Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
57/18.8T8BCL.G1
Relator: EDUARDO AZEVEDO
Descritores: ÓNUS DE ALEGAÇÃO
CAUSA DE PEDIR
PROCESSO DISCIPLINAR
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
1- Da alegação da causa de pedir, deve poder-se extrair a relação jurídica e a pretensão em conformidade.

2- No articulado motivador do empregador se se procede a simples remissão para o acervo documental que se junta respeitante ao procedimento disciplinar sem a formulação de qualquer factualidade constitutiva do direito ao decretamento da sanção disciplinar como causa então deve-se concluir que existe falta de indicação da causa de pedir.

3- Para o efeito não há lugar ao convite de aperfeiçoamento.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães

José desencadeou a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra X, Ldª.

Foi realizada audiência de partes em cuja acta consta:

“Declarada aberta a presente diligência, pelas 13h55 (uma vez que se aguardou pela Ilustre Mandatária da empregadora), a Mma. Juíza tentou a conciliação das partes, o que não conseguiu, tendo a entidade empregadora declarado entender ser lícito o despedimento levado a cabo, ao passo que o trabalhador manteve a sua intenção de ver declarada a ilicitude.
Posteriormente, a Mma. Juíza proferiu o seguinte:
DESPACHO
Atenta a não conciliação das partes, notifique a entidade empregadora nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 4, do artigo 98º-I, do Código de Processo do Trabalho.
Para audiência de discussão e julgamento designo o próximo dia 12 de Abril de 2018, às 14:00 horas.
Notifique.
***
Do despacho que antecede foram os presentes devidamente notificados, tendo dito ficar bem cientes, após o que foi declarada encerrada a presente audiência/diligência, pelas 14h00m.”.

Declarando apresentar o seu “articulado” a sociedade alegou e requereu:










Nomeadamente, foi junto como documento nº 3 o denominado de processo disciplinar onde consta nota de culpa, a defesa do requerente, relatório e proposta de decisão de instrutora nomeada e carta de comunicação do despedimento com este teor:

Apresentou-se contestação e deduziu-se oposição, com o patrocínio do MºPº.

Alegou-se, além do mais:

30º Chegados aqui, analisado o articulado motivador apresentado, verifica-se que não foi alegado qualquer facto ou factos sobre a motivação do despedimento do autor, isto é, qualquer facto ou factos que integrem a justa causa do despedimento do autor.
31º
O facto de a ré ter dado como reproduzida nota de culpa e o processo disciplinar, mas já não a decisão disciplinar proferida, a qual contem a fundamentação do despedimento do autor, não pode ser considerado como alegação de facto.
(…)
34º
Por isso, há que considerar a ineptidão da petição inicial, revestindo, como vimos, essa natureza o articulado motivador do despedimento.
35º
Não se pode, assim, qualificar essa peça /requerimento como articulado motivado do despedimento, inexistindo este, como tal, nos presentes autos.
36º
Também por essa inexistência/ineptidão, evidente se torna que fica excluída qualquer possibilidade de aperfeiçoamento, designadamente nos termos do artº 27º, al. b), do CPT. Não se pode aperfeiçoar aquilo que não existe.
37º
Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artigos 98º-I nº 4 alínea a) e 98º-J do CPT.
38º
Por isso, há que dar cumprimento de imediato ao disposto no 98º -J nºs 3 e 4 do Código de Processo do Trabalho,
39º
ou seja, declarar a ilicitude do despedimento do autor
(…)
c) por impugnação
40º
Por mera cautela e por dever de patrocínio, impugna-se tudo o alegado no articulado motivador, com excepção do alegado nos artigos 1º, 2º, 3º e 9º.

Pediu-se:

Termos em que deverá ser inepto o articulado motivador da ré e procedente, por provada, a reconvenção e, em consequência:

a) ser declarado ilícito o despedimento do autor;
b) ser a entidade empregadora condenada a pagar-lhe:
b1) €6.750,00 de indemnização por despedimento ilícito, sem prejuízo do montante que resultar à data do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida;
b2) €1.805,79 de retribuições intercalares já vencidas, a que acrescem as que se vencerem até à data do trânsito em julgado da douta sentença que vier a ser proferida;
b3) juros de mora vincendos até integral pagamento.”.

A empregadora respondeu à excepção e à reconvenção, mantendo a sua posição inicial.

Referiu ainda:
;
E requereu:

Em anexo apresentou documento denominado “aperfeiçoamento do articulado do empregador”.

Elaborou-se saneador:

“Atendendo aos pressupostos previstos pelo artº 98º-L, nº 3 do Cód. Proc. Trabalho, vai admitida a reconvenção nestes autos deduzida.

(…)
Da excepção de ineptidão do articulado motivador do despedimento José instaurou a presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com processo especial, contra X, Ldª, através do formulário a que se alude no artº 98.º n.º 1 do Cód. Proc. Trabalho, alegando que foi despedido pela Ré em 20 de Dezembro de 2017.

Frustrada a tentativa de conciliação realizada em audiência das partes, foi a Ré notificada para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas.

Veio, então, a Ré apresentar a peça de fls. 26 e segs..

Por sua vez, veio o Autor apresentar contestação, nos termos do art.º 98-L, n.º 1, do Cód. Proc. Trabalho e deduzir reconvenção, nos termos do nº 3 do citado normativo. Naquela sede veio, antes do mais, arguir a excepção de ineptidão do articulado motivador, defendendo, em suma, que, assumindo aquele a natureza de uma petição inicial, onde o empregador deverá motivar o despedimento, apresentar as provas respectivas e formular o correspondente pedido, designadamente a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento, nele deve o empregador descrever os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção e formular o pedido, de acordo com a previsão das als. d) e e) do nº 1 do artº 467º do Cód. Proc. Civil; naqueles termos, analisado o articulado motivador apresentado, verifica-se que não foi alegado qualquer facto ou factos sobre a motivação do despedimento do autor, isto é, qualquer facto ou factos que integrem a justa causa do despedimento do autor; sendo que o facto de a ré ter dado como reproduzida nota de culpa e o processo disciplinar, mas já não a decisão disciplinar proferida, a qual contem a fundamentação do despedimento do autor, não pode ser considerado como alegação de facto.

Termina, defendendo impor-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artºs 98º-I nº 4, al. a) e 98º-J do Cód. Proc. Trabalho, devendo por isso dar-se cumprimento de imediato ao disposto nos nºs 3 e 4 do último dos dispositivos, ou seja, declarar a ilicitude do despedimento do autor.

Em sede de resposta, veio a Ré, por um lado, defender a inatendibilidade da excepção deduzida, por outro, pugnar pela respectiva procedência e, por fim e sem prejuízo, apresentar articulado motivador aperfeiçoado.

Quid iuris?

Seguindo de perto o Ac. TRC de 28/02/2013 (Proc. 485/12.2TTCBR.C1, Relator Ramalho Pinto, disponível em www.dgsi.pt), sumaria aquele que:

“I – Com a revisão do CPT/2009 e com a instituição da nova acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, agora o trabalhador terá apenas de apresentar um requerimento, feito em formulário electrónico, comunicando o seu despedimento e identificando o empregador, conforme o disposto no artº 98º-D.
II – Nesta fase inicial, embora dando impulso processual à impugnação do despedimento, fica o trabalhador dispensado de fundamentar a sua posição ou apresentar qualquer tipo de prova.
III – Passa a competir ao empregador o ónus de alegar e provar os factos que estiveram subjacentes ao despedimento e defesa da sua validade, apresentando o articulado motivador do despedimento a que se refere o artº 98º-J.
IV – Ou seja, o empregador passa a assumir processualmente uma posição muito semelhante à de um autor, apesar de ser a parte contra a qual é instaurada a acção, na medida em que lhe compete apresentar, junto do tribunal, um articulado que motive o despedimento, para o que oferecerá todas as provas, sendo depois o trabalhador notificado para responder, querendo, no prazo de 15 dias.
V – Esse articulado motivador assume claramente a natureza de uma petição inicial, onde o empregador deverá motivar o despedimento, apresentar as provas respectivas e formular o correspondente pedido, designadamente a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento, sob pena de essa “petição” ser inepta – artºs 193º, nº 2, al. a) e 467º, nº 1, als. d) e e) do CPC.”.

Ora, e a petição será inepta quando “falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir” - al. a) do nº 2 do artº 186º do Cód. Proc. Civil.

A petição inicial, como articulado através do qual o autor propõe a acção, constitui a peça fundamental de todo o processo, delimitando o objecto da causa e conduzindo a certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito e dos fundamentos respectivos, nela devendo o autor expor os fundamentos da acção e concluir pela formulação do pedido – artº 552º, nº 1, als. d) e e) do Cód. Proc. Civil. Na petição inicial, o autor deve expor a causa de pedir – acto jurídico (simples ou complexo, mas sempre concreto) donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer – e deve indicar o direito para que solicita ou requer tutela judicial e o efeito jurídico pretendido.

Importa, porém, não pode confundir-se petição inepta com petição simplesmente deficiente ou insuficiente, casos em que se deverá o tribunal socorrer-se da figura do convite ao aperfeiçoamento.

Compulsados os autos, constata-se que a entidade empregadora, efectivamente, no articulado motivador de fls. 26 e segs., refere que “no dia 7 de Novembro de 2017 (…) remeteu ao A. nota de culpa, de que se junta cópia e dá por reproduzida” e que “concluída a instrução, foram considerados provados (…) todos os factos constantes da nota de culpa”.

Importa como tal aferir se tal será bastante, como sustenta a mesma, para que se entenda cumprido o ónus imposto pelos referidos artigos e caso não o seja se poderá ainda assim o Tribunal decidir no sentido do aperfeiçoamento nos termos propugnados.
Reitere-se que resulta da formulação ínsita no referido artº 98º-I nº 4 al. a) do Cód. Proc.
Trabalho, que o legislador impôs ao empregador, não apenas a junção do procedimento disciplinar mas igualmente que o mesmo motivasse o despedimento mediante a apresentação de um articulado.

Daqui decorre que o legislador impôs que através do referido articulado a entidade empregadora expusesse os fundamentos de facto e de direito da acção no sentido da declaração da licitude do despedimento; sem que se possa entender o cumprimento de tal ónus pela mera junção de requerimento dando por reproduzidos os factos constantes do despedimento disciplinar ou da nota de culpa, como aquele que foi junto a fls. 26 e segs.

De resto, caso o legislador se bastasse com a junção do procedimento disciplinar, não teria imposto igualmente a necessidade de junção de articulado motivando o despedimento.

Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artºs 98º-I nº 4 al. a) e 98º-J do Cód. Proc. Trabalho.

Por outro lado, cumpre ainda concluir que está vedado ao Tribunal proferir qualquer despacho em ordem ao aperfeiçoamento do referido requerimento, ou de admissão do articulado apresentado pela entidade empregadora entretanto com essa finalidade, ao abrigo do disposto no artº 27º al. b) do Cód. Proc. Trabalho e 590º, nº 2, al. b) do Cód. Proc. Civil, por remissão dos artºs 61º nº 1 e 98º-M do Cód. Proc. Trabalho. Isto porque tal aperfeiçoamento implica, em termos mínimos, que haja algo a aperfeiçoar, designadamente quando deixem de ser alegados alguns factos com relevo para a boa decisão da causa e não nos casos em que inexiste qualquer facto articulado, como a situação em apreço nos autos, em tudo equiparada à ineptidão prevista no artigo 186º do Cód. Proc. Civil, face à total ausência de factos motivando as razões que presidiram ao despedimento e susceptíveis de levar a conclusão da sua licitude.

Tudo para concluir não assistir razão à entidade empregadora e que como tal haverá que dar cumprimento de imediato ao disposto no 98º-J nºs 3 e 4 do Cód. Proc. Trabalho.

Pelos fundamentos expostos, declara-se ilícito o despedimento do trabalhador José efectuado pela entidade empregadora X, Lda. e em consequência, na procedência da reconvenção nos autos deduzida, condena-se esta última a pagar ao primeiro:

i) Uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades auferidas pelo trabalhador por cada ano completo ou fracção de antiguidade da mesma na entidade empregadora até ao trânsito em julgado da presente decisão e nunca inferior a três meses;
ii) As retribuições que o trabalhador deixou de auferir da entidade empregadora desde a data do seu despedimento e até ao trânsito em julgado da presente decisão.
Custas da acção pela entidade empregadora.
Valor da acção: Nos termos do artº 12º, nº 1, al. e) do RCP, o previsto no nº 1 da tabela I-B.”.

A empregadora recorreu e concluiu:

1. A apelante considera, que a Meritíssima Juíza a quo errou na sua sentença, ao considerar ilícito o despedimento do trabalhador, tendo baseado a sua decisão numa suposta ineptidão do articulado motivador do despedimento do trabalhador, tendo o Tribunal fundamentado a sua pretensão do seguinte modo: “Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artºs 98º-I nº 4 al. a) e 98º-J do Cód. Proc. Trabalho.”
Parece-nos que o Tribunal baseou a sua decisão num suposto “requerimento” que a apelante nunca juntou, descurando por complete o articulado motivador do despedimento junto aos autos.
2. Passando a competir ao empregador o ónus de alegar e provar os factos que estiveram subjacentes ao despedimento e defesa da sua validade, apresentando o articulado motivador do despedimento a que se refere o artº 98º-J, e assumindo esse articulado motivador claramente a natureza de uma petição inicial, onde o empregador deverá motivar o despedimento, apresentar as provas respetivas, e estando perante uma petição inicial deficiente, incompleta, no que concerne à descrição dos factos constitutivos do direito a que se arroga, em que não falta nem é ininteligível a causa de pedir, deveria o juiz ter formulado o convite de aperfeiçoamento previsto no artigo 590.º, n.º 4, do CPC.
3. Retranscrever os mais de 30 factos constantes da NC, mas também constantes do Relatório Final e consequente Decisão proferida no âmbito do processo disciplinar, que foram devidamente remetidos ao Trabalhador, no prazo legal, e posteriormente ao Tribunal, foi considerado pela apelante como uma formalidade desnecessária e possivelmente dilatória, tendo em conta as limitações de MB a que o sistema CITIUS obriga e não descurando, nunca, que o Tribunal não poderia em momento algum, não tomar conhecimento dos factos, estando todos os documentos/peças processuais, juntos num único documento digital.
4. Seguindo a linha de raciocínio que equipara o Articulado do Empregador a uma Petição Inicial, a apelante cumpriu com o disposto no artigo 522.º do CPC descrevendo: “os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção e formulando o pedido – als. d) e e) do n.º1 .
5. O actual artigo 552.º al. d) e e) tem a seguinte redacção: “d) Expor os factos essenciais que constituem causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção; e) Formular o pedido.”, visando a redacção do presente artigo a aproximação ao princípio da verdade material em detrimento da formal.
6. Sucede que, o Articulado do Empregador vem dividido em 4 partes: A- Os Factos; B- Os Factos de Direito; C- O Pedido e D- O requerimento Probatório - cumprindo com os requisitos previstos no 552.º CPC.
7. Porém, e pelo exposto, tendo em conta a agilização formal e os condicionamentos de entregas eletrónicas, a apelante no seu articulado do empregador, deu por provados os factos constantes da NC (art.7.º do articulado do empregador), tendo dado a integralidade do doc. 3, que inclui todo o Processo inclusive o Relatório de Decisão e consequente Decisão de Despedimento como reproduzidos (art 4.º do articulado do empregador) e seguindo os mesmos num único documento digital, que se remeteu para o Tribunal, juntamente com o Articulado, Processo Disciplinar e Provas (reforçamos).
8. O Pedido formulado no articulado do Empregador advém directamente do narrado nos factos e factos de direito expostos pela ora apelante no articulado em questão. (cfr “A- OS FACTOS”” e “B- QUANTO AO DIREITO” constantes do Articulado do Empregador).
9. O Tribunal referiu na sentença: “sendo que o facto de a ré ter dado como reproduzida nota de culpa e o processo disciplinar, já não a decisão disciplinar proferida, a qual contem a fundamentação do despedimento do autor, não pode ser considerado como alegação de facto.”
10. Na verdade e como exposto acima, a apelante deu igualmente como reproduzidos o Relatório de Decisão e Decisão no artigo 4.º do seu Articulado e reforçou a ideia de terem sido os factos provados constantes na NC (art. 7.º do Articulado) que levaram à decisão de despedimento por Justa Causa do Trabalhador - cfr artigo 8.º do Articulado.
11. Posto isto, ressalva a apelante, que se remeteram os factos dados como provados para Documento junto, por uma simples questão de adequação formal.
12. Na verdade, poderemos chamar a este Articulado do Empregador, um Articulado “deficiente” mas nunca inexistente!
13. A decisão da 1.ª instância teve por base Jurisprudência distinta do caso em apreço - Ac. TRC de 28/02/2013 (Proc. 485/12.2TTCBR.C1., daí a Meritíssima Juíza a quo ter, possivelmente, cometido o lapso de intitular o Articulado do Empregador apresentado pela R., ora apelante, de Requerimento e não de Articulado do Empregador, como o é efectivamente.
14. Analisando o acórdão em questão, com rigor, será fácil depreender que se no caso supra indicado a R. empregadora em causa, tivesse junto um Articulado do Empregador e não apenas um simples requerimento a remeter para o Processo disciplinar, ter-lhe-ia sido deferida a possibilidade de aperfeiçoamento.
15. Em momento algum e salvo devido respeito, se poderá dizer que inexiste o Articulado do Empregador, ou chamar o mesmo de “Requerimento”, sendo desprovida de qualquer sentido a parte da Sentença ora recorrida que afirma: “Reitere-se que resulta da formulação ínsita no referido artº 98º-I nº 4 al. a) do Cód. Proc. Trabalho, que o legislador impôs ao empregador, não apenas a junção do procedimento disciplinar mas igualmente que o mesmo motivasse o despedimento mediante a apresentação de um articulado. Daqui decorre que o legislador impôs que através do referido articulado a entidade empregadora expusesse os fundamentos de facto e de direito da acção no sentido da declaração da licitude do despedimento; sem que se possa entender o cumprimento de tal ónus pela mera junção de requerimento dando por reproduzidos os factos constantes do despedimento disciplinar ou da nota de culpa, como aquele que foi junto (…)”
16. Em caso algum poderemos afirmar que no caso em apreço existe uma ineptidão do articulado por ininteligibilidade da causa de pedir, no máximo poderemos dizer que o que existe é uma descrição dos factos constitutivos por remissão, que poderá ser entendida por alguns como uma omissão, mas em momento algum, se pode declarar que o A. não compreendeu os factos dos quais era acusado ou que os mesmos não são claros.
17. E mesmo que o Tribunal não concorde com o supra exposto, a verdade é que no que toca a alegação de factos por referência a documentos simultaneamente apresentados, a Jurisprudência mostra-se unânime e consistente.
18. Nas palavras de A. Abrantes Geraldes (Temas da Reforma do Processo Civil, I Vol., Coimbra, 1999, p. 201 - nota 353) que “se ao abrigo do disposto no CPC de 1961, caracterizado por um maior rigor formal, já era maioritária a tese que admitia a alegação dos factos por referência a documentos simultaneamente apresentados com o respectivo articulado, a nova filosofia inerente aos princípios orientadores da reforma processual e a concretização normativa a que foram sujeitos torna ainda mais defensável a conclusão acerca da admissibilidade da alegação por remissão para documentos, desde que destes resulte qual o facto neles demonstrado que se procura invocar.”, sendo o mesmo acompanhado pela Jurisprudência (cfr. a título de exemplo, acórdão do STJ de 13 de Maio de 1997, BMJ n.º 467, p.510).
19. As afirmações contidas nos documentos juntos com os articulados, na medida em que podem completar as alegações neles contidas, devem, logicamente, ser consideradas como compreendidas nesses articulados.” (Ac. STJ, de 27.5.2010).
20. A jurisprudência tem vindo a defender que a insuficiência ou incompletude do concreto factualismo consubstanciador da causa petendi, não fulmina, em termos apriorísticos e desde logo formais, a petição de inepta, apenas podendo contender, em termos substanciais, com a atendibilidade do pedido pois verdadeiramente só haverá falta de indicação da causa de pedir quando, “de todo em todo, falte a indicação dos factos invocados para sustentar a pretensão submetida a juízo, ou tais factos sejam expostos de modo tal que seja impossível ou, pelo menos, razoavelmente inexigível, determinar qual o pedido e a causa de pedir”– cfr. Acs. do STJ de 30.04.2003, 31.01.2007 e 26.03.2015, p.03B560, 06A4150 e 6500/07.4TBBRG.G2,S2, disponível in www.dgsi.pt.
21. O articulado apresentado pelo recorrente, em consonância com os documentos juntos, evidenciam um quadro factual mínimo que justifica o prosseguimento do processo ou, caso assim não se entendesse, pelo menos justificaria um convite ao aperfeiçoamento.
22. Os documentos juntos com a petição devem considerar-se parte integrante desta e por isso susceptíveis de suprir as lacunas de que a petição possa enfermar, neste sentido - Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 27-02-1970 (na J.R. ano 16º, p. 86); mas também Acórdão do STJ de 02-07-1991 (Processo 080329, Relator Simões Ventura), Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14-10-2008 (Processo 2377/07.8TBVIS.C1, Relator Virgílio Mateus), e, em idêntica opinião, também os Acórdãos de 01.04.2009 (P.236/08.6TBLSA.C1) e de 26.01.2010 (Pº 1801/09.7TBCBR.C1).
23. A causa de pedir é assim a matéria de facto alegada, quer seja narrada no articulado, quer conste dos documentos juntos com o articulado e para os quais esta remeta.
24. O Quid essencial aduzido que determinou a ineptidão do articulado do empregador – falta dos factos que levaram ao despedimento do Autor – estão bem patentes ao longo do articulado apresentado pela apelante mas também dos documentos juntos de onde emana a pretensão deduzida, ou seja, a causa patendi, e para os quais a apelante remeteu expressamente com referência á reprodução integral do seu teor para os devidos efeitos legais.
25. De acordo com o disposto no nº 3, do art. 186º do CPC - mesmo que A., na contestação, invoque a falta ou ininteligibilidade do pedido, tal invocação não é atendível se se concluir que ele, não obstante as deficiências invocadas, inteligiu o feito que o demandante introduziu em juízo e está consciente das consequências que dele pretende retirar.
26. Na verdade, dissecando o articulado apresentado pela R. ora apelante, a conclusão a retirar terá forçosamente de ser a de que o Articulado do Empregador é suficientemente explícito e perceptível para permitir a qualquer declaratário normal colocado na posição do real declaratário (art. 236º do Código Civil), ou a um diligente bom pai de família, compreender os contornos da relação material controvertida. – Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14-07-2017, Processo 10327/15.1T8CBR.C1.
27. Ora, no caso dos presentes autos, o A. invoca a referida excepção que os beneficia e, por outro lado, contesta e ainda deduz reconvenção, o que é demonstrativo da interpretação do articulado do empregador, causa de pedir e pedido.
28. Assim deveremos concluir pela cabal compreensão por parte dos A. evidenciada na contestação, sendo suficiente ver que não tiveram dificuldade em defender-se quer por excepção quer por impugnação, deste modo assegurando um efectivo e leal contraditório - a compreensão por parte do A. é impeditiva do vício da ineptidão, formal e expressamente, precisamente por tê-la interpretado convenientemente.
29. Em denegação do direito do recorrente, nem o Tribunal a quo atendeu à jurisprudência nacional relevante que considera que mesmo existindo ineptidão da petição inicial (o que apenas por hipótese académica de admite), nos termos do art. 186.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, o Tribunal a quo deve considerar forçosamente sanada, prosseguindo os ulteriores termos do processo. Este tem sido o entendimento perfilhado pelos Tribunais Superiores desde sempre pelo que, a título meramente exemplificativo, se destacaram diversos Acórdãos, nomeadamente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-11-1988 (Processo 076956, Relator Pinto Ferreira) – disponível in www.dgsi.pt -, em cujo sumário podemos ler que: (…) III - Ocorre a sanação do vício de ineptidão da petição inicial consistente na falta ou ininteligibilidade da causa de pedir desde que o réu, não obstante arguir o vício, conteste e se verifique que interpretou correctamente o pensamento do autor expresso na petição, valorando-se, para o efeito, a aceitação implícita do autor dessa interpretação decorrente do teor da réplica (do artigo 193º, n. 3 do Código de Processo Civil de 1967) [actual art. 186º, n.º 3 do CPC].
30. Sobre esta questão em particular também o Supremo Tribunal de Justiça se debruçou, nomeadamente em Acórdão datado de 19-12-1989 (Processo 078268, Relator José Domingues) - “Desde que haja contestação, o juiz não pode, por força do disposto no nº 3 do artigo 193º do Código de Processo Civil, julgar inepta a petição inicial no despacho saneador, por falta de indicação da causa de pedir, consequentemente, anulando todo o processo, se chegar à conclusão que o Réu, na contestação, interpretou correctamente a dita petição e isto quer o mesmo Réu haja ou não suscitado a questão da ineptidão.”
31. Neste sentido vai a Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que infirma não ser inepta a petição inicial por falta de causa de pedir se a ré, (no caso em apreço, a A.) a interpretou tão adequadamente que se defende por exceção e por impugnação e reconveio, e apenas existe certa complexidade por haver que conjugar, em termos de fundo, articulados com documentos conexos e pedidos cruzados.
Assim,
32. Enxergando-se irregularidade, insuficiência ou imprecisão na exposição ou concretização de certos factos necessários à procedência da ação, tal será sempre sanável através do convite ao aperfeiçoamento, nos termos do actual art. 590º, n.º 3 e 4 do CPC.
33. Com a Reforma processual de 2013 passou a entende-se que a falta de pressupostos processuais é sanável, com base no poder-dever de prolação de decisão de aperfeiçoamento do Juiz que decorre das exigências constitucionais de um processo justo e equitativo (artigo 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa) e do dever de gestão processual consagrado no artº 6º do CPC, pelo que fica claro que o Juiz está vinculado a gerir bem o processo, concretizado, por exemplo no artigo 590º do CPC, devendo providenciar pelo suprimento das excepções dilatórias, pelo aperfeiçoamento dos articulados e inclusive determinar a junção de documentos para conhecimento de excepções ou do seu mérito.
34. Aqui chegados, entendemos não poder manter-se o decidido no que concerne à ineptidão do articulado do empregador, existindo factualismo controvertido no articulado apresentado pela R., ora apelante, e cabalmente interpretado pelo A. evidenciado no exercício do contraditório quer por exceção quer por impugnação, pelo que importa que os autos prosseguiam os seus termos normais, sem prejuízo de convite à parte para suprimento de deficiências apontadas pelo Tribunal a quo, numa efectiva afirmação da prevalência da decisão de mérito, sobre decisões meramente formais.
35. O despacho proferido pelo Tribunal a quo violou as disposições legais dos artigos 18.º, 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 9º e 236º do Código Civil, e artigos 6º, n.º 1 e 2, 186º, n.º 1, 2, al a) e 3, e 590º, n.º 2, 3 e 4 do Código de Processo Civil.”.

Em síntese conclusiva termina:

“deve ser concedido provimento ao presente recurso, julgando-o totalmente procedente e, em consequência, revogar-se a decisão proferida, assim como revogar a procedência da Reconvenção em autos deduzida, substituindo-a por outra decisão em que se julgue não verificada a ineptidão do articulado do empregador e a consequente ilicitude do despedimento, determinando-se o prosseguimento da causa, e se necessário, com convite à R., ora apelante, no sentido do aperfeiçoamento da matéria de facto inicialmente alegada”.

Contra-alegou-se:

Concluiu-se:

- na petição inicial o autor deve articular os factos nucleares concretos, objectivos e individualizados que constituem a sua causa ou causas de pedir e sustentar juridicamente em termos lógicos, suficientes e adequados os pedidos que formula na acção;
- a exigência de alegação dos factos constituintes da causa de pedir no texto da petição não se satisfaz com a simples junção de documentos em que tais factos possam eventualmente ser mencionados ou de onde se possam extrair, desde que não seja feita menção de tais factos na petição inicial;
- só perante uma petição inicial deficiente, incompleta, imprecisa, no que diz respeito à descrição dos factos constitutivos do direito a que se arroga o autor, em que não falta nem é ininteligível a causa de pedir, deve o juiz convidar a respectiva parte ao seu aperfeiçoamento;
- nada, absolutamente nada, é alegado pela ré quanto aos comportamentos infractores do autor que determinaram a aplicação da sanção disciplinar do despedimento;
- pelo que não há lugar ao convite para seu aperfeiçoamento do articulado motivador do despedimento;
- a consequência para a falta de alegação dos factos motivadores do despedimento é a que se mostra prevista no n.º 3 do artigo 98.º-J do Código de Processo do Trabalho, que foi devidamente aplicada pelo tribunal recorrido.”.
Termina-se pretendendo a negação do provimento.

Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.

Indagar-se-á se existe ineptidão do articulado motivador do despedimento e se assim não for se se deveria formular convite ao aperfeiçoamento.
Está assente o que objectivamente resulta deste relatório.

Vejamos.

Antes o mais constata-se que é anódina para decisão do objecto do recurso a alegação das eventuais vicissitudes da audiência de partes e o seu relacionamento com a prática de irregularidade.
A recorrente nem sequer a arguiu na forma e no tempo certo, não se pode afirmar que o decidido deu cobertura à ocorrência de acto ou omissão em desacerto processual que daí pudesse ter resultado e, a haver irregularidade, não se pode admitir que influísse no exame e na decisão da causa (artºs 195º e 199º do CPC).
Registe-se também que ambas as partes, tal como o tribunal a quo, equiparam o articulado a que aludem os artºs 98º,-G, 98º-I, nº 4, alª a), e 98º-J do CPT a uma petição inicial.

Não se enquadrando completamente na estrutura e conceptualização do direito à acção dos nossos regimes adjectivos tem de se admitir a analogia.

E ainda que a sua natureza partilhe a sua razão de ser com o requerimento em formulário previsto no artº 98º-C mas em que este tem por função apenas desencadear o processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e de permitir o encadeamento de acção declarativa de simples apreciação (artº 10º do CPC) a que corresponde a possibilidade do empregador apresentar esse articulado.

Mal ou bem foi assim desenhada este processo especial sem se olvidar que apresentado o articulado segue-se a denominada contestação (artº 98º-L do CPT) com consequências legais idênticas à da sua congénere do processo comum (revelia, reconvenção, resposta, entre outras) e, na mesma linha, prosseguem os termos posteriores aos articulados (artº 98º-M do CPT).

Neste sentido exprimiu-se Albino Batista (A nova acção de impugnação de despedimento, Coimbra Editora, 89 e 91), embora de forma critica referindo que os processualistas “sentem-se, agora, ao que tudo indica, obrigados a repensar os seus quadros dogmáticos e a rever as suas obras”.

Por seu turno, a referenciação no despacho em crise do articulado da recorrente como requerimento em nada o diminui.

Ao fim ao cabo é o modo comum como as partes expõe os sucessivos motivos da sua intervenção processual terminando, ou não, em consonância, com a concretização de um fim ou pretensão.
De resto, a noção advinda do artº 147º do CPC necessariamente não se limita aos articulados iniciais.

Outrossim não se retira do despacho sob censura que apenas por causa da denominação empregue ficasse diminuída a valia jurídica do acto praticado pela recorrente sendo certo que não se deixa de designar também o requerimento como articulado motivador: “Compulsados os autos, constata-se que a entidade empregadora, efectivamente, no articulado motivador de fls. 26 e segs., refere que “no dia 7 de Novembro de 2017 (…) remeteu ao A. nota de culpa, de que se junta cópia e dá por reproduzida” e que “concluída a instrução, foram considerados provados (…) todos os factos constantes da nota de culpa”.”.

O que se tratou foi, mas sem se considerar o articulado como inexistente, de considerar a situação processual equiparável à prevista no artº 98º-J, nº 3 do CPT.

Aqui chegados.

Segundo a dita equiparação do articulado em causa com a petição inicial decidiu-se que o destes autos padecia de ineptidão por omissão da causa de pedir.
Foi transcrito no relatório ss termos desse articulado.

Para além da relação laboral estabelecida constata-se que a recorrente não enuncia no respectivo texto qualquer factualidade constitutiva do seu direito a decretar a sanção disciplinar (essencial, instrumental ou complementar) e, assim, pela qual tivesse entendido instaurar o respectivo procedimento disciplinar e, depois, cominar o recorrido com o despedimento.

Nem ao pretender enquadrar a sanção aplicada no direito substantivo resume qualquer factualidade de forma categorial sendo certo que nem a indicação abstracta dos deveres do trabalhador aí previstos logram validamente colmatar a necessidade da particularização de tal factualidade.
A recorrente unicamente dá por reproduzido o procedimento disciplinar no seu conjunto e a nota de culpa.
Acresce, referindo que foram dados como provados todos os factos constantes da nota de culpa tão pouco menciona ou se remete para a decisão em si de despedimento que além do mais deve ser fundamentada, constar de documento escrito e ser comunicada, como em tudo se determina no artº 357º do CT.
E apesar de um dos documentos juntos como fazendo parte do procedimento ser a comunicação da sanção e nele referir-se que a direcção da recorrente deliberou nesse sentido, bem como “em cumprimento dos normativos em vigor, remetemos em anexo cópia do relatório final e da decisão fundamentada proferida no âmbito do procedimento disciplinar”, na verdade, sem prejuízo até do disposto no artº 98º-J, nº 3 do CPT, para além da nota de culpa apenas se constata a junção de relatório e proposta de decisão subscrita, como aí se escreve, pela instrutora nomeada.

Daí que nem seja correcto afirmar que “a apelante deu igualmente como reproduzidos o Relatório de Decisão e Decisão de Despedimento, (todos constantes do documento 3 junto aos autos pela R.), no artigo 4.º do seu Articulado e reforçou a ideia de terem sido os factos provados constantes da NC (art. 7.º) que levaram à decisão de despedimento por Justa Causa do Trabalhador - cfr artigo 8.º do Articulado.”.

Ora, a causa de pedir são factos. Da sua alegação extraem-se a relação jurídica e a pretensão em conformidade. Mas se daqueles não se poder deduzir uma unidade individualizável não se pode concluir que se alegou a causa de pedir.

Sem mais, se da simples remissão para o acervo documental que se junta é alcançável a utilidade probatória já não é susceptível de satisfazer esse desiderato para o acesso à tutela judicial de forma equitativa e com garantias processuais se a mesma não foi ancorada na alegação de matéria fáctica que serve de complemento, ou seja a única forma de se afirmar que “As afirmações contidas nos documentos juntos com os articulados, na medida em que podem completar as alegações neles contidas, devem, logicamente, ser consideradas como compreendidas nesses articulados.” (Ac. STJ, de 27.5.2010)”.

Face a este conspecto, portanto, não se vislumbra como deixar de concordar com o decidido no concerne à conclusão de que não foi alegada causa de pedir e nestas circunstância em conformidade não se dever formular o convite ao aperfeiçoamento:

“Ora, e a petição será inepta quando “falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir” - al. a) do nº 2 do artº 186º do Cód. Proc. Civil.
A petição inicial, como articulado através do qual o autor propõe a acção, constitui a peça fundamental de todo o processo, delimitando o objecto da causa e conduzindo a certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito e dos fundamentos respectivos, nela devendo o autor expor os fundamentos da acção e concluir pela formulação do pedido – artº 552º, nº 1, als. d) e e) do Cód. Proc. Civil. Na petição inicial, o autor deve expor a causa de pedir – acto jurídico (simples ou complexo, mas sempre concreto) donde emerge o direito que o autor invoca e pretende fazer valer – e deve indicar o direito para que solicita ou requer tutela judicial e o efeito jurídico pretendido.

Importa, porém, não pode confundir-se petição inepta com petição simplesmente deficiente ou insuficiente, casos em que se deverá o tribunal socorrer-se da figura do convite ao aperfeiçoamento.

Compulsados os autos, constata-se que a entidade empregadora, efectivamente, no articulado motivador de fls. 26 e segs., refere que “no dia 7 de Novembro de 2017 (…) remeteu ao A. nota de culpa, de que se junta cópia e dá por reproduzida” e que “concluída a instrução, foram considerados provados (…) todos os factos constantes da nota de culpa”.

Importa como tal aferir se tal será bastante, como sustenta a mesma, para que se entenda cumprido o ónus imposto pelos referidos artigos e caso não o seja se poderá ainda assim o Tribunal decidir no sentido do aperfeiçoamento nos termos propugnados.

Reitere-se que resulta da formulação ínsita no referido artº 98º-I nº 4 al. a) do Cód. Proc. Trabalho, que o legislador impôs ao empregador, não apenas a junção do procedimento disciplinar mas igualmente que o mesmo motivasse o despedimento mediante a apresentação de um articulado.

Daqui decorre que o legislador impôs que através do referido articulado a entidade empregadora expusesse os fundamentos de facto e de direito da acção no sentido da declaração da licitude do despedimento; sem que se possa entender o cumprimento de tal ónus pela mera junção de requerimento dando por reproduzidos os factos constantes do despedimento disciplinar ou da nota de culpa, como aquele que foi junto a fls. 26 e segs.

De resto, caso o legislador se bastasse com a junção do procedimento disciplinar, não teria imposto igualmente a necessidade de junção de articulado motivando o despedimento.

Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artºs 98º-I nº 4 al. a) e 98º-J do Cód. Proc. Trabalho.
Por outro lado, cumpre ainda concluir que está vedado ao Tribunal proferir qualquer despacho em ordem ao aperfeiçoamento do referido requerimento, ou de admissão do articulado apresentado pela entidade empregadora entretanto com essa finalidade, ao abrigo do disposto no artº 27º al. b) do Cód. Proc. Trabalho e 590º, nº 2, al. b) do Cód. Proc. Civil, por remissão dos artºs 61º nº 1 e 98º-M do Cód. Proc. Trabalho. Isto porque tal aperfeiçoamento implica, em termos mínimos, que haja algo a aperfeiçoar, designadamente quando deixem de ser alegados alguns factos com relevo para a boa decisão da causa e não nos casos em que inexiste qualquer facto articulado, como a situação em apreço nos autos, em tudo equiparada à ineptidão prevista no artigo 186º do Cód. Proc. Civil, face à total ausência de factos motivando as razões que presidiram ao despedimento e susceptíveis de levar a conclusão da sua licitude.

Tudo para concluir não assistir razão à entidade empregadora e que como tal haverá que dar cumprimento de imediato ao disposto no 98º-J nºs 3 e 4 do Cód. Proc. Trabalho.”.

A própria recorrente admite a insuficiência da sua alegação em razão da causa de pedir que devia explanar e daí surgir o dever de ser convidada ao aperfeiçoamento.

Admite igualmente que apresentou o articulado em tais termos e, ao fim ao cabo, violou de forma intencional o disposto no artº 98º-I, nº 4, alª a), do CPT: “Retranscrever os mais de 30 factos constantes da NC, do Relatório Final e consequente Decisão Fundamentada proferida no âmbito do processo disciplinar, que foram devidamente remetidos ao Trabalhador, no prazo legal, e posteriormente ao Tribunal, foi considerado pela apelante como uma formalidade desnecessária e possivelmente dilatória, tendo em conta as limitações de MB a que o sistema CITIUS obriga e não descurando, nunca, que o Tribunal não poderia em momento algum, não tomar conhecimento dos factos, estando todos os documentos/peças processuais, juntos num único documento digital.”; e “Porém, e pelo exposto acima, tendo em conta a agilização formal e os condicionamentos de entregas electrónicas, a apelante no seu articulado do empregador, deu por provados os factos constantes da NC (art.7.º do articulado do empregador), tendo dado a integralidade do doc. 3, que inclui todo o Processo, inclusive o Relatório de Decisão e consequente Decisão De Despedimento como reproduzidos (art 4.º do articulado do empregador), tendo seguido os mesmos num único documento digital, que se remeteu para o Tribunal, juntamente com o Articulado, Processo Disciplinar e Provas (reforçamos).”.

Para justificar a não alegação dos “factos essenciais que constituem causa de pedir” (artº 552º, nº 1, alª d), do CPC invoca ainda a circunstância do empregador “de acordo com o artigo 98.ºJ n.º 1 (…) apenas pode invocar factos e fundamentos da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”.

De todo isto não é correcto.

Para além de qualquer defesa antecipada poderia alegar por exemplo no sentido da incompetência do tribunal, da ilegitimidade da parte, da caducidade da acção ou da exclusão da reintegração. (98º-J, nº 2 do CPT).

Temos necessariamente que concluir que a recorrente sempre estava obrigada a cumprir o dispositivo legal já que também quer a plataforma electrónica quer a legislação processual (artºs 144º, máxime nº4 do CPC e 10º da Portaria 280/2013, de 26.08) têm soluções cabais para que as partes não fiquem impedidas em qualquer circunstância da prática legítima dos seus actos processuais.

Ao caso não pode ser chamado o disposto no artº 186º, nº 3 do CPC:

“1 - É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial.
2 - Diz-se inepta a petição:
a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;
(…)
3 - Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial.
(…)”.
Tão pouco trazidos à colação os preceitos da interpretação e integração das declarações negociais (artºs 236º a 239º do CC).
Desde logo por que se trata de norma que salvaguarda apenas a incolumidade da petição inicial face a situações processuais em que qualquer dúvida assacada em tais termos pela parte contrária não tem razão de ser na medida estava ao alcance desta a respectiva dilucidação.
O que não pode ser o caso na medida em que estamos perante a ausência radical de factualidade.
Depois, na oposição o recorrido unicamente mencionou quanto à factualidade que poderia ser causa directa do despedimento: “Por mera cautela e por dever de patrocínio, impugna-se tudo o alegado no articulado motivador, com excepção do alegado nos artigos 1º, 2º, 3º e 9º.”. A reconvenção traduz-se na mera formalização de pretensão em oposição ao formalismo do articulado da recorrente. E o ocorrido aquando a realização do processo disciplinar está fora do domínio que a norma pretende salvaguardar.
Por fim, não se vislumbra como aplicação do direito nos termos em que se norteou o tribunal a quo constitua uma violação dos artºs 18º e 20º, maxime nº 4, da CRP.
A recorrente acaba por não concretizar em que termos é que o entendimento da lei por esse tribunal violou tais preceitos.
O que se pode entender por processo justo ou equitativo (em que há imposição de meios de defesa idênticos às partes controvertidas e direito de cada parte se pronunciar sobre todas as questões relevantes para a decisão da causa em questão) foi integralmente respeitado no caso. Acontece é que não se observaram as regras processuais para que o articulado fosse aceite ainda que por meio de convite ao aperfeiçoamento.
Pelo exposto é improcedente o recurso devendo ser confirmada a sentença.

Sumário, da única responsabilidade do relator

1- Da alegação da causa de pedir, deve poder-se extrair a relação jurídica e a pretensão em conformidade.
2- No articulado motivador do empregador se se procede a simples remissão para o acervo documental que se junta respeitante ao procedimento disciplinar sem a formulação de qualquer factualidade constitutiva do direito ao decretamento da sanção disciplinar como causa então deve-se concluir que existe falta de indicação da causa de pedir.
3- Para o efeito não há lugar ao convite de aperfeiçoamento.

Decisão

Acordam os Juízes nesta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença.
Custas pela recorrente.
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O acórdão compõe-se de 26 folhas, com os versos não impressos.
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20.09.2018