Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1761/16.0T8BRG.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: CONTRATO DE FRANQUIA
RESOLUÇÃO
JUSTA CAUSA
CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA
CLÁUSULA PENAL
REDUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/01/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- A franquia é o contrato pelo qual o empresário – o franquiador – concede a outro empresário – o franquiado – o direito de exploração e fruição da sua imagem empresarial e respectivos bens imateriais de suporte (designadamente, a marca), no âmbito da rede de distribuição integrada no primeiro, de forma estável e a troco de uma retribuição.
II- Trata-se de um contrato atípico, sendo-lhe aplicáveis, por analogia, as regras que disciplinam o contrato matriz de distribuição – o contrato de agência – sem prejuízo da inaplicação de normas exclusivas deste.
III- O contrato pode ser resolvido se a outra parte faltar ao cumprimento das suas obrigações, quando, pela sua gravidade ou reiteração, não seja exigível a subsistência do vínculo contratual.
IV- O artigo 432.º n.º 1 do Código Civil admite, para além da resolução do contrato fundada na lei, que, por convenção, se atribua a uma das partes ou a ambas, o direito de resolver o contrato.
V- A resolução convencional – cláusula resolutiva expressa -, assentando no princípio da autonomia de vontade e liberdade contratual, confere às partes o direito potestativo de, mediante acordo, atribuir a ambas ou apenas a uma delas, a faculdade de resolver o contrato quando ocorra certo facto.
VI- No contrato de franquia existe uma coligação entre o franquiador e o franquiado na tarefa de captar a clientela, pelo que, só casuisticamente, se poderá verificar se a atividade do franquiado foi determinante para atrair a clientela, atuando em termos idênticos ao agente, não podendo, sem mais, fazer-se a aplicação analógica do artigo do contrato de agência que prevê a indemnização de clientela.
VII- A redução equitativa da cláusula penal, prevista no artigo 812.º do Código Civil, não é oficiosa, dependendo do pedido do interessado, a quem caberá alegar e provar os factos de onde seja possível extrair a excessividade da estipulação, fora dos limites comportáveis pela liberdade contratual.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

“X, Lda.” e “Y, Lda.” deduziram ação declarativa contra “W, Lda.” pedindo que a ré seja condenada a cumprir o contrato celebrado com a 1.ª autora, sob pena de aplicação de sanção pecuniária compulsória (repondo as margens brutas previstas no modelo de negócios, entregando os manuais de operações, transmitindo a filosofia e organização do trabalho, prestando todo o auxílio na gestão) e a pagar à 1.ª autora a quantia de € 133.878,79, acrescido do montante dos prejuízos que a 1.ª autora venha a incorrer até ao cabal cumprimento pela ré das condições previstas no contrato, acrescidos dos juros legais.
Subsidiariamente, pediram que seja declarada a resolução do contrato de franchising celebrado entre a 1.ª autora e a ré, por incumprimento desta última, sendo condenada a pagar à 1.ª autora a quantia global de € 480.981,32, acrescida dos prejuízos que vierem a ser suportados pela 1.ª autora até à decisão final.
Pedem, ainda, que seja reconhecida a falta de fundamento para a resolução do contrato operada pela ré relativamente ao contrato celebrado com a 2.ª autora e que a ré seja condenada a pagar o montante global de € 632.803,54, correspondente aos prejuízos sofridos pela 2.ª autora em resultado do incumprimento pela ré das condições previstas no contrato de franchising e pela resolução do mesmo contrato, acrescidos dos respetivos juros legais, bem como o montante global de € 75.000,00 correspondente aos prejuízos sofridos pela 1.ª autora em resultado do investimento efetuado no capital da 2.ª autora, acrescidos dos respetivos juros legais e, ainda, o valor que vier a ser fixado equitativamente pelo tribunal a título de indemnização de clientela.
A ré contestou, excecionando a coligação ilegal das autoras, impugnando a matéria de facto alegada e suscitando a intervenção principal provocada dos fiadores dos contratos em discussão. Em reconvenção pediu que a 1.ª autora e os fiadores sejam condenados solidariamente a pagar à reconvinte as quantias de € 22.149,84 (serviços faturados e não pagos) e € 272,93 de juros de mora desde a data de vencimento de cada uma das faturas e que a 2.ª autora e seu fiador sejam condenados a reconhecer a validade da resolução do contrato, com justa causa, e a pagar, solidariamente, à ré, as quantias de € 17.796,64 (serviços faturados e não pagos), € 697,47, a título de juros de mora desde a data de vencimento de cada uma das faturas e € 250.000,00 (cláusula penal), acrescida de € 4.345,89 de juros de mora. Pede, ainda, a condenação da 2.ª autora e fiador a pagar solidariamente à ré as quantias que se vierem a liquidar a título de indemnização de imagem, bem como a quantia que o tribunal fixar com recurso a equidade, por forma a compensar o uso ilegítimo pela 2.ª autora dos sinais distintivos do Sistema SP., condenando-se a 2.ª autora a proceder à imediata remoção de todos esses sinais distintivos e no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor diário de € 500,00 até que aquela cumpra com o ordenado.
Em réplica, as autoras pronunciaram-se sobre a matéria de exceção e impugnaram a matéria de reconvenção, pedindo, subsidiariamente, que sejam declaradas nulas e de nenhum efeito as cláusulas XVII, XXVII e XXVIII do contrato de franchising.

Em audiência prévia, foi julgada verificada a coligação ilegal de autoras, tendo-se decidido, após declaração das mesmas nesse sentido, que a ação prosseguisse apenas relativamente à 2.ª autora, tendo a ré sido absolvida da instância quanto aos pedidos formulados pela 1.ª autora.
Nesta sequência, a 2.ª autora – agora única autora – apresentou nova petição inicial, apenas com os factos e os pedidos que a si dizem respeito, a que se seguiu contestação/reconvenção da ré e réplica da autora.
Foi admitida a intervenção do responsável solidário H. M., na qualidade de reconvindo, que apresentou articulado em que adere ao articulado da autora.
Em audiência prévia foi fixado o valor da ação, definido o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.
Posteriormente, a 15/11/2017, a autora foi declarada insolvente e a 09/03/2018 transitou em julgado despacho de encerramento do processo de insolvência nos termos do disposto nos artigos 230.º, n.º 1, alínea d) e 232.º, n.º 2 do CIRE.
Foi proferida sentença que declarou a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto ao pedido formulado pela autora contra a ré e quanto ao pedido reconvencional formulado pela ré/reconvinte contra a autora/reconvinda, prosseguindo os autos quanto ao fiador H. M..
Tendo a autora interposto recurso, que subiu em separado, foi proferido Acórdão que determinou o prosseguimento da ação quanto ao pedido formulado pela autora.
Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, o Tribunal decide:
- julgar a presente acção improcedente e, em consequência, absolve a ré de todos os pedidos contra si formulados pela autora “Y, Lda.”, ora sociedade em liquidação;
- julgar a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, reconhecendo a licitude da resolução operada, condenar o fiador/chamado H. M., a pagar à ré as seguintes quantias:
- € 17.796,64 (dezassete mil, setecentos e noventa e seis euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, a contar desde a data de vencimento de cada uma das facturas identificadas no ponto 87 dos factos provados, à taxa de juros comerciais sucessivamente em vigor;
- € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) a título de cláusula penal, a acrescer de juros de mora vencidos e vincendos, a contar de 25.02.2016 e até efectivo pagamento, à taxa de juros comerciais sucessivamente em vigor;
- € 1.000,00 (mil euros) de indemnização pelo uso não autorizado da marca sistema “SP.” entre os dias 24 a 26.02.2016, a acrescer de juros contados desde a presente decisão e até efectivo pagamento;
- mais se decide absolver o fiador/chamado H. M. de todos os demais pedidos deduzidos, mormente do pedido relativo à indemnização por danos na imagem da ré”.

A autora e o chamado interpuseram recurso, cujas alegações finalizaram com as seguintes
Conclusões:
I. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pela Meritíssima Juiz da Comarca de Braga – Juízo Central Cível de Braga - Juiz 4 -, que julgou a ação improcedente e a reconvenção parcialmente procedente, condenando o Chamado a pagar á Ré as quantias referidas na sentença.
II. Entende a Recorrente que a sentença proferida é merecedora por censura, porque efetua uma errada interpretação e análise da prova produzida e consequentemente da factualidade provada e não provada, assim como da aplicação do direito à matéria ao caso em apreciação.
III. Grosso modo, como adiante veremos, a apreciação da factualidade nos presentes autos passa por perceber de que forma foi celebrado o contrato de franchising, quais as obrigações decorrentes para as partes, se o mesmo foi incumprido pela franqueada ou franqueador, e assim, decidir a final, se a resolução operada pela Recorrida era ou não justificada, sendo que, ao não ser justificada a resolução, recairia sobre a recorrida a obrigação de indemnizar.
IV. Após essa apreciação, teriam de se liquidar os danos decorrentes dessa resolução e ainda, a eventual responsabilidade do chamado H. M..

Da alteração da matéria de facto provada para não provada:

V. O Tribunal a quo apenas conferir credibilidade às testemunhas da Ré, designadamente às declarações do legal representante N. F. e ainda, ao depoimento/declarações de parte do legal representante da Ré, tendo o mesmo sido fundamental e decisivo para a factualidade provada e não provada.
VI. As declarações de N. F. têm tudo menos correspondência com os documentos juntos aos autos, revelando um testemunho totalmente parcial, defensivo e sem esclarecer, afinal, o que é que vendeu aos Franqueados.
VII. Veio defender uma tese fantasiosa, inverosímil e claramente contra aquilo que é a normalidade do acontecer e das práticas negociais neste tipo de contratos e, acima de tudo, da boa fé contratual.
VIII. Tendo-se terminado a produção de prova sem que se saiba, afinal, o que é o “Modelo SP.” e de que forma o negócio poderia ser rentável para os franquiados.
IX. Assim, foram indevidamente considerados como provados os factos constantes 47, 48, 51, 52, 72, 73, 75 e 91 foram incorretamente dados como não provados os factos constantes nas alíneas 1, 2, 5, 6, 22, 28 e 29.
Quanto aos pontos 47, 48 e 52 da factualidade assente e pontos 1, 2, 5, 6 e 29 da matéria não assente:
X. De acordo com a sentença recorrida, - o doc. 26 de fls. 146, email de 25.07.2013 da ré/N. F. para H. M. com o assunto “plano financeiro” com duas versões, quanto aos pontos 4, 5, 47 e 48 dos factos provado, e ainda a fls. 497 (doc. 2 da nova petição); - contribuiu para dar como provado os pontos 47 e 48 - estes pontos referem que, as simulações do plano de negócios teriam a finalidade de instruir e apoiar a obtenção de financiamentos.
XI. Contudo, não é isso que resulta do teor do e-mail junto como doc.26 – factos 4 e 5 assentes.
XII. As declarações do N. F. a este respeito foram tendenciosas e desfasadas da realidade, tentando justificar o injustificável – cfr. gravações ficheiro 20191022104424_5170039_2870509.wma, em 22/10/2019, dos [00:07:41] aos [00:08:04] e [00:15:28] aos [00:18:31] – verificando-se que as declarações prestadas são contraditórias com o teor e-mail por ele enviado.
XIII. Não se concebe assim como é que o tribunal a quo, valoriza este depoimento do N. F. e ter afirmado na motivação da sentença que o depoimento dele foi correspondente e alicerçado nos documentos.
XIV. O depoimento do N. F. foi apenas coincidente com os interesses dele e da empresa dele.
XV. O e-mail com o plano surge em momento anterior à formalização do contrato de franquia e mesmo antes de se ter uma loja para explorar, pelo que, sempre se questiona de que forma, se pode acreditar, porque motivo o N. F. fala em cálculos, previsões e perspetivas de negócio, quando, segundo ele, o mesmo não se destinava a nada disso.
XVI. No ponto 20 da factualidade provada está o teor do e-mail que este N. F. envia à Autora e Dezembro de 2015, acerca das medidas a tomar, referindo, expressamente as “margens estimadas” para determinados produtos, fazendo notar que as margens estimadas para pastelaria estavam acima do plano de negócios, que diz, anteriormente, não existir, sendo apenas para financiamento – cfr. gravação do N. F., ficheiro 20191022104424_5170039_2870509.wma, de 22-10-2019, dos[00:58:04] aos [00:58:59].
XVII. A perceção do fraqueado foi exatamente a que consta nas palavras do N. F. naquele e-mail, e que, salvo melhor opinião, vão de encontro com aquilo que é a perceção de qualquer homem mediano, conforme se verifica na declarações de H. M. – Legal Representante, ficheiros áudio 20191022115449_5170039_2870509.wma e 20191029141630_5170039_2870509.wma, de 22-10-2019 e 29-10-2019,dos [00:10:17] aos [00:15:24]; dos [00:28:10] aos [00:29:06] e dos [00:30:20] aos [00:39:38] – donde resulta que o que foi pedido não foi o plano para qualquer financiamento, mas antes para perceber a rentabilidade do negócio.
XVIII. Aliás, só assim se percebe as explicações que o N. F. dá no e-mail, caso contrário, para que “raio” precisa o banco de saber quantos funcionários teria a Autora e quantas horas iriam trabalhar e qual a rentabilidade dos funcionários em termos de faturação!?
XIX. Das declarações de C. M., resulta que por volta da mesma altura estava a negociar com a Recorrida através do mesmo NF o contrato de franchising para Guimarães, e atestou também ter recebido o mesmo plano, com as mesmas margens, embora com valores previsíveis de faturação diferentes (mais baixos) em virtude da localização da loja, acrescentando que o mesmo não se destinou á obtenção de qualquer crédito, mas antes aferir a rentabilidade do negócio - cfr. declarações de C. M. – Legal Representante, ficheiro 20191029154012_5170039_2870509.wma, de 29-10-2019, dos [00:07:26] aos [00:08:04], dos [00:08:43] aos [00:13:45] e dos [00:15:48] aos [00:19:59]
XX. Temos assim dois candidatos a receber o plano de negócios com as margens brutas esperadas e o N. F. tem a audácia de dizer ao tribunal que o plano foi efetuado a pedido da Autora e apenas para efeitos de candidatura a financiamento, o que é contrariado por ambas as sociedade franchisadas!, tendo de merecer acolhimento a tese dos franqueados e não da Recorrida.
XXI. Além disso, o depoimento do N. F. foi tão comprometido e desvirtuado da verdade que chegou mesmo a afirmar, para demonstrar que o contrato afinal não era, como é, restritivo, que os franchisados até gelado podiam comprar a terceiros, quando, no anexo 9 ao contrato de franchising, é referido que eles são os vendedores exclusivos e que a aquisição do gelado e demais produtos lá discriminados a terceiros, conduzia à resolução do contrato.
XXII. Voltando ao plano de negócios/financeiro que o N. F. diz não existir e cujas margens brutas não prometeu, devemos referir que, a prova testemunhal especializada – contabilistas e revisor oficial de contas – foi unânime em afirmar que é um documento que faz parte deste tipo de contratos e que a margem é pressuposto essencial à análise do franchising e decisão a contratar, conforme resulta da prova testemunhal produzida, designadamente: M. G. – Testemunha, ficheiro 20190930160204_5170039_2870509.wma, no dia 30-09-2019, dos [00:03:19] aos [00:03:41], dos [00:26:04] aos [00:26:54] e ainda a testemunha M. A., ficheiro 20190930163516_5170039_2870509.wma, do dia 30-09-2019, dos [00:26:29] aos [00:28:08] e [00:36:41] aos [00:36:59] .
XXIII. Como acabamos de alegar na prova transcrita, mais concretamente do Contabilista da Ré á data dos factos, este foi perentório em afirmar que o plano de negócio e margens brutas são pressupostos fundamentais para contratar e são avançados pelo franquiador e não pelo franqueado que não dispõe de qualquer tipo de informação a esse respeito, o que foi também confirmado pelo ROC M. G..
XXIV. Para além da prova produzida, temos ainda de referir que, o homem medianamente sagaz e diligente, face à normalidade do acontecer, ao querer entrar num franchising fá-lo porque entende que não tem capacidade para montar, per si, um negócio igual, igualmente rentável e, opta por pagar um fee de entrada e royalty mensal, como contrapartida pelo know how de um negócio já instalado, a funcionar e que, embora não garantido, como é evidente lucro, garante que se as vendas existiram, aqueles produtos terão determinada margem de lucro bruto.
XXV. Para diligenciar nesse sentido, aquele homem, medianamente sagaz, que não percebe nada de gelados ou bolos e respetiva venda, interessou-se por perceber quais as margens brutas, para perceber quanto tempo demoraria a recuperar o investimento, confiando que, utilizando know how e orientações do franquiador, e tendo clientes na porta que escoassem o produto, conseguiriam ter o esperado retorno.
XXVI. Para essa perceção, como é evidente, teve de lhe ser fornecido um plano de negócios/financeiro, com margens brutas esperadas.
Aqui chegados,
XXVII. Têm de ser alterados os pontos 47e 48 da matéria de facto assente e para não provados.
XXVIII. Alterar o teor do artigo 52 da matéria assente para o seguinte: “52. A ré garantiu à autora que o “Sistema SP.”, gerava uma margem “específica/fixa”.”
XXIX. Dar como provado os pontos 1, 2, 5, 6, 29 constantes da factualidade não provada, designadamente: “1. O representante da ré, N. F., vendeu à autora a ideia de que as margens de comercialização dos produtos da sua marca permitiam o reembolso do capital inicial a investir em pouco mais de 3 anos e garantiu que a rentabilidade da loja do Porto faria com que o investimento fosse recuperado “rapidamente”; 2. O “plano de negócios” referido em 4. e 5. dos factos provados permitiria analisar a rentabilidade do investimento e aferir da veracidade dos números indicados pela ré; 5. O modelo de negócio vendido à autora com a celebração do contrato correspondia ao plano de negócios; 6. A ré comprometeu-se a fornecer esse modelo de negócio com custos perfeitamente definidos e margens de venda de produto que permitiam antever o reembolso de investimento; 29. De acordo com o “plano de negócios” era previsível o reembolso do capital investido no prazo máximo de 4 anos;”

Da alteração do ponto 51 da matéria assente e 22 da matéria não provada:

XXX. No ponto (51) é dado como provado que a Ré não decidia as quantidades compradas pela Autora a cada fornecedor, designadamente perante si.
XXXI. No contrato de franchising outorgado e junto aos autos como documento n.º 31 da petição inicial, é estabelecido, mais concretamente no n.º 2 da cláusula XII, conjugada com o anexo VIII que a recorrente estava obrigada a manter um stock mínimo de produtos, designadamente de gelado (7 dias) e de material de embalagem e descartáveis (30 dias) e outros (15 dias).
XXXII. O gelado e materiais descartáveis eram, obrigatoriamente, comprados à Ré – cfr. anexo IX ao contrato de franchising -, sob pena de resolução do contrato.
XXXIII.A ré ora Recorrida exigia stock mínimo de produtos, pelo que, era esta, através do contrato, quem exigia as quantidades mínimas de produto adquiridos, a terceiros e a si também, visto que existem produtos que só a Recorrida podia vender!
XXXIV. Atenta a missiva referente à resolução do negócio – vide ponto 26 dos factos provados – a não existência de stocks mínimos é um dos fundamentos alegados pela recorrida para a resolução por si promovida.
XXXV. Assim, mal andou o Tribunal a quo em dar como provado que não era a ré quem decidia as quantidades mínimas de produtos que a recorrente teria de adquirir, impondo-se assim alterar o ponto 51 em conformidade com o contrato outorgado, designadamente, passando a constar o seguinte: “51. Era a ré quem decidia as quantidades mínimas compradas pela autora junto de cada fornecedor e, no caso, junto da ré.”
XXXVI. Quanto ao ponto 22 da matéria não provada, deve também a mesma ser alterada para provada, pelo que atrás se disse e pelo que a seguir densificaremos.
XXXVII. Como vimos, a Recorrida era um dos fornecedores exclusivos da recorrente, não podendo ser contratado qualquer outro, o que levou a que esta fosse o maior fornecedor da recorrente, senão vejamos o depoimento do funcionário J. F. – Testemunha, ficheiro 20191022092608_5170039_2870509.wma, em 22-10-2019, dos [00:36:52] aos [00:37:24].
XXXVIII. Ainda que indiretamente, sendo a Ré o maior fornecedor obrigatório por força do contrato, foi esta ao inserir tal cláusula que definiu, à partida, que seria o maior fornecedor: ela própria, assim, era ela quem definia o preço de venda dos produtos e consequentemente, as margens que a recorrente poderia ganhar!
XXXIX. Nos termos do contrato de franchising (doc.31) – vide anexo VII -, existiam fornecedores exclusivos autorizados e qualquer alteração teria de ser aprovada pela Recorrida!
XL. Quanto ao preço, e escusando-nos de nos repetir acerca das declarações parciais do N. F., resulta evidente que temos duas versões nos autos: A Recorrida através do N. F. diz que não definia os preços de venda ao público. A Recorrente através do C. M. e do H. M., atesta que era a Recorrida quem definia os PVP, acrescentando que era a recorrida quem controlava os POS nesta questão – vide a este respeito o anexo XI ao contrato de franchising.
XLI. Perante duas versões, qual delas devemos escolher face à normalidade do acontecer e do senso comum, quando estamos perante um contrato de franchising? Num franchising referente a produtos alimentares, regra geral, exige-se que as receitas e qualidade dos produtos seja a mesma, assim como o layout das lojas, de igual modo, os PVP são, regra geral, iguais, pelo menos dentro do mesmo território - essa é a normalidade do acontecer, não sendo de acreditar que, neste caso, os PVP fossem, ou pudessem ser, definidos pelos Franchisados.
XLII. Assim, conjugada a prova produzida – testemunhal e documental -, com a normalidade do acontecer e daquilo que é prática corrente neste tipos de contratos, deve dar-se como provado o ponto 22 da matéria não provada, designadamente: “Era a ré que definia a maioria dos fornecedores da autora, fixava a marca e características dos produtos a adquirir pela autora, e fixava o preço de venda final dos produtos vendidos pela autora;

Da alteração dos pontos 72 e 73 da matéria assente:

XLIII. Nestes pontos 72 e 73, o Tribunal a quo dá como provado que os gerentes da recorrente não acompanhavam o estabelecimento, nem estavam presentes, de forma assídua
XLIV. A prova foi consensual em afirmar que o H. M. era presença assídua em loja, sendo que, apenas não estava em momentos de folgas, fruto dos turnos por este efetuados – cfr. depoimento de J. P. – Testemunha, ficheiro 20190930152010_5170039_2870509. wma, dia 30-09-2019, dos [00:14:37] aos [00:17:52] e ainda as declarações de H. M. – Legal Representante, ficheiros 20191022115449_5170039_2870509.wma e 20191029141630_5170039_2870509.wma, dias 22/10/2019 e 29/10/2019 dos [00:28:34] aos [00:29:47].
XLV. Mais foi dito e atestado que o outro gerente, C. M., que era também gerente, o único, da loja franchisada de Guimarães, estava menos vezes presente no Porto, normalmente duas vezes por semana, fruto da necessidade de acompanhar essa gerência.
XLVI. Por outro lado, a matéria assim dada como provada, ignora que as funções de gerência são muito mais que estar em loja, sendo necessário reunir com a contabilidade, banco, fornecedores, marca, etc.
XLVII. Assim, a conclusão vertida nos pontos 72 e 73 não tem qualquer sentido, ignorando as regras da gerência, sendo a prova inquirida insuficiente para dar como provados tais factos.

Da alteração do ponto 75 da matéria assente:

XLVIII. Vem dado como assente, no ponto 75 da matéria assente, que a Recorrente incumpria, de forma reiterada, os prazos de encomenda de produtos à Ré.
XLIX. Tal facto não está correto, não correspondendo à prova produzida, não tendo o Tribunal a quo sido criterioso nas palavras escolhidas, o que não se pode conceder.
L. A a prova testemunhal produzida é no sentido de atraso, mas apenas nos últimos meses antes de a loja fechar, pelo que se impõe a alteração deste facto 75 no sentido de restringir o atraso das encomendas a este período, senão vejamos: testemunha R. P. – Testemunha, ficheiro 20190930141218_5170039_2870509.wma, dia 30-09-2019, dos [00:44:03] aos [00:44:22] .
LI. Verifica-se pois que a factualidade constante no ponto 75, não se coaduna com a lógica e a prova produzida, devendo ser alterada em conformidade, designadamente: “75. A autora, a partir de meio, final de 2015, incumpriu os prazos de encomenda dos produtos à ré designadamente de gelados, deixando por vezes terminar o seu stock para só aí o encomendar, situação que, por vezes, motivou inexistência de stocks e, consequentemente impossibilidade de venda de produtos aos clientes.”

Do ponto 91 dos factos provados:

LII. Vem neste ponto 91 dado como provado, que a Autora, aqui recorrente, após a interpelação nada fez para alterar as situações relatadas.
LIII. Mais uma vez, s.m.o., confunde o Tribunal a quo factos com conclusões. Na verdade, parece-nos que o ponto 91 não é um facto, mas antes uma conclusão extraída da suposta falta de prova.
LIV. Veja-se que a carta referida em 24 mereceu resposta por parte da Recorrente, a qual está dada como assente e reproduzida no ponto 25 da matéria assente.
LV. Veja-se que a recorrente, na sua resposta, refuta e repudia as alegações da Recorrida.
LVI. Se não concorda com as mesmas, não as aceita e dá uma resposta, não se pode dar como provado que não cumpriu com a missiva referida em 24, pelo simples motivo de não ser aceite a alegação da Recorrida.
LVII. Na carta referida em 25, p.ex. no ponto h da mesma, é expressamente referido pela aqui recorrente, a respeito da garantia bancária que o prazo de 10 dias é insuficiente, pedindo mais prazo, tendo inclusive enviado um cheque para garantia, vejamos: “estamos já a tratar da obtenção da aludida garantia bancária, sendo certo que o prazo de 10 dias fixado na V/ missiva é manifestamente insuficiente para o efeito. Para evitar qualquer incumprimento, enviamos em anexo o cheque nº 6599654648, no valor de 25.000,00 €, sacado sobre o banco Caixa ..., emitido na presente data para caucionar o cumprimento da obrigação em causa, que não deve ser movimentado (salvo nas situações em que poderia ser acionada a garantia) e deve ser restituído após a apresentação da garantia bancária.”
LVIII. Falece assim, por completo, o facto 91, já que não só a recorrente pediu mais prazo, como também tomou medidas, designadamente ao enviar um cheque!, devendo alterar-se para não provado.

Do ponto 28 dos factos não provados:

LIX. Deu a sentença recorrido como não provado a alegação da recorrente de que a recorrida não lhe prestou o auxílio e ajuda a que estava contratualmente (cfr. contrato franchising).
LX. Resulta da prova produzida que foi celebrada uma reunião em meados de junho/julho de 2015 entre os representantes da recorrente e recorrida, assim como dos seus contabilistas, com vista analisarem, o plano de negócios e para que se adotassem medidas para colmatar as falhas do negócio vendido e equilibrar as contas da recorrente – H. M. – Legal Representante, ficheiros 20191022115449_5170039_2870509.wma e 20191029141630_5170039_2870509.wma, dias 22/10/2019 e 29/10/2019, dos [00:25:45] aos [00:28:41] e N. G. – Testemunha, ficheiro 20190930102237_5170039_2870509.wma, dia 30-09-2019 dos [00:21:04] aos [00:26:44].
LXI. Apenas 5/6 meses mais tarde é que a Recorrida responde a esse pedido de ajuda, mais concretamente através de e-mail datado de 16-12-2015 (facto provado 20).
LXII. Em 13-01-2016 foi apresentada uma proposta de pela recorrente para alterar a forma de trabalhar, pedindo ajuda à Recorrida, na análise e implementação das medidas propostas. Esse e-mail de pedido de ajuda nunca mereceu resposta.
LXIII. Veja-se a prova inquirida a este respeito – pedido de ajuda e respetivo cumprimento desse dever: N. F. – Legal Representante, ficheiro 20191022104424_5170039_2870509.wma em 22-10-2019, dos [00:41:16] aos [00:41:59] – não existiu qualquer ajuda válida.
LXIV. Temos pois por evidente que a Recorrida não cumpriu com a sua obrigação contratual de auxílio, pelo que deve alterar-se para provado o ponto 28 dos não provados, designadamente que: “28. A ré não prestou qualquer auxílio à autora na gestão da loja, por forma a aumentar o rendimento ou margem das vendas da autora;”.
LXV. Face à alteração da prova requerida, desde já se requer que o segmento decisório seja alterado, designadamente considerando que não assiste justa causa na resolução operada pela Recorrida e, face a essa decisão, deve a mesma ser condenada a indemnizar a Recorrente.
LXVI. De igual modo, deve improceder o pedido de € 250.000,00 de cláusula penal aplicada ao chamado H. M., assim como as demais quantias que foi condenado a pagar, visto a Recorrente ser credora da Recorrida e não o inverso, efetuando-se compensação nos valores referentes às faturas, caso se entenda que a fiança é válida.

DE DIREITO

LXVII. Também de direito se verifica um claro erro de julgamento, senão vejamos: Averiguar da licitude ou ilicitude da resolução contratual operada pela ré e, consequentemente, saber se o contrato cessou com ou sem motivo justificado:
LXVIII.Com a alteração à factualidade requerida, a resposta é claramente não, visto que os incumprimentos são da Recorrida e foram esses que levaram ao descalabro financeiro da Recorrente, o que a levou a determinados incumprimentos.
LXIX. Mas e se se manterem os factos da sentença, será que se verificava uma conduta grave e reiterada que tornava inexigível a manutenção do vínculo? Desde já adiantamos que a resposta é não!
LXX. Nenhum dos 7 incumprimentos apontados à recorrente justificam a cessação do vínculo, ainda para mais quando resulta evidente da resposta á interpelação (facto 20 provado) que a recorrente pediu ajuda e colaboração da Recorrida, por forma a poder cumprir com as suas obrigações.
LXXI. Em concreto, a recorrida invocou 7 argumentos para a resolução do contrato, designadamente: 1. Ausência recorrente dos gerentes na loja; 2. Inexistência dos stocks mínimos previstos; 3. Incumprimento de obrigações perante terceiros; 4. Incumprimento de obrigações perante o Estado; 5. Não prestação de garantia bancária; 6. Mora superior a trinta dias no pagamento de obrigações vencidas a favor da Franchisante; 7.Não envio por parte da Franchisada à Franchisante dos documentos referentes a seguros;
LXXII. Veja-se que a ausência recorrente dos gerentes em loja, para além de não se verificar, implicava que o gerente não pudesse tratar de outros assuntos/tarefas de gerente e que exigiam a sua ausência da loja.
LXXIII. O C. M. é gerente único da X, sociedade que à data também explorava um franchising da SP. em Guimarães, pelo que não podia estar em dois sítios ao mesmo tempo.
LXXIV. Não é alegado ou demonstrado qualquer dano para a Marca decorrente da suposta violação desse ónus, pelo que, per si, este requisito é inócuo e insuficiente para justificar a resolução.
LXXV. Quanto aos alegados incumprimentos referidos nos pontos, 2, 3, 4 e 6, os mesmos prendem-se com dificuldades de tesouraria, criadas pela falta de rentabilidade do negócio.
LXXVI. Qualquer incumprimento dos pagamentos era e é apenas imputável à Recorrente, não sendo a recorrida responsável pelas supostas dividas.
LXXVII. De referir que não há noticia do corte de qualquer fornecimento ou bem essencial que impedisse o labor normal da loja.
LXXVIII. Quanto ás faturas em divida à recorrida, poderia a mesma aceitar um plano de pagamentos, sendo de referir que 13.000,00€ é menos de metade do direito de entrada, sendo por isso pouco significativo.
LXXIX. Quanto aos pontos 5 e 7, veja-se que apenas 3 anos após a celebração do contrato é que a Recorrida se lembra de pedir esses elementos.
LXXX. Quanto á garantia, foi entregue um cheque e pedido prazo para a mesma, o que não foi concedido.
LXXXI. Quanto aos seguros, foram enviados e, não estando em conformidade, sempre teria a Recorrida de notificar para essa correção, o que também não sucedeu.
LXXXII. Dos 7 pontos invocados pela recorrida, ainda que os mesmos fossem verdadeiros, que não são, os mesmos não impediam a exploração da loja, não denegriam a imagem da marca nem eram impossíveis de ser resolvidos, antes pelo contrário, eram todos eles de fácil resolução e em pouco tempo.
LXXXIII. Assim, analisando todos eles, não se verifica que os mesmos fossem de tal forma graves que impedissem a execução do contrato e que justificassem a resolução, exigindo-se uma conduta grave e reiterada e não um simples incumprimento fácil e rapidamente sanável, como os que aqui referimos.
LXXXIV. De referir que a existência de uma cláusula resolutiva tem de ser aferida ao abrigo do principio da boa fé contratual e que, mesmo assim a mesma não viola as mais elementares normas jurídicas, como a necessidade de uma incumprimento grave e reiterado para a resolução fundamentada.
LXXXV. Assim, a aludida resolução, por iniciativa da recorrida/franquiador, é ilícita e infundada, devendo proceder todos os pedidos formulados pela Recorrente.
LXXXVI. Deve referir-se ainda a este respeito que, não sendo possível calcular/arbitrar o valor da indemnização a que Recorrente tem direito, por não se mostrarem provados os cálculos oferecidos, sempre teria de se relegar para liquidação se sentença.
LXXXVII. De alegar ainda que, ao contrário do que é referido na sentença recorrida, sempre a Autora tem direito a uma indemnização que deve abranger o dano resultante da frustração do interesse contratual positivo, aquele que pretende colocar a parte lesada em circunstâncias idênticas às que se verificariam se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido, designadamente no caso de violação do princípio da boa fé contratual. Ou seja, os benefícios que deixou de obter (lucros cessantes) com a resolução não motivada do contrato, nomeadamente os previsíveis benefícios futuros. – cfr. a este respeito o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo: 1041/12.0TVPRT.P1 de 28-10-2015.
LXXXVIII. De igual modo, teria direito a indemnização pelo interesse contratual negativo, veja-se a contradição produzida na sentença recorrida, já que, a respeito do fiador, já considera serem cumuláveis as indemnizações pelo interesse contratual positivo e negativo (“A tese da admissibilidade da cumulação tem vindo a ganhar terreno na doutrina, em detrimento da tese tradicional”), pelo que terá de proceder o pedido formulado.

Da indemnização por clientela:

LXXXIX. Não vem posto em causa que o contrato celebrado entre a autora e ré é de franquia (franchising), entendendo a Recorrente que, não obstante o que resultar da prova e da (in)justa causa para a resolução contratual, será sempre devida indemnização pela clientela
XC. A indemnização de clientela é uma compensação devida ao agente, após a cessão do contrato, pelos benefícios que a outra parte continua a auferir com a clientela angariada ou desenvolvida pelo agente. - cfr. art. 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86.
XCI. Está dado como provado que:“31. A abertura da loja do Porto no dia 15 de Julho de 2014 contribuiu para o aumento de clientela da marca. 32. Essa clientela, angariada pela autora, continua fiel à marca e aguardou a abertura de novo estabelecimento, até porque tal foi anunciado pela ré pelas redes sociais.”, pelo que não restam dúvidas que a Recorrida beneficiou com a clientela.
XCII. Ora, provado que se verificou aumento, já está. Será a prova, impossível, sem elementos contabilísticos da recorrida e da loja que esta abriu, tudo porque o tribunal recusou a perícia e não ordenou uma oficiosamente, como devia?
XCIII. Não podemos concordar com tal alegação e comportamento. Se o tribunal dá como provado que a recorrida aumentou e beneficiou com a clientela, deve ordenar a perícia necessária à prova e não a indeferir.
XCIV. Sendo certo ainda que, não dispondo dos elementos para o cálculo daquilo que dá provado e está pedido – indemnização de clientela – devia e podia ter relegado para liquidação de sentença - nos termos dos art.ºs 609.º n.º2 e 610.º do C.P.Civil, o que se requer.

Da condenação do chamado:

XCV. Face ás alterações requeridas à matéria de facto assente, ficou demonstrado o do incumprimento da sociedade autora, pelo que a cláusula penal não é exigível, devendo ser absolvido do pedido.
XCVI. Diz a sentença recorrida que o contrato não está submetido ao regime previsto no DL. Nº 446/85, de 25 de Outubro, porquanto existiram negociações. Que negociações?
XCVII. Não está dado como provado qualquer explicação/informação do teor da cláusula de € 250.000,00 de indemnização.
XCVIII. Não está provado que o contrato enviado no primeiro e-mail tivesse essa cláusula…até porque, do teor do mesmo resulta que faltavam precisamente as garantias!
XCIX. Dever de comunicação e informação não foram cumpridos, nem o contrato foi negociado, pelo menos, atendendo aos factos provados.
C. O ónus de prova de informação e comunicação é da recorrida, que não logrou cumprir.
CI. Termos em que devem ser declaradas nulas e de nenhum efeito as cláusulas XVII, XXVII e XXVIII do contrato de franchising – cláusula 12.º e als. c) e f) do art.º 19 do DL 446/8.

Da redução da cláusula penal:

CII. Escreve a sentença recorrida que “Diga-se, por fim, que não pode o Tribunal ex officio proceder à redução do valor da cláusula penal ao abrigo do disposto no art. 812.º do Cód. Civil”
CIII. A cláusula penal, tendo um fim punitivo só será ilegítima se houver uma chocante desproporção, entre os danos que previsivelmente o devedor causar com a sua conduta, e a indemnização prevista na cláusula para os ressarcir.
CIV. A redução da cláusula penal, ao abrigo do art. 812º, nº1, do Código Civil, pressupõe que esta seja manifestamente excessiva.
CV. Verificam-se alegados vários factos e ainda factos contantes no acervo da matéria provada, que permitem ao julgador, recorrendo á equidade, reduzir a cláusula penal, devendo o tribunal ter reduzido a mesma, conforme temas de prova constantes no saneador, o que se requer na presente.
Nestes termos e nos demais de direito, concedendo provimento ao presente, nos termos expeditos nas alegações e conclusões supra, farão V.ªs Ex.ªs a acostumada Justiça!

A ré contra alegou, entendendo que deve ser negado provimento ao recurso.
O recurso foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

As questões a resolver prendem-se com a impugnação da decisão de facto, existência de fundamentos para a resolução legal e/ou convencional do contrato, a possibilidade de indemnização de clientela, a nulidade de cláusulas contratuais e a redução da cláusula penal

II. FUNDAMENTAÇÃO

Na sentença foram considerados os seguintes factos:
Factos provados:
Da nova petição:

1. Em Março de 2013 G. A. e H. M. reuniram com o representante da ré, N. F..
2. A 27 de Março de 2013, por email, o mesmo representante da ré, N. F., enviou àqueles as características que a loja no Porto deveria ter e que seriam as seguintes:
“Localização: …,
Características:
Zona pedonal de alta circulação
Montra com boa visibilidade para o interior
Boa exposição solar
Áreas:
Área público total: 160 a 300 m2
Interior: 120 a 260m2
Exterior: 40 a 100m2”.
3. Após várias conversas iniciais mantidas com o aludido representante da ré, N. F., e os esclarecimentos por este prestados, a 7 de Abril de 2003 H. M. preencheu e apresentou o formulário de candidatura ao franchising “SP. Cupcakes & Coffee”.
4. No dia 25 de Julho de 2013, o aludido representante da ré enviou, a solicitação do H. M. e a este dirigido por email, com a menção ao assunto “plano financeiro”, um denominado “plano de negócios”, com duas versões.
5. Nesse e-mail é referido o seguinte:
“Boa Tarde H. M.,
Conforme combinado, junto envio plano de negócio.
Fiz duas versões, uma conservadora com uma facturação diária de 676 euros e uma com + 20% de facturação.
Considerei 310 dias por ano, o que é próximo dos 6 dias por semana.
A facturação e despesas de pessoal está adaptado a um horário de abertura de 8 horas por dia, ou seja, acredito que haja alguma margem de abertura mais alargada no caso do Porto. A minha estimativa é que para cada 1000 euros de aumento em recursos humanos, teremos um aumento de 3000 em vendas. Também considerei neste plano, um financiamento de 29500 euros a 3 anos.
As amortizações foram calculadas com as taxas máximas para a respectiva rubrica.
Com estes cenários estima-se para a opção mais conservadora um break-even no ano 3 do projecto (entre o terceiro e o quarto ano) e para a segunda opção no ano 2 (ao fim de 2 anos e 4 meses). Assim, acredito que um cenário no meio destes dois estará entre os 2 anos e 10 meses e os 3 anos.
Aguardo vosso feedback em relação à loja.
Abraço.
N.”.
6. No dia 11 de Setembro de 2013 a ré enviou para H. M. e G. A., por email, a 1.ª versão do contrato de franchising, onde refere que o mesmo está a “ajustar para ser rever a questão das garantias”.
7. Após aprovação do projecto da loja pela ré, G. A. e H. M., na qualidade de arrendatários, celebraram com a “N. A.´s – Sociedade Imobiliária, Lda.”, em 9 de Outubro de 2013, um “contrato de arrendamento não habitacional em período limitado com opção de compra” da loja correspondente à fracção “C” - estabelecimento comercial e prestação se serviços, incluindo restauração - composta por cave, rés-do-chão e 1.º andar, com entrada pela Rua ..., n.º ..., no Porto, pela renda anual de 38.400,00 € (trinta e oito mil e quatrocentos euros), pagável em duodécimos mensais de 3.200,00 € (três mil e duzentos euros); contrato que a 17 de Fevereiro de 2014 foi aditado para efeitos de sub-rogação dos direitos e obrigações assumidos pelos arrendatários à autora “Y, Lda.”, por aqueles entretanto constituída.
8. Foi a ré que sugeriu a equipa de projectos, a ser paga pela autora, para definição das obras de adaptação da loja à actividade pretendida.
9. A ré enviou à autora um documento denominado de “acordo pré-contratual” e uma factura pro-forma de 24.10.2013, onde constavam assinalados elementos que iriam ser necessários para adaptar a loja à respectiva actividade e que ascendiam a 201.228,00 € (duzentos e um mil euros e duzentos e vinte e oito cêntimos), com IVA incluído, incluindo obras de estrutura e acabamento, equipamentos, eletrodomésticos, mobiliário, decoração e uniformes a adquirir, e custo de projecto.
10. Após negociações, e no dia 5 de Dezembro de 2013, a autora “Y, Lda.” e a ré celebraram um acordo denominado de “contrato de franchising” de fls. 649 verso a 669 verso, de acordo com o qual esta última atribuiu à autora o direito de utilizar o “Sistema SP.”, assim como os seus sinais distintivos e todo o modelo de negócio associado, através da exploração de uma loja, cujas cláusulas se dão aqui por integralmente reproduzidas.
11. O prazo do contrato foi fixado em 10 anos contados da sua outorga.
12. E a loja seria – como foi, instalada no Porto, no local previsto no Anexo III do contrato.
13. Como contrapartida pela atribuição do direito de utilização do “Sistema SP.”, a autora pagou à ré, na data de assinatura do contrato 30.750,00 € (trinta mil setecentos e cinquenta euros) a título de direito de entrada, e ainda se obrigou a pagar:
a) um valor mensal correspondente a 5% da facturação mensal bruta dos FRANCHISADOS, relativo a royalties;
b) um valor mensal correspondente a 1% da facturação mensal bruta do FRANCHISADO, relativo ao fundo de promoção SP..
14. O direito de entrada incluía a prestação de serviços de formação da equipa inicial da autora, a prestar pela ré, nos termos do ANEXO I, assim como a entrega, a título precário, dos manuais de operações identificados no ANEXO II.
15. A autora fez um investimento inicial global de 265.768,43 € (duzentos e sessenta e cinco mil setecentos e sessenta e oito euros e quarenta e três cêntimos):
a) 30.750,00 € pela celebração do contrato de franchising;
b) 126.761,05 € relativo a obras de adaptação da loja à actividade, incluindo projecto de arquitetura;
c) 108.257,38 € aquisição de equipamento básico e administrativo, incluindo AVAC.
16. A autora contratou um total de oitos funcionários na abertura da loja ao público (sendo dois gerentes, os sócios da sociedade autora, quatro baristas e dois pasteleiros).
17. A ré não forneceu à autora um “Manual de Operações”, o qual só foi solicitado pela “Y” no final do contrato.
18. Desde a abertura da loja e até ao dia 17 de Maio de 2015 a autora “Y” praticou o preço 1.79 € + IVA (2,20 €) por cada porção de 100 gramas de gelado.
19. Após essa data o preço de venda do gelado ao público passou para o valor de 1,95 € + IVA (2,40 €).
20. No dia 16 de Dezembro de 2015 a ré enviou por correio eletrónico uma proposta de medidas a adotar pela “Y”, com o assunto “medidas lojas franchisadas”, do seguinte teor:
“Boa tarde,
Como combinado, junto seguem as medidas que iremos tomar.
1 - FRAPPÉS
Nova receita de frappé
Base para copo pequeno:
47g Manga 0,44€
47g Maracuja 0,43€
10g Base Frappé Dairy Free Monin 0,13€
Copo 0,10€
CUSTO COM IVA – 1,10 €
Base para copo médio:
70g Manga 0,66€
70g Maracuja 0,65€
15g Base Frappé Dairy Free Monin 0,20€
Copo 0,10€
CUSTO COM IVA – 1,61 €
Base para copo grande:
94g Manga 0,88€
94g Maracuja 0,89€
20g Base Frappé Dairy Free Monin 0,27€
Copo 0,12€
CUSTO COM IVA – 2,16 €
Aumento do preço dos frappés:
Novos preços Frappé Frutas
Pequeno – 2,70 Euros – Margem 59%
Médio – 3,20 Euros – Margem 50%
Grande - 4,30 Euros – Margem 50%
No Morango segue a mesma lógica, somando a quantidade de manga e maracujá.
Frappe frutos vermelhos passa a usar opcionalmente Frutos vermelhos e polpa Monin.
2 - GELADO
Aumento dos preços de gelado a 31/12
Guimarães: 2,40 Euros
Porto: 2,60 Euros
Revisão dos preços dos copos e cones a concretizar-se com novos copos a chegar em dezembro, de forma a garantir um preço de 0,08 Euros por copo/cone (considerando 20% cones e 80% copos)
Novos preços temporários dos gelados mais consumidos (com IVA)
211 Maracujá Sorvete 32,60 €
158 Chocolate Negro Valrhona Gelato 31,67 €
207 Manga Sorvete 33,22 €
144 Cheesecake de Frutos Vermelhos Gelato 33,75 €
161 Cookies Gelato 33,85 €
128 Baunilha Francesa Gelato 30,48 €
206 Maltesers Gelato 33,99 €
200 M&M's Gelato 33,99 €
233 Oreo Gelato 30,89 €
172 Frutos Vermelhos Sorvete – Passa a poder ser usado fruto congelado para frappé.
198 Limão Sorvete 28,60 €
189 Kit-Kat Gelato 33,10 €
251 Snickers Gelato 33,10 €
179 Iogurte Gelato 31,76 €
225 Nata Gelato 28,67 €
234 Bubble Gum Gelato 31,16 €
194 Lima Sorvete 35,53 €
165 Dulce de Leche Gelato 30,11 €
Com estas alterações, o gelado sofre na totalidade uma redução de 6%
Com estes 3 ajustes a margem estimadas passariam a:
Guimaraes: 48,5%
Porto: 52,5%
De notar que as margens da pastelaria estão significativamente acima em relação ao plano de negócios.
- OUTRAS MEDIDAS
Atribuição de encomenda de 6300 Cupcakes a Porto e Guimarães, no valor de 9.300 Euros
Introdução de nova linha de produtos de pastelaria quente:
- Cinnamon Rolls e outras variantes
- Panquecas
Introdução dos menus:
Cafe+Mini brownie 1,50 Euros
Café+Mini Gelado 2 Euros
Café+Mini Bolo 2 euros
Revisão dos recursos humanos
Flexibilização da politica de salário mínimo da empresa para 600 euros
Aguardo o vosso feedback.
Abraço!”
21. Das aludidas medidas foram implementadas:
a) atribuição de 6300 cupcakes a Porto e Guimarães, no valor de 9.300,00 € (nove mil e trezentos euros), tendo a ré compensado o valor dessa encomenda em valores que lhe eram devidos;
b) novas receitas dos Frappés (a partir de Fevereiro de 2016).
22. No dia 13.01.2016 C. M. por email propôs à ré algumas medidas, nomeadamente o aumento de preço em alguns produtos.
23. Era a ré fixava o preço das mercadorias por si vendidas à autora.
24. Através de carta de 5 de Fevereiro de 2016, recebida pela autora a 8 de Fevereiro de 2016, com o assunto “Interpelação admonitória para cumprimento de obrigações em mora”, a ré manifestou a vontade de fazer operar a resolução do Contrato de Franchising, com base nos seguintes fundamentos:
“1) Ausência recorrente dos gerentes na loja
Verifica-se que, recorrentemente, qualquer um dos dois gerentes da loja se encontram ausentes na mesma, situação que consubstancia um incumprimento do n.º 3 da cláusula X do Contrato de Franchising.
2) Inexistência dos stocks mínimos previstos
A franchisada não possui neste momento os stocks mínimos no que respeita a gelados e consumíveis, matérias de embalagem e descartáveis, encontrando ainda a incumprir os prazos de encomenda essenciais para a entrega no prazo contratualmente previsto. As situações descritas neste ponto, correspondem ao incumprimento de tudo quanto resulta previsto no n.º 2 da cláusula XII, conjugada com o anexo VIII do Contrato de Franchising e ainda do n.º 5 também da cláusula XII.
3) Incumprimento de obrigações perante terceiros
i. A franchisada é na presente data devedora a terceiros de montantes superiores a € 33.000,00. No que respeita ao fornecedor “Doce ...”, a franchisada mantém faturas vencidas e não pagas no valor de € 4.931,06 desde 25/06/2015;
ii. É igualmente devedora a franchisada de, pelo menos, duas rendas vencidas junto do senhorio do prédio onde se encontra a loja SP. por si explorada, no valor de € 6.400,00;
iii. Na presente data a franchisada tem ainda, para com os seus trabalhadores, salários, subsídios de Natal e de alimentação em atraso.
As situações descritas neste ponto, correspondem ao incumprimento do disposto no n.º 1 e 2 da cláusula XVII do Contrato de Franchising.
4) Incumprimento de obrigações perante o Estado
A franchisada é devedora, na presente data, de montantes superiores a € 14.000,00 junto da Autoridade Tributária, valores estes referentes a IVA não entregue ao Estado, sendo que, se encontram já pendentes execuções fiscais propostas pela Autoridade Tributária para recuperação desses valores e em que figura como executada a franchisada. No âmbito de uma dessas execuções foi mesmo já penhorado um balcão da loja explorada pela franchisada, balcão esse, essencial ao bom e normal funcionamento da loja.
O que ficou exposto no presente ponto constitui um claro e evidente incumprimento por parte da franchisada de tudo quanto resulta previsto na cláusula XVIII do Contrato de Franchising.
5) Não prestação de garantia bancária
A franchisada não prestou, até à presente data, a garantia bancária at first demand a favor da franchisante como deveria ter sucedido nos termos do disposto no n.º 2 da cláusula XXIX, constituindo mesmo o incumprimento contratual supra mencionado uma causa de resolução do contrato de franchising sem necessidade da presente interpelação, nos termos do disposto na alínea b) do ponto n.º 2 da cláusula XXVII do Contrato de Franchising.
6) Mora superior a trinta dias no pagamento de obrigações vencidas a favor da Franchisante
Na presente data a franchisada é devedora da franchisante de valores superiores a € 13.000,00, valores esses em mora já há mais de 60 dias, constituindo tal facto um claro incumprimento do disposto na alínea h) do ponto 3 da cláusula XXVII do Contrato de Franchising.
7) Não envio por parte da Franchisada à Franchisante dos documentos referentes a seguros
Até à presente data, a franchisada não enviou à franchisante cópias das condições gerais e particulares dos seguros referidos nos pontos 1, 2 e 3 da cláusula XIX do Contrato de Franchising, assim como não fez chegar até à franchisante cópias dos avisos de pagamento e respetivos comprovativos do pagamento o que constitui uma clara violação do disposto no ponto 4 da cláusula XIX do Contrato de Franchising.”
25. Tal mereceu a resposta da autora, enviada a 11 de Fevereiro de 2016, onde alega que as situações reportadas resultam “falta de verdade no negócio que nos foi vendido” e que o “Plano de negócios elaborado e fornecidos por V.ªs Ex.ªs revelou-se absolutamente desfasado da realidade … com manipulação evidente de dados” determinantes da inviabilidade do negócio vendido e a necessidade de rever o mesmo, alegando ainda:
“ (…) D) DA ALEGADA AUSÊNCIA RECORRENTE DOS GERENTES NA LOJA:
…o Plano de Negócios apresentado por Vªs. Exªs., que serviu de base à formação da vontade de contratar desta sociedade, seria bastante 1 (um) Gerente, para, mais tarde, virem alterar substancialmente estas condições, a verdade é que hoje a loja conta com 2 (dois) gerentes. Não obstante, sempre se dirá que esta sociedade, está vinculada ao cumprimento da Lei Laboral, nomeadamente as normas respeitantes ao intervalo de descanso, ao descanso diário e descanso semanal, o que nunca poderá ser interpretado como um incumprimento. De resto, bastará atentar no próprio texto do contrato para facilmente se compreender que é o próprio que prevê a possibilidade (evidente) de esporadicamente não se encontrar qualquer gerente na loja. O que pode desde já ser afiançado e corresponde à realidade é que, pelo menos, durante 95% do período de funcionamento da loja, encontra-se sempre presente um dos 2 gerentes de loja indicados no contrato (sem contabilizar o trabalho desenvolvido pelos gerentes fora dos períodos de abertura da loja ao público).
E) DA ALEGADA INEXISTÊNCIA DE STOCKS MÍNIMOS:
Neste ponto somos a manifestar a N/ completa surpresa com a V/ alegação, na verdade, esta questão sempre foi discutida entre as partes nas reuniões realizadas e encontra-se em análise a solução a adotar, pelo que apenas por má-fé podem alegar que esta sociedade está em incumprimento.
Ainda assim, sempre se dirá, na linha do que foi expendido supra, que o conteúdo dos deveres de prestação é determinado através da interpretação da lei e do negócio jurídico. Nesta medida, a declaração negocial desta sociedade aquando da celebração do contrato – no que à aquisição de mercadoria respeita – deve ser integrada de harmonia com a vontade que esta teria tido se houvesse previsto as omissões.
Vale isto por dizer que, na relação pré-contratual – leia-se apresentação do Plano de Negócios – Vªs. Exªs., deliberadamente, omitiram e falsearam todos os dados, sendo certo que estavam adstritos ao cumprimento dos deveres de lealdade e à obrigação de informar, ou seja, estavam adstritos a observar um comportamento segundo as regras da boa-fé o que, in casu, não se verificou. Ora, a conduta de Vªs. Exªs., conduziu à celebração de um contrato desvantajoso (leia-se ruinoso) para esta sociedade por violação dos deveres de cabal esclarecimento da V/ parte (culpa in contrahendo).
Assim sendo, no dia em que as condições previstas no Plano de Negócios sejam repostas, de imediato trataremos de manter os stocks mínimos previstos.
De todo o modo, sempre se acrescentará que, apesar das dificuldades que enfrentamos, nunca houve falha nem rutura de stock de qualquer produto essencial ao bom funcionamento do estabelecimento.
F) DO ALEGADO INCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PERANTE TERCEIROS:
Como ponto prévio esta sociedade afirma de forma categórica que é absolutamente falso tudo quanto vem alegado neste ponto, aliás, só por manifesto lapso ou desconhecimento da situação de facto poderão Vªs. Exªs. tecer acusações tão graves a esta sociedade.
Na linha do que foi expendido supra, para que se fale de incumprimento das obrigações assumidas por esta sociedade com terceiros necessário se torna que se conheçam as modalidades de cumprimento das obrigações acordadas entre as partes. Senão vejamos.
Em primeiro lugar, a relação ao fornecedor “Doce ...” não existe qualquer dívida vencida. As dificuldades de tesouraria fizeram atrasar os pagamentos, no entanto, de imediato falamos com o fornecedor em causa, solicitando-lhe autorização para efetuar o pagamento de valores de forma faseada, o que foi aceite e está a ser cumprido por esta sociedade.
Em relação à alegada dívida ao Locador do prédio onde se encontra a loja desta sociedade, fruto do contrato ruinoso celebrado com Vªs. Exªs. tem sido, de facto, difícil cumprir com os pagamentos das rendas. Contudo, esta sociedade pauta-se pelo escrupuloso cumprimento das suas obrigações e logrou atingir um acordo com o Locatário inexistindo qualquer incumprimento.
Relativamente à alegação de que esta sociedade está em incumprimento com os seus colaboradores, somos de rejeitar de forma categórica essa V/ alegação. Isto porque, é absolutamente falso que se encontrem em dívida quaisquer montantes aos funcionários.
Na verdade, ao contrário daquilo que ocorreu entre a Franchisante e a Franchisada, as condições que esta sociedade assegurou aos seus colaboradores em sede pré-contratual mantêm-se após a celebração do contrato e são escrupulosamente cumpridas.
G) DO ALEGADO INCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PERANTE O ESTADO:
Também neste ponto é completamente falso o alegado. Não existe qualquer incumprimento antes existe um acordo de pagamento celebrado com a Administração Tributária e onde foi apresentada garantia real de pagamento através de bens propriedade dos sócios.
H) NÃO PRESTAÇÃO DE GARANTIA BANCÁRIA:
Este ponto é uma completa novidade, surpresa e revela a manifesta má fé com que Vºs. Exªs. vêm atuando.
A garantia bancária contratualmente prevista deveria ter sido entregue no prazo de 60 dias após a assinatura do contrato. Ora esse prazo já há muito que decorreu. Além disso, no início do ano passado foi admitida a entrada como sócio da sociedade franchisada a sociedade X, Ldª. que adquiriu 49 % do respetivo capital social, com a Vª. Expressa anuência de Vªs. Exªs.. Nessa ocasião foi completamente ocultada a informação em causa. Ou seja, nessa data já existia o incumprimento que ora parecem querer invocar para resolver o contrato e nada foi dito à nova sócia a esse propósito.
De todo o modo e porque pautamos o n/ comportamento por princípios diametralmente opostos aos de Vªs. Exªs. estamos já a tratar da obtenção da aludida garantia bancária, sendo certo que o prazo de 10 dias fixado na V/ missiva é manifestamente insuficiente para o efeito. Para evitar qualquer incumprimento, enviamos em anexo o cheque nº 6599654648, no valor de 25.000,00 €, sacado sobre o banco caixa ..., emitido na presente data para caucionar o cumprimento da obrigação em causa, que não deve ser movimentado (salvo nas situações em que poderia ser acionada a garantia) e deve ser restituído após a apresentação da garantia bancária.
I) DA ALEGADA MORA NO PAGAMENTO À FRANCHISANTE:
Neste ponto somos de manifestar a N/ completa surpresa, isto porque, apenas por lapso ou, em oposição, por manifesta e despudorada má-fé podem alegar qualquer mora desta sociedade.
É que, como resulta daquilo que vem exposto na presente, Vªs. Exªs. têm vindo a incumprir sucessiva e reiteradamente as obrigações que assumiram aquando da celebração do contrato, levando-nos, por via disso, a uma situação ruinosa que nos impede de cumprir pontualmente com as n/ obrigações.
Note-se, que a necessidade de investimento para este negócio, de acordo com o Plano de Negócios que nos foi vendido, se situaria entre 200.000,00 € e 250.000,00 €. Ora, nesta data já injetamos na sociedade 343.000,00 € e continuamos a necessitar de fazer mais suprimentos para fazer face aos prejuízos que vamos acumulando. Ou seja, o n/ atraso no cumprimento das n/ obrigações deriva do V/ reiterado incumprimento das obrigações que assumiram.
J) DO NÃO ENVIO DOS DOCUMENTOS REFERENTES AO CONTRATO DE SEGURO:
Relativamente ao último ponto da V/ missiva apenas de ressalvar que esta sociedade celebrou e mantém válidos todos os seguros estipulados no contrato, sendo certo que, nunca nos foi solicitado o seu envio.
Não obstante, seguem anexos à presente os documentos agora solicitados. (…)”.
26. Por carta registada de 23 de Fevereiro de 2016, recebida pela autora em 24 de Fevereiro de 2016, a ré comunicou que procedia “com efeitos imediatos, à resolução do mesmo [contrato de franchising] com justa causa”, nos seguintes termos:
“À Y, LDA.
Rua ..., n.º ...
… PORTO
Assunto: Resolução do Contrato de Franchising celebrado em 05 de dezembro de 2013
Braga, 23 de fevereiro de 2016
Exmos. Senhores:
No passado dia 05 de fevereiro, por correio eletrónico e correio registado (CTT), esta sociedade, na qualidade de franchisante enviou a V/ Exas., na qualidade de franchisada, uma interpelação admonitória para cumprimento de obrigações que considerava e considera estarem em mora e que decorrem do Contrato de Franchising celebrado em 05 de dezembro de 2013, contrato esse que teve como objeto o direito de utilização dos Sistema SP., assim como os seus sinais distintivos e todo o modelo de negócio associado.
Não obstante a interpelação efetuada e, não obstante o prazo de dez dias concedido a V/ Exas. para que colocassem termo a todas as situações de incumprimento denunciadas na mencionada missiva, certo é que, decorrido o prazo concedido, a franchisada limitou-se a enviar à franchisante em 15 de fevereiro do mês em curso um comunicação em que procura desculpar e justificar todas as situações de incumprimento identificadas na interpelação de 05 de fevereiro com o facto do Plano de Negócios, elaborado aquando da celebração do contrato de franchising, não ter total correspondência com a realidade verificada pela e segundo a franchisada.
Ora, a respeito do plano de negócios apenas e só dirá a franchisante que esse só consistiu numa ferramenta elaborada em conjunto pela franchisante e franchisada, a pedido desta, com o intuito de apoiar a franchisada na viabilização de um financiamento bancário. E, tanto assim foi que, ainda antes de ter sido sequer abordado ou até mesmo elaborado em conjunto o referido plano de negócios, a franchisante cedeu, para análise e estudo, todas as suas contas referentes à loja de Braga à franchisada, contas essas, reais e mais credíveis do que qualquer plano que, necessariamente, é dependente de variáveis e pressupostos não controlados pela franchisante ou pela franchisada.
Ainda, em face da argumentação apresentada por V/ Exas. na missiva enviada em resposta à n/interpelação datada de 05/02/2016, sempre se dirá ainda que, nunca, em momento algum, foi garantido ou até mesmo associado o mencionado plano de negócios à celebração do contrato em causa ou a uma garantia de sucesso, porquanto, a ser assim, ter-se-ia que se ter como pressuposto base e ponto de análise o investimento realizado como um investimento sem qualquer tipo de risco associado, o que não se coaduna com a natureza da situação em causa.
Certo é que, todas as situações de incumprimento oportunamente denunciadas e que integraram a comunicação expedida a V/ Exas. em 05/02/2016 se mantêm na presente data, sendo que, de forma objectiva, a comunicação remetida por V.Exas se traduz numa declaração e intenção de não cumprir e não regularizar qualquer das situações em falta.
Por outro lado, é igualmente inequívoco que, não solicitou a franchisada qualquer prazo suplementar com vista a poder usar do mesmo para cessar todas as situações de incumprimento que foram devidamente referenciadas.
Assim, na presente data encontram-se a incumprir V/ Exas. as seguintes obrigações que decorrem do Contrato de Franchising:
1) Ausência recorrente dos gerentes na loja
Verifica-se que, recorrentemente, qualquer um dos dois gerentes da loja se encontram ausentes na mesma, situação que consubstancia um incumprimento do n.º 3 da cláusula X do Contrato de Franchising.
2) Inexistência dos stocks mínimos previstos
A franchisada não possui neste momento os stocks mínimos no que respeita a gelados e consumíveis, matérias de embalagem e descartáveis, encontrando ainda a incumprir os prazos de encomenda essenciais para a entrega no prazo contratualmente previsto. As situações descritas neste ponto, correspondem ao incumprimento de tudo quanto resulta previsto no n.º 2 da cláusula XII, conjugada com o anexo VIII do Contrato de Franchising e ainda do n.º 5 também da cláusula XII. Para além da falta de stock mínimo existem quebras efectivas de stock em diversos produtos o que põe em causa o fornecimento de diversos produtos ao cliente.
3) Incumprimento de obrigações perante terceiros
i. A franchisada é na presente data devedora a terceiros de montantes superiores a € 33.000,00. No que respeita ao fornecedor “Doce ...”, a franchisada mantém faturas vencidas e não pagas no valor de € 4.931,06 desde 25/06/2015;
ii. É igualmente devedora a franchisada de, pelo menos, duas rendas vencidas junto do senhorio do prédio onde se encontra a loja SP. por si explorada, no valor de € 6.400,00;
iii. Na presente data a franchisada tem ainda, para com os seus trabalhadores, os duodécimos devidos no mês de Janeiro em atraso.
As situações descritas neste ponto, correspondem ao incumprimento do disposto no n.º 1 e 2 da cláusula XVII do Contrato de Franchising.
4) Incumprimento de obrigações perante o Estado
A franchisada é devedora, na presente data, de montantes superiores a € 14.000,00 junto da Autoridade Tributária, valores estes referentes a IVA não entregue ao Estado, sendo que, se encontram já pendentes execuções fiscais propostas pela Autoridade Tributária para recuperação desses valores e em que figura como executada a franchisada. No âmbito de uma dessas execuções foi mesmo já penhorado um balcão da loja explorada pela franchisada, balcão esse, essencial ao bom e normal funcionamento da loja.
O que ficou exposto no presente ponto constitui um claro e evidente incumprimento por parte da franchisada de tudo quanto resulta previsto na cláusula XVIII do Contrato de Franchising.
5) Não prestação de garantia bancária
A franchisada não prestou, até à presente data, a garantia bancária at first demand a favor da franchisante como deveria ter sucedido nos termos do disposto no n.º 2 da cláusula XXIX, constituindo mesmo o incumprimento contratual supra mencionado uma causa de resolução do contrato de franchising sem necessidade da presente interpelação, nos termos do disposto na alínea b) do ponto n.º 2 da cláusula XXVII do Contrato de Franchising.
6) Mora superior a trinta dias no pagamento de obrigações vencidas a favor da Franchisante
Na presente data a franchisada é devedora da franchisante de valores superiores a € 13.000,00, valores esses em mora já há mais de 60 dias, constituindo tal facto um claro incumprimento do disposto na alínea h) do ponto 3 da cláusula XXVII do Contrato de Franchising.
7) Não envio por parte da Franchisada à Franchisante dos documentos referentes a seguros
Até à presente data, a franchisada não enviou à franchisante cópias das condições gerais e particulares dos seguros referidos nos pontos 1, 2 e 3 da cláusula XIX do Contrato de Franchising, assim como não fez chegar até à franchisante cópias dos avisos de pagamento e respetivos comprovativos da pagamento o que constitui uma clara violação do disposto no ponto 4 da cláusula XIX do Contrato de Franchising, tendo apenas remetido para a franchisante documentos do seguro onde está revelado o incumprimento do mínimo de capital para a responsabilidade civil, que deveria ser, nos termos contratualmente estabelecidos, de € 500.000,00 euros e que nos documentos apresentados é de € 50.000,00, ou seja, equivalente a um décimo do exigido.
Em face da gravidade de cada uma das situações de incumprimento supra descritas e dos danos que esse incumprimento reiterado acarreta para a franchisante e para a marca SP., bem como da posição assumida na sequência da interpelação anteriormente efectuada, considera-se a obrigação contratual definitivamente incumprida por culpa exclusiva de V.Exas, tendo perdido a franchisante efetiva e definitivamente o interesse na manutenção do referido contrato pelo que, pela presente, procede-se, com efeitos imediatos, à resolução do mesmo com justa causa.

Como consequência da resolução do contrato de franchising ora efetivada, desde já se notificam V/ Exas. para:
“a) Cessar o uso da marca registada SP. – CUPCAKES & COFFEE;
b) Cessar o uso do Sistema SP., assim como os seus sinais distintivos, incluindo receitas, layout e decoração de loja, uniformes, Mobiliário especifico da marca e todo o modelo de negócio associado, através da loja sita na Rua ..., n.º ..., freguesia de …, …, …, …, … e … – Porto;
c) Proceder ao pagamento à W LDA. da quantia de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) nos termos do disposto no n.º 1 da cláusula XXVIII do contrato de franchising, sem prejuízo de outras indemnizações devidas e/ou que venham a ser peticionadas pela W LDA.;
d) Pagamento de todas as quantias vencidas e não pagas por efeito da execução do contrato de franchising, designadamente as quantias devidas a título de “royalties” bem como, de todas as mercadorias efetivamente fornecidas pela W LDA. a V/ Exas. no período em que durou o contrato ora resolvido.”
27. No dia 25 de Fevereiro de 2016 por email e por carta expedida a 26 de Fevereiro de 2016, a autora invocou a falta de fundamento para a resolução, por inexistir qualquer incumprimento da sua parte, e aludiu à falta de viabilidade inicial do negócio.
28. Desde a entrada da “X Lda.” no capital social da autora, a ré nunca lhe aplicou qualquer penalidade, nem nunca antes exigira por escrito ou oralmente a apresentação da garantia bancária.
29. A autora apresentou à ré um cheque caução para substituir a garantia bancária, datado de 15 de Fevereiro de 2016 no valor de 25.000,00 Eur. (vinte e cinco mil euros), após o recebimento da carta referida em 23.
30. O cheque sacado sobre a Caixa … foi apresentado a pagamento pela autora e devolvido na compensação a 1 de Março de 2016 por “falta de provisão”.
31. A abertura da loja do Porto no dia 15 de Julho de 2014 contribuiu para o aumento de clientela da marca.
32. Essa clientela, angariada pela autora, continua fiel à marca e aguardou a abertura de novo estabelecimento, até porque tal foi anunciado pela ré pelas redes sociais.
33. A ré determinou a fixação da remuneração do pessoal da autora em 700,00 € líquidos.
34. Em face do encerramento da loja, a ré foi obrigada a dispensar os seus trabalhadores, sendo que dos nove com que na altura contava celebrou acordo com oito, pagando compensação de valor não concretamente apurado.

Da contestação:

35. A ré é uma sociedade comercial com sede em Braga que tem por objecto a “Produção, distribuição e exploração de espaços de venda de bebidas, pastelaria e gelados. Exploração e gestão de conceitos de franchising. Formação e consultoria em pastelaria, gelataria, bebidas, café, franchising e negócios.”.
36. A ré é legítima titular do “Sistema SP.” e de todos os respectivos direitos imateriais, bem como detentora da marca registada “SP. – CUPCAKES & COFFEE”.
37. O mencionado sistema tem por objecto a produção e a comercialização de gelados, cupcakes, cafetaria e afins, através de estabelecimentos comerciais.
38. No desenvolvimento da sua actividade comercial, a ré explora desde Julho de 2011, com intuito lucrativo, o estabelecimento comercial conhecido por “SP.” sito no Largo …, n.º .., em Braga.
39. Com vista a expandir e promover o “Sistema SP.”, decidiu conceder a terceiros a possibilidade, mediante candidatura prévia, de utilizar o sistema até então por si desenvolvido, através da celebração de um contrato de franquia, mediante as informações que fez constar no seu site www.SP.cupcakes.com, designadamente perfil da loja, perfil do candidato, elementos que integravam o sistema, localidades disponíveis para a abertura da loja, termos e condições que deveriam ser conhecidas antes da submissão da candidatura.
40. Em face do elevado número de candidaturas recebidas, iniciou a ré um processo de selecção das mesmas, tendo recebido a candidatura da autora.
41. A reunião referida em 1. visou que os representantes legais da autora à data, esclarecessem questões quanto à apresentação da candidatura ao franchising.
42. Tendo sido facultadas as contas da ré, referentes à loja de Braga.
43. E sendo transmitido que seria possível a loja do Porto atingir maior volume de vendas, em face da dimensão da cidade e do potencial número de clientes.
44. Por essa altura, pelo representante da ré foi referido a G. A. e a H. M. que, para abertura da loja “SP.” no Porto seria necessária uma verba de cerca de 200.000,00 (duzentos mil euros), mas que tal dependia do espaço a arrendar para a loja, sendo que, pelo menos 60% desse valor, deveriam ser capitais próprios.
45. Só depois foi enviada a candidatura referida em 3. e a mesma foi aceite pela ré.
46. No formulário da candidatura H. M. informou da disponibilidade e intenção de investir no projecto 200.000,00 € (duzentos mil euros) em capitais próprios, o que não se verificou.
47. Os representantes da autora solicitaram o auxílio do representante da ré para, conjuntamente, realizarem algumas simulações de planos de negócios, os quais teriam como finalidade instruir e apoiar a obtenção de apoios e financiamentos, designadamente ao programa “Comércio Invest”.
48. O que deu origem ao email referido em 4. e 5.
49. A filosofia de trabalho da ré foi transmitida à autora ao longo de seis semanas de formação, dadas aos membros da equipa de pastelaria e quatro semanas de formação dadas aos membros da equipa de baristas, aos quais foi adicionado apoio inicial e presencial aquando da abertura da loja.
50. Com a formação inicial, a ré entregou à autora receitas de bebidas e frapés, receitas dos produtos de pastelaria, assim como novas receitas para novos produtos e vídeos exemplificativos de procedimentos, disponibilizados em simultâneo no grupo privado de facebook, designado de “Família SP.” criado para o efeito.
51. A ré não decidiu as quantidades compradas pela autora junto de cada fornecedor e, no caso, junto da ré.
52. A ré não garantiu à autora que o “Sistema SP.”, gerasse uma margem “específica/fixa”.
53. A autora teve várias e diversas quebras no gelado por acondicionamento precário e má gestão de stocks.
54. A 27 de Janeiro de 2015 foi realizada uma auditoria à loja da autora, no Porto, pela “XX – Engenharia e Segurança Alimentar” para avaliação de diagnóstico ao estabelecimento, cujo relatório veio a assinalar o seguinte:
“a) inadequada localização de extintores;
b) limpeza não efectuada;
c) armazenamento incorrecto de produtos, utensílios e equipamentos de higienização, por forma a prevenir contaminações;
d) produtos fora de prazo de validade;
e) produtos fora da embalagem original sem qualquer identificação;
f) produtos colocados directamente no pavimento;
g) produtos não identificados, produtos em embalagem imprópria ou degradada;
h) balcões em mau estado de conservação;
i) falta de diferenciação de zonas e presença de utensílios na zona de preparação;
j) lavatórios sem detergentes / desinfectante e sem dispositivo de secagem / toalhas descartáveis;
k) desperdícios colocados em contentores sem tampa;
l) telemóveis, vestuário e calçado dos funcionários fora dos cacifos”.
55. Em face de todas as desconformidades apuradas na auditoria anteriormente mencionada, fez a empresa auditora, constar do relatório as seguintes observações:
“No presente relatório são apresentadas as não-conformidades detectadas aquando da auditoria. Para todas as não-conformidades é apresentada uma sugestão de melhoria, que deve ser implementada com a maior brevidade possível.”
56. Pelo menos numa ocasião o gerente C. M. retirou da loja do Porto diversas cubas com gelado, a que deu destino desconhecido, e que ali não foram vendidas a clientes da autora.
57. Os tamanhos de gelado da “SP.” sempre tiveram 3 dimensões de copo: 80cc, 120cc e 160cc.
58. No “plano de negócios” mencionado pela autora o valor de 2,00 € dizia respeito ao preço médio do produto “gelados e afins”, logo era o preço médio para todos os tamanhos de gelado.
59. Na loja “SP.” de Braga, loja frequentada pelos representantes da autora e na qual tiveram formação, praticava-se o preço de 2,00 € para o copo pequeno de gelado, 2,70 € para o copo médio e de 3,50 € para o copo grande.
60. Além de a autora vender gelado em vários tamanhos e preços, também usava esse mesmo gelado para confecionar diversas bebidas frias.
61. A autora não atendeu nos seus cálculos às variações dos preços de mercado das matérias-primas essenciais à produção dos produtos comercializados pela ré.
62. Os preços dos produtos comercializados no estabelecimento pela autora eram sugeridos pela ré à autora, sendo o valor final estabelecido por acordo entre as partes, como sucedeu com o envio do email referido em 20.
63. Os fornecedores a contratar pela autora eram validados pela ré, mas nunca foi rejeitado nenhum novo fornecedor proposto pela autora.
64. A carta referida em 24. foi também enviada por email de 05/02/2016, para o endereço Y.lda@gmail.com, que havia ficado convencionado pelas partes, nos termos e para os efeitos do n.º 3 da cláusula XXXII do contrato de franquia.
65. O cheque referido em 29. e 30. foi apresentado a pagamento por forma a poderem ser pagas quantias que eram já devidas pela autora à ré.
66. E foi o mesmo dado como título na acção executiva iniciada a 4 de Março de 2016 pela ré contra a autora para cobrança do valor titulado pelo cheque.
67. Em finais de Fevereiro de 2016 a autora era devedora a fornecedores, à Autoridade Tributária, à Segurança Social e à Banca de quantias superiores a € 190.000,00 (cento e noventa mil euros).
68. Depois de requerida a insolvência da autora, a mesma apresentou um PER, onde foram reclamados créditos que ascendem ao montante de € 483.429,53 (quatrocentos e oitenta e três mil, quatrocentos e vinte e nove euros e cinquenta e três cêntimos).
69. A autora manteve a loja sita na Rua ..., n.º ..., no Porto, aberta até ao dia 26/02/2016, inclusive.
70. A autora não enviou à ré cópias das condições gerais e particulares dos seguros referidos nos pontos 1, 2 e 3 da cláusula XIX do contrato, assim como não fez chegar àquela cópia dos avisos de pagamento e comprovativos de pagamento, a não ser após a comunicação referida em 24..
71. A autora contratou um seguro para a responsabilidade civil com capital de 50.000,00 € (cinquenta mil euros).
72. Quer a G. A., quer o C. M., pessoa que passou a exercer o cargo de gerente da loja do Porto desde 23 de Janeiro de 2015, juntamente com H. M., não faziam um acompanhamento permanente do estabelecimento.
73. Os gerentes de loja não se encontravam diariamente presentes na abertura e no fecho da loja, não estavam presentes à noite na loja, período que correspondia a cerca de 40 % do horário total em que loja se mantinha aberta, sendo mais assíduo H. M..
74. Verificou-se em diversas ocasiões falta de stock mínimo em loja, principalmente nos meses anteriores à resolução do contrato, e existiram quebras efectivas de stock em diversos produtos, bem como houve produtos da lista exposta e publicitada nas redes sociais que estavam esgotados na loja do Porto.
75. A autora, incumpria ainda, de forma reiterada, os prazos de encomenda dos produtos à ré designadamente de gelados, deixando muitas das vezes terminar o seu stock para só o encomendar, situação que, por vezes, motivou inexistência de stocks e, consequentemente impossibilidade de venda de produtos aos clientes.
76. Em finais de Janeiro de 2016, a autora era devedora a diversos fornecedores de facturas já vencidas.
77. Era devedora de rendas vencidas ao senhorio onde se encontrava instalada a loja “SP.”.
78. Pagava as retribuições aos seus trabalhadores com atraso.
79. À data da resolução do contrato a autora era devedora à Autoridade Tributária de IVA não entregue, em valor superior a € 14.000,00 (catorze mil euros).
80. No âmbito de execução fiscal instaurada pela Autoridade Tributária tinha já sido penhorado um balcão da loja “SP.” do Porto, concretizada no horário em que a loja se encontrava aberta ao público e com clientes no interior da mesma.
81. Situação que gerou desconfiança e levou os clientes a questionar os funcionários acerca do que se estava a passar.
82. À data da resolução do contrato a autora era devedora à ré de valores superiores a € 13.000,00 (treze mil euros), há mais de 60 dias.
83. O salário a fixar aos colaboradores da autora, foi segundo indicação dada pela ré tendo por base a sua experiência no que respeita aos recursos humanos, bem como, a importância que atribui à manutenção da motivação dos seus colaboradores e ainda por critérios de justiça social.
84. O valor do vencimento a pagar aos colaboradores sempre foi um dado do conhecimento da autora, antes e depois de celebrar o contrato.
85. Foi a autora quem fixou o horário de funcionamento da sua loja do Porto, tendo optado por manter o seu estabelecimento em funcionamento num horário mais alargado do que o da loja de Braga, sem que a ré se tenha oposto ou interferido por qualquer forma.
86. A autora pagava vencimentos aos seus gerentes, correspondentes a um período de trabalho a tempo inteiro.
87. No decurso da execução do mencionado contrato, a ré vendeu à autora “Y, Lda.”, a solicitação desta, diversos bens do seu comércio, assim como, no decurso da execução do contrato de franchising a franquiadora emitiu em nome da franquiada diversas facturas referentes a “royalties” devidos e vencidos ao abrigo do contrato celebrado, mormente:
a. Factura n.º 212, emitida e vencida em 01.10.2015, no valor de € 946,97 €;
b. Factura n.º 214, emitida e vencida em 06.10.2015, no alor de € 398,46;
c. Factura n.º 215, emitida e vencida em 08.10.2015, no valor de € 2.097,94;
d. Factura n.º 217, emitida e vencida em 15.10.2015, no valor de € 613,45;
e. Factura n.º 220, emitida e vencida em 02.11.2015, no valor de € 510,66;
f. Factura n.º 221, emitida e vencida em 05.11.2015, no valor de € 162,69;
g. Factura n.º 222, emitida e vencida em 07.11.2015, no valor de € 2.085,81;
h. Factura n.º 224, emitida e vencida em 12.11.2015, no valor de € 480,87;
i. Factura n.º 226, emitida e vencida em 17.11.2015, no valor de € 1.995,05;
j. Factura n.º 227, emitida e vencida em 17.11.2015, no valor de € 798,86;
k. Factura n.º 229, emitida e vencida em 26.11.2015, no valor de € 629,58;
l. Factura n.º 234, emitida e vencida em 04.12.2015, no valor de € 975,66;
m. Factura n.º 236, emitida e vencida em 05.12.2015, no valor de € 1.151,67;
n. Factura n.º 238, emitida e vencida em 14.12.2015, no valor de € 333,99;
o. Factura n.º 241, emitida e vencida em 19.12.2015, no valor de € 941,20;
p. Factura n.º 242, emitida e vencida em 19.12.2015, no valor de € 919,60;
q. Factura n.º 244, emitida e vencida em 28.12.2015, no valor de € 1.958,80;
r. Factura n.º 245, emitida e vencida em 07.01.2016, no valor de € 1.090,97;
s. Factura n.º 248, emitida e vencida em 23.01.2016, no valor de € 1.540,91;
t. Factura n.º 249, emitida e vencida em 23.01.2016, no valor de € 1.021,80;
u. Factura n.º 250, emitida e vencida em 29.01.2016, no valor de € 643,23;
v. Factura n.º 251, emitida e vencida em 29.01.2016, no valor de € 597,80;
w. Factura n.º 252, emitida e vencida em 29.01.2016, no valor de € 36,04;
x. Factura n.º 255, emitida e vencida em 04.02.2016, no valor de € 969,13;
y. Factura n.º 256, emitida e vencida em 08.02.2016, no valor de € 561,96;
z. Factura n.º 257, emitida e vencida em 15.02.2016, no valor de € 957,16 e
aa. Factura n.º 259, emitida e vencida em 22.02.2016, no valor de € 9.619,04.
88. Não obstante, foram também emitidas as seguintes notas de créditos:
a. Nota de crédito n.º 7, emitida e vencida em 18.08.2015, no valor de € 6.649,45;
b. Nota de crédito n.º 8, emitida e vencida em 28.08.2015, no valor de € 8.241,66;
c. Nota de crédito n.º 10, emitida e vencida em 25.09.2015, no valor de € 224,7;
d. Nota de crédito n.º 11, emitida e vencida em 01.11.2015, no valor de € 909,13;
e. Nota de crédito n.º 12, emitida e vencida em 22.02.2016, no valor de € 281,25, referente à entrada em vigor da nova tabela de preços de 16.12.2015.
89. Os originais das respectivas facturas foram entregues à autora, após o fornecimento dos bens constantes das mesmas ou após o facto que originou a sua emissão, tendo a autora recebido essas facturas e delas não apresentou qualquer reclamação.
90. Do encontro dos "débitos" e "créditos" decorrentes destas transacções a aqui autora permanece como devedora da aqui ré do montante de € 17.796,64 (dezassete mil setecentos e noventa e seis euros e sessenta e quatro cêntimos).
91. Na sequência da comunicação referida em 24. a autora nada fez para alterar as situações relatadas, nem solicitou qualquer prazo suplementar à ré com vista a poder usar do mesmo para cessar as mesmas.
92. Não obstante a comunicação referida em 26. a autora não cessou de imediato o uso da marca “SP. – CUPCAKES & COFFEE”, não cessou o uso do “Sistema SP.”, assim como os seus sinais distintivos, incluindo receitas, layout e decoração de loja, uniformes, mobiliário específico da marca.
93. A ré goza de grande credibilidade junto do público, em virtude dos elevados padrões de qualidade dos seus produtos, associada à marca “SP. – CUPCAKES & COFFEE”, tendo ao longo dos anos da actividade granjeado uma imagem de prestígio, profissionalismo e notoriedade no mercado.
94. Goza de notoriedade junto da rede social “Facebook” em que conta, actualmente com cerca de 420.000 seguidores, sendo uma das marcas nacionais com maior número de seguidores.
95. O encerramento da loja “SP.” no Porto, causou a insatisfação generalizada dos clientes da marca, os quais, perante tal facto começaram a questionar, por várias formas e através da rede social “Facebook” os motivos que lhe estavam subjacentes.
96. A ré viu esta situação ser comentada pela concorrência e clientes.
97. O que motivo de vexame, desgostos, mal-entendidos e contrariedades para os responsáveis da ré.
98. Aquando do encerramento do estabelecimento comercial da autora, esta não acautelou a remoção e inutilização de todos os bens que integravam o estabelecimento e que continham sinais distintivos e directamente associáveis à “SP.”.

Da documentação dos autos:

99. Por sentença proferida a 15 de Novembro de 2017, transitada em julgado a 7 de Dezembro de 2017, no âmbito do processo n.º 6382/17.8T8VNG, do Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia – Juiz 2, foi declarada a insolvência da “Y, Lda.”, tendo sido nomeada Administradora da insolvência C. F., e fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos, bem ainda designado o dia 4.01.2018, pelas 14.00 horas, para a realização da assembleia de apreciação do relatório.
100. O aludido processo seguiu-se a um processo de revitalização iniciado pela autora, encerrado sem aprovação de qualquer plano.
101. E veio o mesmo processo de insolvência a ser encerrado nos termos dos arts. 230.º, n.º 1, al. d) e 232.º, n.º 2 do CIRE – “Quando o administrador da insolvência constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo e as restantes dívidas da massa insolvente.”, por despacho proferido a 20.02.2018, transitado em julgado a 9.03.2018.
102. Por sentença proferida a 26 de Abril de 2019, transitada em julgado a 20 de Maio de 2019, no âmbito do apenso “B” do aludido processo n.º 6382/17.8T8VNG, na sequência de parecer nesse sentido dado pela Administradora da insolvência e do Ministério Público, decidiu-se:
“1. Qualificar a insolvência da sociedade “Y, Lda.” como culposa;
2. Declarar afetados pela qualificação da insolvência como culposa os requeridos H. M. e C. M..
3. Decretar a inibição de H. M. e C. M. para administrarem patrimónios de terceiros pelo período de três anos.
4. Declarar H. M. e C. M. inibidos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de três anos.
5. Determinar a perda de quaisquer créditos dos requeridos H. M. e C. M. sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente, condenando-os na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.
6. Condenar os requeridos a indemnizarem os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, valor a apurar em liquidação de sentença.
Custas pelos requeridos.
Registe e notifique.”
103. No aludido processo foram dados como provados, entre outros os seguintes:
“4. Em 11/3/2016 a “FT. – Comércio de Equipamentos de Frio e Ar Condicionado, Lda. apresentou um processo a requerer a declaração de insolvência da “Y, Lda.” que deu origem ao processo n.º 2164/16.2T8VNG que correu termos no 1.º juízo deste tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia.
5. Em 17/3/2016 foi remetida à “Y, Lda.” carta de citação para, querendo, deduzir oposição ao pedido de insolvência formulado no processo referido em 4.
6. Em 26/4/2016 foi determinada a suspensão do processo de insolvência referido em 4. pelo facto de a devedora ter apresentado o PER mencionado em 7.
7. Em 1/4/2016 a “Y, Lda.” apresentou um processo especial de revitalização que correu termos sob o n.º 2796/16.9T8VNG neste 2.º juízo do tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia.
9. O Sr. Administrador Judicial provisório nomeado no processo mencionado em 7. apresentou a lista provisória de créditos reconhecidos cuja cópia se encontra junta a fls. 67, tendo reconhecidos créditos no valor global de €483.429,53 aos seguintes credores: Banco …, SA, Caixa ..., Eletricidade … Comercial, FT., Doce ..., Instituto de Segurança Social, L., J. D., J. P., Ministério Público, NG., …, S., W e NC..
10. A “Y, Lda.” deduziu nesse processo impugnação dessa lista provisória nos termos constantes da impugnação cuja cópia se encontra junta a fls. 338 e seguintes e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
11. Em 10/8/2016 a “Y, Lda.” apresentou no processo de revitalização referido em 7. O requerimento cuja cópia se encontra junta a fls. 279/280 através do qual comunica ao tribunal que, no dia 5/8/2016, outorgou o contrato de trespasse junto a fls. 80/83, que nos termos desse contrato iria receber de imediato a quantia de €172.456,67, valor esse superior aos débitos reconhecidos e vencidos, pelo que comunicou ao Sr. AJP a intenção de pôr termo às negociações e encerrar o processo.
12. Por decisão de 24/11/2016 o tribunal declarou encerrado o processo negocial e, considerando que o Sr. AJP já havia apresentado parecer no sentido de que a devedora se encontrava insolvente, foi determinada a extracção de certidão para processo de insolvência, que originou o processo de insolvência a que os presentes autos estão apensos.
16. A “Y, Lda.” foi citada para, querendo, deduzir oposição no processo de insolvência, não o tendo feito.
19. Em 4 de abril de 2016 a insolvente outorgou com a “SC., Unipessoal, Lda.” O “Contrato de Trespasse” cuja cópia se encontra junta a fls. 80/83 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
20. O contrato de trespasse referido em 19 foi resolvido em Novembro de 2016 através da carta cuja cópia se encontra junta a fls. 84/86 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
21. Em Junho de 2017 a insolvente subscreveu o “contrato-promessa de compra e venda” do imóvel onde estava localizado o seu estabelecimento comercial com J. O. cuja cópia se encontra junta a fls. 649 e seguintes e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
22. Em Julho de 2017 a insolvente outorgou transacção no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 1729/17.0T8PRT no 1.º juízo da Instância Central Cível do Porto dando sem efeito a comunicação de resolução que havia remetido à “SC., Unipessoal, Lda.” nos termos constantes de fls. 669/671.
23. Entre 29/8/2016 e 25/8/2017 a devedora fez pagamentos a credores no valor global de €169.399,76.
24. Através do contrato de trespasse referido em 19 e da transacção mencionada em 22 a insolvente alineou o estabelecimento comercial onde laborava, com todo o seu ativo.
25. Nesse contrato incluía-se todo o seu imobilizado que foi avaliado em €98.388,24.
26. A renda mensal do estabelecimento comercial explorado pela insolvente era de €3.200,00 mensais.
27. No contrato de arrendamento celebrado pela insolvente com a sociedade “N. A., Sociedade Imobiliária, Lda.” constava uma cláusula expressa de opção de compra que poderia ser accionada pela insolvente com desconto no preço de todas as rendas pagas até à efetivação da escritura.
28. Em 9 de Janeiro de 2018 a Sra. administradora da insolvência nomeada no processo de insolvência apresentou a lista de credores reconhecidos e não reconhecidos, reconhecendo créditos no valor de €550.652,70 a título de capital aos seguintes credores: Instituto de Segurança Social, IP, Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP, J. O., J. P., Ministério Público e “W, Lda.”
29. Em 10/4/2018 foi declarada extinta a reclamação de créditos por inutilidade superveniente da lide por força da decisão referida em 18.
30. A contabilidade da insolvente foi organizada até 31/12/2016.
31. A insolvente cessou atividade para efeitos de IVA em 31/12/2016.
32. A insolvente não depositou contas do ano de 2016.
33. A insolvente não tem contabilidade relativa ao ano de 2017.”
104. E na fundamentação pode ler-se, entre o mais, o seguinte:
“Da factualidade dada como assente resulta que a insolvente se apresentou a um PER em 1/4/2016, sendo que, em 4/4/2016 outorgou o contrato de trespasse cuja cópia se encontra junta a fls. 80/83.
Nesse contrato de trespasse ficou a constar que o preço era de €235.000,00, no qual se inclui o valor do imobilizado que ascendia a €93.388,24.
Da factualidade dada como provada resulta que tal contrato de trespasse veio a ser resolvido pela insolvente em novembro de 2016.
Após essa data, mais concretamente em junho de 2017 a insolvente outorgou o contrato promessa (cuja cópia se encontra junta a fls. 649 e seguintes) referente a esse estabelecimento comercial. Nesse contrato-promessa a insolvente declarou ter recebido o valor de €120.000,00 a titulo de sinal e princípio de pagamento, o que originou a reclamação de créditos apresentada nestes autos pelo promitente-comprador e o reconhecimento desse crédito por parte da Sra. Administradora da insolvência (crédito esse que não foi impugnado).
Não obstante a outorga desse contrato-promessa, em junho de 2017 a insolvente outorgou com a trespassária uma transacção judicial dando sem efeito a resolução do contrato de trespasse nos termos constantes de 669/671.
A devedora acabaria, no entanto, por vir a ser declarada insolvente em 15/11/2017.
Apurámos nos autos que parte do preço recebido por força do contrato de trespasse foi usado pela insolvente para pagamento de créditos vencidos.
Na verdade, entre 29/8/2016 e 25/8/2017 a insolvente terá pago a credores o montante de €169.399,76.
Ante o que resultou provado não se nos afigura que tenha existido qualquer ocultação ou desaparecimento de património da devedora.
A questão que se nos coloca é a de saber se existiu disposição de bens em proveito pessoal.
Ora, o preço do trespasse foi de €235.000,00.
A insolvente procedeu ao pagamento a credores de €169.399,76.
Parte do preço do trespasse foi pago diretamente pela trespassária ao Banco … Leasing – o valor de €20.810,34.
Assim, apurámos qual foi o destino dado a €190.210,10.
Não foi dada qualquer explicação em juízo quanto aos restantes €44.789,90 respeitantes à diferença entre o valor do trespasse e o que terá sido pago aos credores.
Era aos requeridos que se impunha fazer a prova de que todo o valor recebido pelo trespasse fora aplicado no pagamento a credores.
Entendemos que os requeridos não lograram fazer a prova de que todo o montante recebido foi entregue no pagamento de dívidas a credores. Ademais, os mesmos não provaram que a trespassária não pagou integralmente o preço acordado.
Assim, ter-se-á que concluir que não foi feita prova nos autos que a totalidade do preço recebido pelo trespasse foi entregue aos credores.
Cumpre salientar que a insolvente terá recebido por força do trespasse o valor de €25.000,00 em julho de 2017, data da transacção.
Ora, em 2017, a insolvente já havia cessado a sua actividade para efeito de IVA – o que fez em 31/12/2017 – não tendo contabilidade organizada no ano de 2017.
Essa falta de contabilidade apenas pode ser imputada aos requeridos, sendo certo que a mesma impede que se apure qual o destino dado pela insolvente a parte dos valores recebidos em consequência do trespasse.
Os requeridos, na qualidade de gerentes da insolvente, teriam que saber que tinham a obrigação de manter a contabilidade da insolvente organizada de maneira a que na mesma pudessem estar reflectidos todos os movimentos financeiros realizados, o que não foi feito.
Ante o exposto, essa falta, que só a eles é imputável, impediu e impede os seus credores de verificarem que destino foi dado a parte do preço recebido pelo trespasse.
Assim, tendo os requeridos trespassado o seu estabelecimento comercial, incluindo todo o seu imobilizado, e tendo apenas comprovado nos autos que parte do preço foi empregue para pagamento dos seus credores, ter-se-á que concluir que dispuseram de bens da insolvente em prejuízo dos seus credores tanto mais que, ao não manterem a contabilidade da sociedade organizada, impediram que estes soubessem qual o destino dado a uma parte substancial desse valor.
Assim, a falta de contabilidade causou um prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor.
Por outro lado, da factualidade dada como provada resulta que não foram depositadas as contas da insolvente do ano de 2016.
A insolvência apenas foi declarada em 15/11/2017 pelo que não há qualquer fundamento que justifique essa omissão de depósito das contas.
Com efeito, o pedido de depósito das contas deve ser apresentado até 15 de julho do ano seguinte àquele a que as contas respeitem.
Assim, a insolvente deveria ter feito o pedido para depositar as contas de 2016 até 15/7/2017, sendo que nessa data ainda não se encontrava declarada a sua insolvência, estando ainda pendente o PER.
Os requeridos não atuaram com a diligência que se lhes impunha.
A falta de depósito das contas de 2016 faz presumir a existência de culpa grave dos requeridos, presunção essa que não foi, de todo, afastada.
Gostaríamos, ainda, de salientar que os requeridos vieram nesta ação alegar que consideram que a insolvente seria credora da requerente de um valor superior a €600.000,00, tendo, inclusivamente, a insolvente interposto contra a mesma uma ação judicial.
Efetivamente resulta da factualidade provada que foi intentada contra a requerente uma ação judicial pela insolvente. No entanto, estranhamente não se opuseram ao encerramento do processo nos termos do art. 230.º, n.º 1, e 232.º do C.I.R.E., ou seja, ao encerramento dos autos por insuficiência da massa, encerramento esse que veio a ser declarado em 20/2/2018. Aliás, estranhamente a insolvente não veio aos autos de insolvência deduzir qualquer oposição ao pedido de insolvência invocando a existência desse crédito.
Considerando, portanto, a factualidade dada como assente entendemos que a presente insolvência deverá ser qualificada como culposa, nos termos do artigo 186.º, n.º 2, alíneas d) e h) e 3, al. b), do C.I.R.E., sendo afetados por essa qualificação os requeridos enquanto gerentes da insolvente. (…)”
105. A “Y, Lda.”, NIPC ………, com sede na Rua …, n.º ..., no Porto, foi constituída em Novembro de 2013, tendo por objecto a “Comercialização de gelados artesanais elaborados a partir de uma mistura de leite fresco e natas. Produtos de pastelaria nomeadamente cupcakes, donuts, bolachas e bolos e bebidas”, com o capital de 5.000,00 € (cinco mil euros), dividido em duas quotas de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) pertença de G. A. e de H. M., ficando a mesma obrigada com a intervenção conjunta de dois gerentes, cargo para o qual foram nomeados os dois sócios fundadores.
106. A aludida G. A. cessou a função de gerente, por renúncia, a 23 de Janeiro de 2015.
107. Na mesma data foi registada alteração ao contrato de sociedade e aos órgãos sociais, sendo a quota da G. A. dividida em duas quotas, uma de 2.450,00 € (dois mil quatrocentos e cinquenta euros), e uma de 50,00 € (cinquenta euros), aquela vendida à sociedade “X, Lda.” NIPC ........., com sede na Rua ..., n.º …, em Braga, e esta vendida à aqui ré, “W, Lda.”.
108. E foi nomeado gerente da autora C. M..
109. A autora “Y” mostra-se pendente de liquidação administrativa, correndo termos o processo n.º 261/2018-2S/ATP, tendo sido nomeados liquidatários da mesma os aludidos H. M. e C. M..
110. A “X, Lda.”, NIPC ........., com sede na Rua ..., n.º …, em Braga, foi constituída em Outubro de 2013, tendo por objecto a “Comércio a retalho de leite e derivados em estabelecimentos especializados. Outro comércio a retalho de produtos alimentares, em estabelecimentos especializados, não especificado. Exploração de conceitos de franchising, consultadoria e formação na área alimentar”, e com o capital social de 1.000,00 € (mil euros), dividido em três quotas, uma de 510,00 € (quinhentos e dez euros) pertença de C. M., uma de 245,00 € (duzentos e quarenta e cinco euros) pertença de D. A., e uma de 245,00 € (duzentos e quarenta e cinco euros) pertença de José, ficando a mesma sociedade obrigada com a intervenção de um gerente, cargo para o qual foi nomeado C. M..

Factos não provados:

1. O representante da ré, N. F., vendeu à autora a ideia de que as margens de comercialização dos produtos da sua marca permitiam o reembolso do capital inicial a investir em pouco mais de 3 anos e garantiu que a rentabilidade da loja do Porto faria com que o investimento fosse recuperado “rapidamente”;
2. O “plano de negócios” referido em 4. e 5. dos factos provados permitiria analisar a rentabilidade do investimento e aferir da veracidade dos números indicados pela ré;
3. O plano de negócios da ré garantia que a actividade da autora ia gerar uma margem bruta, no primeiro ano, de 156.600,00 € (cento e cinquenta e seis mil e seiscentos euros), isto é, 64,35% do volume de faturação, a distribuir como segue: 65% de margem bruta para cupcakes e pastelaria (produto A), bebidas e café (produto B) e gelados e afins (produto C) e uma margem bruta de 55% para outros produtos, já incluindo nesta margem bruta, royalties (5%) e taxa de publicidade (1%);
4. De acordo com o mesmo o gelado iria constituir o principal produto comercializado, representado 41,42% do volume total de vendas por ano (100.800,00 Eur. num total de 243.360,00 Eur.);
5. O modelo de negócio vendido à autora com a celebração do contrato correspondia ao plano de negócios;
6. A ré comprometeu-se a fornecer esse modelo de negócio com custos perfeitamente definidos e margens de venda de produto que permitiam antever o reembolso de investimento;
7. A ré não transmitiu à autora qualquer filosofia e organização do trabalho (…) concebidas desenvolvidas, trabalhadas e optimizadas por ela, e não se apresentou a resolver os problemas que a autora foi sentindo na execução do contrato;
8. Entre Julho de 2014 e 31 de Dezembro de 2015, a ré facturou à autora um total de 233.198,45 €, e esta facturou aos seus clientes nesse mesmo período, o total de 556.957,14 €, representando as matérias vendidas fornecidas pela ré um custo de 41,87% da totalidade das vendas desse período;
9. Desses fornecimentos o gelado constituiu o principal produto comercializado pela marca, tendo representado 45,65 % do volume total de vendas da autora desde a abertura e até 31 de Dezembro de 2015 (254.270,45 € num total de 556.957,14 €);
10. Só considerando os custos da ré, a margem bruta gerada nunca seria superior a 58,13% do volume de vendas de gelados;
11. Mesmo que não tivesse qualquer outro fornecedor, jamais a autora conseguiria atingir as margens do modelo de negócio vendido pela ré (64,35%), nem as margens da venda de gelado (65%), o que a ré sempre soube;
12. A autora, no primeiro exercício (entre 1.07.2014 e 31.12.2014) facturou um total de 184.624,57 €, pelo que facturou, em média, mais 515,14 € por dia do que o previsto no “plano de negócios” da ré;
13. Ao contrário das previsões da ré, a autora nunca obteve qualquer lucro na sua actividade, esteve sempre a acumular prejuízos;
14. O custo dos produtos era superior ao custo previsto no “plano de negócios” e a receita proveniente da venda era inferior à prevista nesse mesmo documento;
15. Mesmo quanto ao gelado, a ré impôs um preço abaixo do valor do seu “modelo de negócio”, pois o preço médio da porção de 100 gramas de gelado praticado pela ré (1,32 €) é muito superior ao valor de 0,70 € previsto no plano de negócios;
16. Em cada venda de 100 gramas de gelado a autora perde 0,21 €, respeitante à diferença do preço de venda (2,00 € - 1,79 €), a que acresce uma perda na compra de cada 100 gramas de gelado no valor de 0,62 €, respeitante ao preço praticado pela ré (1,32 € - 0,70 €);
17. Isto sem contabilizar taxa de publicidade e royalties (6% do valor da venda, ou seja, 0,11 € por cada 100 gramas de gelado vendido);
18. A partir de 17 de Maio de 2015 a margem bruta no gelado passou a ser de 0,63 € (correspondente à diferença entre o preço de venda do gelado – 1,95 € – e o custo de 100 gramas do gelado vendido –1,32 €);
19. Desde aí o prejuízo da autora foi de 0,67 € (1,30 € - 0,63 €), a que acresce 0,11 € correspondentes às royalties e taxa de publicidade, num total de 0,78 €;
20. O referido em 22. dos provados não foi aceite pela ré;
21. O modelo de negócios da ré não tinha correspondência com aquilo que veio a praticar, foi elaborado com manipulação de dados destinados unicamente a convencer a autora da vantagem de celebrar o contrato com a ré, mas que esta nunca cumpriu;
22. Era a ré que definia a maioria dos fornecedores da autora, fixava a marca e características dos produtos a adquirir pela autora, e fixava o preço de venda final dos produtos vendidos pela autora;
23. A margem bruta dos produtos era e é exclusivamente determinada pela ré nada podendo ser feito pela autora;
24. A ré, conscientemente, colocou a autora numa situação de debilidade financeira que lhe dificultava o cumprimento pontual das suas obrigações perante terceiros;
25. A autora estabeleceu com a Administração Tributária um acordo de pagamento em prestações, garantido com património pessoal dos sócios, o valor em dívida;
26. E estava a proceder ao pagamento a pronto das mercadorias que encomendava;
27. A autora não tinha qualquer acção judicial pendente contra si;
28. A ré não prestou qualquer auxílio à autora na gestão da loja, por forma a aumentar o rendimento ou margem das vendas da autora;
29. De acordo com o “plano de negócios” era previsível o reembolso do capital investido no prazo máximo de 4 anos;
30. A margem bruta da autora durante o ano de 2014 não excedeu 43,6%, ao contrário dos 65% garantidos pela ré;
31. Neste valor não se incluem as Royalties (5%) e a taxa de publicidade (1%), caso em que a margem bruta diminui para o valor de 37,6%;
32. O volume de vendas (em metade do ano) foi de 184.624,57 €, mas o EBITDA foi de -32.331,19 € e o resultado líquido foi de -50.878,04 €;
33. A margem bruta durante o ano de 2015 não excedeu 44,5%, ao contrário dos 65% garantidos pela ré;
34. Sem considerar de novo as Royalties (5%) e a taxa de publicidade (1%), caso em que a margem diminui para 38,5%;
35. O volume de vendas fixou-se em 372.292,72 €, mas o prejuízo (resultado líquido) foi de -49.854,10 € e o EBITDA foi de - 15.002,08 €;
36. Em consequência da alteração da margem bruta de comercialização dos produtos fornecidos pela ré, sofreu a autora um prejuízo directo de 116.000,00 € (cento e dezasseis mil euros);
37. O “plano de negócios” previa que, para um volume de vendas de 202.800,00 € bastaria um número total de 4,5 funcionários, assim distribuído: a) Gerente de Loja; b) 2 baristas; c) 1 Pasteleiro; d) 1 apoio em part-time (meio tempo);
38. A ré impôs um período mínimo de abertura de loja - 54 horas semanais;
39. A ré impôs à autora a contratação de um mínimo de nove funcionários, assim discriminados: 2 gerentes; 2 pasteleiros e 5 baristas;
40. O que representou um custo mensal acrescido de 5.400,00 € (cinco mil e quatrocentos euros);
41. Em consequência do número de funcionários impostos pela ré e da remuneração por eles auferida, suportou a autora um acréscimo de um custo total suportado e não previsto de 91.800,00 € (noventa e um mil e oitocentos euros);
42. No “plano de negócios” da ré os Royalties (5%) e a taxa de publicidade (1%) estavam incluídos na margem bruta do negócio;
43. No ano de 2014 o volume de vendas da autora foi de 184.624,57€, pelo que a mesma suportou ainda um prejuízo não previsto no “plano de negócios” no valor de 9.231,23 €, e no ano de 2015 esse prejuízo ascendeu a 22.337,56 €;
44. Antes de contratar com a ré a autora definira que aceitaria um contrato que garantisse uma taxa de retorno de investimento de 25%;
45. O modelo de negócios vendido pela ré previa uma taxa de retorno de investimento média superior a 30%;
46. A marca “SP.” não tinha clientes no Porto antes da abertura dessa loja;
47. Na loja do Porto, em cerca de 19 meses (de Julho de 2014 a Fevereiro de 2016) a autora vendeu produtos da marca da ré no valor de mais de 550.000,00 € (quinhentos e cinquenta mil euros);
48. A autora pagou, em face do referido em 33 dos factos provados, o valor global de 12.500,00 € (doze mil e quinhentos euros), a que acrescerá o valor a pagar ao trabalhador com quem ainda não foi possível celebrar acordo;
49. A autora sempre serviu uma quantidade exagerada e desajustada de gelado em relação à quantidade pretendida e cobrada ao cliente;
50. Tal prática levou à quebra, no mínimo, de 30% do número de gelados por cuba e, assim, à redução da margem para metade do valor estimado pela autora;
51. Além da situação referida em 56. dos provados, a autora comprava mercadoria à ré, designadamente gelados e outros produtos de stock, a qual depois não era vendida na sua loja, o que originava um descontrolo nos inventários daquela;
52. O referido em 79. e 80. dos provados fez com que os fornecedores da autora começassem a questionar a ré acerca da vitalidade do seu negócio, para o qual passaram a olhar com desconfiança;
53. O que afectou a credibilidade e a confiança que os clientes “SP.” depositaram na marca.

Os apelantes discordam da decisão de facto.
Entendem que foram indevidamente considerados como provados os factos constantes dos pontos 47, 48, 51, 52, 72, 73, 75 e 91 e foram incorretamente dados como não provados os factos constantes dos pontos 1, 2, 5, 6, 22, 28 e 29.
Quanto aos pontos 47 e 48 dos factos provados, consideram que devem ser alterados para “não provados”, enquanto o ponto 52 dos factos provados deverá passar a ter a seguinte redação: “A ré garantiu à autora que o “Sistema SP.” gerava uma margem “específica/fixa””. Em sentido inverso, consideram que os pontos 1, 2, 5, 6 e 29 dos factos não provados devem transitar para os factos provados. Fundam tal pretensão nos documentos referenciados nos pontos 4, 5 e 20 dos factos provados, conjugadamente com a reapreciação da prova gravada, designadamente nos depoimentos e declarações de parte dos legais representantes da autora – C. M. e H. M. – e nos depoimentos das testemunhas M. G. e M. A..
Analisados os documentos em causa e os depoimentos/declarações de parte e testemunhais, não podemos concordar com os apelantes.
A questão foi bem decidida na sentença recorrida.
Não só o legal representante da ré é perentório ao afirmar que o plano de negócio enviado à autora em 25/07/2013 – pontos 4 e 5 dos factos provados – (aliás, significativamente, apelidado, no assunto do mail, de “Plano Financeiro”), nada tem a ver com o modelo de negócios, tendo-lhe sido solicitado pelos gerentes da autora para se candidatarem a um financiamento bancário apelidado “Comércio Invest” do BANCO ..., em face da inexperiência da pessoa que lidava com a parte financeira em preparar tais candidaturas, como é o próprio legal representante da autora, H. M. que reconheceu que esse documento foi usado pela autora para o financiamento do “Comércio Invest” através do BANCO ..., sendo que, na altura em que o mesmo foi enviado, apesar de ainda não terem assinado o contrato, já tinham decidido fazê-lo e tinham tudo encaminhado para tal (nada a ver com o apoio do IAPMEI, sugerido pelo Sr. Advogado, mas que apareceu muito depois). As declarações de C. M. são, nesta parte, irrelevantes, até porque, nesta fase do negócio, ainda não estava ligado à loja do Porto, mas apenas à loja de Guimarães, desconhecendo a forma como foram efetuados os contactos e celebrado o negócio entre a autora e a ré (no seu caso nem sequer concorreu a um financiamento como o da autora). Os depoimentos das testemunhas contabilistas – M. G. e M. A. – também pouco adiantam, uma vez que se reportam, não a este caso concreto, mas ao que é comum num negócio deste tipo. Aliás, a testemunha J. M., contabilista da autora, confirmou que a candidatura ao BANCO .../NG., foi efetuada com base nesse plano de negócio.
Veja-se, também, como bem salienta a sentença recorrida, que tal plano de negócios não integrou o contrato celebrado entre as partes, nem constituiu qualquer anexo do mesmo ou a ele aí se faz qualquer referência. Também, de forma relevante, é aceite por todos que a ré, previamente à resolução final da autora em contratar, lhe entregou para análise as suas próprias contas, da loja de Braga, para que sentissem confiança no modelo de negócio que estavam a propor.
Não nos ficam dúvidas quanto à diferença essencial entre o modelo de negócio “SP.” que consta do contrato celebrado entre as partes – e que foi dado a conhecer à autora previamente à assinatura do contrato, não só pela cedência das contas da loja de Braga, da ré, como por várias reuniões havidas entre as partes – e o plano de negócios constante daqueles pontos 4 e 5 dos factos provados, que tinha como finalidade ajudar a autora a concorrer a um financiamento.
Quanto à garantia de margens específicas, é o próprio legal representante da autora, H. M., que diz que apenas “foi-nos transmitido que havia um potencial muito forte para isso acontecer”, inexistindo, assim, qualquer garantia de rentabilidade do negócio, sendo que esta depende, sobretudo, da forma como o mesmo é gerido.
Também os pontos 51 dos factos provados e 22 dos factos não provados estão bem julgados. O facto de o contrato obrigar a manter um stock mínimo de produtos não quer dizer que fosse a ré a decidir as quantidades compradas pela autora a cada fornecedor e que fosse ela que definia a maioria dos fornecedores e que fixava as características dos produtos que a autora devia adquirir, bem como a fixação do preço de venda final. Tal não consta do contrato e o funcionário da autora, citado pelos apelantes, apenas disse que a maioria dos fornecimentos era da SP. (o que é, aliás, compreensível). Este mesmo funcionário – J. O. – acabou por admitir que, a partir de determinada altura passaram a usar açúcar da marca ... e caramelo de outra marca, que era mais espesso, deixando de usar os produtos SP., o que foi corroborado pela testemunha J. P., ex-funcionário da autora na loja do Porto, que admitiu que “passado algum tempo da entrada da nova gerência, começaram a comprar mercadorias no ..., na M., no L., até porque alguns fornecedores deixaram de estar disponíveis para lhes entregar mercadoria, em face do atraso nos pagamentos”. Veja-se, ainda, que os pontos 62 e 63 dos factos provados referem que “os preços dos produtos comercializados no estabelecimento pela autora eram sugeridos pela ré à autora, sendo o valor final estabelecido por acordo entre as partes” e que “os fornecedores a contratar pela autora eram validados pela ré, mas nunca foi rejeitado nenhum novo fornecedor proposto pela autora” e os apelantes não impugnaram estes pontos da matéria de facto. Tudo isto foi, também, confirmado pelo legal representante da ré, N. F., com pormenores relativos aos nomes dos novos fornecedores da autora, acrescentando que nunca puseram qualquer entrave, desde que a qualidade fosse a mesma dos fornecedores iniciais e que a autora só não arranjou outros fornecedores porque não quis ou porque não encontrou no mercado outros fornecedores a oferecer a mesma qualidade/preço dos apontados pela recorrida (a possibilidade de contratar outros fornecedores está, aliás, prevista contratualmente - clausula XII, n.º 3). Quanto aos preços, verifica-se que o próprio H. M. admite que aceitaram os preços indicados pela apelada porque “nós não entendíamos do negócio, portanto eu pessoalmente a mim disseram-me o melhor é vendermos a este preço, portanto ok, vamos vender porque eu não percebo do negócio” e que, houve uma altura em que a ré sugeriu um aumento de preços e a autora não concordou.
Os pontos 72 e 73 da matéria assente prendem-se com a assiduidade dos gerentes na loja do Porto e, uma vez mais, os apelantes não têm razão. Tanto J. P., como J. O., ambos funcionários da loja do Porto da autora referiram que o C. M. tratava, sobretudo, da loja de Guimarães, pouco aparecendo no Porto e o H. M. “praticamente estava lá quase todos os dias. Não digo todos, não estava todos, mas depois houve uma certa altura que falhava muitas vezes…e depois eles delegaram essas responsabilidades para mim. Disseram: quando não tiver ninguém aqui presente, serás tu a tratar da situação” (…) “Não aparecia nenhum gerente…uma, duas vezes por semana” (…) “Havia várias vezes que era sempre eu, então à noite nunca estava ninguém, era sempre praticamente eu ou um colega meu que estávamos nos períodos da noite” (J. P.) “Cheguei a ficar várias noites no balcão sozinho” (J. O.).
Pretendem os apelantes que o ponto n.º 75 da matéria de facto provada seja alterado passando do mesmo a constar que o que aí se relata só aconteceu a partir de meio, final de 2015 (incumprimento de prazos de encomenda e inexistência de stocks). Neste ponto têm razão, pois tal é o que resulta dos depoimentos testemunhais, não só dos funcionários da autora, como de R. P., sócio e funcionário da ré e responsável pela produção de gelados.

Assim, o ponto 75 dos factos provados passará a ter a seguinte redação:

“A partir de meados de 2015 a autora passou a incumprir os prazos de encomendas dos produtos à ré, designadamente de gelados, deixando muitas vezes terminar o seu stock para só aí o encomendar, situação que, por vezes, motivou inexistência de stocks e, consequentemente, impossibilidade de venda de produtos aos clientes”
Os apelantes discordam, também, do ponto n.º 91 dos factos provados. Entendem que se trata de uma conclusão e não de um facto e que o facto é que a autora respondeu à carta de interpelação para cumprimento, conforme consta dos pontos 24 e 25 dos factos provados. Não há dúvida que a autora respondeu à carta da ré, mas também não há dúvida que não se prestou a resolver nenhum dos problemas invocados pela ré como motivo para a resolução do contrato, limitando-se a enviar um cheque em substituição da garantia bancária a que estava obrigada e que não havia prestado (tal cheque veio a ser devolvido por falta de provisão) – factos provados n.ºs 29 e 30. Assim, não há dúvida que a autora nada fez para alterar as situações relatadas na carta de interpelação. Trata-se de um facto – não houve qualquer prova em sentido contrário - e não de uma conclusão.
Finalmente, os apelantes entendem que o facto não provado n.º 28 deve transitar para os factos provados. Ora, resulta do depoimento das testemunhas J. P. e J. O. que, não só receberam formação inicial na loja-mãe em Braga, como na loja do Porto e que, sempre que tinham dúvidas, podiam consultar um manual que lhes havia sido fornecido ou contactar o R. P., em Braga, pelo telefone, que ele esclarecia tudo, para além de um grupo fechado no facebook, com tutoriais em vídeo. Quanto à formação e acompanhamento dos funcionários, foram esclarecedores os depoimentos de R. P. e D. P. que proporcionaram a formação (bem como a sua irmã N.), não só inicial como subsequente, a qualquer momento que houvesse necessidade ou que fossem requisitados para tal. Também a testemunha R. P. esclareceu que, por diversas vezes, nas deslocações ao Porto alertou o H. M. relativamente a procedimentos errados, designadamente, quanto ao armazenamento do gelado, prazos de validade, forma de organização das montras e outras questões relativas à gestão do dia-a-dia. Não há dúvida, portanto, que a ré auxiliou a autora na gestão da sua loja, não só inicialmente, como durante todo o período de execução do contrato. Quanto à reunião que terá havido entre as partes, no verão de 2015, parece certo que a autora apresentou diversas queixas e que a resposta formal apenas terá ocorrido em dezembro de 2015, através do mail a que se refere o ponto n.º 20 dos factos provados. Contudo, a ré nunca deixou de acompanhar a autora e seus funcionários, como já vimos, designadamente com propostas relativas à gestão do dia-a-dia e de optimização de resultados através da forma como eram usados os gelados e outros produtos da loja. Aliás, nessa reunião, a questão central foi o valor do gelado, conforme referiu N. G., que participou da mesma e que era o contabilista da loja de Guimarães e esse problema foi diversas vezes abordado tanto pelo R. P., como pelo D. P., junto da autora e com alternativas de resolução dos problemas.
Assim, não se vê motivo para alterar a decisão de facto, para além da introdução da pequena alteração ao ponto 75 dos factos provados que supra se deixou enunciada.

Na questão de direito, os apelantes começam por dizer que, em face da alteração da decisão de facto, deve considerar-se que não assiste justa causa na resolução operada pela recorrida.
Já vimos que a decisão de facto não foi alterada, pelo que nunca seria motivo para se considerar que, em face de tal alteração, inexistiria justa causa para a resolução.
Em qualquer caso, entendem os apelantes que não se verificou uma conduta grave e reiterada que tornasse inexigível a manutenção do vínculo contratual, uma vez que, os sete pontos invocados pela recorrida, “não impediam a exploração da loja, não denegriam a imagem da marca nem eram impossíveis de ser resolvidos, antes pelo contrário, eram de fácil resolução e em pouco tempo”, devendo considerar-se ilícita e infundada a resolução e indemnizada a autora, conforma peticionado, relegando-se para liquidação de sentença o valor a arbitrar a esse título.
Vejamos.
Não há dúvida que estamos perante um contrato de franquia.

Como bem se salienta na sentença recorrida:

“Define-se a franquia como «o contrato pelo qual o empresário – o franquiador – concede a outro empresário – o franquiado – o direito de exploração e fruição da sua imagem empresarial e respectivos bens imateriais de suporte (mormente, a marca), no âmbito da rede de distribuição integrada no primeiro, de forma estável e a troco de uma retribuição». Trata-se de «um contrato sinalagmático e oneroso, ficando o franquiado vinculado ao pagamento de determinadas prestações pecuniárias, usualmente consistentes numa prestação inicial fixa (front money ou initiation fee) e prestações ulteriores periódicas proporcionais ao volume de negócio (royalties, redevances)» - Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, págs. 451-456”
Trata-se de um contrato atípico, sendo-lhe aplicáveis, por analogia, as regras que disciplinam o contrato matriz de distribuição – o contrato de agência – sem prejuízo da inaplicação de normas exclusivas deste (D.L. n.º 178/86, de 3 de Julho) e da não colisão com o clausulado do franchising, nos termos do art. 405.º do Cód. Civil.” – cfr. neste sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09.01.2007 e de 23.02.2010, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
No caso dos autos, o contrato foi celebrado a 5 de dezembro de 2013, pelo prazo de 10 anos, nos termos do qual a ré atribuiu à autora o direito de utilizar o “Sistema SP.”, assim como os seus sinais distintivos e todo o modelo de negócio associado, através da exploração de uma loja sita no Porto. Neste contrato a sociedade “Y, Lda.” assumiu a qualidade de franquiado, e a ré a qualidade de franquiador.
Com a celebração do contrato de franchising, a sociedade autora assumiu as obrigações decorrentes do clausulado do mesmo, obrigando-se a ré nos termos do mesmo contrato.
Conforme resulta dos factos provados, a ré, por carta registada de 23 de fevereiro de 2016, enviada à autora e por ela recebida, procedeu à resolução do contrato, alegando justa causa e invocando sete pontos que, segundo a ré, constituem situações de incumprimento do contrato de franchising, oportunamente denunciadas (no dia 5 de fevereiro, havia enviado uma interpelação admonitória para cumprimento das mesmas), sem que a autora tenha regularizado qualquer dessas situações ou, sequer, solicitado prazo suplementar com vista a fazer cessar as situações de incumprimento.
Ora, como já vimos, aplicando-se a este tipo de contrato, o DL n.º 178/86 (com as alterações introduzidas pelo DL n.º 118/93), que regulamenta o contrato de agência ou de representação comercial, os requisitos previstos para a resolução do contrato são os dos artigos 24.º, alínea d) e 30.º desse diploma, podendo o contrato ser resolvido “Se a outra parte faltar ao cumprimento das suas obrigações, quando, pela sua gravidade ou reiteração, não seja exigível a subsistência do vínculo contratual”. Trata-se de resolução que deve ser motivada, embora possa efetivar-se extrajudicialmente, mediante declaração feita à outra parte. “A lei exige que a falta de cumprimento assuma especial importância, quer pela sua gravidade (em função da própria natureza da infracção, das circunstâncias de que se rodeia, ou da perda de confiança que justificadamente cria na contraparte, por ex.), quer pelo seu caráter reiterado, sendo essencial que, por via disso, não seja de exigir à outra parte a subsistência do vínculo contratual” – cfr. Pinto Monteiro, Contrato de Agência, Livraria Almedina, pág. 55.
Em relação à aplicação ao contrato de franquia deste dispositivo, refere L. Miguel Pestana de Vasconcelos in “O Contrato de Franquia (Franchising), 2.ª edição, pág. 27, citado na sentença recorrida, que «não encontramos aqui dificuldades de maior na aplicação analógica neste campo, dos preceitos do Dec-Lei n.º 178/86 ao contrato de franquia. Também aqui estamos perante um contrato que assenta e cuja execução gera especiais relações de colaboração e confiança entre as partes e em que os interesses estão em jogo, com vista a estabelecer-se o quadro em que o direito à resolução nasce e pode ser exercido, são fundamentalmente os mesmos». Segundo este autor, a possibilidade de resolução do contrato de franquia, nas situações da disposição mencionada, baseia-se, essencialmente, na circunstância de estar em causa um contrato duradouro que assenta em especiais relações de colaboração e confiança entre as partes e cuja frustração compromete e torna inexigível a manutenção do vínculo contratual”. No mesmo sentido, Acórdão do STJ de 09/01/2007, in www.dgsi.pt.
Analisada a matéria de facto, designadamente, a constante dos pontos 53 a 56, 67, 68, 70 a 82, 87, 89, 90 e 91 dos factos provados, verificamos que a ré tinha motivos suficientes para invocar a justa causa, uma vez que os mesmos são objetivamente determinantes da quebra da relação de confiança que unia as partes que, assim, ficou irremediavelmente e definitivamente comprometida, pois pela sua gravidade e/ou reiteração, não era mais exigível a subsistência do vínculo contratual. Podia, portanto, a ré, como o fez, resolver o contrato.
Importa, ainda, aqui analisar a questão sob o ângulo das cláusulas resolutivas (para além da resolução legal), previstas no artigo 432.º, n.º 1 do Código Civil.
Com efeito, as partes convencionaram a possibilidade de resolução do contrato em caso de incumprimento, por parte do franchisado, das obrigações assumidas no contrato, elencando a título exemplificativo algumas dessas causas – cfr. Cláusula XXVII: “Constituem fundamento de resolução do contrato todos os comportamentos culposos que sejam desconforme com as obrigações decorrentes do presente contrato, nos termos gerais de direito e, em especial, a prática de quaisquer atos que lesem ou que sejam suscetíveis de lesar a imagem de marca e o goodwill do Sistema SP.…podendo o franchisante resolver automaticamente o presente contrato, sem necessidade de qualquer interpelação admonitória, logo que verificada alguma das seguintes circunstâncias (…)”.
Como vimos, a ré entendeu, por sua iniciativa, resolver o contrato que celebrara com a sociedade autora, invocando o incumprimento das obrigações contratuais previstas nas Cláusulas X (ausência recorrente dos gerentes da loja), XII (inexistência de stocks mínimos), XVII (incumprimento de obrigações ante terceiros, fornecedores, trabalhadores e senhorio), XVIII (incumprimento de obrigações perante o Estado, mormente pagamento de impostos), XXVII (mora superior a 30 dias no pagamento das facturas emitidas pela franchisante), XXVIII (não prestação de garantia bancária) e XIX (falta documentos relativos aos seguros e valor do capital do seguro contratado), sendo que, pelo menos duas deles constam daquela cláusula resolutiva.
O artigo 432.º n.º 1 do Código Civil admite, para além da resolução do contrato fundada na lei (casos de não cumprimento ou impossibilidade de cumprimento da obrigação, ou alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar – artigos 801.º, n.º 2, 802.º, 808.º e 437.º do CC), que, por convenção, se atribua a uma das partes ou a ambas, o direito de resolver o contrato. A resolução convencional, assentando no princípio da autonomia de vontade e liberdade contratual, confere às partes o direito potestativo de, mediante acordo, atribuir a ambas ou apenas a uma delas, a faculdade de resolver o contrato quando ocorra certo facto.
Trata-se da chamada cláusula resolutiva expressa, “em que as partes estipulam que ambas ou uma delas tem o direito de resolver o contrato se ocorrer certo e determinado facto, como a inadimplência de uma específica obrigação” – Acórdão da Relação de Lisboa de 23/10/2014, processo n.º 7582/13.5TBCSC-A.L-2 (Eduardo Azevedo), in www.dgsi.pt.
Defende-se neste Acórdão da Relação de Lisboa que “Contudo, é de recordar, que embora as partes possam convencionar outros factos para além dos enumerados na lei para fazerem operar a resolução, não podem é ligar esse direito a um simples incumprimento de uma obrigação de que não resulte uma situação de ruptura da relação contratual, atento ao principio da boa fé (artº 762º, nº 2 do CC), ao critério geral do abuso do direito (artº 334º do CC) e ao disposto nos artºs 802º, nº 2, e 808º, nº 2, do CC, pelo que não deve admitir-se a resolução se, nesses termos, o incumprimento for insignificante ou tiver escassa importância (Maria Helena Brito, O Contrato de Concessão Comercial, 1990, 234 e segs). A par destas considerações, J. Calvão da Silva (Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 1987, Separata do Vol XXX do Suplemento do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, 322) ainda refere que “… as partes não podem dar à cláusula resolutiva expressa um conteúdo meramente genérico …” e “… quando se limitem a fazer uma mera referência genérica, em branco, à violação de (qualquer uma das) obrigações nascentes do contrato, a estipulação não passará de uma cláusula de estilo …, já que não houve uma prévia vontade contratual (bilateral) que de facto valorasse especificamente a gravidade da inadimplência””.
A função da cláusula resolutiva é, como nota Baptista Machado (“Pressupostos da Resolução por Incumprimento” in “Obra Dispersa”, I, 186/7 e nota 77) “organizar ou regular o regime de incumprimento mediante a definição da importância de qualquer modalidade deste para fins de resolução”, devendo ter-se presente que “a cláusula resolutiva expressa «deve referir-se a prestações e a modalidades de adimplemento determinadas com precisão: as partes não podem ligar a resolução a uma previsão genérica e indeterminada (…)” – cfr. Acórdão do STJ de 17/01/2012, processo n.º 473/06.8TVLSB.L1.S1 (Alves Velho).
No caso de que nos ocupamos, as partes previram e convencionaram a possibilidade de resolução do contrato de locação, determinando com precisão as prestações a cujo incumprimento atribuíram aquela capacidade resolutiva.
“Quando tal sucede, o critério de avaliação dos pressupostos da extinção da relação contratual, nomeadamente da perda de interesse na manutenção do contrato, gerador do direito à resolução, independentemente de qualquer acto ou interpelação, está predeterminado e prefixado pelas partes, através da manifestação de vontade consubstanciada na cláusula resolutiva, de sorte que, verificados os pressupostos do respectivo funcionamento, não há que fazer apelo ao critério legal fundante do direito à resolução acolhido pelo art. 808º C. Civil, por isso que, insiste-se, pressuposto de invocação do incumprimento definitivo legitimador da resolução, à luz do convencionado, era o simples incumprimento da prestação identificada na cláusula (art. 406º-1 C. Civil)” – Acórdão do STJ de 17/01/2012 supra citado.
Ao estabelecerem esta cláusula, as partes terão ponderado e “valorado previamente a gravidade da inadimplência a que voluntariamente atribuíram carácter de essencialidade e fundamento de resolução” na economia global do contrato, em termos tais que se atribuíram a faculdade de o resolver sem se discutir a gravidade do incumprimento e a culpa do seu autor (cfr. Calvão da Silva, ob. cit., 324; Pedro R. Martinez, “Da Cessação do Contrato”, pp. 82 e 166).
Não há dúvida, portanto, de que, também por esta via, a ré podia resolver o contrato.

Uma vez que se conclui pela licitude da resolução contratual por parte da ré, fica prejudicado o conhecimento das questões relativas aos pedidos de indemnização formulados pela autora com base na ilicitude da resolução operada.

Outra questão é a da indemnização de clientela.

Na sentença recorrida ficou bem analisada esta questão, nos seguintes termos:

“A indemnização de clientela é uma compensação devida ao agente, após a cessação do contrato, pelos benefícios que a outra parte continua a auferir com a clientela angariada ou desenvolvida pelo agente. - cfr. art. 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86.
Em rigor, não se trata de uma verdadeira indemnização, até porque não está dependente da prova, pelo agente, de danos sofridos, pois o que conta são os benefícios proporcionados pelo agente à outra parte, benefícios que, na vigência do contrato, eram de proveito comum e que, após o seu termo, irão aproveitar apenas, unilateralmente, ao principal. É um benefício que não se pode considerar à custa alheia, pois a projecção do nome do principal e a garantia de qualidade que ele assegura ao produto ou ao serviço (ou a ambos), também é factor componente de valorização e de atractividade de clientela.

Segundo o disposto no citado art.º 33.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 178/86, o agente tem direito, após a cessação do contrato, a uma indemnização de clientela, desde que verificados, cumulativamente, os seguintes requisitos:

“a) O agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente;
b) A outra parte venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente;
c) O agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos na alínea a)”.

Segundo Pinto Monteiro, in RLJ, 130.º-154, “a indemnização de clientela constitui, no fundo, uma compensação a favor do agente, após a cessação do contrato, pelos benefícios que o principal continue a auferir com a clientela angariada ou desenvolvida pelo agente. Ela é devida seja qual for a forma por que se põe termo ao contrato ou o tempo por que este foi celebrado … e acresce a qualquer outra indemnização a que haja lugar (por exemplo, por falta ou insuficiência de pré-aviso ou por violação do contrato pelo principal). E assim entende-se que mesmo que o agente não sofra um prejuízo específico justifica-se essa compensação pelos benefícios que a outra parte venha a conseguir, independentemente de eles já se terem verificado, bastando a possibilidade de eles virem a ocorrer.”
A nossa Jurisprudência tem vindo a aplicar analogicamente normas próprias do contrato de agência a alguns contratos atípicos, sendo expressivos os casos de aplicação das regras da indemnização de clientela aos contratos denominados de “concessão comercial”, pois que cessada a relação contratual, não deverá ser desconsiderado o esforço desenvolvido pelo concessionário na criação ou manutenção de uma clientela para a marca do concedente, que beneficiará este no futuro.
O fundamento para tais decisões é aquela segundo a qual as normas deste contrato típico são aplicáveis aos contratos atípicos, na medida em que a analogia das situações o justifique.
“Ora, no contrato de franquia ou franchising existe como que uma coligação - franquiador e franquiado - com distribuição de tarefas precisas, formando uma nova realidade que capta a clientela, sendo que aqui há dois angariadores distintos que actuam em conjunto. Pelo que, será casuisticamente que se poderá verificar se a actividade do franquiado foi determinante para atrair a clientela, actuando em termos idênticos aos do agente, não podendo, sem mais, fazer-se a aplicação analógica do artigo 33.º do citado DL ao contrato de franquia. Consequentemente, entendemos que deverá ser o franquiado a alegar e provar a sua invocada contribuição determinante para o notório aumento de negócio e clientela do franquiador e que este venha a beneficiar dessa melhor qualidade comercial para além do termo do franchising, cfr. Ac. do STJ de 9.01.2007, in www.dgsi.pt. Ou seja, o aumento e a fidelização da clientela obtidos à custa da actividade pessoal do franquiado são factos a apurar, caso a caso, cujo ónus da alegação e prova a este incumbe.” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28.10.2015 in www.dgsi.pt.
No caso, olhando à escassa matéria apurada nos pontos 31 e 32 dos factos provados, em contraponto com a matéria dos pontos 46 e 47 dos não provados, temos por manifesto que a autora/franquiada, também não logrou provar os elementos que acima se referiu, pelo que se não verificariam também os pressupostos de indemnização de clientela reclamada na alínea f), pelo que não haveria também lugar a qualquer indemnização de clientela”.
Acresce que, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do DL 178/96 – redação introduzida pelo DL 118/93 de 13 de abril, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 86/6537CEE do Conselho de 18/12/1986, relativa à coordenação do direito dos Estados Membros sobre os agentes comerciais - “Não é devida indemnização de clientela se o contrato tiver cessado por razões imputáveis ao agente…”, o que terminou com a polémica que se vinha instaurando sobre saber se a indemnização de clientela se justificava ainda que o contrato tivesse cessado por iniciativa do agente ou por iniciativa da outra parte fundada em incumprimento do agente ou em circunstâncias a este imputáveis (de que nos dá conta Pinto Monteiro, in Contrato de Agência, pág. 59, em edição anterior à redação introduzida por aquele DL 118/93).

Os apelantes discordam, ainda, da condenação do fiador com base na cláusula XXVIII, pois entendem que a mesma deve ser declarada nula e de nenhum efeito com base nos artigos 12.º e alíneas c) e f) do 19.º do DL 446/85, por não terem existido negociações com vista à celebração do contrato aqui em causa que, é, assim, um contrato de adesão.
O DL 446/85 estabelece o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais e, como parece óbvio de tudo o que aqui já dissemos e da matéria de facto considerada provada, não é aplicável ao contrato dos autos, cujos termos foram negociados entre as partes, tendo tido a autora possibilidade de analisar a minuta do contrato que lhe foi fornecida pela ré e tendo ocorrido negociações sobre a mesma e alterações, que configuram uma negociação prévia à outorga definitiva do contrato – pontos 1 a 10 e 39 a 48 dos factos provados, onde fica patente a existência de reuniões de discussão dos termos do contrato, troca de email’s, apresentação de versões diferentes e acordos pré-contratuais, durante cerca de 10 meses de negociações que antecederam a assinatura do contrato.
Impossível esquecer que o que se pretendeu com este regime do DL 446/85 foi a proteção do destinatário de cláusulas não negociadas, evitando abusos e repondo uma igualdade que aprioristicamente se pressupõe não existir (José Manuel Araújo de Barros, Cláusulas Contratuais Gerais, Coimbra Editora, pág. 232), o que, verdadeiramente não pode aplicar-se no caso de que nos ocupamos.

Finalmente, coloca-se a questão da redução da cláusula penal.
Entendem os apelantes que, sendo esta manifestamente excessiva e revelando uma chocante desproporção entre os danos que previsivelmente o devedor causa com a sua conduta e a indemnização prevista para os ressarcir, deve ser reduzida.
Vejamos.
Nos termos do n.º 1 da cláusula XXVIII: “O incumprimento definitivo do presente contrato que legitime a sua resolução, constitui o franchisado na obrigação de pagamento da quantia de € 250.000,00 a título de cláusula penal, na modalidade de liquidação antecipada do dano”.
O fiador foi condenado no pagamento deste valor a título de cláusula penal.
A questão que se coloca é a de saber se o tribunal pode proceder oficiosamente à redução da cláusula penal, face à alegação de que a mesma é excessiva.
Ora, como salienta a Conselheira Maria da Graça Trigo no acórdão de 18/01/2018, por si relatado (processo n.º 473/14.4T8LRA.C1.S1), in www.dgsi.pt, “A falta de alegação e prova por parte dos réus de factos dos quais decorra que os danos da autora ascendem a montante inferior impede que se opere a redução do montante da cláusula penal (art. 342.º, n.º 2, do CC)”.
Esta questão da necessidade de alegação e prova dos factos que conduzam à decisão de redução da cláusula penal, tem sido estudada pela doutrina e jurisprudência que, de forma generalizada, têm concluído que a redução equitativa da cláusula penal, prevista no artigo 812.º do Código Civil, não é oficiosa, dependendo do pedido do interessado, a quem caberá alegar e provar os factos de onde seja possível extrair a excessividade da estipulação, fora dos limites comportáveis pela liberdade contratual.
Para além do já citado acórdão, veja-se, também o Acórdão do STJ de 12/07/2011, processo n.º 1552/03.9TBVLG.P1 (Nuno Cameira), in www.dgsi.pt: “Recai sobre o devedor, que pretenda seja decretada a redução equitativa da cláusula penal, o ónus de alegar e provar os factos atinentes à manifesta desproporção entre a cláusula penal convencionada e os danos sofridos pelo credor. O uso da faculdade prevista no art. 812.º do CC depende de pedido nesse sentido, ainda que não expressa e formalmente apresentado. Se a autora/reconvinda, não só não alegou, na petição inicial ou na réplica, nenhum facto concreto visando demonstrar a manifesta desproporção entre a cláusula penal convencionada e os danos sofridos pelos réus/reconvintes, como também nenhum pedido apresentou ao tribunal, sequer implicitamente, no sentido de decretar a redução equitativa da cláusula penal, e apenas nas alegações da apelação levantou pela primeira vez o problema, esta pretensão não pode obter vencimento”.
No mesmo sentido, e colhido na mesma base de dados, o Acórdão do STJ de 12/09/2013, processo n.º 1942/07.8TBBNV.L1.S1 (Azevedo Ramos): “A função da cláusula penal é a fixação, por acordo das partes, da indemnização exigível ao devedor que não cumpre a sua prestação – art. 810.º do CC –, dispensando o autor de demonstrar quer a efectiva verificação de danos e prejuízos, quer os respectivos montantes. O ónus de alegar e provar os factos que eventualmente integrem desproporcionalidade entre o valor da cláusula acordada e o valor dos danos a ressarcir ou um excesso da cláusula em relação as danos efectivamente causados recai sobre o devedor. O uso da faculdade de redução equitativa da cláusula penal, previsto no art. 812.º, n.º 1, do CC, não é de conhecimento oficioso, dependendo de pedido do devedor da indemnização”.
A doutrina tem também enveredado por esta solução, como se pode ver em Código Civil Anotado, Pires de Lima e Antunes Varela, vol. II, 3.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 81, Cláusulas limitativas do Prof. Pinto Monteiro, pág. 150 e Cumprimento e sanção pecuniária compulsória do Prof. Calvão da Silva, pág. 275, nota (502) (estes dois últimos citados no Acórdão do STJ de 10/10/2006, processo n.º 06A2118 (Sousa Leite), que vai no mesmo sentido).
Também nesta Relação de Guimarães, já assim se decidiu, em acórdão de 04/10/2017, processo n.º 992/13.0TTBRG-A.G1 (Antero Veiga), in www.dgsi.pt: “Coloca-se desde logo a questão de saber se a redução pode ser oficiosa ou deve ser solicitada. No sentido de que o uso da faculdade de redução equitativa da cláusula penal, não é oficiosa, Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, pp. 735 a 737; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 4.ª ed., p. 81; Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 1987, p. 275; acórdãos do STJ de 17/2/98, CJ do STJ, ano VI, tomo I, p. 72; de 20/11/2003, processo nº 03A1738, de 17/5/2012, processo nº 3855/05.9TVLSB.L1.S1, de 24/4/2012, processo nº 605/06.6TBVRL.P1.S1; RL de 4/12/2014, processo nº 79649/13.2YIPRT.L1-8; RP de 13/2/2015, processo nº 288/12.4TTGRD-A.C1, entre outros, sendo opinião dominante, que não vemos razão para não seguir. Veja-se que o negócio usurário é apenas anulável – artigo 282º do CC -, o que demanda um pedido do interessado. A oficiosidade implicaria violação do princípio da proibição do julgamento «ultra petitum» - STJ de 24/4/2012, acima referido”. No mesmo sentido, Acórdão de 08-06-2017, processo n.º 577/13.0TJVNF-A.G1 (Alexandra Rolim Mendes).
É também a jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto, onde, a título de exemplo, poderíamos citar os Acórdãos de 17/10/2011 (processo n.º 64/10.9TBSJP.P1 – Ana Paula Amorim), de 27/05/2014 (processo n.º 110/10.6TVPRT.P1 – Fernando Samões) e de 03/03/2016 (processo n.º 11709/15.4T8PRT.P1 – Aristides Almeida).
No caso em apreço, a ré peticionou a condenação da autora e do chamado no pagamento do valor de € 250.000,00 a título de cláusula penal, nos termos da cláusula XXVIII do contrato celebrado entre eles e, na réplica, os ora apelantes apenas questionaram a validade de tal cláusula ao abrigo do DL 446/85, invocando ser o seu valor excessivo e despropositado, mas não tendo peticionado a sua redução (apenas a nulidade da cláusula).
Nem sequer vêm alegados factos que permitissem ao tribunal a intervenção moderadora a que faz apelo o artigo 812.º do Código Civil, tendo em vista controlar o montante da cláusula penal, quando este fosse susceptível de ferir de forma clamorosa o sentimento de justiça e equidade.
Veja-se que a cláusula penal não se limita à função de fixação prévia e convencional do montante da indemnização, tendo também uma função de estímulo e de reforço do cumprimento do contrato, como meio eficaz de pressão ao cumprimento da obrigação (função ressarcidora e função coercitiva).
Não há, portanto, factos que o tribunal possa ponderar no sentido da redução equitativa do montante da cláusula penal.
Não esqueçamos que a intervenção do tribunal, a este título, deve sempre ser cuidadosa, não devendo neutralizar os objectivos que presidiram à fixação da cláusula penal.
“O controlo judicial da cláusula penal deve limitar-se aos casos de manifesto abuso, não para limitar de forma injustificada a liberdade contratual e os legítimos interesses do credor. Apenas deve ocorrer quando a cláusula penal for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente – artigo 812º do CC.
Não basta que a cláusula seja excessiva, que ultrapasse o montante dos danos, até porque também lhe anda associada uma função compulsória, deve tratar-se de montante excessivamente desproporcional em relação ao dano e aos objetivos tidos em vista com a cláusula. Pode mesmo não ocorrer dano, esse simples facto não justifica a redução” – Acórdão da Relação de Guimarães citado.
Não há, portanto, motivo para alterar o decidido, sendo de confirmar a sentença recorrida.

III. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.
***
Guimarães, 1 de outubro de 2020

Ana Cristina Duarte
Fernando Fernandes Freitas
Alexandra Rolim Mendes