cfr. defende Isabel Menéres Campos, Código Civil Anotado, Livro V, Direito das Sucessões, Coordenação de Cristina Araújo Dias, anot. Ao artº 2088º). O cabeça de casal pode socorrer-se das acções possessórias contra terceiros e os próprios herdeiros e ainda desencadear as providências judiciais que se mostrem adequadas a essa finalidade, incluindo a execução para entrega de coisa certa

E nos termos do nº 2 do artº 2088º, o exercício das acções possessórias cabe também aos herdeiros ou a terceiro contra o cabeça de casal.

Assim, a lei faculta aos herdeiros e ao cabeça de casal um meio específico para serem restituídos à posse de determinados bens.
A apelante entende que não tem que deduzir o procedimento cautelar contra todos os herdeiros porque os bens são próprios e não fazem parte do património hereditário.

Vejamos:

Distribuição dos rendimentos da herança relativos ao ano de 2014, 2015 e 2016
De acordo com o artº 2069º, d) do CC fazem parte da herança os frutos percebidos até à partilha. Fruto é tudo o que a coisa produz, sendo frutos naturais os que provêm directamente da coisa, como se verifica com os produtos agrícolas e os frutos civis correspondem às rendas ou interesses que a coisa produz em consequência de uma relação jurídica (artº 212, nºs 1 e 2 do CC).

Porque os frutos da coisa não pertencem ao cabeça de casal a quem incumbe administrar a herança, incumbe-lhe distribui-los pelos herdeiros, mesmo antes determinar a sua gestão e à medida desta (artº 2092º do CC), tendo em atenção o que dispõe o artº 213º do CC.

A herança enquanto indivisa é administrada pelo cabeça de casal e no desempenho do cabecelato, o cabeça de casal tem de fazer face aos respectivos encargos, destinando-se os rendimentos dos bens que administra, em primeiro lugar, a fazer face aos encargos da herança e, só os sobrantes poderão ser distribuídos pelos interessados.

Enquanto a partilha não estiver efectivada e terminada, no decurso do exercício do cabecelato, qualquer dos herdeiros ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça de casal distribua por todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem necessários, mesmo nessa parte, para satisfação dos encargos da administração (artº 2092º do CC).

Os rendimentos a que a lei atende são os que respeitam aos bens da herança que o cabeça-de-casal administra e em que os herdeiros ou o cônjuge meeiro tenham parte.

A regra de que o herdeiro apenas tem direito a exigir até metade dos rendimentos que lhe caibam, só se aplica durante a anuidade respectiva. Finda esta, há lugar à prestação de contas (na qual se tomam em consideração tanto as despesas, como os rendimentos que foram já entregues aos herdeiros – 20193º, nº 2 do CC) e apurado o saldo este é distribuído pelos interessados na proporção dos seus direitos, deduzida a quantia necessária para fazer face aos encargos ao novo ano - 2093º, nº 3 do CC – (conforme ensinamentos de Augusto Lopes Cardoso, Partilhas Litigiosas, volume II, Almedina, 2018, p. 222).

A entrega dos rendimentos pode ser exigida em qualquer altura pelos herdeiros, não impondo a lei ao cabeça de casal que tome a iniciativa de entregar os rendimentos (2093º, nº 1 do CC). O sujeito passivo da obrigação é pois o cabeça de casal, pelo que relativamente ao pagamento dos rendimentos da herança, não tem o presente procedimento que ser instaurado contra todos os herdeiros.
A apelada alegou ter pedido escusa do cargo de cabeça-de-casal por se encontrar doente (artº 2085º, alínea b) do CC) e ter-lhe sido deferido esse pedido, “encontrando-se apenas a assegurar a gestão corrente da herança até que entre em funções o novo cabeça-de-casal” (artº 35º da oposição).

Enquanto não tomar posse quem vier substituir o cabeça-de-casal, o cabeça de casal que requereu escusa e obteve deferimento, mantém-se em funções e como tal poderá ser demandado. É que, embora o cabeça-de-casal não seja um mandatário, em muito se lhe assemelha, pelo que a solução tem resposta no instituto do mandato – artºs 1175º e 1176ºdo CC – devendo continuar no exercício da função enquanto o que for nomeado em sua substituição não tomar posse do cargo, sempre que da vacância possam resultar prejuízos para a herança (cfr. defende Augusto Lopes Cardoso, obra citada, p.109).

Da quantia doada no valor de 200.100,00

Alega a apelante que a sua mãe, autora da herança lhe doou a quantia de 200.100,00 e que a cabeça-de-casal mantém indevidamente na sua posse essa quantia.

Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício de outro contraente (artº 940º, nº 1 do CC).

O cabeça de casal goza de poderes de administração dos bens hereditários que incidem sobre os bens próprios do falecido e tendo este sido casado em regime de comunhão, sobre os bens comuns do casal (artº 2087º do CC).

Os bens doados em vida pelo de cujus, não obstante puderem ser levados em consideração no cálculo da legítima (artº 2162º, nº 1 do CC), não são considerados parte integrante da herança e por isso ficam fora da alçada dos deveres de administração do cabeça de casal, sendo administrados pelo seu donatário, seu efectivo proprietário (cfr. se defende no Ac. do TRL de 25.08.2008, proc. 6459/2008-2). As doações feitas em vida do autor da sucessão não são inválidas, ainda que sejam inoficiosas.

Consequentemente, estando o dinheiro doado na posse do cabeça de casal, como alega a apelante, é este parte legítima para estar na acção, não se impondo a presença dos demais herdeiros, uma vez que está em causa a restituição de um bem próprio da apelante e não de um direito relativo à herança.

Da partilha das jóias em vida

Alega a apelante que a sua mãe, autora da herança, procedeu à partilha em vida das jóias de que era proprietária pelos cinco filhos, o que correspondeu ao montante 176.534,00 a cada um, fundamentando-se no documento nº 4 que juntou com o requerimento inicial (fls 20 v a 21 v) e que esse crédito lhe é devido desde a morte da inventariada (artº 53º da petição inicial aperfeiçoada).

O documento nº 4 está subscrito pelos seus seis outorgantes e foi denominado de “convenção”. A primeira outorgante é a mãe da apelante, S. C., autora da sucessão, os 2ºs a 6ºs outorgantes correspondem aos cinco filhos da 1ª contraente e a apelante é a quinta outorgante.

É o seguinte o seu texto:

I – A primeira contraente é proprietária, em domínio pleno – raiz e usufruto – de um determinado conjunto de jóias de ouro e de prata para uso pessoal, tendo decidido proceder à partilha em vida das mesmas pelos seus cinco filhos – que são os segunda a sexta contraente –em partes iguais para cada um deles.
II – Para o efeito da efectivação da partilha acima indicada, todos os contraentes promoveram a avaliação das jóias em causa, a qual foi realizada pelo sr. Mário, avaliação essa da qual resultou que o valor total actual das referidas jóias é de 882.670,00 (oitecentos e oitenta dois mil seiscentos e setenta euros), cfr. doc. junto que vai rubricado por todos os contraentes.
III: Do valor de tal avaliação resulta que a cada um dos filhos da primeira contrataente – os aqui Segunda a Sexta contraentes – cabem jóias cujo valor totaliza a quantia de 176.534,00.
IV: A quinta contraente declara não pretender que lhe seja atribuída qualquer uma das indicadas jóias, pretendendo antes, que o valor da sua quota parte nessas jóias lhe seja atribuído em outros bens, actualmente pertencentes à primeira contraente, quando, no futuro, se proceder à partilha destes outros bens.
V: A segunda, o terceiro, o quarto e a sexta contraentes procederam, entre eles, à partilha da totalidade das jóias em causa, em conformidade com a vontade comum e de cada um deles, tendo, por tal forma, ficado composto o lote atribuído, por mútuo acordo de todos, a cada um daqueles quatro contraentes.

Em face do exposto, a segunda, o terceiro, o quarto e a sexta contraentes, obrigam-se perante a quinta contraente, a, quando no futuro, se proceder à partilha dos restantes bens actualmente pertencentes à primeira contraente, atribuir à mesma quinta contraente, para além da quota parte que lhe couber na partilha de tais bens, o valor adicional de 176.534,00, correspondente ao quantitativo do respectivo quinhão de uma quinta parte das jóias, o qual não pretendeu receber nesta oportunidade.”

Nos termos do artº 2029º, nº 1 do CC, não é havido por sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou parte deles, a algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.

A doutrina e a jurisprudência são praticamente unânimes, no que respeita à qualificação da partilha em vida como um contrato de doação e, portanto, como um negócio gratuito, ou seja, um negócio em que não existe nenhuma contrapartida pecuniária em relação à transmissão dos bens, já que importa sacrifícios económicos apenas para uma das uma das partes - o doador. Como claramente resulta do artº 2029º do CC a partilha em vida é efectivamente uma doação, tal como definida no artº 940º, nº 1, muito embora com um regime particular, específico, que resulta de ser feita a presumidos herdeiros legitimários e com encargos a favor dos outros presumidos herdeiros legitimários.

É uma doação com características especiais, na medida em que, muito embora, se verifiquem os efeitos translativos do direito sobre os bens doados, tal não ocorre em virtude de mero espírito de liberalidade do doador, já que este tem em vista partilhar, ainda em vida, os seus bens pelos presumíveis herdeiros legitimários, de modo a evitar questões futuras entre eles, após a sua morte, ou até a manter a unidade de determinados bens. Aliás, essa “natureza transaccional” está bem patente no facto de se permitir que os bens sejam doados a apenas alguns dos presumíveis herdeiros contra o pagamento aos demais de tornas pelo valor que proporcionalmente lhes tocaria na partilha dos bens doados (cfr. se defende no Ac. do TRL de 27.04.2010, proc. 31/95.L1-7).

Uma vez que funciona como doação, a partilha em vida tem efeitos imediatos, designando quem fica com que parte dos bens, ficando os donatários com os bens a partir da data da partilha em vida e ficando obrigados a pagar tornas aos demais naquela data ou posteriormente, uma vez que com a partilha em vida pretende-se a igualação de todos os quinhões.

No caso foi efectuada uma partilha em vida das jóias da 1ª contraente por quatro dos seus cinco filhos, com o consentimento da apelante que declarou não pretender receber qualquer das jóias, obrigando-se os demais irmãos a, no momento da partilha, a atribuir à apelante um valor adicional em igual valor ao das jóias que receberam.

As partes convencionaram que o direito da apelante ao pagamento surge apenas posteriormente, quando se proceder à partilha dos bens. O crédito reconhecido funciona como meio de composição dos quinhões dos herdeiros legitimários, tendo por finalidade propiciar a igualação da partilha que se efectuou através da doação.

Ora, tendo em conta o acordado pelas partes na convenção junta aos autos pela apelante, documento no qual fundamenta a sua pretensão, deverá a apelante exigir de todos os herdeiros legitimários intervenientes na convenção o cumprimento do então acordado, por serem eles os titulares da relação controvertida do lado passivo (artº 30º, nº 3 do CPC).

Assim relativamente a este pedido, a cabeça de casal por si só é parte ilegítima para estar em juízo.

De acordo com a relação material controvertida desenhada pela apelante que se fundamenta na convenção junta, os herdeiros têm interesse directo em contradizer. Para aferir da legitimidade há que atender à relação jurídica configurada pela A., estribada nos factos que aduz e não na qualificação jurídica que faz.

Diz a apelante que se a Mma. Juiz a quo considerava que a apelada era parte ilegítima por estar em juízo desacompanhada dos demais herdeiros, deveria ter dado cumprimento ao disposto no artº 6º, nº 2 do CPC.

De acordo com o artº 6º, nº 2 do CPC, o juiz providencia oficiosamente pela suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo. Trata-se de uma das vertentes do dever de gestão processual. No caso, não podendo as intervenções de terceiros ser ordenadas oficiosamente, deve o julgador convidar a parte a praticar o acto.

E este dever é vinculado quando conduz ao suprimento da falta de pressupostos ou à realização de actos que visam a regularidade da instância, visando permitir que o processo possa prosseguir com regularidade e possibilitar uma decisão sobre a pretensão das partes.

A lei processual é expressa quanto à sanabilidade do pressuposto processual consistente na falta de litisconsórcio necessário (art. 261º do C.P.C.). Apenas «são insanáveis a ilegitimidade singular, a falta de personalidade judiciária (fora do caso referido no art. 14º), a incompetência absoluta, o caso julgado e a litispendência»(cfr. Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, II Vol., 3ª ed., 2000, p. 64).

Consequentemente, relativamente a este pedido, impondo-se a presença na lide de todos os herdeiros, deve ser proferido despacho a convidar a apelante a requerer a sua intervenção na lide (artº 6º, nº 2, alínea, 2ª parte), e em caso de incumprimento, então absolver-se a apelada da instância relativamente a este pedido.
Sempre se dirá ainda que o artº 2088º, nº 2 do CC invocado pela apelante, apenas tem aplicação relativamente à reclamação da quantia doada, sendo que o pedido de distribuição de rendimentos tem fundamento no artº 2092º do CC.

Da litigância de má fé

A apelada considera que a apelante litiga com má fé porque sendo licenciada em Direito e advogada não podia ignorar que não lhe assistem qualquer dos direitos de que se arrogou titular nesta acção.

De acordo com o nº 2 do artº 542º do CPC, na parte que aqui pode interessar, “Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave: d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.

Diversamente do que se verificava anteriormente à reforma processual civil introduzida pelo Dec.-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, passou a ser sancionável a título de má-fé, não apenas a lide dolosa, mas também a lide temerária, como dela se diz quando as regras de conduta processual conformes com a boa-fé são violadas com culpa grave ou erro grosseiro (neste sentido, José Lebre de Freitas. A. Montalvão Machado. Rui Pinto, in “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 2º, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. 194).

Na apreciação da conduta da parte deverá atender-se ao princípio da cooperação consagrado no art.º 7º, nº 1 do CPC que recai sobre as partes com vista à descoberta da verdade (nº 1 do art.º. 417º do CPC).

Conforme tem vindo a ser entendido pela jurisprudência, a conclusão no sentido da litigância de má fé não pode ser extraída automaticamente da verificação de comportamento processual subsumível à tipicidade das várias alíneas do n.º 2 do art.º 456º do Cód. Proc. Civil. A condenação nesse sentido exige uma apreciação casuística.

Na sentença recorrida entendeu-se que “na sequência da decisão que antecede, uma vez que não irá ser produzida prova sobre o mérito da causa, fica prejudicada a apreciação do incidente de litigância de má fé.”
A apelada não interpôs recurso desta decisão, razão pela qual não pode agora ser conhecida essa questão. Só não seria assim, se a parte tivesse vindo requerer a condenação da apelante como litigante de má fé, por força da sua actuação posterior à sentença recorrida. Mas não se afigura ser o caso. Ainda que assim não se entendesse, estando ainda o processo numa fase em que não se conheceu do mérito da causa, mas apenas dos pressupostos processuais e nem de todos, não há elementos para concluir no sentido defendido pela apelada. Note-se que a lei exige para a condenação como litigante de má fé, não apenas qualquer uso do processo, mas um uso manifestamente reprovável.

IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em revogar a sentença recorrida, e, consequentemente, julgam a apelada parte legítima relativamente aos pedidos supra apreciados em 1º e 2º lugar, devendo o Mmo. Juiz a quo proferir despacho em conformidade com o disposto no artº 6º, nº 2 do CPC, convidando a A. a fazer intervir na lide os demais herdeiros, se outro motivo não obstar ao prosseguimento dos autos e altera-se o valor da acção para o montante de 588.217,26.
Custas pela parte vencida a final.
Guimarães, 14 de junho de 2018

Helena Melo
Pedro Damião e Cunha
Maria João Matos