Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
224/14.3.TBAMR-A.G1
Relator: JOSÉ FLORES
Descritores: EXECUÇÃO DE SENTENÇA
CUSTAS DE PARTE
EMBARGOS À EXECUÇÃO
CASO JULGADO
APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Viola o caso julgado anterior a decisão de embargos de executado por custas de parte que “revoga” a anterior decisão de condenação em custas da sentença exequenda;

II- Beneficiando os executados de apoio judiciário na modalidade prevista no art. 16º, nº 1, al. a), da actual Lei nº 34/2004, é-lhes inexigível o cumprimento dessa obrigação de custas (que inclui as de parte), enquanto subsistir da dispensa, o que constitui excepção impeditiva de execução, tal como resulta do disposto no art. 729º, al. e), do C.P.C.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES NA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:

I – Relatório

Os Recorrentes são embargados na oposição desencadeada pelos aqui Recorridos à execução que aqueles lhes moveram. Estes culminaram os seus embargos pedindo que seja julgados provados e procedentes, com as cominações legais consequentes, alegando que a obrigação que ora se executa lhes é inexigível.
Os embargados contestaram, pedindo a sua improcedência.

Após tentativa de conciliação frustrada e o devido contraditório, foi proferida a seguinte sentença em fase de saneamento:

“Nestes termos, julga-se a presente oposição à execução por embargos deduzida pelos embargantes/executados (…) totalmente procedente e, em consequência, absolve-se os mesmos da execução instaurada pelos embargados/exequente (…).
Em conformidade, determina-se a extinção da execução.
Custas a cargo dos embargados/exequentes (cfr. artigo 527º, nºs1 e 2, do Código de Processo

Inconformada com tal decisão, dela interpuseram os Embargados o presente recurso de apelação, em cujas alegações formulam as seguintes conclusões:

I. É sindicável por recurso a sentença proferida que viole caso julgado anterior sendo independentemente do valor da causa e da sucumbência.
II. Quando por sentença proferida no âmbito de Embargos de Executado os Executados são condenados ao pagamento das “custas” bem como se determina a “prossecução da execução”, caso não haja reclamação, reforma ou recurso apresentados pela parte vencida, deve ter-se a mesma como transitada em julgado.
III. As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.
IV. A sentença condenatória não sindicada e já transitada em julgado, acompanhada da nota discriminativa e justificativa de custas de parte não sindicadas, constituem título executivo.
V. Os embargos de executado apresentados na execução cujo título executivo é uma sentença condenatória em custas acompanhada das devidas notas não admite qualquer outro fundamento que não os previstos no artigo 729.º do CPC.
VI. Não podem os Recorridos esperar defender-se perante um título executivo transitado em julgado, com base na impugnação da condenação de que foram alvos.
VII. Não tendo os Recorridos feito uso dos seus argumentos em sede de sindicância da sentença transitada em julgado, tendo esta ganho força executiva e configurando um caso julgado, não podem estes vir a fazer uso dos argumentos anteriores para obstar à prossecução da execução.
VIII. O Tribunal que entenda que uma sentença anterior, já caso julgado, tenha decidido de forma errada não pode sentir-se no direito de a sindicar, porque ultrapassa os seus poderes de conhecimento.
IX. A sentença que se pronuncie sobre questões já transitadas em julgado incorre em omissão de pronúncia por obstar ao conhecimento da excepção dilatória de caso julgado bem como por excesso de pronúncia por conhecer de questões que não podia ter conhecimento.
X. A sentença proferida violou, assim, o caso julgado e a autoridade de julgado, dado que o que estava na base da execução embargada era um título executivo judicial, já transitado em julgado, onde além da mesma identidade de sujeitos e da causa, os Recorridos tiveram, naquele processo, a possibilidade de reclamar, reformar ou recorrer – coisa que nunca fizeram.
XI. Em face de todo o exposto, com a sentença recorrida violou-se o disposto nos artigos 615.º n.º1 alínea d), 703.º n.º1 alínea a), 729.º, 577.º i), 580.º, 581.º, 620.º, 621.º, 628.º do Código de Processo Civil.

TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO, Deve o presente recurso ser admitido, ser revogada e substituída por outra que julgue totalmente improcedente os embargos apresentados pelos Recorridos e, consequentemente, determinar a prossecução da instância executiva.

Os Recorridos apresentaram contra-alegações onde concluem que deve ser mantida, na íntegra, a douta decisão de primeira instância.

II – Delimitação do objeto do recurso a apreciar:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº. 639º, do Código de Processo Civil (doravante C.P.C.).
A questão enunciada pode ser sintetizada da seguinte forma: se existe caso julgado no processo 511/10.0TBAMR-A, mais precisamente na decisão proferida em oposição, aí deduzida pelos aqui Recorridos/Alegantes, que seja invocável nesta acção executiva e respectiva oposição.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

III – FUNDAMENTOS

1. Factos (1)

1. 1. No dia 05 de Junho de 2014, os, aqui, embargados/exequentes (…) intentaram um processo de execução para pagamento de quantia certa, sob a forma sumária, contra os, aqui, embargantes/executados (…) – cfr. requerimento junto a fls.2-33, dos autos principais.
2. No campo destinado à exposição dos factos, alegaram, além do mais, que: “1. Os exequentes intentaram acção executiva para prestação de facto que correu termos neste Tribunal Judicial de Amares sob o número de processo 511/10.0TBAMR. 2. Citados, os executados deduziram oposição à execução, que viria a ser julgada improcedente, por não provada, assim como determinou que o pagamento das custas de ambos os processos (acção executiva e incidente declarativo – oposição à execução) corressem a cargo daqueles (…) 3. Por via da condenação no incidente declarativo, foram os executados notificados pelo Agente de Execução da elaboração da conta- nota discriminativa no dia 15 de Outubro de 2013 referente aos autos executivos (…), da qual consta o valor a liquidar de €664,61 (seiscentos e sessenta e quatro euros e sessenta e um cêntimos). 4. Os executados não reclamaram nem pediram reforma da conta de custas. 5. Não obstante as notificações do Agente de Execução e do mandatário dos exequentes, os executados não procederam ao devido pagamento da conta de custas de sua inteira responsabilidade. 6. Assim, são os executados devedores da quantia de €664,61 (seiscentos e sessenta e quatro euros e sessenta e um cêntimos) acrescidos de juros de mora vencidos no valor de €16,97 (dezasseis euros e noventa e sete cêntimos) sem prejuízo dos juros vincendos que calcularão a final, o que perfaz o valor de €681,58 (seiscentos e oitenta e um euros e cinquenta e oito cêntimos). 7. A nota de honorários e despesas do Agente de Execução conjuntamente com a sentença transitada em julgado constituem título executivo suficiente e exigível. 8. Por via da oposição à execução geraram-se custas e encargos neste processo declarativo que correu termos sob o número 511/10.0TBAMR-A, os quais, por via da total improcedência da acção de oposição à execução, determinam a exigibilidade dos valores despendidos pelos exequentes a título de taxas de justiça, procuradoria e demais encargos com o processo. 9. Com efeito, em face da improcedência total da oposição à execução, também as custas processuais deste incidente obrigatoriamente correm por conta dos executados que gozavam do benefício do Apoio Judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. 10. Assim, atenta a douta sentença proferida a 8 de Junho de 2012, os exequentes, no dia 9 de Julho de 2012 (dentro do prazo referido no artigo 25º, do Regulamento das Custas Processuais), remeteram para os autos, para o Ilustre mandatário dos opoentes(executados) e para o Instituto de Gestão Financeira e Infra- Estruturas da Justiça, I.P. a Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte, na qual foram peticionadas todas as custas, encargos e procuradoria (…) 6. Desta referida Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte não foi deduzida qualquer reclamação ou pedido de reforma. 7. Sucede que os exequentes, em face do preparo excessivo para uma perícia colegial, foram reembolsados, via Tribunal Judicial de Amares pelo Instituto de Gestão Financeira e Infra-Estruturas da Justiça, I.P do valor de €693,80 (…) 8. Porém, considerando que o Instituto de Gestão Financeira e Infra- Estruturas da Justiça, I.P., em face do disposto no Regulamento das Custas Processuais apenas assume o valor relativo a taxas de justiça, 9. Resulta que ainda se encontram por pagar por parte dos executados os valores referentes a: a) encargos no valor de €1561,20 (mil quinhentos e sessenta e um euros e vinte cêntimos); b) Procuradoria no valor de €166,39 (cento e sessenta e seis euros e trinta e nove cêntimos); 10. O que relativamente às custas de parte do apenso (A) da oposição à execução, já debitado o valor entretanto reembolsado pelo IGFIJ de €153,00 referentes à taxa de justiça da contestação da oposição à execução, perfaz a quantia de €1727,59 (mil setecentos e vinte e sete euros e cinquenta e nove cêntimos), a qual não se encontra paga, não obstante variadas interpelações para o efeito. 11. Pese embora os esforços do mandatário dos exequentes, os executados não procederam ao devido pagamento da conta de custas de sua inteira responsabilidade. 12. Assim, são os executados devedores da quantia de €1727,59 (mil setecentos e vinte e sete euros e cinquenta e nove cêntimos) acrescidos de juros de mora vencidos no valor de € 129,50 (cento e vinte e nove euros e cinquenta cêntimos) sem prejuízo dos juros vincendos que calcularão a final, o que perfaz o valor de €1857,09 (mil oitocentos e cinquenta e sete euros e nove cêntimos). 13. Calculando-se a quantia exequenda, acrescida do valor da taxa de justiça devida pela instauração da presente execução, em €2.564,17 (dois mil quinhentos e sessenta e quatro euros e dezassete cêntimos)” – sublinhado e destacado nossos (cfr. requerimento junto a fls.2-33, dos autos principais).
3. No referido Processo nº511/10.0TBAMR (autos principais e apenso), os, aqui, embargantes/executados (…) litigaram com benefício do apoio judiciário nas modalidades de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e atribuição de agente de execução – cfr. fls.10-12 e fls.13-15, dos presentes autos.
4. Nesses embargos os aqui recorridos (aí executados) opuseram-se à execução movida pelos aqui Recorrentes (aí exequentes), com o fundamento de que a sentença estava integralmente cumprida. A final a decisão julgou a oposição improcedente e, em consequência, determinou o prosseguimento da execução ditando, além de mais, que a custas seriam “pela opoente”. (2)

2. Direito

Como já dizia o Código Civil de Seabra de 1867, no seu art. 2502º (Do Caso Julgado), caso julgado é o facto ou o direito, tornado certo por sentença de que não há recurso.
O actual Código de Processo Civil, dita nessa linha, no seu art. 619º, que (1) Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º..
Esse art. 580º, esclarece que (1) as excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado. (2) Tanto a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.
Concretiza-se nesse art. 581º (1) repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. (2) Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. (3) - Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico. (4) Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.
Por sua vez, o seu artigo 621.º, reportando-se ao seu alcance, estipula que a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique.
Dita ainda o actual art. 732º, nº 5, do Código de Processo Civil (3), que (5) para além dos efeitos sobre a instância executiva, a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.

Estamos assim, apesar de o legislador qualificar o caso julgado como excepção peremptória, de alguma forma no âmbito dos pressupostos processuais que, como refere Miguel Teixeira de Sousa (4), definem as condições nas quais o direito subjectivo alegado pelo autor pode obter a tutela jurisdicional concedida através de uma decisão de procedência. Nesta perspectiva, os pressupostos processuais constituem limites intrínsecos à concessão da tutela jurisdicional e realizam uma função reguladora ou ordinatória, pois que determinam os condicionalismos processuais nos quais essa tutela pode ser concedida à parte requerente. (…) A consagração legal deste pressupostos visa acautelar determinados interesses que devem ser observados na concessão da tutela judiciária. (…) No direito positivo, que qualifica como peremptória a excepção de caso julgado (496º, al. a)), parece restar apenas a competência absoluta (quer a interna, quer a tendencialmente internacional) como exemplo dos pressupostos que acautelam interesses da titularidade do Estado e relativamente aos quais se justifica a precedência da sua apreciação, como, de algum modo (…). Em contrapartida, a generalidade dos pressupostos processuais visa salvaguardar os interesses das partes garantindo um equilíbrio de forças e de oportunidades entre os litigantes. (…) Mas a grande maioria dos pressupostos processuais tem por função preservar o réu de sacrifícios inúteis ou desnecessários, dado que a concessão de tutela judiciária à situação subjectiva alegada pelo autor não pode postergar todos os interesses desta parte passiva: assim, o réu não pode ser obrigado a discutir um certo objecto quando está pendente um outra causa sobre o mesmo objecto ou quando esse objecto já foi decidido noutra acção (o que justifica a previsão das excepções de litispendência e de caso julgado), quando a concessão da tutela judiciária em nada aproveita ao autor ou pode ser obtida através de outro meio processual menos oneroso para o réu (o que fundamento a exigência do interesse processual) do autor (…).

Trata-se de um instituto com raízes no direito fundamental, constitucional. O caso julgado está intimamente ligado ao princípio do Estado de Direito Democrático e uma garantia basilar dos cidadãos onde deve imperar a segurança e a certeza. Não obstante, o respeito pelas decisões no poder judicial, já anteriores à república, e que se encontram presentes na actualidade consubstanciam ao valor máximo de justiça aliado ao princípio da separação de poderes (5).

O fundamento do caso julgado reside, por um lado, no prestígio dos tribunais, o qual «seria comprometido em alto grau se mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente» e, por outro lado, numa razão de certeza ou segurança jurídica, pois «sem o caso julgado estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa. (…) Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu.“. (6)

“Se assim não fosse, os tribunais falhariam clamorosamente na sua função de órgãos de pacificação jurídica, de instrumentos de paz social”. (7)

Dito isto, há que salientar que a abrangência do instituto do caso julgado tem sofrido evoluções jurisprudenciais e doutrinais relevantes.

Como salienta o Conselheiro Tomé Gomes, relator do recente Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 22.6.2017 (8), sobre a tríplice identidade mencionada no citado art. 581º, quanto à identidade de sujeitos, o que é essencial não é a sua identidade física, mas a mesmidade da posição ou da qualidade jurídica na titularidade direitos e obrigações contemplados pelo julgado (9). Todavia, a relatividade subjectiva do caso julgado não obsta a que este se possa estender a terceiros, mormente nos casos em que da lei resulte tal extensão (10).

Também, no que respeita à identidade do pedido e da causa de pedir, importa aferi-la não de um modo global, mas sim em função de cada pretensão parcelar em que se possa decompor o objecto das causas em confronto e dos correspectivos segmentos decisórios.(…)

Os Apelantes alegam que existe violação do caso julgado na sentença proferida no citado processo 511/10, nomeadamente na parte do seu dispositivo que determinou que as custas da oposição julgada seriam suportadas “pela opoente”, sendo isso que literalmente consta da dita sentença exequenda, sem haver notícia de que tenha ocorrido qualquer rectificação da mesma.

Na sentença recorrida segue-se o entendimento de que a legislação em vigor impede, se bem percebermos, ab initio, a condenação em custas do referido processo, dos aqui oponentes Paula e Armindo, dado estes beneficiaram de protecção jurídica nas modalidades de dispensa do pagamento de taxa e demais encargos com o processo e atribuição de agente de execução no âmbito do citado processo 511/10. É com estes fundamentos que se conclui que a oposição deve proceder.

Em rigor, se atendermos ao sentido literal da sentença que alegadamente estabeleceu o julgado em questão, pelo menos em relação à oponente Paula, existe uma repetição do julgamento feito pelo Tribunal que apreciou os embargos do apenso A do processo 511/10.

A sentença recorrida, indo além do que lhe foi pedido ou alegado, acabou por discutir a sentença exequenda em nítida violação do caso julgado que essa estabelece, entre as mesmas partes, sobre essa matéria: responsabilidade/condenação nas custas devidas no mesmo, pelo que, pelo menos nessa parte, haverá que dar razão aos Apelantes.

Aliás, aquilo que se pedia ao Tribunal a quo (cf. art. 3º, nº 1, do C.P.C.) era tão-somente analisar se, pelo menos quanto à dita sentença exequenda, havia razão para considerar algum dos fundamentos tipificados no art. 729º, do C.P.C., que obstasse à sua coerciva cobrança, maxime a alegada inexigibilidade.

Já no que diz respeito ao oponente, a mesma sentença, aliás como as partes, deu de barato, porventura por lapso, que sequer havia título executivo. Essa questão não foi suscitada em recurso e por isso não será por nós desenvolvida mas, ainda que assim se não entendesse, em relação a ambas as partes envolvidas e aqui Recorridas, a questão colocada e aflorada na sentença impugnada prende-se sim com a exigibilidade da obrigação exequenda tal como ela está configurada, já que quanto a condenação em custas ela deve considerar-se definitivamente estabelecida (pelo menos quanto à oponente)!

Sem prejuízo dessa delimitação, cumpre esclarecer que não concordamos com o entendimento seguido pela primeira instância no que concerne ao alegado impedimento de condenação dos beneficiários de apoio judiciário na modalidade do art. 16º, nº 1, al. a), da actual Lei nº 34/2004, posterior ao citado Acórdão do Conselheiro Salvador da Costa (11), proferido no âmbito de legislação distinta, na qual inexistia o actual art. 29º, do R.C.P., que, precisamente, dispensa de conta as custas dos beneficiários de apoio judiciário nessa modalidade. Ora, só se pode dispensar (12) aquilo que, previamente, teria alguma razão de ser: a contagem das custas imputadas às partes que beneficiaram dessa dispensa (cf. art. 9º, nºs 1 e 3, do C.C.) e que não deixam de ser imputáveis àquelas e são, eventualmente, reclamáveis nos termos do citado art. 13º, da Lei nº 34/2004, ou de outras normas que prevêem a revogação posterior dessa dispensa (e não um condenação em custas à posteriori), seja, v.g., por via da acção declarativa prevista nessa norma, seja por via de condenação por má-fé processual.

A questão que se coloca e é relevante (arts. 5º, nº 3, e art. 665º, do C.P.C.), repetida pelos oponentes nas suas alegações, é de saber qual o efeito da dispensa de pagamento de custas na obrigação exequenda e sobre essa matéria, embora sem lhe dar o devido relevo, a sentença em crise citou jurisprudência deste Tribunal (13) onde já se deixou claro aquilo que resulta das normas citadas e nos parece evidente: a deferida dispensa do pagamento de custas, que compreendem conceptualmente a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (art. 529º, nº 1, do C.P.C.), importa que a obrigação de custas, resultante da condenação proferida naquele processo 511/10, nomeadamente as aqui reclamadas, não é exigível aos supostos condenados/obrigados enquanto se mantiver essa dispensa ou, por outras palavras, não for demonstrada a sua revogação, o que configura excepção impeditiva da execução em apreço, tal como resulta do disposto no art. 729º, al. e), do C.P.C. e determina o mesmo efeito declarado na sentença proferida pelo Tribunal a quo, que por isso se mantém, com esta diversa fundamentação, julgando-se improcedente a apelação dos embargados.
*

IV. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação, decidindo, em conformidade, manter a decisão recorrida.

Custas da apelação pelos Recorrentes, em partes iguais (cf. art. 527º, do Código de Processo Civil).
Guimarães, 5.4.2018

José Flores
Sandra Melo
Heitor Gonçalves


1. Os considerados pela primeira instância, que não foram objecto de impugnação e os que oficiosamente se colhem dos documentos juntos na mesma (cf. art. 663º, nº 6, do Código de Processo Civil).
2. Cf. sentença documentada a fls. 54 a 55
3. Que entrou em vigor em 1.9.2013 e nesta parte é aplicável apenas aos embargos deduzidos após essa data (cf. art. 6º, nº 4, da Lei nº 41/2013).
4. In Sobre o Sentido e a Função dos Pressupostos Processuais (Algumas Reflexões Sobre o Dogma da Apreciação Prévia dos Pressupostos Processuais Na Acção Declarativa), p. 102 e ss.
5. MIGUEL PIMENTA DE ALMEIDA, in A INTANGIBILIDADE DO CASO JULGADO NA CONSTITUIÇÃO (BREVÍSSIMA ANÁLISE), p. 18
6. AUTOR: Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, p. 306.
7. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 2ª Ed., p. 705
8. In http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/538df581632b09588025814c0049be53?OpenDocument
9. Neste sentido, vide, entre outros, Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 1981, pp. 97-99.
10. Vide Alberto dos Reis, ob. cit. p. 99.
11. In http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ed4422b9f18dabc180256e13005c556a?OpenDocument
12. O termo é aliás o mesmo que se utilizada, v.g., nos casos do art. 15º, nº 1, do C.P.C., sem que isso evite o pagamento previsto oportuno nos termos do seu nº 2 e não pode ser considerado equivalente ao regime de isenção taxativamente previsto no ar 4º, do mesmo R.C.P. – cf. art. 9º, do C.C..
13. In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/8e67955c9d65b0e3802580a000575374?OpenDocument