Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
75/21.9GAVVD.G1
Relator: MARIA TERESA COIMBRA
Descritores: CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
ESTADO DE EMERGÊNCIA
DECRETO N.º 4/2021
DE 13/03
INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA
PRÉVIA COMINAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/06/2021
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
Não comete o crime de desobediência, previsto em qualquer das alíneas do n.º 1 do art.º 348 do Código Penal, o arguido que violou o dever de recolhimento imposto pelo art.º 4.º do Dec. 4/2021 de 13.03, se não lhe foi feita, pelas forças de segurança que constataram a violação, a cominação a que alude o art.º 50.º, n.º 1, d) do mesmo diploma legal.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I.
No processo especial sumário que, com o nº 75/21.9GAVVD, corre termos no juízo local criminal de Vila Verde foi decidido, além do mais (transcrição):

(…) Absolver o arguido A. R. da prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348º, nº 1, al. a) e do Código Penal com referência aos artigos 7º da Lei 44/86 de 30.09 (Regime do Estado de Sítio e Estado de Emergência), 1º, 2º, 3º, 4º, nº 1 alínea a) e 6º, nº 1 do Decreto do Presidente da República nº 25-A/2021 de 11 de março, 2º, 4º e 50º, nº 1 alínea d) do Decreto nº 4/2021 de 13.03.
*
Inconformado com a absolvição recorreu o Ministério Público para este Tribunal da Relação apresentando no final da motivação as seguintes conclusões (transcrição):

1.ª) O presente recurso circunscreve-se à decisão de absolvição do arguido da prática do crime de desobediência por violação do dever geral de recolhimento domiciliário imposto por força da declaração do estado de emergência e respectivas medidas de execução.
2.ª) O Tribunal a quo deu como provado, para o que ora releva, o seguinte:
“1. No dia 11 de março de 2021, através do Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11/3, veio a ser prorrogado em território nacional – por motivos de saúde pública decorrentes da situação de calamidade pública causada pelo agente Coronavírus SARS-Cov-2 e COVID19 – o estado de emergência, pelo período de 15 dias, com início às 00h00 do dia 17 de março de 2021 e termo às 23h59 do dia 31 de março de 2021.
2. Nessa sequência, pelo Decreto n.º 4/2021, de 13 de março, foi imposta a todos os cidadãos a obrigação de cumprimento de um dever geral de recolhimento domiciliário, designadamente através da proibição de circulação na via pública no referido período.
3. No dia - de março de 2021, pelas 17h55, o arguido tripulou na via pública, designadamente na Rua ..., em ..., concelho de Vila Verde, o ciclomotor, de marca Famel, matrícula IT, sendo portador de uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 3,097 g/l [correspondente à taxa apurada de 3,26 g/l deduzida do valor do erro máximo admissível].
4. Tal taxa de álcool no sangue resultou da ingestão voluntária de bebidas alcoólicas por parte do arguido.
5. Quando decidiu tripular o ciclomotor, o arguido sabia estar sob o efeito do álcool e que a taxa de álcool no sangue que o afetava era igual ou superior a 1,20 g/l.
6. Indiferente, porém, a tal situação, não se coibiu de tripular o ciclomotor nas circunstâncias acima descritas, sabendo não o poder fazer.
7.Acresceque, nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido também não se encontrava legitimado a circular na via pública, por não integrar nenhuma das exceções previstas em 3), violando, dessa forma, o dever de recolhimento domiciliário a que estava obrigado.
8. Sabia o arguido que, nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, vigorava o dever de recolhimento domiciliário e a proibição de circulação na via pública nos moldes supra descritos e que não existia qualquer motivo justificativo que o excecionasse de tais obrigações.
9. O arguido deslocou-se a casa dos falecidos pais, onde ninguém reside, percorrendo uma distância de cerca de um quilómetro, para colocar umas cortinas que tinha lavado, após realizar obras de reabilitação do imóvel.
10. Agiu o arguido de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.”
3.ª) Considerou, contudo, o Tribunal a quo que:
“O Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11-3 tem prevista a prática de um crime de desobediência no seu artigo 6.º, dizendo que a violação do disposto na declaração do estado de emergência faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência.
O Decreto do Governo n.º 4/2021, de 13-3 não tem prevista a prática do crime de desobediência. Antes pelo contrário, resulta do disposto no artigo 50.º n.º 1 d) do Decreto n.º 4/2021, de 13-3 a necessidade de cominação com a prática de tal crime, pelas forças de segurança, a quem viole o disposto no artigo 4.º do mesmo diploma legal. Foi exatamente o que sucedeu no caso dos autos, o arguido ausentou-se do seu domicílio, sem que tal ausência se enquadre nas exceções legalmente previstas, contudo, não foi advertido de que incorria na prática de um crime de desobediência.
Assim, uma vez que entendemos que não é sustentável que haja uma cominação com o crime de desobediência para a conduta do arguido, com base no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 44/86, de 30-9, impõe-se a absolvição do arguido da prática deste crime.
Poder-se-ia dizer que a Resolução da Assembleia da República, que autorizou a declaração do estado de emergência por parte do Presidente da República, continha a necessária habilitação para a referida criminalização de condutas.
Contudo, cremos que tal resolução, a Resolução da Assembleia da República n.º 77-B/2021, de 11 de março, apenas previu, ao abrigo do artigo 161.º, n.º 1 e do artigo 166.º, n.º 5, da CRP e do artigo 15.º, n.º 1 do RESEE, aquela mesma autorização. […] Estamos em crer que nunca esteve previsto, em Lei ou Decreto do Governo devidamente autorizado o crime de desobediência que se pretende imputar ao arguido, pois seria sempre necessária a prévia cominação da autoridade policial cometente, conforme previsto do Decreto do Governo n.º 4/2021, no seu artigo 50.º n.º 1 d). A defender-se o entendimento da acusação todo e qualquer incumprimento a cada uma das normas aí previstas faria incorrer os seus autores em crime de desobediência, seria uma punição genérica.
Em suma, impõe-se concluir pela inconstitucionalidade orgânica das normas supra referidas e que definem matéria criminal, razão pela qual não pode, pois, o arguido, ser condenada pela sua prática.”
4.ª) Contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, entendemos que o crime de desobediência, com fundamento nas normas contidas no Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11 de março (renovação do estado de emergência aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 77-B/2021, de 11 de março), no Decreto do Governo n.º 4/2021, de 13 de março, e no Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência, não padece de qualquer inconstitucionalidade.
5.ª) Neste particular, acompanhamos o entendimento sufragado por André Lamas Leite, Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Porto e da Universidade Lusíada Norte (Porto), no artigo “Desobediência em tempos de cólera”, publicado na Revista do Ministério Público, Número Especial Covid: 2020, que parcialmente se transcreve:
[…] As situações de anormalidade ou estado de necessidade constitucionais admitem, no nosso país, duas configurações: estado de sítio e estado de emergência, aos quais, para além dos preceitos da CRP, se aplicam a Lei n.º 44/86, de 30 de Setembro (doravante, RESEE), a qual regulamenta tais estados em que existe sempre limitação de direitos fundamentais (cf. os seus artigos 1.º, 8.º e 9.º), apenas admissível em dimensão colectiva e nunca individual […]. Importa, agora, focar a nossa atenção, aproximando-nos do objecto de estudo a que nos propusemos, na análise do artigo 7.º do RESEE, o qual prevê que «[a] violação do disposto na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou na presente lei, nomeadamente quanto à execução daquela, faz incorrer os respectivos autores em crime de desobediência». […] não será apenas e tão-só, como parece resultar à primeira vista de uma mera interpretação enunciativa do artigo 7.º do RESEE, a violação do constante no decreto do PR que configurará a prática do crime de desobediência, mas todo o conjunto normativo sem o qual tal decreto não tem efectividade prática. […]. Na verdade, cabendo ao Governo a execução do referido decreto (artigo 17.º do RESEE), apenas em conjunto, como acto legislativo complexo ou bifronte, se insufla de sentido a declaração do estado de anormalidade constitucional. Donde, os comportamentos exigidos ou vedados no decreto governamental integram o conjunto normativo sem o qual o estado de emergência não se efectiva, o que importa que esse mesmo diploma do Executivo encontra cobertura constitucional, em especial no tangente ao princípio da reserva de lei do artigo 165.º, n.º 1, alínea c), da CRP, para que não restem dúvidas de constitucionalidade orgânica e formal quanto à previsão normativa nele do delito de desobediência. […]
[…]no que aos estados de excepção constitucional tange, a única disposição da norma normarum relativa ao Governo é a do artigo 197.º, n.º 1, alínea f ), quanto à sua pronúncia no processo legislativo em causa. Não restando outra qualquer disposição expressa em sede de competências do Executivo, é natural que tenha sido usada a norma que prevê uma competência residual. Mais, o facto de se tratar de uma “função administrativa” em nada bole com o princípio da reserva de lei, porquanto, como já procurámos explicar no enquadramento jusconstitucional, a declaração do estado de emergência é um acto legislativo complexo do qual fazem parte, desde logo, o artigo 19.º da CRP, as demais normas em sede procedimental e de fiscalização política e judicial, mas também o artigo 7.º do RESEE que, como interpretámos, tem uma eficácia externa – ao invés dos iniciais “crimes de responsabilidade” –, assim se configurando como norma habilitante para a aplicação de um único tipo legal de crime, que é exactamente a desobediência. E veja-se que não usámos propositadamente a expressão “criação” de um tipo legal, porquanto esta só é possível, por via da reserva de lei do artigo 165.º, n.º 1, alínea c), da CRP, através de lei da AR ou de decreto-lei autorizado. Ora, e então o que é o RESEE se não uma lei orgânica, ainda por cima de valor reforçado, como sublinhado supra? Por outras palavras, a punição por desobediência nos decretos executivos do estado de emergência nem sequer se pode dizer, em nossa perspectiva, que apenas seja dotada de legitimidade de segundo grau, porquanto repousa directamente na Lei n.º 44/86, ainda por cima matéria de competência legislativa exclusiva da AR [artigo 164.º, alínea e), da CRP].
[…]
Do percurso trilhado, em especial do entendimento do estado de emergência como um processo composto, como se de um acto único se tratasse, por via do decreto presidencial e da autorização parlamentar, a que acresce o artigo 7.º do RESEE, na hermenêutica patrocinada, somos levados a concluir pela não inconstitucionalidade do crime de desobediência nas suas duas modalidades típicas das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 348.º do CP, seja em estado de emergência, seja na actual situação de calamidade.”
(sublinhado nosso)
6.ª) O Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, no que concerne à subsunção jurídica da factualidade que deu como provada.
7.ª) O artigo 7.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro (que aprovou o Regime Jurídico do Estado de Sítio e do Estado de Emergência), estatui que “a violação do disposto na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou naquele regime, nomeadamente quanto à execução daquela, faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência”.
8.ª) Por sua vez, o artigo 348.º, n.º 1, do Código Penal prevê o seguinte: “quem faltar à obediência devida a ordem ou mandado legítimos regulamente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias se:
a) Uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples;
b) Na ausência de disposição legal, a autoridade ou o funcionário fizerem a correspondente cominação.”
9.ª) Decorre assim do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal que se verifica o crime de desobediência quando uma lei cominar a punição com tal crime.
Ora, é o que sucede com o crime de desobediência previsto no artigo 7.º do Regime de Estado de Sítio e do Estado de Emergência (para o qual remete expressamente o artigo 6.º, n.º 1, do Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11 de março).
10.ª) Neste tocante, concorda-se com a posição defendida por Vânia Filipe Magalhães, Juíza de Direito, no artigo intitulado “Reflexões sobre o crime de desobediência em Estado de Emergência”, disponível para consulta no seguinte link: https://julgar.pt/wp-content/uploads/2020/03/20200329-ARTIGO-JULGAR-Reflex%C3%B5es-sobre-o-crime-de-desobedi%C3%AAncia-em-Estado-de-Emerg%C3%AAncia-V%C3%A2nia-Magalh%C3%A3es-v2.pdf, que pela sua clareza e acerto se transcreve parcialmente:
“Recorrendo aos cânones interpretativos do direito penal, entende-se que o crime de desobediência a que se reporta o artigo 7.º do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência se enquadra na previsão típica da alínea a) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal, na medida em que aquele preceito estabelece o crime de desobediência como consequência necessária da violação da lei e da respectiva execução.
Daqui se extrai que, qualquer violação à Declaração do Estadode Emergência e sua execução corporizada no Decreto n.º 2-A/2020 de 20 de Março, seja o dever de confinamento obrigatório (artigo 3.º), o dever especial de protecção (artigo 4.º) ou o dever geral de recolhimento domiciliário (artigo 5.º), para além das demais regras, por acção ou omissão, é passível de consubstanciar a prática de um crime de desobediência, observado que está o princípio da legalidade penal.
Em primeiro lugar, o Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência foi emanado da Assembleia da República (artigo 164.º, alínea e), da Constituição da República Portuguesa), assumindo a forma de lei orgânica (artigos 166.º, n.º 2, e 168.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa) e, desta forma, com valor reforçado, nos termos do artigo 112.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, o que significa que deve ser acatada pela declaração, autorização e resolução a emitir nos termos dos artigos 10.º, 11.º, 15.º e 17.º do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência. […]
Em segundo lugar, o artigo 7.º do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência refere expressamente que a violação do disposto na declaração do estado de emergência ou naquela lei, nomeadamente quanto à execução daquela, faz incorrer os respectivos autores em crime de desobediência. Reportando-se este artigo à execução da lei só pode querer significar que o crime de desobediência é aplicável a todas as violações das normas emanadas na Declaração do Estado de Emergência e na resolução de execução emitida pelo Governo nos termos do artigo 17.º do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência. […]
Conclui-se, assim, que o crime de desobediência previsto no artigo 348.º, n.º 1, do Código Penal e no artigo 7.º do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência é aplicável às violações das regras impostas pela Declaração do Estado de Emergência e respectiva resolução, incluindo não só o dever de confinamento obrigatório, mas também o dever especial de protecção e o dever geral de recolhimento domiciliário, para além das demais regras impostas a todos os cidadãos e expressamente previstas na lei.”
(negrito e sublinhado nossos)
11.ª) No mesmo sentido, veja-se ainda a Recomendação n.º 3/2020, de 15 de abril de 2020, da Procuradoria-Geral Regional do Porto e parecer anexo ao mesmo (cf. docs. nºs 1 e 2, que se juntam). , cujas conclusões se transcrevem:
“1. O regime sancionatório da violação das obrigações impostas pelo Estado de Emergência constitui, segundo o artigo 7.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, crime de desobediência, punível nos termos do artigo 348.º, n.º1, alínea a), do Código Penal;
2. A violação das obrigações impostas pelo Estado de Emergência preenche o tipo legal de crime de desobediência independentemente de qualquer outro requisito, designadamente cominação;
3. O Decreto 2-B/2020, de 2 de abril não prevê qualquer regime sancionatório diverso do que consta da Lei n.º 44/86, nem podia, seja por ser aquela uma lei de valor reforçado (art. 112.º, n.º 3 e 166.º, n.º 2, da CRP), seja porque invadiria reserva legislativa da Assembleia da República (art. 164.º, alª e, da CRP) limitando-se a confirmar que para além daquele regime existe o regime suplementar consagrado no artigo 348.º, n.º 1, alª b), do Código Penal;
4. Atento o disposto no art. 7º da Lei nº 44/86, sem prejuízo dos órgãos de polícia criminal e demais autoridades poderem sempre elucidar das consequências penais da conduta, a cominação com crime de desobediência só é aplicável a casos em que não estando em causa condutas já punidas como desobediência, seja necessário emanar uma ordem legítima;
5. Neste contexto, a desobediência e a resistência às ordens legítimas das entidades competentes, quando praticadas em violação do disposto no Decreto 2-B/2020, se não constituírem já crime de desobediência, previsto e punível nos termos do artigo 7.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro e do artigo 348.º n.º 1 alª a) do Código Penal, se estiverem reunidos os respetivos pressupostos legais, integra o crime de desobediência, previsto e punível nos termos do 348.º n.º 1 alª b), do mesmo diploma legal.
12.ª) Assim, contrariamente ao entendimento sufragado pelo Tribunal a quo consideramos que o preenchimento e verificação do crime de desobediência in casu não carecia de qualquer prévia cominação por parte da autoridade competente, mormente da GNR [não sendo assim subsumível à modalidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal, mas antes do alínea a) do mesmo preceito legal, por força do disposto no artigo 7.º da Lei 44/86, de 30 de setembro].
13.ª) Face à factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, encontram-se verificados todos os elementos típicos do referido crime de desobediência, razão pela qual o arguido deveria ter sido também condenado pela sua prática.
14.ª) Acresce que existe contradição entre os factos dados como provados e os factos dados como não provados contradição [artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal], uma vez que, por um lado, a Mm.ª Juíza a quo afirma que o arguido estava ciente de que se encontrava a violar e assim a desobedecer às obrigações/deveres impostos em plena vigência do Estado de Emergência decretado e que agiu ainda, de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo, além do mais, que tal conduta era proibida e punida por lei, mas por outro lado, dá como não provado que o arguido sabia que a violação do dever de recolhimento obrigatório e da proibição de circulação na via pública – e, por conseguinte, das imposições decorrentes do sobredito estado de emergência decretado – comportavam a sua responsabilização criminal, sem porém concluir pela exclusão da culpa (artigo 16.º do Código Penal) ou da ilicitude (artigo 17.º do Código Penal).
Cumpre salientar, aliás, que o arguido confessou que sabia que, por causa da pandemia e das regras impostas, não podia sair de casa quando lhe apetecesse, para ir pôr as cortinas (cf. gravação media studio, entre os 11 minutos e 14 segundos e os 11 minutos e 29 segundos).
15.ª) A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 7.º e17.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro (Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência) e 348.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, por referência aos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, n.º 1, alínea a), e 6.º, n.º 1, do Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11 de março, 4.º, n.º 1, alíneas a) e c), e 6.º, n.º 1, da Resolução da Assembleia da República n.º 77-B/2021, de 11 de março, 2.º, 4.º e 50.º, n.º 1, alínea d), do Decreto n.º 4/2021, de13 de março, sendo nula, pelo que deverá ser parcialmente revogada e, em consequência, ser substituída por outra que condene o arguido também pela prática do crime de desobediência pelo qual estava acusado.
*
Termos em que deverá essa Veneranda Relação conceder provimento ao presente recurso, revogando parcialmente a decisão recorrida e substituindo-a por outra que condene o arguido também pela prática do crime de desobediência de que foi acusado,
assim se fazendo JUSTIÇA.
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O recurso foi corretamente recebido.
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A ele respondeu em primeira instância o arguido, pugnando pela sua improcedência.
*
Após a remessa dos autos a este tribunal, o Ministério Público apôs o seu visto.
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Após os vistos, realizou-se conferência.

II.
Cumpre apreciar e decidir tendo em conta que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
*
A matéria que o recorrente traz à apreciação deste tribunal resume-se a saber se a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 348 nº 1 a) do C.P. por referência aos art. 7º e 17º da Lei 44/86 de 30.09 (LRESEE), e ainda os art. 1º, 2º, 3º, 4º, nº 1, alínea a) e 6º, nº 1 da Decreto do PR nº 25-A/2021 de 11.03, 4º, nº 1, alíneas a) e c) e 6º, nº 1 da resolução da AR nº 77-B/2021 de 11/03, 2º, 4º e 50º, nº 1 d) do Decreto nº 4/2021 de 13.03.
- Se, consequentemente, o preenchimento e verificação do crime de desobediência não carecia de qualquer prévia cominação por parte da autoridade competente (GNR).
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É a seguinte a matéria de facto fixada em 1ª instância e respetiva fundamentação.

Matéria de facto provada:
1. No dia 11 de março de 2021, através do Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11/3, veio a ser prorrogado em território nacional – por motivos de saúde pública decorrentes da situação de calamidade pública causada pelo agente Coronavírus SARS-Cov-2 e COVID19 – o estado de emergência, pelo período de 15 dias, com início às 00h00 do dia 17 de março de 2021 e termo às 23h59 do dia 31 de março de 2021.
2. Nessa sequência, pelo Decreto n.º 4/2021, de 13 de março, foi imposta a todos os cidadãos a obrigação de cumprimento de um dever geral de recolhimento domiciliário, designadamente através da proibição de circulação na via pública no referido período.
3. No dia 19 de março de 2021, pelas 17h55, o arguido tripulou na via pública, designadamente na Rua ..., em ..., concelho de Vila Verde, o ciclomotor, de marca Famel, matrícula IT, sendo portador de uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 3,097 g/l [correspondente à taxa apurada de 3,26 g/l deduzida do valor do erro máximo admissível].
4. Tal taxa de álcool no sangue resultou da ingestão voluntária de bebidas alcoólicas por parte do arguido.
5. Quando decidiu tripular o ciclomotor, o arguido sabia estar sob o efeito do álcool e que a taxa de álcool no sangue que o afetava era igual ou superior a 1,20 g/l.
6. Indiferente, porém, a tal situação, não se coibiu de tripular o ciclomotor nas circunstâncias acima descritas, sabendo não o poder fazer.
7. Acresce que, nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido também não se encontrava legitimado a circular na via pública, por não integrar nenhuma das exceções previstas em 3), violando, dessa forma, o dever de recolhimento domiciliário a que estava obrigado.
8. Sabia o arguido que, nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, vigorava o dever de recolhimento domiciliário e a proibição de circulação na via pública nos moldes supra descritos e que não existia qualquer motivo justificativo que o excecionasse de tais obrigações.
9. O arguido deslocou-se a casa dos falecidos pais, onde ninguém reside, percorrendo uma distância de cerca de um quilómetro, para colocar umas cortinas que tinha lavado, após realizar obras de reabilitação do imóvel.
10. Agiu o arguido de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
11. O arguido vive só em casa dos tios, sendo sustentado pelo seu irmão que reside no Canadá e que lhe manda dinheiro. Bebe habitualmente bebidas alcoólicas às refeições e fora delas, não obstante ser medicamente desaconselhado por ter ataques epiléticos. Tem o 7.º ano de escolaridade.

Matéria de facto não provada:

Entre as 00h00 do dia 17 de março de 2021 e as 23h59 do dia 31 de março de 2021, sob pena de incorrerem na prática de um crime de desobediência, os cidadãos só podiam circular em espaços e vias públicas, ou em espaços e vias privadas equiparadas a vias públicas para as seguintes situações:

a) Aquisição de bens e serviços essenciais;
b) Acesso a serviços públicos, nos termos do artigo 35.º, e a participação em atos processuais junto das entidades judiciárias ou em atos da competência de notários, advogados, solicitadores ou oficiais de registo;
c) Desempenho de atividades profissionais ou equiparadas, quando não haja lugar ao teletrabalho, conforme atestado por declaração emitida pela entidade empregadora ou equiparada, ou a procura de trabalho ou resposta a uma oferta de trabalho;
d) Atender a motivos de saúde, designadamente para efeitos de obtenção de cuidados de saúde e transporte de pessoas a quem devam ser administrados tais cuidados ou dádiva de sangue;
e) Acolhimento de emergência de vítimas de violência doméstica ou tráfico de seres humanos, bem como deslocações para efeitos de intervenção no âmbito da proteção das crianças e jovens em perigo, designadamente das comissões de proteção de crianças e jovens e das equipas multidisciplinares de assessoria técnica aos tribunais;
f) Assistência a pessoas vulneráveis, pessoas em situação de sem-abrigo, pessoas com deficiência, filhos, progenitores, idosos ou dependentes ou outras razões familiares imperativas, designadamente o cumprimento de partilha de responsabilidades parentais, conforme determinada por acordo entre os titulares das mesmas ou pelo tribunal competente;
g) Deslocações para acompanhamento de menores para frequência dos estabelecimentos escolares cuja atividade presencial seja admitida, creche, creche familiar ou ama;
h) Realização de provas e exames, bem como a realização de inspeções;
i) Atividade física e desportiva ao ar livre, nos termos do artigo 41.º;
j) Participação em cerimónias religiosas, incluindo celebrações comunitárias, nos termos do artigo 42.º;
k) Fruição de momentos ao ar livre e o passeio dos animais de companhia, os quais devem ser de curta duração e ocorrer na zona de residência, desacompanhadas ou na companhia de membros do mesmo agregado familiar que coabitem;
l) Assistência de animais por médicos veterinários, detentores de animais para assistência médico-veterinária, cuidadores de colónias reconhecidas pelos municípios, voluntários de associações zoófilas com animais a cargo que necessitem de se deslocar aos abrigos de animais e pelos serviços veterinários municipais para recolha e assistência de animais, bem como a alimentação de animais;
m) Participação em ações de voluntariado social;
n) Visita a utentes de estruturas residenciais para idosos e para pessoas com deficiência, unidades de cuidados continuados integrados da Rede Nacional de Cuidados Integrados e outras respostas dedicadas a pessoas idosas;
o) Visitas, quando autorizadas, ou entrega de bens essenciais a pessoas incapacitadas ou privadas de liberdade de circulação;
p) Exercício das respetivas funções dos titulares dos órgãos de soberania, dirigentes dos parceiros sociais e dos partidos políticos representados na Assembleia da República, bem como das pessoas portadoras de livre-trânsito emitido nos termos legais;
q) Desempenho de funções oficiais por parte de pessoal das missões diplomáticas, consulares e das organizações internacionais localizadas em Portugal;
r) Acesso a estações e postos de correio, agências bancárias e agências de mediadores de seguros ou seguradoras;
s) Exercício da liberdade de imprensa;
t) Deslocações necessárias à entrada e à saída do território continental, incluindo as necessárias à deslocação de, e para, o local do alojamento;
u) Outras atividades de natureza análoga ou por outros motivos de força maior ou necessidade impreterível, desde que devidamente justificados;
v) Retorno ao domicílio no âmbito das deslocações mencionadas nas alíneas anteriores.

Mais sabia o arguido que a violação do dever de recolhimento domiciliário e da proibição de circulação na via pública importavam a sua responsabilização criminal.

Motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto apurada, fundamentou-se na confissão integral e sem reservas feita pelo arguido.
A sua condição pessoal resultou igualmente das suas declarações.
No que tange à matéria não provada, desde logo por referência ao que consta no artigo 3.º da acusação, não está prevista a prática de crime de desobediência no Decreto n.º 4/2021, de 13-3. Antes pelo contrário, resulta do disposto no artigo 50.º n.º 1 d) do Decreto n.º 4/2021, de 13-3 a necessidade de cominação com a prática de tal crime, pelas forças de segurança, a quem viole o disposto no artigo 4.º do mesmo diploma legal.
A matéria do artigo 10.º da acusação resultou igualmente não provada, não obstante a genérica confissão que o arguido fez, uma vez que a violação do dever de recolhimento domiciliário não importa responsabilização criminal.

III. Aspeto Jurídico da Causa

Enquadramento jurídico-penal:
O arguido vem acusado da prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292.º n.º 1 e 69.º do Código Penal.
(…)
Vem ainda imputada ao arguido a prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348.º n.º 1 a) do Código Penal, 7.º do Decreto-Lei n.º 44/86, de 30 de setembro (Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência), por referência aos artigos 1.º a 3.º e 4.º, n.º 1, a) e 6.º n.º 1 do Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021 de 11 de março de 2021, 2.º, 4.º e 50.º, n.º 1, d) do Decreto n.º 4/2021, de 13 de março de 2021.
É imputado tal crime ao arguido pelo facto de o mesmo ter saído de casa violando o recolhimento domiciliário obrigatório determinado pela imposição do estado de emergência.
No dia 11 de março de 2021, pelo Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021 veio a ser prorrogado, em território nacional - por motivos de saúde pública decorrentes do estado de pandemia reconhecido pela Organização Mundial de Saúde, em razão da propagação de infeções do aparelho respiratório de origem viral, causadas pelo agente Coronavírus SARS-Cov-2 e COVID19 – o estado de emergência, pelo período de 15 dias, com início às 00H00m do dia 17 de março de 2021 e termo às 23H59m do dia 31 de março de 2021.
Nessa sequência, pelo Decreto do Governo da República n.º 4/2021, de 13 de março de 2021, veio a ser determinada/imposta a todos os cidadãos, entre o mais, a obrigação de cumprimento de um dever geral de recolhimento domiciliário, designadamente, através da proibição de circulação na via pública, no referido período.
Assim, entre as 00h00 do dia 17 de março de 2021 e as 23h59 do dia 31 de março de 2021, sob pena de incorrerem na prática de um crime de desobediência, os cidadãos só podiam circular em espaços e vias públicas, ou em espaços e vias privadas equiparadas a vias públicas para as seguintes situações:
a) Aquisição de bens e serviços essenciais;
b) Acesso a serviços públicos, nos termos do artigo 35.º, e a participação em atos processuais junto das entidades judiciárias ou em atos da competência de notários, advogados, solicitadores ou oficiais de registo;
c) Desempenho de atividades profissionais ou equiparadas, quando não haja lugar ao teletrabalho, conforme atestado por declaração emitida pela entidade empregadora ou equiparada, ou a procura de trabalho ou resposta a uma oferta de trabalho;
d) Atender a motivos de saúde, designadamente para efeitos de obtenção de cuidados de saúde e transporte de pessoas a quem devam ser administrados tais cuidados ou dádiva de sangue;
e) Acolhimento de emergência de vítimas de violência doméstica ou tráfico de seres humanos, bem como deslocações para efeitos de intervenção no âmbito da proteção das crianças e jovens em perigo, designadamente das comissões de proteção de crianças e jovens e das equipas multidisciplinares de assessoria técnica aos tribunais;
f) Assistência a pessoas vulneráveis, pessoas em situação de sem-abrigo, pessoas com deficiência, filhos, progenitores, idosos ou dependentes ou outras razões familiares imperativas, designadamente o cumprimento de partilha de responsabilidades parentais, conforme determinada por acordo entre os titulares das mesmas ou pelo tribunal competente;
g) Deslocações para acompanhamento de menores para frequência dos estabelecimentos escolares cuja atividade presencial seja admitida, creche, creche familiar ou ama;
h) Realização de provas e exames, bem como a realização de inspeções;
i) Atividade física e desportiva ao ar livre, nos termos do artigo 41.º;
j) Participação em cerimónias religiosas, incluindo celebrações comunitárias, nos termos do artigo 42.º;
k) Fruição de momentos ao ar livre e o passeio dos animais de companhia, os quais devem ser de curta duração e ocorrer na zona de residência, desacompanhadas ou na companhia de membros do mesmo agregado familiar que coabitem;
l) Assistência de animais por médicos veterinários, detentores de animais para assistência médico-veterinária, cuidadores de colónias reconhecidas pelos municípios, voluntários de associações zoófilas com animais a cargo que necessitem de se deslocar aos abrigos de animais e pelos serviços veterinários municipais para recolha e assistência de animais, bem como a alimentação de animais;
m) Participação em ações de voluntariado social;
n) Visita a utentes de estruturas residenciais para idosos e para pessoas com deficiência, unidades de cuidados continuados integrados da Rede Nacional de Cuidados Integrados e outras respostas dedicadas a pessoas idosas;
o) Visitas, quando autorizadas, ou entrega de bens essenciais a pessoas incapacitadas ou privadas de liberdade de circulação;
p) Exercício das respetivas funções dos titulares dos órgãos de soberania, dirigentes dos parceiros sociais e dos partidos políticos representados na Assembleia da República, bem como das pessoas portadoras de livre-trânsito emitido nos termos legais;
q) Desempenho de funções oficiais por parte de pessoal das missões diplomáticas, consulares e das organizações internacionais localizadas em Portugal;
r) Acesso a estações e postos de correio, agências bancárias e agências de mediadores de seguros ou seguradoras;
s) Exercício da liberdade de imprensa;
t) Deslocações necessárias à entrada e à saída do território continental, incluindo as necessárias à deslocação de, e para, o local do alojamento;
u) Outras atividades de natureza análoga ou por outros motivos de força maior ou necessidade impreterível, desde que devidamente justificados;
v) Retorno ao domicílio no âmbito das deslocações mencionadas nas alíneas anteriores.

O Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11-3 tem prevista a prática de um crime de desobediência no seu artigo 6.º, dizendo que a violação do disposto na declaração do estado de emergência faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência.
O Decreto do Governo n.º 4/2021, de 13-3 não tem prevista a prática do crime de desobediência. Antes pelo contrário, resulta do disposto no artigo 50.º n.º 1 d) do Decreto n.º 4/2021, de 13-3 a necessidade de cominação com a prática de tal crime, pelas forças de segurança, a quem viole o disposto no artigo 4.º do mesmo diploma legal. Foi exatamente o que sucedeu no caso dos autos, o arguido ausentou-se do seu domicílio, sem que tal ausência se enquadre nas exceções legalmente previstas, contudo, não foi advertido de que incorria na prática de um crime de desobediência.
Ainda que se entendesse que há uma previsão de crime de desobediência na concatenação dos artigos 2.º, 4.º e 50.º n.º 1 d) do Decreto n.º 4/2021, de 13-3, a criação de tipos de ilícitos criminais é matéria da reserva relativa da Assembleia da República, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, sendo certo que tal competência pode, igualmente, competir ao Governo, desde que com autorização da Assembleia da República. Não é o facto de o tipo em análise não ter moldura penal própria - uma vez que remete para o crime de desobediência previsto no artigo 348º do Código Penal e para o artigo 7.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro – que afasta este entendimento, já que no tipo de ilícito aí previsto está objetivada a realidade que a lei passou a punir como crime de desobediência.
Na esteira do decidido pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 09.11.2020 e disponível no sítio da internet www.dgsi.pt podemos questionar se a declaração de estado de emergência, com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública permite a inobservância dos preceitos constitucionais, tal como se mostram definidos.
Entendemos que não.
Na verdade, é a própria Lei Fundamental, no seu artigo 19.º, n.º 7, o proíbe, quando diz que “a declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só pode alterar a normalidade constitucional nos termos previstos na Constituição e na lei, não podendo nomeadamente afetar a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgãos de soberania e do governo próprio das regiões autónomas ou os direitos e imunidades dos respetivos titulares”, pelo que, mesmo em estado de emergência, a qualificação de um determinado comportamento como crime, continua a ser da competência da Assembleia da República, salvo autorização ao governo.
A conclusão lograda não sai beliscada pelo facto de no Decreto n.º 4/2021, de 13 de março constar que as medidas neles previstas o foram ao abrigo da alínea g) do artigo 199º da Constituição. Isto porque dispõe a referida norma com a epígrafe “Competência administrativa”, na sua alínea g) que “compete ao Governo, no exercício de funções administrativas praticar todos os atos e tomar todas as providências necessárias à promoção do desenvolvimento económico-social e à satisfação das necessidades coletivas” Se é certo que os casos de contagio de Covid-19 exige a aplicação de medidas extraordinárias e de caráter urgente de restrição de direitos e liberdades, em especial no que respeita com direitos de circulação e às liberdades económicas, em articulação com as autoridades europeias, com vista a prevenir a transmissão do vírus, não menos verdade é que estas medidas devem, pois, ser tomadas com respeito pelos limites constitucionais e legais, o que significa que devem, por um lado, limitar-se ao estritamente necessário e, por outro, que os seus efeitos devem cessar assim que retomada a normalidade.
Se o exposto ajuda a perceber a preocupação em conter a propagação do vírus, não pode fazer esquecer, como se afirma no aresto supra mencionado, “o respeito devido pelos fundamentos democráticos da sociedade, porque “a democracia não poderá ser suspensa”, o certo é que a criação de um novo tipo de crime vai, obviamente, muito para além da competência administrativa invocada para a regulamentação do estado de emergência”.

Face ao exposto, não há quanto a nós, dúvidas o Decreto em análise ao definir um novo tipo de crime, invade a competência legislativa que lhe não compete e que só competiria se tivesse sido prevista por uma lei de autorização legislativa.
A Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, que regula o regime do estado de sítio e do estado de emergência, no seu artigo 7º prevê que “a violação do disposto na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou na presente lei, nomeadamente quanto à execução daquela, faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência”.
No que respeita ao teor do artigo 7.º da Lei n.º 44/86, de 30-9, não contém tal norma a cominação com a prática de crime de desobediência, para quem infrinja o disposto nos Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11-3 ou Decreto do Governo da República n.º 4/2021, de 13-3.
Este tema já foi tratado por Alexandre Au-Yong Oliveira no e-book do Centro de Estudos Judiciários «Estado de Emergência – Covid 19 Implicações na Justiça», abril 2020, página 431 e seguintes, pelo que se dá por reproduzido o seu texto, designadamente os segmentos inseridos nos pontos 1.3 e 1.4., transcrevendo-se apenas dois pequenos excertos:
«Com efeito, parece haver aqui a tendência, perante a letra do aludido artigo 7.º, em especial do segundo segmento normativo – «[a] violação do disposto […] na presente lei, nomeadamente quanto à execução daquela [declaração do estado de emergência], faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência» –, de retirar da referência à “execução” o sentido de qualquer execução da declaração do estado de emergência e não, como resulta da letra da lei, das regras de execução expressas no próprio RESEE e previstas, em especial, nos respetivos artigos 17.º e seguintes21. Tal interpretação do artigo extrapola, assim, para concluir que o crime de desobediência pode resultar, de forma direta, da violação do(s) Decreto(s) do Governo que regulamenta(m) o(s) Decreto(s) do Presidente da República (doravante, “PR”), ou seja, que regulamenta(m) a declaração do estado de emergência. Não cremos, contudo, atenta a letra e espírito da lei, que assim o seja.»
«De qualquer modo, apesar da referida mudança substancial no fim da norma (e seus destinatários?), o certo é que a mesma não foi acompanhada de uma alteração explícita ao nível objetivo, pois a norma continuou a prever, única e exclusivamente, violações às declarações do estado de emergência (ou de sítio) e da “presente lei”, ou seja, do próprio RESEE. Não nos parece, pois, depois das alterações ora descritas, que a norma tenha passado a prever violações a outros diplomas que não os já aludidos – Decreto do Presidente da República a declarar o estado de exceção e RESEE –, sendo certo que, estando aqui em causa uma norma penal remissiva, ou seja, uma norma penal em branco, entendimento diverso sempre esbarraria contra o princípio da tipicidade.»
Assim, uma vez que entendemos que não é sustentável que haja uma cominação com o crime de desobediência para a conduta do arguido, com base no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 44/86, de 30-9, impõe-se a absolvição do arguido da prática deste crime.
Poder-se-ia dizer que a Resolução da Assembleia da República, que autorizou a declaração do estado de emergência por parte do Presidente da República, continha a necessária habilitação para a referida criminalização de condutas.
Contudo, cremos que tal resolução, a Resolução da Assembleia da República n.º 77-B/2021, de 11 de março, apenas previu, ao abrigo do artigo 161.º, n.º 1 e do artigo 166.º, n.º 5, da CRP e do artigo 15.º, n.º 1 do RESEE, aquela mesma autorização. Nesse âmbito, recorde-se aliás que, de acordo com Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, Direitos Fundamentais, Tomo V, Coimbra, 5.ª edição, 2012, páginas 216 e 217), a autorização da Assembleia da República para o Governo legislar em matéria criminal sempre teria de ser «explícita e autónoma».
Estamos em crer que nunca esteve previsto, em Lei ou Decreto do Governo devidamente autorizado o crime de desobediência que se pretende imputar ao arguido, pois seria sempre necessária a prévia cominação da autoridade policial cometente, conforme previsto do Decreto do Governo n.º 4/2021, no seu artigo 50.º n.º 1 d). A defender-se o entendimento da acusação todo e qualquer incumprimento a cada uma das normas aí previstas faria incorrer os seus autores em crime de desobediência, seria uma punição genérica.
Em suma, impõe-se concluir pela inconstitucionalidade orgânica das normas supra referidas e que definem matéria criminal, razão pela qual não pode, pois, o arguido, ser condenado pela sua prática.
(…)
*
Apreciação do recurso

O arguido foi absolvido da prática de um crime de desobediência p.p. art.º 348.º nº 1 al. a) do Código Penal, com referência aos artigos 7º da Lei 44/86 de 30.09 (LRESEE) e 1º, 2º, 3º, 4º, nº 1 alínea c) e 6º, nº 1 do Decreto do PR nº 25/A/2021 de 11 de março, 2º, 4º e 50º, nº 1, alínea d) do decreto 4/2021 de 13-3.
O recorrente entende que o arguido deveria ter sido condenado por desobediência não só porque, no seu entender, tal decorre dos diplomas legais citados sem que se suscite qualquer inconstitucionalidade, como ainda porque é aplicável à situação em apreço o artigo 7º da LRESEE para o qual remete expressamente o artigo 6º, nº 1 do Dec. do PR nº 25-A/2021 de 11/03.
A questão não é nova, já foi tratada por este tribunal em vários acórdãos v.g no acórdão referido na sentença recorrida (Ac. RG de 09/11/2020 in www.dgsi.pt) e tem dado azo a controvérsias e posições doutrinárias conhecidas e referidas quer na decisão, quer no recuso interposto e sistematizadas noutros acórdãos desta Relação de que são exemplo os acórdãos proferidos em 23.11.2020 e 11.10.2021, respetivamente nos processos 117/20.5PBCHV.G1 e 449/20.2GAVVD, não publicados.
Entendemos que a razão está do lado da sentença recorrida, pelos fundamentos nela expostos, aliás concordantes com os do nosso referido acórdão, a que acrescentamos agora mais dois pontos.
O primeiro é que, contrariamente ao que acontecia com o Decreto 2-A/2020 de 20/03 que procedeu, ao tempo, à execução da declaração do estado de emergência decretado pelo Presidente da República, o Decreto do Governo 4/2021 de 13/03 deixou de prever expressamente que a violação da obrigação de confinamento constituía crime de desobediência.
Compare-se o texto dos artigos terceiros de ambos os Decretos com a epígrafe (em ambos) “Confinamento obrigatório” para perceber que desapareceu, do diploma agora em apreciação, a referência expressa à prática de crime de desobediência.
Isto mesmo é dito na sentença recorrida ao referir que não só o Dec. Governo 4/2021 de 13/03 deixou de prever a prática do crime de desobediência, como resulta do disposto no artigo 50º, nº 1 alínea d) do Dec. 4/2021 a necessidade de cominação com a prática de tal crime, pelas forças de segurança, a quem viola o disposto no artigo 4º do mesmo diploma legal.
Sem prejuízo de continuarmos a defender o entendimento de que a criação de novos crimes compete à Assembleia da República (AR) em primeira linha (artigo 165º, nº 1 alínea c) da CRP), podendo competir ao governo, mas apenas com autorização da AR, , não há dúvida de que é o próprio Dec. nº 4/2021 que, no art. 50 nº1 d), prevê “ a cominação e a participação por crime de desobediência, nos termos e para os efeitos da alínea b) do nº 1 do art. 348 do Código Penal, bem como do art. 7º da Lei 44/86 de 30.09, por violação do disposto nos art. 4º a 6º, 16º e 17º do presente decreto, bem como do confinamento obrigatório, por quem a ele esteja sujeito, nos termos do art. 3º”. Assim, configura-se incontroverso que para que se pudesse falar da prática de um crime de desobediência por parte do arguido, ele teria de ser precedido de cominação por parte das forças de segurança de que a desobediência aos deveres impostos pelo art. 4º o faria incorrer em tal crime. (Aliás a necessidade de cominação é exigida, mesmo por quem entende não se suscitarem questões de inconstitucionalidade nos diplomas em apreço, como resulta do teor dos acórdãos atrás referidos).
Uma vez que tal cominação inexistiu, como decorre da matéria de facto apurada, está afastada a possibilidade de condenação do arguido.

O segundo ponto tem a ver com a interpretação do artigo 7º da lei 44/86 de 30.09 que prevê que a violação do disposto na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou na presente lei, nomeadamente quanto à execução daquele, faz incorrer os respetivos autores em crime de desobediência e que o recorrente entende que, só por si, justificava a punição.

Recordamos o que a propósito desta norma dissemos no acórdão de 19/11/2020 proferido no processo in www.dgsi.pt e que mantém atualidade:

Trata-se de um crime de desobediência que não é praticável pelos cidadãos em geral, mas tão só por titulares de cargos políticos. ( Não se ignora que, por exemplo, André Lamas Leite in “ Desobediência em tempos de cólera”- Revista do Ministério Público- Nº Especial Covid-19: 2020, pág. 15 e ss defende entendimento contrário, mas sem a consideração do que foi decidido pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias aquando da 2ª alteração à lei 44/86 de 30.09, a que faremos referência infra). De facto, se atentarmos na redação original do referido artigo 7º (com a epígrafe Crimes de responsabilidade) constatamos que aí é estabelecido que a violação do disposto na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou na presente lei, nomeadamente quando à execução daquela, faz incorrer os respetivos autores em crime de responsabilidade”. Foi a lei orgânica 1/2012 de 11/05 que alterou a designação de crime da responsabilidade para crime de desobediência, mas tal traduziu-se não num alargamento quanto a possíveis autores do ilícito, mas a uma mera atualização de referências e conceitos legais (cfr Parecer sobre o projeto de lei nº 146/XII/1ª da Comissão de Defesa Nacional e Nota Técnica da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, referidos por Alexandre Au-Yong Oliveira in Estado de emergência – Covid 19, Implicações na Justiça (Jurisdição Penal e Processual Penal, 440– salientando o que consta em especial da p. 5 (e não 8, como é dito por mero lapso) do Parecer e p.4 da Nota Técnica, com data de 08/02/2012). Refere, ainda, o mesmo autor que se fosse possível a interpretação ampla segundo a qual o legislador, com a remissão para o crime de desobediência prevista no artigo 7º, pretendia “abarcar de forma geral e abstrata, a violação de todos os atos de execução do estado de exceção, independentemente da forma que assumissem e da respetiva importância” tal seria “tanto mais grave no presente estado de emergência, quanto nos Decretos emanados pelo Presidente da República e na Resolução da Assembleia preveem inclusivamente, a suspensão do direito de resistência.
E acrescenta com razão: Neste contexto, se esta interpretação fosse correta seriamos como que devolvidos a um Estado manifestamente autoritário, sendo exigível ao cidadão comum uma obediência cega a qualquer ato de execução emitido por um qualquer agente administrativo (sem qualquer ponderação de proporcionalidade e do caso concreto), o que não nos parece, de todo, que tenha sido a intenção do legislador, nem quando elaborou (ou alterou) o RESEE, nem quando decretou o presente estado de emergência, nem sequer do atual governo quando regulamentou a sua execução.”.
Esta opinião que, entendemos, se mantém válida veio a ser avalizada recentemente pelo Professor Vieira de Andrade na RLJ nº 4029, ano 150º, 2021, página 313 e ss em artigo titulado “A defesa dos direitos e das liberdades em estado de emergência – algumas reflexões livres”, texto que teve como base a intervenção oral proferida no Colóquio comemorativo dos 45 anos da Constituição promovido pelo Tribunal Constitucional, em 07/05/2021.
Aí (fls. 318 e ss) diz o insigne Professor “uma outra situação duvidosa, do ponto de vista da protecção de liberdades, tem a ver com a eventual violação do princípio constitucional da legalidade criminal, no que se refere ao entendimento do crime de desobediência no quadro da utilização da tutela penal para assegurar o combate à pandemia.
Diga-se, para começar, que a previsão do crime de desobediência para sancionar a violação das normas estabelecidas em estado de emergência – isto é do disposto na respetiva declaração e na lei que estabelece o respetivo regime, designadamente, quanto à execução da declaração – surge na lei Orgânica nº 1/2012, que alterou o artigo 7º da Lei 44/86, a qual, até então, fazia incorrer os violadores dessas normas em “crime de responsabilidade”. É dizer que a criminalização foi inicialmente pensada para prevenir e punir os titulares de cargos públicos que não cumprissem as regras do estado de excepção e aparece, sem discussão pública e sem que dos trabalhos preparatórios resulte qualquer explicação, transmutada na criminalização dos cidadãos prevaricadores – um facto que altera radicalmente o sentido da norma em desfavor da liberdade.
O problema está, no entanto, na circunstância de se ter entendido que o referido artigo 7º vale como norma incriminadora de qualquer incumprimento das medidas dos decretos governamentais de execução. Ou, pelo menos, do incumprimento daquelas medidas que esses decretos de execução identificassem como crime de desobediência – e assim aconteceu em sucessivos regulamentos governamentais, designadamente, quanto ao incumprimento da obrigação de confinamento de infectados ou de pessoas sujeitas a vigilância activa, da obrigação de encerramento de espaços comerciais ou de suspensão de certas actividades.
Ora, parece-nos inadmissível, do ponto de vista constitucional, que o crime de desobediência possa consistir no mero incumprimento dos decretos presidenciais, que tal como a LRESEE, não estabelecem normas de conduta, limitando-se a prever os poderes administrativos de imposição ou proibição, ou que possam ser os diplomas do Governo a qualificar comportamentos como criminosos.
A constituição exige para a punição criminal uma lei anterior incriminadora e da LRESEE nesse particular apenas se pode retirar a possibilidade de o agente de autoridade cominar a desobediência às normas de execução da declaração do estado de emergência no caso concreto, nos termos do artigo 348º alínea b) do Código Penal.
E o respeito pela regra da legalidade criminal não se basta com a autorização parlamentar proferida no âmbito do procedimento da declaração do estado de emergência: como vimos, estamos aí perante um ato político do Presidente, com a colaboração da Assembleia da República e não perante um ato de soberania legislativa faltando o conteúdo, forma e o procedimento de uma lei parlamentar”.
As considerações acabadas de expor respondem ao recorrente quando defende que o preenchimento e verificação do crime de desobediência em causa nos autos não carecia de prévia cominação por parte da autoridade competente, mormente da GNR, não sendo subsumível à modalidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 348º do CP, mas antes à alínea a) do mesmo preceito legal por força do disposto no artigo 7º da lei 44/86 de 30.09.
É que tal entendimento projeta “uma tendência de restrição inadequada ou desproporcionada das liberdades” (cfr Vieira de Andrade, loc. cit, 319) não admissível no nosso Estado de Direito, pelo que bem andou o tribunal a quo ao absolver o arguido da prática do crime de desobediência, como o fez.
A decisão terá, pois, de ser confirmada.

III.
Decisão.

Em face do exposto decidem os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães julgar improcedente o recurso e confirmar a decisão recorrida.
Sem custas, por delas estar isento o recorrente ( art. 522 do CPP).
Notifique.
Guimarães, 06 de dezembro de 2021

Maria Teresa Coimbra
Cândida Martinho (com declaração de voto)

Voto a decisão, com o seguinte esclarecimento:

Apesar de entender que não se suscitam questões de inconstitucionalidade nos diplomas em apreço (Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional 352/2021, de 27 de maio e Acórdãos deste Tribunal da Relação, citados na presente decisão (processos 117/20.5PBCHV.G1 e 449/20.2GAVVD, nos quais foi Relator o Juiz Desembargador, Dr. Cruz Bucho), inexistindo qualquer dúvida que o DL.nº4/2021, de 13/3, no seu artigo 50º,nº1,al.d), faz depender o preenchimento e verificação do crime de desobediência imputado ao arguido, da prévia cominação, por parte da autoridade competente, de que a desobediência aos deveres impostos pelo artigo 4º do presente decreto o faria incorrer em tal crime, não tendo a mesma ocorrido, tal conduz, necessariamente à absolvição do arguido.

Cândida Martinho