Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
8057/13.8TBBRG.G1
Relator: ESPINHEIRA BALTAR
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
DIREITO À REPARAÇÃO
PRESCRIÇÃO
RECONHECIMENTO DO DIREITO
ABUSO DO DIREITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. O TRG alterou parcialmente as respostas negativas aos pontos de facto das als. b) e c) da matéria de facto não provada, porque se convenceu que os primeiros réus e a 2ª ré se comprometeram a realizar as obras de reparação dos danos.

2. E alterou, parcialmente, as respostas negativas aos pontos de facto das alíneas d) e e), porque se convenceu que os autores, antes da obra de intervenção no prédio dos réus, pintava o seu prédio e este não apresentava fissuras.

3. Foi julgada interrompida a prescrição porque em face da alteração das respostas aos pontos de facto das alíneas b) e c) da matéria de facto, o TRG considerou que os primeiros réus e a 2ª ré reconheceram o direito dos autores à reparação dos danos provocados pela intervenção no prédio dos primeiros réus.

4. A 2ª ré responde pelos danos patrimoniais e morais em consequência da sua atividade ilícita, culposa e danosa.

5. Os primeiros réus respondem pelos danos porque se comprometeram a repará-los e não o fizeram.

6. A ré seguradora é responsável pelos danos por força do contrato de seguro celebrado com a 2ª ré, cujo objeto os abrange”.
Decisão Texto Integral:
Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães

ANTÓNIO e mulher ODETE intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra JOÃO e mulher, MARIA, e X – CONSTRUÇÕES, S.A., pedindo que:

- seja declarada a conduta dos 1.ºs RR. e 2.ª R. como a única e exclusiva causa dos danos materiais verificados no prédio dos AA., descritos em relatório técnico junto à p.i. e que os 1.ºs RR e 2.ª R. sejam declarados únicos e exclusivos culpados na produção do evento-causa;
- sejam todos os RR. condenados, solidariamente, a executar todas as obras adequadas a repor o prédio dos AA., no estado de conservação anterior ao evento-causa, por si ou por intermédio de terceiros, à escolha dos AA.
ou em alternativa,
- sejam todos os RR. condenados a pagar aos AA., a quantia de € 98.010,00, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, a título de danos patrimoniais destinada à execução de obras de reparação;
e sempre, cumulativamente,
- sejam os RR. condenados, individual ou solidariamente, a pagar aos AA. a quantia de € 11.690,00 a título de outros danos patrimoniais e a quantia de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais, bem como as quantias que se vierem a quantificar em execução de sentença, quer a título de desvalorização do prédio dos AA, quer a título de danos não patrimoniais futuros, quantias estas acrescidas de juros moratórios vencidos calculados à melhor taxa legal em vigor, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Alegaram, para o efeito, que os 1ºs Réus são proprietários de um prédio urbano contíguo ao seu, no qual aqueles levaram a efeito a demolição e reconstrução do edifício aí existente, tendo para o efeito celebrado com a 2ª. Ré um contrato de empreitada.

As obras, que tiveram o seu início em meados do mês de Dezembro de 2010, acabaram por afectar o imóvel dos Autores, que sofreu forte abalo na sua estrutura e apresentou uma fissura vertical ao longo do alçado lateral de todos os três pisos e águas furtadas, que constitui uma parede meeira de ambos os prédios.

Alegaram, ainda, que estes danos foram de imediato denunciados inicialmente à 2ª. Ré e, posteriormente, também aos 1ºs Réus, os quais depois de contactos e conversações, solicitaram a elaboração de um relatório de vistoria. Não obstante o resultado desse relatório, os 1ºs e 2ºs Réus não levaram a efeito quaisquer obras no prédio dos Autores com vista à reposição do mesmo no estado de conservação em que se encontrava anteriormente, obras essas que ascendem ao valor de € 98.010,00.

Para além destes danos, a incúria dos Réus levou à deterioração do recheio do prédio dos Autores, computando estes o valor de € 2.500,00 respeitante aos móveis e € 2.500,00 relativos a fotografias. Referem, também, ter suportado despesas com honorários de peritos (€ 500,00), com taxa de justiça (€ 1.020,00) e com honorários à mandatária (€ 5.000,00), para além de danos não patrimoniais, reclamando a este título € 15.000,00.

A 2ª R. foi a primeira a contestar, nos termos constantes de fls. 22 a 34 do processo físico, começando por excepcionar a prescrição do direito invocado pelos Autores, pois os trabalhos ter-se-ão iniciado em 16-11-2009 e não em meados de Dezembro de 2010, como alegam aqueles, tendo a demolição terminado em meados de Janeiro de 2010. Como tal, quando foram citados para a presente acção (31-12-2013) há muito tinha já decorrido o prazo de prescrição previsto no art. 498º do Cód. Civil.

Invocou, ainda, a exceção de ilegitimidade, alegando que apenas se obrigou perante os 1ºs Réus a executar a obra de acordo com um projecto previamente fornecidos por estes, tendo-o feito segundo as regras da arte e sem violação de qualquer dever especial de conduta, pelo que nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada e, a existir nexo de causalidade entre os danos e a obra, aqueles ficam a dever-se a um erro de projecto, da responsabilidade dos 1ºs Réus.

Pugnou, ainda, pela existência de abuso de direito e pela ocorrência de culpa dos próprios Autores, pois a tardia denúncia dos danos contribuiu necessariamente para o seu agravamento, defendendo-se no final por impugnação no que respeita a grande parte da factualidade alegada na petição inicial.

Terminou pedindo a sua absolvição da instância e do pedido, requerendo ainda a intervenção principal da seguradora “Y – Companhia de Seguros, S.A.”, para quem havia transferido a responsabilidade civil decorrente de danos emergentes da empreitada.

Os 1ºs Réus também contestaram (fls. 56 a 69 do processo físico), nos termos constantes de fls. 170 a 189, excepcionando igualmente a prescrição do direito à reparação, pois as obras tiveram efectivamente o seu início em 16-11-2009 e a demolição ficou completamente concluída em meados de Janeiro de 2010.

Impugnaram, também, que as obras realizadas tenham causado quaisquer danos no prédio dos Autores, até porque a parede que confinava com o prédio dos 1ºs Réus foi protegida da entrada das águas pluviais e alegaram não ter tido qualquer intervenção na direcção da obra, a qual foi efectuada pela 2ª. Ré, pelo que apenas esta poderá ser responsabilizada pelos alegados danos.

Por fim, também invocam o abuso de direito, dado o lapso temporal que mediou entre a demolição e a denúncia dos danos, responsabilizando os Autores pelo agravamento dos mesmos.
Concluíram, pedindo a improcedência da acção.

Por despacho de 03-10-2014 (fls. 211 e 212 do processo físico) foi admitida a intervenção principal da seguradora “Y – Companhia de Seguros, S.A.”.

A mesma apresentou também a sua contestação (fls. 221 a 229 do processo físico), arguindo de igual forma a prescrição do direito com os mesmos fundamentos e excepcionando a exclusão dos danos invocados nas coberturas do contrato de seguro.

A 2ª. Ré respondeu às exceções deduzidas pela seguradora (fls. 248 a 251 do processo físico).

Procedeu-se a uma audiência prévia (cfr. acta de 27-05-2016, a fls. 335 a 340 do processo físico), no decurso da qual foi proferido despacho saneador, onde foi negado provimento à excepção dilatória de ilegitimidade que havia sido deduzida pela 2ª. Ré na sua contestação, enquanto o conhecimento das restantes excepções (peremptórias) de prescrição e abuso de direito foi relegado para final.

De seguida foi fixado o objecto do litígio e foram elaborados os temas da prova.

Procedeu-se seguidamente a julgamento.

Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“julgar procedente a exceção perentória de prescrição do direito invocado pela Autora, deduzida pelos Réus e, em consequência, julgar improcedente a presente acção, absolvendo os Réus do pedido.”

Inconformados como o decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:

I - O presente recurso vem interposto da sentença final em que julgou procedente a exceção da prescrição, e consequentemente absolveu os Recorridos, do pedido.
II - Da matéria assente como provada, não restam dúvidas de que sobre os Recorridos recai o dever de indemnizar os Recorrentes, a título de responsabilidade cível extracontratual, resultante da prática de factos ilícitos.
III - Os Recorridos levaram a cabo obra de reconstrução de prédio contíguo ao dos Recorrentes, em pleno centro histórico de Braga.
IV - Os Recorridos ao invocarem a prescrição, cabia-lhes o ónus da prova dos fados respetivos, nos exatos termos previstos nos artigos 342º nº 2 do CC e 264º nº 1 do CPC competindo-lhes, tratando-se de factos continuados, invocar e provar factos que permitam efetuar uma discriminação temporal entre as omissões que lhes são imputadas e os respectivos danos, para que alguns possam caber no aludido prazo de 3 anos".
V - Os Recorrentes, não lograram provar em que data os Recorrentes, tiveram conhecimento dos danos, nem dos iniciais, nem dos que se seguiram, como era de seu ónus.
VI - A exceção perentória da prescrição, deveria ter sido julgada improcedente, pois in casu, os danos foram ocorrendo sucessivamente no tempo, e os Recorridos não lograram provar que todos os danos alegados pelos Recorrentes foram conhecidos de forma imediata e instantânea. Atente-se no excerto infra do Ac. TRGuimarães de 23.10.2012:

"De acordo com o disposto no artigo 486º do Código Civil as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando há, por força da lei, o dever de praticar o acto omitido, o que acontece quando o proprietário, por inércia, cria ou mantém uma situação de perigo provocada pelas coisas que lhe pertencem, vindo estas a provocar danos na esfera pessoal ou patrimonial de terceiros.

Nas situações em que o lesado tem conhecimento do facto danoso (e, inerentemente, do direito que lhe compete) logo que o mesmo ocorre, começa de imediato a correr o prazo prescricional caso o facto ilícito alegado tenha natureza instantânea.

No entanto, se as omissões de que emerge a responsabilidade traduzem factos« continuados e se prolongam no tempo, mantendo-se igualmente uma produção de danos, não sendo possível efectuar uma destrinça entre os diversos momentos temporais que desde tal altura ocorreram àqueles atinentes, o prazo de prescrição de três anos só começa a contar a partir do momento em que o lesado tomou conhecimento da produção efectiva de todos os danos, uma vez que as obrigações futuras só prescrevem no prazo de três anos contados do momento em que cada uma seja exigível (ou conhecida) pelo lesado.
VI - O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia; está presente, desde logo, na norma do art. 334.° do CC, que, ao falar nos limites impostos pela boa-fé ao exercício dos direitos, pretende por essa via assegurar a proteção da confiança legítima que o comportamento contraditório do titular do direito possa ter gerado na contraparte".
VII - No caso sub judice, resulta mais do que claro que todos estes pressupostos se encontram cumpridos:

- Existência dum comportamento anterior do agente suscetível de basear uma situação objetiva de confiança - os Recorridos, com as sucessivas promessas de reparação, criaram nos Autores a convicção de que o prédio sofreria as obras necessárias;
- Imputabilidade das duas condutas (anterior e atual) ao agente - quer a conduta inicial, de tranquilizar os Recorrentes, quer a conduta atual de, em juízo, negar proceder às reparações com as quais se haviam previamente comprometido, são imputáveis aos Recorridos.
- Boa-fé do lesado (confiante) - que, in casu, se verifica, pois, os Recorrentes foram protelando intentar a ação judicial por estarem confiantes nas boas intenções dos Recorridos.
VIII - Não será, mais do que óbvio, que estamos na presença de um gritante caso de abuso de direito, na sua modalidade de venire contra factum proprium.
IX - A prova documental junta aos autos e a prova testemunhal produzida conduz obrigatoriamente a uma decisão diversa da recorrida, daí a impugnação da matéria de facto com vista à reapreciação e modificação por V.Ex.ªs. com cabal cumprimento do ónus imposto aos Recorrentes pelo art.640º n.º1, als. a), b) e c) do CPC., a saber:

- OS CONCRETOS PONTOS DE FACTO QUE SE CONSIDERA INCORRET AMENTE JULGADOS

Dos factos não provados:

a) As obras iniciaram-se em meados do mês de dezembro de 2010,
b) As conversações referidas em 9° visaram proceder à execução de obras tendentes à reparação dos danos ocorridos no prédio referido em 1°.
c) Os 1.ºs e 2.ª RR. prometeram sucessivamente a execução de obras de reparação e foram sucessivamente protelando a dita.
d) Antes das obras no prédio referido em 2°, o prédio aludido em 1° apresentava-se em ótimas condições de conservação.
e) Os AA. sempre cuidaram da sua manutenção, zelando pela sua conservação, cientes do significativo valor patrimonial que aquele edifício possui, atenta quer a sua excelente localização, quer a sua arquitectura (exterior/interior).
- A INDICAÇÃO DOS CONCRETOS MEIOS PROBATÓRIOS Depoimentos prestados pelas seguintes testemunhas:
- PAULO, gravado em sistema áudio na sessão de julgamento do dia 24.11.17, de 11.07.31 às 11.42.36
- MANUELA, depoimento gravado no sistema áudio, na sessão de julgamento do dia 24.11.17, das 11.43.51 às 12.04.23
- A DECISÃO QUE, NO SEU ENTENDER DEVE SER PROFERIDA SOBRE AS QUESTOES DE FACTO IMPUGNADAS - 3.° ónus, da al. c), do n.ºl, do art.640.º CPC,

Os factos dados como NÃO PROVADOS que deveriam ter seguido no sentido de PROVADOS, a saber:

a) As obras iniciaram-se em inícios/meados do mês de dezembro de 2010,
b) As conversações referidas em 9° visaram proceder à execução de obras tendentes à reparação dos danos ocorridos no prédio referido em 1°.
c) Os 1.ºs e 2.ª RR. prometeram sucessivamente a execução de obras de reparação e foram sucessivamente protelando a dita.
d) Antes das obras no prédio referido em 2°, o prédio aludido em 1° apresentava-se em ótimas condições de conservação.
e) Os AA. sempre cuidaram da sua manutenção, zelando pela sua conservação, cientes do significativo valor patrimonial que aquele edifício possui, atenta quer a sua excelente localização, quer a sua arquitectura (exterior/interior).
X - A ter decidido como decidiu, o Juiz a quo, fez errada interpretação e valoração da prova.
XI - O princípio da livre apreciação da prova é balizado por um lado, pelo princípio da legalidade e, por outro, pelo princípio das regras do experienciar humano.
XII - A sentença a quo, violou o princípio das regras da experiência comum, na medida em que, não fez apelo algum, à normal contexto da realidade a que o caso em concreto respeita.
XIII - Os Recorridos, nunca poderiam ter iniciado e concluído as obras de demolição, atendendo a que o Inverno de 2009/2010 foi um dos mais rigorosos dos últimos sete anos, de acordo com os dados do Boletim do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, cf. sítio na Internet www.ipma.pt, sendo elevado o risco de derrocada atenta a natureza dos trabalhos - demolição.
XIV - Os Recorridos efetuaram vistoria em setembro de 2011 ao prédio dos Recorrentes.
XV - os Recorridos ao elaborarem o relatório em finais de 2011, e ao apontarem solução da sua autoria para os danos à data visíveis, assumiram, reconheceram a sua responsabilidade.
XVI - Não obstante a sucessão continuada dos danos no tempo, o direito de ação por banda dos Recorrentes, nunca estaria prescrito em dezembro de 2013, dada a conduta manifestada pelos Recorridos, ao longo de 2011, 2012 e 2013, conforme resulta da prova que ora se pretende ver reapreciada e modificada.
XVII- Antes da propositura da ação judicial, as mandatárias das partes, trocaram correspondência, cuja junção se protesta, após o levantamento do sigilo profissional por parte da Ordem dos advogados, por ser relevante para a apreciação da questão do abuso de direito que neste recurso se coloca.
XVIII - Os Recorridos intentaram tempestivamente a ação, a que foram forçados após a inércia dos Recorridos em concretizarem a prometida intervenção com vista à reparação dos defeitos.
XVIII - Os Recorridos devem pois, responder por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados, de resto apurados e dados como provados.
XIX - a sentença recorrida não fez correta aplicação da lei, nomeadamente do princípio da livre apreciação da prova, do princípio da boa-fé e da confiança, bem como não fez operar o instituto do abuso do direito, face à prova produzida como podia e devia.
XX- Ao assim ter decidido, o Mmo Juiz a quo, e com o devido respeito, não alcançou a verdade material do pleito, e a consequente justiça, fazendo prevalecer o direito adjetivo em manifesto errar injudicando, erro de julgamento, em virtude da distorção da realidade factual de que a sentença a quo enferma..”

Houve contra-alegações dos primeiros e segunda ré réus que pugnaram pelo decidido, requerendo os réus João e esposa MARIA, subsidiariamente, a ampliação do recurso na vertente do facto, formulando as seguintes conclusões:

l º Na fase de recurso, a junção ao processo de documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção, só é possível se a sua junção se tiver tomado necessária em virtude do julgamento proferido na lª instância, em respeito aos princípios da (in)disponibilidade e da necessidade.
Cumprindo-se os requisitos estatuídos pela lei adjectiva para essa junção, em fase de recurso a mesma só será possível com as alegações respectivas, nunca após esta, atenta e estrita formalidade dos recursos.
Pelo que, aos apelantes está vedada a junção ao recurso do documento que pretendem/protestam juntar, mas nem sequer juntaram, por imposição legal e por não se verificarem, nem sequer terem sido alegados, os pressupostos legais impositivos para o efeito.
Não há, no processo, qualquer meio probatório que imponha, ou justifique, a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto considerada não provada nas alíneas a), b), c), d) e e), dos factos não provados na sentença, sendo certo que, quanto à matéria de facto vertida naquela alínea a), qualquer alteração sempre seria contraditória com a matéria de facto provada e assente no ponto 5. dos factos provados na sentença e não impugnados no recurso, e a quanto à matéria de facto vertida naquelas alíneas d) e e) os AA/apelantes não indicaram qualquer meio de prova, mormente de prova gravada, que impusesse, ou até permitisse, a pretendida alteração, pelo que, quanto a esta parte o recurso deverá ser rejeitado.
Não ocorrendo qualquer alteração à decisão sobre a matéria de facto, por não se verificar qualquer erro de julgamento da mesma, o direito aplicado na sentença aos factos considerados provados é o correcto e adequado, pelo que, tem de concluir-se pela total improcedência do recurso.
Se, porém, assim se não considerasse, o que se concede por mera cautela e dever de patrocínio, e se decidisse a questão de saber quem é a entidade responsável pelo pagamento da indemnização que fosse devida aos AA/apelantes, teria de decidir-se, subsidiariamente e em ampliação ao recurso de apelação dos AA/apelantes, ser a 2ª Ré essa entidade, por ser o empreiteiro quem, durante a execução da obra de demolição causadora dos danos no prédio dos AA/apelantes, deteve a posse do prédio dos 1ºs RR., foi o autor e executor dessa obra perigosa pela sua própria natureza (considerando as características próprias dos prédios envolvidos), quem tinha o dever de a vigiar, quem deu causa culposa aos referidos danos e quem, ainda, declarou assumir toda a responsabilidade inerente a essa obra.
7 Devendo, ainda, nessa ampliação subsidiária do recurso de apelação, aditar-se à matéria de facto provada os dois factos referidos em 93. supra, aqui considerados reproduzidos por razões de brevidade, por estarem provados por documentos e pelo depoimento da testemunha Engº Fernando.

Termos em que, deve o recurso de apelação ser considerado totalmente improcedente, mantendo-se a sentença recorrida na íntegra, só assim se fazendo a usual e esperada
Justiça.

Se, porém, assim se não entender, como anteriormente concedido por mera cautela e dever de patrocínio, e vier a decidir-se procedente o recurso de apelação e a questão da entidade responsável pela reparação dos danos sofridos pelos AA/apelantes, deve proferir-se douto Acórdão que decida ser essa entidade a 2ª Ré, sem prejuízo da transferência da sua responsabilidade para a sua companhia de seguros chamada, mantendo-se a absolvição dos 1 ºs RR. dos pedidos, só assim se fazendo a usual e esperada
Justiça.”

Das conclusões do recurso e da sua ampliação na vertente do facto ressaltam as seguintes questões:

A. Recurso dos autores

1. Alteração das respostas negativas para positivas aos pontos de facto das alíneas a) a e) da matéria de facto não provada da decisão recorrida.
2. Se em face da alteração proposta às respostas dos pontos de facto impugnados deve ser julgada improcedente a exceção de prescrição invocada.
3. Se há abuso de direito na invocação da prescrição.

B. Ampliação do recurso suscitada pelos 1ºs réus.

1. Aditamento dos seguintes factos:

a. Em 31 de Agosto de 2009 a 2ª Ré emitiu um documento, denominado “Declaração de Responsabilidade” , com o seguinte teor:

X CONSTRUÇÕES, LDA., contribuinte nº …, titular do certificado de classificação de construção civil nº …, inscrita no Instituto da Construção e do Imobiliário em 15/10/2007, com sede na Quinta …, freguesia de ..., concelho de Vila Verde, declara nos termos do Regulamento Municipal de Edificações Urbanas em vigor no concelho e demais disposições legais aplicáveis, que assume a responsabilidade pela execução e direcção da obra de construção civil, pertencente a João, com residência na Rua ..., concelho de Braga, portadora do BI. nº ..., incluindo toda a responsabilidade inerente à mesma.
( ... )
b. A obra de demolição do prédio referido em 2 implicava especiais cuidados pela 2ª Ré, atendendo à antiguidade do prédio referido em 1º, contíguo àquele.”
2. Se houver procedência da apelação a responsabilidade pelos danos provocados é da 2ª ré.

Vamos conhecer das questões enunciadas.

A.1 Alteração das respostas negativas para positivas aos pontos de facto das alíneas a) a e) da matéria de facto não provada da decisão recorrida.

Para a alteração proposta, os apelantes indicaram a reapreciação de excertos dos depoimentos das testemunhas PAULO e MANUELA, conjugados com o relatório de vistoria da autoria do Eng. Civil Jorge, datado de 28 de outubro de 2011, referente ao prédio dos autores.

Por sua vez a 2ª ré indicou a reapreciação de excertos do depoimento da testemunha Paulo, à perícia colegial, com os esclarecimentos dos peritos, para concluir que as obras tiveram o seu início nos finais do ano de 2009 e princípios de 2010, que não assumiu qualquer responsabilidade sobre a reparação dos danos causados no prédio dos autores.

Os primeiros réus, nas suas contra-alegações, indicaram a reapreciação dos excertos dos depoimentos das testemunhas Paulo, MANUELA, Fernando e José conjugados com o relatório pericial junto aos autos, para concluírem que as obras se iniciaram em finais de 2009 e princípios de 2010 e não em dezembro de 2010, e não houve assunção de responsabilidade na reparação de danos causados no prédio dos autores.

Os pontos da matéria de facto não provada, cuja reversão os apelantes pretendem ver concretizada:

a) As obras iniciaram-se em meados do mês de dezembro de 2010,
b) As conversações referidas em 9º visaram proceder à execução de obras tendentes à reparação dos danos ocorridos no prédio referido em 1º.
c) Os 1.ºs e 2.ª RR. prometeram sucessivamente a execução de obras de reparação e foram sucessivamente protelando a dita.
d) Antes das obras no prédio referido em 2º, o prédio aludido em 1º apresentava-se em ótimas condições de conservação.
e) Os AA. sempre cuidaram da sua manutenção, zelando pela sua conservação, cientes do significativo valor patrimonial que aquele edifício possui, atenta quer a sua excelente localização, quer a sua arquitectura (exterior/interior).

Por uma questão de metodologia vamos dividir as várias alíneas em três grupos, composto o primeiro pela alínea a), o segundo pelas alíneas b) e c) e o terceiro pelas alíneas d) e e).

Na alínea a) discute-se o início das obras. Se ocorreu entre novembro de 2009 e fevereiro de 2010 ou se em dezembro de 2010.

O tribunal recorrido julgou não provado que as obras tivessem o seu início no mês de dezembro de 2010, formando a sua convicção no depoimento das testemunhas Paulo e esposa MANUELA, filho e nora dos autores, que viviam no prédio, na carta escrita assinada pelo Paulo e datada de 28/12/2010 a comunicar à 2ª ré os danos que se estavam a verificar no prédio dos autores, com incidência na parede meeira, no depoimento das testemunhas Fernando, eng. Civil que acompanhou a obra no período de demolição, entre novembro de 2009 e fevereiro de 2010, José, eng. civil que entrou para a empresa, 2ª ré, em agosto de 2010, para o setor da segurança, e que constatou que a obra estava em reconstrução, com paredes e tetos e o relatório pericial colegial, com os esclarecimentos dos respetivos peritos.

Reapreciados estes elementos de prova indicados pelas partes e conjugando-os entre si, concluímos que as obras de demolição tiveram o seu início nos finais do ano de 2009, entre novembro e dezembro de 2009, prolongando-se por cerca de 3 meses. Os depoimentos das testemunhas Paulo e esposa não foram convincentes, nesta parte, face aos outros elementos de prova mais objectivos, como o relatório pericial colegial e respetivos esclarecimentos dos peritos, que identificaram partes do livro de obra que apontam a demolição para novembro/dezembro de 2009, com duração de cerca de 3 meses, tendo havido um período de suspensão da obra, para além do depoimento do eng. civil Fernando, amigo dos autores e dos réus e conhecedor da idoneidade da 2ª ré, que acompanhou a obra de demolição, revelando-se isento e objetivo. Para além de a obra já estar em reconstrução, com paredes e tetos em agosto de 2010, como o referiu o eng. José, que entrou para a empresa, 2ª ré, nesse mês. Seria incompreensível que a demolição tivesse o seu início em dezembro de 2010, como o afirmaram, veementemente, as testemunhas Paulo e esposa Manuela, para justificarem que os danos sugiram nesse mês. Em face do exposto é de manter a resposta ao ponto de facto da al.a).

As alíneas b) e c) dizem respeito a conversações entre autores e primeiros réus e 2ª ré para a execução de obras no prédio daqueles, com vista à eliminação dos danos, comprometendo-se a fazê-las, adiando-as sucessivamente.

O tribunal recorrido respondeu negativamente a estes pontos de facto, porque não se convenceu da sua ocorrência, por falta de especificação de circunstâncias concretas que levassem a essa conclusão, por parte dos depoimentos das testemunhas Paulo e esposa Manuela.

Sobre esta matéria os apelantes destacam excertos destes depoimentos, o relatório da vistoria ao seu prédio, de novembro de 2011, para concluírem pelo reconhecimento dos primeiros réus e 2ª ré das responsabilidades na reparação dos danos e pela confiança transmitida de que as realizariam.

Da análise desta prova temos a destacar a carta enviada pela testemunha Paulo à segunda ré a 29/12/2010, a enviada aos primeiros réus, em março de 2011, que não foi reclamada e um relatório de uma vistoria levada a cabo ao prédio dos autores a 28/09/2011, pelo eng. civil Jorge, a mando dos primeiros réus e segunda ré, datado de 28/10/2011, que foi remetido aos autores e que se encontra junto a fls. 13 a 15, em que foram reconhecidas fissuras nas paredes confinantes com a parede meeira, infiltrações de água nesta parede provocadas pela falta de isolamento da empena que fica acima do telhado do prédio dos autores, e apontadas as soluções com vista a serem corrigidas as patologias.

Dos depoimentos das testemunhas Paulo e esposa Manuela resulta que o dono da obra visitou algumas vezes o prédio dos autores e tranquilizou-os no sentido de que as obras de reparação iriam ser executadas e que foi realizada uma vistoria para fazer o levantamento dos danos provocados pela execução da obra em curso. Pelo lado da 2ª ré o encarregado da obra colocou chapas no telhado e plásticos para minorar os estragos. Nunca foi dado um prazo certo para a execução das obras, mas estavam à espera que as obras terminassem. Isto é o comum em situações destas, porque só quando termina a obra acabam os eventuais danos e tudo é resolvido no final, para evitar reparações duplas ou mais.

Da conjugação destes elementos de prova, com destaque para a vistoria levada a cabo em 28/09/2011, e apresentado o respetivo relatório ao autores, datado de 28/10/2011, é de concluir que os primeiros réus e a 2ª ré tiveram um conhecimento profundo da situação do prédio dos autores, souberam das soluções a concretizar para a eliminação das patologias, e com o envio do mesmo aos autores reconheceram o direito dos autores à reparação das patologias, criaram-lhes a convicção, a confiança que iriam honrar o prometido nas visitas que o réu marido fizera ao seu prédio. Julgamos que este comportamento é suficiente para a alteração das respostas aos pontos de facto das alíneas b) e c) da matéria de facto não provada, neste sentido:

“ Em face da comunicação dos autores através da carta enviada à 2ª ré a 29/12/2010 e aos primeiros réus a 31/03/2011 e do relatório de vistoria ao prédio dos autores de 28/10/2010, aqueles encetaram conversações e comprometeram-se a realizar as obras nele apontadas, o que não concretizaram”.

Os pontos de facto d) e e) da matéria de facto não provada diz respeito à situação do prédio dos autores antes do inico das obras no prédio dos primeiros réus, em que os autores alegaram nos artigos 30 e 31 da petição inicial que se “.. apresentava em óptimas condições de conservação …sempre cuidaram da sua manutenção, zelando pela sua conservação..”.

Os primeiros réus opuseram-se à alteração das respostas a estes pontos de facto porque não indicaram meios de prova no sentido da sua reversão, pelo menos gravada. Têm razão no que tange à omissão de prova gravada. Mas apontaram prova documental junta aos autos, o que é suficiente para cumprirem o ónus imposto pelo artigo 640 n.º 1 al. b) do CPC.

Da análise do relatório da perícia colegial e das fotografias juntas para o suportar, é de concluir que o prédio dos autores, nas partes onde não sofreram infiltrações de águas na parede meeira e nas confinantes, com as obras realizadas no prédio dos primeiros réus, encontrava-se pintado e limpo, o que revela que os autores cuidavam dele, pintando-o. E isto está em consonância com o depoimento da testemunha PAULO, que revisitamos através do sistema áudio, oficiosamente, nos termos do artigo 662 n.º 1 do CPC. Daí que as respostas em causa devam ser alteradas nos seguintes termos: “ Antes do início das obras no prédio dos primeiros réus as paredes interiores do prédio dos autores encontravam-se pintadas e sem fissuras”.

B.1
a. Em 31 de Agosto de 2009 a 2ª Ré emitiu um documento, denominado “Declaração de Responsabilidade”, com o seguinte teor:

X CONSTRUÇÕES, LDA., contribuinte nº ..., titular do certificado de classificação de construção civil nº ..., inscrita no Instituto da Construção e do Imobiliário em 15/10/2007, com sede na Quinta ..., freguesia de ..., concelho de Vila Verde, declara nos termos do Regulamento Municipal de Edificações Urbanas em vigor no concelho e demais disposições legais aplicáveis, que assume a responsabilidade pela execução e direcção da obra de construção civil, pertencente a João, com residência na Rua ..., concelho de Braga, portadora do BI. nº ..., incluindo toda a responsabilidade inerente à mesma.
( ...)
b. A obra de demolição do prédio referido em 2 implicava especiais cuidados pela 2ª Ré, atendendo à antiguidade do prédio referido em 1º contíguo àquele.”

Os primeiros réus pretendem o aditamento desta matéria de facto, que consideram provada a al. a) por documentos juntos aos autos e a al. b) por depoimento da testemunha eng. Fernando.

No que tange à matéria da al. a), que foi alegada na contestação e encontra-se provada pelo documento de fls. 71, é de admitir o seu aditamento.

No que concerne à matéria de facto da al. b), julgamos que integra factos essenciais, que não foram alegados pelos primeiros réus, pelo que não são de admitir nos termos do artigo 5º n.º 1 do CPC.

Assim vamos aditar à matéria de facto provada a da al. a).

Vamos fixar a matéria de facto considerada provada:

1. Encontra-se inscrito, em data anterior a 1951, na matriz predial urbana sob o art. ....º, da freguesia de ... (Braga), do concelho de Braga e descrito na C.R.Predial sob o n.º ..., onde a respectiva aquisição se encontra inscrita a favor dos Autores, o prédio urbano composto por três andares e águas furtadas.
2. Contíguo a este prédio, à esquerda deste (para quem se encontra de frente para o mesmo), na mencionada rua, freguesia e concelho, com os nºs de polícia … a …, situa-se um prédio urbano pertencente aos 1ºs Réus.
3. Ambos os prédios encontram-se inseridos no Centro Histórico da Cidade de Braga, cujas construções remontam há mais de 50 anos.
4. Os 1ºs Réus celebraram com a 2.ª Ré um contrato de empreitada, mediante o qual esta última se obrigou a realizar a obra de demolição e reconstrução do prédio urbano referido em 2º.
5. As obras iniciaram-se entre Novembro e Dezembro de 2009 com a demolição da construção existente, que teve a duração de entre 2 a 3 meses e, em Agosto de 2010, a construção que se encontrava em curso no prédio referido em 2º já dispunha de paredes e tecto.
6. Como consequência directa e necessária das obras de demolição do prédio referido em 2º, o prédio referido em 1º sofreu:

- na empenha lateral esquerda do, contígua àquele outro prédio, fissuração vertical em toda a extensão da parede meeira abarcando todos os três pisos e as águas furtadas;
- fissuração estrutural da ligação das paredes de tabique ortogonais à parede meeira da empena e do próprio tecto dos respectivos compartimentos, com maior magnitude a partir do piso 2 até ao sótão;
- infiltrações de humidade em revestimento de parede meeira;
- infiltração de humidade em tectos dos compartimentos confinantes com a parede meeira;
- infiltração de humidade em revestimento de pavimentos dos compartimentos confinantes com a parede meeira;
- infiltração de humidade nas paredes divisórias de tabique ortogonais à parede meeira;
- infiltração de humidade nas costas dos móveis de madeira encostados à parede meeira;
- infiltração de humidade na própria estrutura da parede meeira em tabique, a partir do piso 2 até ao sótão;
- empenamentos de portas e janelas;
- desníveis de pavimentos;
- deslocamento vertical junto aos cantos de paredes.
7. As referidas infiltrações de humidade inutilizaram um roupeiro de quarto, um móvel de quarto, uma porta de acesso à cozinha e um móvel de cozinha.
8. Em 28 de Dezembro de 2010, o filho dos AA., PAULO, também morador (ele e o respetivo agregado) naquele referido prédio, remeteu à 2ª. Ré uma carta registada com aviso de receção, recebida no dia seguinte, indicando como assunto “Danos causados pela obra na r.Sta Margarida” (danos que à data eram visíveis) com o seguinte teor:
“Serve a presente para vos comunicar que desde o início da reconstrução que a vossa empresa se encontra a efectuar no edifício contínuo à minha casa; que a mesma tem causado vários danos na minha residência.
A parede da minha sala jantar inclinou.
As paredes da sala jantar, de dois quartos e da caixa de escada apresentam fissuras algumas delas bastantes consideráveis, a tinta encontra-se toda levantada e as mesmas estão cheias de humidade; devido às várias infiltrações de água que ocorreram durante os períodos de chuva, os tectos e chão junto das ditas paredes encontram-se húmidos o que pode provocar o apodrecimento dos mesmos uma vez que estes são em madeira, o mesmo acontece com os móveis, que se encontram nesses locais.
Com o passar do tempo esta situação tem vindo a sofrer um agravamento considerável o que está a tornar a habitabilidade de minha casa cada vez mais difícil.

Assim sendo solicito que vexas tomem as diligências necessárias no mais curto espaço de tempo para assim se evitar danos maiores.
Solicito também que procedam o mais rápido possível à reparação de todos os danos já causados.
(…)”
9. A esta carta a 2.ª R. respondeu, no sentido de que deveriam contactar o dono da obra.
10. Os AA., por intermédio do seu filho, enviaram aos 1ºs RR., a 30 Março de 2011, uma carta registada com aviso de receção, que veio devolvida.
11. Por intermédio da então Mandatária dos AA., Dr.ª Bárbara, em contacto com a Mandatária dos 1.ºs RR., Dr.ª Ana, foram desenvolvidos contactos e conversações.
12. Por solicitação do 1º Réu e de um colaborador da 2ª. Ré, em 28 de Setembro de 2011 foi efectuada uma vistoria aos referidos prédios e foi elaborado um relatório datado de 28 de outubro de 2011, no qual o técnico subscritor propôs a colocação de rufos em chapa zincada ou pré-lacada ao longo de toda a empena bem como o revestimento daquela empena através de forra em chapa nervurada lacada aplicada sobre a alvenaria existente.
13. Em data não apurada, mas não anterior a 28-09-2011, os Réus colocaram nessa empena tela plástica e chapas metálicas.
14. As patologias e estragos referidos em 6º e 7º são passíveis de reparação, ascendendo o valor do encargo necessário para esse fim e para a reposição do imóvel no estado anterior a € 45.000,00.
15. No imóvel referido em 1º vivem os AA., dois filhos dos mesmos, nora e netas, o qual constitui a sua única casa de morada de família.
16. Por via dos danos causados, uma sala e um quarto existentes nesse prédio encontram-se fechados e inabitáveis.
17. A sala de jantar esconde por detrás de um móvel, fungos (cogumelos).
18. Os AA. sentem desgosto e tristeza com o estado em que se encontra a sua casa de habitação.
19“ Em face da comunicação dos autores através da carta enviada à 2ª ré a 29/12/2010 e aos primeiros réus a 31/03/2011 e do relatório de vistoria ao prédio dos autores de 28/10/2010, aqueles encetaram conversações e comprometeram-se a realizar as obras nele apontadas, o que não concretizaram”.
20“Antes do início das obras no prédio dos primeiros réus as paredes interiores do prédio dos autores encontravam-se pintadas e sem fissuras”.
21 “Em 31 de Agosto de 2009 a 2ª Ré emitiu um documento, denominado “Declaração de Responsabilidade”, com o seguinte teor:

X CONSTRUÇÕES, LDA., contribuinte n' ..., titular do certificado de classificação de construção civil nº ..., inscrita no Instituto da Construção e do Imobiliário em 15/10/2007, com sede na Quinta ..., freguesia de ..., concelho de Vila Verde, declara nos termos do Regulamento Municipal de Edificações Urbanas em vigor no concelho e demais disposições legais aplicáveis, que assume a responsabilidade pela execução e direcção da obra de construção civil, pertencente a João, com residência na Rua ..., concelho de Braga, portadora do BI. nº ..., incluindo toda a responsabilidade inerente à mesma”.

A.2 Se em face da alteração proposta às respostas dos pontos de facto impugnados deve ser julgada improcedente a exceção de prescrição invocada.

Esta questão está conexa com o momento em que apareceram os danos no prédio dos autores, o momento do seu conhecimento e as consequências jurídicas daí emergentes para os autores.

O tribunal recorrido considerou prescrito o direito dos autores porque tiveram conhecimento do seu direito três anos antes da citação dos réus, não se estando perante uma situação de facto continuado e não tendo ocorrido qualquer circunstância interruptiva da prescrição previstas no artigo 323 e seguintes do C.Civil.

Os apelantes defendem que se está perante uma situação de facto continuado e não instantâneo, cujos danos se foram revelando ao longo das obras realizadas no prédio dos primeiros réus, e não no ato de demolição, em si, mas durante todo o período de reconstrução até à eliminação da fonte dos danos, colocação de chapas na empena e rufos para escoamento das águas pluviais junto ao telhado do prédio dos autores.

Da petição inicial resulta que os autores centraram todos os danos visíveis entre meados e finais do mês de dezembro de 2010, emergentes do início das obras de demolição e reconstrução do prédio dos primeiros réus. Isto revela que os danos, na perspetiva dos autores, foram provocados por este ato de intervenção, neste período de tempo, que se traduz num facto instantâneo, gerador de danos que os autores tomaram conhecimento e consciencializaram-se do direito que tinham à reparação.

Todos os réus suscitaram a prescrição do direito porque entenderam que os autores tiveram de ter conhecimento do seu direito muito antes, porque a obra no prédio dos primeiros réus teve início em novembro/dezembro de 2009, pelo que os danos apontados na carta envidada à 2ª ré ocorreram, necessariamente, num prazo de 2 a 3 meses.

Tendo ficado provado que o início das obras ocorreu entre novembro e dezembro de 2009, tendo a demolição durado 2/3 meses e em agosto o prédio já tinha paredes e tetos, é de concluir que os danos indicados na carta de 28/12/2010 já se teriam consolidado antes desta data, e os autores já tinham interiorizado o direito à reparação, pelo que não beneficiam do prazo de cinco dias previsto no artigo 323 n.º 2 do C.Civil, atento o requerimento de citação urgente, para efeitos da interrupção da prescrição, porque o prazo é anterior a 28/12/2010.

Questiona-se a interrupção da prescrição, que não foi considerada pelo tribunal recorrido, por falta de prova dos factos das alíneas b) e c) da matéria de facto não provada. Com a alteração introduzida pela resposta a estes pontos de facto questionados, plasmada no ponto 19 da matéria de facto provada, é de concluir que os primeiros réus e a 2ª ré tiveram conhecimento dos danos provocados no prédio dos autores, oriundos da intervenção no prédio dos primeiros réus pela 2ª ré, e assumiram o compromisso de os reparar. Isto é a expressão de quem reconhece o direito dos autores à reparação dos danos. Esse reconhecimento verifica-se, pelo menos, a partir da data do relatório de vistoria – 28/10/2011. Pois não faria sentido que os réus tivessem enviado este relatório aos autores, se não reconhecessem o seu direito à reparação, face à sua transparência e ao facto de terem ordenado a respetiva vistoria. Daí que julgamos que a prescrição do direito dos autores foi interrompida ao abrigo do disposto no artigo 325 n.º 1 e 2 do C.Civil.

Assim, o prazo conta-se a partir, pelo menos, de 28/10/2011, data do relatório. Tendo os primeiros réus sido citados a 31/12/2013 e a 2º ré a 2/01/2014 (doc. fls. 16,17 e 18) é de concluir que o direito dos autores não prescreveu, porque não decorreram os 3 anos previstos no artigo 498 nº 1 do C.Civil.

A.3 Se há abuso de direito na invocação da prescrição.

Os apelantes suscitam o abuso de direito na vertente do “venire contra factum proprium”, apoiando-se nos factos alegados nos artigos 21 a 27 da petição inicial e materializados nas respostas negativas às alíneas b) e c) da matéria de facto não provada, no pressuposto da sua reversão para respostas positivas.

Com a alteração dada às respostas das alíneas b) e c) da matéria de facto não provada, materializada no ponto 19 da matéria de facto provada, os réus reconheceram os danos provocados no prédio dos autores pela intervenção no prédio dos primeiros réus, por parte da segunda ré, e comprometeram-se na sua eliminação. Este facto criou a confiança necessária nos autores no sentido de que o compromisso iria ser cumprido. A invocação da prescrição revela-se num comportamento contraditório e violador da confiança gerada. Daí que tenham agido de má-fé, aproveitando o instituto da prescrição, para não cumprirem o que prometeram.

Assim julgamos que se verificam os pressupostos do abuso do direito na vertente invocada, que neutraliza o exercício do direito de alegar a prescrição como forma de extinção do direito dos autores, porque um exercício ilegítimo, caso não tivesse sido interrompida a prescrição, como decidido em 2.

B.2 Se houver procedência da apelação a responsabilidade pelos danos provocados é da 2ª ré.

Depois de decida a questão da prescrição, vamos conhecer dos pedidos formulados na petição inicial, que se traduzem na determinação dos responsáveis pelos danos provocados no prédio dos autores através da restauração natural, indemnização e compensação relativamente a danos morais.

Da análise da matéria de facto provada resulta que a 2ª ré, na execução do contrato de empreitada, que celebrou com os primeiros réus, provocou danos no prédio dos autores, violando o seu direito de propriedade, de forma culposa, porque não cumpriu com todas as regras da arte de reabilitar imóveis contíguos, que impunham que na execução da demolição do prédio não deixasse desamparado o prédio contíguo na empena lateral esquerda meeira exposta ao tempo, sujeita a infiltrações de humidades, como veio a acontecer, e fissurações na respetiva parede e nas convergentes, por falta de cuidado no desmonte dos elementos que compunham a estrutura interior do prédio dos primeiros réus. Estes danos foram a consequência da atividade negligente da 2ª ré, no exercício da sua atividade, como empresa de construção civil certificada para o efeito, como consta do ponto 21 da matéria de facto provada.

Assim podemos concluir que estamos perante uma situação de responsabilidade civil da 2ª ré, nos termos do artigo 483 do C.Civil, na medida em que se verificam os seus pressupostos – ilicitude, culpa, nexo de causalidade adequada e dano.

Os primeiros réus, enquanto donos da obra, comprometeram-se, perante os autores, a reparar os danos como resulta do ponto de facto 19 da matéria de facto provada, pelo que também são responsáveis pela sua reparação.

Os danos causados e identificados nos pontos de facto provados 6 e 7 podem ser reparados como resulta do ponto 14, sendo o seu custo de 45.000€.

Foi admitida a intervir como parte principal a seguradora Y Companhia de Seguros S.A. que outorgara com a 2ª ré um contrato de seguro de responsabilidade civil, vigente à data do sinistro (fls.211 e 212).

E, na sua contestação, alega a exclusão da sua responsabilidade invocando o disposto no artigo 3º n.º1 als. b), q) e n.º 2 da condição especial 004 e nas condições particulares, que não abarcam os danos provocados, constantes dos autos.

A 2ª ré, na sua resposta, alega que estas cláusulas especiais não lhe foram comunicadas nem são do seu conhecimento, assim como não lhe foi explicado o seu conteúdo, nem estão assinadas por si.

Além disso, o contrato, em si, envolve a construção civil e obras públicas, abarcando o risco em causa, que emerge da atividade de construção civil.

No caso em apreço, não consta da matéria de facto provada que a seguradora tenha comunicado e explicado à 2ª ré o teor das cláusulas especiais invocadas na sua contestação, pelo que são excluídas do contrato ao abrigo do disposto no artigo 8º als. a) e b), conjugado com o artigo 5.º n.º 1 a 3 e 6º do DL. 446/85 de 25/10, cujo ónus da prova impende sobre a seguradora, que quer fazer valer essas cláusulas gerais contra a 2ª ré sua segurada.

Com a exclusão destas cláusulas o contrato de seguro invocado abarca o sinistro, na medida em que não é excluído pelas cláusulas particulares, uma vez que resultou da atividade de reparação de edifício (um dos objetos do contrato) que envolve um conjunto de atos, como o de demolição.

Assim, a seguradora é responsável pela reparação dos danos no prédio dos autores identificados nos pontos de facto 6º e 7º da matéria de facto provada, em substituição da 2ª ré, até ao montante de 45.000€.

Face à matéria de facto não provada dos pontos de facto das als. f), g), h), e j) e à provada do ponto de facto 7 e 14, fica prejudicado o conhecimento do pedido formulado na al. e) da petição inicial.

Os autores pediram a quantia de 15.000€ para compensação dos danos morais sofridos materializada no pedido formulado em f).

Alegaram, em síntese, que o prédio é a sua morada de família, vivendo em conjunto com os seus filhos, nora e netos. Era um lugar aprazível para se viver e agora transformou-se num pesadelo, com quartos repletos de mofo, a sala de jantar com fungos, vivendo com enorme desgosto e tristeza.

Da matéria alegada foi provado apenas o que consta dos pontos de facto 15 a 18 da matéria de facto provada, em que se destaca que os autores, filhos, nora e netas vivem no prédio, com um quarto e uma sala fechados, por inabitáveis, sentindo os autores desgosto e tristeza com o estado em que se encontra a sua habitação.

Julgamos que, da conjugação destes factos com os identificados danos a que o prédio foi sujeito, é de concluir que estamos perante uma situação que merce a tutela do artigo 496 nº 1 do C.Civil. Para compensar estes danos morais, atendendo à gravidade da situação, que envolve a casa de morada de família, onde se passa grande parte da vida, que era um espaço limpo, e agora com problemas de saúde, que obrigou a desativar duas divisórias, desencadeando um desgosto e tristeza, julgamos adequada a quantia de 5.000€.

Fica prejudicado o conhecimento do pedido formulado na al. f), porquanto os montantes fixados para a reparação do prédio e para a compensação dos danos morais abrangem todos os prejuízos conexos com a intervenção no prédio dos primeiros réus, tanto materiais como morais. Não são previsíveis danos futuros emergentes do ato interventivo.

Assim, para concluir, os primeiros réus e a 2ª ré são responsáveis pela reparação dos danos patrimoniais identificados nos pontos 6 e 7 da matéria de facto provada, e ainda pelo pagamento da quantia de 5.000€ a título de danos morais. E a seguradora, em substituição da 2ª ré, é responsável pela reparação dos danos patrimoniais e pela compensação dos danos morais, até ao montante de 50.000€, com a dedução da franquia de 10%, equivalente a 5.000€, que será da responsabilidade da 2ª ré.

Concluindo: 1. O TRG alterou parcialmente as respostas negativas aos pontos de facto das als. b) e c) da matéria de facto não provada, porque se convenceu que os primeiros réus e a 2ª ré se comprometeram a realizar as obras de reparação dos danos.
2. E alterou, parcialmente, as respostas negativas aos pontos de facto das alíneas d) e e), porque se convenceu que os autores, antes da obra de intervenção no prédio dos réus, pintava o seu prédio e este não apresentava fissuras.
3. Foi julgada interrompida a prescrição porque em face da alteração das respostas aos pontos de facto das alíneas b) e c) da matéria de facto, o TRG considerou que os primeiros réus e a 2ª ré reconheceram o direito dos autores à reparação dos danos provocados pela intervenção no prédio doa primeiros réus.
4. A 2ª ré responde pelos danos patrimoniais e morais em consequência da sua atividade ilícita, culposa e danosa.
5. Os primeiros réus respondem pelos danos porque se comprometeram a repará-los e não o fizeram.
6. A ré seguradora é responsável pelos danos por força do contrato de seguro celebrado com a 2ª ré, cujo objeto os abrange.

Decisão

Pelo exposto acordam os juízes da Relação em julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogam a decisão recorrida e julgam parcialmente procedente a ação e condenam:

1. Os primeiros réus e a segunda ré a repararem os danos identificados nos pontos 6 e 7 da matéria de facto provada e ainda a pagarem aos autores a quantia de 5.000€ a título de danos morais, acrescida de juros moratórios desde a notificação da decisão em 1ª instância.
2. A ré seguradora, em substituição da segunda ré, a reparar os danos identificados nos pontos 6 e 7 da matéria de facto provada e ainda a pagar aos autores a quantia de 5.000€ a título de danos morais, acrescida de juros moratórios desde a notificação da decisão em 1ª instância, até ao montante de 50.000 com a dedução da franquia de 10%, no montante de 5.000€, da responsabilidade da segunda ré.

Custas por autores e réus na proporção de vencimento.
Guimarães,

Relator: Espinheira Baltar
1.ª Adjunta: Eva Almeida
2.º Adjunto: Beça Pereira