Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
135/21.6T8EPS.G1
Relator: ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores: INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA
NULIDADE
RECURSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
- O indeferimento do requerimento, feito na audiência final, para a inquirição de uma testemunha indicada pelos apelantes, podendo constituir a nulidade prevista no artigo 195º nº 1 NCPC, implica a sua arguição nesse ato (cfr. artigo 199º NCPC) e, perante o seu indeferimento, a interposição de recurso no prazo de 15 dias (artigos 638º nº 2 e 644º nº 2 alínea d) NCPC), a subir imediatamente, em separado, com efeito devolutivo, pelo que não podem os apelantes, vir impugnar nesta apelação, interposta da sentença final, a matéria que deveria ter sido oportunamente e nos termos referidos suscitada, não o tendo feito, não pode o tribunal agora apreciá-la.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

A) AA e mulher BB vieram intentar ação declarativa, com processo comum, contra CC, onde concluem pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada e, em consequência:

a) O réu condenado à reparação das patologias que a moradia dos autores apresenta, identificadas no ponto 11 da PI;
b) Bem como pagar aos autores a quantia de €6.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
c) Ser ainda condenado o réu no pagamento das despesas decorrentes do relatório técnico a que deu causa que ascende ao valor de €2.500,00.
Para tanto alegam, em síntese, que por escritura pública de 1 de março de 2016, os autores compraram ao réu, que o vendeu, o prédio urbano, composto por casa com três pavimentos e logradouro, destinado a habitação, sito no lugar do ..., Rua ..., da freguesia ..., concelho ..., pelo preço de €250.000,00.
No ano de 2016 os autores comunicaram verbalmente ao réu a existência de deficiências nas paredes exteriores daquele prédio, tendo este respondido que iria proceder à sua reparação.
Devido aos invernos rigorosos, no Verão de 2020 o referido imóvel apresentou outros defeitos e várias patologias e anomalias, que especificam, resultantes de defeito de construção, que comunicaram ao réu em 20/01/201, ascendendo a €27.375,00 o custo da execução dos trabalhos de reparação.
Pelo réu CC foi apresentada contestação onde conclui entendendo que deve a presente ação ser julgada totalmente não provada e improcedente, com todas as consequências legais.
Para tanto impugna o réu a matéria de facto alegada, referindo que quando os autores compraram a casa sabiam que a mesma tinha defeitos de construção, tendo o preço de compra sido reduzido em €30.000,00 devido a tais defeitos, sendo falso que só agora tenham detetado os defeitos que invocam, pelo que caducou o direito invocado pelos autores.
Os autores AA e mulher BB apresentaram resposta onde concluem entendendo que devem ser julgadas não provadas e improcedentes as exceções invocadas pelos réus, concluindo-se como na petição inicial pela procedência da ação, com as consequências legais.
Pugnam os autores pela tempestividade da presente ação.
O réu veio peticionar a condenação como litigantes de má-fé dos autores.
Convidados para especificarem a data de conhecimento dos defeitos cuja reparação reclamam, vieram os autores que em julho de 2020 conheceram cabalmente os defeitos e suas concretas causas, alegação esta que o réu impugnou.
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B) Realizou-se audiência prévia, foi elaborado despacho saneador, foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.
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C) Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença que decidiu julgar a ação improcedente e procedente a exceção de caducidade deduzida e, em consequência, absolver o réu do pedido contra si deduzido.
Mais foi decidido condenar os autores como litigantes de má-fé em multa de 3UC e indemnização à parte contrária que foi fixada em €700,00, a título de despesas com o seu mandatário, a que acresce o valor das taxas de justiça pagas nos autos.
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D) Inconformados com esta decisão, vieram os autores AA e BB interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (fls. 126).
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Nas alegações de recurso dos autores AA e BB, são formuladas as seguintes conclusões:

1. Cumprindo o disposto no art. 640º do CPC importa desde já consignar que:
- a matéria de facto assente nos artigos 9º a 11º da douta sentença deveria ter sido dada como não provada;
Devia ter sido dado como provado que:
a) no ano de 2016, os autores comunicaram verbalmente ao réu a existência de deficiências nas paredes exteriores, ao que o réu respondeu que iria proceder à sua reparação.
b) Nesta altura apenas se verificavam tais defeitos.
c) No verão de 2020 os autores constataram outros defeitos e várias patologias e anomalias, para além do que referiram verbalmente ao réu em a).
d) Os autores em consequência do apurado, e tendo comprado esta moradia com sacrifício e com a expectativa de ser a sua moradia de sonho, onde iriam passar o resto das suas vidas, sentem-se tristes e abatidos com a existência de todas estas patologias que não decorrem de outro motivo a não ser os defeitos de construção.
e) com tais patologias o ambiente da moradia torna-se insalubre e prejudicial à saúde dos autores.
2. O próprio tribunal, na sua fundamentação, limita-se a referir que os autores tinham conhecimento das patologias em causa aquando da aquisição, resultou do seu depoimento.
3. Ora, salvo o devido respeito, resulta do depoimento de parte dos autores exatamente o contrário, que se transcreve:
Depoimento do Autor AA
00:01:28 – Autor: Comprei ao preço acordado entre mim e o senhor CC que foram 280 mil euros.
00:01:34 – Juíza: 280 mil euros?
00:0136 – Autor: Exatamente. Depois falei com ele porque havia coisas que ele ainda estava por terminar em casa e ele para essas coisas que ele não conseguiu acabar, fez-me uma atenção e baixou-me o preço em 3 mil euros.
00:01:56 – Juíza: Em quanto?
00:01:57 – Autor: 3 mil.
00:01:58 – Juíza: 3 mil?
00:01:59 – Autor: Exatamente. E nós pagamos ao senhor CC foi 277 mil euros.
00:02:04 – Juíza: E como é que pagou esse dinheiro?
00:02:09 – Autor: 250 mil euros foi por transferência bancária e 27 mil euros foi por um cheque que foi dado.
00:02:18 – Juíza: Então não pagou 250 mil euros pela casa?
00:02:21 – Autor: Paguei 277 mil euros.
00:03:34 – Juíza: Além disso não testemunhou que houve uma redução do preço?
00:03:38 – Autor: Sim, mas isso foi para justificar um bocado aquela diferença entre os 277 mil euros e os 250 mil.
00:04:52 – Juíza: Foi isso então que o senhor testemunhou nesse processo?
00:04:54 – Autor: Sim.
00:04:55 – Juíza: Então o que me está a dizer, isso então não foi verdade?
00:04:58 – Autor: Não.
00:05:06 – Juíza: Olhe, então se isso não era verdade, o senhor quando comprou a casa como é que estava a casa?
00:05:14 – Autor: Como?
00:05:15 – Juíza: Como é que estava a casa?
00:05:17 – Autor: Estava impecável.
00:05:19 – Juíza: Não tinha rachadela nenhuma?
00:05:20 – Autor: Se não não comprava.
00:05:22 – Juíza: Não tinha rachadela nenhuma?
00:05:25 – Autor: A única coisa que a casa tinha que o senhor CC arranjou ainda nós não tínhamos ido para lá viver era algumas tintas… algumas paredes que a tinta estava a descascar e a parte exterior, os passeios estavam rachados e que ele na altura mandou lá uma pessoa arranjar.
00:05:46 – Juíza: Então as rachadelas nas fachadas, a necessidade de instalação de aquecimento central…
00:05:51 – Autor: Não. Não.
00:05:52 – Juíza: …eletricidade, as infiltrações isso foi fruto da imaginação. Já agora terminamos. A necessidade de substituição de estores e de substituição do motor do portão de rua, as alterações na cozinha, a inexistência de eletrodomésticos foi tudo imaginado?
00:06:06 – Autor: A inexistência de eletrodomésticos essa parte é verdade porque nós quando compramos a casa não tinha nada dentro. Na parte da cozinha isso não tinha nada, mas não teve nada a ver com a tal diferença de preço.(...)
00:10:08 – Juíza: Não. Não. O senhor disse que não tinha. Senhor AA a casa quando a comprou tinha alguma rachadela?
00:10:14 – Autor: Não.
00:10:15 – Juíza: Não tinha nenhuma. o que disse é que no processo disse que as rachadelas eram na fachada sul.
Depoimento da Autora BB
00:01:14 – Juíza: Olhe, eu começava por lhe perguntar porque preço adquiriram a casa ao senhor CC.
00:01:18 – Autora: Por 277 mil euros.
00:01:29 – Juíza: Olhe, isso não foi o preço que os senhores declararam na escritura.
00:01:32 – Autora: Verdade. 00:01:33 – Juíza: Então?
00:01:34 – Autora: Não foi porque o senhor CC tinha uma pendencia com a imobiliária Era e pediu-nos na altura, chegamos a um acordo para que fosse a casa registada por 250 mil para evitar que ele tivesse transtornos principalmente financeiros com a imobiliária.
00:01:57 – Juíza: Olhe essa diferença entre o que declararam e o que diz que efetivamente pagaram não foi um desconto no preço?
00:02:07 – Autora: Não foi um desconto absolutamente nenhum porque nós pagamos efetivamente 277 mil euros.
00:02:17 – Juíza: A senhora tem conhecimento de um processo judicial que houve precisamente neste Tribunal com a imobiliária e este senhor CC?
00:02:23 – Autora: Nós fomos testemunhas.
00:02:24 – Juíza: E o que é que a senhora testemunhou nesse processo?
00:02:27 – Autora: Testemunhamos… dissemos que …mentimos… acabamos por mentir porque afirmámos que foram os 250 mil euros para ilibar o senhor CC de qualquer outro procedimento que ele pudesse ter com a Era. Mas o senhor CC sabia efetivamente que nós tínhamos pago os 277 mil.
00:02:45 – Juíza: Olhe, dona BB o que é que a senhora testemunhou então nesse processo? A senhora foi ao processo dizer que pagou …
00:02:50 – Autora: 250 mil euros.
00:02:52 – Juíza: Porquê?
00:02:53 – Autora: Porquê?
00:02:55 – Juíza: Porquê esse valor?
00:02:56 – Autora: Porquê esse valor Drª? porque foi esse valor que nós acordamos com o senhor CC de que seria o montante adequado para ele justificar junto da Era…
00:03:09 – Juíza: Sim senhora. A senhora nesse processo disse, declarou que os 250 mil euros era um desconto por causa dos defeitos que a casa tinha?
00:03:17 – Autora: Na altura dissemos sim porque tínhamos de justificar de alguma maneira que eram defeitos, mas eram defeitos que nada têm a ver com o que nós hoje vimos aqui solicitar.
00:03:29 – Juíza: Então que defeitos é que a senhora atestou nesse processo?
00:03:35 – Autora: Era a substituição do motor do portão de rua, substituição de estores, substituição do aquecimento central, a cozinha que não tinha eletrodomésticos, umas retificações que havia a fazer na cozinha, na placa do fogão.
00:03:51 – Juíza: Não se queixaram já nessa altura, a senhora não foi atestar nesse processo a existência de rachadelas na fachada?
00:03:57 – Autora: Sim. havia umas rachadelas mas eram rachadelas que tinham a ver com a argamassa e com a pintura e não propriamente aquilo que nós reivindicamos que são fissuras estruturais.
(...)
00:04:28 – Autora: Essas rachadelas efetivamente existiam mas não nos locais que existem agora. Eram ... nas paredes exteriores ao lado da garagem que tinham a ver com a salitra, até porque na altura o senhor CC até foi lá retificar essa pintura. Ele foi lá na altura retificar essa pintura.
00:05:27 – Juíza: E rachadelas?
00:05:29 – Autora: Sim, mas essas rachadelas não têm a ver com isto que nós hoje alegamos. Eram rachadelas que com uma pintura ficou retificada. E ficou porque na altura o senhor CC foi lá retificar precisamente esse serviço. Se ele não se sentisse digamos que no dever de, ele não ia.
00:05:52 – Juíza: Então estes defeitos existiam na casa? 00:05:53 – Autora: Esses existiam.
00:05:55 – Juíza: Esses existiam. Rachadelas nas fachadas?
00:05:58 – Autora: Nas fachadas não.
00:05:59 – Juíza: Então?
00:06:00 – Autora: Em algumas paredes externas, mas que eram paredes…
00:06:04 – Juíza: As paredes externas da casa é o que se chama fachada. Então em que paredes externas é que existiam rachadelas?
00:06:09 – Autora: Por exemplo, um muro que tem, a Dr.ª não conhece a casa, um muro que tem do lado de fora, que faz a entrada para a garagem, esse muro aí estava… tinha umas rachadelazitas superficiais.
00:06:24 – Juíza: Aqui fala-se também em…infiltrações de água no exterior. É isso?
00:06:30 – Autora: Essas infiltrações eu não lhe posso precisar porque não sou da área mas tinha a ver com o estore que não funcionava e permitia a entrada da água e que por isso é que nós tivemos de substituir alguns estores.
00:06:47 – Juíza: Então fala-se aqui de duas coisas diferentes, uma coisa são as rachadelas …a casa tinha alguma rachadela quando os senhores a compraram?
00:06:50 – Autora: Rachadela… notória não. Tinha aqueles pequenos defeitos de pintura que facilmente foram retificados.
00:07:15 – Juíza: Portanto, não tinha nada?
00:07:17 – Autora: Não.
00:07:20 – Juíza: Estas outras coisas que disse, necessidade de instalação de aquecimento central e eletricidade, a substituição dos estores, do motor do portão de rua, alterações na cozinha e os eletrodomésticos diz que existia mas não teve nada a ver com o suposto desconto que não existiu.
00:07:39 – Autora: Que não existiu, exatamente.
00:07:41 – Juíza: Olhe e então para que é que … porque é que efabularam estas rachadelas nas fachadas?
00:07:47 – Autora: Essas rachadelas nas fachadas, Drª tem precisamente a ver com ter de haver uma retificação na pintura, só isso, não era nada muito… muito…era evidente mas não era nada que nos preocupasse porque nós sabíamos que aquelas rachadelas com a pintura iam à vida e foi isso exatamente que aconteceu e que o senhor CC foi lá retificar. Na altura ele foi retificar porque ele sabia que nós se ele não retificasse nós não iriamos colaborar com ele no processo da Era.
00:08:22 – Juíza: Sim senhora…
00:08:27 – Autora: Mas nada… desculpe… nada que nos preocupasse porque era uma situação que se resolvia facilmente. Aquilo com que nós nos deparamos atualmente não tem nada a ver, nem nunca pensamos que pudesse chegar a uma situação destas senão nunca teríamos comprado a casa.
4.Os Autores, em depoimento de parte e conscientes das consequências do mesmo, falaram com verdade, repuseram a verdade dos factos, ora ninguém no seu juízo perfeito está disposto a declarar que prestou falsas declarações a “pedido” do agora Réu/Recorrido num outro processo para o beneficiar, com perfeita noção das consequências penais e fiscais do declarado, que, obviamente, fiscalmente trará consequências de igual modo para o Réu, aqui Recorrido.
5. Ora, o tribunal nunca poderia retirar a ilação de que houve um desconto do preço e que tinham conhecimento das patologias em causa no presente processo aquando da aquisição, pois resultou efetivamente o contrário dos seus depoimentos, e ao mesmo tempo valorar o depoimento, extraindo certidão para o Ministério Público instaurar a competente ação.
6. Ao contrário do que o tribunal a quo entendeu, salvo o devido respeito, à luz das regras da experiência comuns e normalidade, a posição dos Autores, face às consequências da mesma, é verdadeira e com o intuito de repor a verdade dos factos, já que o Réu/Recorrido escusa-se à sua responsabilidade, agindo este sim de má-fé, pois bem sabe o valor que recebeu, e como recebeu:
00:02:09 – Autor: 250 mil euros foi por transferência bancária e 27 mil euros foi por um cheque que foi dado.
7. Dados/comprovativos (extrato bancário e desconto do cheque) que para a boa descoberta da verdade deveriam ter sido aceites no processo. Ainda para o mais que os mesmos serão apresentados nos processos que advirão como consequência dos seus depoimentos e para reposição da verdade.
8. Ademais, na sequência do depoimento dos Autores requereram os mesmos a audição de pessoa, que se encontrava no tribunal, e se revelava essencial para o apuramento da verdade, atendendo aos depoimentos de parte, o que não foi deferido e que, salvo o devido respeito, andou mal o indeferimento.
9. O Tribunal a quo incumpriu o poder-dever, que lhe é imposto pelos artigos 411º e 526º, do Código de Processo Civil, de inquirição de testemunha, com conhecimento de factos importantes para a decisão da causa, em violação dos princípios do inquisitório e o da descoberta da verdade material.
10. Não colhe igualmente o argumento da coincidência entre o valor do desconto e o valor necessário à reparação das patologias pois se de facto existissem tais patologias à data da aquisição, com tal valor, nunca o valor seria o mesmo ou semelhante na presente data! Pelo que aqui, salvo o devido respeito, terá o Tribunal a quo, laborado em confusão.
11. O tribunal a quo fundamenta ainda a sua decisão: “Competia, por isso, aos autores fazer a contraprova de tais factos, demonstrando que aquilo que alegaram não era verdade e/ou as patologias agora reivindicadas não eram as mesmas, o que não conseguiram fazer.”
12. Ora, resulta do depoimento da testemunha DD, (engenheiro civil) exatamente o contrário:
(...) 00:03:54 – Testemunha: As fissurações na envolvente exterior nas paredes dos diversos alçados que aqui refiro tinham como causa … eram causas estruturais, fissuras ativas, nomeadamente no corpo que está com solo, que está balançado e com uma deformação do elemento, nos elementos nós temos deformações quando estamos a construir, nós temos fundamentalmente 3 tipos de deformações, temos uma deformação instantânea que decorre no momento construtivo, quando estamos a executar o edifício, temos deformações a longo prazo num primeiro período de 5 anos, ou seja, em que o edifício com a utilização que lhe vai sendo dada se vai ajustando em termos de deformações e depois temos deformações ao longo da vida útil do edifício, que estes edifícios são dimensionados estruturalmente para 50 anos em que essas deformações dependem como é que o edifício está a ser utilizado, como é que está a ser carregado, das ações (...)
00:05:49 – Advogada: 2020. Mas pela sua experiencia enquanto técnico isto são tipo de defeitos que se nota de início? Ou demoram algum tempo a aparecer?
00:06:01 – Testemunha: Isso são defeitos que costumam aparecer nos primeiros 5 anos de vida útil do edifício.
13. Conforme se pode constatar do depoimento do Engenheiro que elaborou o relatório, os defeitos reclamados não são defeitos instantâneos, que esses sim poderiam verificar-se aquando da aquisição da casa de habitação, acabada de construir, como foi o caso. Pelo contrário são defeitos que ocorrem nos primeiros 5 anos de vida útil do edifício, chamadas de deformações a longo prazo.
14. Do depoimento da testemunha também não resulta que as fissurações já existiam seguramente há mais de um ano à data da verificação, que correu no Verão de 2020.
15. Este tipo de tipologias não acontecem de um momento para o outro. Normalmente têm um desenvolvimento, podem ter um desenvolvimento rápido, ele há situações, nomeadamente nestas fissuras que temos em consola, claramente via-se que existiu ali num período curto uma oscilação, a própria argamassa do reboco ainda estava quase que virgem percebe. Ao partir a gente viu que tinha saltado há pouco tempo, mas se me perguntar se tinha sido há 6 meses, 1 ano ou 2 anos, não consigo precisar isso, percebe? Nem eu, nem ninguém.
16. Não pode o Tribunal a quo concluir que já existiam as patologias em causa seguramente há mais de um ano até que a testemunha refere que existiu um período curto de oscilação, a própria argamassa do reboco ainda estava quase virgem!!!
17. O tribunal deveria ter dado assente de que em 2016 não existiam as referidas patologias, pelo que à data da venda não existiam tais patologias e como consequência não poderiam os autores terem conhecimento das mesmas e em consequência como não provada a matéria dos artigos 9º a 11º.
18. Pelo que nunca poderia o Tribunal a quo decidir pela exceção da caducidade.
19. O Tribunal a quo valorou mal o depoimento dos Autores, atendendo a que os mesmos depuseram com segurança, total transparência e conscientes dos efeitos dos seus depoimentos, o que por si só, não pode deixar de ser tido em conta!
20. Os Autores não obtiveram qualquer desconto aquando da aquisição, por não existiram quaisquer defeitos, para além de que resultou igualmente provado que os defeitos nunca poderiam ter surgido seguramente há mais de um ano após o conhecimento dos mesmos por parte dos Autores.
21. A decisão recorrida, nunca poderia condenar os Autores em litigância de má-fé por deduzirem pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar.
22. À contrário, tal aplicar-se-ia ao Réu que manifestamente aproveitou-se e continua a aproveitar-se dos Autores, quer na ação em que os Autores foram testemunhas e a seu pedido mentiram para o beneficiar, quer agora na presente ação furtando-se às suas responsabilidades, como que saindo “airosamente” colocando os Autores/Recorrentes na posição contrária à verdade dos factos, o que leva a uma total desilusão dos Autores que pretenderam com os seus depoimentos repor a verdade dos factos, arcando por isso com as necessárias consequências da sua atuação prévia ao compactuar com o Réu.
23. O que choca à consciência do cidadão comum é o Tribunal a quo compactuar com a versão do Réu e não ponderar o facto dos Autores/Recorrentes pretenderem a reposição da verdade, uma vez que necessidade nenhuma tinham de depor conforme depuseram arcando com as consequências de terem prestado falsas declarações em processo anterior, pois além de incorrerem num processo crime e fiscal, continuam com o problema por resolver, verificando-se a irresponsabilização do Réu.
24. Salvo o devido respeito, a explicação que foi dada pelas partes é perfeitamente lógica, coerente e provida de total sensatez.
25. De facto, na audiência de discussão e julgamento quer as partes como a testemunha explicaram de forma perfeitamente clara e congruente os defeitos existentes no prédio bem como a proveniência dos mesmos e o seu surgimento recente.
26. Posto isto, é por demais evidente que os autores não litigam de má-fé, pelo contrário o único propósito é a reposição da verdade dos factos, independentemente das consequências que advêm.
27. Logo, salvo o devido respeito, contrariamente ao entendido pelo tribunal recorrido, os recorrentes fizeram prova que o que alegaram não era verdade e que as patologias agora reivindicadas não eram as mesmas que existiam aquando da compra do imóvel.
28. O tribunal não deveria ter decidido pela procedência da exceção de caducidade nem condenado os Autores em litigância de má-fé, e sim condenar o réu no pedido, conduzindo à procedência do recurso e à revogação da sentença recorrida.
Termina entendendo que deve o recurso em causa ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida nos termos acima referidos.
*
Não foi apresentada resposta.
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E) Foram colhidos os vistos legais.

F) As questões a decidir no recurso são as de saber:

1) Se existe invocação de nulidade da sentença e, existindo, se a nulidade se verifica;
2) Se há violação do princípio do inquisitório;
3) Se deverá ser alterada a decisão da matéria de facto;
4) Se deverá ser julgada improcedente a caducidade e o réu condenado no pedido;
5) Se deve ser revogada a condenação dos autores como litigantes de má-fé.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

A) I. FACTOS PROVADOS
(Petição Inicial)

1) Por escritura pública celebrada a 1 de março de 2016, os autores compraram ao réu o prédio urbano, composto por casa com três pavimentos e logradouro, destinado a habitação, sito no lugar do ..., Rua ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do registo predial ... sob o número ...80, da freguesia ... e inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...22, pelo valor de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), conforme documento junto aos autos a fls. 12 a 20, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
2) Por carta, datada de a 20/01/2021 enviaram carta registada com aviso de receção ao aqui réu declarando “Todavia, neste Verão de 2020 verificamos várias patologias e anomalias tendo para o efeito solicitado relatório técnico para apuramento cabal dos concretos defeitos e anomalias, as suas causas, medidas corretivas e de tratamento bem como custos de reparação das mesmas.
Ora, do relatório conclui-se que as patologias verificadas resultam de defeitos de construção e não da normal “degradação” pelo uso, pelo que não resta outra alternativa a não ser a denúncia dos mesmos para a sua reparação (…)”, conforme documento junto aos autos a fls. 52 a 54, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
3) O prédio referido em 1) apresenta as seguintes patologias:
- Fissuração da fachada exterior sul, em consola, com revestimento em reboco pintado, com sinais evidentes de infiltração para o interior.
- Fissuração da fachada exterior norte, em consola, com revestimento em reboco pintado.
- Fissuração da fachada exterior nascente com revestimento em reboco pintado.
- Fissuração da fachada exterior norte com revestimento em placas de granito coladas.
- Fissuração da fachada nas zonas dos vãos e aberturas.
- Fissuração do revestimento em placas de granito colado da varanda poente.
- Ausência de corte hídrico nas fundações e elementos de construção em contacto com o solo.
- Humidade na face inferior das escadas exteriores a norte.
- Assentamento dos passeios e pavimentos exteriores em cubo de granito.
- Fissuração dos muros de vedação exteriores.
- Infiltração nas paredes do quarto Nascente/Sul.
- Fissuração vertical generalizada nas placas de gesso cartonado de revestimento interior de paredes.
- Fissuração no teto da cozinha em placas de gesso cartonado.
- Humidade localizada nas ombreiras dos vãos e face inferior das paredes interiores no piso semienterrado.
- Fissuração na parede da caixa de escadas no poiso semienterrado.
- Fissuração da parede da garagem.
- Degradação do roupeiro em madeira da suite por ação da humidade.
4) Para reparar as patologias identificadas em 3) será necessário:
a) Tratamento da fissuração estrutural por abertura, reforço estrutural e fecho de fissuras.
b) Regularização do pano de fachada.
- Fornecimento e aplicação de sistema kenflim estruturado em todas as fachadas com acabamento em reboco pintado, precedido de decapagem do sistema existente, ou
- Fornecimento e aplicação de sistema ETICS 40mm em todas as fachadas em reboco pintado, concluindo aumento de soleiras e peitoris em alvenaria de granito e remate somente com RDA na zona de transição para ombreiras e padieiras.
c) Remoção de todos os elementos em placas de granito que se apresentem fissurados ou ocos.
d) Tratamento de toda a fissuração estrutural do suporte por abertura, reforço estrutural e fecho das fissuras.
e) Regularização do pano de fachada.
f) Fornecimento e aplicação de novos elementos de placas de granito onde removidos.
g) Fornecimento e aplicação de hidrófugo de cristalização em toda a área das fachadas em placas de granito colado.
h) Fornecimento e execução de corte em V na face inferior do reboco das fachadas.
i) Fornecimento e aplicação de cordão de mástique acrílico em toda a zona de corte.
j) Acabamento de acordo com a opção 1 ou 2.
k) Demolição do material de revestimento das escadas exteriores na sua face superior e inferior.
l) Regularização dos suportes.
m) Fornecimento e aplicação de novo revestimento dos degraus e patamares das escadas em placas de granito, precedido de camada de impermeabilizante em membrana liquida.
n) Fornecimento e aplicação de pintura na face inferior das escadas.
o) Remoção do material de revestimento dos pavimentos em cubo de granito e sua limpeza para posterior reaplicação.
p) Fornecimento e execução de nova camada de base incluindo adequada compactação e precedido de camada drenante e manta geotêxtil.
q) Reaplicação do cubo nas zonas intervencionadas. Rejuntamento das juntas do cubo em argamassa.
r) Tratamento da fissuração estrutural por abertura, reforço estrutural e fecho das fissuras.
s) Regularização do pano de reboco.
t) Fornecimento e aplicação de pintura de exterior acrílica.
u) Fornecimento e execução de tetos e paredes interiores em tinta acrílica de interior, precedido de correção, em zona de fissuração proceder previamente à sua correção e fecho.
v) Remoção a vazadouro do roupeiro existente.
w) Fornecimento e aplicação de novo roupeiro de madeira idêntico ao existente.
x) Remoção do material de revestimento de ombreiras.
y) Remoção e acondicionamento para reaplicação de caixilharia.
z) Fornecimento e aplicação de impermeabilizante Weberdry em toda a zona da parede interior.
aa) Fornecimento e execução de reboco e acabamento.
bb) Reaplicação da caixilharia.
cc) Pintura final de acordo com o especificado para pinturas interiores.
dd) Remoção do material de revestimento da face inferior das paredes interiores.
ee) Fornecimento e aplicação de impermeabilizante weberdry em toda a zona da parede interior.
ff) Fornecimento e execução de reboco e acabamento.
gg) Pintura final de acordo com o especificado para pinturas interiores.
5) A execução dos trabalhos identificados em 4) importa custos que ascendem a €27.375,00.
6) Para além de que as patologias referidas diminuem o valor o imóvel em caso de venda.
7) Os autores recorreram a mútuo bancário para a aquisição da moradia, no valor de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros)…
8) Incidem sobre o imóvel hipotecas a favor do Banco 1... para garantia do capital, juros à taxa anual de 7 por cento, acrescida de sobretaxa de 3% ao ano em caso de mora e despesas judiciais e extrajudiciais emergentes do contrato fixadas para efeitos de registo em €10.000,00 (dez mil euros), conforme documento junto aos autos a fls. 12 a 20, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
(Da contestação)
9) Os autores quando compraram o prédio referido em 1) sabiam que o mesmo apresentava defeitos …
10) Concretamente “rachadelas nas fachadas” e “várias infiltrações de água no exterior”…
11) Tendo o preço da venda sido reduzido em €30.000 como consequência desses defeitos.
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II. FACTOS NÂO PROVADOS

a) No ano de 2016, os autores comunicaram verbalmente ao réu a existência de deficiências nas paredes exteriores, ao que o réu respondeu que iria proceder à sua reparação.
b) Nesta altura apenas se verificavam tais defeitos.
c) No Verão de 2020 os autores constataram outros defeitos e várias patologias e anomalias, para além do que referiram verbalmente ao réu e referidas em a).
d) Os autores, em consequência do apurado, e tendo comprado esta moradia com sacrifício e com a expectativa de ser a sua moradia de sonho, onde iriam passar o resto das suas vidas, sentem-se tristes e abatidos com a existência de todas estas patologias que não decorrem de outro motivo a não ser de defeitos de construção.
e) Com tais patologias o ambiente da moradia torna-se insalubre e prejudicial à saúde dos autores.
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações das recorrentes, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
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C) Nas suas alegações, e não também, nas conclusões, alegam os apelantes que “nos termos do artigo 615º nº 1 alínea d) Código de Processo Civil, sobre o tribunal recai especial dever de fundamentação das suas decisões ou também denominado “exame crítico”, que basicamente consiste na enunciação das razões de ciência extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimento, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pela ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção – neste sentido Ac. RG de 05/12/16 (Proc. 104/14.2GBVNF.G1).”
Verdadeiramente não existe qualquer invocação de nulidade da sentença por omissão de fundamentação, mas, ainda que se pudesse admitir, por mera hipótese de trabalho que a alegação pudesse constituir uma invocação de nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea d) NCPC, sempre se diria que o normativo em questão não traduz qualquer omissão de fundamentação, dado que esta se conteria, antes, no artigo 615º nº 1 alínea b) e não d) NCPC e, de qualquer forma nunca tal se verificaria, basta para tanto uma simples leitura objetiva da motivação da decisão de facto, constante de fls. 99 vº a 100vº, pelo que sempre teria de improceder a eventual pretensão.
O que existe, antes, é uma discordância da apreciação da prova e da decisão constante da sentença, o que é coisa diversa da nulidade da sentença.
Quanto à questão de saber se há violação do princípio do inquisitório, a própria alegação dos apelantes já responde à questão que se passa a esclarecer.
Com efeito, referem os apelantes que “na sequência do depoimento dos autores requereram os mesmos a audição de pessoa, que se encontrava no tribunal, e se revelava essencial para o apuramento da verdade, atendendo aos depoimentos de parte, o que não foi deferido e que, salvo o devido respeito, andou mal o indeferimento”, citando uma decisão judicial cujo endereço indicam, mas que não foi possível identificar e localizar, onde se refere, nomeadamente, que:
“V - A inobservância do inquisitório, a gerar nulidade processual, nos termos gerais do nº 1, do art. 195º, do CPC - porquanto consiste na omissão de um ato que a lei prescreve e a irregularidade cometida pode influir no exame ou na decisão da causa –, pode, validamente, ser suscitada no recurso da decisão interlocutória de não audição, apelação autónoma e imediata da decisão de rejeição de meio de prova (al. d), do nº2, do art. 644º, do CPC)”, posição com a qual concordamos e da qual, os apelantes não tiraram as devidas ilações.
Admitindo que a inquirição da testemunha indicada pelos apelantes, na audiência de julgamento (EE), que o tribunal indeferiu (cfr. a ata da audiência final a fls. 95), considerando-se que tal pudesse constituir a nulidade prevista no artigo 195º nº 1 NCPC, teriam os autores que arguir tal nulidade nesse ato (cfr. artigo 199º NCPC) e, perante o seu indeferimento, interpor recurso no prazo de 15 dias (artigos 644º nº 2 alínea d) NCPC), que subiria imediatamente, em separado, com efeito devolutivo (artigos 645º nº 2 e 647º nº 1 NCPC), pelo que não podem os apelantes, vir impugnar nesta apelação, a matéria que deveria ter sido oportunamente e nos termos referidos suscitada, não o tendo feito, não pode o tribunal agora apreciá-la e, como tal, se indefere.
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A presente apelação visa a reapreciação da decisão da matéria de facto e da decisão propriamente jurídica.
No que se refere à matéria de facto, entendem os apelantes que os pontos 9, 10 e 11 dos factos provados devem ser considerados não provados e os pontos a), b), c), d) e e) dos factos não provados, deverão ser considerados como provados.
Para tanto baseiam-se os apelantes nos depoimentos de parte dos autores e da testemunha DD, precisamente os mesmos meios de prova em que o tribunal a quo se sustentou para decidir a matéria de facto, apenas tendo o tribunal, a mais, tomado em consideração os documentos juntos aos autos.
E revisitada a totalidade da prova produzida, é inequívoco, até pelos depoimentos prestados pelos autores e apelantes, que tinham conhecimento das patologias que o imóvel apresentava quando o adquiriram, desde logo, a autora admite que existiam rachadelas na casa e infiltrações, mas atribui-as a uns estores (!?).
No entanto, importa ter em atenção que na ação nº 656/17.5T8EPS, em que uma imobiliária demandou o ali e aqui réu, os autores aí intervieram na qualidade de testemunhas, onde afirmaram terem declarado que tiveram um desconto de €30.000,00 no preço da aquisição do imóvel em causa nos autos, devido às patologias que a moradia apresentava que se referiam entre outras a “rachadelas nas fachadas” e “várias infiltrações de água no exterior”.
Afirmaram, nos presentes autos que mentiram ao proferir tais declarações no julgamento daquele processo 656/17.5T8EPS, tendo a intenção ajudar o aqui réu e ali réu e prejudicar a imobiliária/autora nesse processo.
No entanto sustentam nos presentes autos que não houve qualquer desconto no preço, que compraram o imóvel pela quantia de €280.000,00, contradizendo o alegado na PI, no artigo 2º, (nestes autos) e que não existiam as patologias que agora denunciam.
A autora BB refere que as patologias invocadas naquele processo 656/17.5T8EPS não são as mesmas que estão em causa nos presentes autos.
Se atendermos a que os ora autores não eram parte naquele processo, não custa a crer que os depoimentos aí prestados possam traduzir que o assumido desconto que negociaram com o réu possa ter sido o aí declarado, no montante de €30.000,00, tendo em conta as patologias em causa, valor esse que, como muito bem se refere na motivação da decisão da sentença, se aproxima do valor reclamado para reparação dos invocados defeitos, nestes autos para reparação das patologias (€27.375,00), assim como a coincidência entre o tipo de patologias invocadas naquele processo 656/17.5T8EPS e nos presentes autos, não nos permite credibilizar a versão aqui apresentada, cuja sustentação, não pode deixar de ser posta em causa.
Acresce que do depoimento da testemunha DD, não é possível afastar a possibilidade de as patologias que o imóvel apresenta de que em 2016, as mesmas ainda não existissem.
Assim sendo, resulta que se terá de manter a formulação da matéria de facto tal como foi apreciada e decidida pelo tribunal a quo, assim improcedendo a pretensão dos apelantes.
E mantendo-se a matéria de facto, necessariamente que terá de se manter a decisão propriamente jurídica da causa, dado que a alteração daquela constituía condição sine qua non para permitir a alteração da decisão constante da sentença, cuja consistência se terá de manter.
Com efeito, da matéria de facto dada como provada resulta que o prazo da denúncia dos defeitos, conhecidos já em 2016, já havia decorrido, tendo em conta os prazos que constam do artigo 917º do Código Civil, pelo que à data da entrada em juízo da presente ação, em 25/02/2021, já tendo os mesmos decorrido, caducou o direito que pretendiam exercer.
De resto, ainda que assim não fosse – e é – sempre se diria que tendo o preço da venda sido reduzido em €30.000,00 como consequência dos defeitos que o prédio apresentava, pretenderem agora os autores obter nova indemnização para eliminação dos mesmos, tal corresponderia ao exercício em termos clamorosamente ofensivos da justiça, ainda que ajustados ao conteúdo formal do direito, o que é dizer-se, tal constituiria um manifesto abuso de direito (artigo 334º Código Civil).
E como é bom de ver, nenhuma censura nos merece a manutenção da condenação dos autores como litigantes de má-fé.
Com efeito, provou-se uma materialidade contrária à alegada pelos autores, pelo que os mesmo deduziram pretensão cuja falta de fundamento não ignoravam e contraria uma consciência reta, a aceitação de uma indemnização para compensação de defeitos pré-existentes, para posteriormente voltar a peticionar nova indemnização, sobre os mesmos defeitos.
Por todo o exposto, inexistindo a violação de qualquer das normas e princípios referenciados, sem necessidade de ulteriores considerações, resulta que a presente apelação terá de improceder e, em consequência, confirmar-se a douta sentença recorrida.
Face ao total decaimento da pretensão dos apelantes, sobre os mesmos recai o encargo de suportar o pagamento das custas (artigo 527º nº 1 e 2 NCPC).
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III. DECISÃO

Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.
Notifique.
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Guimarães, 12/01/2023

Relator: António Figueiredo de Almeida
1ª Adjunta: Desembargadora Maria Cristina Cerdeira
2ª Adjunta: Desembargadora Raquel Baptista Tavares