Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
123/12.3TBCBC.G1
Relator: ALEXANDRA ROLIM MENDES
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
ÂMBITO DA INDEMNIZAÇÃO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 – Ainda que se entenda que são indemnizáveis os danos não causados diretamente pela expropriação, não é indemnizável a depreciação da parcela sobrante pelos danos não patrimoniais que causa aos expropriados a construção de uma estrada junto à sua moradia, nomeadamente em termos de ruído e perda de qualidade ambiental, quando os expropriados, sabendo ou devendo saber, que a parcela expropriada se encontrava afetada à construção de infraestruturas (variante) pelo PDM, construíram a sua moradia naquele local

2 - O princípio da igualdade impõe igualdade de tratamento para situações iguais e tratamento diferenciado para situações desiguais.

3 - Para que se possa concluir pela violação do princípio da igualdade na fixação de indemnização por expropriação, é necessária a prova da existência de tratamento diverso entre situações concretas iguais, sem que tal diferenciação tenha justificação em fundamentos razoáveis.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório:

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública, em que é expropriante o “Município X”, com sede na Praça …, X, e são expropriados E. F. e mulher A. S., residentes no Lugar …, concelho de X, para construção da “Variante à EN-205”, foi expropriada uma parcela de terreno integrante do prédio urbano sito no lugar (...), na freguesia de (...), concelho de X - descrito na Conservatória do Registo Predial de X com o n.º (...) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 719.º - que se encontra identificada como parcela “L1” na planta de localização aprovada pelo Despacho do Exmo. Sr. Secretário de Estado da Administração Local, de 13 de abril de 2011, publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º84, de 02 de maio de 2011, e que, assim, se mostra abrangida pela Declaração de Utilidade Pública (doravante DUP) do mesmo despacho.

Em 03-06-2011, foi realizada vistoria ad perpetuam rei memoriam (que não foi objeto de reclamação pelas partes) e, em 27-06-2011, a expropriante entrou na posse administrativa da parcela expropriada.
Proferido acórdão arbitral em 03-02-2012, que, avaliando o terreno expropriado, considerou que a justa indemnização a atribuir aos expropriados seria de € 11.861,96.

Inconformados, os expropriados vieram interpor recurso da decisão arbitral manifestando discordância relativamente ao valor atribuído à parcela expropriada, alegando, em suma que: (1) a área total do prédio dos expropriados é de 5000 m2 e não de 3.500 m2; (2) todo esse prédio está localizado em zona de sossego, com boas qualidades ambientais; (3) aí, o ruído é praticamente inexistente; (4) o prédio expropriado, ao contrário do que consta do acórdão arbitral, é servido de bons acessos, designadamente um caminho público asfaltado, com 80 metros de terra batida, apresentando localização privilegiada, ao encontrar-se a 200 metros da estrada nacional que liga X ao Arco de Baúlhe; (5) o prédio expropriado tem infraestruturas de eletricidade, de telefone, de água e saneamento; (6) encontrando-se a parcela expropriada no logradouro do prédio urbano dos réus, a respetiva avaliação sempre deveria realizar-se de acordo com o disposto no artigo 26.º, n.º12 do Código das Expropriações, devendo o m2 de terreno cifrar-se na ordem dos € 20,00 e a justa indemnização a esse título cifrar-se nos € 8.900,00; (7) a desvalorização da parte sobrante deverá ter em conta que parte da casa dos expropriados se encontra em servidão “non aedificandi”, o que importará a deslocação daquela parte da casa por forma a que toda a casa fique fora daquela servidão, pois de outra forma ficará desvalorizada em mais de 80%; (8) a via construída passará a 5 metros da casa, o que lhe impõe margens de ruído insuportáveis ao mesmo tempo que lhe retira toda a qualidade ambiental; (9) a casa dos expropriados ficará sem qualquer logradouro; (10) por esses motivos, a desvalorização da casa, na ordem de 80%, deverá ser avaliada em € 304.000,00; (11) a restante parcela de terreno não expropriada fica igualmente desvalorizada nessa proporção, isto é, em cerca de 80%, num montante de € 77.880,00; (12) o valor das benfeitorias mostra-se, também ele, desajustado, merecendo concordância, apenas, o valor atribuído ao furo da água; (13) o valor da oliveira é de € 250,00 e o das fiteiras de € 350,00 cada uma; (14) o lago deve ser valorizado à razão de € 150,00 m2, num valor total de € 30.000,00 (€150,00 x 200m2); (15) para restabelecimento e recuperação da rede elétrica e de iluminação de todo espaço, terão de despender, no mínimo, um montante de cerca de € 5.000,00; (16) para refazer a rede de adução de água, por se tratar de repor cerca de 250 metros de tubo de plástico e respetivas manilhas, será necessário despender um montante de cerca de € 5000,00; (17) para substituição e reposição do sistema de rega automática, será necessário gastar, pelo menos, o montante de € 3.000,00; (18) quanto à rede de drenagem de águas pluviais que atravessa a parcela de terreno do extremo norte, será necessário despender o montante de € 1000,00 para a sua reposição; (19) o muro de suporte tem 3,20 metros de altura e não 2,20 metros, uma vez que a fundação é de 1 metro e tem 14,00 metros de comprimento; (20) o valor do muro de suporte em alvenaria é de € 85,00 por m2 e não de € 35,00, pelo que o seu valor é de € 3.308,00 (3,20 metros x 14,00 metros x € 85,00); (21) o muro de espera em alvenaria tem 1,50 metros de altura e não 1,00 metro, uma vez que a sua fundação é de 0,50 metros e tem, de comprimento, 72,00 metros; (22) o valor deste muro, por m2, é de € 70,00 e não de €30,00, num total de € 7.560,00 (1,50 metros x 72 metros x € 70,00).

Concluíram, considerando que o valor da justa indemnização a atribuir deverá ser de € 446.798,00.

Também a entidade expropriante veio recorrer, a fls. 259 e ss., pugnando pela redução do valor indemnizatório para € 2.508,25.
Alegou, para tanto, com relevo, que: (1) a parcela expropriada tem uma área de 445,00 m2, desanexada de uma área total de 3.400,00 m2; (2) de acordo com o Plano Diretor Municipal (doravante apenas PDM), a parcela expropriada insere-se em Reserva Agrícola Nacional (doravante apenas RAN) e, na carta de ordenamento caracteriza-se por espaço destinado a infraestruturas, ambos na classe de solos rurais; (3) neste contexto, a classificação da parcela como solo para outros fins é correta; (4) a taxa de capitalização aplicada pelos Srs. Árbitros mostra-se exacerbada e terá sempre de ser superior a 3 %, designadamente 4%, tendo em conta o risco inerente à atividade desenvolvida, o valor do terreno, as suas acessibilidades e o seu declive; (5) o valor da justa indemnização da parcela a expropriar será de €4,85 m2, num total de € 2.158,25; (6) nenhuma das benfeitorias, a não ser as vegetais, poderão ser relevadas para efeitos de justa indemnização, considerando que se trata de infraestruturas edificadas em Reserva Agrícola Nacional, sem licenciamento ou legalização; (7) apenas por 1 oliveira e 4 fiteiras poderão ser os expropriados indemnizados na quantia global de € 350,00.

A entidade expropriante veio responder concluindo como no respetivo recurso, e alegando, em síntese, que: (1) a área total do prédio do qual foi desanexada a parcela expropriada, que consta em toda a documentação junta aos autos, é de 3.400,00 m2, não se alcançando a relevância de ter o prédio uma área superior, que sempre haveria de ser provada pelos expropriados; (2) dada a proximidade do prédio dos expropriados da EN 205, que faz a ligação entre X e Arco de Baúlhe, e que também dá acesso à autoestrada A7, não é verdade que ali houvesse a qualidade ambiental e a ausência de ruído invocadas no recurso pelos expropriados; (3) as infraestruturas de água e saneamento têm cariz privado e não poderão ser valorizadas de acordos com o disposto nos artigos 26.º, n.º6, alíneas c) e d) do Código das Expropriações; (4) a parcela expropriada está inserida em RAN e não apresenta todas as características a que alude o artigo 25.º, n.º2 do Código das Expropriações; (5) a parte sobrante não deverá ser avaliada para efeitos de justa indemnização porquanto, pela respetiva área – 2.995,00 m2 -, apresenta interesse económico analisado objetivamente; (6) os expropriados não podiam ignorar que a via em causa ia ser construída quando edificaram a sua habitação.

Procedeu-se à avaliação da parcela expropriada, com a presença de cinco peritos.

O relatório elaborado pelos Srs. Peritos foi junto a fls. 480 e ss., sendo que os peritos indicados pela expropriante e nomeados pelo tribunal computaram, como justa indemnização, um valor global de € 29.997,50; e o perito indicado pelo expropriado calculou, como justa indemnização, o valor de € 170.037,00.

Por solicitação dos expropriados foi elaborado um estudo acústico de ruído ambiental que se encontra junto a fls. 518 e ss..
Tendo sido deferida a produção de prova (com inquirição de testemunhas e esclarecimentos aos peritos) na primeira data agendada para esse efeito, em 23-02-2017, foi determinado que os Srs. Peritos apresentassem nova avaliação do terreno, considerando a eventual desvalorização da parte sobrante tendo em conta o impacto ambiental (em virtude do ruído) e o facto de, encontrando-se a parcela expropriada e o prédio da qual foi desanexada em RAN, não poder ser considerado o solo da parcela expropriada como apto para construção.

Em obediência a este despacho foi apresentada nova avaliação pelos Srs. Peritos, a fls. 677 e ss., onde concluíram: os peritos indicados pela entidade expropriante e nomeados pelo tribunal, pelo valor global de € 27.318,60; o perito indicado pelo expropriado, pelo valor global de € 170.037,00.
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Foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:

“Nestes termos, decido julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos, fixando-se a justa indemnização no montante de € 27.318,60 (vinte e sete mil, trezentos e oito euros e sessenta cêntimos), acrescido do valor correspondente à atualização até à data da presente decisão, calculado de acordo com a evolução do índice de preços ao consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, nos termos do n.º 2 do art.º 24.º do Código das Expropriações.”

Inconformados vieram os Expropriados recorrer formulando as seguintes Conclusões:

A-) Deve ser alterada a matéria de facto, nos termos seguinte

Factos a eliminar:

Devem ser eliminados os pontos 6 e 7 dos factos provados.

Factos a alterar:

Deve ser alterado o ponto 15, passando o valor para o montante de 22.000,OO€.

Factos a aditar:

Devem ser aditados os factos seguintes:

1 - 0 terreno do prédio vizinho ao dos expropriados, pertencente a A. M. e T. R., apesar de ter igualmente as condicionantes constantes dos pontos 3. e 19. dos factos provados, foi-lhe pago, como tratando-se de terreno de logradouro da casa de habitação,
2 - Os peritos indicados pelo tribunal e pela expropriante avaliaram a parcela expropriada, como tratando-se de terreno agrícola, sendo que a mesma integrava o logradouro da habitação dos expropriados, pelo que deve ser tida em conta a avaliação do perito dos expropriados e que é do montante de 6.619,00€.
3 - Na avaliação efetuada pelos peritos do tribunal e pelo perito da expropriante não foi tido em conta o estudo acústico, a que alude o ponto 16. dos factos provados, ao contrário do que sucedeu com o perito dos expropriados, pelo que deve ser tido em conta a posição deste, atribuindo-se assim o montante de 22.606,00€ a título de depreciação da parcela sobrante e o montante de 43.3S0,00€ de depreciação da moradia,
4 -Aquando da "vistoria ad perpetuam rei memoria", o muro de suporte (da confrontação a norte) tinha 3,20 metros de altura, correspondendo um metro à sua fundação, e o muro de espera (da confrontação a poente) tinha 1,50 metros de altura, correspondendo a 0,50 metros à sua fundação, estes muros, além da alvenaria de granito, eram construídos em betão armado e, segundo o perito dos expropriados o seu valor a 52.128,00€, mais 1.320,00€.
Devem ser eliminados dos factos dados como não provados, as alíneas b) e c).
Para as alterações propostas à matéria de facto, tivemos em consideração o relatório pericial, em concreto a posição assumida pelo perito dos expropriados, o depoimento testemunhal de A. M., e ainda a transação judicial que envolveu esta testemunha e a expropriante;
B-) O Mto. Juiz "a quo" no essencial seguiu a posição dos peritos indicados pelo tribunal e pela entidade expropriante, apesar de estes ignorarem por completo os valores a que chegaram as partes no processo expropriativo que opunham A. M. e esposa e a Câmara Municipal de X,
C-) Sendo os terrenos dos expropriados e de A. M. e esposa contíguos, a avaliação dos mesmos tem que ser efetuada de forma igual. Os lagos e as demais benfeitorias têm que ser avaliados de forma igual, e a depreciação das parcelas sobrantes e das casas têm que ser avaliadas também de forma igual,
D-) Só o perito dos expropriados, que foi igualmente perito de A. M. e esposa, teve em linha de conta o modo como a entidade expropriante chegou a acordo com estes, na definição dos valores a atribuir aos expropriados, para que se conseguisse uma justa indemnização,
E-) Primeiro os peritos do tribunal e da entidade expropriante e depois o Mto. Juiz "a quo", ignoraram por completo o processo expropriativo dos terrenos confinantes com os terrenos dos expropriados, introduzindo uma clara violação do princípio da igualdade na definição da justa indemnização;
F-) Do relatório do perito dos expropriados e do depoimento da testemunha A. M., resulta claro que o prédio dos expropriados ficou diminuído, face às suas condições anteriores;
G-) Os expropriados edificaram a sua casa de habitação em local afastado de estradas municipais ou nacionais, com o intuito de obterem sossego e tranquilidade;
H-) Com a construção da via, a casa dos expropriados e bem assim toda a área envolvente e que integra o logradouro do prédio destes, sofreu uma clara desvalorização, que se encontra perfeitamente definida no relatório pericial do perito dos expropriados, sustentado também pelo depoimento da testemunha A. M.;
I-) A casa dos expropriados na sua parte fronteira possuía um lago e agora possui uma estrada, o que configura uma desvalorização de todo o conjunto;
J-) Sendo a construção da via um importante ativo para o concelho de X e para a sua população, esta foi construída, impondo sacrifícios aos proprietários dos prédios, por onde foi desenhada e, no caso dos expropriados, o sacrifício foi maior, pelo facto de a sua casa de habitação ter ficado muito próxima da via agora edificada;
K-) Esse sacrifício impõe ser indemnizado e, nos termos propostos pelo perito dos expropriados, uma vez que os demais peritos, pura e simplesmente ignoraram essa questão;
L-) As benfeitorias, designadamente o lago, tem que ser indemnizado pelos valores que foi indemnizado o lago da testemunha A. M., que refere lhe ter sido pago o m2 a 100/150€.
M-) O montante referido no seu depoimento pela testemunha A. M., vai de encontro à avaliação do perito dos expropriados, que aponta para 110€ o m2, num total de 22.000,OO€.
N-) Os muros foram devidamente avaliados pelo perito indicado pelos expropriados e de acordo também com o depoimento da testemunha A. M., pelo que o valor deve ser fixado em 52.128,00€ e para o acrescento no muro existente para contenção do talude do novo arruamento o montante de 1.320,00€.
O-) O valor da justa indemnização a atribuir aos expropriados, deve situar-se no montante de 157.352,OO€ (cento e cinquenta e sete mil trezentos e cinquenta e dois euros),
P-) A douta sentença recorrida, viola entre outras as normas contidas nos artigos 13° da Constituição da República Portuguesa, 6° do Código do Procedimento Administrativo, e 23°, 25°, nº 1 alínea a) e nº 2 alínea b), 26°, 28° e 29° do Código das Expropriações.
Nestes termos e nos melhores de direito a suprir por Vªs Exas Venerandos Desembargadores, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que fixe em 157.352,OO€, o montante da justa indemnização a atribuir aos expropriados, com as legais consequências.

A Expropriante não apresentou contra-alegações.
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Questões a decidir:

- Verificar se a prova produzida permite extrair as conclusões de facto expressas na sentença;
- Verificar se o direito foi bem aplicado aos factos provados, designadamente, se houve depreciação da parcela sobrante e, a existir, se esta é indemnizável e se houve violação do princípio da igualdade.
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Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

A matéria considerada provada na 1ª instância é a seguinte:

1. Para construção da “Variante à EN-205” que faz a ligação rodoviária entre a autoestrada “A7” e a vila de X, pelo Município X foi expropriada uma parcela de terreno integrante do prédio urbano sito no lugar (...), na freguesia de (...), concelho de X - descrito na Conservatória do Registo Predial de X com o n.º (...) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 719.º - que se encontra identificada como parcela “L1” na planta de localização aprovada pelo Despacho do Exmo. Sr. Secretário de Estado da Administração Local, de 13 de abril de 2011, publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º84, de 02 de maio de 2011, e que, assim, se mostra abrangida pela DUP declarada no mesmo despacho.
2. A área da parcela expropriada era de 445,00 m2 e a área total do prédio que a integrava era de 3.400,00 m2.
3. De acordo com o PDM de X em vigor à data da DUP, publicado no Diário da República n.º241 – II Série, de 15 de dezembro de 2008 (páginas 50093 e ss.) a parcela expropriada encontrava-se inserida em Reserva Agrícola Nacional/Solo Rural – Espaço Destinado a Infraestruturas.
4. Em 03-06-2011, a parcela a expropriar apresentava uma inclinação muito ligeira a nascente, sendo utilizada como logradouro/espaço de lazer da construção existente, que corresponde à habitação dos expropriados.
5. Na mesma data:
- o acesso ao prédio era possível pela confrontação norte, através de via não pavimentada (a via apresenta pavimento até cerca de 80 metros de distância da parcela);
- a parcela expropriada tinha plantadas 1 oliveira e 4 fiteiras, todas de bom porte e em bom estado vegetativo e diversos arbustos de jardim;
- no extremo norte da parcela expropriada existia um lago com cerca de 200 m2, que servia de local de recolha e depósito de águas, revestido a enrocamento de pedra sobre a membrana de impermeabilização;
- no subsolo da parcela expropriada existia uma rede de condução elétrica e de iluminação de todo o espaço, rede de adução de água, rede de rega automática, com dispositivos de rega, rede de drenagem de águas pluviais, que atravessava a parcela no extremo norte da mesma;
- a parcela expropriada tinha implantados, na confrontação a norte, um muro de suporte em alvenaria regular de granito, com 2,20 metros de altura e 14 metros de comprimento, com contador elétrico embutido no muro e, na confrontação a poente, um muro de espera em alvenaria de granito, junto da confrontação a poente, com 1,00 metro de altura e 72 metros de comprimento;
- a parcela expropriada tinha um furo de captação de água com 92 metros de profundidade;
- o prédio que integrava a parcela expropriada dispunha de redes de eletricidade e de telefone, situando-se a rede de distribuição de água a cerca de 100 metros da parcela.
6. O terreno da parcela expropriada, considerando as práticas agrícolas da região, as respetivas condições edafo-climáticas e a disponibilidade de água para rega, seria adequado a uma rotação bianual com as seguintes culturas e respetivos rendimentos anuais:
- no primeiro ano, o valor global líquido de € 728,00 - sendo, na primavera/verão, milho grão (num total de 3.500 kg, por hectare, valendo cada kg € 0,25, com encargos de 60% do valor de produção) e milho palha (num total de 1750 kg por hectare, valendo cada kg € 0,06, com encargos de 60% do valor de produção) e, no outono/inverno, azevém para corte em verde (num total de 12.000 kg por hectare, valendo cada kg € 0,04, com encargos de 30% do valor de produção);
- no segundo ano, o valor global de €1736,00 – sendo, na primavera/verão, hortícolas diversas (num total de 17.500 kg por hectare, valendo cada kg €0,20, com encargos de produção de 60%) e, no outono/inverno, azevém para corte em verde (num total de 12.000 kg por hectare, valendo cada kg € 0,04, com encargos de produção de 30%).
7. A taxa de capitalização sobre o valor médio de produção corresponde a 4% por hectare, donde, o valor médio da parcela expropriada é de €3,08 por metro quadrado (= produção anual média da parcela expropriada, que é de € 1232,00, a dividir pela taxa de capitalização referida, 0,04, equivalente a €30.800,00 por hectare), num total de €1370,60.
8. A oliveira que se encontrava plantada na parcela expropriada tinha um valor de €200,00 e as fiteiras um valor total de € 300,00.
9. O muro de suporte da confrontação a norte tinha um valor de €1848,00.
10. O muro de espera da confrontação a poente tinha um valor de € 3.600,00.
11. O furo de captação de água tinha um valor de € 4.000,00.
12. A rede de condução elétrica e iluminação tinha um valor de € 2.000,00.
13. A rede de adução de água tinha um valor de € 2.000,00.
14. A rede de rega automática, com dispositivos de rega, tinha um valor de € 1.000,00 e a rede de drenagem de águas pluviais tinha um valor de € 1000,00.
15. O lago no extremo norte da parcela tinha um valor de € 10.000,00.
16. Por solicitação dos expropriados, foi elaborado um estudo acústico de ruído ambiental onde se concluiu que, “do ponto de vista legal a futura implantação da variante EN 205 ditará o incumprimento do critério dos valores limite de exposição definido pelo Regulamento Geral do Ruído dando lugar a locais de sobre-exposição de ruído” e, ainda, que, “do ponto de vista ambiental, segundo critério de avaliação de impactes observa-se a criação de impacte negativo certo, local e permanente, condições estas que alteram determinantemente as condições de habitabilidade da habitação em causa.”
17. O alvará de construção da moradia dos expropriados é o n.º47/2010, de 17 de maio.
18. Com data de 02-08-2013, foi enviada aos expropriados carta com o seguinte teor: “Relativamente ao muro construído por V.Exa. no lugar …, freguesia de (...), deste concelho, o qual de acordo com a informação técnica presta n.º405/2013, cuja cópia se anexa, não é passível de legalização, pois situa-se no Plano Diretor Municipal em espaço canal e não cumpre os afastamentos ao eixo do caminho público confinante (no caso de 4 m, por força do disposto na alínea a), do n.º4, do artigo 59.º do Regulamento do Plano Diretor Municipal de X) para além de que não poderia ter sido executado àquela cota, uma vez que, esta, resulta de alteamento ilegal promovido no caminho público, vimos em cumprimento do despacho de 19 de julho de 2013, do Exmo. Sr. Presidente da Câmara, Eng. J. B., notificar V.Exa., nos termos do disposto n.º3 do artigo 106.º do RJUE, da intenção desta Câmara Municipal ordenar a demolição do referido muro e reposição do caminho público nas condições em que se encontrava antes do aterro, alteamento e patamar por si executados, com transporte a depósito dos respetivos materiais, no prazo de 30 dias.
Notifica, ainda V.Exa. que, em caso de incumprimento de tal ordem a mesma será executada coercivamente pela Câmara Municipal, a expensas suas, nos termos do artigo 4.º do artigo 106.º do RJUE e artigo 101.º do Regulamento Geral de Estradas e Caminhos Municipais.
(…)
Todavia, por que o dispositivo legal supracitado determina que, antes da resolução definitiva, seja dada audiência ao interessado a fim de dizer o que se lhe oferecer sobre tal petição, fica, igualmente, V.Exa. notificado para apresentar, por escrito, no prazo de 15 dias úteis, a contar da receção da presente notificação, informação ou que se lhe oferecer sobre as questões que constituem objeto do procedimento, podendo ainda requerer diligências complementares e juntar documentos com novos elementos defendendo os seus pontos de vista, no Serviço de Atendimento Único desta Câmara (…)”.
19. Do PDM do Município X constava, à data da DUP, do subcapítulo “Espaços Destinados a Infraestruturas”:
“Artigo 47.º Definição - Os espaços destinados a infra -estruturas são espaços que suportam a existência de infra -estruturas que condicionam especialmente a ocupação do solo e integram a rede rodoviária estruturante. Artigo 48.º- Identificação - Os espaços destinados a infra -estruturas e que integram a rede rodoviária estruturante estão identificados na planta de ordenamento à escala 1:10.000, e compreendem a área correspondente às margens de 50 metros para cada lado do eixo dos traçados propostos para a variante à E.N. 205, variante às EENN 205/210 e variante à E.N. 210, na parte destes eixos viários que atravessam o território do concelho.”
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E considerou não provados os seguintes factos:
a) À data da DUP, a área do prédio do qual foi desanexada a parcela expropriada era de 5.000,00 m2.
b) Aquando da “vistoria ad perpetuam rei memoria”, o muro de suporte (da confrontação a norte) tinha 3,20 metros de altura, correspondendo 1 metro à sua fundação, e o muro de espera (da confrontação a poente) tinha 1,50 metros de altura, correspondendo 0,50 metros à sua fundação.
c) Os muros de poente e norte, à data da “vistoria ad perpetuam rei memoria”, além da alvenaria de granito, eram construídos em betão armado.
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Da análise do recurso de impugnação da matéria de facto:

Quanto à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente especificar, obrigatoriamente e sob pena de rejeição, o seguinte (v. artigo 640º n.º 1 do CPC):

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.

Analisadas as conclusões formuladas pelos Recorrentes, verifica-se que cumpre o formalismo imposto pelo art. 640º do C. P. Civil, pelo que se vai conhecer de seguida do recurso de impugnação da matéria de facto.
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Cabe então agora verificar se a prova produzida foi bem analisada pelo julgador na 1ª instância.

Resulta do disposto no art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Conforme explica Abrantes Geraldes (1), a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações na matéria provada e não provada. Acrescentando que, em face da redação do art. 662º do C. P. Civil, fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe a sua própria convicção, mediante reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis, apenas cedendo nos fatores da imediação e oralidade.

Os Recorrentes impugnaram os pontos 6 e 7 dos factos provados, que pretendem sejam eliminados, pretendendo ainda a eliminação dos pontos b) e c) dos factos considerados não provados.

Pretendem a alteração do valor constante do ponto 15 dos factos provados (valor do lago) para 22.000,00€.

Pretendem ainda o aditamento dos seguintes factos:

1-O terreno do prédio vizinho ao dos expropriados, pertencente a A. M. e T. R., apesar de ter igualmente as condicionantes constantes dos pontos 3. e 19. dos factos provados, foi-lhe pago, como tratando-se de terreno de logradouro da casa de habitação;
2-Os peritos indicados pelo tribunal e pela expropriante avaliaram a parcela expropriada, como tratando-se de terreno agrícola, sendo que a mesma integrava o logradouro da habitação dos expropriados, pelo que deve ser tida em conta a avaliação do perito dos expropriados e que é do montante de 6.619,00€;
3-Na avaliação efetuada pelos peritos do tribunal e pelo perito da expropriante não foi tido em conta o estudo acústico, a que alude o ponto 16. dos factos provados, ao contrário do que sucedeu com o perito dos expropriados, pelo que deve ser tido em conta a posição deste, atribuindo-se assim o montante de 22.606,00€ a título de depreciação da parcela sobrante e o montante de 43.350,00€ de depreciação da moradia;
4-Aquando da “vaprm”, o muro de suporte (da confrontação a norte) tinha 3,20 metros de altura, correspondendo um metro à sua fundação, e o muro de espera (da confrontação a poente) tinha 1,50 metros de altura, correspondendo a 0,50 metros à sua fundação; estes muros eram construído, além da alvenaria de granito, eram construídos em betão armado e, segundo o perito dos expropriados o seu valor a 52.128,00€, mais 1.320,00€.

Analisando:

Os Recorrentes pretendem que os pontos 6 e 7 dos factos provados sejam eliminados, no entanto, a matéria dos mesmos consta do relatório pericial (aditamento) e, por outro lado, os Recorrentes não apresentam qualquer razão para que se proceda a tal eliminação, nomeadamente que a avaliação efetuada pelos peritos não esteja correta. Na verdade, pensamos que o pedido de eliminação da matéria em causa se prende com a discordância dos Recorrentes relativamente à classificação do solo da parcela expropriada mas, neste caso, estamos perante uma questão jurídica que não cabe analisar nesta sede.

Quanto à eliminação das al. c) e d) dos factos não provados, tal eliminação consistiria numa ato inútil e por isso proibido por lei (v. art. 130º do C. P. Civil) já que a matéria de facto considerada não provada não serve para base à aplicação do direito, não tendo pois, qualquer relevância a sua eliminação.

Assim, não analisaremos este segmento da impugnação da matéria de facto.

Os Recorrentes pretendem que o valor atribuído ao lago no ponto 15 dos factos provados, seja aumentado para 22.000,00€.
Fundamentam tal alteração na posição assumida pelo perito dos expropriados no laudo pericial e ainda o depoimento da testemunha A. M., vizinho daqueles.

A testemunha em causa referiu ser vizinho dos Expropriados, ter mandado fazer um lago parecido ao que existia no logradouro daqueles, mas de menores dimensões. Referiu alguns pormenores relacionados com a construção do lago, dizendo por exemplo que o mesmo era revestido a granito. Disse que esse lago deve ter custado aos Expropriados entre 20.000€ e 25.000,00€, correspondendo a um custo por m2 entre 100 e 150€. Estas declarações correspondem ao alegado pelos Expropriados, no entanto, não fornecem um valor preciso. Assim, na falta de elementos que sustentem tais afirmações, como por exemplo, uma fatura, não é possível aceitar tal versão.

Por outro lado, é certo que o perito dos expropriados atribuiu ao lago um valor superior ao considerado pelos peritos da expropriante e do Tribunal, no entanto, em face de tal divergência e, não se pondo obviamente em causa a idoneidade do Sr. Perito indicado pelo Expropriados, entende-se dar prevalência à avaliação efetuada pela maioria onde se inclui o Sr. Perito indicado pelo Tribunal, que terá maior independência relativamente aos interesses das partes, pelo que se têm por adequado o valor fixado pelo Tribunal recorrido.

O entendimento no sentido de que, em caso de divergência entre os peritos, o julgador deve dar prevalência ao parecer maioritário e, em caso de discordância entre os peritos do tribunal e os demais, há que dar prevalência ao laudo dos primeiros, tem sido praticamente unânime na nossa jurisprudência, pela maior garantia de imparcialidade que oferecem os peritos nomeados pelo tribunal, só devendo ser afastado tal laudo, quando se constata que foi elaborado com base em critérios inadmissíveis ou desadequados, ou quando se deparam nos mesmos erros ou lapsos evidentes, que importem correcção (2)

No que concerne aos factos que os Recorrentes pretendem aditar, vemos que o ponto 1 dos mesmos diz respeito à situação de uns vizinhos dos expropriados e à classificação do solo do prédio desses. Ora, ainda que o mencionado prédio também tivesse as condicionantes previstas nos pontos 3 e 19 – coisa que desconhecemos por tal matéria não ter sido alegada e não ter resultado da prova produzida -, como acima já foi dito, a classificação do solo para efeitos de atribuição de indemnização é uma classificação jurídica, que não pode ser tratada na fundamentação de facto.

Os pontos 2 e 3 que os Apelantes pretendem aditar aos factos provados, mais não é que um relato de certos aspetos do relatório pericial e argumentação no sentido da fixação da indemnização pretendida pelos Expropriantes.

Ora, o relatório pericial é um meio de prova, a valorar livremente pelo Tribunal, destinando-se, como qualquer outra prova, a demonstrar os factos alegados pelas partes (3), não cabendo por isso relatar nos factos provados as respostas dadas pelos Srs. Peritos a determinadas questões aí abordadas. Assim, a matéria ora em análise não pode ser incluída nos factos provados (ou nos não provados).

No que respeita ao ponto 4 que os Apelantes pretendem aditar, vemos que os factos relativos aos muros foram consignados na matéria de facto no ponto 5, encontrando-se tal matéria estribada pelo tribunal a quo nas respostas do Sr. Perito do Tribunal e do Sr. Perito da Expropriante, já que o Sr. Perito indicado pelos Expropriados teve outro entendimento (no sentido do agora sugerido pelos Apelantes). Ora, em face desta divergência, remete-se para o que acima foi dito a propósito da avaliação do lago. Por outro lado, a fixação dos valores indemnizatórios não consubstancia matéria de facto mas sim uma questão jurídica, pelo que tal menção nunca poderia fazer parte dos factos provados.

Improcede, pois totalmente a pretensão dos Recorrentes no sentido da alteração da matéria de facto fixada na 1ª instância.
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Do Direito:

A expropriação por utilidade pública traduz-se na “relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar determinados bens imóveis em fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjetivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património da pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a este pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória“ (4).

Decorre do disposto no art.º 1º do Código de Expropriações que “Os bens imóveis e os direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública compreendida nas atribuições, fins ou objeto da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização.”.

Por outro lado, resulta do art. 23º, nº 1 do mesmo Código que : “1- A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.”

No Acórdão do Tribunal Constitucional nº 84/2017 de 16/02/2017 (5) entendeu-se que “a justa indemnização deve atingir valor adequado a ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo princípio da equivalência de valores.”.

Nos artigos 26º e seguintes. do Cód. De Expropriações encontram-se previstos os critérios referenciais para o cálculo do valor dos bens, esclarecendo o nº 5 do art. 23º que “o valor dos bens calculado de acordo com os critérios referenciais do art. 26º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado”.

Nos termos do preceituado no art. 24º, nº 1 do CE, o montante da indemnização é calculado por referência à data da declaração de utilidade pública, sendo atualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução de preços no consumidor, com exclusão da habitação.

Em face da improcedência do recurso na parte respeitante à alteração da matéria de facto, adere-se à cuidada fundamentação jurídica expendida na sentença recorrida, nomeadamente no que respeita aos valores atribuídos ao muro e ao lago, uma vez que a eventual alteração da indemnização estava dependente da modificação factual, que não ocorreu. Adere-se também ao tratamento jurídico que mereceu, nessa decisão, a questão relativa à depreciação da parcela sobrante do terreno e da moradia devido à perda da qualidade ambiental e aumento dos níveis de ruído.

Com efeito, quanto a esta questão realça-se, tal como fez o Exmº Juiz a quo, que “aquando a emissão do respetivo alvará de construção – em 17 de maio de 2010 –, já o PDM de X, de 2008, previa a construção da “variante” junto àquela moradia”.

Na verdade, sabendo os Expropriados, ou devendo saber, que a parcela expropriada se encontrava afetada à construção de infraestruturas (variante) pelo PDM de 2008, construíram a sua moradia naquele local, pelo que, ainda que se entenda que são indemnizáveis os danos não causados diretamente pela expropriação (6), estaríamos perante um caso de venire contra factum próprio, pois os Expropriados assumem comportamentos que podem ser considerados contraditórios, já que, por um lado, edificam a sua moradia junto de um espaço onde está prevista a construção de uma estrada e, por outro lado, querem ser indemnizados pelos danos não patrimoniais que lhes causa tal construção, nomeadamente em termos de ruído e perda de qualidade ambiental.

Vejamos agora se, no caso, foi violado o princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP e no art. 6º do C. P. Administrativo.
Os Expropriantes dizem que o Juiz a quo ignorou o processo expropriativo dos terrenos confinantes, designadamente o que abrangeu o terreno da testemunha A. M., argumentando que a avaliação dos dois terrenos e, nomeadamente dos lagos e demais benfeitorias, tem de ser feita de forma igual.

Conforme se explica no Acórdão do Tribunal Constitucional de 18/03/2003 (7) o princípio da igualdade no domínio da relação interna (onde se confrontam as regras de indemnização aplicáveis às diferentes expropriações), impõe ao legislador, na definição de regras de indemnização por expropriação, um limite inderrogável: não pode fixar critérios de indemnização que variem de acordo com os fins públicos específicos das expropriações (v.g. critérios de indemnização diferentes para as expropriações de imóveis destinados à abertura de vias férreas, ao rasgo de autoestradas, à execução de planos urbanísticos, etc.), com os seus objetos (critérios diferenciados para as expropriações de imóveis e móveis, prédios rústicos e urbanos, solos agrícolas e solos urbanizados, etc.) e com o procedimento a que elas se subordinam. O princípio da igualdade não permite que particulares colocados numa situação idêntica recebam indemnizações quantitativamente diversas ou que sejam fixados critérios distintos de indemnização que tratem alguns expropriados mais favoravelmente do que outros grupos de expropriados. Aquele princípio obriga o legislador a estabelecer critérios uniformes de cálculo da indemnização, que evitem tratamentos diferenciados entre os particulares sujeitos a expropriação.

Por outro lado, conforme refere Jorge Miranda (8), citando o Ac. do Tribunal Constitucional nº 231/94 de 9/3 (9) a essência da aplicação do princípio da igualdade encontra o seu ponto de apoio na determinação dos fundamentos fácticos e valorativos da diferenciação jurídica consagrada no ordenamento. O que significa que a prevalência da igualdade como valor supremo do ordenamento tem de ser caso a caso compaginada com a liberdade que assiste ao julgador de ponderar os diversos interesses em jogo e diferenciar o seu tratamento no caso de entender que no caso se justifica.

O princípio da igualdade impõe, pois, igualdade de tratamento para situações iguais e tratamento diferenciado para situações desiguais.

No caso, para que se pudesse concluir pela violação do princípio da igualdade, seria necessária a prova da existência de tratamento diverso entre situações concretas iguais, sem que tal diferenciação tivesse justificação em fundamentos razoáveis.

Ora, nada nos autos nos indica que os Expropriados e seu vizinho estivessem em situações idênticas, já que nada foi alegado e/ou provado nesse sentido. Desconhecemos também quais os critérios que estiveram na base na fixação da alegada indemnização à mencionada pessoa, sendo certo que seria pouco provável que as situações em causa fossem absolutamente idênticas de forma a merecerem o mesmo tratamento jurídico, já que cada terreno ou obra tem sempre especificidades únicas que, em princípio merecerão tratamento diferenciado.

Improcede assim, totalmente o recurso dos Expropriados, mantendo-se o valor das indemnizações fixadas na sentença recorrida.
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DECISÃO:

Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas a cargo dos Recorrentes.
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Guimarães, 8 de novembro 2018

Alexandra Rolim Mendes
Maria de Purificação Carvalho
Maria dos Anjos Melo Nogueira


1. Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3ª Edição, pág. 245
2. neste sentido, os Ac. da R.C. de 25/11/03; da R. G. de 11/09/2012; da R. P. de 18/12/2013; Ac. R. L. de 12/04/2018
3. v. arts. 341º, 388 e 389º, todos do C. Civil
4. Marcelo Caetano, in Manual de Direito Administrativo, vol. II, pág. 1020
5. in www.tribunalconstitucional.pt
6. A interpretação do art. 29º do C.E. vem sendo alvo de duas correntes interpretativas que assentam essencialmente na identificação ou ausência de nexo de causalidade entre o ato expropriativo e os prejuízos causados à parte sobrante do prédio expropriado. Salvador da Costa (Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores Anotados e Comentados, Almedina 2010, pág. 215) e diversa jurisprudência (Ac. STJ de 9/7/2014; Ac. RP de 29/06/09; Ac. RG de 6/4/2010) pronuncia-se pela não ressarcibilidade de tais danos, pelo menos no processo expropriativo por entender que os mesmos não de correm da expropriação. Outras decisões pronunciam-se em sentido oposto (Ac. STJ de 10/01/2013; Ac. RE de 17/5/07).
7. in www.pgdlisboa.pt
8. in Direito Constitucional, Tomo IV, pág. 248
9. DR 1ª série – A, nº 98 de 28/4/1994