Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1186/14.2T8VCT.G1
Relator: MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO MORTE
DANO PATRIMONIAL FUTURO
OBRIGAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Não deixando de ter presente que o valor da vida humana deve ser tendencialmente igual para todas as pessoas na fixação da indemnização pelo dano morte deve dar-se relevância à idade da vítima, ao seu estado de saúde e a outros factores da sua pessoa (ex. integração e relacionamento familiar e social, alegria de viver, projectos pessoais).

II - Da análise da jurisprudência do S.T.J. dos últimos anos resulta a consolidação do entendimento de que o dano pela perda do direito à vida se situa, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50 000,00 e € 80 000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00.

III - Para que nasça o direito a indemnização pelos danos patrimoniais futuros nos termos do art. 495º nº 3 do C.C. basta a qualidade de que depende a possibilidade legal do exercício de alimentos, não relevando a efectiva necessidade dos mesmos.”
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

Maria, por si e na qualidade da sua filha Isabel, menor, e José, instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra X – Companhia de Seguros, S.A. pedindo a condenação desta a pagar:

- à autora Maria a quantia de € 33.000,00 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório, inerente ao montante de que o falecido era credor (€ 99.000,00: 3), € 35.000,00 a título de danos não patrimoniais; € 130.000,00 a título de danos futuros; € 156,67 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório, inerente aos objectos pessoais do falecido que ficaram totalmente destruídos e referenciados no artigo 91° da p.i. (€ 470,00:3); € 3.130,00 inerente às despesas por si suportadas relativas ao funeral do falecido, peticionadas no artigo 92° da p.i.; € 22,17 inerente a medicamentos, consultas e exame, peticionados no artigo 93° da p.i.; € 60,00 referente a certidões da C.R. Civil, peticionadas no artigo 94° da p.i.;
- à autora Isabel: € 33.000,00 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório inerente ao montante de que o falecido era credor (€ 99.000,00:3), € 30.000,00 a título de danos não patrimoniais; € 130.000,00 a título de danos futuros; € 156,67 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório, inerente aos objectos pessoais do falecido que ficaram totalmente destruídos e referenciados no artigo 91° da p.i. (€ 470,00:3);
- ao autor José: € 33.000,00 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório inerente ao montante de que o falecido era credor (€ 99.000,00:3); € 30.000,00 a título de danos não patrimoniais; € 156,67 referente à quota que lhe cabe a título de direito sucessório inerente aos objectos pessoais do falecido que ficaram totalmente destruídos e referenciados no artigo 91° da p.i. (€ 470,00:3).

Pedem ainda que a Ré seja condenada a pagar-lhes a quantia de € 2.464,05 inerente ao valor da reparação do veículo ou, em alternativa, que a Ré seja condenada a mandar consertar o veículo e, consequentemente, a pagar a respectiva reparação.

Por fim, pedem a condenação da ré a pagar, a título de privação do uso do veículo e a título de equidade, uma quantia não inferior a € 5,00 diários, contados desde a data do acidente (15/06/14) até à data em que a ré pague tal quantia ou mande efectuar a reparação do veículo e, reparado este, o mesmo seja devolvido aos autores, quantia cuja liquidação relegaram para execução de sentença.
Em síntese alegam que, em 15/06/14, ocorreu um acidente de viação entre o motociclo de matrícula MM, conduzido por Manuel, e o veiculo de matrícula CC, conduzido por Agostinho, por culpa exclusiva do condutor deste, acidente esse que causou a morte de Manuel.
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A ré contestou impugnando a matéria de facto e imputando a responsabilidade da produção do acidente ao condutor do MI. Alegou que vistoriou os danos do motociclo e deu ordem de reparação. A factura foi enviada pela oficina à ré, que a liquidou. Refere que os autores reclamam montantes a que sabem não terem direito, sob pena de constituir um enriquecimento à custa de outrem. Os autores participaram o sinistro ao abrigo da apólice de acidentes de trabalho e as indemnizações não são cumuláveis. Por outro lado, foram reembolsados das despesas de funeral pela C.N.P.. E são-lhe processadas pensões de sobrevivência pelo referido C.N.P..
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A ré suscitou a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros Y, S.A. por ter pago à autora quantias diversas a título de pensões.

Foi admitida a intervenção principal provocada da Y, S.A..

Esta, associada aos autores, pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 410,00, acrescida de juros de mora desde a notificação deste pedido até efectivo pagamento; no pagamento de todos os montantes que, por força do contrato de seguro de acidentes de trabalho, venha a despender até à data da sentença e a reconhecer a obrigação de reembolsar a interveniente de todos os montantes que esta venha a despender. Posteriormente ampliou o pedido.

A Ré contestou dizendo que o pedido da interveniente deve ser julgado de acordo com a prova produzida.
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A X, S.A. requereu a intervenção principal provocada de Agostinho que conduzia o veículo CC à data do acidente não sendo titular de carta de condução ou de qualquer outro título de condução. Alega ter direito de regresso sobre o condutor nos termos do disposto na alínea d) do art. 27° do DL n° 29112007, de 21 de Agosto.
Foi admitida a esta intervenção.
Agostinho apresentou contestação pugnando pela improcedência da acção.
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Foi proferido despacho a definir o objecto do processo e a indicar os temas da prova.
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Procedeu-se a audiência final após o que foi proferida decisão, cuja parte decisória reproduzimos na íntegra:

“Pelo exposto, decide-se:

- Julgar parcialmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pelos AA. contra a Ré X, condenando esta no pagamento àqueles das seguintes quantias:
• À Autora Maria pagará a R.:
- 30.000 € (trinta mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;
- 23.900 € (vinte e três mil e novecentos euros) (80.000 €:3-2.766,85 €) pelo dano morte, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;
- 80.768,05 € (oitenta mil setecentos e sessenta e oito euros e cinco cêntimos) (185.000 €:2-11.731,95 €) a título de dano patrimonial futuro acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;
- 1.612,17 € (mil seiscentos e doze euros e dezassete cêntimos) (1.530 €+22,17 €+60,00€) a título de despesas, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

• À Autora Isabel pagará a R.:

- 20.000 € (vinte mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;
- 23.900 € (vinte e três mil e novecentos euros) (80.000 €:3 - 2.766,85 €) pelo dano morte, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;
- 83.130,95 € (oitenta e três mil cento e trinta euros e noventa e cinco cêntimos) (185.000:2 - 9.369,05€) a título de dano patrimonial futuro acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

• Ao Autor José pagará a R.:

- 20.000 € (vinte mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;
- 26.666 € (vinte e seis mil seiscentos e sessenta e seis euros) (80.000 €:3) pelo dano morte, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento.
- Condena-se ainda a R. a mandar efectuar a reparação (que já pagou), de modo a que o motociclo seja entregue aos AA. em boas condições de circulação.
- Mais se decide julgar parcialmente procedente o pedido formulado na presente acção pela Y, agora Seguradoras U, S.A., contra a Ré X, condenando esta no pagamento àquela da quantia de 22.927,87 € (vinte e dois mil novecentos e vinte e sete euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.
- Absolve-se a R. do demais peticionado.
Custas em dívida a suportar pelos AA., pela R. e pela interveniente Y, agora Seguradoras U, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.”
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Não se conformando com a decisão recorrida veio X, S.A. dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

. - Pela perda do direito à vida foi atribuída aos Recorridos a quantia de 80.000 euros mas tal valor está desajustado face aos padrões estabelecidos pela jurisprudência.
. - Pois consolidou-se, na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça o entendimento de que o dano pela perda do direito à vida, direito absoluto e do qual emergem todos os outros direitos, situa-se, em regra e com algumas oscilações, entre os €50 000,00 e €80 000,00.
. - E neste caso, o dano morte do falecido foi fixado em €80.000,00, valor esse que embora situado dentro das margens definidas em tais arestos não respeita o padrão referencial que vem sendo seguido pela jurisprudência daquele Tribunal, tendo em conta que a infeliz vítima tinha 41 anos.
. - O valor de 60.000,00 euros era o mais adequado e ajustado tendo em conta os padrões seguidos pela jurisprudência atenta a idade da vítima.
. - O valor arbitrado à Recorrida Maria de 92.500,00 euros a título de dano patrimonial é exagerado pois não se provou que estivesse dependente dos rendimentos da infeliz vítima.
. - Pois a lei reconhece, nos casos de morte, excepcionalmente, o direito a indemnização de danos patrimoniais iure proprio às pessoas que podiam exigir alimentos do lesado directo mas não basta, a simples invocação da qualidade ou status de cônjuge sobrevivo para, de pronto e de modo automático, ser atribuída ao invocante uma indemnização a esse título: esta só pode ser exigida por danos efectivos.
. – Ainda porque os alimentos a cônjuges passou a atribuir cariz excepcional e passou a vigorar o chamado princípio da auto-suficiência, conferindo, em regra, ao direito a alimentos entre ex-cônjuges carácter temporário e natureza subsidiária.
. - Trilhando-se hodiernamente um caminho em que se instituíu o princípio basilar da igualdade de género com a consequente independência (financeira) e auto-suficiência.
. - Mesmo não se perfilhando tais entendimentos sempre o valor a atribuir deveria ser mitigado por tais parâmetros e pelo entendimento que hoje se considera de que o valor do salário mínimo nacional é o valor de referência do limiar de subsistência.
10ª . - Não é razoável atribuir o montante de 92.500 euros à Recorrida Maria tanto mais que aquele valor representa mais de 300 euros mensais durante os próximos 25 anos (idade em que infeliz vítima atingiria a reforma).
11ª. - E também porque a vítima não podia dispor de tal rendimento a favor do cônjuge pois auferia o salário líquido de 559 euros.
12ª. - Pelo que à Recorrida Maria, a ser-lhe atribuída indemnização por dano patrimonial, não deveria exceder a quantia de 30.000 euros.
13ª. - A filha Isabel tinha 12 anos de idade à data do falecimento do seu pai, infeliz vítima do acidente relatado nos autos pelo que tinha direito a alimentos da infeliz vítima durante mais 13 anos.
14ª. - O tribunal “a quo” ao atribuir-lhe a quantia de 92.500 euros atribuiu-lhe uma média mensal de quase 600 euros mensais até aos 25 anos (e que a acrescer à da Recorrida Maria em muito ultrapassaria os valores do vencimento mensal do infeliz falecido).
15ª. - Quantia de que a infeliz vítima nunca poderia dispor pois tinha um vencimento líquido de impostos de 559 euros.
16ª. - Desse modo, o valor de 20.000 euros seria justo e equitativo para ressarcir a Autora Isabel da perda desse rendimento.
17ª. – Os valores atribuídos à Recorrida Maria de 30.000 euros e ao filho José de 20.000 euros a título de danos morais são desajustados.
18ª. - Para a Recorrida Maria seria justa e adequada a quantia de 25.000 euros e para o Recorrido José seria justa e adequada a quantia de 15.000 euros.
19ª. - Pois o filho José já tinha uma vida independente e mais distante da infeliz vítima e seria desajustado atribuir o mesmo valor ao Recorrido José que à Recorrida Isabel quando esta tinha ainda uma dependência da infeliz vítima e um maior apego, até pela convivência diária que o filho José não tinha.
20ª. - A ré não tem, como nunca teve, a direcção efectiva do motociclo que pertence aos Recorridos e não foi a ré que escolheu a oficina para se proceder à reparação do motociclo.
21ª. - A Ré limitou-se a efectuar a vistoria, assumir a responsabilidade, e prontificar-se para pagar a reparação.
22ª. - Porque a oficina escolhida pelos Recorridos lhe apresentou a factura e na convicção de que o veículo estava reparado, liquidou o valor da reparação à oficina.
23ª. - Estando paga a reparação são os Recorridos quem deverão promover e ordenar a reparação do veículo quando e como o entenderem e não a Ré, que dele não tem a direcção efectiva.
24ª. - Devendo, em consequência, ser revogada a decisão na parte em que condenou a R. a efectuar a reparação (que já pagou) de modo a que o motociclo seja entregue aos AA. em boas condições de circulação.
25ª. - Violou o tribunal “a quo” o disposto no art. 496º, 564º e 566º, nº. 3, 805º do Código Civil.”
Pugna pelo provimento do presente recurso
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Contra-alegaram os autores Maria e outros pugnando pela confirmação da sentença recorrida
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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Tendo em atenção que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são:

A)Os eventuais erros de julgamento na fixação do valor da indemnização pelo dano morte e pelos danos não patrimoniais dos autores
B) Pelos danos patrimoniais futuros;
C) Eventual erro de julgamento da decisão que condenou a ré a mandar reparar o motociclo.
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II – Fundamentação
Foram considerados provados os seguintes factos:

1.No dia 15 de Junho de 2014, cerca das 13:50 horas, na E.N. 203 - Km 31,580, em Santa Cruz do Lima, concelho de Ponte de Lima, ocorreu um acidente de viação.
2. No mesmo foram intervenientes o motociclo de serviço particular, matrícula MM, propriedade e tripulado pelo falecido Manuel e o veículo automóvel ligeiro de passageiros, de serviço particular, matrícula CC, propriedade de Agostinho, e conduzido por este.
3. O falecido Manuel tripulava o MM pela E.N. 203, no seu sentido Ponte de Lima - Ponte da Barca.
4. O falecido Manuel conduzia o motociclo pela sua mão de trânsito, faixa direita atento o sentido seguido e a cerca de 1,5 metros da berma direita atento o mesmo sentido.
5. Imprimia o falecido Manuel, ao motociclo, uma velocidade não superior a 40 kms / hora.
6. Quando assim seguia, o falecido Manuel vê, súbita e inesperadamente, a via por onde seguia barrada pelo CC.
7. O qual acabara de sair da Rua …, rua esta sita no lado esquerdo da E.N. 203 atento o sentido seguido pelo inditoso Manuel.
8. Atravessou a faixa esquerda atento o sentido seguido pelo falecido.
9. E invadiu a faixa direita atento o mesmo sentido, barrando tal faixa por completo.
10. E, porque tal aconteceu, quando o falecido Manuel estava a cerca de 10 metros de distância do CC, o inditoso travou e guinou para a esquerda, só que não conseguiu evitar que a frente do motociclo que tripulava embatesse na parte lateral direita do CC.
11. O embate deu-se precisamente a meio da faixa direita atento o sentido seguido pelo motociclo MM.
12. E em frente da Rua de Barbudos, que entronca com a E.N. 203, do lado esquerdo atento o sentido seguido pela inditosa vítima.
13. O acidente assim descrito deu-se única e exclusivamente por causa da actuação do condutor do CC.
14. Tal condutor circulava, antes de invadir a E.N. 203, pela Rua de Barbudos.
15. Na desembocadura da Rua de Barbudos com a E.N. 203, o condutor do CC não parou ou abrandou a marcha.
16 O condutor do CC, na mesma desembocadura da Rua de Barbudos com a E.N. 203, não olhou para se certificar se, na referida estrada, não circulava qualquer veículo nos sentidos Ponte da Barca - Ponte de Lima e Ponte de Lima - Ponte da Barca.
17.E, porque o não fez, saiu da Rua de Barbudos e invadiu a E.N. 203.
18.A velocidade não inferior a 30 kms / hora.
19. Invadiu a faixa esquerda atento o sentido Ponte de Lima – Ponte da Barca.
20. E invadiu igualmente a faixa direita atento o mesmo sentido.
21. Isto porque precisamente nessa via circulava o motociclo MM.
22. O condutor do CC estava distraído.
23. Na desembocadura da Rua de Barbudos donde o CC saía, com a E.N. 203 existe, no lado direito, o sinal de STOP.
24.Sinal este bem visível.
25.E que obriga os condutores que pretendem sair da Rua de Barbudos e entrar na E.N. a pararem e a cederem a passagem aos veículos que circulam na E.N..
26. Se o condutor do CC tivesse parado na desembocadura da Rua de Barbudos com a E.N. 203, teria uma visão no sentido por onde o falecido circulava de, pelo menos, 300 metros.
27. Em tal sentido, apresenta-se uma recta ascendente com 300 metros de comprimento.
28. Na desembocadura da rua não existia qualquer obstáculo que impedisse ou limitasse a visão nesse sentido.
29. No local ficou lavrado, no piso da estrada, um rasto de travagem do motociclo com 10 metros de comprimento, rasto este situado na faixa direita atento o sentido seguido pelo falecido Manuel.
30. O motociclo, após o embate, ficou igualmente na faixa direita atento o sentido seguido, em frente da Rua de Barbudos e a cerca de um metro do local onde ocorreu a colisão.
31. O falecido foi prejectado pelo ar e ficou estatelado no piso da estrada, a cerca de 4 metros do local onde ocorreu o embate.
32. O CC não parou a marcha, acabando por atravessar a via direita atento o seu sentido seguido pelo motociclo, vindo a imobilizar-se na Rua de Árdega, situada no lado direito, atento o sentido seguido pelo falecido.
33. No local onde ocorreu a colisão ficaram vidros, bocados de fibra, sangue e terra.
34. O piso da estrada no local é betuminoso.
35. Na data em que ocorreu o acidente estava bom tempo.
36. A plataforma da estrada no local onde ocorreu o acidente tem 6,30 metros de largura.
37. E as bermas têm 1,5 metros de largura cada.
38. Agostinho havia transferido para a Ré a responsabilidade civil emergente de acidente de viação através da apólice de seguro em vigor à data do acidente com o número ….
39. Do acidente resultaram danos no motociclo, bem como a morte do seu tripulante, Manuel.
40. O Manuel era casado com a autora Maria, sob o regime da comunhão de adquiridos e em primeiras núpcias de ambos.
41. Desse casamento nasceram em 12/05/1992 e a 01/03/2002 respectivamente, os únicos filhos do casal: José e Isabel, menor.
42. Do acidente descrito resultaram no inditoso Manuel lesões traumáticas graves que foram a causa directa e necessária da sua morte.
43. O falecido Manuel, antes de ocorrer o acidente, trabalhava para a firma “P. – Companhia de Segurança, Lda.”, exercendo a actividade profissional de Vigilante e auferindo mensalmente o vencimento base de € 641,93 (seiscentos e quarenta e um euros e noventa e três cêntimos), acrescido do subsídio de trabalho nocturno de € 18,50 (dezoito euros e cinquenta cêntimos) e do subsídio de alimentação no montante de € 113,80 (cento e treze euros e oitenta cêntimos), tudo no total de € 774,23 (setecentos e setenta e quatro euros e vinte e dois cêntimos).
44. Manuel, além do período laboral, agricultava igualmente os seus campos, criava animais domésticos, fazia plantação de vinha, podava e sulfatava as videiras, vindimava as uvas.
45. De todo este trabalho agrícola, o falecido obtinha animais domésticos, bem como vinho e legumes que destinava ao consumo do seu agregado familiar.
46. O falecido exercia igualmente a actividade profissional de carpinteiro quando estava de folga, auferindo quantia não concretamente determinada.
47. A vitima contava, à data do acidente, 42 (quarenta e dois) anos de idade.
48. A Autora Maria contava, à data do acidente, com 42 (quarenta e dois) anos de idade.
49. A vítima dedicava um grande afecto à Autora Maria.
50. E uma ternura muito especial aos seus dois únicos filhos Isabel Isabel e José.
51. A vítima e os Autores sempre se haviam mantido, ao longo das suas vidas, muito unidos e foram o amparo moral e afectivo uns dos outros.
52. O Manuel rodeava permanentemente de atenção e dedicava grande amor à Autora Maria.
53. E nutria um carinho especial para com os seus dois filhos Isabel Isabel e José.
54. O corte abrupto da sua vida causou aos AA. um profundo desgosto, que os prostrou e os deixou inconsoláveis para o resto das suas vidas.
55.Sendo certo que os Autores coabitavam com a vítima.
56.Gastou a Autora Maria, no funeral do inditoso Manuel, as seguintes quantias, no montante global de € 3.130,00 (três mil, cento e trinta euros):

a) A quantia de € 180,00 (cento e oitenta euros), paga a Elias - outros prestadores de serviços;
b) A quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros), paga à Junta de Freguesia g., respeitante a taxa de enumação e ocupação de casa Mortuária;
c) A quantia de € 300,00 (trezentos euros), paga a M. C. - Florista da Matriz, inerente a fornecimento de flores para o funeral do falecido;
d) A quantia de € 1.600,00 (mil e seiscentos euros), paga à Agência Funerária G. Unipessoal, Lda., inerente ao funeral do falecido Manuel;
e) A quantia de € 900,00 (novecentos euros), paga à Mármores e Granitos M., de Céu, inerente à aquisição de sepultura em granito para o falecido Manuel.
57. Gastou igualmente a Autora Maria, a quantia global de € 22,17 (vinte e dois euros e dezassete cêntimos), em medicamentos adquiridos na Farmácia DT - L. S., Sociedade Unipessoal (€ 4,67), em consultas realizadas no Centro de Saúde (€ 15,00), e em exame efectuado na CF - Centro de Diagnóstico pela Imagem, Lda. (€ 2,50). 58. Bem como gastou a Autora Maria a quantia de € 60,00 (sessenta euros), inerente a requisição de certidões de óbito, casamento e nascimento na Conservatória do Registo Civil, tendo em vista instruir a presente acção.
59. Ainda e como consequência do acidente, resultaram danos no veículo em que o falecido circulava, marca Yamaha, matrícula MM, nomeadamente ficaram danificados os faróis, guarda-lamas, roda dianteira, depósito de gasolina, pintura e mecânica.
60. O veículo foi transportado do local do acidente para a oficina C. G., sita em S. …, Ponte de Lima.
61. A ré vistoriou os danos no veículo sinistrado sendo que o valor da reparação ascende a € 2.464,05 (dois mil, quatrocentos e sessenta e quatro euros e cinco cêntimos).
62. A Ré deu ordem de reparação do veículo.
63. E porque deu ordem de reparação a factura foi enviada pela oficina à Ré que a liquidou.
64. No dia do julgamento a oficina não tinha ainda reparado o veículo em causa.
65. Os AA. foram reembolsados das despesas de funeral pelo Centro Nacional de Pensões.
66. E não lhe são processadas pensões de sobrevivência pelo referido Centro Nacional de Pensões.
67. No âmbito da sua actividade social, a interveniente Y celebrou com a sociedade "P. Companhia de Segurança, Lda.", a pedido desta, um contrato de seguro de Acidentes de Trabalho, na modalidade prémio variável (vulgarmente designado de seguro de folhas de férias), titulado pela apólice nº …, o qual se encontrava válido e em vigor à data dos factos em causa nos presentes autos.
68. Nos termos do estabelecido nas Condições Particulares da Apólice, ficam abrangidos por tal contrato, "(...) os trabalhadores cujos nomes, profissões e proventos salariais, constem dos duplicados ou fotocópias das folhas de retribuições remetidos à Segurança Social, obrigando-se o Tomador do Seguro, nos termos previstos nas Condições Gerais da Apólice, a enviar mensalmente à Seguradora cópia dos mesmos até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que se referem”.
69. Nos termos do acordado entre a aqui interveniente e a aludida "P. Companhia de Segurança, Lda.", o mencionado contrato de seguro cobre um número variável de pessoas seguras, com retribuições seguras também variáveis, sendo consideradas pela ora contestante as pessoas e as retribuições identificadas nas folhas de vencimento que lhe são enviadas periodicamente pelo Tomador do Seguro.
70.Tal contrato de seguro encontrava-se válido e em vigor à data dos factos em discussão nos autos, garantindo as indemnizações que fossem exigíveis à referida "P. - Companhia de Segurança, Lda.", emergentes de acidentes de trabalho envolvendo trabalhadores ao seu serviço que se encontrassem incluídos nas citadas folhas de retribuição por aquela remetidas à Segurança Social e enviadas à aqui interveniente.
71. À data do acidente dos autos o falecido Manuel desempenhava a actividade profissional de vigilante, função que exercia ao serviço da sociedade "P. - Companhia de Segurança, Lda.", a sua entidade patronal.
72. Em 16.06.2014, a mencionada "P. Companhia de Segurança, Lda.", participou à interveniente Y a ocorrência do presente sinistro.
73. No momento em que ocorreu o presente sinistro, o falecido Manuel deslocava-se da sua residência, situada em …, Ponte de Lima, para o seu local de trabalho, sito nas instalações do hipermercado I., em Arcos de Valdevez, pelo trajecto normal e mais directo.
74. O falecido Manuel constava das folhas de férias remetidas pela "P. - Companhia de Segurança, Lda." à ora interveniente, com a seguinte remuneração declarada na apólice supra identificada:

- Salário: 641,93€ x 14 meses
- Subsídio de alimentação: 5,69€ x 22 x 11 meses
- Outros Subsídios: 39,14€ x 12 meses.
75. À data dos factos, o contrato de seguro supra aludido cobria os acidentes de trabalho sofridos pelo indicado Manuel, quando ao serviço da "P. Companhia de Segurança, Lda.", incluindo os que ocorressem no trajecto normal de ida da sua residência para o seu local de trabalho e no regresso deste à sua residência.
76. Garantindo, designadamente e nos termos legais, prestações de natureza médica, cirúrgica, hospitalar, farmacêutica e outras acessórias ou complementares, qualquer que fosse a sua forma, desde que necessárias ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho da vitima e à sua recuperação para a vida activa.
77. Bem como todas as indemnizações, pensões, prestações e subsídios previstos na Lei n. 98/2009, de 4 de Setembro.
78. Correu termos no Tribunal de Trabalho de Viana do Castelo o processo nº. 501/14.3TTVCT, instaurado na sequência do presente sinistro, o qual constituiu simultaneamente um acidente de viação e de trabalho.
79. Até 20 de Abril de 2015, em consequência do presente sinistro, a aqui interveniente Y suportou os seguintes montantes:

- 100,00€, referentes ao pagamento de consultas de assistência psicológica prestada à viúva e filha menor do falecido Manuel, Maria e Isabel, posto que estas últimas entraram sem situação de descompensação psicológica, face à notícia da morte, por acidente, do marido e pai, respectivamente;
- 310,00€, referente ao custo que a aqui interveniente teve de suportar com a averiguação do presente sinistro, nomeadamente com o apuramento das circunstâncias de modo, tempo e lugar em que o mesmo se deu - tudo no total de € 410,00.
80. Na sequência da tentativa de conciliação realizada no processo de acidente de trabalho n° 501114.3 TTVCT, a Y foi condenada a pagar à A. Maria, a título de prestações legais devidas por acidente de trabalho, as seguintes quantias:

- 1.600,00 € a título de despesas de funeral;
- 2.766,85 € a título de subsídio por morte;
- 3.250,10 € (30 % da retribuição do sinistrado) a título de pensão anual e vitalícia, com início em 16/07/2014, actualizável anualmente;
- 10,00 € a título de despesas de transporte.
81. Ainda na sequência da dita tentativa de conciliação, a Y foi condenada a pagar à A. Isabel, a título de prestações legais devidas por acidente de trabalho, as seguintes quantias:

- 2.766,85 € a título de subsídio por morte;
- 2.166,74 € a título de pensão anual e temporária, com início em 16/07/2014.
82. Entre o dia 25 de Maio de 2015 e o dia 31 de Março de 2016, a Y pagou às AA. as seguintes quantias:

-1.600,00 € de despesas de funeral;
- 2.766,85 €+2.766,85 € a título de subsídios por morte;
- 5.223,38 €+5.029,96 € a título de pensão anual e vitalícia e de pensão anual e temporária;
- 10,00 € de despesas de transporte, totalizando os pagamentos o montante de 17.397,04 €.
83. Desde 1 de Abril de 2017 até à data da audiência de julgamento, a Y pagou à A. Maria a quantia de 3.258,47 € a título de pensão anual e vitalícia e pagou à A. Isabel a quantia de 2.172,35 € a título de pensão anual e temporária, totalizando o montante de 5.430,83 €.
84. No âmbito do proc. n° 303/14.7 GAPTL, Agostinho foi condenado, em virtude do sinistro em discussão nos presentes autos, pela prática de um crime de homicídio negligente e de um crime de condução sem habilitação legal.
*
E foram considerados não provados:

I.O condutor do CM desenvolvia a sua marcha pela Rua dos Barbudos em direcção à E.N. 203, rigorosamente pela metade direita da faixa de rodagem, atento o indicado sentido de marcha.
II. E animado de uma velocidade reduzida não inferior a trinta quilómetros por hora.
III. Ao chegar à embocadura da Rua dos Barbudos com a E.N.203 imobilizou o que conduzia, olhou para a sua esquerda e depois para a sua direita.
IV. O condutor do CM não avistou qualquer veículo a circular ao longo da E.N.203, quer no sentido Ponte de Lima – Ponte da Barca, quer no sentido inverso.
V. Decidiu proceder à travessia da E.N.203 em direcção à Rua da Árdega onde pretendia penetrar.
VI. Quando já havia iniciado e desenvolvido a manobra de atravessamento da E.N.203, prestas a conclui-la, foi embatido pelo MM.
VII. O condutor do MM seguia pela E.N. 203 no sentido Ponte de Lima – Ponte da Barca e imprimia ao que conduzia uma velocidade não inferior a 140 km/hora.
VIII. Seguia de forma completamente distraída e sem prestar qualquer atenção à condução que fazia.
IX. Por essa razão não se apercebeu da presença do CC e que este circulava à sua frente.
X. O condutor do MM, porque seguia distraído, não se apercebeu que o CC circulava a uma velocidade muito reduzida e procedia ao atravessamento da via e só se apercebeu da presença deste quando se encontrava a cerca de 20 metros deste.
XI. Ao deparar com o CC travou o que conduzia.
XII. O inditoso, antes de ocorrer o acidente, apercebeu-se do mesmo e da impossibilidade de lhe escapar.
XIII. Após o embate a morte não foi imediata.
XIV. Apercebeu-se da gravidade das lesões, já que sangrava pela boca, cabeça e sentia fortes dores.
XV. Apercebeu-se que ia morrer.
XVI. De todo o seu trabalho agrícola o falecido obtinha produtos que destinava à venda nos mercados locais.
XVII. O falecido, na sua actividade profissional de carpinteiro, e nos dois dias de folga que tinha por semana, auferia por dia quantia não inferior a € 40,00 (quarenta euros).
XVIII. Da venda de produtos agrícolas e animais domésticos e do rendimento inerente ao trabalho de carpinteiro o falecido mensalmente obtinha um rendimento mensal não inferior a € 200,00 (duzentos euros).
XIX. Fruto do falecimento do seu marido e pai, os autores não conseguem dormir, nem descansar.
XX. Têm pesadelos constantes.
XXI. Choram frequentemente.
XXII. Ficaram com dificuldades a nível de relacionamentos interpessoais.
XXIII. O que motiva que os Autores venham a ser acompanhados por tratamentos psicológicos.
XXIV. Ainda em consequência do acidente de viação ficou partido o capacete do falecido, no valor de € 100,00 (cem euros), o telemóvel que o falecido possuía no valor de e 120,00 (cento e vinte euros), foram rasgadas umas calças de ganga no valor de € 50.00 (cinquenta euros), um casaco de cabedal no valor de € 150,00 (cento e cinquenta euros) e uma camisa no valor de € 50,00 (cinquenta euros).
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A) Danos não patrimoniais

A Recorrente insurge-se contra os valores arbitrados pelo Tribunal a quo a título de perda do direito à vida e a título de danos não patrimoniais sofridos pelos autores. Em relação ao primeiro, em vez do valor fixado de € 80.000,00 contrapõe o valor de € 60.000,00 e em relação aos segundos, em vez dos valores fixados de € 30.000,00 para a viúva e € 20.000,00 para cada filho, contrapõe os valores de € 25.000,00 para a viúva e € 15.000,00 para o filho José.
Os Recorridos pugnaram pela confirmação da sentença.

Vejamos.

Nem sempre foi reconhecida a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais em geral e do dano morte em particular.
No domínio do Código de Seabra era discutida a questão da reparação dos danos morais, mas pouco a pouco, foi sendo admitida até porque passou a ser prevista noutros diplomas (v.g. art. 34º & 2 do Código Processo Penal de 1929; em sede de responsabilidade médica no Dec.-Lei nº 32.171 de 29/07/1942; em sede de responsabilidade por acidentes de viação no art. 56º nº 2 do Código da Estrada de 1954).
O Código Civil de 1966 introduziu, no seu art. 496º, uma cláusula geral de ressarcibilidade dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (cuja redacção veio a ser alterada pela Lei nº 23/2010 de 30/08).

Como assinala Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol. I, Almedina, 7ª ed., 1993, pág. 602 “A indemnização por danos não patrimoniais reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.”.
Esta segunda vertente não tem naturalmente aplicação em casos em que é demandada uma seguradora e não o lesante.
Nos danos morais em geral mostra-se impossível, pela própria natureza das coisas, a reparação natural do dano, pelo que a lei impõe o recurso à equidade tendo em atenção os danos causados, o grau de culpa, a situação económica do lesante e do lesado e as demais circunstâncias do facto - art. 496º nº 1 e nº 4 e art. 494º do C.C.. Naturalmente que quando é demandada uma seguradora não há que atender á situação económica do lesante.
Segundo Ana Prata, in Dicionário Jurídico, 4ª ed., 2005, p. 499 “Julgar segundo a equidade significa dar a um conflito a solução que parecer mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável. A equidade tem, consequentemente, conteúdo indeterminado, variável de acordo com as concepções de justiça dominantes em cada sociedade e em cada momento histórico.”.
Em vez dos tribunais se limitarem a fazer apelo ao critério da equidade indicando logo um montante reputado como adequado afigura-se-nos, na senda da jurisprudência mais recente, que se deverá tentar indicar critérios referenciais para permitir uma maior uniformidade de critérios e para evitar um eventual desajustamento entre as decisões do Tribunal e a realidade, i.e, critérios concordantes com os padrões sociais vigentes.
Se é verdade que não devem as indemnizações conduzir a um enriquecimento despropositado do lesado, também não devem corresponder a uma simples esmola, a um valor meramente simbólico.
*
1. Dano morte

Em torno da problemática da morte como dano surgiu no âmbito do C.C. uma querela que concitou muitas análises e opiniões, quer na doutrina, quer na jurisprudência.
O Ac. do S.T.J. de 17/03/71, tirado em reunião das então três Secções daquele tribunal (BMJ 205º, 150), entendeu que, em caso de morte, nos termos do art. 496º nº 2 e 3 do C.C., resultam três danos não patrimoniais indemnizáveis:

- o dano pela perda do direito à vida – dano autónomo;
- o dano sofrido pelos familiares da vitima com a sua morte;
- o dano sofrido pela vítima antes de morrer, variando em função de factores de diversa ordem, como sejam o tempo decorrido entre o acidente e a morte, se a vitima estava consciente ou em coma, se teve dores ou não e qual a intensidade, se teve ou não consciência de que ia morrer.

Mais entendeu este aresto que a perda do direito à vida por morte ocorrida em acidente de viação é passível de reparação pecuniária, que o direito a esta reparação se integra no património da vítima e que, por morte desta, transmite-se aos seus herdeiros (sendo que a jurisprudência maioritária mais se afastou desta tese como veremos infra).

Apesar do referido acórdão não ter a natureza de assento o mesmo veio a provocar uma relativa uniformização de decisões acerca da ressarcibilidade em termos gerais do dano morte.
Esta tese é conforme com a Constituição da República Portuguesa e com o Código Civil.
Dispõe o art. 24º nº 1 da C.R.P. “O direito à vida é inviolável”.
A propósito deste direito referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 2ª ed. revista e ampliada, Coimbra Editora, 1984, pág. 190/1:
“O direito à vida (…) é o primeiro dos direitos fundamentais constitucionalmente enunciados. É, logicamente, um direito prioritário, pois é a condição de todos os outros direitos das pessoas. Ao conferir-lhe uma protecção absoluta, não admitindo qualquer excepção, a Constituição erigiu o direito à vida em direito fundamental qualificado. (…) O direito à vida significa, primeiro e acima de tudo, direito a não ser morto, de não ser privado da vida.”.
O art. 70º nº 1 do C.C., ao preceituar “A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à personalidade física ou moral”, consagra uma norma de tutela geral da personalidade, o reconhecimento da existência de um direito geral da personalidade, direito absoluto, bem protegido erga omnes, do qual se pode extrair o direito à vida e à integridade física, entre outros.
Posteriormente o dano morte foi expressamente reconhecido pelo Dec.-Lei nº 291/2007 de 21 de Agosto, que aprovou o Regime do Sistema de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel – art. 3º nº 2 – e Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio (alterada pela Portaria nº 679/2009 de 25 de Junho), que fixa os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta razoável para indemnização do dano corporal – art. 2º a) e 5º.
Como se referiu supra, embora haja ainda quem entenda que o direito à indemnização se constitui no património da vítima/falecido sendo depois encabeçado pelos respectivos herdeiros mediante transmissão por morte (sucessão hereditária), a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça vem entendendo que o dano morte cabe, por direito próprio, aos familiares legalmente indicados nos termos e segundo a ordem prevista no art. 496º nº 2 do C.C..
*
A “quantificação” deste dano encerra algum melindre uma vez que se trata de procurar traduzir em quantia certa o que, por natureza, é insusceptível de mesuração e de redução a uma expressão numérica.
Existe uma outra questão não consensual na doutrina e na jurisprudência que se prende com o facto de saber se, na fixação da indemnização pelo dano morte, se deve dar relevância à idade da vítima, ao seu estado de saúde e a outros factores da sua pessoa (ex. integração e relacionamento familiar e social, alegria de viver, projectos pessoais).
No sentido de que “O prejuízo é o mesmo para todos os homens. (…) A indemnização deve ser a mesma para todos” vide Leite de Campos, in “A vida, a morte e a sua indemnização”, BMJ 365, 15. Na jurisprudência tal posição foi defendida, entre outros, nos Ac. S.T.J. de 20/06/2006 e de 12/09/13, in www.dgsi, pt..
No sentido oposto e afigura-se-nos como jurisprudência maioritária, entre outros, vide Ac. do S.T.J. de 11/01/2007, 18/12/07 e 08/09/11, in www.dgsi.pt.
Não deixando de ter presente que o valor da vida humana deve ser tendencialmente igual para todas as pessoas, uma vez que, como vimos, um dos critérios a recorrer na fixação desta indemnização é exactamente o recurso à equidade, aderimos a esta segunda tese.
Na fixação do valor da indemnização a este título, além do critério da equidade previsto no art. 496º nº 4 do C.C. há que recorrer aos critérios previstos no art. 494º do C.C. quando aplicáveis; à comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras decisões judiciais e à Portaria nº 377/08 de 26 de Maio (alterada pela Portaria nº 679/2009 de 25 de Junho).
No que concerne este último diploma importa ter presente que os valores constantes do Anexo II da Portaria têm uma aplicação extrajudicial e naturalmente não vinculativa para os tribunais pelo que estes deverão ter presentes tais valores, mas apenas como referência, como critério de orientação.
*
Segundo a Portaria supra referida – anexo II (c) - o “valor” do direito à vida de um homem entre os 25 e os 49 anos pode ir até aos € 51.300,00, mas como dissemos este diploma não vincula os tribunais.
Da análise da jurisprudência do S.T.J. dos últimos anos resulta a consolidação do entendimento de que o dano pela perda do direito à vida se situa, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50 000,00 e € 80 000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00 (Neste sentido vide Ac. do S.T.J. de 15/09/16, 03/11/2016, in www.dgsi.pt). Desta análise resulta igualmente que, quanto mais jovem é a vítima, maior costuma ser o valor arbitrado.

Revertendo ao caso concreto apurou-se que está em causa o óbito de um homem de 42 anos, ocorrida na sequência de um acidente de viação em que a única culpa (grosseira, a nosso ver) foi do condutor do outro veículo interveniente; o mesmo era casado, tinha dois filhos, com 12 e 22 anos à data do acidente; vivia com estes; tinha por estes grande afecto e vice-versa; trabalhava como vigilante numa empresa de segurança e nos tempos livres agricultava os seus campos e criava animais doméstico, bem como ainda fazia alguns trabalhos de carpintaria.

Tendo em atenção estas considerações afigura-se-nos equitativa a indemnização pela perda da vida de € 80.000,00. Tal indemnização é repartida pelos três autores devendo ser deduzida a quantia entretanto paga a título de subsídio por morte às autoras tal como foi decidido pelo tribunal recorrido sendo certo que esta parte não foi objecto de recurso..
Assim, nada a censurar ao tribunal recorrido nesta sede.
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2. Danos não patrimoniais sofridos pelos autores

Segundo a Portaria supra referida – anexo II (a) Grupo I - os valores referentes aos danos morais para o cônjuge pode ir até aos € 20.520,00 (estavam casado havia 22 anos atento o assento de casamento de fls. 22) e para os filhos (atendendo à idade dos autores à data do óbito) até € 15.390,00, mas como dissemos este diploma não vincula os tribunais.

Da matéria dada como provada resulta que o falecido era marido da autora Maria havia 22 anos e pai dos demais autores; coabitavam juntos (contrariamente ao alegado pelo ré não consta que o autor José não habitasse com os pais, resultando do ponto 55 o contrário); formavam uma família unida; tinha grande afecto pela mulher e uma ternura especial pelos filhos e a sua morte repentina causou neste um profundo desgosto, prostou-os e deixou-os inconsoláveis.

Face esta matéria de facto e tendo em atenção os valores que vêm sendo fixados pelo S.T.J. em situações análogas à destes autos (morte de cônjuge e pai em acidente de viação causado por terceiro) afigura-se-nos equilibrados os valores arbitrados pelo Tribunal recorrido nesta sede.
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B) Danos patrimoniais futuros

Insurge-se a Recorrida contra a sua condenação no pagamento, a este título, de € 80.768,05 à autora Maria e de € 83.130,95 à autora Isabel.

Vejamos.

Dispõe o art. 495º nº 3 do C.C. Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava em cumprimento de uma obrigação natural.
Consagra este preceito uma excepção ao princípio geral de que só ao titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado assiste direito a indemnização, pois nele se abrangem terceiros que só reflexamente são prejudicados com o evento danoso.
Está aqui em causa a compensação pelos danos patrimoniais futuros resultante da perda de alimentos por falta da vítima, danos esses que devem ser previsíveis (art. 564º, nº 2 do C.P.C.) e não podendo ser averiguado o seu valor exacto haverá que recorrer à equidade (art. 566º nº 3 do C.C.).
No que concerne à autora Maria, sendo casada com o falecido, importa ter presente que os cônjuges estão reciprocamente obrigados ao dever de assistência (art. 1672º do C.C.), o qual compreende, quer a obrigação de prestar alimentos (que se aplica caso estejam separados), quer a obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar (que se aplicam caso vivam juntos) (art. 1675º nº 1, 1676º do C.C.).

No caso em que uma relação matrimonial cessa abruptamente devido à morte do cônjuge em consequência de acidente de viação exclusivamente imputável a terceiro, ocorre uma involuntária quebra do dever de assistência pelo que é de imputar o dano patrimonial futuro ao lesante ou à seguradora nos termos do art. 495º nº 3 do C.C..

No que diz respeito aos filhos, maiores ou menores, estes podem exigir alimentos ao falecido nos termos do art. 1878º nº 1, 1880º, 2003º, 2009º nº 1 c) do C.C. pelo que também este dano patrimonial futuro é de imputar ao lesante ou seguradora nos mesmos termos.
Na sequência dos ensinamentos de Antunes Varela que defende que o direito a indemnização pelo denominado “dano da perda de alimentos” existe, quer a necessidade de alimentos seja futura, desde que seja previsível, quer não seja previsível (in Das Obrigações em Geral, I, 7ª ed, pág. 619), a jurisprudência maioritária vem entendendo que, para que nasça o direito a esta indemnização basta a qualidade de que depende a possibilidade legal do exercício de alimentos, não relevando a efectiva necessidade dos mesmos (neste sentido vide, entre outros, Ac. do S.T.J. de 05/05/2005, R.P. de 09/02/2009, S.T.J. de 19/10/16, in www.dgsi.pt). Perfilhamos esta posição.
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O cálculo desta indemnização, como referimos supra, deve ser feito com recurso à equidade e não está isento de dificuldades.

A este propósito o Ac. da R.P. de 22/05/2012, in www.dgsi.pt, refere:

“A jurisprudência do S.T.J. vem assentando, a propósito do cálculo da indemnização do dano futuro (…) nas seguintes ideias-força (…):

1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;
2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso normal das coisas, é razoável;
3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial na equidade;
4ª) Deve ser proporcionalmente deduzido no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;
5ª) Deve ponderar-se o facto da indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia;
6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (…). ”.
Igualmente a Portaria nº 377/2008 de 28/05, alterada pela Portaria nº 679/2009 de 25/06 – art. 2º b), 6º nº 1 c) e anexo III (c) – prevê uma fórmula para o cálculo deste dano.

Tendo por base estes critérios vejamos o caso em apreço.

À data do óbito o falecido tinha 42 anos; teria cerca de 35 anos de esperança média de vida (segundo os últimos dados do I.N.E. a mesma é de 77 anos para os homens e de 83 para as mulheres) e cerca 28 de tempo provável de vida activa (nos últimos tempos a jurisprudência do Supremo, face às recentes alterações legislativas, tem-se afastado dos 65 anos e aproximado dos 70 anos); auferindo um vencimento mensal líquido de cerca de € 560,00 (fls. 26V, 103 a 106) (e anual de € 7.840,00 = 560x14); deste vencimento seria razoável que 2/3 do mesmo fosse para fazer às despesas domésticas, i.e., € 373,33 (€ 373,33 x 14 = 5.226,66), despesas domésticas essas que se reduzirão um pouco à medida que os filhos se tornarem independentes. Assim, calcula-se em cerca de € 172.479, 78 (€ 5.226,66 x média de 33 anos).

Da matéria de facto dada como provada nada consta acerca da actividade profissional da autora Maria e seu vencimento, mas, atenta a declaração de rendimentos junta a fls. 99 a 100V, resulta claramente que a mesma, pelo menos nessa ano, trabalhava e auferia uma remuneração. No que dia respeito a esta autora, que tinha 42 anos na data do óbito do marido, é de admitir como possível que venha a refazer a sua vida afectiva e familiar.

Quanto à autora Isabel, que tinha 12 anos na data do óbito do pai, será apenas expectável que viesse a precisar de alimentos deste até aos 23, 25 anos admitindo que, depois da escolaridade obrigatória, pretenda continuar a estudar e assim prosseguir com a sua formação profissional.

Tendo em atenção que àquela quantia há que proceder a um desconto (de cerca de 1/5) em função de ser recebida de uma só vez e em função também destes factos afigura-se-nos equilibrado arbitrar à autora Maria a quantia de € 85.000,00 e à autora Isabel a quantia de € 55.000,00.

A estas quantias há que deduzir as quantias já pagas à primeira autora - € 11.731,95 a título de pensão anual e vitalícia - pelo que receberá € 73.268,05 e à segunda autora - € 9.369,05 a título de pensão anual e temporária – pelo que receberá € 45.630,95.
A apelação procede nesta parte.
*
C) A condenação na reparação do motociclo

Nestes autos os autores pediram a condenação da R no pagamento de € 2.464,05 ou a mandar consertar o motociclo e pagar tal reparação.

Por fim, insurge-se a ré quanto à sua condenação a mandar efectuar a reparação dizendo que nunca teve a direcção efectiva do mesmo uma vez que é propriedade dos autores e que se limitou a pagar a factura referente à reparação apresentada pela oficina escolhida por estes. Pede a revogação da sentença nesta parte.

Vejamos.

Da matéria de facto dada como provada resulta que, na sequência do acidente, resultaram danos para o motociclo; o mesmo foi transportado para a oficina de C. G.; a ré vistoriou tais danos sendo que o valor de reparação ascende a € 2.464,05; a ré deu ordem de reparação e pagou a factura que lhe foi apresentada, contudo a oficina não reparou o veículo.

Assim sendo, uma vez que o valor da reparação já foi pago pela ré a quem de direito, i.e., à oficina a quem o motociclo foi entregue pelos autores para reparação naturalmente que não faz sentido a condenação daquela na entrega de tal valor aos autores, sob pena de pagar duas vezes a mesma coisa.

Por outro lado, uma vez que se apurou que a ré deu ordem de reparação à referida oficina e pagou inclusive a factura referente à reparação concordamos com a recorrente que não faz sentido ser a mesma condenada numa coisa pedida pelos autores, mas que ela já fez.
Afigura-se-nos que nada mais nesta sede pode ser exigido à ré incumbindo aos autores entenderem-se com a oficina no sentido de lhes ser entregue o motociclo cuja reparação foi paga pela seguradora.
Pelo exposto, é de revogar a decisão nesta parte.
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Sumário – art. 663º nº 7 do C.P.C.:

I - Não deixando de ter presente que o valor da vida humana deve ser tendencialmente igual para todas as pessoas na fixação da indemnização pelo dano morte deve dar-se relevância à idade da vítima, ao seu estado de saúde e a outros factores da sua pessoa (ex. integração e relacionamento familiar e social, alegria de viver, projectos pessoais).
II - Da análise da jurisprudência do S.T.J. dos últimos anos resulta a consolidação do entendimento de que o dano pela perda do direito à vida se situa, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50 000,00 e € 80 000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00.
III - Para que nasça o direito a indemnização pelos danos patrimoniais futuros nos termos do art. 495º nº 3 do C.C. basta a qualidade de que depende a possibilidade legal do exercício de alimentos, não relevando a efectiva necessidade dos mesmos.
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III – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência.

- alterar a decisão recorrida na parte respeitante à indemnização por danos patrimoniais futuros condenando-se a ré no pagamento à autora Maria da quantia de € 73.268,05 e à autora Isabel da quantia de € 45.630,95, acrescida de juros de mora, desde a citação até efectivo e integral pagamento;
- revogar na parte da condenação da ré a mandar efectuar a reparação do motociclo de modo a que o mesmo seja entregue aos autores em boas condições de circulação;
E no mais confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante e apelados na proporção do decaimento.

Guimarães, 22/02/2018


(Margarida Almeida Fernandes)
(Margarida Sousa)
(Afonso Cabral de Andrade)