Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4276/18.9T8BRG.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
DISCORDÂNCIA QUANTO À INCAPACIDADE
JUNTA MÉDICA
FUNDAMENTAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/18/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:

I - A prova pericial em que se traduzem os exames médicos realizados no âmbito das acções emergentes de acidente de trabalho, está sujeita à livre apreciação do julgador.
II - Estando em causa o laudo maioritário de dois dos três peritos que constituíram a junta médica, laudo esse que versou sobre todas as questões colocadas pelas partes, com indicação dos motivos da decisão, suportada no resultado dos exames imagiológicos (RM e EMG), devidamente considerados, e que nos permite perceber da razão pela qual os Peritos Médicos, por maioria, decidiram considerar o sinistrado curado sem desvalorização, é de considerar que a junta médica se encontra suficientemente fundamentada, inexistindo violação do citado n.º 8 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades.

Vera Sottomayor
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

APELANTE – L. V.
APELADA – X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Braga, Juiz 1

I – RELATÓRIO

Na fase conciliatória dos presentes autos com processo especial emergentes de acidente de trabalho, em que é sinistrado L. V. e responsável X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A, não obteve êxito a tentativa de conciliação a que se refere o auto de não conciliação com a referência ……..60, cingindo-se a discordância apenas quanto ao grau da incapacidade permanente de que se encontra, ou não, afectado o sinistrado.
No exame singular foi considerada uma IPP de 2% (cap. I 1.1.1 b)), com consolidação em 13/10/2018, estando referidas como sequelas resultantes das lesões _ lombalgia - sofridas no acidente: ráquis: rigidez na extensão da coluna lombar, rigidez nos movimentos de rotação e lateralização a direita lombar. Lassegue e bracgard negativo.

Por não ter sido possível a conciliação, veio a seguradora responsável e o sinistrado requerer a realização de junta médica, nos termos do artigo 138.º n.º 2 do C.P.T., tendo apresentado os respectivos quesitos, que passamos a transcrever:

Quesitos da Seguradora:

1) Quais as sequelas que resultaram das lesões sofridas em consequência do acidente de trabalho? Em que elementos objectivos se fundamentam?
2) Qual a data da consolidação das lesões?
3) Quais os períodos de incapacidade temporária a atribuir?
4) Em que alínea(s) da TNI se enquadra(m) a(s) sequela(s)?
5) Qual a IPP a atribuir face à TNI?

Quesitos do sinistrado:

1. Em consequência do acidente dos autos o Demandante ficou a padecer das seguintes sequelas
1.1. Radiculopatia por atingimento radicular de L5 esquerda, conforme evidencia EMG realizada no âmbito da avaliação pelo INML?
1.2. Rigidez da coluna lombar?
1.3. Rigidez dos movimentos de rotação e lateralização à direita ao nível lombar?
1.4. Dor intensa ao nível da coluna lombar?
1.5. Parastesias dos dedos do pé esquerdo?
1.6. Dificuldade em permanecer em pé parado?
1.7. Dificuldade em permanecer sentado por períodos superiores a 30 minutos?
1.8. Dificuldade em permanecer na mesma posição, em decúbito, tendo de alterar entre os laterais, dorsal e ventral?
1.9. Dificuldade em permanecer na posição de flexão da coluna lombar, nomeadamente, de manhã não consegue apertar os cordões do sapato e começa a deambular com muita dificuldade?
1.10. Dificuldade em subir e descer escadas?
1.11. Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs.?
1.12. Impossibilidade de correr?
1.13. Impossibilidade de conduzir por mais de uma hora?
1.14. Muita dificuldade em conduzir tractor e utilizar motosserra pela vibração e, consequente dor que provoca nas costas?
2. Estas sequelas representam um agravamento de lesão anterior ou preexistente ao acidente?
3.Tais sequelas inscrevem-se no CAP III, nº 7 (0.10 - 0.20) da TNI?
3.1. Ou outro e qual? Justifique?
3.2. Qual o coeficiente (mínimo, intermédio ou máximo) a atribuir? Justifique?
3.3. Qual o grau de incapacidade parcial permanente para o trabalho de que o sinistrado se encontra afectado?

Teve lugar o exame por Junta Médica no âmbito do qual os Srs. Peritos Médicos responderam aos quesitos da seguinte forma:

Resposta aos quesitos da seguradora

1.º Não resultaram sequelas. No exame objectivo e na existência de pré danos
2.º A atribuída pelo GML, alta em 13-10-2018
3.º Os atribuídos pelo GML a fls. 82 vs.
4.º Prejudicado
5.º Prejudicado

Resposta aos quesitos do sinistrado

1.1.º a 1.14.º Não. As lesões são pré-existentes ao acidente e não têm nexo causal com o evento participado.
2.º - Não existe agravamento.
3.º - Prejudicado.
3.1.º - Prejudicado
3.2.º - Curado sem incapacidade
3.3.º - Prejudicado.

Pelo Perito Médico do sinistrado foi dito que do acidente resultou radiculalgia do membro inferior esquerdo, por compressão da raiz de L5 esquerda, causada por hérnia discal L4-L5, confirmada na RM de fls. 71 e EMG de fls. 83, bem como no exame objectivo o sinistrado refere dor na região nadegueira esquerda e face antero – lateral esquerda que corresponde ao território da raiz de L5 esquerdo. Entende, por tudo isto, que deveria atribuir-se ao sinistrado uma IPP de 10% (Cap. III; 7; 0,10 – 0,20).

Após a notificação do auto de junta médica o sinistrado solicitou esclarecimentos aos senhores Peritos Médicos, que obtiveram a seguinte resposta:

Em resposta aos quesitos formulados pelo Autor, em sede de junta de esclarecimentos, os peritos, por maioria (Entidade responsável e Tribunal), respondem da seguinte maneira:

1.1. No objecto da perícia o sinistrado questionou os senhores peritos se o mesmo ficou a padecer de:

- Radiculopatia por atingimento radicular de L5 esquerda, conforme evidencia EMG realizada no âmbito da avaliação pelo INML?
- Rigidez da coluna lombar?
- Rigidez dos movimentos de rotação e lateralização à direita ao nível lombar?
- Dor intensa ao nível da coluna lombar?
- Parastesias dos dedos do pé esquerdo?
- Dificuldade em permanecer em pé parado?
- Dificuldade em permanecer sentado por períodos superiores a 30 minutos?
- Dificuldade em permanecer na mesma posição, em decúbito, tendo de alterar entre os laterais, dorsal e ventral?
- Dificuldade em permanecer na posição de flexão da coluna lombar, nomeadamente, de manhã não consegue apertar os cordões do sapato e começa a deambular com muita dificuldade?
- Dificuldade em subir e descer escadas?
- Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs.?
- Impossibilidade de correr?
- Impossibilidade de conduzir por mais de uma hora?
- Muita dificuldade em conduzir tractor e utilizar motosserra pela vibração e, consequente dor que provoca nas costas?
“Admitimos que sim a todos os itens assinalados, mas sem relação com o evento em apreço.”
2. Por maioria, os senhores peritos da seguradora e do Tribunal, respondem a todas aquelas questões, em bloco, nos seguintes termos: “Não. As lesões são preexistentes ao acidente e não tem nexo causal com o evento participado.»
“Não se trata de quesito, no entanto reiteram o previamente mencionado de que as lesões apresentadas são pré-existentes e não tem nexo causal com o vento participado. ”
3. Por sua vez, o perito do sinistrado refere: «que do acidente resultou radiculalgia do membro inferior esquerdo, por compressão da raiz de L5 esquerda, causada por hérnia discal L4-L5 confirmada na RM de fls. 71 e EMG de fls. 83, bem como no exame objectivo o sinistrado refere dor na região nadegueira esquerda e face antero-lateral esquerda que corresponde ao território da raiz de l5 esquerdo
“O perito do sinistrado mantém a afirmação constante.”
4. Das respostas obtidas pelos senhores peritos médicos verifica-se que todos aqueles pontos de facto não foram respondidos, individualizadamente, como se pretende e impõe a fim de que não se suscitem dúvidas ou conclusões erróneas.
“4- Não é quesito.”
5. Assim, afigura-se imprescindível a uma avaliação, objectiva e rigorosa, do estado clínico do sinistrado que os senhores peritos respondam, independentemente, de haver ou não, nexo causal com o acidente ou das lesões serem anteriores ao acidente que respondam ao seguinte:

Se o Demandante padece de:
5.1. Radiculopatia por atingimento radicular de L5 esquerda?
5.2. Rigidez da coluna lombar?
5.3. Rigidez dos movimentos de rotação e lateralização à direita ao nível lombar?
5.4. Dor intensa ao nível da coluna lombar?
5.5. Parastesias dos dedos do pé esquerdo?
5.6. Dificuldade em permanecer em pé parado?
5.7. Dificuldade em permanecer sentado por períodos superiores a 30 minutos?
5.8. Dificuldade em permanecer na mesma posição, em decúbito, tendo de alterar entre os laterais, dorsal e ventral?
5.9. Dificuldade em permanecer na posição de flexão da coluna lombar, nomeadamente, de manhã não consegue apertar os cordões do sapato e começa a deambular com muita dificuldade?
5.10. Dificuldade em subir e descer escadas?
5.11. Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs.?
5.12. Impossibilidade de correr?
5.13. Impossibilidade de conduzir por mais de uma hora?
5.14. Muita dificuldade em conduzir tractor e utilizar motosserra pela vibração e, consequente dor que provoca nas costas?
“Passam a responder da seguinte maneira: De 5.1 a 5.14, sim, assim o refere, mas não reportável ao evento participado.”
6. Pretende-se, ainda, que esclareçam o seguinte:
6.1 Se a ressonância magnética realizada na altura do acidente nos serviços clínicos da Demandada em 07.06.2018 e, posteriormente, no âmbito da avaliação pelo INML, demonstram ou não, a existência de uma hérnia discal em L4-L5 com deformação do saco dural e contactando a raiz de L5?
“ Sim.”
6.2 Se a electromiografia já no âmbito da avaliação pelo INML demonstra ou não a existência de compressão da raiz de L5?
“ Sim.”
6.3 Atento a distância temporal existente entre a data do acidente e a realização dos exames – RMN e Electromiografia - no âmbito da avaliação no INML, se será normal que as lesões venham descritas nos últimos relatórios, como “crónicas” ou “degenerativas”, atento o decurso de cerca de 1 ano após a sua verificação?
“Sim, as lesões apresentadas nos exames diagnóstico de RMN da coluna lombar e electromiografia dos membros inferiores são de carácter crónico e degenerativo e sem relação com o evento participado.”
O perito médico do sinistrado reafirma que não se podem aferir as conclusões do ponto 6.3 face á avaliação clínica e aos exames complementares de diagnóstico realizados.”

Seguidamente foi pelo Tribunal a quo proferida sentença no âmbito da qual se considerou o sinistrado curado sem qualquer grau de desvalorização, acolhendo assim o laudo maioritário e da qual consta o seguinte dispositivo:

III. Decisão:
Pelo exposto, decido:
Condenar a seguradora a pagar ao autor as quantias de € 1.588,07 e € 20,00, acrescidas de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a data da tentativa de conciliação até integral pagamento.
Nos termos do art. 120º nº1 do Cód. de Processo do Trabalho, fixo à causa o valor de € 1.608,07.
*
Custas a cargo do autor.
Registe e notifique.”
*
Inconformado veio o sinistrado interpor recurso de apelação, no qual formulou as seguintes conclusões que passamos a transcrever:

1. Pelo presente recurso pretende-se a sindicância da decisão proferida pelo Tribunal a quo que recaiu sobre a matéria de facto, ao dar como provado, que o recorrente/sinistrado ficou curado sem desvalorização.
2. Desde logo, porque os senhores peritos médicos que integraram o exame, por junta médica maioritária, para além de se terem pronunciado sobre questões de facto que lhe estavam vedadas – nexo de causalidade entre as lesões e o acidente – apresentam respostas à matéria de facto que integra o objecto da perícia que pecam por manifesta falta de fundamentação, inquinando a legalidade da decisão judicial que nela se ancorou.
3. Participado o acidente e submetido o sinistrado à avaliação no Gabinete Médico-Legal e Forense do Cávado foi considerado pelo perito singular que o mesmo sofreu em consequência do acidente de trabalho hérnia discal em L4-L5, apresentando como sequelas - rigidez na extensão da coluna lombar, rigidez nos movimentos de rotação e lateralização à direita da lombar, fenómenos dolorosos da coluna lombar agravado com esforço e algumas posições; parestesias nos dedos do pé esquerdo, dificuldade para conduzir o tractor por longos períodos e pela vibração que provoca nas costas; dificuldade a subir e descer escadas, em correr, em pegar em pesos, em permanecer em pé e para passar de decúbito a deambular, atribuindo-lhe pela raquialgia (dor na coluna lombar) um grau de incapacidade permanente para o trabalho de 2%, nos termos do Capítulo I, 1.1.1.b) da TNI (cfr. relatório médico-legal de fls. 80 e sgts.).
4. Na tentativa de conciliação a Ré seguradora aceitou a existência do acidente, a sua caracterização como acidente de trabalho e o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões, frustrando-se a conciliação, unicamente por discordância da ré/recorrida quanto ao grau de incapacidade parcial permanente (doravante IPP) atribuído ao sinistrado.
5. Estando em discussão, apenas e só, o grau de IPP do sinistrado, o processo prosseguiu para a fase contenciosa, com o pedido de exame, por junta médica, nos termos do disposto no art. 117º, nº 1 do CPT.
6. Nesse exame os Srs. peritos médicos, por unanimidade, aceitaram que o sinistrado apresentava: radiculopatia por atingimento radicular de L5 esquerda; rigidez da coluna lombar; rigidez dos movimentos de rotação e lateralização à direita ao nível lombar; dor intensa ao nível da coluna lombar; parastesias dos dedos do pé esquerdo; dificuldade em permanecer em pé parado; dificuldade em permanecer sentado por períodos superiores a 30 minutos; dificuldade em permanecer na mesma posição, em decúbito, tendo de alterar entre os laterais, dorsal e ventral; dificuldade em permanecer na posição de flexão da coluna lombar, nomeadamente, de manhã não consegue apertar os cordões do sapato e começa a deambular com muita dificuldade; dificuldade em subir e descer escadas; impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs.; impossibilidade em correr; impossibilidade de conduzir por mais de uma hora; muita dificuldade em conduzir tractor e utilizar motosserra pela vibração e, consequente dor que provoca nas costas;
7. Contudo, os peritos nomeados pelo Tribunal e pela Seguradora, não subscreveram a posição do GML e não atribuíram ao Demandante qualquer desvalorização, por o entenderem que as lesões e sequelas que o mesmo apresenta são preexistentes ao acidente, de origem crónica e degenerativas e sem nexo causal com o evento participado.
8. Contrariamente, o Sr. Perito nomeado pelo sinistrado, no seu voto de vencido, foi de opinião que as lesões – hérnia discal em L4-L5 - resultantes do acidente dos autos determinaram ao sinistrado sequelas ao nível da coluna lombar, designadamente, radiculalgia (dor que irradia para o membro inferior), por compressão da raiz de L5 esquerda, causada pela hérnia discal em L4-L5., confirmada na RM de fls. 71 e EMG de fls. 83, bem como, no exame objectivo quando o sinistrado refere dor na região nadegueira esquerda e face antero-lateral esquerda a que corresponde ao território da raiz de L5 esquerdo, atribuindo-lhe uma IPP de 10%, coeficiente mínimo previsto no Capítulo III. 7 (0,10-0,20) da TNI.
9. Tendo a Ré seguradora aceite, na tentativa de conciliação, o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões – formação de hérnia discal em L4-L5 com rotura do anulo fibroso e a contactar raiz L5 esquerda – em sede de junta médica, a única questão a dirimir pelos senhores peritos médicos seria a definição das sequelas que daí advinham para o sinistrado, designadamente, ou raquialgia - conforme avaliação do perito singular do GML - ou radiculalgia - conforme avaliação do perito nomeado pelo sinistrado - e determinar o grau de I.P.P que as mesmas aportavam ao sinistrado!
10. A ser legítima a discussão do nexo de causalidade entre lesões e o acidente determinaria que a abertura, da fase contenciosa, tivesse sido feita com a apresentação da petição inicial a que se reporta a alínea a) do artigo 117º do CPT permitindo ao sinistrado exercer o contraditório e oferecer meios de prova, nomeadamente, documental e testemunhal que desta forma lhe ficam cerceados e não mediante a tramitação simplificada a que alude a alínea b) do mesmo normativo, como aconteceu!
11. Vedado que estava ao Meritíssimo Juiz a quo fundamentar a sua decisão sobre a matéria de facto no laudo maioritário dos senhores peritos médicos, sempre deveria a sentença recorrida ancorar-se no laudo minoritário do Sr. perito médico e considerá-lo afectado de radiculalgia do membro inferior esquerdo, por compressão da raiz de L5 esquerda.
12. Parecer médico-legal que tem total apoio nos demais meios de prova carreados para os autos, (os quais nem tão pouco tiverem qualquer afloramento crítico na sentença recorrida), nomeadamente, nos meios de diagnóstico – ressonâncias magnéticas e electromiografia – a que o sinistrado foi submetido;
13. no episódio de urgência, de 28.05.2028, relativo à observação do sinistrado no dia do acidente - fls. 52 dos autos - donde decorre a seguinte informação: «Refere lombalgia apos esforço com dificuldade em mobilizar desde então; SEM HISTÓRIA DE TRAUMA RECENTES, REFERE SER PRIMEIRO EPISÓDIO»;
14. no relatório de médico ortopedista que observou o sinistrado, em 13 de julho de 2018, logo após a alta inusitada dada ao sinistrado pelos serviços clínicos da Ré em 04 de julho de 2018 - Fls. 6 dos autos, donde decorre: «Neste momento mantém dor lombar com irradiação para o membro inferior esquerdo; .Laségue a 45ª; TAC com sinais de hérnia discal em L4 e L5; Deve sere reobservado na companhia de seguros.»
15. nos elementos do processo individual do sinistrado existente no S.N.S de Fls. 40 a 46 que demonstram, que a médica de família que seguiu clinicamente o sinistrado após alta dada pelos serviços clínicos da Ré associa o síndrome da coluna com irradiação de dor para o membro inferior esquerdo que o sinistrado apresentava ao acidente de trabalho por si sofrido, detetando a presença de hérnia discal em L4 /L5 com deformação do saco dural e contatando a raiz de L5 à Esquerda;
16. o exame realizado no GML – fls. 80 dos autos – no qual a Sra. perita médica do GML defende que do acidente participado resultou para o sinistrado uma hérnia discal em L4-L5 que lhe provoca dor na coluna lombar.
17. Atendendo à globalidade da prova produzida e existente nos autos merece assim censura a decisão do Tribunal recorrido ao dar como provado que o sinistrado ficou curado sem desvalorização, devendo pelo presente recurso alterar-se a matéria de facto considerando-se que do acidente em causa resultou para o mesmo um grau de incapacidade permanente parcial de 10,% pela radiculalgia de que ficou afectado e prevista no CAP III. 7 (0,10-0,20) da TNI.
18. Consequentemente, deverá condenar-se a Ré seguradora no pagamento da indemnização, em capital de remição, da pensão anual, no valor de EUR. 568,40 (8.120,00 X 70% X 10%), com início em 14 de outubro de 2018, dia seguinte ao da alta definitiva.
19. Se assim não se entender, o que se ventila por mera necessidade de raciocínio, sempre se deverá julgar, as respostas, já acima transcritas, dadas pelos peritos médicos que subscreveram o laudo maioritário às questões médicas colocadas, manifestamente concisas, sucintas, omissas e abstractas por não serem minimamente esclarecedoras quanto aos motivos que os levaram a concluir pela inexistência de IPP, pela pré-existência de lesões e/ou sequelas degenerativas e respectiva falta de nexo causal com o acidente de trabalho sofrido pelo sinistrado e/ou dos motivos da inexistência de um eventual agravamento de uma lesão/doença anterior!
20. Constituindo o exame, por junta médica, uma modalidade de prova pericial, tais exames não serão de considerar pelo tribunal, como elemento válido de prova, se as respostas aos quesitos ou o relatório sejam deficientes, obscuros ou contraditórios ou se as conclusões ou respostas aos quesitos não se mostrarem fundamentadas, tanto mais, que decorre do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, a obrigação legal dos peritos fundamentar todas as suas conclusões, de forma a que as respostas aos quesitos ou a fundamentação aduzida no laudo pericial permitam com segurança ao julgador analisar e ponderar o grau de incapacidade a atribuir.
21. No caso, a sentença recorrida considerou que é de zero a IPP a atribuir ao Demandante, louvando-se no laudo maioritário emitido pela junta médica que considerou que as sequelas que o sinistrado apresenta, no exame objectivo que lhe foi realizado, nomeadamente, Radiculopatia por atingimento radicular de L5 esquerda; Rigidez da coluna lombar; Rigidez dos movimentos de rotação e lateralização à direita ao nível lombar; Dor intensa ao nível da coluna lombar; Parastesias dos dedos do pé esquerdo; Dificuldade em permanecer em pé parado; Dificuldade em permanecer sentado por períodos superiores a 30 minutos; Dificuldade em permanecer na mesma posição, em decúbito, tendo de alterar entre os laterais, dorsal e ventral; Dificuldade em permanecer na posição de flexão da coluna lombar, nomeadamente, de manhã não consegue apertar os cordões do sapato e começa a deambular com muita dificuldade; Dificuldade em subir e descer escadas; Impossibilidade em transportar pesos acima de 5 Kgs.; Impossibilidade de correr; Impossibilidade de conduzir por mais de uma hora; Muita dificuldade em conduzir tractor e utilizar motosserra pela vibração e, consequente dor que provoca nas costas, são de caracter degenerativo e crónico sem relação com o acidente dos autos.
22. Porém, lidas e relidas as respostas dadas por aqueles peritos médicos às questões que lhes foram colocadas na perícia, debalde se encontra, no laudo maioritário, respostas fundamentadas e minimamente esclarecedoras para as seguintes questões:
23. Qual é em concreto a doença e/ou patologia degenerativa de que o sinistrado era portador antes do acidente sofrido nos autos?
24. Como é que essa patologia prévia e/ou doença degenerativa se reflectia na saúde e capacidade funcional do sinistrado?
25. Se essa patologia prévia e/ou doença degenerativa lhe aportava um qualquer grau do IPP?
26. Com que base ou fundamento os senhores peritos médicos sustentam que as lesões/sequelas apresentadas pelo sinistrado são do foro degenerativo e sem relação com o acidente, já que, nem tão pouco existe nos autos qualquer relatório médico, meio de diagnóstico ou documento clínico do sinistrado realizado antes do acidente que se possa contrapor aos realizados após o acidente, de forma a que se possam tirar ilações e conclusões com razoável certeza quanto à pré-existência dessa patologia?
27. Em que medida os meios de diagnóstico juntos aos autos – ressonância magnética e electromiografia juntas aos autos e realizadas após o acidente - permitem concluir aos senhores peritos que as lesões/sequelas neles reflectidas são de caracter degenerativo e prévias ao acidente?
28. E de que premissas partem os senhores peritos para afirmar que na eventualidade de existir patologia prévia, a mesma não foi agravada pelo acidente? Como sustentam os senhores peritos tal conclusão, já que, a mera resposta negativa dada a tal questão, nada esclarece?
29. Qual é em concreto a lesão que reconhecem que adveio ao sinistrado em consequência do acidente dos autos, atendendo a que da documentação clínica junta pela ré seguradora, nomeadamente, do boletim de alta – junto a fls. 5 – se faz apenas alusão a “lombalgia” que, mais não é do que, uma dor na coluna, ou seja, um sintoma e não a causa da lesão?
30. Porque é que os senhores peritos concluem que as lesões/sequelas evidenciadas no exame objectivo e nos meios de diagnóstico juntos aos autos não tem relação causal com o acidente sofrido pelo sinistrado?
31. Pelo exposto, e sabendo-se que o laudo maioritário não se impõe ao Julgador que tem a liberdade de o apreciar livremente, sempre se dirá que um juízo crítico de toda a prova pericial e documental existente nos autos, amplamente referenciado nas conclusões 11º a 16º, sempre legitimaria ao Juiz a quo e aos desta Relação, proferir decisão de acordo com o laudo minoritário subscrito pelo Sr. perito médico do sinistrado - atribuindo-se-lhe uma IPP de 10%, pela radiculalgia que ficou a padecer enquadrável no CAP. III, 7 da TNI - por ser o único que responde a todas as questões médicas colocadas, que avalia lesões e sequelas do sinistrado de forma fundamentada e com respaldo em toda a prova existente nos autos.
32. Se assim não se entender afigura-se-nos que é deficiente a matéria de facto, dada a falta de fundamentação do exame por junta médica, o que impõe a sua repetição e a anulação da sentença que nela se fundamentou!

TERMOS EM QUE, deve o presente recurso ser recebido e provido, revogando-se a sentença recorrida e determinando-se a sua substituição por outra que considere, em função do laudo minoritário subscrito pelo perito médico que integrou a junta médica, afectado de uma IPP de 10%, nos termos do CAP III. 7 (0,10-0,20) da TNI e, consequentemente, condene a Ré seguradora nas prestações a que o sinistrado tem direito, designadamente, no pagamento da indemnização, em capital de remição, da pensão anual, no valor de EUR. 568,40, com início em 14 de outubro de 2018, dia seguinte ao da alta definitiva.
Se, assim, não se entender, o que se ventila por mera necessidade de raciocínio deverá revogar-se a sentença recorrida para que o Tribunal a quo proceda às diligências consideradas convenientes, com vista ao correcto apuramento do grau e natureza da incapacidade de que sofre o sinistrado,
como é da mais inteira JUSTIÇA!”

A Seguradora respondeu pugnando pela improcedência do recurso.
Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87.º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer, no sentido da improcedência da apelação.
Não houve qualquer resposta ao parecer
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, incumbe apreciar e decidir.
*
II OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões do Recorrente (artigos 608º n.º 2, 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil), as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes:

- Da impugnação da matéria de facto
Do excesso de pronúncia
Da falta de fundamentação do auto de junta médica.
*
III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes para a decisão da causa são os que resultam do relatório supra, a que acrescem os seguintes:

1. O autor exercia a actividade profissional de madeireiro, por conta própria, auferindo a retribuição anual de € 8.120,00;
2. No dia 28 de Maio de 2018, enquanto exercia a sua actividade profissional, o autor sentiu um estalo na coluna quando estava a desviar um ramo com 40 ou 50 Kg;
3. Os senhores peritos médicos concluíram, por maioria, que o autor ficou curado sem desvalorização e não ficou com qualquer incapacidade permanente para o trabalho;
4. Como consequência directa e necessária do acidente, o autor esteve com incapacidade temporária absoluta pelos períodos descritos a fls. 80, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos;
5. O autor ficou clinicamente curado no dia 13 de Outubro de 2018;
6. Como consequência directa e necessária do acidente, o autor despendeu a quantia de € 20,00 em deslocações obrigatórias no âmbito dos presentes autos;
7. O autor nasceu no dia - de Abril de 1981;
8. A responsabilidade por acidentes de trabalho com o autor estava transferida para a ré por contrato de seguro válido e eficaz na altura do acidente;
9. Este contrato de seguro cobria a retribuição anual de € 8.120,00;
10. A ré entregou ao autor a quantia de € 443,82 pelo período em que esteve com incapacidade temporária absoluta para o trabalho.

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO

Da impugnação da matéria de facto

a) Do excesso de pronúncia

Insurge-se o recorrente quanto ao facto da decisão recorrida assentar no laudo maioritário de junta médica, que se pronunciou sobre matéria que extravasa o objecto da perícia ao concluíram sobre a falta de nexo causal entre as lesões e o acidente sofrido pelo sinistrado e que se encontra insuficientemente fundamentado, padecendo de incongruências, inexactidões.
Reclama por isso que se altere a decisão recorrida valorizando-se a situação clinica do sinistrado em conformidade com o laudo de junta médica, minoritário subscrito pelo perito médico por si indicado, com as demais consequências. Ou se assim não se entender que se revogue a sentença recorrida determinando que se proceda à realização de diligências consideradas convenientes para o correcto apuramento do grau e natureza da incapacidade de que sofre o sinistrado,
Quanto ao excesso de pronúncia, por o tribunal a quo se ter pronunciado sobre questões de facto que lhe estavam vedadas apenas nos apraz dizer que não assiste qualquer razão ao recorrente, pois não está, nem foi posto em causa o nexo de causalidade entre as lesões o acidente, mas sim aos Srs. Peritos Médicos por maioria entenderam perante a documentação clínica constante dos auto que as sequelas de que o sinistrado é portador não resultaram do acidente por terem natureza degenerativa ou crónica.
Acresce dizer que em lado algum, designadamente em sede de exame médico singular realizado pelo GML, ficou definitivamente assente que as lesões apresentadas pelo sinistrado em consequência do acidente consistiram em hérnia discal em L4-L5 com rotura do anulo fibroso e a contactar raiz L5 esquerda. Ao invés o que resulta de tal exame médico, levado a cabo pelo Gabinete Médico-Legal, como lesão sofrida em consequência do acidente consiste numa lombalgia pós-esforço.
Assim, também deste ponto de vista não podemos concluir, como pretende o recorrente, que ao tribunal a quo estava por esse motivo vedada a possibilidade de fundamentar a sua decisão no laudo maioritário dos Senhores Peritos médico, por se terem pronunciado sobre matéria de facto que estava assente e fora da sua cogitação. Como também não podemos concluir que por essa mesma razão que o tribunal a quo teria de ter acolhido a posição sustentada pelo Perito do sinistrado em sede de junta médica, a qual não é sustentada por qualquer outro perito médico nem tem suporte na documentação clinica existente, uma vez que não está minimamente demonstrado que em consequência do acidente dos autos o sinistrado sofreu hérnia discal em L4-L5.

b) Da falta de fundamentação do auto de junta médica

Quanto à falta de fundamentação do auto de junta médica, vejamos!

Dispõe o artigo art.º 662º do Código de Processo Civil e aqui aplicável por força do n.º 1 do art.º 87º do Código de Processo do Trabalho, o seguinte:

“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
(…)”
Estabelece o n.º 8 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades, anexa ao DL n.º 352/2007, de 23 de Outubro, que o resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões. Esta exigência decorre essencialmente, do facto do julgador não ter conhecimentos especiais em medicina e, por isso, as respostas aos quesitos ou a fundamentação consignada no laudo pericial devem permitir que o juiz com segurança, possa analisar e ponderar o enquadramento das lesões/sequelas na TNI e o respectivo grau de incapacidade a atribuir.
A prova pericial em que se traduzem os exames médicos realizados no âmbito das acções emergentes de acidente de trabalho está sujeita à livre apreciação do julgador (cfr. art.º 389º do Código Civil e arts. 489º e 607º, nº 5 do CPC).
Daqui resulta que o laudo de junta médica não sendo vinculativo, deve ser apreciado como qualquer outro meio de prova.
Contudo, estando em causa um juízo técnico-jurídico, para dele divergir o julgador tem de fundamentar essa divergência, impondo-se uma especial exigência da fundamentação, assente preferencialmente em opinião ou parecer científico ou técnico, de sinal contrário. Porém, para que o juiz possa fundamentar circunstanciadamente a sua decisão é indispensável que a prova pericial se apresente também devidamente fundamentada.
Assim, embora o tribunal aprecie livremente os elementos médicos constantes do processo, designadamente perícia singular, relatórios clínicos e exames complementares de diagnóstico, a par da própria observação do sinistrado, essa livre apreciação não é, todavia, sinónimo de arbitrariedade, razão pela qual aos peritos médicos que intervêm na junta médica impõem-se que indiquem os elementos em que basearam o seu juízo e que o fundamentem, para que o Tribunal, o sinistrado e a entidade responsável pela reparação do acidente o possam sindicar.
Resumindo, as perícias médicas não constituem decisão sob o grau de incapacidade a fixar, mas são somente um elemento de prova, com exigências especiais de conhecimentos na matéria, por isso o laudo pericial tem de conter os factos que serviram de base à atribuição de determinada incapacidade de modo a que o tribunal possa interpretar e compreender o raciocínio lógico realizado pelos Srs. Peritos Médicos de forma a poder valorá-lo.
Na verdade, apesar do juiz não estar adstrito às conclusões das perícias médicas, certo é que, por falta de habilitação técnica, apenas delas deverá discordar em casos devidamente fundamentados e, daí também, a necessidade da cabal fundamentação do laudo pericial pois que, só assim, poderá o mesmo ser sindicado.
Competindo à perícia médica (exame singular ou exame por junta médica), a apreciação e determinação das lesões/sequelas que o sinistrado apresenta, bem como proceder à fixação da incapacidade para o trabalho decorrente das mesmas, não existindo razões objectivas para se discordar do laudo médico ou para formular pedidos de esclarecimentos aos peritos médicos, ou solicitar a realização de exames e de outros pareceres complementares, caso estes tenham respondido com precisão a todos os quesitos de forma lógica sem deficiência, obscuridade ou contradição, não se verificará qualquer razão para que o julgador divirja do laudo, fixando incapacidade distinta ou não atribuindo incapacidade.
Por fim, salientamos que resulta do disposto no artigo 140.º do CPT. que a fixação da incapacidade para o trabalho decorre de decisão soberana do juiz, que evidentemente terá de ter em atenção a prova pericial produzida, que deverá ser apreciada livremente pelo julgador. No entanto, atenta a natureza técnica e complexa associada a este tipo de perícia, na maioria dos casos a decisão proferida pelo juiz relativamente à fixação da incapacidade para o trabalho corresponde àquela que foi atribuída pelos peritos médicos que intervieram no processo em exame singular ou colegial e sendo este último presidido pelo juiz, permite-lhe indagar e esclarecer, aquando da realização do exame, todas as suas dúvidas resultantes da complexidade e tecnicidade que normalmente decorre de uma perícia médico-legal.
Não sendo desse modo, tais exames não serão de considerar pelo tribunal, como elemento válido de prova pericial, designadamente no caso de as respostas aos quesitos ou o relatório serem deficientes, obscuras ou contraditórios ou se as conclusões ou respostas aos quesitos não se mostrarem fundamentadas.
Reafirmamos que destinando-se esta prova a fornecer ao tribunal uma especial informação de facto tendo em conta os específicos conhecimentos técnicos ou científicos do perito que se não alcançam pelas regras gerais da experiência (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, 261 e segs. e Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, 322 e segs.), deve ser apreciada pelo juiz segundo a sua experiência, a sua prudência, o seu bom senso, com inteira liberdade, sem estar adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais, o que implica que o juiz possa na decisão de facto afastar-se do que resultou da perícia, mas apenas deverá discordar em casos devidamente fundamentados, nomeadamente baseados em outras opiniões científicas, ou em razões jurídico processuais que se afigurem ao legislador de relevantes.
Retornando ao caso dos autos questionamos se efectivamente os meios de prova indicados pelo recorrente, designadamente a opinião minoritária do perito do sinistrado que integrou a junta médica, impunham decisão diferente.
A esta questão teremos de responder de forma negativa, pois ao contrário do afirmado pelo recorrente a opinião minoritária do perito indicado pelo sinistrado não põe em causa, nem afasta a posição assumida no laudo maioritário de junta médica, fundamentada na documentação clinica junta aos autos, a qual permite concluir que o sinistrado não ficou portador de qualquer sequela valorizável pela TNI em consequência do acidente a que os autos se reportam, pois que de forma suficientemente fundamentada os Srs. Peritos Médicos responderam aos quesitos daí resultando, após a realização de exame objectivo ao sinistrado, que este não apresenta qualquer sequela funcional resultante do acidente de trabalho, o qual consistiu numa lombalgia de esforço, não sendo por isso de lhe atribuir uma qualquer incapacidade.
No que respeita à falta de fundamentação do laudo maioritário de junta médica, afigura-se-nos dizer que tal como decorre do Relatório supra, constatamos que a junta médica respondeu aos quesitos que lhe foram colocados por ambas as partes e prestou os esclarecimentos que lhe foram solicitados pelo sinistrado, com fundamentação suficiente do ponto de vista médico, pois ali se identificam analisam e avaliam os elementos clínicos em que se baseia.
Em sede de deliberação médica, teremos de dizer que os senhores peritos responderam aos quesitos formulados e prestaram os esclarecimentos solicitados, não se detectando deficiência (pronunciaram-se sobre todos os pontos), obscuridade (pronunciaram-se de modo que não suscita dúvida sobre o sentido visado) ou contradição (pronunciaram-se por maioria e de modo coerente).
Resumindo, o auto de junta médica não é omisso, não é contraditório nem é carente de fundamentação, pelo facto do perito do sinistrado ter avaliado e caracterizado a situação do sinistrado diferentemente dos restantes peritos médicos que intervieram nos autos, não lhe reconhecendo as sequelas por aquele consideradas. Ou seja, as divergências detectadas, relativamente à posição assumida pelo perito do sinistrado relativamente aos demais peritos, não integram quaisquer vícios lógicos mas diferente perspectiva científica que ao juiz, a coberto do princípio da livre apreciação da prova pericial (art. 389.º do Código Civil e arts. 489.º e 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil), cabe acolher ou não, fundamentando circunstanciadamente a sua decisão.
Ora, estando em causa o laudo maioritário de dois dos três peritos que constituíram a junta médica, laudo esse que versou sobre todas as questões colocadas pelas partes, com indicação dos motivos da decisão, suportada no resultado dos exames imagiológicos (RM e EMG), devidamente considerados, e que nos permite perceber da razão pela qual os Peritos Médicos, por maioria, decidiram considerar o sinistrado curado sem desvalorização, é de considerar que a junta médica se encontra suficientemente fundamentada, inexistindo violação do citado n.º 8 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades.
Consequentemente inexiste fundamento para anular ou reabrir a junta médica para mais esclarecimentos ou outras indagações, já que o laudo pericial é desprovido de omissão de fundamentação, não evidencia qualquer contradição nem se revela de incompleto.
Em suma, não existindo elementos de prova técnico-científicos que nos permitam divergir do laudo maioritário do Srs. Peritos Médicos que compuseram a Junta Médica, o qual não padece de qualquer ambiguidade, obscuridade ou contradição que imponha o esclarecimento a solicitar aos Srs. Peritos Médicos e não se verificando qualquer situação que impossibilite a correcta reapreciação da matéria de facto e subsequente decisão de direito, teremos de concluir pela inexistência de qualquer erro de julgamento que implique a revogação da decisão proferida pelo tribunal recorrido.
Em face do exposto mais não resta do que manter a decisão recorrida a qual não merece qualquer censura, negando consequentemente provimento ao recurso.

V - DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida
Custas a cargo do Recorrente.
Notifique.
18 de Março de 2021

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
Antero Veiga