Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
749/15.3T8BCL.G1
Relator: MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Numa situação em que os autores, em face dos defeitos que foram sendo detectados e não eliminados na moradia por eles adquirida, durante seis anos não usufruíram plenamente da mesma; sentiram-se defraudados e frustrados com a sua aquisição; sofreram de permanente inquietação, angústia, desgaste físico e psicológico devido aos inúmeros contactos com o réu com vista à sua resolução; tem havido uma inconstância de promessas de reparação; têm adiado o projecto de ter filhos por a moradia não ter condições para uma criança crescer de forma saudável e em que é prejudicial para a saúde do autor viver numa casa com humidades uma vez que sofre de problemas do foro respiratório, afigura-se-nos equilibrada uma indemnização no valor de € 7.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

Maria e marido, Fernando, instauraram a presente acção de processo comum contra MUNICÍPIO X pedindo que o réu seja condenado a:

- reparar e eliminar os defeitos elencados na petição, no seu artigo 17º, 22º e 23º, devendo iniciar as obras no prazo de 60 dias após trânsito em julgado;
- reparar e eliminar os defeitos nos termos propostos pelos autores na sua petição devendo iniciar as obras no prazo de 60 dias após trânsito em julgado;
- a pagar aos autores, por cada dia de atraso no início da obra, a quantia de 25,00€;
- a indemnizar os autores pelos danos patrimoniais sofridos e que se vierem a apurar em sede de incidente de liquidação;
- e a pagar aos autores a titulo de danos não patrimoniais sofridos e apurados até à presente data a quantia de € 12.500,00, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento e danos não patrimoniais futuros que se vierem a apurar em sede de incidente de liquidação.

Para tanto, alegam, em síntese, que tendo adquirido ao réu o prédio urbano identificado no art. 1.º da p.i. em Novembro de 2012, logo em Dezembro de 2012 o mesmo apresentou defeitos. Tais defeitos foram rectificados e, no início de 2013 apareceram novas anomalias no referido prédio, tendo o réu procedido à retirada de uma floreira que seria o foco das infiltrações em Julho de 2013.

Contudo, os defeitos subsistiram, pois as infiltrações têm origem nos materiais aplicados, em alguma fissuração e em erros de construção.
Alegam ainda que, em Julho de 2014, reuniram com o Presidente da Câmara do réu Município tendo este reconhecido os defeitos e assumido que as obras começariam em breve.
Alegam inúmeros danos não patrimoniais que computam em €12.500,00.
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O réu contestou deduzindo excepção de caducidade porquanto os autores tinham até ao início de 2014 para propor a acção pelo que não o tendo feito o seu direito caducou. Aceita alguns factos, impugna, no geral, os restantes e, alega que os danos não patrimoniais não se encontram devidamente concretizados.
Por último, requer a intervenção das empresas que procederam à empreitada.
Conclui pela procedência das excepções e, se assim não for, pela improcedência do pedido.
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Em resposta os autores pronunciaram-se pela improcedência da excepção alegando que o prazo é de 5 anos e sendo um ano para a denúncia dos defeitos tal prazo foi cumprido. Mais alegam que o réu reconheceu e aceitou os defeitos pelo que sempre será de aplicar o artigo 1225º do C.C..
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Foi admitida a intervenção, as empresas contestaram, mas antes de se iniciar a fase de julgamento, estas sociedades chamadas transigiram com o réu Município pelo que, quanto às mesmas, foi a instância extinta.
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Foi proferido despacho saneador, relegando para final o conhecimento da excepção de caducidade, identificando o objecto do litígio e enunciando os temas de prova.
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Os autores deduziram articulado superveniente no qual pediram a condenação do réu a reparar novos defeitos surgidos em Dezembro de 2016, bem como a pagar a quantia de € 2.5000,00 por danos morais decorrentes destes novos factos.

O réu respondeu pugnando pelo indeferimento do articulado por inadmissibilidade, extemporaneidade e invocou a caducidade do direito uma vez que tais danos, a existirem, já há muito que se tinham manifestado.
O articulado superveniente foi admitido e foram aditados temas de prova.
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O réu Município deduziu articulado superveniente alegando que, tendo solicitada autorização aos autores para a execução de obras, por carta de 10/01/2017, foi tal autorização recusada pelo que o atraso sempre deverá correr por conta daqueles.
Os autores responderam alegando que a intervenção solicitada pelo réu é apenas na fachada do prédio e só com a concordância de todos os proprietários do loteamento. A isto acresce que a proposta foi condicionada à renúncia dos restantes direitos por parte dos autores.

Pediram ainda a condenação do réu como litigante de má-fé e a improcedência do pedido.

O Tribunal a quo relegou o conhecimento do pretendido para sentença.
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O réu deduziu ainda a excepção de incompetência material, mas foi tal pedido indeferido uma vez que a mesma havia sido conhecida em sede de despacho saneador.
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Procedeu-se a audiência final, após a qual foi proferida decisão, cuja parte decisória, reproduzimos na íntegra:

“Face a todo o exposto, nos termos das disposições legais supra indicadas, julga-se improcedente a exceção deduzida e a ação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente, o tribunal decide:

a) condenar o R. à reparação e eliminação dos defeitos elencados nos pontos 16., 18. e 19., nos termos propostos, que resultaram apurados em 23. a 30. dos factos provados, devendo iniciar as obras no prazo de 150 dias após o transito em julgado;
b) condenar o R. à eliminação e reparação dos defeitos descritos no ponto 53. dos factos provados, devendo iniciar as obras no prazo de 150 dias após o transito em julgado;
c) condenar o R. a pagar aos AA., a título de danos não patrimoniais a quantia de 7.000,00 (sete mil euros), acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento:
e) absolver o R. Município dos restantes pedidos contra si deduzidos.
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Fixam-se as custas da ação pelos AA. e pelo R., na proporção do decaimento que se fixa em 15% e 85%, nos termos do art. 527.º n.º 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
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Registe e notifique.”
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Não se conformando com a decisão recorrida veio o réu dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

. O que importa apurar, no presente recurso é se os danos de natureza não patrimonial invocados pelos Autores podem servir de fundamento de condenação do Réu na quantia destinada a ressarcir esses danos.
. As considerações contidas na sentença recorrida que fundamentam o arbitramento aos Autores de uma indemnização a título de danos não patrimoniais, não evidenciam um dano moral merecedor de tutela do direito.
. Na verdade, o facto de os Autores considerarem que o seu projecto de constituir família se encontra adiado em virtude dos defeitos encontrados na moradia que habitam não tem qualquer fundamentação objectiva.
. Compulsados os factos vertidos na sentença recorrida nada se encontra susceptível de fundamentar semelhante decisão dos Autores.
. Do mesmo modo, o receio que manifestam pela falta de segurança e estabilidade do imóvel, não tem qualquer fundamento no plano dos factos dados como provados.
. Por outro lado ainda, a sentença recorrida considera que o ambiente provocado pelas infiltrações é prejudicial à saúde do Autor.
. Contudo, a sentença recorrida não diz como compatibilizar esta consideração com o facto dado como não provado segundo o qual “A situação de saúde do A. marido tem-se vindo a agravar com o tempo, em consequência da humidade existente na habitação, recorrendo, mais frequentemente a consultas médica e ao recurso a medicamentos.”
. Entre o facto dado como provado segundo o qual “o ambiente provocado pelas infiltrações que é prejudicial à saúde do A” e o indicado facto dado como não provado, aparentemente, existe, até, contradição, fundamento de nulidade da sentença nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615º do Código do Processo Civil, que desde já se invoca para todos os efeitos.
. Quanto ao mais considerado na sentença recorrida para efeitos de apuramento de danos não patrimoniais sofridos pelos Autores sempre haverá de atender que, só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral.
10º. Ora, no caso, as inquietações, angústias e frustrações, bem como as limitações ao uso da habitação – que aliás não vêm concretizadas -, não ocorre uma grave lesão de valores não patrimoniais, pelo que o dano sofrido pela autora (tristeza, consternação), não sendo suficientemente relevante, não se mostra ressarcível no âmbito do artº 496º, nº 1 do CC.
11º. Deste modo, inexistindo dano merecedor de tutela legal, não ocorre a obrigação de indemnização com base na responsabilidade civil contratual a imputar ao réu pois que falta um dos pressupostos dessa responsabilidade, antes enunciados.
12º. Por outro lado, na fixação da indemnização arbitrada aos Autores, a sentença recorrida não levou em consideração que “Com data de 10 de janeiro de 2017, o Município R. remeteu aos AA uma missiva na qual informava que tinha elaborada um projecto urbanístico que contemplava uma profunda intervenção nas fachadas dos imóveis, o que iria eliminar o aparecimento de humidades no interior dos mesmos, e dessa forma, criar condições para se poder eliminar, posteriormente as patologias interiores. Mais acrescentava o R. que era necessária a concordância e autorização dos proprietários das moradias, remetendo uma minuta de declaração para que os AA. dessem a sua autorização.” (cfr. ponto 57 dos factos provados).
13º. Isto é, mais de um ano antes da elaboração da sentença o Réu pretendeu eliminar os defeitos existentes na morada habitada pelos Autores e senão o fez foi porque os Autores recusaram essa intervenção do Réu, com a única justificação de que essa intervenção mais não era “do que uma tentativa não séria de resolução dos problemas” (cfr. ponto 59 dos factos provados).
14º. Sobre esta questão diz-se na sentença que “no que respeita ao pedido de cessação da mora do credor por parte do R. Município com a alegação de que notificados os AA. para autorizaram as obras na habitação, pelos mesmos foi recusado, desde logo não colhe tal versão, pois que se atentarmos aos restantes factos prova dos mesmo resulta que acompanha ndo a dita autorização os AA. teriam de renunciar ao direito de recurso à via judicial para efeitos de responsabilização do Município.”
15º. A sentença levou em linha de conta o facto vertido no ponto 60 dos facto provados, segundo o qual “Fez, ainda, o R. verter na referida carta que, não obstante a intervenção ter que merecer a concordância unanime de todos os proprietários, manifesto a minha concordância com o projecto de reabilitação exterior das moradias e, nesse sentido, autorizo a realização das respectivas obras no imóvel, e por conseguinte renuncio ao direito de recurso à via judicial para efeitos de responsabilização do MUNICÍPIO X, bem como para a obtenção de quaisquer indemnização. No que concerne às obras interiores, as mesmas serão objecto de realização, logo que finda a execução das obras exteriores”.
16º. Contudo bastará atentar ao documento de fls. 744 dos autos para se poder concluir que tal não corresponde à verdade.
17º. O trecho citado no ponto 60 dos factos provados não se encontra vertido na carta a que se refere o ponto 57 dos factos provados, mas antes na minuta anexa a essa carta que constitui uma mera sugestão de declaração de autorização.
18º. Nem se diga que tal distinção não tem qualquer consequência uma vez que uma coisa é o Réu pedir autorização para efectuar as obras de reparação, manifestando a sua pretensão de que os litígios terminassem; outra bem distinta é o Réu pretender fazer depender a eliminação dos defeitos da circunstância de os Autores abdicarem de qualquer indemnização.
19º. Ora, o que resulta claro pelas cartas trocadas entre Autores e Réu (cfr. fls 744 a 746 dos autos) é que os Autores bem entenderam que a declaração do Réu era a de eliminar os desfeitos sem qualquer contrapartida.
20º. Assim, resulta de tudo quanto vem de expor-se que, ainda que se venha a julgar que aos Autores deveria ser arbitrada uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelos Autores em consequência dos defeitos de construção verificados na moradia que adquiriram ao Réu, no que se não consente, nem prescinde, sempre a sentença recorrida merecerá reparo na medida em que a quantia concretamente arbitrada na sentença recorrida, a este título - € 7.000,00 – é manifestamente excessiva e desproporcionada aos danos não patrimoniais sofridos pelos Autores objectivamente determinados.”
Pugna pela revogação parcial da sentença nos termos referidos.
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Contra-alegaram os autores pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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Tendo em atenção que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são:

A) Apurar se a sentença é nula nos termos do art. 615º nº 1 c) do C.P.C.;
B) Saber se ocorreu erro na subsunção dos factos provados ao direito no que concerne ao pedido de indemnização a título de danos patrimoniais.
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II – Fundamentação

Foram considerados provados os seguintes factos:

1. Os autores são donos e legítimos proprietários do prédio urbano, destinado à habitação, composto por edifício de três pisos e logradouro, - Lote 12, sito na Rua …, freguesia de ..., concelho de X, inscrito na matriz sob o art. 590º, descrito na conservatória de R.P.X, sob o nº 588/....
2. Os autores adquiriram ao réu o referido imóvel através de escritura pública de compra e venda realizada em 07/11/2012 e a aquisição foi levada a registo através da AP Nº 2571 de 07/11/2012.
3. Logo após a compra os autores passaram a ocupar a moradia que não aparentava quaisquer defeitos.
4. Em Dezembro desse mesmo ano foram detectados e reportados defeitos ao réu, o que implicou várias deslocações da Sra. Eng. Isabel e Sra. Eng. Adelina, funcionárias da Câmara Municipal e técnicas do departamento de obras públicas, à moradia.
5. Aí puderam constar a existência dos defeitos reportados pelos autores, existentes nessa data e procederam à sua rectificação.
6. Não obstante, o certo é que os defeitos voltaram a surgir.
7. No início do ano 2013 surgiram outros defeitos, tais como humidades nas paredes, nas madeiras e outros que de seguida serão elencados.
8. Tendo sido reportados ao réu, quer verbalmente, quer por escrito.
9. Logo que comunicados os defeitos, deslocou-se à moradia por inúmeras vezes o Sr. Eng. Duarte, funcionário do município e técnico do departamento de obras publicas, tendo concluído que a origem das humidades/ infiltrações, se devia a uma má impermeabilização de uma floreira existente no terraço da moradia.
10. A moradia faz parte de um conjunto habitacional em banda, composta por 30 moradias, todas elas padecendo de vícios de construção idênticos.
11. Assim, em finais de Julho de 2013 foi ordenada a retirada da floreira da moradia dos autores (bem como nas demais 29 moradias).
12. No decurso das obras da retirada da floreira, que demoraram cerca de três semanas, caiu, de forma abundante e quando chovia, água do tecto da sala.
13. Rapidamente o réu se apercebeu que o problema afinal não estava na falta de impermeabilização da floreira, pois os defeitos de construção até então existentes, subsistiam, surgindo constantemente novos defeitos, os quais eram aceites.
14. Após várias deslocações à moradia dos autores (e demais moradores) pelo Eng. Duarte, foi por este sugerido a colocação de rufos e, caso não resultasse, a colocação de silicone.
15. O réu desconhecia a origem do problema.
16. A moradia dos autores, padece, actualmente, conforme esta tem conhecimento, porque reiteradamente denunciados e por ela reconhecidos e aceites, dos seguintes defeitos:

a) Manchas visíveis decorrentes de infiltrações de humidade no quarto a nascente/ sul, no último piso;
b) Manchas visíveis decorrentes de infiltrações de humidade, no quarto a nascente/norte, no último piso;
c) Deterioração da pintura por infiltração de água através do vão de acesso ao terraço a poente;
d) Remate mal executado entre a parede e o revestimento de chapa do murete de protecção do terraço acessível a poente, permitindo a entrada de água da chuva;
e) Tinta a descolar do suporte, por má aplicação, permitindo a entrada da água da chuva na parede que delimita o terraço acessível a sul;
f) Deterioração por efeito de infiltração de humidade pela soleira do vitral existente na parede exterior a poente contigua ao terraço acessível – de salientar que esta tinta foi aplicada aquando da (errada) remoção da floreira;
g) Deterioração da parede por infiltração de humidade, através da caixilharia da janela na parede da sala comum a poente;
h) Deterioração do tecto da sala comum, por efeito de infiltração de humidade, através da soleira da porta de acesso ao terraço livre;
i) Deterioração da face interior da parede exterior, lado poente no piso da garagem, por efeito de infiltração de humidade;
j) Rompimento da tela de protecção, que permite a entrada de água através da cobertura;
k) Mau acabamento de remates nas aplicações nas paredes da chaminé, permitindo a entrada de humidade;
l) Desligamento com fissuração de vedação a poente da fachada da moradia, permitindo a entrada de agua;
m) Fissuração da parede junto aos degraus de acesso à entrada a nascente da moradia, permitindo a entrada de água para o seu interior;
n) Escorrimento de água entre o revestimento e a parede da fachada, provocando, por infiltração, danos na face interior desta;
o) Deterioração da tinta na parede da entrada da moradia, que foi aplicada no decurso do ano 2013, na sequência de denúncia de defeitos, mas que subsistem;
p) Manchas escuras na fachada do edifício, onde se vislumbra retenção de água, permitindo o desenvolvimento de fungos;
q) Má execução da soleira e do revestimento da fachada, permitindo a entrada de água da chuva para o interior;
r) Do interior da parede exterior – caixa de ar – pode verificar-se o escorrimento de água, por infiltração, na face interior do revestimento exterior em tijolo burro maciço;
s) Reacção alcalina das argamassas, devido à infiltração de humidade por fissuração do revestimento;
t) O fecho da janela do quarto sito no 2º piso da moradia, não funciona correctamente, sendo difícil a abertura e fecho daquela – este defeito fora participado em Dezembro de 2012, sendo reparado nos dias seguintes, sendo certo que logo de seguida voltou a surgir o mesmo problema que se mantem na presente data;
u) O chão da garagem está a “ levantar” – a garagem, foi, também ela, alvo de uma reparação em Dezembro de 2012, sendo certo que o defeito voltou a surgir e se mantem na presente data;
v) O soalho da sala está a “ levantar”, devido à humidade existente na habitação;
w) Determinados interruptores eléctrinos não estão a ser utilizados divido à intensa humidade existente na zona envolvente, provocando “ choques” eléctricos se usados.
17. Sucede que, após a ida ao local do referido técnico, é possível verificar o agravamento dos defeitos de construção e o surgimento de novos defeitos.
18. Assim, na parede da sala é possível verificar a existência de um buraco devido à rápida degradação dos materiais, à intensa humidade que se verifica na parede que se desfaz ao mero toque.
19. Ainda no decurso do mês de Fevereiro de 2015, devido à infiltração das chuvas através da soleira da porta de acesso ao terraço, os autores tiveram de colocar alguidares para a recolha da água que era intensa e caía a “fio” na sala.
20. Esta situação ocorre sempre que chove com mais alguma intensidade.
21. Tendo já danificado o soalho da sala, que carece de ser substituído.
22. As infiltrações verificadas têm origem nos materiais aplicados, em alguma fissuração e em erros de construção.
23. As anomalias verificadas devem-se ao tijolo maciço de revestimento das fachadas, que como revestimento funcional não é eficaz, pois é permeável por ser cru, e a técnica empregue na sua aplicação com junta de cimento promove a retenção da água da chuva nas fachadas, permitindo um maior tempo de absorção e o desenvolvimento de fungos e matéria vegetal, aumentando ainda mais o índice de retenção de água na fachada. As transições entre este material e outros, estão mal executadas permitindo estabelecer pontos de infiltração, por retenção, criando obstáculos ao escoamento superficial normal da água da chuva.
24. A fissuração verificada contribue também para a infiltração de água para o interior da habitação, danificando os rebocos e as pinturas dos tetos e paredes. As infiltrações verificadas através dos vãos devem-se principalmente ao facto de, na execução, não ter sido respeitado o princípio da descontinuidade dos materiais aplicados, i.e., os rebocos, não devem ter continuidade do interior para o exterior, como foi o caso desta obra.
25. Mais se verificam remendos de pintura mal aplicados ou por má qualidade das tintas, ou pelo facto do suporte não ter sido devidamente tratado antes da aplicação da nova tinta. Na cobertura será necessário remendar a tela de revestimento junto da chaminé.
26. No que respeita às fachadas, a solução será a aplicação do sistema capoto do tipo da “Weber” ou da “Viero”.
27. Relativamente às paredes interiores, nas zonas com infiltrações, deverá o suporte danificado ser totalmente removido, de seguida proceder à aplicação de primário epoxídico de base aquosa, para paredes sujeitas a migração da humidade, primário anti-salitre, série 020-0401, da “Robbialac” aplicado em duas demãos, tal qual o produto é fornecido (após catalisação). Refazer toda a zona com massa “Águaplast Renovação”, da “Robbialac”.
28. Deverá, ainda, proceder-se à aplicação de primário baseada numa dispersão aquosa de resina sintética especial, copolímera acrílica, pigmentada com dióxido de titânio rutilo, dotado de boa resistência alcalina a fungos e a algas, tipo “Plastron Aquoso Anti-Fungos, Algas e Anti-Alcalino”, ref. 020.0200, da “Robbialac” aplicado diluído a 100% com água, bem como, à aplicação de tinta de acabamento, baseada numa dispersão aquosa de resina sintética especial pigmentada com dióxido de titânio rutilo, pigmentos resistentes aos álcalis e cargas inertes, tipo REP Semi – Acetinado, série 064 aplicada em duas demãos, todas diluídas com cerca de 10 % de água.
29. Na parte onde se verifica descontinuidades de materiais, deverá em todas as zonas onde se verifique pontes hídricas, serem eliminadas, provocando a interrupção dos materiais de ligação, com a execução de juntas que devem de seguida serem preenchidas com mástique de poliuretano do tipo “Sikaflex 11FC*” da “Sika”.
30. Para promover a descontinuidade de materiais, principalmente nos vãos das paredes exteriores, deve ser retirada toda a caixilharia e soleiras, promover o corte dos materiais que produzam ponte hídrica, preencher esse corte com o produto acima indicado e voltar a colocar a caixilharia. Neste processo aconselha-se o corte da soleira, até ficar somente com a largura do vão, para evitar a sua penetração nas ombreiras.
31. Perante os sucessivos adiamentos da realização das obras, os moradores das 30 moradias, incluindo os autores, reuniram no dia 21/07/2014 com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de X, a fim de exigirem a realização das obras.
32. Ao que o Sr. Presidente informou ter conhecimento de toda a situação e deu a sua palavra aos moradores em como iria resolver o problema.
33. Os autores continuaram a insistir junto do réu, na pessoa do Sr. Eng. Duarte, pela intervenção urgente da autarquia.
34. No dia 05/05/2014, após questionado pelos AA., o Sr. Eng. Duarte informou os mesmo, via e-mail, que “As intervenções no interior das moradias foram suspensas, devido à constatação, em várias moradias, de que, mesmo após as intervenções feitas no exterior, as infiltrações permaneciam. Nesse sentido, o Município está a finalizar o estudo de uma solução que resolverá definitivamente os problemas de infiltrações que ainda se verificam. Nesse sentido, ainda não posso adiantar qual será a solução, contudo a mesma será comunicada aos proprietários brevemente, no sentido de os mesmos a validarem. Pelas razões acima descritas é entendimento do Município que não será aconselhável fazer qualquer intervenção até que as infiltrações sejam resolvidas.”
35. Mais recentemente, todos os moradores interpelaram o réu através de Notificação Judicial Avulsa, denunciando, uma vez mais os defeitos, compelindo a mesma a proceder à reparação dos mesmos.
36. O réu sempre reconheceu a existência dos defeitos elencados em 16 e aceitou reparar os mesmos.
37. O réu accionou a caução prestada pelo empreiteiro e que cobriria uma parte (ainda que reduzida) das obras a realizar, tendo sido confrontada com a oposição do mesmo.
38. O que motivou o adiamento, uma vez mais, do inicío das obras.
39. Os autores reuniram com a Sra. Eng. Adelina, em finais de Janeiro do corrente, no Departamento de Obras Públicas do Município, na tentativa de obterem uma data quanto ao inicío das obras.
40. Por aquela foi confirmado que o estudo se encontrava concluído, que acompanhou todo o processo, efetuando diversas deslocações à moradia (e às demais) e que o Município estava prestes a lançar concurso público para a realização das obras, mas foi confrontado com o facto de o empreiteiro se ter oposto ao accionamento da caução.
41. Concluiu dizendo não saber quando as obras se iniciarão.
42. Esta situação impede os autores de usufruírem plenamente da sua moradia.
43. Vivendo numa situação de permanente inquietação e angústia, desgaste físico e psicológico.
44. A casa que compraram tinha uma floreira que a autora primava e cuidava e que foi removida, e que desvalorizou à habitação.
45. Uma casa para a qual tiveram de contrair um empréstimo pagando as prestações mensais.
46. Vivendo na inconstância, em face das sucessivas promessas de realização das obras, de reparação dos defeitos por parte do réu, organizando as suas vidas, nomeadamente férias, em função das datas que lhes eram adiantadas.
47. Ver a sua casa nova com alguidares na sala a aparar a água da chuva que vai caindo, causa desgosto aos autores.
48. Os autores sentem-se defraudados e frustrados.
49. Desgastados fisicamente em face dos inúmeros telefonemas, tentativas, e-mails, reuniões com o réu pelas expectativas geradas por esta na resolução rápida do problema.
50. Constituir família vem sido sucessivamente adiado por parte dos autores em face das circunstâncias, pois entendem que a moradia não reúne as condições para que uma criança possa crescer de forma saudável.
51. O autor marido sofre de alergias do foro respiratório, nomeadamente rinite alérgica e bronquite alérgica.
52. A vivência em ambiente com humidade, bolores e fungos, como tem acontecido, é prejudicial para a saúde do autor.
53. Em Dezembro de 2016 verificaram os autores no imóvel em causa a existência de:

a) humidade ascensional na parede ao fundo da cave na zona da garagem;
b) fissura entre o teto da escada e o teto da cave;
c) fissuras pronunciadas na parede do lado direito da porta interior da cave;
d) mancha de humidade no teto da sala do R/CD, na zona da porta da varanda;
e) fissuração no pavimento do pátio exterior da entrada, com acesso pelo arruamento superior, que indicia assentamentos de um aterro instável;
f) agravamento da rotação do muro de divisão e vedação do pátio exterior de entrada com acesso pelo arruamento superior, por assentamento da sua fundação, denunciando em consequência a deterioração do tijolo cerâmico.
54. Os referidos defeitos resultam de uma errada edificação ou aplicação dos materiais.
55. Os autores receiam pela falta de segurança e estabilidade do imóvel.
56. Estão impedidos de aceder à sua habitação por um dos acessos uma vez que não é possível abrir o portão.
57. Com data de 10/01/2017 o Município réu remeteu aos autores uma missiva na qual informava que tinha elaborada um projecto urbanístico que contemplava uma profunda intervenção nas fachadas dos imóveis, o que iria eliminar o aparecimento de humidades no interior dos mesmos, e dessa forma, criar condições para se poder eliminar, posteriormente as patologias interiores. Mais acrescentava o réu que era necessária a concordância e autorização dos proprietários das moradias, remetendo uma minuta de declaração para que os autores dessem a sua autorização.
58. Declaração essa a ser emitida após a consulta do projecto de intervenção urbana que o Município se propunha a levar a cabo.
59. Por carta remetida à Camara Municipal de X datada de 08/02/2017 os autores acusaram a recepção da missiva e a referir que mais não era do que uma tentativa não séria de resolução dos problemas.
60. Fez, ainda, o réu verter na referida minuta (e não carta, como por lapso a sentença recorrida fez constar) que “Não obstante a intervenção ter que merecer a concordância unânime de todos os proprietários, manifesto a minha concordância com o projecto de reabilitação exterior das moradias e, nesse sentido, autorizo a realização das respectivas obras no imóvel, e por conseguinte renuncio ao direito de recurso à via judicial para efeitos de responsabilização do MUNICÍPIO X, bem como para a obtenção de quaisquer indemnizações. No que concerne às obras interiores, as mesmas serão objecto de realização, logo que finda a execução das obras exteriores”.
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Factos não provados:

a. Os defeitos referidos em 7 foram de imediato e no prazo de 30 dias comunicados ao réu.
b. Nas circunstâncias referidas em 12 ficaram danificados diversos objectos.
c. O defeito referido em w) já colocou em causa a integridade física dos autores.
d. Através de Notificação Judicial Avulsa enviada por uma das moradoras daquele aldeamento, na qual se denunciava os defeitos e compelia o Município a proceder à reparação dos mesmos, este, em resposta, reconheceu a existência dos defeitos em todas as moradias, alegando estarem diligências em curso, nomeadamente a elaboração de um estudo com vista à obtenção de uma solução, uma vez que os defeitos são transversais a todas as moradias.
e. O réu já tinha conhecimento dos defeitos e apenas fazia uma “operação de estética”, de forma a que o defeitos não fossem visíveis e perceptíveis aquando da compra.
f. A situação de saúde do autor marido tem-se vindo a agravar com o tempo em consequência da humidade existente na habitação, recorrendo mais frequentemente a consultas médicas e ao recurso a medicamentos.
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A) Nulidade da sentença é nos termos do art. 615º nº 1 c) do C.P.C.
Defende o apelante que a sentença é nula por existir contradição entre o facto provado nos termos do qual “A vivência em ambiente com humidade, bolores e fungos, como tem acontecido, é prejudicial para a saúde do autor.” e o facto não provado “A situação de saúde do autor marido tem-se vindo a agravar com o tempo em consequência da humidade existente na habitação, recorrendo mais frequentemente a consultas médica e ao recurso a medicamentos.”.

Vejamos.

Dispõe o art. 615º do C.P.C.:

1.É nula a sentença quando: (…)
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão; (…).

Esta nulidade remete para o princípio da coerência lógica da sentença uma vez que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica, i.e., a decisão proferida não pode seguir um caminho diverso daquele que apontava a linha de raciocínio plasmado nos fundamentos. Tem-se entendido que esta nulidade está relacionada, por um lado, com a obrigação de fundamentação da decisão prevista nos art. 154º e 607º nº 3 do C.P.C. e, por outro, pelo facto da sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico em que a decisão deverá ser a conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor). Neste sentido, entre outros, Ac. da R.L. de 09/07/2014, in www.dgsi.pt.
Situação distinta é erro de julgamento (error in judicando), quer quanto à apreciação da matéria de facto, quer na determinação e interpretação da norma jurídica aplicável.

Ora, da análise da sentença não resulta, de modo algum, que os fundamentos de facto ou de direito estejam em contradição com a parte decisória da sentença.

A alegada contradição entre a matéria de facto dada como provada e não provada, entre a matéria de facto dada como provada e a convicção do tribunal ou entre a matéria de facto dada como provada e a fundamentação de direito poderá corresponder a erro na apreciação da prova ou na aplicação do direito, erro de julgamento a apreciar noutra sede.
Pelo exposto, temos por não verificada a invocada nulidade.
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B) Reapreciação da matéria de facto

Refere o apelante “o facto de os Autores considerarem que o seu projecto de constituir família se encontra adiado em virtude dos defeitos encontrados na moradia que habitam não tem qualquer fundamentação objectiva.”. Mais refere existir contradição entre o facto provado nos termos do qual “A vivência em ambiente com humidade, bolores e fungos, como tem acontecido, é prejudicial para a saúde do autor.” e o facto não provado “A situação de saúde do autor marido tem-se vindo a agravar com o tempo em consequência da humidade existente na habitação, recorrendo mais frequentemente a consultas médica e ao recurso a medicamentos.”.

Destas afirmações parece resultar o propósito do apelante em ver reapreciada a matéria de facto, mas uma vez que apenas parcialmente observou os ónus previstos no art. 640º do C.P.C. é de rejeitar a mesma. Com efeito, no caso em apreço, verificamos que o apelante, apesar de ter indicado concretamente os pontos de factos que considera incorrectamente julgados, não indicou qual a decisão que devia ser proferida, nem indicou os concretos meios de prova que impugnam decisão diversa.

De qualquer modo, sempre se dirá que, a nosso ver, não pode haver contradição real entre factos provados e factos não provados porque a resposta não provado a um facto não significa a existência do facto contrário ou de facto diverso. Com efeito, do ponto de vista lógico, não pode um nada em que se traduz uma resposta negativa colidir com algo em que se traduz uma resposta positiva. Neste sentido vide, entre outros, Ac. do S.T.J. de 15/04/10, in www.dgsi.pt.. In casu o facto de um ambiente com humidade, bolores e fungos ser prejudicial para a saúde do autor não está em contradição com a não prova que a saúde daquele se tivesse agravado com o tempo.
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C) Subsunção jurídica

Na presente apelação o réu insurge-se contra a sua condenação no pagamento aos autores de uma indemnização a título de danos não patrimoniais no valor de € 7.000,00, acrescido de juros de mora desde a citação até integral pagamento.
Antes de mais, autores e réu celebraram um contrato de compra e venda de um prédio urbano, bem este que apresentou vários e sérios vícios e defeitos, pelo que está em causa a responsabilidade civil contratual do réu.

Entendemos que a discussão acerca da admissibilidade da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais em sede de responsabilidade contratual está ultrapassada. Com efeito, a jurisprudência maioritária do S.T.J. abraça esta tese desde que os danos, pela sua gravidade, sejam merecedores da tutela do direito cfr. dispõe o nº 1 do art. 496º do C.C. e que se mostrem preenchidos os respectivos pressupostos que se retiram dos art. 798º e 799º do C.C.: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

O facto, a conduta humana dominada ou dominável pela vontade, aqui em causa é a venda pelo réu aos autores de um prédio urbano com vários graves defeitos.

A ilicitude de um facto resulta da desconformidade entre o comportamento devido pelo seu autor e o comportamento observado. Incumbia ao réu eliminar definitivamente os defeitos detectados, contudo, o mesmo revelou-se incapaz aos longo dos anos para apurar a origem dos mesmos e, uma vez por todas, eliminá-los.

A culpa traduz-se num juízo de reprovabilidade da conduta de alguém que, em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo e assenta no nexo psicológico que existe entre o facto e a vontade do agente. Pode revestir a forma de dolo ou de negligência. Em sede de responsabilidade contratual, nos termos do art. 799º nº 1 do C.C., existe uma presunção de culpa do devedor incumbindo a este ónus de a afastar. A culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família em face das circunstâncias de cada caso (art. 799º nº 2 e 487º nº 2 do C.C.).
No caso bem apreço, verificamos que o réu não logrou afastar a presunção de culpa que incide sobre si.

No que concerne aos danos não patrimoniais nem sempre foi reconhecida a ressarcibilidade dos mesmos, contudo o Código Civil de 1966 introduziu, no seu art. 496º, uma cláusula geral de ressarcibilidade dos danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (cuja redacção veio a ser alterada pela Lei nº 23/2010 de 30/08). Como se lê no Ac. do S.T.J. de 24/01/2012, in www.dgsi.pt: “dano grave não terá que ser considerado apenas aquele que é “exorbitante ou excepcional”, mas também aquele que “sai da mediania que ultrapassa as fronteiras da banalidade”, um dano que, segundo as regras da experiência e do bom senso, “se torna inexigível em termos de resignação””.

Como assinala Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol. I, Almedina, 7ª ed., 1993, pág. 602 “A indemnização por danos não patrimoniais reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.”.

Nestes danos mostra-se impossível, pela própria natureza das coisas, a reparação natural do dano, pelo que a lei impõe o recurso à equidade tendo em atenção os danos causados, o grau de culpa, a situação económica do lesante e do lesado e as demais circunstâncias do facto – art. 496º nº 3 e art. 494º, 566º nº 3 do C.C..

Segundo Ana Prata, in Dicionário Jurídico, 4ª ed., 2005, p. 499 “Julgar segundo a equidade significa dar a um conflito a solução que parecer mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável. A equidade tem, consequentemente, conteúdo indeterminado, variável de acordo com as concepções de justiça dominantes em cada sociedade e em cada momento histórico.”.

Revertendo ao caso em apreço constatamos a existência dos seguintes danos não patrimoniais:

- os autores, em face dos defeitos que foram sendo detectados e não eliminados, praticamente nunca usufruíram plenamente da sua moradia (veja-se que a aquisição ocorreu em 07/11/12, no fim de Dezembro desse ano foram detectados e reportados defeitos e, pelo menos em Janeiro de 2018, altura em que foi proferida sentença pelo tribunal a quo, os mesmos continuavam por eliminar), designadamente vêem-se impedidos de aceder à moradia por um acesso uma vez que não é possível abrir um portão;
- a referida situação, acompanhada dos inúmeros contactos com o réu com vista a tentar que a situação fosse resolvida (telefonemas, e-mails, reuniões), provocou nos autores um sentimento de permanente inquietação, angústia, desgaste físico e psicológico;
- ficaram desgostosos ao ver alguidares na sala da casa para aparar a água da chuva que aí caía;
- sentem-se defraudados e frustrados com a aquisição do imóvel, a que acresce o facto de haverem contraído empréstimo que continuam a pagar;
- a inconstância das promessas de realização de obras obrigou-os a organizar as suas vidas em função das mesmas;
- têm adiado o projecto de ter filhos por entenderem que a moradia não tem condições para uma criança crescer de forma saudável;
- por fim, uma vez que o autor sofre de problemas do foro respiratório como rinite alérgica e bronquite alérgica, o facto de viver numa casa com humidades, bolores e fungos é prejudicial para a sua saúde.

Concordamos com o apelante quando refere que o receio sentido pelos autores de que o imóvel não tem segurança e estabilidade não é dano objectivo e grave, mas apenas um sentimento daqueles que aliás, atendendo ao tipo de defeitos longamente referidos na matéria de facto provada, não corresponde à realidade.

Em contrapartida o facto objectivo que resultou provado (e não foi correctamente impugnado como vimos supra) de os autores, em face dos defeitos da moradia, adiarem o projecto de ter filhos por recearem pela saúde destes nada tem que ver com uma percepção subjectiva dos mesmos sem suporte na realidade, pois é sabido que não é bom para a saúde viver numa casa com humidades, bolores e fungos ainda que não se tenham concretos problemas respiratórios.

Defende ainda o apelante que, por carta datada de 10/01/17, propôs a eliminação definitiva dos problemas e não o fez porque os autores recusaram. Esta afirmação não é séria e raia a litigância de má-fé. Ora, na referida missiva o ré condicionou a definitiva eliminação das “deficiências de construção e de projecto” à concordância de todos os 60 proprietários com o projecto urbanístico (elaborado e em consulta pública) nos termos de uma minuta anexa, unânimidade essa que é, desde logo, difícil de obter. Veja-se que o réu não alega que os autores foram os únicos que não aceitaram a proposta. Acresce que, atento o teor da referida minuta, o réu impôs uma segunda condição, a renúncia a recorrer à via judicial.

Atendendo à data de início dos problemas (Dezembro de 2012), o arrastar da situação durante anos sem que os problemas ficassem definitivamente resolvidos, a data da missiva do réu (10/01/2017) e o seu teor entendemos que nada há a censurar à carta dos autores de fls. 746. Não tem aquela missiva a virtualidade de fazer cessar a mora do credor porque não se pode afirmar que os autores tenham recusado a prestação sem motivo justificado (art. 813º do C.C.).

Concluindo, tendo em atenção que são dois os autores, a gravidade dos danos em causa e o facto de os mesmos se arrastarem, pelo menos há 6 anos, afigura-se-nos equilibrado o valor de € 7.000,00 arbitrado pelo Tribunal recorrido nesta sede. Se é verdade que não devem as indemnizações conduzir a um enriquecimento despropositado do lesado, também não devem corresponder a uma simples esmola ou a um valor meramente simbólico.

Acresce que a jurisprudência tem entendido que, no caso de indemnizações por danos não patrimoniais, estando em causa o critério da equidade, as indemnizações arbitradas apenas devem ser reduzidas quando afrontem manifestamente as regras da boa prudência, do bom senso prático e da criteriosa ponderação das regras da vida (neste sentido vide Ac. da R.C. de 01/02/2012, in www.dgsi.pt), o que não se verifica no caso em apreço.

Por fim, verifica-se igualmente o último pressuposto da responsabilidade civil contratual que é o nexo de causalidade entre o facto ilícito e os danos, sendo que o art. 563º do C.C. prevê a doutrina da causalidade adequada. Ora, é incontestável que a conduta do réu nos termos referidos foi de molde a causar aos autores os mencionados danos não patrimoniais supra referidos.

Assim, a apelação improcede.
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Sumário – 663º nº 7 do C.P.C.:

Numa situação em que os autores, em face dos defeitos que foram sendo detectados e não eliminados na moradia por eles adquirida, durante seis anos não usufruíram plenamente da mesma; sentiram-se defraudados e frustrados com a sua aquisição; sofreram de permanente inquietação, angústia, desgaste físico e psicológico devido aos inúmeros contactos com o réu com vista à sua resolução; tem havido uma inconstância de promessas de reparação; têm adiado o projecto de ter filhos por a moradia não ter condições para uma criança crescer de forma saudável e em que é prejudicial para a saúde do autor viver numa casa com humidades uma vez que sofre de problemas do foro respiratório, afigura-se-nos equilibrada uma indemnização no valor de € 7.000,00 a título de danos não patrimoniais.
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III – Decisão

Pelo exposto, os juízes desta Relação acordam em julgar improcedente a apelação e em confirmar integralmente a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
Guimarães,13/09/2018

(Margarida Almeida Fernandes)
(Margarida Sousa)
(Afonso Cabral de Andrade)