Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3492/13.4TBBCL-A.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: EXECUÇÃO
CAUSA PREJUDICIAL
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CASO JULGADO FORMAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

I. Segundo o critério da eficácia, há que distinguir entre o caso julgado formal, que só é vinculativo no processo em que foi proferida a decisão (cf. art. 620.º, n.º 1 do CPC) e o caso julgado material, que vincula no processo em que a decisão foi proferida e também fora dele, consoante estabelece o art. 619.º do CPC.

II - O caso julgado formal só é vinculativo no próprio processo (e respectivos incidentes que correm por apenso) em que a decisão foi proferida, e não impede que a mesma questão processual seja decidida em outra acção, de forma diferente pelo mesmo tribunal ou por outro tribunal.

III- Sendo inequívoco que o Tribunal Recorrido já proferiu decisão sobre a questão aqui colocada pelo Recorrente/Embargante (mesmo pedido de suspensão da instância executiva com igual fundamento), decisão essa que foi confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (proferido no apenso B), que se mostra transitado em julgado, não será difícil concluir-se que se verifica uma situação de caso julgado formal.

IV- Em sede de Embargos de Executado, a invocação de uma eventual causa prejudicial não torna inexigível a prestação exequenda constante do título executivo. Na verdade, para o efeito do preenchimento deste requisito processual apenas interessa saber se, ao tempo da citação, existia uma obrigação que os aqui executados deviam cumprir e que fosse quantitativa e qualitativamente determinada.

V- Nessa medida, verificando-se essa situação, pode-se concluir que a situação invocada (a pendência de acções) não contende com este pressuposto (da exigibilidade), pelo que o pedido de suspensão de instância que se funde em tal motivo ou noutro motivo alegadamente justificado, em nada poderia afectar a exigibilidade do título executivo dado à execução.”
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

A. Silva e S. Baptista, executados nos autos principais de que os presentes constituem apenso, e onde figuram como embargantes, deduziram oposição à execução intentada pelo “BANCO X, S. A.”, exequente com os sinais nos autos principais, figurando no presente apenso como embargado, pedindo, a final, que seja julgada procedente por provada e, consequentemente, seja declarada suspensa a execução.

Alegam, para tanto, que procederam da forma descrita no requerimento executivo.

No entanto, nos termos acordados com o embargado/exequente, celebraram com a “Companhia de Seguros de Vida, Y S. A.” um Seguro de Vida – Grupo, com condições gerais da Apólice nº00061190 – certificados nºs97403857, 97403865 e 71539654 – e ainda celebraram com condições especiais Seguro Ramo Vida – Grupo Cobertura Complementar – Invalidez Total ou Permanente.

Tal contrato tem como capital seguro o montante de €40.468,31 (quarenta mil, quatrocentos e sessenta e oito euros e trinta e um cêntimos), titulado pela Apólice nº00061190, certificado nº97403857, pela mesma Apólice mas com o certificado nº97403865 com o montante de capital seguro de €25.504,38 (vinte e cinco mil, quinhentos e quatro euros e trinta e oito cêntimos), e ainda pela mesma Apólice mas com o certificado nº71539654 com o montante de capital seguro de €24.577,26 (vinte e quatro mil, quinhentos e setenta e sete euros e vinte e seis cêntimos).

Mostra-se garantido, nos termos expostos, o pagamento do capital seguro no montante global de €105.780,10 (cento e cinco mil, setecentos e oitenta euros e dez cêntimos), relativo a empréstimo de dinheiro concedido para a aquisição de habitação e realização de obras, se os embargantes/executados falecessem ou ficassem em estado de invalidez total ou permanente.

Por outro lado, os embargantes/executados e a referida Companhia de Seguros celebraram ainda um contrato de seguro “Plano Protecção Crédito Habitação” com condições gerais na Apólice nºPC88100076, garantindo durante o período de um ano o pagamento das mensalidades referentes aos empréstimos concedidos aos executados, para aquisição de habitação e realização de obras, em caso de incapacidade temporária para o trabalho por acidente ou doença.

Sucede que o embargante/executado A. Silva é portador de lesões incapacitantes e irreversíveis, tendo-lhe sido atribuída, em 27 de Janeiro de 2011, uma IPP de 72,0% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades.
Este facto determinou que deixasse de poder liquidar junto do embargado/exequente as prestações relativas aos empréstimos bancários concedidos.
Accionados os respectivos seguros, a “X – Companhia de Seguros de Vida, S. A.”, sem motivo que o justifique, ainda não procedeu em conformidade com o contratado.
Por esse motivo, o embargante/executado A. Silva intentou 2 (duas) acções com vista à condenação dessa seguradora no cumprimento dos identificados contratos, que correm termos sob os nºs3276/13.0TBBCL e 1326/13.9TBBCL, dos (extintos) 2º e 4º Juízos Cíveis, respectivamente, do Tribunal Judicial de Barcelos.
Essas acções constituem causa prejudicial na medida em que, a procederem, serão um facto extintivo da obrigação dos embargantes/executados, não sendo exigível a quantia exequenda.
Torna-se, pois, necessário, nesta fase, a suspensão da instância executiva.
Sustentam, nestes factos, o respectivo petitório.
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Por despacho proferido no dia 02 de Abril de 2014, a fls.46, foi recebida a oposição apenas quanto ao embargante/executado A. Silva – já não quanto à embargante/executada S. Baptista, por extemporânea.
Nessa sede, determinou-se a notificação do embargado/exequente para, querendo, contestar.
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O embargado/exequente “Banco X, S. A.” apresentou articulado de contestação, pugnando pela improcedência da oposição à execução.
Afirma que o embargante/executado confessou todos os factos constitutivos do direito de crédito invocado pelo embargado/executado.
Na verdade, por via da referida oposição, o mencionado A. Silva não pretende a extinção da instância executiva, mas antes a suspensão da mesma pela existência de causas prejudiciais.

Ora, a execução hipotecária tem que prosseguir os seus termos normais, independentemente do desfecho das referidas acções declarativas, as quais concederão (ou não) ao embargante/executado determinadas indemnizações.

O embargado/exequente manifesta-se contra a pretendida suspensão da instância executiva.
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Por decisão proferida no dia 04 de Junho de 2014, a fls.68-69, indeferiu-se a peticionada suspensão da instância executiva.
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O embargante/executado interpôs recurso dessa decisão.
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Por Acórdão da Relação de Guimarães, de 15 de Outubro de 2015, a fls.73 ss, do apenso ‘B’, já transitado em julgado no dia 09 de Novembro de 2015, negou-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Designada data para a realização de uma Audiência Prévia, foi nesse acto proferido despacho saneador sentença em que, a final, ficou decidiu o seguinte:

IV. DECISÃO

Nestes termos, julga-se a presente oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado A. Silva totalmente improcedente e, em consequência, absolve-se o embargado/exequente “Banco X, S. A.” do pedido.
Em conformidade, determina-se o normal prosseguimento da execução.
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Custas a cargo do embargante/executado (cfr. artigo 527º, nºs1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo do direito a protecção jurídica de que (eventualmente) beneficie.
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Registe e notifique.“
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É justamente desta decisão, que o aqui Recorrente veio apresentar o presente Recurso, apresentando as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES:

1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, em 5 de dezembro de 2017, que julgou a oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado A. Silva totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o embargado/exequente “Banco X, S. A.” do pedido.
2. Segundo a 1.ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil “o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta”, estabelecendo a suspensão da instância com fundamento em “causa prejudicial”.
3. Verifica-se a relação de dependência ou prejudicialidade, justificativa da suspensão da instância, quando a decisão ou o julgamento de uma acção - a dependente - é atacada ou afectada pela decisão ou julgamento emitida noutra - a prejudicial.
4. O executado/recorrente deduziu oposição à execução defendendo que na sequência da outorga do contrato de mútuo com hipoteca entre o executado, por exigência do próprio banco mutuante – exequente/recorrido, o recorrente subscreveu uma proposta de Contrato de Seguro de Vida Grupo com uma companhia de seguros.
5. Releva o ponto n.º 2 das Cláusulas Décima Primeira do Documento Complementar à 1.ª escritura, Décima do Documento Complementar da 2.ª escritura e Décima terceira do Documento Complementar da 3.ª escritura, juntas pelo Exequente e que ora se transcreve: “2. Os Mutuários obrigam-se a contratar um SEGURO DE VIDA cujas condições, constantes da respectiva apólice, serão indicadas pelo Banco, em sociedade de seguros de reconhecido crédito e da confiança do Banco, a pagar atempadamente os respectivos prémios, a fazer inserir na respectiva apólice que o Banco é credor hipotecário e que, em consequência, as indemnizações que sejam devidas em caso de sinistro reverterão para o Banco.”
6. Deste modo, o recorrente celebrou dois contratos de seguro com a Companhia de Seguros de Vida Y S.A., ao abrigo da Cláusula supra mencionada.
7. Mais propriamente, o recorrente e a Companhia de Seguros de Vida Y S.A. celebraram um Seguro de Vida – Grupo, com condições gerais da Apólice n.º 00061190 – certificados n.ºs 97403857, 97403865 e 71539654 – e ainda celebraram com condições especiais seguro Ramo Vida – Grupo Cobertura Complementar – Invalidez Total ou Permanente.
8. Tal contrato tem como capital seguro o montante de € 40.468,31 (quarenta mil, quatrocentos e sessenta e oito euros e trinta e um cêntimos), titulado pela Apólice n.º 00061190, certificado n.º 97403857, pela mesma Apólice mas com o certificado n.º 97403865 com o montante de capital seguro de € 25.504,38 (vinte e cinco mil, quinhentos e quatro euros e trinta e oito cêntimos) e ainda pela mesma Apólice mas com o certificado n.º 71539654 com o montante de capital seguro de € 24.577,26 (vinte e quatro mil, quinhentos e setenta e sete euros e vinte e seis cêntimos);
9. Garantindo o pagamento do capital seguro no montante global de € 105.780,10 (cento e cinco mil, setecentos e oitenta euros e dez cêntimos), relativo a empréstimo de dinheiro concedido para a aquisição de habitação e realização de obras, se o aqui recorrente falecesse ou ficasse em estado de invalidez total ou permanente.
10. Seguro que visava assegurar o pagamento do capital em dívida, referente ao mútuo que o executado tinha contraído junto do banco exequente, ora recorrido, no caso de morte ou de invalidez total e permanente do segurado/mutuante.
11. Por outro lado, o executado e a referida Companhia de Seguros celebraram ainda um contrato de seguro “Plano Protecção Crédito Habitação” com condições gerais na Apólice n.º PC88100076, garantindo durante o período de um ano o pagamento das mensalidades referentes aos empréstimos concedidos aos executados, para aquisição de habitação e realização de obras, em caso de incapacidade temporária para o trabalho por acidente ou doença.
12. Sucede que, o executado/recorrente A. Silva é actualmente portador de lesões incapacitantes e irreversíveis, tendo lhe sido atribuído, em 27 de janeiro de 2011, uma IPP de 72,0% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades.
13. Por esse motivo, o executado/recorrente deixou de poder liquidar junto do exequente/recorrido as prestações relativas aos empréstimos bancários concedidos.
14. Não obstante terem sido accionados os respectivos seguros, que garantem o pagamento do valor correspondente às prestações pecuniárias devidas ao exequente/recorrido, por cada mês de duração de incapacidade para o trabalho, e bem assim, o pagamento do montante global em dívida (capital seguro) por incapacidade permanente, a verdade é que, a Seguradora X – Companhia de Seguros de Vida S.A., e sem motivo que o justifique, ainda não procedeu em conformidade com o contratado.
15. Em virtude da incapacidade parcial permanente do recorrente, é a companhia de seguros a responsável pelo pagamento do valor mutuado em dívida, pois o incumprimento do contrato de mútuo e a presente acção executiva não se teriam verificado se a companhia de seguros tivesse cumprido pontualmente as obrigações, decorrentes dos contratos de seguro mencionados, que sobre a mesma impendiam.
16. Contratos de seguro de vida (celebrados por imposição do mutuante aos mutuários e como garantia do crédito/quantia concedida) que são elementos essenciais e integrantes do título executivo dado à execução,
17. Com efeito, no título executivo figura o executado como devedor, excepto em caso de morte ou invalidez deste último pois, nesse caso, a companhia de seguros é a responsável pelo pagamento ao banco (beneficiário do seguro) – ora exequente/recorrido - do valor em dívida, em virtude do seguro de vida celebrado.
18. Assim, um dos elementos do título executivo encontra-se controvertido (o contrato de seguro) e a posição de devedor não está estabilizada no título,
19. Questionando o recorrente, desse modo, o título dado à execução, isto é, a validade do título em relação a si (pois considera que, após a incapacidade parcial permanente do executado/recorrente, a responsabilidade do pagamento das prestações ao banco e demais quantias recai sobre a seguradora).
20. Como o mutuário ficou afectado de uma incapacidade parcial permanente de 72%, verificou-se, assim, o evento que transfere a responsabilidade pelo pagamento da quantia mutuada para a companhia de seguros, o recorrente considerou não ser mais o responsável pelo pagamento mas sim a seguradora (que declinou o pagamento) e intentou duas acções vista à condenação da seguradora no cumprimento dos referidos contratos, de modo a que esta seja condenada a pagar ao banco (beneficiário do seguro) o valor das prestações em dívida e as quantias exigidas por aquele pela mora no cumprimento do contrato de mútuo em causa.
21. Ações declarativas a correrem os seus termos no 2.º Juízo Cível, sob o processo n.º 3276/13.0TBBCL, e, no 4.º Juízo Cível, sob o processo nº 1326/13.9TBBCL, ambas no Tribunal Judicial de Barcelos.
22. Do exposto, retira-se claramente a existência de prejudicialidade entre a execução e tais acções declarativas de condenação, uma vez que da procedência destas acções decorrerá a condenação da seguradora a pagar ao banco (beneficiário do seguro) – exequente/recorrido - a quantia mutuada em dívida, e este (banco), por sua vez, através do prosseguimento da acção executiva, obterá o pagamento do seu crédito através da venda do imóvel, recebendo, assim, o valor em dobro, obrigando a aqui recorrente a agir, extrajudicial ou judicialmente, contra o banco para obter o valor indevidamente recebido.
23. A norma do artigo 272.º do Código de Processo Civil é de carácter geral, não distingue entre acções executivas e acções declarativas, aplicando-se, subsidiariamente, ao processo de execução as normas relativas ao processo de declaração.
24. Não fazendo sentido que seja entendido poder-se aplicar, no âmbito da acção executiva, a segunda parte do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil e não a sua primeira parte.
25. Não sendo possível, conforme tem sido entendimento da doutrina e jurisprudência, no âmbito da acção executiva, deduzir incidente de intervenção principal provocada (chamamento da companhia de seguros), nem suspensão da instância executiva por existência de causa prejudicial, vê-se o executado/recorrente impossibilitado de exercer convenientemente todos os meios de defesa ao seu alcance para fazer valer o seu direito, podendo, assim, haver razões ou motivos ponderosos para ser alterada a interpretação dada à 1.ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil no âmbito da acção executiva.
26. É admitida, pela jurisprudência, a aplicabilidade à acção executiva da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil, ou seja, a suspensão da instância executiva “por outro motivo justificado”.
27. O recorrente, na oposição à execução apresentada, veio alegar que o responsável pelo pagamento da quantia em dívida ao banco exequente (beneficiário do seguro) é a companhia de seguros e não o próprio (recorrente), na sequência dos contratos de seguro de vida celebrados, inerentes ao contrato de mútuo, e da verificação do evento que está na base da transferência de responsabilidade (a incapacidade parcial permanente do executado).
28. Porquanto o contrato de mútuo em causa (celebrado entre o banco/mutuante e o executado/recorrente) não é um mero contrato de mútuo hipotecário, é mais do que isso: é um contrato de mútuo assegurado por hipoteca e pela celebração de contratos de seguro de vida, conforme impõe o ponto n.º 2 das Cláusulas Décima Primeira do Documento Complementar à 1.ª escritura, Décima do Documento Complementar da 2.ª escritura e Décima terceira do Documento Complementar da 3.ª escritura.
29. Assim, o banco exequente/recorrido tem a assegurar os seus créditos uma hipoteca e um seguro de vida que garantem os montantes dos empréstimos devidos, em caso de morte ou de invalidez total e permanente do mutuário.
30. Ora, desde 27 de janeiro de 2011, o executado/recorrente é portador de lesões incapacitantes e irreversíveis, tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade parcial permanente de 72,0% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades.
31. Atento o sucedido, desde então, o recorrente não mais pagou as prestações ao banco por ser responsável a companhia de seguros (e não o executado/recorrente), na sequência dos contratos de seguro de vida celebrados e da verificação do evento que está na base da transferência de responsabilidade, pela restituição ao banco do capital mutuado.
32. É sabido que, com o prosseguimento da acção executiva (não sendo suspensa a instância executiva ao abrigo do disposto da 2.ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do CPC), é evidente que o executado não disporá de liquidez para proceder ao pagamento da quantia exequenda (razão pela qual para construir a sua habitação recorreu a um empréstimo bancário), pelo que a casa será necessariamente vendida no processo de execução, ficando o executado/recorrente e os seus filhos sem a casa (por força da venda),
33. Restando-lhe aguardar pelas sentenças das acções declarativas de condenação propostas contra a companhia de seguros que, sendo favoráveis, condenarão tal companhia no pagamento da quantia mutuada em dívida ao banco.
34. Banco – ora exequente/recorrido - que irá receber o montante duas vezes, uma por via da acção executiva (e venda da casa) e outra por via da companhia de seguros, obrigando o recorrente, mais uma vez, a valer-se de mecanismos extrajudiciais ou judiciais para reaver o montante do banco.
35. O banco – exequente/recorrido - tem o seu crédito duplamente assegurado por hipoteca e pelos contratos de seguro de vida (cujo evento ocorreu) do qual é beneficiário, pelo que, a suspensão da instância executiva por motivo justificado não lhe acarretaria qualquer prejuízo.
36. Pelo contrário, quanto ao recorrente/executado, o prosseguimento da acção executiva, gerará, necessariamente, a venda da casa, a perda da mesma pelo recorrente, e sendo as acções declarativas de condenação contra a seguradora procedentes, esta terá de realizar o pagamento ao banco e o executado/recorrente terá de valer-se de mecanismos extrajudiciais ou judiciais para reaver o montante do banco.
37. Factualidade que resulta dos embargos de executados deduzidos e do conhecimento oficioso sobre a tramitação do processo executivo, pelo que pode ser subsumível, salvo melhor opinião, à segunda parte do número e dispositivo legal já mencionados (n.º 1 do art. 272.º do Código de Processo Civil), devendo a instância executiva ser suspensa.
38. Caso assim não seja entendido, a 2.ª parte do n.º 1 do artigo 272.º do Código de Processo Civil nunca tem aplicabilidade na prática no âmbito da acção executiva, apenas em teoria. Sem prescindir e subsidiariamente,
39. Se numa acção se discute certo facto jurídico que está na base ou é fundamento de outra acção, então aquela primeira acção é e constitui causa prejudicial relativamente a esta.
40. A oposição à execução configura, dentro do processo executivo, uma verdadeira sub acção de cariz declarativo, no âmbito da qual persiste um diferendo a decidir, e tem por finalidade a extinção, no todo ou em parte, da execução,
41. Pelo que lhe (à oposição à execução) é aplicável o disposto no artigo 272.º do Código de Processo Civil, caso se verifique o condicionalismo nele previsto.
42. Assim, o título executivo dado à execução é composto pelo contrato de mútuo, assegurado pela hipoteca e pelos seguros de vida (a tríade “contrato de mútuo com hipoteca e seguro de vida” constitui o título executivo) e no título executivo figura o executado como devedor, excepto em caso de morte ou invalidez deste último pois, nesse caso, a companhia de seguros é a responsável pelo pagamento ao banco (beneficiário do seguro) do valor em dívida, em virtude do seguro de vida celebrado.
43. O mesmo é dizer que, um dos elementos constitutivos do título dado à execução se vê controvertido (o contrato de seguro/quem é o responsável pelo pagamento da quantia ao banco), e se encontra a ser litigado nas acções declarativas de condenação intentadas pelo aqui recorrente contra a companhia de seguros, consubstanciando uma causa prejudicial.
44. A procedência, com trânsito em julgado, da acção declarativa conduzirá à condenação da companhia de seguros no pagamento ao banco (exequente/recorrido) das prestações em dívida e demais quantias peticionadas, pagamento que o banco (exequente/recorrido), por via da acção executiva, está a exigir ao executado/recorrente,
45. Podendo o banco (exequente/recorrido), eventualmente, obter o pagamento em dobro (por via do trânsito em julgado das acções declarativa propostas contra a seguradora, nas quais se peticiona que esta seja condenada a pagar ao banco, e por via da acção executiva contra o executado), obrigando o aqui recorrente a fazer-se valer de mecanismos extrajudiciais ou judiciais para reaver o montante do banco.
46. Foi precisamente na fase da oposição (fase declarativa do processo de execução) que o recorrente/executado invocou que um elemento constitutivo do título executivo se encontrava controvertido (contrato de seguro/ quem é o responsável pelo pagamento da quantia em dívida ao banco) e a existência de causa prejudicial (a recorrente intentou acções declarativas de condenação contra a companhia de seguros, pedindo a condenação desta no pagamento ao banco, aqui exequente/recorrido, do valor das prestações em dívida e as quantias exigidas por aquele pela mora no cumprimento do contrato de mútuo em causa).
47. Conforme se sustentou no douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de outubro de 2013, processo 102/12.0TBBGC-A.P1, disponível em www.dgsi.pt:“pode ser suspensa a oposição à execução, dada a sua natureza declarativa, por via da pendência de causa prejudicial, maxime da acção em que se discuta a obrigação exequenda”, considerando-se que “existe relação de prejudicialidade, conducente à suspensão da oposição à execução, entre a acção que o oponente instaurou contra a seguradora, para cumprimento das suas obrigações decorrentes de um contrato de seguro de vida, e a oposição à execução em que o segurado invoca contra o mutuante o incumprimento desse contrato e a pendência da acção”.
48. Estabelece-se entre o mutuante, a seguradora e os mutuários uma relação triangular que não pode ser escamoteada quando ocorre uma incapacidade parcial permanente do segurado.
49. Neste caso, a seguradora é chamada a cumprir as suas obrigações mediante o pagamento da quantia correspondente ao capital seguro.
50. Acontecendo isso, o mutuário fica desonerado perante o mutuante.
51. Na nossa hipótese a seguradora declinou o pagamento do capital seguro, o que forçou o executado a accioná-la para que o mesmo fosse feito nas condições acordadas nos contratos de seguro de vida.
52. Faz, pois, todo o sentido que a oposição à execução fique suspensa até que seja proferida decisão na acção declarativa, que constitui verdadeira causa prejudicial, porquanto, considerando-se que a seguradora deve pagar, fica desonerado o executado.
53. Deste modo e salvo melhor opinião, afigura-se existir uma verdadeira causa prejudicial, pois a pretensão deduzida nas acções declarativas constitui um pressuposto da pretensão deduzida na oposição à execução.
54. As acções declarativas de condenação contra a companhia de seguros (o processo n.º 3276/13.0TBBCL e o processo n.º 1326/13.9TBBCL) foram propostas pelo aqui recorrente em abril e outubro de 2013 e a acção executiva (processo n.º 3492/13.4TBBCL-A) foi intentada, pelo banco exequente contra o executado/recorrente em fevereiro de 2014, pelo que não está verificada qualquer das causas estabelecidas no n.º 2 do artigo 272.º do CPC que exclui a suspensão da instância.
55. Assim, encontrando-se verificado o condicionalismo previsto no artigo 272.º do Código de Processo Civil, devia o Tribunal a quo ter ordenado a suspensão da instância da oposição à execução, por existência de prejudicialidade entre a acção declarativa de condenação e a oposição à execução ou por existência de motivo justificado já que o banco exequente tem o seu crédito duplamente assegurado por hipoteca e pelos contratos de seguro de vida (cujo evento ocorreu) dos quais é beneficiário, pelo que, a suspensão da instância da oposição à execução não lhe acarretaria qualquer prejuízo, já que a própria instância executiva prosseguiria os seus termos.
56. Não o tendo feito, fez errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 5.º, 272.º, 731.º, 732.º e 733.º do Código de Processo Civil.

Termos em que, e nos demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e, em consequência, ser declarada suspensa a execução.“
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Foram apresentadas contra-alegações pelo Recorrido, pugnando pela improcedência do Recurso.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, o Recorrente coloca a seguinte questão que importa apreciar:

- saber se, atendendo ao pedido formulado na oposição à execução por embargos deduzida pelo embargante/executado A. Silva (aí se escreve: deverá o presente incidente de embargos de executado ser julgado totalmente procedente, por provado e, consequentemente, ser declarada suspensa a execução), devem as acções declarativas que, sob os nºs 3276/13.0TBBCL e 1326/13.9TBBCL, que correm seus termos nos (extintos) 2º e 4º Juízos Cíveis, respectivamente, do Tribunal Judicial de Barcelos, constituir (ou não) causa de suspensão da instância executiva.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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O Tribunal Recorrido considerou a seguinte factualidade como relevante para a decisão que proferiu:

III. FUNDAMENTAÇÃO

1. DOS FACTOS

Compulsados os autos principais, o presente apenso e o apenso ‘B’, resultou apurada a seguinte factualidade e dinâmicas processuais:

1. No dia 21 de Novembro de 2013, o, aqui, embargado/exequente “Banco X, S. A.” intentou um processo de execução para pagamento de quantia certa, sob a forma sumária, contra os executados A. Silva e S. Baptista, peticionando, a título de capital, o valor de €89.499,90 (oitenta e nove mil, quatrocentos e noventa e nove euros e noventa cêntimos) – cfr. requerimento executivo junto a fls.1-28, dos autos principais.
2. Sustenta esse seu pedido nos seguintes factos:

“1. Como é do conhecimento da generalidade das pessoas, o Exequente exerce a actividade bancária.
2. No exercício da sua actividade e a pedido dos Mutuários A. Silva e S. Batista, no dia 14.06.2007, o Exequente celebrou com eles uma ESCRITURA DE TRANSFERÊNCIA DE MÚTUO COM HIPOTECA - cfr. Doc. 1 que se junta, incluindo o Documento Complementar que dela faz parte, e que se dá, como os demais, por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
3. Através de tal Contrato, o Exequente emprestou aos Mutuários, a quantia de € 48.939,92.
4. Tais Mutuários utilizaram a quantia mutuada para os fins previstos constantes no teor da Escritura Pública.
5. De acordo com a Escritura junta, e nos temos do art. 724.º, n.º 1, alínea e) do C.P.C., foram convencionadas, além do mais, as Cláusulas (que aqui se dão como reproduzidas) acerca: a) Do número de prestações mensais, através das quais o capital mutuado, bem como os respectivos juros, haveriam de ser pagos; b) Das datas da 1.ª e das restantes prestações; c) Dos juros moratórios em caso de incumprimento ou atraso no pagamento, calculados de acordo com a respectiva Cláusula do Contrato; d) Do valor das despesas emergentes do Contrato devidas pelos Mutuários.
6. Ora, as prestações convencionadas deixaram de ser pagas em 14.04.2013 (inclusive), o que implicou a resolução do Contrato de Mútuo, sendo devido o pagamento da totalidade do Empréstimo, o que deriva do art. 781.º do C.C. (e do teor do Documento Complementar da Escritura).
7. Ficou, assim, em dívida, de capital, a quantia de € 39.978,76, sobre a qual incide os juros remuneratórios e moratórios constantes do item “Liquidação da Obrigação”.
8. Importa acrescentar que, como garantia de todas as responsabilidades assumidas neste mútuo concedido aos Mutuários, foi constituída uma hipoteca a favor do Exequente sobre o imóvel melhor identificado no item “Bens Registados”.
9. Hipoteca essa que está registada pela Ap. 60 de 2007/10/04 na respectiva Certidão Registal junta - cfr. Doc. 2.
10. Ainda no exercício da sua actividade e, novamente a pedido dos mesmos Mutuários, no mesmo dia 14.06.2007, o Exequente celebrou com eles uma outra ESCRITURA DE MÚTUO COM HIPOTECA - cfr. Doc. 3 que se junta, incluindo o Documento Complementar que dela faz parte, e que se dá, como os demais, por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
11. Através de tal Contrato, o Exequente emprestou aos Mutuários, a quantia de € 30.840,18.
12. Tais Mutuários utilizaram a quantia mutuada para os fins previstos constantes do teor da Escritura Pública.
13. De acordo com a Escritura junta, e nos temos do art. 724.º, n.º 1, alínea e) do C.P.C., foram convencionadas, além do mais, as Cláusulas (que aqui se dão como reproduzidas) acerca: a) Do número de prestações mensais, através das quais o capital mutuado, bem como os respectivos juros, haveriam de ser pagos; b) Das datas da 1.ª e das restantes prestações; c) Dos juros moratórios em caso de incumprimento ou atraso no pagamento, calculados de acordo com a respectiva Cláusula do Contrato; d) Do valor das despesas emergentes do Contrato devidas pelos Mutuários.
14. Ora, as prestações convencionadas deixaram de ser pagas em 14.05.2013 (inclusive), o que implicou a resolução do Contrato de Mútuo, sendo devido o pagamento da totalidade do Empréstimo, o que deriva do art. 781.º do C.C. (e do teor do Documento Complementar da Escritura).
15. Ficou, assim, em dívida, de capital, a quantia de € 25.093,12, sobre a qual incide os juros remuneratórios e moratórios constantes do item “Liquidação da Obrigação”.
16. Importa acrescentar que, como garantia de todas as responsabilidades assumidas neste mútuo concedido aos Mutuários, foi constituída uma hipoteca a favor do Exequente sobre o imóvel melhor identificado no item “Bens Registados”.
17. Hipoteca essa que está registada pela Ap. 61 de 2007/10/04 na respectiva Certidão Registal junta - cfr. Doc. 2.
18. Finalmente, mais uma vez no exercício da sua actividade e, novamente a pedido dos mesmos Mutuários, no dia 10.03.2010, o Exequente celebrou com eles uma outra ESCRITURA DE MÚTUO COM HIPOTECA - cfr. Doc. 4 que se junta, incluindo o Documento Complementar que dela faz parte, e que se dá, como os demais, por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
19. Através de tal Contrato, o Exequente emprestou aos Mutuários, a quantia de € 26.000,00.
20. Tais Mutuários utilizaram a quantia mutuada para os fins previstos constantes do teor da Escritura Pública.
21. De acordo com a Escritura junta, e nos temos do art. 724.º, n.º 1, alínea e) do C.P.C., foram convencionadas, além do mais, as Cláusulas (que aqui se dão como reproduzidas) acerca: a) Do número de prestações mensais, através das quais o capital mutuado, bem como os respectivos juros, haveriam de ser pagos; b) Das datas da 1.ª e das restantes prestações; c) Dos juros moratórios em caso de incumprimento ou atraso no pagamento, calculados de acordo com a respectiva Cláusula do Contrato; d) Do valor das despesas emergentes do Contrato devidas pelos Mutuários.
22. Ora, as prestações convencionadas deixaram de ser pagas em 25.05.2013 (inclusive), o que implicou a resolução do Contrato de Mútuo, sendo devido o pagamento da totalidade do Empréstimo, o que deriva do art. 781.º do C.C. (e do teor do Documento Complementar da Escritura).
23. Ficou, assim, em dívida, de capital, a quantia de € 24.428,02, sobre a qual incide os juros remuneratórios e moratórios constantes do item “Liquidação da Obrigação”.
24. Importa acrescentar que, como garantia de todas as responsabilidades assumidas neste mútuo concedido aos Mutuários, foi constituída uma hipoteca a favor do Exequente sobre o imóvel melhor identificado no item “Bens Registados”.
25. Hipoteca essa que está registada pela Ap. 1196 de 2010/03/11 na respectiva Certidão Registal junta - cfr. Doc. 2.”
(facto admitido por acordo – cfr. artigo 1º, da petição de oposição à execução – cfr. artigo 574º, nº2, do Código de Processo Civil; cfr. requerimento executivo junto a fls.1-28, dos autos principais).

3. No ponto nº 2, da cláusula 11.ª, do documento complementar à escritura datada de 14 de Junho de 2007 (denominada “Transferência de mútuo com hipoteca”), ficou convencionado entre as partes que: (…) 2. Os MUTUÁRIOS obrigam-se a contratar um SEGURO DE VIDA cujas condições, constantes da respectiva apólice, serão as indicadas pelo Banco, em sociedade de seguros de reconhecido crédito e da confiança do Banco, a pagar atempadamente os respectivos prémios, a fazer inserir na respectiva apólice que o Banco é credor hipotecário e que, em consequência, as indemnizações que sejam devidas em caso de sinistro reverterão para o Banco (…) – cfr. fls.9, dos autos principais.
4. No ponto nº 2, da cláusula 10.ª, do documento complementar à escritura datada de 14 de Junho 2007 (denominada “Mútuo com hipoteca”), ficou convencionado entre as partes que:
2. Os MUTUÁRIOS obrigam-se a contratar um SEGURO DE VIDA cujas condições, constantes da respectiva apólice, serão as indicadas pelo Banco, em sociedade de seguros de reconhecido crédito e da confiança do Banco, a pagar atempadamente os respectivos prémios, a fazer inserir na respectiva apólice que o Banco é credor hipotecário e que, em consequência, as indemnizações que sejam devidas em caso de sinistro reverterão para o Banco (…) – cfr. fls.17, dos autos principais.
5. No ponto nº 2, da cláusula 13.ª, do documento complementar à escritura datada de 10 de Março de 2010 (denominada “Mútuo com hipoteca”), ficou convencionado entre as partes que: (…) 2. Os Clientes obrigam-se a contratar um seguro de vida cujas condições, constantes da respectiva apólice, serão as indicadas pelo Banco, em empresa de seguros de reconhecido crédito, a pagar atempadamente os respectivos prémios, a fazer inserir na respectiva apólice a designação do Banco como beneficiário irrevogável do seguro e que, em consequências, as indemnizações que sejam devidas em caso de sinistro reverterão para o Banco (…) – cfr. fls.25, dos autos principais.
6. Em conformidade com o convencionado nas mencionadas escrituras públicas, o embargante/executado e a sua esposa celebraram 2 (dois) contratos de seguro com a “Companhia de Seguros de Vida Y S. A.”, em concreto: [i] um Seguro de Vida – Grupo, com condições gerais da Apólice nº00061190 – certificados nºs97403857, 97403865 e 71539654; e [ii] um seguro Ramo Vida – Grupo Cobertura Complementar – Invalidez Total ou Permanente – cfr. fls.27-31, destes autos.
7. O embargante/executado, nos termos descritos em 2., deixou de liquidar junto do embargado/exequente “Banco X, S. A.” as prestações respeitantes aos empréstimos bancários concedidos por, alegadamente, ser portador de lesões incapacitantes e irreversíveis, que determinam uma IPP de 72,0%, fixada em 27 de Janeiro de 2011, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades – cfr. fls.9-26, destes autos.
8. Não obstante terem sido accionados os respectivos seguros, que garantem o pagamento do valor correspondente às prestações pecuniárias devidas ao embargado/exequente por cada mês de duração de incapacidade para o trabalho e, bem assim, o pagamento do montante global em dívida (capital seguro) por incapacidade permanente, a mencionada “Companhia de Seguros de Vida Y S. A.” ainda não procedeu em conformidade com o contratado – cfr. fls.9-26, destes autos.
9. O referido em 8. determinou que o embargante/executado A. Silva instaurasse 2 (duas) acções com vista à condenação da aludida Seguradora no cumprimento dos contratos celebrados, que correm termos sob os nºs3276/13.0TBBCL e 1326/13.9TBBCL, dos (extintos) 2º e 4º Juízos Cíveis, respectivamente, do Tribunal Judicial de Barcelos – cfr. fls.9-26, destes autos.
10. O embargante executado requereu a suspensão da instância executiva, fundando esse seu pedido nas acções identificadas em 9. – cfr. fls.6-7, destes autos.
11. Por decisão proferida no dia 04 de Junho de 2014, considerou-se não se justificar a suspensão da instância executiva sem a prestação de caução – cfr. fls.68-69, destes autos.
12. Essa decisão foi confirmada por Acórdão da Relação de Guimarães, de 15 de Outubro de 2015, transitado em julgado no dia 09 de Novembro de 2015 – cfr. fls.73-79, do apenso ‘B’ e informação supra.
13. No Acórdão referido em 12. escreve-se, além do mais, que:

(…) A resposta à questão enunciada prende-se com o preceituado, presentemente, no artigo 272º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (…) Ora, há muito que se estabeleceu uma corrente largamente maioritária na doutrina e jurisprudência, no sentido de que a acção executiva não pode ser suspensa com fundamento na pendência de uma causa prejudicial. Na verdade, “o fim deste processo não é decidir uma causa, mas dar satisfação efectiva a um direito já declarado por sentença ou constante de título com força executiva”. E, sendo assim, não se verifica a relação de dependência que caracteriza o nexo de prejudicialidade referido em qualquer um dos preceitos citados. Esta posição veio a ser acolhida no Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 1960, nos termos do qual, “A execução propriamente dita não pode ser suspensa pelo primeiro fundamento do artigo 284º do Código de Processo Civil” (BMJ, 97º, 173). E não pode ser suspensa porque, como aí se ponderou, embora a execução possa caber no conceito lato de causa a que alude aquele artigo, tal circunstância não esgota as suas exigências porque “ele não pressupõe apenas duas causas, pressupõe também que nenhuma delas esteja decidida. É o que claramente flui das locuções “decisão da causa” e “julgamento da causa”. Ora a execução não é uma causa por decidir; é a sequência de uma decisão, quando não provém de título com força executiva; decorre de um direito já declarado. Logo não pode ser suspensa ao abrigo do disposto na primeira parte do artº 284º citado”. Esta posição jurisprudencial, largamente maioritária, continua a merecer a nossa concordância. O processo de execução visa dar realização efectiva e prática ao direito do exequente, esteja ele jurisdicionalmente definido ou resulte de outro título a que a lei atribua força executiva. Em qualquer caso, nunca esse direito está por decidir na acção executiva propriamente dita. Pelo contrário, o título executivo constitui um instrumento legal necessário, mas, ao mesmo tempo, suficiente para a instauração de qualquer acção executiva, uma vez que esta não se desenvolve sem ele, mas, em simultâneo, o mesmo basta para legitimar os actos executivos, sem prévia indagação acerca da existência e vigência do direito nele incorporado. De modo que o prosseguimento da execução nunca pode ser sustado por se entender que o direito exequendo se encontra por decidir nessa instância. Pode vir a ser objecto de discussão noutro lugar, particularmente em sede de oposição à execução ou mesmo noutra acção judicial, mas nunca na própria acção executiva. Cremos, assim, ser claro que os Apelantes, no caso em apreço, não podem ver suspensa a execução que lhe foi movida pelo Apelado apenas porque instauraram acções declarativas tendentes a reconhecer o seu direito a ver pago por terceiro (uma seguradora), ou com meios que lhe sejam fornecidos por terceiro, o crédito exequendo. A execução não se propõe decidir se esse crédito existe, mas pressupõe, antes, que o mesmo subsiste e é exigível aos executados. O que, de resto, em bom rigor, os Apelantes nem sequer contestam. O que parecem sustentar é apenas, repetimos, que, eles próprios, têm direito a que um terceiro liquide essa obrigação ou lhes faculte meios para tal. Mas essa questão não está por decidir na acção executiva.

De modo que não há qualquer nexo de prejudicialidade entre ambas as acções. O que poderia, ainda assim, questionar-se é se não ocorre outro motivo justificado, com o que estaríamos no âmbito de previsão da 2ª parte do nº 1 do artigo 272º do Código de Processo Civil. Ora, do nosso ponte de vista, a resposta só pode ser negativa. A ocorrência de outro motivo justificado exige que a razão invocada seja diferente da pendência de qualquer outra acção judicial, pois, caso contrário, estaríamos a acolher por esta via um fundamento que já antes tínhamos considerado inadmissível; ou seja, a existência de uma relação de prejudicialidade que a lei não consente como causa de suspensão da acção executiva. Até porque, claramente, alude a “outro motivo”. É, assim, líquido que baseando-se os Apelantes na pendência de outras acções declarativas para obter a suspensão da execução já referenciada, essa pretensão não pode ser acolhida (…) – cfr. fls.73-79, do apenso ‘B.
*
B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Já se identificou, em cima, a única questão que aqui é colocada pelo Recorrente.

Conforme resulta da matéria de facto considerada provada (e do próprio processo), o Recorrente, com anterioridade à dedução dos presentes Embargos de executado, já tinha levantado, exactamente com os mesmos fundamentos, a questão da suspensão da acção executiva.

Essa questão foi objecto de decisão (do Tribunal da Relação de Guimarães), decisão essa transitada em julgado, e que, como iremos ver, formou caso julgado formal, no âmbito do presente processo.

Independentemente dessa questão, importa ainda atender a que, salvo o devido respeito pela opinião contrária, os próprios Embargos de executado, instaurados apenas com este fundamento, não são deduzidos, em bom rigor, com qualquer um dos fundamentos legais previstos pelo legislador para a sua interposição.

Com efeito, a verdade é que, compulsada a petição inicial de Embargos, pode-se constatar que o único fundamento de oposição aí deduzido foi justamente:

- o pedido de suspensão de instância da acção executiva.

Na verdade, os executados, para fundamentar esse seu pedido (único), referem que:

-“existem causas prejudiciais que obstam ao prosseguimento da acção executiva”;
-“a resolução das causas pendentes resolverá a questão atinente, sendo um facto extintivo da obrigação dos executados, não sendo exigível a quantia exequenda, é fundamento do presente embargo de execução, nos termos do art. 731º do CPC”
-“Ora, a situação do crédito estar a ser discutido numa outra acção que se encontra pendente e estar a própria existência do crédito dependente de uma decisão que ainda não existe, tona-se necessário, nesta fase, a suspensão da acção executiva”;
- “a suspensão da instância requerida é fundamentada com a pendencia de causa prejudicial”;
- “ a suspensão da instância tem que suceder, pois, os executados impugnam a exigibilidade da obrigação exequenda nos termos da al. c) do nº1 do art. 733º do CPC”
“Termos em que, deve o presente incidente de Embargos de executado ser julgado totalmente procedente, por provado, e consequentemente, ser declarada suspensa a execução”.

Assim, como se pode retirar do teor da petição inicial, em nenhum momento, os Embargantes/Recorrentes aí invocam qualquer outro fundamento que não seja o (único) pedido que efectivamente formulam, que é o “de suspensão de instância fundado em existência de questão prejudicial ou outro motivo justificado”- sendo que seria a existência dessa prejudicialidade que poria em causa a exigibilidade do crédito exequendo.

Ora, importa atender que a invocação de uma eventual causa prejudicial não contende manifestamente com este pressuposto (da exigibilidade), pelo que o pedido de suspensão de instância que se funde em tal motivo ou noutro motivo alegadamente justificado, em nada poderá afectar a exigibilidade do título executivo dado à execução.

É que se trata de uma realidade que apenas diz respeito à ponderação de interesses processuais (ponderação de outras acções pendentes ou outros motivos justificados) que não tem qualquer influência naquele requisito do título executivo.
Na verdade, impõe este requisito que a prestação, que decorra do título dado à execução, se mostre exigível.
Ora, importa ter em atenção que este pressuposto processual só constitui um requisito autónomo quando a exigibilidade não resulte do título executivo, ou seja, se essa exigibilidade não se puder depreender directamente do documento que serve de base à execução.
Na verdade, o que verdadeiramente impõe este requisito é que, “ao tempo da citação”, exista “uma obrigação que o executado deva cumprir e que seja quantitativa e qualitativamente determinada…” (1).
À partida, dir-se-ia que a exigibilidade seria sinónimo de incumprimento.
“Não é assim, todavia: o facto negativo do incumprimento não chega a incorporar a causa de pedir, seja declarativa, seja executiva. O Autor/exequente não tem de alegar e provar que a obrigação não foi pontual e integralmente cumprida. Relembre-se que … a causa de pedir, tanto condenatória, como executiva, são os factos constitutivos ou aquisitivos do direito a uma prestação. São estes que têm que ser demonstrados, pela prova ou pelo título executivo, respectivamente. Caberá ao Réu alegar o cumprimento ou facto equivalente como excepção peremptória extintiva…”.
(E mais à frente…) “Portanto, e em termos simples, a obrigação exigível é a obrigação que está em tempo de cumprimento- obrigação actual” (2).
A obrigação é, assim, exigível quando, à data da propositura da execução, se encontre vencida ou se vença mediante interpelação, ainda que judicial (3).
Diversamente a obrigação já não será exigível, por exemplo, se se encontrar sujeita a condição suspensiva, se estiver dependente de contraprestação, ou se o credor se encontrar em mora.
Uma das situações em que a obrigação se tem que considerar vencida é justamente o caso em que tal exigibilidade resulta, de modo imediato, do próprio título executivo.
Por esta ordem de ideias, não há dúvidas que a prestação aqui dada à execução é exigível.
Mas mesmo que se atenda à relação jurídica fundamental subjacente, também a dívida -resultante do incumprimento dos contratos de mútuo por parte dos Embargantes - é exigível nos termos expostos, já que, como se referiu, entende-se que a obrigação assume essa natureza quando, à data da propositura da execução, se encontre vencida- o que sucedia no caso concreto.
Pelo exposto, julga-se que, por esta via, a argumentação do Recorrente tem que ser julgada improcedente.
Ou seja, conforme resulta do exposto, a invocação de uma eventual causa prejudicial não torna inexigível a prestação exequenda constante do título executivo.
Na verdade, para o efeito do preenchimento deste requisito processual apenas interessa saber se, ao tempo da citação, existia uma obrigação que os aqui executados deviam cumprir e que fosse quantitativa e qualitativamente determinada.
Nessa medida, verificando-se, no caso concreto, essa situação, pode-se facilmente concluir que a situação invocada (a pendência de acções) não contende manifestamente com este pressuposto (da exigibilidade), pelo que o pedido de suspensão de instância que se funde em tal motivo ou noutro motivo alegadamente justificado, em nada poderia afectar a exigibilidade do título executivo dado à execução.
É que, como se referiu, trata-se de uma realidade que apenas diz respeito à ponderação de interesses processuais (ponderação de outras acções pendentes ou outros motivos justificados) que não tem qualquer influência naquele requisito do título executivo.

Isso, aliás, já ficou decidido no Acórdão da Relação de Guimarães proferido, nos presentes autos, sobre esta mesma questão:

“Cremos, assim, ser claro que os Apelantes, no caso em apreço, não podem ver suspensa a execução que lhe foi movida pelo Apelado apenas porque instauraram acções declarativas tendentes a reconhecer o seu direito a ver pago por terceiro (uma seguradora), ou com meios que lhe sejam fornecidos por terceiro, o crédito exequendo. A execução não se propõe decidir se esse crédito existe, mas pressupõe, antes, que o mesmo subsiste e é exigível aos executados. O que, de resto, em bom rigor, os Apelantes nem sequer contestam. O que parecem sustentar é apenas, repetimos, que, eles próprios, têm direito a que um terceiro liquide essa obrigação ou lhes faculte meios para tal. Mas essa questão não está por decidir na acção executiva”.

Nesta conformidade, só nos resta concluir pela total improcedência desta argumentação, na medida em que o fundamento deduzido não se enquadra naqueles que estão previstos no artigo 731º do CPC.
É que, efectivamente, os Embargantes, quando deduziram os Embargos à execução, só formularam um pedido de suspensão de instância fundado em causa prejudicial (ou outro motivo justificado), não tendo indicado qualquer um dos fundamentos ali previstos.
Aliás, o único preceito legal invocado diz respeito aos efeitos do recebimento dos Embargos- al. c) do art. 733º do CPC.

Com efeito, estipula-se aí que a execução pode ser suspensa, por efeito do recebimento dos embargos, se: “tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade … e o Juiz considerar, ouvido o Embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução” – al. c).

Aqui chegados, fica evidente que os Embargantes não invocaram qualquer fundamento legal para apresentar a oposição à execução.

Nesta conformidade, não há dúvidas nenhumas que o Tribunal Recorrido, só por apelo a esta argumentação, proferiu a decisão que se impunha no caso concreto.
*
Ultrapassada esta questão prévia, importa, além disso, referir que, como bem argumentou o Tribunal Recorrido, a questão (novamente) levantada pelo Recorrente, já foi objecto de decisão proferida nos presentes autos, na sequência de requerimento anteriormente apresentado pelos executados, que fundamentava o seu pedido de suspensão da execução, na altura apresentado, exactamente nos mesmos termos.

Na verdade, é inequívoco que o Tribunal Recorrido já proferiu decisão sobre a questão aqui colocada (mesmo pedido de suspensão da instância executiva com igual fundamento), decisão essa que foi confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (proferido no apenso B), que se mostra transitado em julgado.

Ora, se, de facto, já foi proferida decisão transitada em julgado, no presente processo e sobre a (mesma) questão levantada pelos Embargantes, não será difícil concluir-se que se verifica uma situação de caso julgado formal.

Na verdade, não podem existir dúvidas que a anterior decisão proferida nos presentes autos pronunciou-se sobre a mesma questão processual, que aqui constituiu o objecto da decisão recorrida, ou seja, sobre a questão de saber se a pendência daquelas acções instauradas pelo Recorrente impõem a suspensão da acção executiva.

Como é sabido, o trânsito em julgado, conforme decorre claramente do art. 628.º do CPC, ocorre quando uma decisão é já insusceptível de impugnação por meio de reclamação ou através de recurso ordinário.

Verificada tal insusceptibilidade, forma-se caso julgado, que se traduz, portanto, na impossibilidade da decisão proferida ser substituída ou modificada por qualquer tribunal, incluindo aquele que a proferiu.

Segundo o critério da eficácia, há que distinguir entre o caso julgado formal, que só é vinculativo no processo em que foi proferida a decisão (cfr. art. 620º, nº 1 do CPC) e o caso julgado material, que vincula no processo em que a decisão foi proferida e também fora dele, consoante estabelece o art. 619º do CPC.

Do caso julgado decorrem, como é também sabido, dois efeitos essenciais, a saber: a impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida -efeito negativo- e a vinculação do mesmo tribunal e eventualmente de outros, estando em causa o caso julgado material, à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado (4).

Todavia, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar (art. 625.º n.º 1 do CPC), critério operativo ainda quando estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta (vide n.º 2 do preceito).
Importa, pois, verificar se estão verificados os pressupostos de aplicação da figura do caso julgado.

Como se disse, de acordo com o critério da eficácia, há que distinguir entre o caso julgado formal, que só é vinculativo no processo em que foi proferida a decisão (cf. art. 620.º, n.º 1 do CPC) e o caso julgado material, que vincula no processo em que a decisão foi proferida e também fora dele, consoante estabelece o art. 619º do CPC.

Na verdade, se uma decisão se pronuncia sobre uma questão processual de determinada forma e transita em julgado, forma-se sobre essa questão caso julgado formal que obsta a que, mais tarde, se emita nova decisão sobre ela no mesmo processo

Com efeito, de harmonia com o que, sob a epígrafe “Caso julgado formal”, prevê-se no art. 620º do CPC - excluídos os que versam as decisões previstas no art. 630º do CPC, de que não é admissível recorrer - os despachos (e as sentenças), que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.

Assim, se, em determinado processo, tiver já sido proferida decisão sobre determinada questão processual, que transitou em julgado, e vem a ser proferida posteriormente, no mesmo processo, uma nova decisão sobre a mesma questão concreta da relação processual que foi objecto dessa primeira decisão e que também transita, diz-nos o art, 625º do CPC, que se cumprirá, como se disse, a decisão que passou em julgado em primeiro lugar.

Esta disposição legal reforça a ideia de que o caso julgado formal previsto no 620º do CPC se refere à vinculação do Tribunal ao julgamento que fez sobre uma questão concreta da relação processual.

Com efeito, “… o caso julgado formal tem força obrigatória apenas dentro do processo, obstando a que o Juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida, mas não impedindo que, noutra acção, a mesma questão processual concreta seja decidida em termos diferentes pelo mesmo Tribunal ou por outro entretanto chamado a apreciar a causa…” (5).

Na verdade, o caso julgado formal “só é vinculativo no próprio processo (e respectivos incidentes que correm por apenso) em que a decisão foi proferida, obstando a que o juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida- mas não impede que a mesma questão processual seja decidida em outra acção, de forma diferente pelo mesmo tribunal ou por outro tribunal…” (6).

Nesta conformidade, importa concluir que “…as decisões de forma desfrutam de força vinculativa de caso julgado apenas dentro do processo…” (7).

Ora, no caso “sub judicio”, não há dúvidas que o Tribunal Recorrido bem andou em invocar a existência de uma situação de caso julgado formal, pois que, se assim não entendesse, correria o risco de contrariar a decisão que anteriormente foi proferida sobre essa mesma questão processual.

Tem, assim, razão, quando defende que:

“…a questão da suspensão da execução, que constitui o pedido formulado no presente apenso, mostra-se já decidida por Acórdão da Relação de Guimarães, de 15 de Outubro de 2015, transitado em julgado no dia 09 de Novembro de 2015 (cfr. fls.73-79, do apenso ‘B’).
Fazer prosseguir os autos para a fase do julgamento afigura-se-nos inútil, na medida em que a decisão de mérito a proferir teria, necessariamente, que coincidir com aquela proferida pelo Tribunal superior, sob pena de contradição de julgado (cfr. artigo 625º, do Código de Processo Civil)”.
*
Nesta conformidade, e por todas as razões expostas, conclui-se, também, que a pretensão do Recorrente teria que necessariamente ser julgada improcedente com este fundamento (caso julgado formal).
*
De qualquer forma, sempre se poderá acrescentar que, mesmo que assim não fosse, também nunca se poderia considerar estarem verificados os requisitos que permitiriam determinar a suspensão da instância, seja por prejudicialidade, seja por outro motivo justificado.
Em primeiro lugar, importa relembrar que é pacífico que o processo executivo não pode ser suspenso com fundamento na pendência de causa prejudicial- o que, aliás, se julga que o Recorrente não põe em causa.

Na verdade, sabendo-se que a execução não é propriamente uma causa a decidir, mas antes um direito já efectivamente declarado, não se pode aqui afirmar qualquer nexo de prejudicialidade (8).

Com efeito, tal sucede “…porque a acção executiva não visa a declaração de um direito, mas antes a adopção das providências à execução coerciva de um direito que já se encontra declarado ou reconhecido” (9).

“Efectivamente, a execução não visa a declaração de um direito, antes assenta numa presunção titulada de existência deste. Por isso a sua eficácia não está, como uma causa declarativa, dependente do julgamento de outra já proposta…” (10).

Além disso, sendo a razão de ser da suspensão de instância, a economia e coerência de julgamentos, aquela só se justificará na fase declarativa.

Ainda assim, vejamos, de uma forma sintética, em que é que consistem aquelas causas gerais de suspensão de instância.
Como é sabido, nos termos do art. 269º, nº 1, al. c) do CPC a instância suspende-se quando o tribunal ordenar a suspensão e isso sucederá quando, por exemplo a decisão da causa estiver dependente do Julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado (art. 272º, nº 1 do CPC).
Segundo o Prof. Alberto dos Reis (11),“...uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta...”.

Por força deste preceito legal, poder-se-á, assim, dizer que “… não é qualquer tipo de afectação ou influência de uma acção sobre a outra que justifica o nexo de prejudicialidade. É necessário que essa influência seja decisiva, e só o é se o acto ou facto jurídico que se discute na primeira (causa prejudicial) constituir o pressuposto do que se discute na segunda (causa dependente) … “ (12).
Por outro lado, importa ter em atenção que uma das razões de ser da suspensão por pendência da causa prejudicial é a economia e coerência de julgamentos.

Finalmente, não se pode deixar de atender a que “não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens” (nº 2 do art. 272º do CPC).

Importa reverter para o caso concreto.

Na presente situação, conforme resulta do relatório elaborado, a questão que se coloca é a de saber se, como insiste o Recorrente,“ a pretensão deduzida nas acções declarativas constitui um pressuposto da pretensão deduzida na oposição à execução”
Sucede que, salvo o devido o respeito pela opinião contrária, a verdade é que a invocação de tais processos não pode funcionar como causa prejudicial dos presentes autos de acção executiva (nem da oposição à execução- como parece também defender o Recorrente, ainda que de uma forma não muito clara).

Na verdade, como ficou referido, para que assim se pudesse considerar, a “decisão” que viesse a ser proferida naquelas causas teria que constituir o pressuposto do que se discute na segunda (causa dependente), ou seja, na presente acção executiva.
Ora, não se vislumbra como tal possa suceder no caso concreto.

Com efeito, o facto alegado (que, no fundo, é uma mera expectativa jurídica dos executados) não constitui, de forma alguma, um pressuposto da presente acção executiva, uma vez que o título dado à execução preenche, como vimos, todos os requisitos (de exequibilidade, exigibilidade, etc.) que lhe permitem fundamentar a pretensão executiva.

Sucede que, mesmo que assim não se entendesse, sempre tal hipótese estaria afastada, pois que, como se referiu, não é legalmente admissível a suspensão de instância na acção executiva.
Aqui chegados, pode-se, assim, concluir que não se vislumbra como é que as invocadas causas possam funcionar como causa prejudicial da acção executiva aqui em apreciação.
Vejamos agora se aquela suspensão devia ter sido determinada com apelo a “outro motivo justificado”.

Estabelece o art. 272º, nº 1, 2ª parte, do CPC que a suspensão da instância pode ainda ser determinada “… quando ocorrer outro motivo justificado… “.
Entende-se existir “outro motivo justificado” em situações em que ocorram “… motivos diferentes da pendência da causa prejudicial e que em seu juízo (do Tribunal) justifique a suspensão… “ (13).
Ora, como se diz no ac. da RL de 17.11.1994 (14), “… parece-nos resultar da lição do Prof. Alberto dos Reis (citando a lição do prof. Manuel de Andrade em “Lições de processo civil, pág. 493 e 494) em face aos casos admitidos como situações em que o juiz pode suspender a instância com fundamento noutro motivo justificado que, apenas, em casos muito ponderosos a instância deve ser suspensa por vontade do Juiz… “.

Daí que, como se refere no ac. da RP de 8.11.2007 já citado, “…nesta parte, dá-se ao juiz grande liberdade de acção. O juiz pode ordenar a suspensão quando entenda que há utilidade ou conveniência processual em que a instância se suspenda… “.

Assim, “do teor do n° 1 artigo 279° (actual, art. 272º) do CPC – “o juiz pode ordenar” — decorre que o julgador não se encontra obrigado a suspender o processo, mesmo na pendência de causa prejudicial. Trata-se de uma faculdade que exercerá, ou não, consoante a avaliação que faça. E essa avaliação surgirá do balanceamento entre, por um lado, as necessidades de segurança e certeza jurídicas (a aconselharem a suspensão) e, por outro, a exigência de decisão “em prazo razoável” (evitando — ou tentando evitar — o que possa provocar demoras excessivas) … “ (15).
Logo, no preenchimento deste conceito - motivo justificado – o Juiz deverá “…orientar-se, claro está, por critérios de utilidade e conveniência processual” (16).
Dir-se-á, porém, que nesta “integração do conceito “motivo justificado para a suspensão da instância”, deve entender-se que a lei não toma em consideração, propriamente, os prejuízos ou vantagens (de um ponto de vista subjectivo) das partes, mas apenas do ponto de vista processual, devendo o juiz ponderar as vantagens e os inconvenientes da suspensão para obter a justa composição do litígio” (17).
Nesse sentido, um dos critérios que poderá ser utilizado, neste âmbito, é o de ponderar se os inconvenientes processuais que a suspensão de instância poderá produzir serão superiores aos que resultarão da continuação dos autos.
Ora, aplicando estas considerações ao caso concreto, afigura-se ao presente Tribunal que o motivo invocado pelo Recorrente- fundando-se numa mera expectativa jurídica que deterá nas aludidas causas- a ser aceite, produziria inconvenientes processuais consideravelmente superiores àqueles que poderão ser produzidos, com o prosseguimento da presente acção executiva.
Referimo-nos não só ao facto de tal suspensão de instância colocar em causa “um direito que já se encontra declarado ou reconhecido”, mas também ao facto de, não sendo certo que o Recorrente venha a ter a titularidade do direito invocado, se assim não vier a ocorrer, a efectivação das providências coercivas, destinadas ao cumprimento, terem sido adiadas, sem que para tal tenha existido qualquer fundamento legal (já reconhecido).

Ou, como já ficou referido no Acórdão da Relação de Guimarães:

“A execução não se propõe decidir se esse crédito existe, mas pressupõe, antes, que o mesmo subsiste e é exigível aos executados. O que, de resto, em bom rigor, os Apelantes nem sequer contestam. O que parecem sustentar é apenas, repetimos, que, eles próprios, têm direito a que um terceiro liquide essa obrigação ou lhes faculte meios para tal. Mas essa questão não está por decidir na acção executiva”.
Nesta conformidade, entende-se que, também, por esta via, não pode a pretensão do Recorrente ser acolhida.
*
Aqui chegados, resta-nos, pois, confirmar o juízo formulado pelo Tribunal Recorrido, sendo inequívoco que a questão que é colocada pelo Recorrente se mostra abrangida pelo caso julgado formal estabelecido pela anterior decisão proferida nos presentes autos, e, nessa medida, é vinculativa seja para as partes, seja para o próprio Tribunal.
*
Nesta conformidade, e por todo o exposto, decide-se julgar o Recurso totalmente improcedente, confirmando-se integralmente a decisão recorrida.
*
III- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar o Recurso totalmente improcedente, e, em consequência, confirmar integralmente a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente (art. 527º, nº1 do CPC).

Guimarães, 28 de Junho de 2018

Pedro Alexandre Damião e Cunha
Maria João Marques Pinto de Matos
José Alberto Moreira Dias


1. Rui Pinto, in “Manual da execução e despejo”, pág. 226.
2. Rui Pinto, in “Manual da execução e despejo”, pág. 227.
3. Rui Pinto, in “Manual da execução e despejo”, pág. 229.
4. Segundo o Prof. Alberto dos Reis, in “CPC anotado”, vol. III, págs. 92-93, o caso julgado exerce uma função positiva, quando faz valer a sua força e autoridade (princípio da exequibilidade), e uma função negativa, quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo tribunal.
5. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, pág. 704.
6. Remédio Marques, in “A acção declarativa à luz do Código revisto”, pág. 644.
7. Remédio Marques, in “A acção declarativa à luz do Código revisto”, pág. 646;- excepto no caso previsto no nº1 do art. 101º do CPC.
8. É essa a posição que, em termos Jurisprudenciais, tem sido também considerada: v, por exemplo, o Ac. do STJ de 14.1.93, in Cj, t. I, pág. 59, onde se decidiu que “ ...a execução não pode ser suspensa com fundamento na existência de causa prejudicial ... “- trata-se de Jurisprudência que tem o seu fundamento na argumentação desenvolvida no Assento de 24.5.60, publicado in Bmj 97, pág. 173 onde, de igual modo, se concluiu que “ a execução propriamente dita não pode ser suspensa pelo primeiro fundamento do art. 284 do CPC ( actual 279 , nº1 )“. No mesmo sentido, v. os acs. RC de 2.10.84, in Bmj 340, pág. 449, de 4.3.92 , in Bmj 415, 740 , de 28.4.92, in Bmj 416, pág. 725 , e de 14.7.92 , in Bmj 419, pág. 834.
9. Marco Gonçalves, in “Lições de Processo civil executivo”, pág. 397 (citando Jurisprudência recente).
10. Rui Pinto, in “Manual da acção executiva e do despejo”, págs. 1009.
11. In “Comentário ao CPC”, vol. III, pág.206
12. Ac. da RP de 8.11.2007, in dgsi.pt
13. Prof. Alberto dos Reis, in “Comentário ao CPC”, vol. III, pág.279
14. In Cj, t. V, pág. 110;
15. Ac. da RP de 6.7.2010, in Dgsi.pt.
16. Ac. da RG, de 07.02.2012 (relator: Ana Cristina Duarte), in dgsi.pt.
17. Ac. da RL, de 24.01.2013 (relator: Maria Amélia Ameixoeira), in dgsi.pt.