Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2062/17.2T8BCL.G3
Relator: JOAQUIM BOAVIDA
Descritores: EMPREITADA DE CONSUMO
DIREITOS DO CONSUMIDOR
AUTONOMIA
PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/25/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Os direitos conferidos ao consumidor no artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, são independentes uns dos outros e podem ser exercidos sem observar qualquer ordem de precedência entre eles.
II- No âmbito das relações de consumo podem ser exercidos em regime de alternatividade o direito à reparação das desconformidades do bem, serviço ou obra e o direito de indemnização correspondente ao custo da reparação.
III- O consumidor pode escolher e exercer autonomamente a ação de responsabilidade civil pelo interesse contratual positivo decorrente de cumprimento defeituoso, sem fazer valer diretamente qualquer dos direitos previstos no artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003.
IV- O consumidor não pode contemplar no pedido de indemnização o ressarcimento de danos que são objeto de um outro pedido deduzido em cumulação.
V- Deve ser julgado improcedente o pedido de indemnização deduzido com a finalidade exclusiva de acautelar a possibilidade de ser declarada a caducidade do direito à reparação do bem, obra ou serviço, ou seja, visando iludir o regime da caducidade, afastando a sua aplicabilidade, quando está em causa a satisfação da mesma pretensão material.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1):

I – RELATÓRIO

1.1. A. F. e mulher, I. M., intentaram acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra D. A. e mulher, E. M., pedindo que os Réus sejam condenados a:
«a) Num prazo de trinta dias, reparar os defeitos/patologias existentes na obra de carpintaria e caixilharia realizada no imóvel dos AA. (identificado no retro artº 1º) e que se encontram discriminadas nos retros artigos 12º a 14º,

Ou, caso não sejam reparadas,
b) Pagar aos AA. o valor correspondente ao valor dos danos sofridos, de € 20.130,77,
Ou ainda,
c) Pagar aos AA. o valor correspondente ao valor de indemnização pelo interesse contratual positivo, decorrentes do cumprimento defeituoso, que se computa em € 20.130,77,
Ou ainda, subsidiariamente,
d) Pagar aos AA. a quantia de € 20.130,77, decorrente do enriquecimento tido à custa dos RR. e sem qualquer causa que o justifique».

Para fundamentar a sua pretensão alegaram, em síntese, que aquando da reconstrução da sua casa de habitação, a solicitação dos Autores, o Réu marido apresentou orçamento para a obra de carpintaria e caixilharia no valor total de € 52.385,34, que lhe veio a ser adjudicada sem que tivesse sido reduzido a escrito o contrato de empreitada. Tendo o Réu facturado os serviços e materiais fornecidos no valor global de € 53.874,10, os Autores pagaram a totalidade do valor reclamado pelo Réu.
Mais alegaram que a obra não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm de ser corrigidos ou compensados aos Autores, pelo que solicitaram ao Réu a reparação dos defeitos existentes ou a redução do preço, o que este recusa, causando-lhes um dano não inferior a € 20.130,77.
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Na sua contestação os Réus impugnaram os factos alegados pelos Autores, excepcionaram a ilegitimidade da Ré mulher e a caducidade do direito de acção, bem como da denúncia, concluindo pela procedência das excepções deduzidas e a improcedência da acção, com a consequente absolvição dos pedidos.
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Foi dispensada a realização da audiência prévia e no saneador julgou-se improcedente a excepção de ilegitimidade da Ré mulher e «procedente a excepção peremptória de caducidade, nos termos do disposto no artigo 1225º, nº 1 e 2, do Código Civil, absolvendo os Réus do pedido, nos termos do disposto nos artigos 571º, nº 1, 576º, nº 3, do Código de Processo Civil».
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No âmbito do recurso de apelação interposto pelos Autores, foi por esta Relação revogado o saneador-sentença recorrido na parte em que se tinha julgado procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de acção (prazo para a propositura da acção).
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1.2. Após baixa dos autos à 1ª instância, realizou-se nova tentativa de conciliação, dispensou-se a audiência prévia, proferiu-se despacho-saneador, definiu-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, proferiu-se sentença a:
«a) julgar procedente a exceção perentória de caducidade relativamente à desconformidade dada como provada (o armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13), nos termos do disposto no artigo 5º - A, n.º 1 do DL n.º 67/2003 de 08 de abril.
b) condenar o Réu D. A. a proceder, no prazo de 30 dias, contados do trânsito em julgado, à reparação – da pequena área de soalho que se encontra descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso; do puxador porta corredora elevadora que tem folga e da janela no sequeiro que apresenta sinais de infiltração de água.
c) absolver os Réus dos demais pedidos formulados».
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1.3. Inconformados, os Autores interpuseram recurso de apelação da sentença, formulando as seguintes conclusões:

«A. Os AA. não se conformam com a sentença proferida.
B. É objeto do presente recurso submeter à apreciação deste Tribunal da Relação quatro questões:
1. Falta ou insuficiente fundamentação da Sentença
2. Erro de julgamento na apreciação da Prova: necessidade de alteração da matéria de facto;
3. Da Improcedência do Pedido Alternativo: De Condenação ao Pagamento do valor das reparações necessárias à eliminação dos vícios ou desconformidades em apreço.
4. Omissão De Pronúncia: direito de indemnização dos aa. decorrente do interesse contratual positivo e enriquecimento sem causa;
C. Desde logo, pretendem os Recorrentes submeter à apreciação deste Douto Tribunal da Relação a falha grave do Tribunal Recorrido que não observou, como lhe incumbia, o dever de indicar os fundamentos/motivação em que assentou a sua convicção no julgamento dos factos considerados como não provados!
D. Para que exista uma válida motivação é necessário que o julgador leva a cabo uma análise crítica dos elementos probatórios produzidos nos autos, isto é, que se proceda à sua apreciação e valorização de forma conjugada, relacionando-os reversivamente (testando a compatibilidade entre uns e outros) e também apreciar da sua consistência intrínseca (da sua verosimilhança), tudo isto à luz das regras da normalidade e da experiência da vida ou dos ensinamentos da ciência.
E. Sucede que, o Tribunal Recorrido incumpriu o seu dever de dever de indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos considerados como não provados.
F. Os Autores aquando da instauração da ação, instruíram os autos de prova documental e pericial em ordem à comprovação dos factos por si alegados, designadamente, os orçamentos, projetos e faturas! - Doc. 3 -Anexo A14 (1de 2 e 2 de 2), Anexo A1, Anexo A4, Anexo A5 (1 de 2 e 2 de 2), Doc.4 Doc. 5.
G. Dos quais, sempre decorre, a comprovação das desconformidades alegadas, sendo, porquanto sempre dali decorra, manifestamente, a discrepância da qualidade entre os materiais orçados, projetados e faturados e, por isso, os convencionados pelas partes, e aqueles que se constatou terem sido aplicados pelos Réus! - Doc. 3 -Anexo A14 (1de 2 e 2 de 2), Anexo A1, Anexo A4, Anexo A5 (1 de 2 e 2 de 2), Doc.4 Doc. 5 e Doc. 9.
H. Não se compreende e, por isso, os Recorrentes não aceitam, que o Tribunal Recorrido munido de meios de prova capazes de comprovar a factualidade por si alegada, sobretudo documental e pericial, se tenha bastando em concluir pela ausência de prova respetiva…
I. O Tribunal Recorrido ao não ter especificado os concretos fundamentos através das regras da ciência, da lógica e da experiência, para que se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos como não provado, violou as formalidades previstas no art. 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, que importa a sua nulidade.

SEM PRESCINDIR,
J. Por se entender que, uma das mais relevantes funções dos Tribunais da Relação consiste na reapreciação da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto,
K. E conferindo-se-lhes a lei o poder-dever de apurar da razoabilidade da convicção formada em 1ª instância e, ainda, de valorar a prova produzida, formando a sua própria convicção, em ordem à modificação da matéria de facto - Cfr. 712º e 662º do CPC,
L. Pretendem os Autores que este Tribunal da Relação, em suprimento da nulidade arguida, aprecie da credibilidade e consistência dos meios de prova que foram, sem qualquer justificação, desconsiderados pelo Tribunal Recorrido,
M. Importando, pois, a alteração sobre os factos considerados por provados e não provados pela Decisão Recorrida.
N. Diga-se, pois, que o Tribunal de Primeira Instância, simplesmente, não quis apreciar a prova submetida ao seu cuidado, concluindo, sem fundamento, inexistir prova à sustentação da factualidade alegada pelos Autores, ora recorrentes!
O. Em entendimento manifestamente contrário ao sufragado pelo Tribunal Recorrido, entendem os Recorrentes que os presentes autos estão instruídos de prova documental e, sempre, pericial e testemunhal, em ordem à comprovação da factualidade por eles alegada!
P. E, visando este recurso o erro de julgamento de facto, especificaram os Recorrentes os concretos pontos que entendem ter sido incorretamente julgados, os quais foram, para os devidos efeitos impugnados.
Q. Ademais, os Recorrentes indicaram e analisaram os concretos meios de prova que, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida. - Cfr. artº.640, nº.1, do C.P.Civil,
R. Da análise do Documento 3. junto à Petição Inicial e, bem assim, seus Anexos A1 a A5 é, pois, de concluir que, tal como considerado pelo relatório pericial junto aos autos pelos Autores (Doc. 9) e, bem assim, o relatório pericial elaborado nos presente autos, que embora o contrato de empreitada não tenha observado a forma escrita, as partes encetaram previamente ao inicio dos trabalho diversas negociações, tendo o R. elaborado, a pedido dos Autores, orçamentos e projetos onde estavam mencionados os trabalhos e materiais pretendidos,
S. Salienta-se que os documentos são da lavra do R. que não inverteu o ónus de demonstrar que o que neles consta não é verdade ou que o seu teor foi objecto de alterações!
T. E, além dos orçamentos e projetos elaborados pelos Réus, dos quais, manifestamente, decorre o tipo e/ou qualidade dos materiais pretendidos pelos Autores, analisaram os Recorrentes, seguidamente, o conteúdo dos Documentos 4, 5 e 6 juntos à Petição Inicial, dos quais resultou, que o Réu faturou, nos exatos termos orçamentados, o preço correspondente a materiais cuja qualidade não corresponde, por manifestamente inferior, àqueles que os Autores pretenderam e aceitaram pagar.
U. Além disso, resultou ainda do relatório pericial junto aquando da Petição Inicial (Doc. 9) e, bem assim, do relatório pericial elaborado nos autos, que a discrepância entre o tipo/qualidade dos materiais orçados e faturados e aqueles que foram efectivamente aplicados é de tal forma considerável que, também por aqui, o Tribunal Recorrido podia perceber o engano a que os Autores foram sujeitos! - por comparação dos orçamentos, projetos e faturas- Docs. 3,4,5 e 6- e relatórios periciais.
V. Feita a análise comparativa e conciliatória dos orçamentos e projetos (Doc. 3 e respetivos anexos A14, A1 a A5) as faturas (Docs, 4, 5 e 6), os relatórios periciais constantes dos autos (Doc. 9 e o relatório pericial elaborado nestes autos) e ainda os cruciais (alguns) depoimentos das testemunhas e as declarações de parte do Autor, conforme supra melhor transcritos, deverá ser dada como provada a seguinte factualidade:
1. Quanto aos armários de cozinha:
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
b) Os armários da cozinha, o material aplicado na estrutura do interior dos armários da cozinha não está conforme o acordado, pois foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho (contraplacado marítimo).
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
1. Prejuízos relativos aos armários da cozinha: Prejuízo relativo á diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos armários da cozinha e o tipo de material orçamentado - € 4.104,02
i. Ou ainda, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: Prejuízos relativos aos armários da cozinha: 1. Prejuízo relativo á diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos armários da cozinha e o tipo de material orçamentado €3.827,00, acrescido de IVA, portanto €4.707,21
2. Quanto ao armário lavatório do wc do rés-do-chão 0.67x0.69m
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
c) Armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
2. Prejuízo relativo ao armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no armário e o tipo de material orçamentado - € 107,00
i. Ou ainda, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 3. Prejuízo relativo ao armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no armário e o tipo de material orçamentado -€132,00, acrescido de IVA, portanto, €160,29.
3. Armário/roupeiro do wc andar, 1.99x1.13m
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
e) O armário tipo roupeiro do piso 1, 1.99x1.13m: o armário não está construído conforme o acordado, isto é, em madeira de castanho;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
4. Prejuízo relativo à substituição do armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13m: O armário não está feito conforme o orçamento, nem em relação aos materiais nem ao desenho fornecido - € 660,00.
i. Ou ainda, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 4. Prejuízo relativo à substituição do armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13m: O armário não está feito conforme o orçamento, nem em relação aos materiais nem ao desenho fornecido: €720,00, acrescido de IVA, portanto €885,60
4. Roupeiro do quarto principal sem portas
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
f) O roupeiro do quarto principal, sem portas, de 2,50x4.00: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
5. Prejuízo relativo ao roupeiro do quarto principal 2.50X4.00 (portas não incluídas): Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro e o tipo de material orçamentado - € 1.140,00.
i. Ou ainda, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 5. Prejuízo relativo ao roupeiro do quarto principal 2.50X4.00 (portas não incluídas): Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro e o tipo de material orçamentado a € 960,00, acrescido de IVA, portanto, € 1.180,80.
5. Roupeiros dos quartos e Roupeiro do hall de entrada
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
g) Os roupeiros (3unidades) com portas lisas a toda a altura de 2,50x1,80: o material aplicado nos 3 armários não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
6. Prejuízos relativos aos 3 roupeiros 2.50X1.80 (2 nos quartos pequenos e 1 no hall de entrada):
6.1. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos 2 roupeiros dos quartos pequenos e o tipo de material orçamentado - € 1 421,00;
6.2. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro do hall de entrada e o tipo de material orçamentado - € 260,50
i. Ou e, sempre, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que:
6.1. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos 2 roupeiros dos quartos pequenos e o tipo de material orçamentado €760,00, acrescido de IVA, portanto, €934,80;
6.2. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro do hall de entrada e o tipo de material orçamentado corresponde a €380,00, acrescido de IVA portanto €467,40.
6. Madeira das portas principais e interiores, caixilharias de janelas e rodapé
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
h) A madeira das portas principais, portas interiores: a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, já que foi aplicada madeira de castanho, e tem “bicho”.
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
7. Prejuízo relativo as portas principais, as portas interiores, as caixilharias janelas e ao rodapé: Prejuízo relativo ao valor da diferença de duração entre o tipo de material aplicado e o tipo de material orçamentado € 1 000,00.
i. Ou e, sempre, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 7. Prejuízo relativo as portas principais, as portas interiores, as caixilharias janelas e ao rodapé: Prejuízo relativo ao valor da diferença de duração entre o tipo de material aplicado e o tipo de material orçamentado correspondente a €700,00, acrescido de IVA, portanto €861,00.
7. Rodapé - medição do aplicado
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
i) O Rodapé: O preço estava incluído no orçamento fornecido sob o item “soalho” e “madeira de carvalho para portas roupeiros e rodapé”; foram faturados e pagos, como “extra” (fora do orçamento), 56m2 de rodapé, indevidamente; não foi aplicado rodapé nas escadas, conforme previsto;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
8. Prejuízo relativo ao rodapé:
8.1. Prejuízo relativo aos 9,7m de rodapé orçamentados para as escadas, mas não aplicados - € 140,22;
8.2. Prejuízo relativo aos 56m de rodapé facturados a mais, mas não orçamentados e não aplicados - € 826,56;
8. Soalho – áreas aplicadas
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
j) Soalho: foram facturados e pagos (indevidamente) 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 51,23 m2 ou e, sempre, 52,76m2, atento o relatório pericial junto aos autos
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos: 9. Prejuízo relativo á diferença entre a área do soalho aplicado e a área de soalho facturado - €809,03
i. Ou e, sempre, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 9. Prejuízo relativo á diferença entre a área do soalho aplicado e a área de soalho facturado - no primeiro caso e, ou €543,00, acrescido de IVA, portanto, €667,89.
9. Soalho e Escadas – Deficiências no Verniz aplicado
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
l) Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
10. Prejuízo relativo ao facto do verniz aplicado não ser conforme o orçamentado - € 1 545,00
i. Ou e, sempre, a valorar o relatório pericial elaborado nos presentes autos, considerar-se provado que: 10. Prejuízo relativo ao facto do verniz aplicado não ser conforme o orçamentado €876,00, acrescido de IVA, portanto, €1.077,48.
10. Vidros aplicados não terão gás árgon no seu interior
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
p) Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido, ao contrário do que estava acordado e orçamentado.
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
15. Prejuízo relativo diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos - € 4 000,00
i. Ou e, sempre, a ser de valorar nesta parte o relatório pericial elaborado nos autos, considerar-se que o Prejuízo relativo diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos - € 2.900,00, acrescido de IVA, portanto €3.567,00.
11. Certificado dos vidros
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
q) Certificado de vidros: até hoje ainda não foram entregues os certificados correspondentes aos vidros efectivamente aplicados em obra.
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
16. Prejuízos relativos á caixilharia e aos vidros
16.1. Prejuízo relativo á falta de certificado dos vidros - € 750,00
16.2. Prejuízo relativo á falta de certificação ao nível da impermeabilidade e resistência térmica do conjunto da caixilharia (alumínios e madeira) - € 750,00;
16.3. Prejuízo relativo á falta do manual de desmontagem/montagem das janelas para substituição de vidros € 750,00
12. Ligação da caixilharia às paredes exteriores
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
n) Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
13. Prejuízo relativo à falta de ligação/isolação e fixação das caixilharias:
13.1. Prejuízo relativo á falta de ligação/isolamento da caixilharia às paredes exteriores - € 492,00
13. Infiltrações de Humidade
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
o) Infiltrações de água nas janelas: em 2 janelas do quarto principal têm aparecido infiltrações de água;
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
14. Prejuízo relativo a infiltrações de humidades em 3 janelas, retirar e instalar as mesmas - € 904,05
W. Pelo que, considerando este douto Tribunal da Relação, pela verificação de erro de julgamento do Tribunal Recorrido e, bem assim, apreciando devidamente dos meios de prova produzidos e concluindo pela sua credibilidade e consistência em ordem à comprovação dos factos alegados pelos Autores, aqui Recorrentes, deverá revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que considere como factos provados, os seguintes:

Factos Provados:
a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
b) Os armários da cozinha, o material aplicado na estrutura do interior dos armários da cozinha não está conforme o acordado, pois foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho (contraplacado marítimo).
c) O armário lavatório WC do R/C de 0.67x0.69m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho; o material do armário por não ser de boa qualidade está danificado com a humidade.
d) Armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho;
f) O roupeiro do quarto principal, sem portas, de 2,50x4.00: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
g) Os roupeiros (3unidades) com portas lisas a toda a altura de 2,50x1,80: o material aplicado nos 3 armários não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
h) A madeira das portas principais, portas interiores: a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, já que foi aplicada madeira de castanho, e tem “bicho”.
i) O Rodapé: O preço estava incluído no orçamento fornecido sob o item “soalho” e “madeira de carvalho para portas roupeiros e rodapé”; foram faturados e pagos, como “extra” (fora do orçamento), 56m2 de rodapé, indevidamente; não foi aplicado rodapé nas escadas, conforme previsto;
j) Soalho: foram facturados e pagos (indevidamente) 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 51,23m2;
m) Tipo do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz aplicado no soalho e nas escadas não está conforme o acordado, pois foi acordado que seria aplicado verniz poliuretano e, ao invés, foi aplicado verniz aquoso;
n) Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas;
o) Infiltrações de água nas janelas: em 2 janelas do quarto principal têm aparecido infiltrações de água;
p) Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido, ao contrário do que estava acordado e orçamentado.
q) Certificado de vidros: até hoje ainda não foram entregues os certificados correspondentes aos vidros efectivamente aplicados em obra.
(…)
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
1. Prejuízos relativos aos armários da cozinha: Prejuízo relativo á diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos armários da cozinha e o tipo de material orçamentado - € 4.104,02
2. Prejuízo relativo á substituição do armário lavatório WC R/C, 0.67x0.69m: O armário não é em castanho tal como orçamentado e está todo danificado com a humidade- € 369,00
3. Prejuízo relativo ao armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no armário e o tipo de material orçamentado - € 107,00
4. Prejuízo relativo à substituição do armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13m: O armário não está feito conforme o orçamento, nem em relação aos materiais nem ao desenho fornecido - € 660,00.
5. Prejuízo relativo ao roupeiro do quarto principal 2.50X4.00 (portas não incluídas): Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro e o tipo de material orçamentado - € 1.140,00.
6. Prejuízos relativos aos 3 roupeiros 2.50X1.80 (2 nos quartos pequenos e 1 no hall de entrada):
6.1. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos 2 roupeiros dos quartos pequenos e o tipo de material orçamentado - € 1 421,00;
6.2. Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro do hall de entrada e o tipo de material orçamentado - € 260,50
7. Prejuízo relativo as portas principais, as portas interiores, as caixilharias janelas e ao rodapé: Prejuízo relativo ao valor da diferença de duração entre o tipo de material aplicado e o tipo de material orçamentado € 1 000,00.
8. Prejuízo relativo ao rodapé:
8.1. Prejuízo relativo aos 9,7m de rodapé orçamentados para as escadas mas não aplicados - € 140,22;
8.2. Prejuízo relativo aos 56m de rodapé facturados a mais, mas não orçamentados e não aplicados - € 826,56;
8.3. Prejuízo relativo á diferença entre a área do soalho aplicado e a área de soalho facturado - € €809,03,
9. Prejuízo relativo ao facto do verniz aplicado não ser conforme o orçamentado - € 1. 545,00
13. Prejuízo relativo á falta de ligação/isolamento da caixilharia às paredes exteriores - € 492,00
14. Prejuízo relativo a infiltrações de humidades em 3 janelas, retirar e instalar as mesmas - € 904,05
15. Prejuízo relativo diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos - € 4 000,00
16. Prejuízos relativos á caixilharia e aos vidros
16.1. Prejuízo relativo á falta de certificado dos vidros - € 750,00
X. Ou, e sempre, a ser de considerar, no que respeita aos prejuízos apurados pela valorização do relatório pericial elaborado nestes autos, deva a factualidade ser considerada provada, com as necessárias modificações, supra melhor aduzidas.
Y. Quanto à terceira ordem de razões objeto do presente recurso, respeitante à improcedência do pedido alternativo, para o caso de o Réu não proceder à realização de tais obras naquele prazo, a condenação deste a pagar-lhes o valor correspondente aos danos sofridos,
Z. Entendemos, diferentemente do sufragado pela decisão recorrida, que sempre deveriam os Réus, em alternativa, ser condenados a pagar o valor das reparações necessárias à eliminação dos vícios ou anomalias em questão.
AA. Como decorre do artº 4º do já D.L. 67/2003, em caso de falta de conformidade do bem com o contrato o consumidor tem direito à reposição da conformidade sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato, podendo qualquer um desses direitos ser exercido pelo consumidor.
BB. Justificando-se, pois, assim a condenação dos RR. em alternativa à reparação, no pagamento da quantia necessária para realizar essa reparação, e que no caso concreto corresponde aos montantes apurados nos factos que devem passar a ser considerados por provados.
CC. Por fim, quanto àquela que foi a última questão de que nos ocupamos no presente recurso, entendemos, pois, que a decisão recorrida padece de vício de nulidade por falta/omissão de pronúncia,
DD. Porquanto, não tenha conhecido das questões de direito que, quer na petição inicial, quer na réplica, (artº 31º a 41º da PI) foram suscitadas, sobre o (hipotético) decurso do prazo de caducidade previsto pelo regime da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas - DL n.º 67/2003, de 08 de Abril, alterado pelo DL n.º 84/2008, de 21/05,
EE. O que, a verificar-se, como aconteceu, sempre obrigava à apreciação do direito indemnizatório dos AA. por via do interesse contratual positivo ou, subsidiariamente, do instituto do enriquecimento sem causa,
FF. Ao não ter o Tribunal Recorrido apreciado todas as questões que lhe foram colocadas e a que estava obrigado, padece a sentença recorrida de nulidade, que expressamente se invoca. (artº 615º nº 1 d) do CPC).
Assim,
GG. O tribunal recorrido não fundamentou devidamente a sentença,
HH. O tribunal recorrido não apreciou devidamente a prova (documentos, perícias e depoimentos) produzida, e
II. O tribunal recorrido não apreciou todas as questões que lhe foram colocadas, na hipótese de ser procedente alguma exceção invocada pelos RR.

Termos em que,
Deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a decisão recorrida revogada e substituída por outra que condene os RR. no pedido.
Assim decidindo, farão V. Exas. inteira Justiça!».
*
Os Réus apresentaram contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
*
1.4. Em virtude de o Tribunal recorrido ter fundamentado a decisão sobre os 39 factos não provados dizendo que «[a] factualidade dada como não provada resulta da ausência de prova respectiva», foi por acórdão de 29.10.2020, determinada a remessa do processo à primeira instância para ser fundamentada a decisão sobre a matéria de facto no que respeita aos factos considerados não provados.
*
Por decisão de 17.12.2020, o Tribunal recorrido supriu a falta de fundamentação, exarando:

«A matéria de facto dada como não provada resultou da ausência de prova respetiva, visto que dos meios de prova produzidos, designadamente da prova documental, da prova testemunhal e da prova pericial, não conseguiu o tribunal, quanto ao negócio em si, apurar o que realmente foi acordado entre as partes, atenta a inexistência de qualquer documento escrito, onde tenham sido definidas as clausulas desse mesmo contrato e ninguém presenciou ou tinha conhecimento direto dessas mesmas negociações, visto que as declarações parte não foram atendidas atento o interesse e parcialidade das mesmas, daí que se tenham considerado como não provadas a existência de desconformidades e consequentemente a existência dos prejuízos invocados; quanto aos demais factos dados como não provados, dos meios de prova produzidos não ficou o tribunal convencido de forma credível da sua verificação».
*
Na sequência daquela decisão, as partes nada requereram.
Em conformidade com o disposto no artigo 665º, nºs 2 e 3, do CPC, procedeu-se à audição das partes relativamente à excepção de caducidade do direito de denúncia deduzida pelos Réus na contestação, cujo conhecimento se percepcionou como tendo ficado prejudicado face à decisão proferida na primeira instância sobre a matéria de facto. No seu requerimento, além de se pronunciarem sobre a excepção de caducidade, os Réus argumentaram que os pretensos defeitos eram aparentes e que os Autores os aceitaram sem reservas.
Foram colhidos os vistos legais.
**

1.5. Questões a decidir

Em conformidade com o disposto nos artigos 635º, nºs 2 a 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a área de intervenção do tribunal ad quem, restrição que não opera relativamente a questões de conhecimento oficioso.
Por outro lado, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes, sendo o seu objecto em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Neste enquadramento, tendo presente que a questão identificada nas conclusões C) a I) já foi objecto de apreciação no anterior acórdão, constituem agora questões a decidir:
i) Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (sobre o direito de indemnização decorrente do interesse contratual positivo e de enriquecimento sem causa) – conclusões CC) a FF);
ii) Erro no julgamento da matéria de facto – conclusões J) a X);
iii) Consequências em sede de direito da modificação da matéria de facto, incluindo a apreciação da questão da alegada aceitação da obra pelos Autores;
iv) Erro de direito na parte em que se julgou improcedente o pedido de condenação no pagamento do valor das reparações necessárias à eliminação dos vícios ou desconformidades – conclusões Y) a BB).
***
II – FUNDAMENTOS

2.1. Fundamentos de facto
2.1.1. Na decisão recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:

«1 - Os AA. são donos e legítimos proprietários do prédio urbano designado por “casa de rés do chão e andar”, sito na Rua do ..., nº …, em …, concelho de Barcelos, inscrito na matriz predial urbana sob o artº … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos, sob o nº ....
2 - O referido prédio destina-se exclusivamente à habitação dos AA. 3 – O Réu, a solicitação dos AA., forneceu orçamento para obra de carpintaria e caixilharia na habitação dos AA., que foi aceite por estes.
4 - A última fase da obra, em 2013, referiu-se à cozinha e acabamentos gerais.
5 - O Réu faturou os serviços e materiais fornecidos ao abrigo das faturas:
-Nº 08/280091, no valor de € 17.012,23;
-Nº 08/280098, no valor de € 23.713,17; e
-Nº CXB/4, no valor de 13.148,70, tudo perfazendo a quantia global de € 53.874,10.
6 - Os AA. pagaram a totalidade do valor reclamado pelo R.
7 – Em 02 de fevereiro de 2016, os AA. enviaram uma missiva ao Réu, onde comunicavam o seguinte, que aqui se transcreve: “… defeitos/desconformidades de construção agora verificados…
1 - Armários da cozinha: o material aplicado na estrutura do interior dos armários da cozinha não está conforme o acordado, pois foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho (contraplacado marítimo);
2 - Armário lavatório WC do R/C de 0.67x0.69m: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado ser madeira de castanho.
3 - Armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira de castanho;
4 - Armário tipo roupeiro do piso 1, 1.99x1.13m: o armário não está construído conforme o que acordamos, conforme o desenho fornecido e em madeira de castanho;
5 - Roupeiro do quarto principal, sem portas, de 2,50x4.00: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira carvalho;
6 - Roupeiros (3unidades) com portas lisas a toda a altura de 2,50x1,80: o material aplicado nos 3 armários não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira carvalho;
7 - Madeira das portas principais, portas interiores:
a) a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, foi aplicada madeira de castanho;
b) a madeira de castanho aplicada tem bicho, por falta de tratamento.
8 - Rodapé: os 56 m de rodapé faturados a mais não foram nem aprovados nem aplicados, o único rodapé que foi aplicado faz parte do soalho e das escadas.
9 – Área do soalho: a área do soalho aplicado é só de 53,20 m2 e não 60 m2 tal como foi faturado, foram faturados 7 m2 mais.
10 - Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar.
11 - Tipo do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz aplicado no soalho e nas escadas não está conforme o que acordamos, pois foi acordado que seria aplicado verniz poliuretano e, ao invés, foi aplicado verniz aquoso.
12 - Levantamento do soalho: o soalho está descolado e levantado no corredor à entrada do WC do 1º piso.
13 - Puxador porta corredora elevadora: o eixo do puxador está desgastado e tem muita folga.
14 - Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas.
15 - Infiltrações de água nas janelas: 2 janelas do quarto principal e uma do sequeiro têm aparecido infiltrações de água.
16 - Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não tem Argon inserido, ao contrário do que acordamos.
17- Certificado de vidros:
a) os documentos apresentados/identificados no relatório do perito Eng. V, não nos foram entregues,
b) os documentos apresentados no relatório do Eng. V, como sendo o certificado, não são válidos como tal,
c) os vidros maiores apresentados no relatório do perito Eng. V, não são os que foram aplicados na nossa obra,
d) os nossos nomes (donos da obra) não estão identificados nos documentos apresentados no relatório do perito Eng. V,,
e) o nome do empreiteiro aplicador (X) não está identificado nos documentos apresentados no relatório do perito Eng. V,,
f) os documentos apresentados no relatório do perito Eng. V, não estão ligados (não correspondem) entre eles, do dono da obra até fabricante dos vidros.
18 - Certificado relativo composição da caixilharia: falta de certificado da composição e rotura térmica da caixilharia completa (madeira/alumínio/vidros) das janelas, portas e vidraças.
19 - Ficha técnica de desmontagem/montagem: falta de ficha técnica para desmontagem/montagem das janelas para trocar vidros se necessário…
8 – O armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13 não está feito conforme o desenho fornecido.
9 – Uma pequena área de soalho encontra-se descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso.
10 - O puxador porta corredora elevadora tem folga.
11 – Uma janela no sequeiro apresenta sinais de infiltração de água.
12 - Os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido.
13 – O armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13 foi entregue aos AA. em fevereiro de 2013.
14 - Os RR. são casados entre si no regime da comunhão de adquiridos.
15 - É com o proveito da sua atividade profissional que o R. marido acorre às despesas doméstica.
16 – A ré esposa beneficia dos resultados da atividade profissional do marido, o que até se presume».
*

2.1.2. Factos não provados

O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:
«a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.
b) Os armários da cozinha, o material aplicado na estrutura do interior dos armários da cozinha não está conforme o acordado, pois foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho (contraplacado marítimo).
c) O armário lavatório WC do R/C de 0.67x0.69m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho; o material do armário por não ser de boa qualidade está danificado com a humidade.
d) Armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho;
e) O armário tipo roupeiro do piso 1, 1.99x1.13m: o armário não está construído conforme o acordado, isto é, em madeira de castanho;
f) O roupeiro do quarto principal, sem portas, de 2,50x4.00: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
g) Os roupeiros (3unidades) com portas lisas a toda a altura de 2,50x1,80: o material aplicado nos 3 armários não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado que seria madeira carvalho;
h) A madeira das portas principais, portas interiores: a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, já que foi aplicada madeira de castanho, e tem “bicho”.
i) O Rodapé: O preço estava incluído no orçamento fornecido sob o item “soalho” e “madeira de carvalho para portas roupeiros e rodapé”; foram faturados e pagos, como “extra” (fora do orçamento), 56m2 de rodapé, indevidamente; não foi aplicado rodapé nas escadas, conforme previsto;
j) Soalho: foram facturados e pagos (indevidamente) 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 53,20m2;
l) Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar;
m) Tipo do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz aplicado no soalho e nas escadas não está conforme o acordado, pois foi acordado que seria aplicado verniz poliuretano e, ao invés, foi aplicado verniz aquoso;
n) Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas;
o) Infiltrações de água nas janelas: em 2 janelas do quarto principal têm aparecido infiltrações de água;
p) Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido, ao contrário do que estava acordado e orçamentado.
q) Certificado de vidros: até hoje ainda não foram entregues os certificados correspondentes aos vidros efectivamente aplicados em obra.
r) Certificado relativo composição da caixilharia: até hoje ainda não foram entregues os certificados da composição e rotura térmica da caixilharia completa (madeira/alumínio/vidros) das janelas, portas e vidraças.
s) Ficha técnica de desmontagem/montagem: Até hoje ainda não foi entregue a ficha técnica para desmontagem/montagem das janelas para trocar vidros se necessário.
t) Os AA. com as desconformidades/defeitos alegados sofreram os seguintes prejuízos:
1. Prejuízos relativos aos armários da cozinha: Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos armários da cozinha e o tipo de material orçamentado - € 4.104,02
2. Prejuízo relativo à substituição do armário lavatório WC R/C, 0.67x0.69m: O armário não é em castanho tal como orçamentado e está todo danificado com a humidade - € 369,00
3. Prejuízo relativo ao armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no armário e o tipo de material orçamentado - € 107,00
4. Prejuízo relativo à substituição do armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13m: O armário não está feito conforme o orçamento, nem em relação aos materiais nem ao desenho fornecido - € 660,00.
5. Prejuízo relativo ao roupeiro do quarto principal 2.50X4.00 (portas não incluídas): Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro e o tipo de material orçamentado - € 1.140,00.
6. Prejuízos relativos aos 3 roupeiros 2.50X1.80 (2 nos quartos pequenos e 1 no hall de entrada):
6.1 Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado nos 2 roupeiros dos quartos pequenos e o tipo de material orçamentado - € 1 421,00;
6.2 Prejuízo relativo à diferença de valor entre o tipo de material aplicado no roupeiro do hall de entrada e o tipo de material orçamentado - € 260,50
7. Prejuízo relativo as portas principais, as portas interiores, as caixilharias janelas e ao rodapé: Prejuízo relativo ao valor da diferença de duração entre o tipo de material aplicado e o tipo de material orçamentado € 1 000,00.
8. Prejuízo relativo ao rodapé:
8.1 Prejuízo relativo aos 9,7m de rodapé orçamentados para as escadas mas não aplicados - € 140,22;
8.2 Prejuízo relativo aos 56m de rodapé facturados a mais, mas não orçamentados e não aplicados - € 826,56;
9. Prejuízo relativo à diferença entre a área do soalho aplicado e a área de soalho facturado - € 435,42.
10. Prejuízo relativo ao facto do verniz aplicado não ser conforme o orçamentado - € 1 545,00
11. Prejuízo relativo ao levantamento do soalho - € 100,00
12. Prejuízo relativo ao eixo do puxador da porta corredora estar desgastado - € 180,00
13. Prejuízo relativo à falta de ligação/isolação e fixação das caixilharias:
13.1 Prejuízo relativo à falta de ligação/isolamento da caixilharia às paredes exteriores - € 492,00
13.2 Prejuízo relativo à falta de fixação e isolação da parte superior das vidraças do sequeiro - € 160,00
14. Prejuízo relativo a infiltrações de humidades em 3 janelas, retirar e instalar as mesmas - € 904,05
15. Prejuízo relativo diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos - € 4 000,00
16. Prejuízos relativos à caixilharia e aos vidros
16.1 Prejuízo relativo à falta de certificado dos vidros - € 750,00
16.2 Prejuízo relativo à falta de certificação ao nível da impermeabilidade e resistência térmica do conjunto da caixilharia (alumínios e madeira) - € 750,00;
16.3 Prejuízo relativo à falta do manual de desmontagem/montagem das janelas para substituição de vidros € 750,00
Tudo no total de € 20.130,77».
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2.2. Do objecto do recurso

2.2.1. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Invocando os Recorrentes a nulidade da sentença causada por omissão de pronúncia, cumpre apreciar tal fundamento.
Nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), do CPC, a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da sentença.
Esta nulidade está directamente relacionada com o disposto no artigo 608º, nº 2, do CPC, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
Neste enquadramento, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes. Conforme já ensinava Alberto dos Reis (2), «são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão». Quer dizer, a omissão de pronúncia circunscreve-se às questões/pretensões formuladas de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou invocação de um argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado (3).
Esta nulidade só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, pedido e excepções, e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas (4). Segundo Manuel Tomé Gomes (5), «já não integra o conceito de questão, para os efeitos em análise, as situações em que o juiz porventura deixe de apreciar algum ou alguns dos argumentos aduzidos pelas partes no âmbito das questões suscitadas. Neste caso, o que ocorrerá será, quando muito, o vício de fundamentação medíocre ou insuficiente, qualificado como erro de julgamento, traduzido portanto numa questão de mérito». O juiz não tem que analisar um por um todos os argumentos ou razões invocados pelas partes, ainda que tenha de dar resposta (resolução) às questões por elas invocadas; não se lhe impõe, por outro lado, que indique, uma por uma, as disposições legais em que se baseia a decisão, bastando que faça alusão às regras e princípios gerais em que a ancora (6).
Também não há omissão de pronúncia quando a matéria, tida por omissa, ficou implícita ou tacitamente decidida no julgamento da matéria com ela relacionada, competindo ao tribunal decidir questões e não razões ou argumentos aduzidos pelas partes (7). O juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devem ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (8).
Assim, incumbe ao juiz conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente deve conhecer (artigo 608º, nº 2, do CPC), salvo daqueles cujo conhecimento esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outros. O conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição directa sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui (9). Não ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando nela não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra (10).
Feitas estas considerações gerais, vejamos a sua pertinência no caso concreto.
Nas conclusões CC a FF das suas alegações, os Recorrentes invocam a nulidade da sentença por não se ter pronunciado sobre o «direito indemnizatório dos AA. por via do interesse contratual positivo ou, subsidiariamente, do instituto do enriquecimento sem causa».
Tendo os Autores deduzido, sob a alínea d), pedido subsidiário de condenação dos Réus no pagamento da «quantia de €20.130,77, decorrente do enriquecimento tido à custa dos RR. e sem qualquer causa que o justifique», constata-se que na sentença esse pedido foi apreciado.
Concluiu-se aí que «não resultaram demonstrados quaisquer dos pressupostos aplicáveis ao regime do enriquecimento sem causa previsto no artigo 473º, do Código Civil, logo tal pretensão terá necessariamente de improceder».
Sendo assim, não restam dúvidas de que o Tribunal recorrido apreciou tal pedido, pelo que não se verifica, nessa parte, nulidade por omissão de pronúncia.

Já o mesmo não se pode dizer quanto ao terceiro pedido.
Com efeito, verifica-se que os Autores na petição inicial deduziram, sob a alínea c), pedido de condenação dos Réus a pagar-lhes «o valor correspondente ao valor de indemnização pelo interesse contratual positivo, decorrentes do cumprimento defeituoso, que se computa em €20.130,77».
Sucede que na sentença não se apreciou tal pedido. A fundamentação de direito não contém qualquer referência ao aludido pedido. Apenas no dispositivo consta a absolvição genérica dos «Réus dos demais pedidos formulados», pelo que falta em absoluto a indicação dos fundamentos de direito da decisão de absolvição dos Réus daquele pedido.
Por isso, é manifesta a nulidade da sentença, por não especificar os fundamentos de direito que justificam a decisão (art. 615º, nº 1, al. b), do CPC), que deve ser declarada. Atenta a regra da substituição ao tribunal recorrido (art. 665º, nº 1, do CPC), impõe-se a esta Relação que conheça desse pedido.
Pelo exposto, na parcial procedência da arguição, declara-se verificada a nulidade da sentença, pelo que se procederá à apreciação do pedido deduzido na petição inicial sob a alínea c).
*
2.2.2. Da impugnação da decisão da matéria de facto
2.2.2.1. Em sede de recurso, os Recorrentes impugnam a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1ª instância.
Os Autores/Recorrentes consideram incorrectamente julgados os pontos de facto que enumeram na conclusão V das suas alegações.
Os Recorrentes entendem que se devem considerar provados os factos que descrevem na conclusão W das suas alegações.
*
2.2.2.2. Com vista a ficarmos habilitados a formar uma convicção autónoma, própria e justificada, procedemos à análise de todos os documentos juntos aos autos e do relatório pericial e respectivos esclarecimentos prestados por escrito, e à audição integral da gravação dos depoimentos de parte do Autor A. F. e da Autora I. M., das declarações de parte do Réu D. A. e do Autor A. F., dos esclarecimentos prestados em audiência pelo perito R. F. (engenheiro civil) e dos depoimentos das testemunhas A. C. (empreiteiro da construção civil, residente em …, Barcelos, que desenvolveu as funções de empreiteiro geral da obra em causa nestes autos), N. R. (engenheiro civil, residente em Braga, que elaborou, a pedido dos Autores, o relatório técnico junto com a petição inicial), M. P. (carpinteiro, filho dos Réus, residente em ..., Viana do Castelo, que teve intervenção na obra e na elaboração, além do mais, dos desenhos das portas dos armários), J. C. (residente em …, Barcelos, actualmente reformado desde 2014, mas que anteriormente prestou serviços para o Réu, tendo sido a empresa desta testemunha que procedeu ao envernizamento do soalho), J. N. (carpinteiro, irmão e funcionário do Réu, que trabalhou na obra dos autos, residente em …, Barcelos), C. A. (industrial, residente em ..., Viana do Castelo, cuja empresa forneceu os vidros para a habitação dos Autores), R. V. (engenheiro civil, residente em Barcelos, que efectuou uma perícia no âmbito de uma acção anterior).
Como existem nos autos algumas fotografias do prédio e respectivas obras e materiais aplicados, aqui em causa, isso permitiu a esta Relação ter uma ideia aproximada dos factos objecto dos depoimentos.
Para melhor percepção das questões factuais colocadas, foram ouvidas as alegações orais dos Advogados das partes.
*
2.2.2.3. Alínea a) dos factos não provados

Esta alínea tem o seguinte teor:
«a) A obra encomendada e contratada com o R. não está de acordo com o que foi orçamentado e padece de defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.».
Conforme se verifica na conclusão W), os Recorrentes pretendem que este ponto “de facto” seja considerado provado, com base nos elementos de prova que enumeram.
Constam desta alínea uma conclusão genérica e uma formulação de direito.
O Tribunal poderá chegar ou não à conclusão formulada após verificação de cada um dos factos parcelares que constituem as suas premissas. Na decisão sobre a matéria de facto declaram-se quais os factos que se julgam provados e quais os que se julgam não provados, mas não se pronúncia sobre juízos conclusivos (cfr. art. 607º, nº 4, do CPC) ou valorativos. O que releva, em sede de decisão da matéria de facto é a pronúncia sobre os factos que constituem a causa de pedir ou que alicerçam matéria de excepção.
Quanto à formulação de direito, sobre «defeitos que têm que ser corrigidos ou compensados aos AA.», igualmente é insusceptível de ser respondida na decisão sobre a matéria de facto e, nesta fase de recurso, na apelação sobre a matéria de facto. A matéria de direito é abordada pelo juiz na sentença na parte em que lhe cabe «indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes» (art. 607º, nº 3, do CPC). Em sede de recurso, as questões de direito são apreciadas na apelação interposta sobre a matéria de direito.
Pelas razões apontadas, a alínea a) dos factos provados não pode ser considerada provada.

No entanto, importa aproveitar esta questão genérica para também desde logo estruturar argumentação sobre questões factuais que são comuns a vários pontos de facto que constam das diversas alíneas dos factos julgados não provados pelo Tribunal recorrido.

2.2.2.3.1. Inexistência de contrato escrito
Após análise dos extensos meios de prova produzidos, esta Relação tem poucas dúvidas sobre o resultado da obra que o Réu marido executou. Sabe-se o que foi executado na casa dos Réus. Em rigor, a única dúvida, facilmente resolúvel em face das regras do ónus da prova, respeita a saber se existe ou não soalho sob os roupeiros, uma vez que a prova é absolutamente contraditória sobre esse ponto e não permite chegar a uma conclusão segura.
A questão factual nuclear, da qual quase todas as demais dependem, respeita a saber o que concretamente foi acordado entre Autores (rectius, em rigor, Autor A. F., pois até a Autora I. M. no seu depoimento de parte referiu que o assunto foi tratado em “98 a 99%” pelo seu marido) e Réu D. A..
E essa questão factual é muito difícil de apurar, na medida em que o contrato (de empreitada, segundo uniformemente entendido pelas partes e pelo Tribunal recorrido) não foi celebrado por escrito (questão logo admitida no art. 6º da p.i.), não existe documento escrito definidor do respectivo clausulado, as negociações decorreram exclusivamente entre Autor e Réu, sem intervenção de terceiros, e ninguém assistiu às negociações ou à celebração do acordo verbal.
Mas isso não significa que esta Relação se deva demitir de tentar apurar, através da análise dos meios de prova produzidos, o que foi acordado, sempre na medida do que seja possível em face do revelado pelos elementos dos autos.

2.2.2.3.2. Defeitos e desconformidades - metodologia
Dito isto, os Autores alegaram um conjunto alargado de desconformidades entre a obra executada e o que as partes tinham acordado entre si. Em menor número, invocaram ainda alguns vícios materiais.
No que respeita aos vícios (patologias materiais da obra executada), o Tribunal recorrido deu como demonstrados os seguintes:
«9 – Uma pequena área de soalho encontra-se descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso.
10 - O puxador [da] porta corredora elevadora tem folga.
11 – Uma janela no sequeiro apresenta sinais de infiltração de água».
Quanto às desconformidades apenas deu como verificado, sob o ponto 8, que «o armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, [com] 1.99x1.13 [m,] não está feito conforme o desenho fornecido».
Na análise da impugnação, abordaremos especificadamente cada um dos vícios alegados, mas já quanto às desconformidades não seguiremos tal metodologia. Isto porque há um conjunto de desconformidades que assenta na alegação de que os materiais a aplicar na obra seriam em “madeira de carvalho”, conforme, segundo os Autores, constava do(s) orçamento(s) e que, afinal, veio a ser aplicado aglomerado revestido a folha de madeira de castanho (ou aglomerado revestido a melamina em tom de madeira de castanho no interior do móvel da casa de banho e no interior do roupeiro da suite; aglomerado de madeira folheada a melamina cinzenta no interior dos armários da cozinha; madeira lacada nos roupeiros dos restantes quartos). Nem madeira maciça, nem pelo menos contraplacado, mas sim aglomerado.
Por se mostrarem juntos aos autos e terem sido referidos uniformemente por todas as pessoas ouvidas em audiência sobre essa matéria, verifica-se que foram elaborados pelo Réu, a pedido do Autor (e não propriamente dos Autores, pois já se referiu que a Autora mulher nenhuma intervenção teve nas negociações prévias à celebração do contrato), orçamentos onde constavam os trabalhos a executar e os materiais a aplicar na obra. Em rigor, não é correcto falar apenas em “orçamento”, como os Autores fizeram no artigo 3º da petição, pois existiu mais do que um, e mesmo o termo “contrato” ou “obra”, no singular, tem de ser usado cum granu salis, na medida em que os orçamentos têm datas (o da “cozinha” – como o Autor o identificou no seu depoimento de parte – foi feito mais tarde) e objectos diferentes.
Vamos desde já afastar a possibilidade de ter sido acordada a aplicação de “madeira maciça”. Por um lado, nenhuma prova minimamente convincente foi produzida no sentido afirmativo (pelo contrário, os meios de prova apontam até em sentido negativo). Por outro, o próprio Autor, durante o seu depoimento de parte, como se pode ver na gravação cerca dos 15 minutos e 16 segundos (usaremos a terminologia “15m16s”, sendo que também é usualmente utilizada a designação “15:16” ou “15.16”) acabou por dizer que nunca esteve estabelecido entre Autor e Réu que seria apenas, com exclusão de qualquer outra solução, aplicada madeira maciça (também, no mesmo momento da gravação, declarou que o Réu usaria madeira maciça onde pudesse usar – sem haver qualquer definição sobre a respectiva concretização – e se não pudesse usar madeira maciça aplicaria contraplacado). Além disso, como se vê no relatório pericial elaborado nestes autos (v. esclarecimentos prestados por escrito em 17.09.2019), foi afirmado nos esclarecimentos verbais do Sr. Perito R. F. e resulta dos depoimentos das testemunhas M. P., J. N. e R. V. é pouco frequente aplicar madeira maciça, sobretudo em cozinhas e casas de banho (pelo risco de empenar e “inchar”, no dizer do Réu (5m39s) e da testemunha J. N., sendo que também é maior «a dificuldade na realização das peças em madeira maciça» - v. esclarecimento 1.3. ao relatório pericial). O próprio empreiteiro geral da obra – A. C. – referiu: «nós sabemos que os armários não são em madeira de carvalho maciça porque hoje ninguém faz isso».
Também, pelos mesmos motivos, não pode ser dado como demonstrado que foi acordado que a madeira seria em contraplacado, sendo que apenas o Autor o afirmou (nos termos que já se referiram e que aqui se voltam a enfatizar: o Réu usaria madeira maciça onde pudesse; se não pudesse, utilizaria contraplacado) e inexiste qualquer outro elemento que o confirme, sendo que em lado algum dos três orçamentos consta a referência a “contraplacado”. Além disso, a situação mais corrente é a utilização de aglomerado.
Acresce que existem vários elementos nos autos, contrários à tese dos Autores (sustentada apenas nas suas afirmações em depoimento de parte), que apontam no sentido de ter sido acordada a utilização de aglomerado, sendo que nas partes em que fosse necessário revestir este a folha de madeira seria utilizado castanho e não madeira de carvalho.
Primeiro, no desenho do «armário da casa de banho do andar de cima», assim designado, consta a referência a «2 portas lisas em castanho» (negrito nosso) e foi efectivamente aplicado aglomerado revestido a folha de madeira de castanho (portanto, afastando a aplicação de “madeira de carvalho” (11)). Segundo, em email de 16.02.2012 os Autores confirmaram ao Réu que o roupeiro do quarto principal seria com «estrutura em aglomerado “melamina” a imitar o castanho» (o que desde logo contraria que o roupeiro do quarto principal seria em “carvalho” – alínea f) dos factos não provados – bem como que foi acordada a aplicação de contraplacado), «porta dupla a abrir para o exterior com almofada (iguais às outras portas interiores)», «roupeiros dos 2 quartos pequenos: portas lisas a abrir para o exterior (com dobradiças invisíveis), pintadas em branco. (…) interior aglomerado em melanina branca» (também infirma o que consta da alínea g) e que tenha sido acordada a aplicação de contraplacado); terceiro, nas sucessivas trocas de correspondência o Autor (ou os Autores) nunca suscitou qualquer questão relativa à desconformidade da madeira aplicada com o que foi acordado (sendo certo que carvalho e castanho são madeiras com diferentes características, desde logo aquelas que são perceptíveis pela sua mera observação, e a madeira de castanho facilmente se distingue da madeira de carvalho, atenta, além do mais, a sua diferente tonalidade); quarto, tal como uniformemente referido por M. P. (4m10s, 4m15, 4m57, 5m30s, 6m15s, 6m18s, 6m30s e 6m48s) J. N. (2m53s e 3m10s), além do próprio Réu (pese embora se tenha bem presente o seu interesse em que a causa seja decidida a seu favor), foram feitas amostras da madeira, o Autor aprovou-as na oficina do Réu e a obra foi executada em conformidade; quinto, tanto pelo que resulta da sucessão de mensagens de correio electrónico trocadas como do depoimento da testemunha M. P., é possível perceber que foram executados desenhos dos móveis e demais artigos, onde se evidenciavam as suas características, e que os mesmos foram aprovados pelos Autores, sendo que o Autor se deslocou propositadamente à oficina do Réu (segundo a testemunha M. P., andou uma semana a ir todos os dias à oficina, sendo que pelo menos uma vez foi acompanhado da Autora), pelo menos numa das ocasiões em que esteve em Portugal, para discutir desenhos e materiais; sexto, as mensagens de correio electrónico de 16.02.2012 às 15.49 horas (sobre a escolha dos modelos para os roupeiros dos quartos pequenos, mencionando ainda o roupeiro grande do quarto principal), de 16.02.2012 às 17.40 horas (sobre o roupeiro do quarto principal e os roupeiros dos quartos pequenos, incluindo pronúncia sobre materiais e composição), de 04.07.2012 (onde o Autor confirma três portas transparentes e especifica determinadas exigências, tal como já havia feito no email de 30.05.2012) e de 15.09.2012 (onde, além do mais, exige ao Réu que faça «todos os acabamentos de finição (12) relativamente ao teu trabalho» e apresenta uma listagem de especificações do que pretende) evidenciam que o Autor definiu o que queria, aprovou os modelos que lhe foram apresentados, teve conhecimento do que ia ser feito e acompanhou, apesar de residir no Canadá, a execução das obras e dos materiais aplicados.
Portanto, nesta parte, consideramos que a motivação da decisão da matéria de facto é pertinente: «dos meios de prova produzidos, designadamente da prova documental, da prova testemunhal e da prova pericial, não conseguiu o tribunal, quanto ao negócio em si, apurar o que realmente foi acordado entre as partes, atenta a inexistência de qualquer documento escrito, onde tenham sido definidas as cláusulas desse mesmo contrato e ninguém presenciou ou tinha conhecimento direto dessas mesmas negociações, visto que as declarações parte não foram atendidas atento o interesse e parcialidade das mesmas, daí que se tenham considerado como não provadas a existência de desconformidades e consequentemente a existência dos prejuízos invocados».
Por isso, não podem ser considerados provados os pontos constantes das alíneas b), c) (abordaremos mais à frente a questão da danificação por humidade), d), e), f) e g), bem como os alegados “prejuízos” inerentes a esses não verificados defeitos.
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2.2.2.4. Alínea c) dos factos não provados, na parte não prejudicada pelo já apreciado em 2.2.2.3.2.

Os Recorrentes identificam esta questão factual sob a epígrafe «2. Quanto ao armário lavatório do wc do rés-do-chão 0.67x0.69m».

A alínea c) dos factos não provados tem o seguinte teor:
«c) O armário lavatório WC do R/C de 0.67x0.69m: o material aplicado no armário não está conforme o acordado, foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho; o material do armário por não ser de boa qualidade está danificado com a humidade».
Não se demonstrando, pelos fundamentos já expostos, a desconformidade referida nesta alínea, resta apurar se «o material do armário por não ser de boa qualidade está danificado com a humidade».
Foi realizada uma perícia nestes autos e da mesma resulta que «o armário tem vestígios de humidades». Não resulta do relatório pericial que o material do “armário” não seja de «boa qualidade».
Quanto aos vestígios de humidade, conforme se vê nos esclarecimentos ao relatório pericial prestados por escrito, tendo sido constatada a existência de algumas manchas de humidades e alguns escorrimentos de humidades, o Sr. Perito concluiu que a causa ou origem da humidade «nada tem a ver com o material utilizado na elaboração dos armários». Além disso, o Sr. Perito esclareceu na audiência final que as manchas que viu foi na primeira prateleira e que tem a certeza que foi água que saiu do lavatório.
Portanto, trata-se de uma consequência do uso (“mau uso”, no entender do perito) e não propriamente da má qualidade do material.
Consideramos que não existe fundamento válido para afastar a conclusão pericial, sendo certo que a perícia foi realizada por um técnico qualificado, que demonstrou isenção e equidistância relativamente às posições das partes, designadamente quando prestou esclarecimentos em audiência (13).
Por isso, não conseguindo formular-se uma convicção divergente daquela que que está expressa na decisão sobre a matéria de facto, deve manter-se como não provado o ponto de facto constante da alínea c) ora em análise, assim como o ponto t)-2, referente ao alegado prejuízo.
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2.2.2.5. Alínea h) dos factos não provados

Esta alínea tem o seguinte teor:
«h) A madeira das portas principais, portas interiores: a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, já que foi aplicada madeira de castanho, e tem “bicho”».
No que respeita a ter sido acordada a aplicação de madeira de carvalho já nos pronunciamos. Tal facto não resultou demonstrado.
Resta apurar se a madeira aplicada «tem “bicho”».
Nessa parte, os Recorrentes não apontam qualquer meio de prova produzido que ateste a realidade desse facto.
Na perícia não foram detectadas portas com “bicho”.
Por isso, este ponto de facto foi correctamente considerado como não provado.
Consequentemente, também inexiste o respectivo prejuízo.
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2.2.2.6. Alíneas i) e t)-8.1 e 8.2 dos factos não provados

A alínea i) tem o seguinte teor:
«i) O Rodapé: O preço estava incluído no orçamento fornecido sob o item “soalho” e “madeira de carvalho para portas roupeiros e rodapé”; foram faturados e pagos, como “extra” (fora do orçamento), 56m2 de rodapé, indevidamente; não foi aplicado rodapé nas escadas, conforme previsto».
A alínea t)–8.1 e 8.2 consiste em:
«8. Prejuízo relativo ao rodapé:
8.1 Prejuízo relativo aos 9,7m de rodapé orçamentados para as escadas mas não aplicados - € 140,22;
8.2 Prejuízo relativo aos 56m de rodapé facturados a mais, mas não orçamentados e não aplicados - € 826,56».

A questão da “madeira de carvalho” para o rodapé é similar à apreciada quanto às portas. Entendemos que o Tribunal recorrido decidiu bem ao considerar não demonstrado que tinha sido acordada a aplicação de madeira de carvalho. Aliás, faria pouco sentido não haver uma harmonização e uniformização das madeiras aplicadas (como referiu, por exemplo, a testemunha M. P.– 6m48s).
Segundo o relatório pericial, da análise do orçamento não resulta absolutamente claro se o rodapé estaria ou não incluído no orçamento. Sendo verdade que no anexo 5 se enuncia genericamente «Madeira de Carvalho para portas roupeiros e rodapé e portadas», também se verifica que existe uma remissão para o “anexo” («o eventual fornecimento e colocação dos materiais designados no anexo»). E no dito “anexo” não está incluído esse item específico, o qual não é aí referido. Nos esclarecimentos prestados em audiência, o Sr. Perito explicitou (10m30s a 11m48s) que para se poder considerar que estava incluído no orçamento tinha que ser referido na parte em que se especificavam os materiais, as quantidades e o respectivo custo (designação). Não estando o rodapé mencionado naquela parte do orçamento, não se pode dar como provado que o rodapé estava incluído no custo orçamentado.
Entendem igualmente os Autores que estava prevista a aplicação de rodapé nas escadas. Consultado o orçamento, verifica-se que do mesmo não consta qualquer menção à aplicação de rodapé nas escadas, o que só por si já é motivo para considerar não demonstrado tal facto, sendo certo que nenhuma prova em sentido afirmativo foi feita, além do afirmado pelo Autor no depoimento de parte (sem qualquer confirmação em outro elemento de prova).
Mais: no email de 13.02.2013, dirigido ao Réu, o Autor afirmou que «[n]o que diz respeito aos extras está tubo bem excepto o rodapé, que no meu ponto de vista estava incluído e mencionado no orçamento original». Repare-se que o Autor não invocou então, quando seria natural fazê-lo se essa fosse uma desconformidade com o acordado, a falta de colocação de rodapé nas escadas, mas apenas que o rodapé estava mencionado no «orçamento original». Tal declaração indicia fortemente que não tinha sido acordada a colocação de rodapé nas escadas.
Acresce que, conforme referido no relatório pericial, nas escadas foi aplicado rodapé nas paredes com reboco, apenas não tendo sido aplicado na parte das escadas em que as paredes são de alvenaria de granito sem revestimento superficial (acrescentamos nós, em mero reforço argumentativo, que devido à irregularidade da pedra seria pouco curial prever a aplicação de rodapé, pois ficaria inestético em algumas partes).
Embora tenham alegado, na tabela constante do artigo 14º da p.i., sob o ponto 8.1, «Prejuízo relativo aos 9,7m de rodapé orçamentados para as escadas mas não aplicados - € 140,22», os Autores não mencionaram o facto essencial base que permitiria entender o que pretendiam dizer com «9,7m de rodapé orçamentados mas não aplicados».
Só agora nas alegações, a destempo, introduziram e pretendem que seja considerado provado um facto que é diferente daquele que consta do ponto 8.1.
Repare-se que aquilo que estava alegado é que foram “orçamentados” 9,7 m de rodapé e não foram aplicados. Agora invoca-se (melhor dizendo, alega-se) um facto diferente (v. 61.4 da motivação das alegações): que «os Autores suportaram um preço correspondente à aplicação de 56 m, sendo que foi aplicado apenas 48,70 m».
Ora, a diferença entre 56 m e 48,70 é de 7,3 m e não de 9,5 m. Por isso, não era esse o facto alegado em 8.1, mas sim “a não aplicação do rodapé nas escadas e degraus, num total de 9,5 metros lineares”.
Portanto, a argumentação ora apresentada, relativa à aplicação de 48,70 m e ao pagamento de 56 m, não demonstra o que se alegara em 8.1 do artigo 14º da petição inicial.
“Orçamentado e não aplicado” é coisa diferente de “não aplicado mas pago”, sendo que este último facto não foi sequer alegado. É por isso que tal facto – não alegado – não foi submetido à perícia e nem sequer consta dos factos não provados. No relatório pericial, apenas é apontado que «o prejuízo relativo ao rodapé em falta não aplicado seja de aproximadamente € 116,40», pressupondo a verificação da orçamentação.
Não estando demonstrado que os 9,7 m de rodapé foram orçamentados, é impossível chegar à conclusão de que houve prejuízo.
Por isso, nenhum motivo substancial temos para afastar a motivação da decisão recorrida sobre este facto.
Termos em que não podem ser dados como provados os factos das alíneas i) e t)-8.1. e 8.2.
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2.2.2.7. Alíneas j) e t)-9 dos factos não provados

A alínea j) tem o seguinte teor:
«j) Soalho: foram facturados e pagos (indevidamente) 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 53,20m2».
Por sua vez no ponto 9 da alínea t) consta:
«9. Prejuízo relativo [à] diferença entre a área do soalho aplicado e a área de soalho facturado - € 435,42».
Não existe qualquer evidência de que a área do soalho seja de apenas 53,20 m2. Na medição do Sr. Perito, que nenhuma razão substancial temos para rejeitar, a área de soalho, considerando nesta a parte ocupada pelos roupeiros (3 roupeiros), é de 56,81 m2 (e não 53,20 m2). Sabe-se que os roupeiros ocupam 4,05 m2, tal como indicou o Sr. Perito na audiência final.
Como já referimos, fica-nos a dúvida sobre se existe ou não soalho sob os roupeiros, uma vez que a prova é absolutamente contraditória sobre esse ponto (Autor e testemunha A. C. a afirmarem que não existe soalho por baixo dos roupeiros, enquanto o Réu e as testemunhas M. P. e J. N. afirmam que foi colocado soalho debaixo dos roupeiros) e não permite chegar a qualquer conclusão segura. Por isso, a questão tem que ser resolvida em desfavor do Autor, cujo ónus da prova lhe cabia.
Por isso, deveria o Tribunal recorrido ter dado como demonstrado que «foram facturados e pagos 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 56,81m2». Essa diferença resultava objectivamente dos elementos dos autos (é para isso que se manda produzir prova pericial, que no caso não foi afastada mediante invocação de qualquer argumento) e não era uma questão de “ausência de prova” ou de falta de convencimento.
Consequentemente, também se deveria ter dado por verificado o respectivo “prejuízo”, no sentido de que os Autores pagaram mais 3,19 m2 de soalho (um total de 60 m2) do que aquele que foi efectivamente aplicado (56,81 m2).
Conforme se apurou na perícia, no relatório elaborado nos presentes autos é de € 239,25, acrescido de IVA, portanto € 294,28 (o custo unitário, por metro quadrado de soalho de madeira de “afizélia”, é de € 75,00, acrescido de IVA).
A diferença entre o custo da área de soalho aplicada e o custo da área de soalho facturada pelo Réu e paga pelos Autores é de € 239,25, acrescido de IVA, ou seja, € 294,28 (duzentos e noventa e quatro euros e vinte e oito cêntimos).

Termos em que, na parcial procedência da impugnação sobre estes dois pontos de facto, se decide eliminar as alíneas j) e t)-9 dos factos não provados e se determina o aditamento de dois novos pontos à factualidade assente, com a seguinte redacção:
17. Foram facturados e pagos 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 56,81 m2.
18. A diferença entre o custo da área de soalho aplicada e o custo da área de soalho facturada pelo Réu e paga pelos Autores é de € 239,25, acrescido de IVA, ou seja, € 294,28 (duzentos e noventa e quatro euros e vinte e oito cêntimos).
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2.2.2.8. Alínea l) dos factos não provados
Esta alínea tem o seguinte teor:
«l) Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar».
No âmbito da perícia verificou-se que «durante a diligência não foram detectadas áreas a descascar ou desgaste prematuro do soalho aplicado nos pavimentos e nas escadas».
Nesta conformidade, este ponto de facto foi correctamente considerado como não provado.
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2.2.2.9. Alíneas m) e t)-10 dos factos não provados

A alínea m) tem o seguinte teor:
«m) Tipo do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz aplicado no soalho e nas escadas não está conforme o acordado, pois foi acordado que seria aplicado verniz poliuretano e, ao invés, foi aplicado verniz aquoso».

No que respeita ao inerente prejuízo, consta no ponto 10 da alínea t):
«10. Prejuízo relativo ao facto do verniz aplicado não ser conforme o orçamentado - € 1 545,00».

Sobre o facto de ter sido aplicado verniz aquoso a prova é absolutamente uniforme: todas as pessoas ouvidas sobre essa matéria o confirmaram, começando logo pelo Réu, que o confessou. Também já resultava da perícia realizada no anterior processo que correu termos entre Réu e Autor, e a perícia agora realizada também o confirma.
Revistos os meios de prova produzidos sobre esta questão, é para nós perfeitamente claro que foi acordada a aplicação de «verniz poliuretano 20% de brilho da marca Y».
Primeiro, é isso que consta do orçamento que o Réu elaborou (documento nº 3 junto com a p.i., anexo A5). O acordo foi formado pela apresentação do orçamento onde se previa a aplicação do verniz de poliuretano e a aceitação do mesmo pelo Autor.
Segundo, ao contrário do que sucedeu com as madeiras, em que existem vários elementos que apontam no sentido de o orçamentado ter sido modificado mediante acordo das partes (nos termos que já expusemos), aqui inexiste qualquer indício, por menor que seja, de alteração do acordado.
Terceiro, nesta matéria não é viável argumentar que o Autor sabia que era verniz aquoso, pois dificilmente um leigo consegue distinguir os dois vernizes depois de aplicados (ao contrário do que sucede com a madeira de carvalho e a de castanho, perceptível logo pela tonalidade).
Quarto, também não se pode argumentar com a realização de alguma prova do verniz e consequente apreciação e aprovação pelos Autores, pois nenhuma foi feita.
Quinto, o Réu, durante o seu depoimento de parte, argumentou que foi colocado verniz aquoso por manter “muito mais” a tonalidade da madeira, mas isso não constitui motivo justificativo para introduzir, por sua iniciativa e sem dar prévio conhecimento desse facto ao Autor, tal alteração ao acordado.
Sexto, também em audiência se introduziu a tese de que o verniz com poliuretano é agora proibido (v., por exemplo, o depoimento de J. C.), sendo que se desconhece a partir de quando passou a ser vedada a sua utilização (ninguém o conseguiu afirmar). Além de ser difícil de conceber que se inclua num orçamento a aplicação de um produto cuja utilização é proibida, sucede que nunca antes tal facto foi alegado pelo Réu, sendo que o normal, se tivesse sido esse o motivo para a aplicação de outro verniz, seria tê-lo invocado. Tal tese (sobre ter sido esse o motivo determinante da alteração do verniz aplicado, que não a circunstância de a aplicação do verniz orçamentado poder, eventualmente, agora ser proibida), tal como a dos Autores sobre a madeira maciça, não merece credibilidade e não nos convence. A própria introdução de tal elemento só na audiência de julgamento atesta que não houve qualquer acordo modificativo daquilo que estava acordado sobre o verniz, sendo que em lado algum o Réu indica se e quando obteve o acordo do Autor sobre a alteração do verniz.
De harmonia com o resultado da perícia, que temos por bom, o prejuízo resultante desta desconformidade, por o verniz aplicado não ser conforme o orçamentado, importa em € 876,00, acrescido de IVA, isto é, € 1.077,48 (mil e setenta e sete euros e quarenta e oito cêntimos).
Tal como indicado no documento nº 9 junto com a petição inicial, será necessário remover o verniz aplicado e aplicar o novo verniz solvente, por mais adequado à madeira em causa.
Nesta conformidade, procedendo nos termos expostos a impugnação sobre estes dois pontos de facto, decide-se eliminar as alíneas m) e t)-10 dos factos não provados e determinar o aditamento de dois novos pontos à factualidade assente, com a seguinte redacção:
19. Foi acordado que o verniz aplicado no soalho e nas escadas seria «verniz poliuretano 20% de brilho da marca Y» e veio a ser aplicado verniz aquoso.
20. Por o verniz aplicado não ser conforme o orçamentado, os Autores terão que remover o verniz aplicado e aplicar um verniz solvente, reparação que importa em € 876,00, acrescido de IVA, isto é, € 1.077,48 (mil e setenta e sete euros e quarenta e oito cêntimos).
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2.2.2.10. Alíneas n) e t)-13 dos factos não provados

A alínea n) tem o seguinte teor:
«n) Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas».

Por sua vez, na alínea t)-13 consta:
«13. Prejuízo relativo à falta de ligação/isolação e fixação das caixilharias:
13.1 Prejuízo relativo [à] falta de ligação/isolamento da caixilharia às paredes exteriores - € 492,00[;]
13.2 Prejuízo relativo à falta de fixação e isolação da parte superior das vidraças do sequeiro - € 160,00».

Deste conjunto de anomalias alegadas pelos Autores, o único vício verificado durante a perícia foi «num dos vãos envidraçados da sala». O Sr. Perito esclareceu durante a audiência que constatou isso no vão envidraçado da sala, onde se consegue ver luz proveniente do exterior através dessa saliência (destaca-se que o silicone aplicado no exterior é transparente e deixa passar luminosidade). Sendo certo que todas as caixilharias têm silicone aplicado na parte exterior, a deficiência que constatou consiste na “falta de isolamento entre o aro e a parede”. Tem silicone transparente na parte exterior, mas não tem na parte de dentro, o qual está em falta. Portanto, falta colocar silicone na parte interior, do lado direito para quem está de frente para o vão em causa (segundo resulta dos esclarecimentos do Perito).
O custo da reparação, consistente no fornecimento e colocação de silicone na parte em falta, importa em € 40,00, acrescido de IVA, conforme indicado no relatório pericial.

Termos em que, na parcial procedência da impugnação sobre estes dois pontos de facto, se decide:
i) Determinar o aditamento de dois novos pontos à factualidade assente, com a seguinte redacção:
21. Verifica-se falta de isolamento, entre o aro e a parede, num vão envidraçado da sala, onde não foi colocado silicone na parte interior, o que permite a passagem de luz proveniente do exterior.
22. O custo da reparação, consistente no fornecimento e colocação de silicone na parte em falta, importa em € 40,00 (quarenta euros), acrescido de IVA, ou seja, € 49,20 (quarenta e nove euros e vinte cêntimos).
ii) Alterar, restringindo o seu objecto, a redacção das alíneas n) e t)-13:
«n) Que na parte não prejudicada pelo que consta do ponto de facto nº 22, falte isolamento entre o aro e a parede nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas».
«13. Prejuízo relativo à falta de ligação/isolação e fixação das caixilharias:
13.1 Que o prejuízo relativo à falta de ligação/isolamento da caixilharia às paredes exteriores seja superior € 40,00, acrescido de IVA, designadamente € 492,00;
13.2 Prejuízo relativo à falta de fixação e isolação da parte superior das vidraças do sequeiro - € 160,00».
*

2.2.2.11. Alíneas o) e t)-14 dos factos não provados

A alínea o) tem o seguinte teor:
«o) Infiltrações de água nas janelas: em 2 janelas do quarto principal têm aparecido infiltrações de água».
A alínea t)–14 contempla o seguinte facto:
«14. Prejuízo relativo a infiltrações de humidades em 3 janelas, retirar e instalar as mesmas - € 904,05».

No âmbito da perícia verificou-se que «no quarto principal não foram aferidas infiltrações de água nas janelas». Apenas foi verificado, no sequeiro, o facto que consta do ponto nº 11, ou seja, que «uma janela no sequeiro apresenta sinais de infiltração de água».
Embora no documento elaborado pela testemunha N. R. se mencione a existência de manchas de humidade e eflorescências de escorrimentos derivados de infiltrações de humidade, o certo é que o Sr. Perito, no exercício das suas funções e tendo as partes tido a possibilidade de acompanhar as diligências de inspecção, não constatou tais anomalias.
Mais, já no âmbito da perícia realizada no processo 88.752/13.8YIPRT não tinha sido detectado qualquer indício de humidades.
Portanto, atento o verificado na perícia ora realizada, não se pode dar como provado o que os Autores pretendem na impugnação da decisão sobre estes pontos de facto.
Por outro lado, não foi objecto da perícia o custo da reparação das infiltrações na janela do sequeiro. Como no documento elaborado pela testemunha N. R. se indica um valor global que envolve a reparação de anomalias que não se verificam, é impossível estabelecer, com os dados dos autos, qualquer estimativa para a correcção da deficiência na janela do sequeiro, uma vez que também a anomalia pode ter duas origens (no próprio caixilho ou na ligação do caixilho à parede). Por isso, deve manter-se a redacção da alínea t)-14.
Nesta conformidade, improcede a impugnação quanto a estes pontos de facto.
*
2.2.2.12. Alíneas p) e t)–15 dos factos não provados

A alínea p) tem o seguinte teor:
«p) Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido, ao contrário do que estava acordado e orçamentado».
Na alínea t)–15 consta:
«15. Prejuízo relativo [à] diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos - € 4 000,00».

O Tribunal recorrido limitou-se a dar como demonstrado, no ponto 12, que «os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido». Considerou não demonstrada a restante componente factual alegada por «ausência de prova respectiva», em virtude de não ter conseguido «apurar o que realmente foi acordado entre as partes, atenta a inexistência de qualquer documento escrito» e ninguém ter presenciado as negociações.
Tudo se resume a saber se a inserção do gás árgon entre os vidros duplos foi “orçamentada” e “acordada”.
Quanto ao primeiro aspecto factual inexistem dúvidas: consta expressamente do orçamento, referente à caixilharia e vidros, a inclusão de «vidros duplos de controlo solar SGG Planitherm 6+15+5 com gás árgon» (negrito da nossa autoria).
Constando do orçamento, resta apurar se foi acordado. O acordo integra, no caso, a proposta (o orçamento) e a sua aceitação – adjudicação da obra.
Revistos integralmente os meios de prova produzidos sobre esta questão factual, ficamos com a forte convicção que o Autor aceitou aquele orçamento onde constava expressamente a aplicação de gás árgon.
Primeiro, se atentarmos no email de 14.02.2013, remetido pelo Réu ao Autor já na fase em que a obra referente à colocação da caixilharia tinha sido concluída, verificamos que nele comunica «Com respeito aos vidros não tens de ficar confuso, porque está tudo descrito no orçamento». Ora, se o Réu informa que quanto aos vidros «está tudo descrito no orçamento», isso significa que foi o que estava no orçamento que foi acordado. De outro modo, o Réu não invocaria o orçamento, mas sim que tinha sido acordada coisa diferente do que constava do orçamento. A única especificação “falada” não respeitava ao gás árgon, mas sim aos vidros laminados (um dos vidros que compõem os vidros duplos e não o que está entre os vidros, na denominada caixa de ar, que no caso deveria ser o gás árgon e não mero “ar”), pois aí referia que «os vidros das janelas são laminados sim, e ainda bem que falas nisso porque na altura falamos em colocar este vidro para apostar um pouco na segurança, e que terias um acréscimo de valor na ordem de mil e tal euros».

Recorde-se que o referido email do Réu constitui uma resposta ao email do Autor, expedido em 13.02.2013, no qual referia:
«No que diz respeito aos vidros confesso que sinto-me um bocado confuso.
Na altura tínhamos falado de vidros laminados.
Tal como eu já te mencionei, na factura das janelas do montante de 17 012.23Eur (13 831.08 + IVA) não indicas nenhum pormenor. Nomeadamente sobre o tipo de vidros das janelas. No orçamento escreves “Vidro SGG Plantherm 6+12+5 com gas árgon, e “vidro laminado fosco – acido 3+3”.
No carimbo dos vidros está escrito outra coisa.
Não percebo nada de vidros, por favor esclarece-me».
Também neste email o Autor invoca que no orçamento, cuja aceitação está pressuposta naquela comunicação, estava escrito «“Vidro SGG Plantherm 6+12+5 com gas árgon». Procurava na altura saber que vidros efectivamente tinham sido colocados e se eram diferentes do que tinha sido acordado.
Como o gás árgon constava do orçamento cuja obra tinha sido adjudicada, o Autor salientou que «por questões de segurança e de eficiência energética os vidros têm uma grande importância para mim» e, perante a apontada resposta do Réu, solicitou-lhe que pedisse à empresa que «forneceu os vidros que produza um certificado relacionado com a minha obra e identificando claramente o tipo de vidros aplicados (espessuras, laminado, árgon, etc.)».
Segundo, tanto o Réu no seu depoimento de parte, como a testemunha C. A., que era o legal representante da empresa que forneceu os vidros para a obra, salientaram que efectivamente fez-se constar do orçamento o gás árgon, mas que isso se ficou a dever a um lapso do Réu, emergente de ter aproveitado um orçamento que “tinha feito para França” com gás árgon.
Porém, em momento algum esse ponto relativo à previsão da inserção do gás árgon foi afastada por um acordo expresso entre Réu e Autor. Pelo contrário, as comunicações trocadas entre ambos revelam a inexistência de tal acordo. E se inexistiu tal acordo modificativo, mantém-se como acordado entre ambos o que constava do orçamento.

Resta a questão do “prejuízo” causado aos Autores por não ter sido colocado gás árgon. Este gás, como resulta da perícia, é um elemento que é introduzido para aumentar o isolamento térmico de uma janela, pois é um protector térmico para janelas de vidro duplo.
A tese defendida pelos Réus no sentido de que os vidros colocados são melhores não demonstra que o isolamento térmico seja superior ao que é conferido pela utilização de gás árgon. Inexiste qualquer elemento objectivo que o demonstre e nem sequer é isso que está em causa, pois o que os Autores alegam é uma desconformidade com o acordado e essa é inequívoca.

Se mais não houvesse, que há, nesta parte consideramos que não está demonstrado qual o efectivo “prejuízo” causado aos Autores pela não utilização do gás árgon, designadamente se é de € 4.000,00 ou de € 2.900,00. Apesar de o Sr. Perito ter indicado o valor de € 2.900,00, a sua resposta por escrito aos esclarecimentos que lhe foram solicitados sobre o relatório pericial é elucidativa: «o perito desconhece qual é a diferença entre os vidros orçamentados e os efectivamente colocados, uma vez que não foi possível aferir as características quer dos vidros orçamentados quer dos vidros colocados»; também declarou desconhecer se os aplicados «são ou não de qualidade superior».
Ora, se não se sabe quais são as características de uns e de outros, não é possível concluir, desde logo, pela necessidade da sua substituição. Depois, desconhece-se se aquela concreta caixilharia suporta ou não a inserção de gás árgon e, na negativa, quais as modificações que é necessário aplicar para que seja possível a respectiva inserção. E poderíamos continuar a enumerar outras vicissitudes que podem condicionar o apuramento do efectivo prejuízo, mas pensamos que já demonstramos o busílis condicionante daquela determinação.
Por outro lado, existe um problema de compatibilidade entre os dois factos alegados pelos Autores. Na alínea q) do artigo 12º da petição inicial alegaram: «q) Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás Argon inserido, ao contrário do que estava acordado e orçamentado». Por sua vez, no ponto 15 do artigo 14º da petição inicial, alegaram: «Prejuízo relativo diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos. € 4 000,00».
Trata-se de um verdadeiro problema de inconcludência: a alínea q) respeita à «falta de árgon nos vidros» e o prejuízo alegado, no valor de € 4.000,00, é «relativo [à] diferença entre os vidros orçamentados e os aplicados e substituição dos mesmos».
Como é evidente, não se pode dar como provado um prejuízo relativo a uma diferença de características (qualidades) dos vidros e à necessidade da substituição dos aplicados, quando o facto base respeita à falta de inserção nos vidros de gás árgon.

Termos em que se decide manter nos seus precisos termos a alínea t)-15 dos factos não provados, determinar a eliminação da alínea p) dos factos não provados e aditar o seguinte ponto aos factos provados:
23. Foi orçamentada e acordada a inserção de gás árgon nos vidros das janelas, vidraças e porta de correr.
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2.2.2.13. Alíneas q), r) e s) e t)-16.1, 16.2 e 16.3 dos factos não provados
As alíneas q), r) e s) tem o seguinte teor:
«q) Certificado de vidros: até hoje ainda não foram entregues os certificados correspondentes aos vidros efectivamente aplicados em obra;
r) Certificado relativo composição da caixilharia: até hoje ainda não foram entregues os certificados da composição e rotura térmica da caixilharia completa (madeira/alumínio/vidros) das janelas, portas e vidraças;
r) Certificado relativo composição da caixilharia: até hoje ainda não foram entregues os certificados da composição e rotura térmica da caixilharia completa (madeira/alumínio/vidros) das janelas, portas e vidraças».
s) Ficha técnica de desmontagem/montagem: Até hoje ainda não foi entregue a ficha técnica para desmontagem/montagem das janelas para trocar vidros se necessário.
Na alínea t)–16 consta:
«16. Prejuízos relativos à caixilharia e aos vidros
16.1 Prejuízo relativo à falta de certificado dos vidros - € 750,00;
16.2 Prejuízo relativo à falta de certificação ao nível da impermeabilidade e resistência térmica do conjunto da caixilharia (alumínios e madeira) - € 750,00;
16.3 Prejuízo relativo à falta do manual de desmontagem/montagem das janelas para substituição de vidros € 750,00».

Resulta do depoimento da testemunha N. R. (engenheiro civil) que o certificado dos vidros é relevante para a certificação energética do edifício e também para obter um nível de certificação superior ao que se conseguirá sem o respectivo certificado. O que a testemunha disse está em conformidade com aquilo que é a experiência comum relativa à necessidade de certificação enérgica e às consequências advenientes de se atingir um maior ou menor grau de eficiência energética, existindo legislação sobre tal matéria.
Também a testemunha explicou que «o problema do certificado de caixilharia tem a ver com o certificado energético» e que «neste momento é um documento que é obrigatório entregar quando se requer a licença de habitabilidade. Nós na Câmara além de outros documentos temos que entregar o certificado energético da casa em que diz o que é que a casa tem, qual é a classificação dela, qual é o tipo de paredes, tipo tal, e uma das coisas que tem-se que colocar é qual é o tipo de vidro e de caixilharia. Porque tem a ver com a, que são valores que vamos buscar ao certificado da caixilharia para meter no programa de cálculo que nos vai fazer as contas. Eu se tiver na caixilharia grau que é o máximo tenho um desempenho muito melhor do que uma caixilharia sem classificação. Porque ao não termos o certificado temos que considerar um modelo rasca».
Do depoimento desta testemunha resulta evidenciada a relevância tanto do certificado dos vidros como do certificado da caixilharia. Ambos são importantes para a certificação energética dos edifícios.
Só que os Autores, nas suas alegações, não invocam um único meio de prova susceptível de demonstrar que os referidos certificados ou a ficha técnica para desmontagem/montagem das janelas não foram emitidos e entregues.
O extracto do depoimento da testemunha não contém qualquer referência sobre essa matéria e não é indicado um meio de prova que o demonstre.
Como no relatório pericial o Sr. Perito declarou desconhecer se os certificados e a ficha técnica foram entregues ou não, tais factos não podem ser considerados provados, assim como os inerentes prejuízos.
Aliás, o Sr. Perito, pelas razões que apontou no relatório, considera que inexiste prejuízo emergente da falta de entrega de tais elementos, caso ele se tenha verificado.

Termos em que se julga improcedente a impugnação relativamente às alíneas q), r) e s) e t)-16.1, 16.2 e 16.3 dos factos não provados.
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2.2.2.14. Alínea t)–4 dos factos não provados
Este ponto da alínea t) tem o seguinte teor:
«4. Prejuízo relativo à substituição do armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, 1.99x1.13m: O armário não está feito conforme o orçamento, nem em relação aos materiais nem ao desenho fornecido - € 660,00».
No relatório pericial, o Sr. Perito estimou este prejuízo em € 720,00, acrescido de IVA, pelo que o valor deveria corresponder ao indicado.
Porém, dado que não foi impugnada a decisão que julgou procedente a excepção peremptória de caducidade relativamente à desconformidade dada como provada, que assim transitou em julgado, fica necessariamente prejudicada a apreciação da impugnação da decisão sobre este ponto de facto, o que se declara.
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2.2.2.15. Alínea t)–11 dos factos não provados
Este ponto da alínea t) tem o seguinte teor:
«11. Prejuízo relativo ao levantamento do soalho - € 100,00».

Conforme consta do ponto 9 dos factos assentes, «uma pequena área de soalho encontra-se descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso».
No relatório pericial, o Sr. Perito estimou este prejuízo em € 50,00, acrescido de IVA, pelo que o valor deve corresponder ao indicado.

Pelo exposto, decide-se eliminar a alínea t)-11 dos factos não provados e aditar o seguinte ponto aos factos provados:
24. A reparação do descolamento e levantamento do soalho, referido em 9, importa num custo de € 61,25 (sessenta e um euros e vinte e cinco cêntimos).
*

2.2.2.16. Alínea t)–12 dos factos não provados
Este ponto da alínea t) tem o seguinte teor:
«12. Prejuízo relativo ao eixo do puxador da porta corredora estar desgastado - € 180,00».
No ponto 10 dos factos assentes consta que «o puxador [da] porta corredora elevadora tem folga».
No relatório pericial considerou-se que a aludida reparação tem um custo de € 50,00, acrescido de IVA. Nenhuma razão substancial existe para discordar do valor preconizado para a supressão daquela anomalia.
Nesta conformidade, decide-se eliminar a alínea t)-12 dos factos não provados e aditar o seguinte ponto aos factos provados:
25. A reparação do puxador da porta corredora, referido em 10, importa num custo de € 61,25 (sessenta e um euros e vinte e cinco cêntimos).
*

Em consequência do decidido sobre a apelação sobre a matéria de facto, os factos provados são os seguintes:

1 - Os Autores são donos e legítimos proprietários do prédio urbano designado por “casa de rés-do-chão e andar”, sito na Rua do ..., nº …, em …, concelho de Barcelos, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos, sob o nº ....
2 - O referido prédio destina-se exclusivamente à habitação dos Autores.
3 – O Réu, a solicitação dos Autores, forneceu orçamento para obra de carpintaria e caixilharia na habitação dos Autores, que foi aceite por estes.
4 - A última fase da obra, em 2013, referiu-se à cozinha e acabamentos gerais.
5 - O Réu facturou os serviços e materiais fornecidos ao abrigo das facturas:
-Nº 08/280091, no valor de € 17.012,23;
-Nº 08/280098, no valor de € 23.713,17; e
-Nº CXB/4, no valor de 13.148,70, tudo perfazendo a quantia global de € 53.874,10.
6 - Os Autores pagaram a totalidade do valor reclamado pelo Réu.
7 – Em 02 de Fevereiro de 2016, os Autores enviaram uma missiva ao Réu, onde comunicavam o seguinte, que aqui se transcreve: “… defeitos/desconformidades de construção agora verificados…
1 - Armários da cozinha: o material aplicado na estrutura do interior dos armários da cozinha não está conforme o acordado, pois foi aplicado aglomerado e estava acordado ser madeira de castanho (contraplacado marítimo);
2 - Armário lavatório WC do R/C de 0.67x0.69m: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado ser madeira de castanho.
3 - Armário suspenso WC piso 1, 1.20x0.48m: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira de castanho;
4 - Armário tipo roupeiro do piso 1, 1.99x1.13m: o armário não está construído conforme o que acordamos, conforme o desenho fornecido e em madeira de castanho;
5 - Roupeiro do quarto principal, sem portas, de 2,50x4.00: o material aplicado no armário não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira carvalho;
6 - Roupeiros (3unidades) com portas lisas a toda a altura de 2,50x1,80: o material aplicado nos 3 armários não é conforme o que acordamos, foi aplicado aglomerado mas tínhamos acordado que seria madeira carvalho;
7 - Madeira das portas principais, portas interiores:
a) a madeira aplicada não é madeira de carvalho tal como foi acordado, foi aplicada madeira de castanho;
b) a madeira de castanho aplicada tem bicho, por falta de tratamento.
8 - Rodapé: os 56 m de rodapé faturados a mais não foram nem aprovados nem aplicados, o único rodapé que foi aplicado faz parte do soalho e das escadas.
9 – Área do soalho: a área do soalho aplicado é só de 53,20 m2 e não 60 m2 tal como foi faturado, foram faturados 7 m2 mais.
10 - Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar.
11 - Tipo do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz aplicado no soalho e nas escadas não está conforme o que acordamos, pois foi acordado que seria aplicado verniz poliuretano e, ao invés, foi aplicado verniz aquoso.
12 - Levantamento do soalho: o soalho está descolado e levantado no corredor à entrada do WC do 1º piso.
13 - Puxador porta corredora elevadora: o eixo do puxador está desgastado e tem muita folga.
14 - Isolamento das portas de entrada, porta de correr, vidraças e janelas: falta de isolamento entre o aro e a parede (em alguns vê-se o dia de um lado ao outro), nas vidraças, portas de entrada, porta de correr e janelas.
15 - Infiltrações de água nas janelas: 2 janelas do quarto principal e uma do sequeiro têm aparecido infiltrações de água.
16 - Falta de Argon nos vidros: os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não tem Argon inserido, ao contrário do que acordamos.
17- Certificado de vidros:
a) os documentos apresentados/identificados no relatório do perito Eng. V, não nos foram entregues,
b) os documentos apresentados no relatório do Eng. V, como sendo o certificado, não são válidos como tal,
c) os vidros maiores apresentados no relatório do perito Eng. V, não são os que foram aplicados na nossa obra,
d) os nossos nomes (donos da obra) não estão identificados nos documentos apresentados no relatório do perito Eng. V,,
e) o nome do empreiteiro aplicador (X) não está identificado nos documentos apresentados no relatório do perito Eng. V,,
f) os documentos apresentados no relatório do perito Eng. V, não estão ligados (não correspondem) entre eles, do dono da obra até fabricante dos vidros.
18 - Certificado relativo composição da caixilharia: falta de certificado da composição e rotura térmica da caixilharia completa (madeira/alumínio/vidros) das janelas, portas e vidraças.
19 - Ficha técnica de desmontagem/montagem: falta de ficha técnica para desmontagem/montagem das janelas para trocar vidros se necessário…
8 – O armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, com 1.99x1.13 m, não está feito conforme o desenho fornecido.
9 – Uma pequena área de soalho encontra-se descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso.
10 - O puxador da porta corredora elevadora tem folga.
11 – Uma janela no sequeiro apresenta sinais de infiltração de água.
12 - Os vidros das janelas, vidraças e porta de correr não têm gás árgon inserido.
13 – O armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso, com 1.99x1.13 m, foi entregue aos Autores em Fevereiro de 2013.
14 - Os Réus são casados entre si no regime da comunhão de adquiridos.
15 - É com o proveito da sua actividade profissional que o Réu marido acorre às despesas doméstica.
16 – A Ré esposa beneficia dos resultados da actividade profissional do marido, o que até se presume.
17. Foram facturados e pagos 60,00m2 de soalho, quando na realidade a área do soalho aplicada é de 56,81 m2.
18. A diferença entre o custo da área de soalho aplicada e o custo da área de soalho facturada pelo Réu e paga pelos Autores é de € 239,25, acrescido de IVA, ou seja, € 294,28 (duzentos e noventa e quatro euros e vinte e oito cêntimos).
19. Foi acordado que o verniz aplicado no soalho e nas escadas seria «verniz poliuretano 20% de brilho da marca Y» e veio a ser aplicado verniz aquoso.
20. Por o verniz aplicado não ser conforme o orçamentado, os Autores terão que remover o verniz aplicado e aplicar um verniz solvente, reparação que importa em € 876,00, acrescido de IVA, isto é, € 1.077,48 (mil e setenta e sete euros e quarenta e oito cêntimos).
21. Verifica-se falta de isolamento, entre o aro e a parede, num vão envidraçado da sala, onde não foi colocado silicone na parte interior, o que permite a passagem de luz proveniente do exterior.
22. O custo da reparação, consistente no fornecimento e colocação de silicone na parte em falta, importa em € 40,00 (quarenta euros), acrescido de IVA, ou seja, € 49,20 (quarenta e nove euros e vinte cêntimos).
23. Foi orçamentada e acordada a inserção de gás árgon nos vidros das janelas, vidraças e porta de correr.
24. A reparação do descolamento e levantamento do soalho, referido em 9, importa num custo de € 61,25 (sessenta e um euros e vinte e cinco cêntimos).
25. A reparação do puxador da porta corredora, referido em 10, importa num custo de € 61,25 (sessenta e um euros e vinte e cinco cêntimos).
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2.2.3. Da reapreciação de Direito
2.2.3.1. Do pedido principal

Os Autores pediram a condenação dos Réus a, num prazo de trinta dias, «reparar os defeitos/patologias existentes na obra de carpintaria e caixilharia realizada no imóvel», no prazo de 30 dias.
Na sentença, tendo-se reconhecido a existência de três deficiências na obra executada, condenou-se «o Réu D. A. a proceder, no prazo de 30 dias, contados do trânsito em julgado, à reparação – da pequena área de soalho que se encontra descolado e ligeiramente levantado à entrada da instalação sanitária do 1º piso; do puxador porta corredora elevadora que tem folga e da janela no sequeiro que apresenta sinais de infiltração de água».
Em consequência da parcial procedência da apelação sobre a matéria de facto, tendo resultado provada a existência de outros defeitos ou desconformidades na obra executada, de harmonia com o disposto nos artigos 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, e 1221º, nº 1, do Código Civil, os Réus estão obrigados à reparação ou eliminação desses defeitos, dentro do mesmo prazo de 30 dias que já havia sido fixado na sentença relativamente às demais anomalias, que é um prazo razoável e adequado à situação (nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003). Isto porque, nos termos do primeiro preceito citado, «em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição».
*

Os Réus invocaram na contestação tanto a caducidade do direito de denúncia (por ter decorrido o prazo para comunicação do dono da obra ao empreiteiro dos defeitos da obra) como do direito de acção (resultante do decurso do prazo para o exercício judicial dos direitos que legalmente são conferidos ao dono da obra).
Nestes autos já foi proferido acórdão sobre a não verificação do prazo de caducidade do direito de acção, previsto no artigo 5º-A, nº 3, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, onde se estabelece que os direitos do dono da obra caducam decorridos três anos a partir da denúncia no caso de bem imóvel. Considerou-se então que «tendo os Autores efectuado a denúncia dos alegados defeitos da obra em 02.02.2016, quando intentaram a acção, em 11.09.2017, ainda não tinha decorrido o prazo de três anos de que dispunham para exercer os seus direitos».
Poder-se-ia colocar a questão de saber se ocorre a caducidade do direito dos Autores relativamente às desconformidades ora dadas como provadas.
Porém, observa-se que no artigo 39º, complementado pelo exposto nos artigos 45º e 46º, todos da contestação, os Réus apenas invocaram a excepção peremptória de caducidade relativamente aos «defeitos descritos nas alíneas j), m), n) e p) do artigo 12.º da p.i.», ou seja, os seguintes:
«j) Qualidade do verniz aplicado no soalho e nas escadas: o verniz apresenta um desgaste prematuro e tem áreas a descascar;
(…)
m) Levantamento do soalho: o soalho está descolado e levantado no corredor à entrada do WC do 1º piso;
n) Puxador porta corredora elevadora: o eixo do puxador está desgastado e tem muita folga;
(…)
p) Infiltrações de água nas janelas: Em 2 janelas do quarto principal e uma do sequeiro têm aparecido infiltrações de água».
Ora, nenhum desses defeitos corresponde aos que agora foram dados como provados, em face da parcial procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Por isso, não sendo a caducidade de conhecimento oficioso, não pode esta Relação dela conhecer.
*

Alegaram os Réus nos artigos 25º a 33º da sua contestação que os Autores aceitaram sem reservas as obras, pelo que, de harmonia com o disposto nos artigos 1219º, nº 1, do Código Civil e 2º, nº 3, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, constituiria motivo para absolvição do pedido – caso de irresponsabilidade do empreiteiro. Também nas contra-alegações invocaram «que, no caso em apreço, os AA. acompanharam de perto a execução dos trabalhos e sem sombra de dúvida que os aceitaram, sem quaisquer reservas ou reclamações». Reiteraram e reforçaram a argumentação no requerimento que apresentaram sobre as questões cujo conhecimento tinha ficado prejudicado na decisão recorrida, alegando que os defeitos foram objecto de aceitação pelos Autores, «dado que em causa sempre estariam “defeitos” ou “desconformidades” aparentes, que os AA. aceitaram, sem quaisquer reservas, nos diversos momentos temporais em que o R. Marido procedeu à entrega das obras que lhe foram encomendadas, o que ocorreu em Janeiro (caixilharias) e Junho (madeiramento interior – soalhos, escadas, portadas e roupeiros) de 2012 e Fevereiro (cozinha, rodapé, armários de casa de banho e roupeiro) de 2013». Argumentaram ainda que a «aceitação (…) decorre não somente da circunstância de nunca ter sido apresentada qualquer reclamação e de, à excepção do que sucedeu com a última das empreitadas realizadas, os trabalhos realizados pelo R. Marido terem sido devida e integralmente pagos, após a sua recepção».

Apreciando:
O Tribunal a quo não conheceu desta questão na sentença e os Réus não reagiram a essa omissão na parte não prejudicada pela decisão da matéria de facto.
Por outro lado, no mais, não consta da factualidade apurada qualquer facto que suporte a afirmação feita sobre a aceitação das obras, a inexistência de reservas e o conhecimento dos defeitos por parte dos ora Autores. Nem sequer consta da matéria de facto a data em que a obra (ou melhor, cada uma das três obras, pois estão em causa três orçamentos e outros tantos contratos de empreitada) foi entregue pelo Réu aos Autores (14). Apenas se fez constar, sob o nº 4, que «a última fase da obra, em 2013, referiu-se à cozinha e acabamentos gerais», mas isso não esclarece nem a data da entrega nem se houve ou não aceitação e, na afirmativa, se foi incondicional. Aliás, esse facto também não esclarece sequer quando, em concreto, ocorreu a conclusão da obra, sendo que a circunstância de ser concluída não equivale necessariamente à demonstração da sua entrega ao dono da obra.
Acresce que, segundo Pires de Lima e Antunes Varela (15), a aceitação é um “acto de vontade” e, acrescentamos nós, traduz-se numa postura do dono da obra da qual resulta que a obra foi realizada a seu contento.
A aceitação não goza de autonomia conceitual, mas não se confunde com a entrega material da obra; o simples facto de a obra ter sido entregue ao dono da obra não significa que tenha havido aceitação. Daí que da simples entrega material da obra se não pode concluir ter esta sido concluída sem defeito, porquanto ela não representa uma declaração de execução, conforme ao contrato, no que respeita à inexistência de vícios. Mais: o próprio pagamento do preço, salvo disposição contratual em contrário, não corresponde a uma aceitação tácita da obra.
Portanto, no caso dos autos, independentemente de quaisquer outras considerações, carecia de demonstração a existência do acto de aceitação (enquanto pressuposto da alegada exclusão da responsabilidade), seja ele expresso ou tácito (16), sendo que nas empreitadas de consumo esse acto não se presume nos termos do nº 5 do artigo 1218º do Código Civil, por tal preceito não ser aplicável (17).
Os Réus invocam na contestação a troca de comunicações por correio electrónico, mas não é possível extrair delas qualquer conclusão sobre a aceitação da obra e muito menos sobre a inexistência de reservas. Pelo contrário, resulta do teor desses elementos que logo em 13 de Fevereiro de 2013 já era patente a existência de um conflito entre as partes no que respeita à obra, o que contraria a tese de que ocorreu aceitação e de forma incondicional.
Mesmo que estivessem demonstrados factos concretos sobre a entrega e a aceitação, designadamente sobre as datas em que ocorreram, sempre teríamos que distinguir entre defeitos aparentes e defeitos ocultos. Os primeiros são reconhecíveis pelo dono da obra se fizer uso da diligência normal do homem médio; os segundos são desconhecidos do dono da obra e não é razoável exigir que os conheça por não serem detectáveis por uma pessoa de normal diligência.
O artigo 1219º do Código Civil presume que são conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou não havido verificação da obra, e equipara estes defeitos àqueles de que o dono da obra tem conhecimento ao tempo da aceitação, para efeitos da exclusão da responsabilidade do empreiteiro.
Porém, desde logo, o regime aplicável à empreitada de consumo não impõe ao consumidor o dever de verificar a obra. Acresce que se estabelece no artigo 2º, nº 3, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, que «não se considera existir falta de conformidade, na acepção do presente artigo, se, no momento em que for celebrado o contrato, o consumidor tiver conhecimento dessa falta de conformidade ou não puder razoavelmente ignorá-la ou se esta decorrer dos materiais fornecidos pelo consumidor». Este preceito não é equivalente ao artigo 1219º do Código Civil e o regime nele estabelecido é substancialmente diferente do vigente para as empreitadas que não são de consumo. Para além de formalmente se reportar à data da celebração do contrato e não à data da entrega do bem ou obra, nenhuma presunção legal estabelece com base na aceitação da obra, seja no momento da entrega ou em momento posterior, sendo certo que os Réus estruturaram, na contestação, a alegação da exclusão da responsabilidade do empreiteiro na aceitação da obra e não propriamente na aceitação das desconformidades. Mais: no Decreto-Lei nº 67/2003 nenhuma presunção é extraída da entrega do bem. Estabelece, isso sim, no nº 1 do seu artigo 3º, que o empreiteiro responde perante o consumidor dono da obra «por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue».
Ainda que considerássemos existir uma presunção de conhecimento dos defeitos aparentes e que da aceitação da obra sem reservas decorreria a perda do direito do dono da obra relativamente àqueles defeitos, sempre seria de concluir que tanto a falta de aplicação de gás árgon como o diferente verniz aplicado, em desconformidade com o contratado, são defeitos ocultos, pois não são detectáveis por uma pessoa de normal diligência através da simples observação dos vidros ou do soalho.
Quanto à área do soalho, além de uma parte do soalho estar sob os roupeiros (4,05 m2) e não ser visível, o email de 9 de Junho de 2013, que o Réu remeteu ao Autor, evidencia que em Fevereiro de 2013 já estava colocada a questão da área (medição) do soalho aplicado, como resulta da seguinte passagem: «E já agora também, mediste o chão em fevereiro, mas ainda estou à espera do resultado das medidas». Por isso, dificilmente se pode considerar ter existido a aceitação dessa concreta desconformidade (a área de soalho, considerando nesta a parte ocupada pelos roupeiros, é de 56,81 m2, mas os Autores pagaram o preço correspondente a 60 m2).
A única desconformidade susceptível de ser qualificada como aparente, mas mesmo assim com algumas dúvidas (18), é a da falta de isolamento numa parte do vão envidraçado da sala (falta de aplicação de silicone). Apesar disso, igualmente não estão demonstrados factos-base que permitam suportar a alegada aceitação desta desconformidade (e se não está demonstrada a aceitação global das obras, é muito pouco provável que o dono da obra se dispusesse a fazer aceitações parciais, designadamente de partes de obra com defeitos). Acresce que não se pode confundir aceitação da obra com aceitação de concretos defeitos da obra, uma vez que são realidades diferentes, embora entre as mesmas exista uma certa relação; dificilmente se concebe que não se verificando a aceitação genérica da obra possa considerar-se existir a aceitação de defeitos dessa mesma obra mediante uma declaração tácita.
Todos os demais defeitos dados como provados são supervenientes, pelo que nunca estariam abrangidos pela alegada – mas não demonstrada – aceitação.
Em todo o caso, ainda que assim não se entendesse, conforme se refere no acórdão da Relação de Coimbra de 06.12.2011, proferido no processo 447/09.7TBVIS.C1 (19), ao abordar a questão da exclusão da responsabilidade do empreiteiro pelos defeitos existentes na obra, como consequência da sua aceitação pelo dono da obra, «tal exclusão legal de responsabilidade não é aplicável nas empreitadas de consumo. O art.º 1219º, n.º 1 do C. Civil consagra um caso de exclusão legal da res­ponsabilidade do empreiteiro, relativamente aos defeitos conhecidos pelo dono da obra se este a aceitou sem reservas. O legislador presumiu de forma absoluta que o dono da obra que a aceita, conhecendo os seus defeitos, sem os denunciar nesse acto, renuncia à responsabilização do empreiteiro pelo cumprimento defeituoso. Mas o estabelecimento desta presunção absoluta não pode ser aplicado nas empreitadas de consumo pois contraria o regime especial imperativo do DL 67/2003 e da Lei de Defesa do Consumidor (L.D.C.). Na verdade, o art.º 10º, n.º 2 do DL 67/2003 comina com a nulidade os pactos excluidores ou limitativos do exercício dos direitos do dono da obra-consumidor celebrados antes da denúncia dos defeitos, o que contraria que o acto de aceitação da obra sem denúncia dos defeitos verificados possa determinar a exclusão da responsabilidade do empreiteiro. Se não se reconhece relevância à renúncia expressa aos direitos do dono da obra consumidor pela existência de defeitos antes da denúncia destes, também não se pode relevar um acto tácito revelador dessa renúncia ocorrido antes desse momento.
Não é, pois, aplicável às empreitadas de consumo o disposto no art.º 1219º, nº 1 do C. Civil e, em consequência, perde interesse o estabelecimento da presunção relativa do art.º 1219º, n.º 2 do C. Civil – presunção de conhecimento dos defeitos aparen­tes».

Em suma: numa situação como a dos autos não se presume o conhecimento dos defeitos aparentes, uma vez que esta presunção se encontra estabelecida com vista à exclusão da responsabilidade do empreiteiro em resultado da aceitação da obra com defeitos conhecidos, a qual não tem aplicação nos contratos de empreitada de consumo (20).
Pelas razões expostas, não se pode considerar verificada a exclusão da responsabilidade do empreiteiro com o aludido fundamento.
*

2.2.3.2. Do pedido de condenação no pagamento do valor correspondente às reparações necessárias à eliminação dos vícios ou desconformidades

Os Autores formularam na petição inicial, após o pedido principal de condenação dos Réus na reparação dos defeitos/patologias existentes na obra, um outro pedido para o caso de os Réus não procederem à realização das obras de reparação no prazo de 30 dias. Tal pedido consiste na condenação dos Réus a «pagar aos AA. o valor correspondente ao valor dos danos sofridos, de € 20.130,77».
O Tribunal recorrido, socorrendo-se do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14.02.2019, que transcreveu, concluiu que «seguindo o entendimento supra transcrito e por aplicável, pela mesma ordem de razões, não poderá proceder o pedido alternativo de pagamento do valor dos danos». No citado acórdão considerou-se que a pretensão condenatória de exigir do empreiteiro o pagamento das despesas necessárias à reparação dos defeitos só faz sentido após a declaração de resolução do contrato da empreitada e que «a improcedência desta pretensão não preclude o direito dos recorrentes a obter a reparação e/ou eliminação dos defeitos da obra, porquanto, a não ser efetuada a prestação pelo empreiteiro, sempre aqueles poderão intentar contra ele execução para prestação de facto».
Entendem os Recorrentes que se justifica «a condenação dos RR. em alternativa à reparação, no pagamento da quantia necessária para realizar essa reparação, e que no caso concreto corresponde aos montantes apurados nos factos que devem passar a ser considerados por provados».
Argumentam na conclusão AA) do seu recurso que «Como decorre do artº 4º do D.L. 67/2003, em caso de falta de conformidade do bem com o contrato o consumidor tem direito à reposição da conformidade sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato, podendo qualquer um desses direitos ser exercido pelo consumidor».

Tal como se qualificou anteriormente, nos autos está em causa um contrato de empreitada de consumo, que é um subtipo do contrato de empreitada. É-lhe aplicável o regime do direito do consumo (21).
As relações de consumo, no domínio do contrato de empreitada, mostram-se reguladas pela Lei de Defesa dos Consumidores (Lei nº 24/96, de 31 de Julho) e pelo Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril.
O artigo 1º-A, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, determina que o seu regime «é aplicável aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores», e o seu artigo 1º-A, nº 2, estende a aplicação do respectivo regime, «com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada». O diploma aplica-se a qualquer bem imóvel ou móvel corpóreo, tal como resulta do artigo 1º-B, al. b), aditado pelo Decreto-Lei nº 84/2008, de 21 de Maio.
Nos termos do artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, «em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato».

São quatro os direitos conferidos ao consumidor:

a) Reparação do bem de consumo (“reposição do bem de consumo em conformidade com o contrato”);
b) Substituição do bem (22);
c) Redução do preço (23);
d) Resolução do contrato.

Sobre o exercício desses direitos releva o artigo 4º, nº 5, do mencionado Decreto-Lei 67/2003, de 8 de Abril, onde se dispõe que «o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais».
Significa isto que não existe uma ordem pré-estabelecida de exercício ou, doutro modo, uma relação de hierarquia entre os direitos, que são independentes uns dos outros, e que é ao consumidor que cabe escolher qual deles exerce, tendo apenas como limites a impossibilidade de exercício (24) e o abuso do direito (respeito pelos princípios da boa-fé, dos bons costumes e da finalidade económico social do direito escolhido).
Os Recorrentes defendem que o segundo pedido que deduziram na petição inicial é um pedido alternativo e que, por isso, deveria ter sido julgado procedente relativamente aos danos sofridos.
Dispõe o artigo 553º do CPC que «é permitido fazer pedidos alternativos, com relação a direitos que por sua natureza ou origem sejam alternativos, ou que possam resolver-se em alternativa».

Em nosso entender, os direitos conferidos pelo nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, são alternativos na medida em que o consumidor pode exercer qualquer deles sem observar qualquer ordem de precedência ou prioridade. Se o credor tem a faculdade de escolher uma de quatro prestações, que são entre si disjuntivas, temos que tais direitos são alternativos: é a lei que lhe atribui a possibilidade de optar por uma das várias soluções que prevê para o caso de falta de conformidade do bem com o contrato. É uma escolha entre direitos que cabe ao credor fazer. Mas se o credor não quiser fazer essa escolha logo na petição inicial, pode manter a indeterminação, deduzindo um pedido alternativo ao primeiro que deduziu.
Sucede que o segundo pedido deduzido pelos Autores não corresponde ao exercício de qualquer dos direitos referidos no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril: não é a reparação ou a substituição do bem, nem é a redução do preço ou a resolução do contrato. Em concreto, no segundo pedido, não se pretende que o empreiteiro proceda à reparação (nem se pede a redução do preço, que sempre teria de ser fundamentada e peticionada enquanto tal (25)), mas sim que pague o valor correspondente a essa reparação e esse direito não consta do nº 1 do artigo 4º do diploma que vimos citando.
Estando em causa uma empreitada de consumo, é ainda aplicável o disposto no artigo 12º, nº 1, da Lei de Defesa do Consumidor (Lei nº 24/96, de 31 de Julho), segundo o qual «o consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos».
Consagra esta disposição um direito de indemnização do consumidor pelas desconformidades do bem, serviço ou obra em termos amplos e não limitados, ou seja, tal direito (dependendo do que em concreto for peticionado na acção em que é exercido) não é legalmente configurado apenas como subsidiário, residual ou complementar dos direitos de reparação, substituição, redução do preço ou de resolução do contrato. Pode ser exercido de forma alternativa ao direito de reparação consagrado no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril.
Convém recordar que na redacção original do artigo 12º da LDC existia um nº 4 («Sem prejuízo do disposto no número anterior, o consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos») que se articulava com o nº 1, onde se estabeleciam os direitos conferidos ao consumidor de exigir «a reparação da coisa, a sua substituição, a redução do preço ou a resolução do contrato». A actual redacção foi introduzida pelo Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, deixando de haver qualquer referência aos direitos do artigo 4º, nº 1, deste diploma.
Para além da apontada circunstância formal, não existe norma expressa a estabelecer qualquer relação, de dependência ou de complementaridade, entre o exercício do direito à indemnização e o exercício dos direitos previstos no Decreto-Lei nº 67/2003, para fazer face às desconformidades do bem, serviço ou obra. Para se poder considerar que existia uma restrição ao seu exercício, que dependia da articulação com os direitos previstos naquele diploma, teria de existir uma disposição legal da qual, directa ou indirectamente, se extraísse tal imposição e ela não existe.
O direito à indemnização, quanto às empreitadas de consumo, escapa assim às regras de articulação dos direitos conferidos ao dono da obra tanto no Decreto-Lei nº 67/2003 (artigo 4º, nº 1) como no Código Civil (artigos 1221º a 1223º), pelo que pode ser livremente exercido pelo dono da obra com a qualidade de consumidor, desde que sejam observadas as exigências da boa-fé, dos bons costumes e da sua finalidade sócio-económica, ou seja, desde que sejam respeitados os limites impostos pela figura geral do abuso do direito – artigo 334º do Código Civil (26). «Desde que as circunstâncias em que este direito de indemnização é exercido não revelem uma ofensa àqueles princípios, pode o dono da obra utilizá-lo sem que primeiro tenha esgotado os outros meios de satisfazer os seus interesses» (27).
O artigo 12º, nº 1, da LDC pretende efectivar uma responsabilidade contratual, concretamente a indemnização pelo interesse contratual positivo, sendo ressarcíveis quer os danos patrimoniais quer os danos não patrimoniais. Tratando-se de responsabilidade contratual, nos termos do artigo 799º do Código Civil, a culpa presume-se, pelo que o consumidor tem de provar apenas a desconformidade, o dano e o nexo de causalidade. Os danos não patrimoniais não estão abrangidos pelo regime do Decreto-Lei nº 67/2003, pelo que o exercício do direito à sua compensação em caso algum poderia carecer de qualquer espécie de articulação com o disposto naquele diploma.
Por outro lado, no que respeita aos danos patrimoniais, a sobreposição de pretensões ou a sua incompatibilidade é resolvida de harmonia com as regras gerais.
O que releva é apenas a existência de um dano na esfera jurídica do consumidor e se o seu ressarcimento não foi obtido – ou não está a ser peticionado em juízo de forma cumulativa – através dos remédios previstos no regime aplicável aos contratos de consumo.

Voltando ao caso dos autos, estando os Autores confrontados com vícios e desconformidades da empreitada, podiam exercer contra os Réus, em regime de alternatividade, o direito à reparação e o direito de indemnização correspondente ao custo da reparação. Este último tutela um interesse legítimo e, sendo exercido em alternativa, não se verifica qualquer espécie de sobreposição ou incompatibilidade com o exercício do direito à reparação dos defeitos da obra.
Neste enquadramento, assiste razão aos Recorrentes, devendo os Réus ser condenados, em alternativa à reparação dos defeitos no prazo de 30 dias, no pagamento aos Autores da quantia correspondente ao custo da reparação.

Sucede que não está determinado qual o valor da reparação em que importa a inserção de gás árgon nos vidros das janelas, vidraças e porta de correr (ponto 23), bem como a eliminação das infiltrações de água na janela do sequeiro (ponto 11).
Não resultam dos factos provados elementos que nos permitam fixar o valor dessa reparação, pelo que a situação dos autos subsume-se ao disposto no artigo 609º, nº 2, do CPC: embora tenha sido apurada a existência do direito e da correspondente obrigação, os elementos de facto revelam-se insuficientes para a quantificação, mesmo com recurso à equidade. Por isso, deve ser proferida uma condenação genérica, condenando os Réus no que vier a liquidar-se sobre o valor do custo com a inserção de gás árgon nos vidros das janelas, vidraças e porta de correr e a reparação das infiltrações de água na janela do sequeiro.
A parte já liquidada dos danos ascende a € 1.543,46 (294,28 + 1.077,48 + 49,20 + 61,25 + 61,25).
Termos em que procede parcialmente este pedido.
*

2.2.3.2. Do 3º pedido
Na petição inicial, sob a alínea c), os Autores deduziram o seguinte pedido:
«Ou ainda,
c) Pagar aos AA. o valor correspondente ao valor de indemnização pelo interesse contratual positivo, decorrentes do cumprimento defeituoso, que se computa em € 20.130,77».
Para fundamentar tal pedido alegaram o seguinte:
«44º
Como resulta da exposição fáctica, supra exposta, os bens de que ora se reclama a sua desconformidade foram, no que respeita às suas características e qualidades, pormenorizadamente discutidos pelas partes,
45º
Não tendo o R. não cumprido o acordado.
46º
Assiste, pois, aos AA. o direito a serem indemnizados pelos danos sofridos em consequência do cumprimento defeituoso do contrato de empreitada por parte do empreiteiro, cujo fundamento se encontra nos artigos 799º do C. Civil».

Na motivação da apelação os Recorrentes argumentam que pretenderam, «como forma de acautelar à verificação do decurso do prazo de caducidade previsto naquele regime, a apreciação do direito indemnizatório dos AA. por via do interesse contratual positivo».

A pertinência da apontada questão cinge-se à desconformidade relativa ao «armário tipo roupeiro da casa de banho do 1º piso», pois só quanto a esta o Tribunal a quo considerou procedente a excepção peremptória de caducidade «nos termos do disposto no artigo 5º - A, n.º 1 do DL n.º 67/2003 de 08 de abril». Apesar de a questão ter uma relevância muito restrita, cumpre apreciá-la.
Antes de mais, recordemos que o interesse contratual positivo visa colocar o lesado na situação em que estaria caso o contrato tivesse sido cumprido. Já o interesse contratual negativo visa colocar o lesado na situação em que estaria se o contrato não tivesse sido celebrado.
No âmbito de uma empreitada, o consumidor, enquanto dono da obra, tem o direito de ser indemnizado nos termos gerais, ou seja, nos termos dos artigos 562º e seguintes do Código Civil, independentemente do exercício dos direitos previstos no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril. Pode, portanto, cumular um pedido relativo ao exercício de um daqueles direitos com o pedido de indemnização. Não pode é contemplar no pedido de indemnização o ressarcimento de danos que são objecto de um outro pedido deduzido em simultâneo e em cumulação.
No caso dos autos, os Autores deduziram o terceiro pedido de forma alternativa aos dois outros pedidos, o que é bem patente na utilização da expressão «Ou ainda» (em contraposição com a expressão que antecede a dedução do 4º pedido, de natureza subsidiária: «Ou ainda, subsidiariamente»).
Um tal direito fundado no artigo 12º, nº 1, da Lei de Defesa do Consumidor (ou no artigo 1223º do Código Civil), quando se destine a precaver a improcedência de outro pedido, pode ser exercido na mesma acção (independentemente de qualquer consideração sobre o seu mérito), mas em regime de subsidiariedade e não de alternatividade.
Porém, parece resultar do exposto na petição inicial e, sobretudo, no recurso que era sua intenção deduzir o 3º pedido de forma subsidiária, na medida da improcedência dos demais pedidos eventualmente emergente da declaração de caducidade dos respectivos pedidos (28).

Questão diferente consiste em saber se, em termos substanciais, pode ser deduzido um pedido de indemnização destinado a efectivar formalmente o interesse contratual positivo, ou seja, visando colocar o lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido, no caso de já terem decorrido os prazos de caducidade para o exercício dos direitos do consumidor previstos no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, quando o demandante pretenda obter exactamente o mesmo que alcançaria com o exercício de um desses direitos. Está afastada da nossa cogitação a hipótese de a indemnização visar compensar outros danos, diferentes dos que são ressarcidos com o exercício dos quatro tradicionais direitos do consumidor, emergentes do não cumprimento, caso em que nenhuma dúvida existe sobre a sua admissibilidade.
Como é bom de ver, trata-se de um expediente destinado a iludir o regime da caducidade, afastando a sua aplicabilidade. Não tendo os direitos sido exercidos nos prazos previstos, para contornar o regime da caducidade e no fundo pedir o ressarcimento do mesmo dano, recorre-se de forma aparente a um outro instituto.
Sucede que, como salienta João Cura Mariano (29), referindo-se ao direito de indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes da realização de obras defeituosas, nas relações de consumo, previsto no artigo 12º, nº 1, da LDC, «a apesar de se encontrar autonomamente previsto na LDC, como direito colocado à disposição do dona da obra consumidor, o seu exercício não deixa de estar sujeito aos requisitos gerais do C.C. [Código Civil] para as consequências da realização duma obra defeituosa, nomeadamente a exigência de culpa do empreiteiro, a necessidade de denúncia atempada dos defeitos (art.º 1220º do C.C.) e a aplicação dos prazos de caducidade dos artigos 1224º e 1225º do C.C.» (30).
O consumidor dono da obra pode escolher e exercer autonomamente a acção de responsabilidade civil pelo interesse contratual positivo decorrente de cumprimento defeituoso, presumidamente imputável ao devedor (artigos 798º, 799º e 801º, nº 1, do Código Civil), sem fazer valer outros remédios, ou seja, sem pedir a reparação da obra, a substituição, a redução do preço ou a resolução do contrato.
Porém, no nosso entendimento e salvo melhor opinião, se os prejuízos a indemnizar forem aqueles cujo ressarcimento se obteria com o exercício de um dos quatro apontados remédios, não pode deixar de obedecer aos prazos para o exercício dos direitos conferidos ao consumidor. Seria bizarro, por se distinguir onde nada há que justifique a distinção, que os prazos de caducidade para o consumidor exercer os seus direitos fossem afastados quando está em causa a satisfação do mesmo interesse do credor, subtraindo a sua aplicação apenas por o seu exercício ser efectivado através da acção de indemnização pela violação do interesse contratual positivo, relativamente à qual valeria o prazo prescricional geral de 20 anos (artigo 309º do Código Civil). Por exemplo, seria incongruente que o consumidor dono da obra defeituosa, em vez de peticionar a reparação, recorresse a uma sucedânea acção de indemnização para obter a condenação do empreiteiro no pagamento do valor correspondente à reparação necessária para eliminar os defeitos da obra e não estivesse sujeito aos prazos de caducidade que vigoram relativamente ao exercício do direito à reparação. Em ambas as situações os resultados seriam equivalentes: conseguir suprir, através de reparação, a desconformidade da obra, só que num caso a reparação seria feita pelo empreiteiro e no outro por um terceiro contratado pelo dono da obra com o valor obtido na acção de indemnização.
Parafraseando o acórdão de 07.05.2009 do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo 09B0057 (31), que versava sobre uma venda de coisa defeituosa, ainda que só a indemnização por violação do interesse contratual positivo seja pedida, ela não deixa de se fundar na falta de conformidade da obra com o contrato, e não deixa de ser, em caso algum, o “sucedâneo” com o qual se pretende assegurar a prestação pontual que o defeito não deixou cumprir. Daí que a acção respectiva não possa deixar de ser tratada da mesma forma que a acção definida para o “essencial” do remédio do defeito: a acção de reparação, substituição, redução do preço ou resolução do contrato. De outro modo o que é “essencial” estaria sujeito a um prazo curto e o que é “sucedâneo” estaria sujeito a um outro (longo) prazo, o da prescrição, do artigo 309º do Código Civil.
Acresce que sendo efectivamente exercido algum dos direitos do consumidor dono da obra, a indemnização prevista no artigo 12º, nº 1, da Lei de Defesa do Consumidor (ou no artigo 1223º do Código Civil), pedida na mesma acção (em cumulação) ou em acção autónoma, destinar-se-á necessariamente a ressarcir os danos que não possam ser reparados com os mecanismos previstos no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril.
Em todo o caso, não deixa de se enfatizar que quando se pede uma indemnização por um dano cujo ressarcimento se alcançava com o exercício dos direitos enunciados no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 67/2003 está-se, em termos substanciais ou materiais, a exercer o mesmo direito subjectivo e a obter a satisfação do mesmo interesse. E se esse direito caducou – e tal foi declarado – não pode ser exercido, seja qual for a roupagem que se lhe dê para dissimular o seu exercício. Há que considerar a caducidade desse direito (32).
Também não se pode ignorar que as soluções do ordenamento têm de ser coerentes e conciliáveis entre si. O sistema jurídico não pode ser visto como um conjunto de medidas segmentadas, sem nexo ou inter-relação entre si. A procura dessa coerência intrínseca das medidas legislativas conduziu a que nos contratos de consumo a matéria do cumprimento defeituoso seja objecto de regulamentação específica (bem patente nas soluções introduzidas pelo Decreto-Lei nº 84/2008), em caso de falta de conformidade do bem ou serviço com o contrato ou, especificamente, quando esteja em causa o fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos. Essa regulamentação estende-se aos prazos para o exercício dos direitos e aos prejuízos acautelados com as formas específicas de indemnizar, em consequência do cumprimento defeituoso. Sendo exercido um desses direitos, só se proliferarem outros danos na esfera jurídica do consumidor é que este pode pedir a respectiva indemnização, a qual pode então ser cumulada com o exercício dos demais direitos.
Por outro lado, o fundamento da caducidade radica em razões de segurança jurídica e rápida estabilização do Direito aplicável. É por isso, por exemplo, que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine (artigo 328º do Código Civil). Que segurança jurídica existiria se quase 20 anos depois de adquirido o bem (ou prestado o serviço ou realizada a obra), um consumidor estivesse a reclamar uma indemnização por um defeito desse bem que verificou existir no momento da aquisição? Isso passaria a ser frequente se considerasse-mos admissível a tese dos Autores, sobre a acção de indemnização, seja qual for o seu objecto, não estar sujeita a qualquer prazo de caducidade, mas apenas ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos, previsto no artigo 309º do Código Civil.
A forma correcta de ver o problema é esta: não pode o consumidor formular um pedido indemnizatório sob a aparência de estar a exercer um outro direito, para realizar o interesse contratual positivo, quando se trata de obter a satisfação da mesma pretensão material que obteria com o exercício do direito à reparação, que no fundo é uma das formas de tutelar precisamente aquele interesse. Se decorreu o prazo de caducidade, o direito indemnizatório não pode ser exercido como meio de precaver a improcedência do pedido (com aquele fundamento) que se destinava a obter a satisfação da mesma pretensão material.
Como é óbvio, nenhuma segurança jurídica existiria se um pedido, baseado num concreto direito subjectivo, fosse julgado improcedente por ter sido declarada a excepção de caducidade e o demandante pudesse exercer a mesma pretensão material numa outra acção. Pior ainda seria se isso fosse admitido na mesma acção, através da formulação de pedido para ser considerado «como forma de acautelar à verificação do decurso do prazo de caducidade previsto» no regime dos contratos de consumo.

No caso dos autos, em todos os quatro pedidos se pretende a satisfação do mesmo interesse: a reparação da obra no primeiro pedido, alegando-se que o valor da reposição da sua conformidade importaria em € 20.130,77, enquanto nos restantes três pedidos se pede a condenação dos Réus no pagamento aos Autores exactamente da quantia de € 20.130,77, que é precisamente o alegado custo da reparação. O segundo pedido é um sucedâneo do primeiro. Também o terceiro pedido é um sucedâneo, que visa obter a mesma quantia de € 20.130,77. Com o quarto pedido pretendem os Autores obter a mesma quantia, mas a título de enriquecimento sem causa, que é um instituto jurídico por natureza subsidiário, a que só é possível recorrer se a lei não facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído (artigo 470º do Código Civil), figura essa que no caso não tem qualquer cabimento.
Embora os Autores tenham argumentado nos autos que se trata de «indemnização dos prejuízos colaterais, provocados pelos defeitos da obra», nenhum dano colateral foi alegado; todos os pedidos se alicerçam na mesma factualidade e se destinam a satisfazer o mesmo interesse.
Por isso, não há rigorosamente qualquer motivo para subtrair os direitos exercidos às regras da caducidade.
Finalmente, mesmo que se interprete o terceiro pedido como tendo natureza subsidiária, «como forma de acautelar à verificação do decurso do prazo de caducidade», não existe qualquer direito a indemnização por ter decorrido o prazo de caducidade para o exercício do direito à reparação das desconformidades. Não tem qualquer justificação atribuir uma indemnização pelo interesse contratual positivo, correspondente ao valor das obras necessárias à reparação de desconformidades relativamente às quais já foi declarada a caducidade do direito por ter decorrido o respectivo prazo de denúncia.
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2.2.3.4. Do 4º pedido
Os Autores deduziram pedido subsidiário de condenação dos Réus a «[p]agar aos AA. a quantia de € 20.130,77, decorrente do enriquecimento tido à custa dos RR. e sem qualquer causa que o justifique».
Os Recorrentes, em vez de impugnarem o decidido pelo Tribunal recorrido sobre este pedido, invocaram a nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto a tal pedido.
Sucede que, conforme já se decidiu em 2.2.1., tal pedido foi apreciado e julgado improcedente.
Como os Autores não formularam qualquer conclusão a impugnar a decisão do Tribunal recorrido, nem desenvolveram qualquer argumento demonstrativo do eventual erro de julgamento em matéria de direito, designadamente na parte em que se considerou que «não resultaram demonstrados quaisquer dos pressupostos aplicáveis ao regime do enriquecimento sem causa previsto no artigo 473º, do Código Civil» (33), fundamentação que se afigura inteiramente justificada, inexiste qualquer questão susceptível de decisão sobre tal matéria.
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2.3. Sumário
1 – Os direitos conferidos ao consumidor no artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, são independentes uns dos outros e podem ser exercidos sem observar qualquer ordem de precedência entre eles.
2 – No âmbito das relações de consumo podem ser exercidos em regime de alternatividade o direito à reparação das desconformidades do bem, serviço ou obra e o direito de indemnização correspondente ao custo da reparação.
3 – O consumidor pode escolher e exercer autonomamente a acção de responsabilidade civil pelo interesse contratual positivo decorrente de cumprimento defeituoso, sem fazer valer directamente qualquer dos direitos previstos no artigo 4º do Decreto-Lei nº 67/2003.
4 – O consumidor não pode contemplar no pedido de indemnização o ressarcimento de danos que são objecto de um outro pedido deduzido em cumulação.
5 – Deve ser julgado improcedente o pedido de indemnização deduzido com a finalidade exclusiva de acautelar a possibilidade de ser declarada a caducidade do direito à reparação do bem, obra ou serviço, ou seja, visando iludir o regime da caducidade, afastando a sua aplicabilidade, quando está em causa a satisfação da mesma pretensão material.
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III – DECISÃO

Assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se parcialmente a sentença e, em consequência, decide-se:
a) Além do já constante da alínea b) do dispositivo da sentença, que se mantém, condenar os Réus na realização das reparações necessárias à eliminação dos defeitos aludidos nos pontos 17, 19, 21 e 23 dos factos provados no prazo de 30 dias ou, em alternativa, caso não procedam à reparação, no pagamento aos Autores da quantia de € 1.543,46 (mil quinhentos e quarenta e três euros e quarenta e seis cêntimos), bem como no que vier a liquidar-se sobre o valor do custo da eliminação dos defeitos mencionados nos pontos 11 (infiltrações de água na janela do sequeiro) e 23 (inserção de gás árgon nos vidros das janelas, vidraças e porta de correr), absolvendo os Réus do demais peticionado;
b) Julgar improcedente o pedido deduzido na petição inicial sob a alínea c), dele absolvendo os Réus;
c) Confirmar no mais a sentença.
Custas, na vertente de custas de parte, na proporção do decaimento (artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6, e 663, nº 2, do CPC).
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Guimarães, 25.03.2021
(Acórdão assinado digitalmente)

Joaquim Boavida (relator)
Paulo Reis (1º adjunto)
Joaquim Espinheira Baltar (2º adjunto)



1. Utilizar-se-á a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do texto original.
2. Código de Processo Civil Anotado, vol. V, p. 143.
3. Cf. também os Acórdãos do STJ de 07.07.1994, Miranda Gusmão, BMJ nº 439, pág. 526 e de 22.06.1999, Ferreira Ramos, CJ 1999 – II, pág. 161, da Relação de Lisboa de 10.02.2004, Ana Grácio, CJ 2004 – I, pág. 105, de 4.10.2007, Fernanda Isabel Pereira, de 6.3.2012, Ana Resende, 6509/05, acessíveis em www.dgsi.pt/jtrl.
4. Acórdão do STJ de 21.12.2005, Pereira da Silva, acessível em www.dgsi.pt.
5. Da Sentença Cível, pág. 41.
6. Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, Almedina, 2015, p. 370.
7. Acórdão da Relação do Porto de 09.06.2011, Filipe Caroço, proc. 5/11, em www.dgsi.pt.
8. Acórdão do STJ de 30.04.2014, Belo Morgado, proc. 319/10, em www.dgsi.pt.
9. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08.03.2001, Ferreira Ramos, acessível em www.dgsi.jstj/pt.
10. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.10.2002, Araújo de Barros, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
11. Aliás, embora no texto tenhamos procurado recorrer a elementos objectivos, o declarado pelo Autor cerca dos 28m30s da gravação do seu depoimento de parte seria, só por si, suficiente para afastar que a madeira de carvalho tivesse permanecido como a acordada para aplicação. Resulta do aí referido que “em meados de 2012”, houve uma “mudança de material”. Seria utilizada madeira de castanho na casa de banho e na cozinha, de modo que, quando se aplicasse madeira, seria castanho.
12. Itálico da nossa autoria.
13. Os Autores qualificam o documento nº 9 junto com a petição inicial como uma “relatório pericial”, mas é absolutamente inapropriada tal designação, pois trata-se de uma análise técnica elaborada a pedido dos Autores para sustentar os pedidos formulados nesta acção. Não foi elaborada no âmbito de um processo, quem o elaborou não ficou sujeito ao regime de impedimentos e suspeições que vigora relativamente aos peritos e que é igual ao dos juízes (art. 470º, nº 1, do CPC), o seu desempenho e actividade não foi objecto de supervisão por um tribunal e, sobretudo, a parte contrária não teve qualquer possibilidade de intervir nos actos em causa. Isso está em consonância com o referido pelo Réu cerca dos 2m28s da gravação do seu depoimento de parte.
14. Se não se sabe quando a obra foi entregue também necessariamente que não está adquirido quando ocorreu a alegada aceitação, sendo que esta não pode consistir num fenómeno abstracto, que se dá por existente sem se saber quando ocorreu.
15. Código Civil Anotado, vol. II, 3ª edição, Coimbra Editora, pág. 817.
16. A declaração negocial é expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam (artigo 217º, nº 1, do Código Civil).
17. As normas do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, bem como as da LDC, são normas especiais relativamente às normas gerais do Código Civil, pelo que derrogam aquelas que sejam incompatíveis no seu âmbito de aplicação, que são as relações de consumo. No fundo, são inaplicáveis todas as normas do Código Civil que sejam incompatíveis com normas do DL nº 67/2003 e da LDC. É o caso da norma do artigo 2º, nº 3, do DL nº 67/2003 relativamente à norma do artigo 1218º, nº 5, do Código Civil.
18. Segundo parece, é uma falta de isolamento parcial, que terá sido detectada por nessa zona se verificar que deixava passar a luminosidade provinda do exterior. Depreende-se que a passagem de luminosidade terá sido o factor relevante para a detecção da desconformidade.
19. Relatado por Sílvia Pires, disponível em www.dgsi.pt, como todos os demais acórdãos que aqui citamos. No mesmo sentido o acórdão da Relação do Porto de 15.12.2016, relatado por Jorge Seabra, proferido no processo 103/14.4T8PFR.P1, João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, págs. 255 e 257, Pedro Romano Martinez, Empreitada da Consumo, Revista Themis, ano II, nº 4, Almedina, 2001, págs. 167-168, acórdão da Relação do Porto de 06.09.2010, processo nº 2788/06.6TBPNF.P1, relator António Eleutério e acórdão da Relação de Coimbra de 18.02.2014, processo nº 2817/09.1TBFIG.C1, relatora Sílvia Pires.
20. Em decorrência do disposto nos arts. 10º, nº 2, do Decreto-Lei nº 67/2003 e 16º, nº 1, da LDC. Tais preceitos cominam com nulidade os pactos que excluam ou restrinjam o exercício dos direitos do dono da obra consumidor celebrados antes da denúncia dos defeitos, o que contraria que o acto de aceitação da obra sem denúncia dos defeitos verificados possa determinar a exclusão da responsabilidade do empreiteiro.
21. Para um estudo pormenorizado desta matéria, v. Manual de Direito do Consumo, Jorge Morais Carvalho, 5ª edição, Almedina, págs. 262-343.
22. Implica a devolução pelo consumidor do bem desconforme e a entrega pelo vendedor de um novo bem conforme com o contrato.
23. O consumidor fica com o bem desconforme, mas tem direito ao valor correspondente à desvalorização emergente da desconformidade. Ao contrário do sustentado nas alegações, que se alicerça em pontual jurisprudência que recorre a uma construção teórica muito forçada, a redução do preço não corresponde a uma indemnização pelo custo da reparação, antes a uma reposição do equilíbrio entre as prestações – precedida de avaliação destinada a apurar a proporção da diminuição do valor do bem desconforme –, tendo como limite máximo o valor do preço.
24. Corresponde à inexequibilidade da solução para efeitos de reposição da conformidade com contrato, sendo o que acontece, nomeadamente, nos casos em que é entregue ao consumidor um bem diferente do acordado, na hipótese de o bem se encontrar esgotado no mercado ou de inexistência de condições técnicas para colocar o bem em conformidade com o contrato.
25. Pedro Romano Martinez afirma que a redução do preço não pode corresponder ao custo da eliminação dos defeitos, porque, se assim fosse, haveria uma sobreposição de meios jurídicos. Refere que não prejudicando o defeito o valor do imóvel, como sucede no caso de pequenos defeitos de pintura numa divisão, que não alteram aquele valor, deve valorar-se o custo da eliminação. Não pondo em causa a possibilidade de ser requerida tal quantia, afirma que nesses casos não está a ser exigida a redução do preço – Cumprimento Defeituoso, em especial na Compra e Venda e na Empreitada, Colecção Teses, Almedina, pág. 405, nota 3.
26. Neste sentido o acórdão da Relação de Coimbra de 04.05.2020, proferido no processo 4581/15.6T8VIS.C2, relatado por Barateiro Martins, disponível em www.dgsi.pt, bem como João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 2ª edição, Almedina, pág. 234.
27. João Cura Mariano, ob. cit., pág. 234.
28. Segundo o que ora alegam no recurso era isso que tinham em vista, como resulta do extracto da motivação das alegações acima transcrito.
29. Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 2ª edição, Almedina, pág. 234.
30. Tenha-se em conta que o extracto transcrito foi produzido em 2005, antes das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 84/2008, de 21 de Maio.
31. Relatado por Pires da Rosa, disponível em www.dgsi. pt.
32. Neste sentido, referindo-se ao artigo 1223º do Código Civil, v. RLJ, 105º, pág. 282.
33. O enriquecimento sem causa tem, nos termos do artigo 474º do Código Civil, uma natureza subsidiária e, no caso, o direito dá uma outra solução jurídica ao caso. Por isso, afastava o funcionamento subsidiário do enriquecimento sem causa. Aliás, o enriquecimento sem causa não constitui um instituto de “fim de linha” e sempre disponível ad libitum quando os outros correm mal. Existindo outros institutos para tutelar a posição jurídica do demandante é inaplicável o enriquecimento sem causa.