Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1566/13.0TBGMR-A.G1.
Relator: AFONSO MANUEL ANDRADE
Descritores: TAXA SANCIONATÓRIA EXCEPCIONAL
REQUISITOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.º SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. Justifica-se a aplicação de uma taxa sancionatória excepcional (art. 531º CPC) a uma exequente que instaurou uma execução apresentando apenas uma fotocópia simples de documento particular assinado pelo devedor (contrato de crédito), e que quando notificada para juntar o original declarou que o mesmo se tinha transviado, e que por isso viu os embargos de executado instaurados pelo executado ser julgados manifestamente procedentes.

2. A censura não recai no comportamento da parte após ter instaurado a execução, recai antes no próprio acto de instauração da execução, sem ter título executivo.

3. E é legítimo ponderar na aplicação da taxa sancionatória o facto de a exequente ser uma entidade que se dedica, como a sua designação o indica, a efectuar «Serviços de Tratamento e Aquisição de Dívidas».
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Sumário: 1. Justifica-se a aplicação de uma taxa sancionatória excepcional (art. 531º CPC) a uma exequente que instaurou uma execução apresentando apenas uma fotocópia simples de documento particular assinado pelo devedor (contrato de crédito), e que quando notificada para juntar o original declarou que o mesmo se tinha transviado, e que por isso viu os embargos de executado instaurados pelo executado ser julgados manifestamente procedentes. 2. A censura não recai no comportamento da parte após ter instaurado a execução, recai antes no próprio acto de instauração da execução, sem ter título executivo. 3. E é legítimo ponderar na aplicação da taxa sancionatória o facto de a exequente ser uma entidade que se dedica, como a sua designação o indica, a efectuar «Serviços de Tratamento e Aquisição de Dívidas».

I- Relatório

André, com os sinais dos autos, deduziu oposição por embargos à execução contra si movida por X- Serviço de Aquisição e Tratamento de Dívidas, SA.

Na fase de saneamento e condensação dos autos, o Tribunal considerou possível, sem necessidade de mais provas, proceder à imediata apreciação do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 595º,1,b, do Código de Processo Civil, “ex vi” do disposto no artigo 732º,2 do mesmo Código.

Fazendo-o, o Tribunal considerou que a exequente além de não possuir o original do título executivo, apresentou uma fotocópia que é ilegível quanto ao número atribuído e, consequentemente, à identificação do contrato. E só os originais ou cópias autênticas dos documentos constituem títulos executivos, pelo que considerou manifestamente improcedente esta acção executiva que tem por título uma fotocópia simples e ilegível.
Assim, o Tribunal julgou o documento dado à execução sem idoneidade para configurar título executivo e, em consequência, julgou a oposição à execução procedente e determinou a extinção da execução, condenando em custas a exequente, com taxa de justiça excepcional fixada em 8 (oito) UCs.

Inconformada com a decisão que a condenou em 8 UC de taxa de justiça excepcional, a exequente veio dela interpor recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito suspensivo (artigos 644º,2,e; 645º,1; 647º,3,e, todos do C.P.C).

Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões:

A) O documento apresentado à execução consiste na fotocópia de um contrato, celebrado entre a apelante e o apelado, através do qual a Exequente/apelante concedeu um crédito ao Executado, através do qual este se obrigou a reembolsar a Exequente da verba mutuada e efectivamente disponibilizada, mediante o pagamento de prestações mensais determinadas no contrato;
B) Não obstante a Apelante dispor do original em arquivo externo, uma vez que o contrato em questão remonta ao ano de 2006;
C) Sucede porém, que aquando da notificação do douto Tribunal “a quo” para junção do original do título executivo, a ora recorrente tratou imediatamente de diligenciar pela sua obtenção;
D) Aconteceu, todavia que o respectivo documento se extraviou;
E) Ora, estamos perante um contrato que remonta a 2006, que foi objecto de diversas cessões de crédito conforme explanado no requerimento executivo, o que o levou a ser objecto de vários transportes por terceiros, e a sucessivas mudanças de instalações, alheias à aqui Apelante;
F) Contrariamente ao afirmado pelo M.º Juiz “a quo”, entende a Apelante não existir culpa ou mera negligência na sua actuação, uma vez que o extravio de um documento pode acontecer a qualquer pessoa colectiva ou singular, independentemente do nome da sua firma ou do objecto social que prossegue;
G) Mais, a ora apelante pautou sempre a sua actuação pelo cumprimento dos deveres de actuação para com o douto tribunal, informando o tribunal do sucedido.
H) Segundo o critério de um bom pai de família, diligente e prudente, não está este isento de um acontecimento como o é, o extravio de um documento sem culpa;
I) Ora, e uma vez que a notificação para a junção do original do documento surge apenas em momento posterior à fase dos articulados e tendo sido requerido nos autos realização de prova testemunhal;
J) Acrescentando, que não estão verificados os pressupostos de aplicação do art. 531º do CPC mormente, a improcedência da acção não é resultado exclusivo da falta de prudência da Apelante, a Apelante não visava qualquer intuito dilatório, nem reconhece na sua actuação qualquer elemento abusivo ou censurável que justifique a sanção aplicada;
K) Tendo sido também ela apanhada de surpresa.
L) Sem pretender se eximir à consequência legal da improcedência da acção executiva por falta de título executivo não deve a aqui Apelante receber um tratamento desfavorável, desproporcional, e gravoso só e apenas pelo nome da sua firma, ou pelo seu objecto social.

Não houve contra-alegações.

II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando a natureza jurídica da matéria versada, a única questão a decidir consiste em saber se se se deve manter a decisão que condenou a exequente em taxa de justiça excepcional.

III
Fazendo um breve resumo da tramitação processual destes autos, temos o seguinte panorama:

1. X- Serviço de Aquisição e Tratamento de Dívidas, SA, intentou contra André, com os sinais dos autos, acção executiva para cobrança da quantia de € 1.055,96.
2. A embargada apresentou contestação.
3. Por despacho de 4/5/2015, o Juíz do processo ordenou a notificação da exequente para no prazo de 10 dias juntar aos autos o original do contrato dado à execução (visto que da cópia junta aos autos principais não é visível o nº atribuído ao mesmo).
4. A exequente veio então requerer prorrogação de prazo por período não inferior a 20 dias para juntar o documento em causa, alegando que o mesmo se encontrava em arquivo externo e a exequente está a diligenciar pela sua entrega.
5. Foi proferido despacho que concedeu o peticionado prazo.
6. Posteriormente, veio a exequente informar que não logrou encontrar o original do documento dado à execução, pelo que não será possível dar cumprimento ao despacho.
7. Foi então proferido “Saneador-Sentença”, com o seguinte teor:

“Em apenso a acção executiva, fundada em documento particular assinado pelo devedor, constitutivo de obrigação pecuniária (contrato de crédito), veio o executado deduzir oposição à execução, alegando, além do mais e em síntese, que efectuou o pagamento de todas as prestações do referido contrato de mútuo, a última das quais em Dezembro de 2004, todas por débito directo na sua conta bancária, de que junta comprovativos, não compreendendo o motivo porque o exequente refere que deixou de pagar em 22-06-2006. Requereu por isso e além do mais que a exequente juntasse aos autos cópia certificada da autorização do seu débito directo, referente ao contrato de crédito nº ...001.
Notificado o exequente, veio o mesmo alegar, além do mais, que os comprovativos dos pagamentos efectuados pelo executado dizem respeito a outro contrato que não o dado à execução.
Em face de tal posição do exequente, veio o executado dizer que só celebrou um contrato de crédito com a entidade em causa e não compreende o motivo porque o exequente não junta qualquer documento referente a este crédito.
Em face da posição das partes, foi notificada a exequente para, em 10 dias, juntar aos autos o original do contrato dado à execução, uma vez que a fotocópia junta é ilegível quanto ao número atribuído ao mesmo.
Após várias insistências, o exequente veio dizer que não localizou o original do contrato, não podendo cumprir o ordenado.

II – Fundamentação:

Não se questiona que o título dado à execução é uma fotocópia de documento particular assinado pelo devedor, constitutivo de obrigação pecuniária (contrato de crédito), ilegível quanto ao número atribuído ao mesmo.
De igual modo não se questiona que o executado cumpriu integralmente o contrato de crédito nº ...001.
Do mesmo modo, não se questiona que o exequente foi notificado para juntar o original do contrato de crédito e não o fez, dizendo que não o localizou.
Portanto, o que se questiona é se uma fotocópia ilegível pode constituir título executivo.
A apresentação de título executivo constitui o requisito formal para a instauração da acção executiva (artigo 10º, nº 5, do Código de Processo Civil), sendo através do mesmo que a lei presume um direito (para quem nele figure como credor) e uma obrigação (para quem nele figure como devedor). É pois, pelo título que se determina o fim e os limites da acção executiva.
Ora, baseando-se a execução em fotocópia de documento particular assinado pelo devedor (contrato de crédito) em que não é possível sequer identificar o mesmo, por ser ilegível, não é de a admitir como título executivo.
Na verdade, o processo executivo baseia-se num título executivo cuja apresentação é suficiente para iniciar a execução, consistindo o dito título num documento que faz prova documental simples de um acto ou de um negócio jurídico constitutivo ou certificativo de uma relação jurídica de natureza real ou obrigacional e que, só por si, permite que o credor desencadeie a actividade jurisdicional visando a realização coactiva da prestação que lhe é devida.
A mera fotocópia não se encontra revestida de idêntico valor probatório e não pode servir de base à execução. Efectivamente, só os originais ou cópias autênticas dos documentos constituem títulos executivos (cfr. neste sentido: Acórdãos da Relação do Porto de 15-06-2011 – Nº convencional JTRP000, da Relação de Lisboa de 30-03-2006, e Relação de Coimbra de 14-12-2005 - Nº convencional JTRC, todos disponíveis in: www-dgsi.pt).
Assim, é forçoso concluir que o exequente não tem título para formular o pedido executivo, ocorrendo manifesta falta de título executivo relativamente ao pedido deduzido. A falta de título implica a recusa do requerimento inicial pela secretaria ou, não o tendo sido, implica indeferimento do requerimento executivo pelo juiz, nos termos do disposto nos artigo 725º, nº1, al. d), e 726º, nº2, al. a, do Código de Processo Civil.
E desta forma, nada mais resta que julgar o documento apresentado sem idoneidade para configurar título executivo e, em consequência, julgar procedente a oposição à execução.

Da taxa sancionatória excepcional.

Dispõe o artigo 531º do Código de Processo Civil que o juiz, por decisão fundamentada e excepcionalmente, pode aplicar uma taxa sancionatória quando a acção seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida.
No caso dos autos, a exequente «X», instaurou a presente execução alegando que o credor Banco C., S.A., cedeu-lhe o crédito que possuía sobre o executado, dando à execução uma fotocópia de documento particular assinado pelo devedor, constitutivo de obrigação pecuniária (contrato de crédito).
Porque o título executivo era um documento que aparentava fazer prova documental simples de uma relação jurídica de natureza obrigacional e que, só por si, permitia ao credor desencadear a actividade jurisdicional visando a realização coactiva da prestação que lhe é devida, foi notificada a entidade patronal do executado para proceder à penhora do seu salário, o que sucedeu.
O executado deduziu oposição à execução e já no decurso desta constatou-se que a exequente além de não possuir o original do título executivo, a própria fotocópia apresentada é ilegível quanto ao número atribuído e, consequentemente, à identificação do contrato.
Ora, só os originais ou cópias autênticas dos documentos constituem títulos executivos, pelo que é manifestamente improcedente uma acção executiva que tem por título uma fotocópia simples e ilegível.
E sendo a exequente uma entidade que se dedica, como a sua designação o indica, a efectuar «Serviços de Tratamento e Aquisição de Dívidas», é de concluir que não agiu com a prudência e diligência devida ao instaurar a execução com base numa fotocópia ilegível.
Assim, entendemos ser de aplicar à exequente/oposta taxa sancionatória excepcional.
A tal propósito, dispõe o artigo 10º do RCP que a taxa sancionatória é fixada pelo juiz entre 2 e 15 UC.
Considerando o exposto e a actividade da cessionária do crédito (exequente), consideramos proporcional e adequado a fixação de 8 UCs a título de taxa sancionatória excepcional.
*
III - DECISÃO:

Pelo exposto:

1. Julgo o documento dado à execução sem idoneidade para configurar título executivo e, em consequência, julgo a presente oposição à execução procedente e determino a extinção da execução.
2. Custas pela exequente/oposta, com taxa de justiça excepcional que fixo em 8 (oito) UCs.
Registe e notifique.”

IV
Conhecendo do recurso.
Está em causa apenas saber se a decisão que aplicou à exequente uma taxa sancionatória excepcional, no montante de 8 UC, merece censura ou não.

Dispõe o art. 531º CPC, sob a epígrafe “Taxa sancionatória excepcional”, que

“por decisão fundamentada do juiz, pode ser excepcionalmente aplicada uma taxa sancionatória quando a acção, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida”.

Recorrendo aqui ao comentário de Lebre de Freitas, in CPC anotado, 3ª edição, “exige-se, além da manifesta improcedência, que o acto da parte seja resultado exclusivo de falta de prudência ou diligência”.

Salvador da Costa escreve (As Custas Processuais, 6ª edição, fls. 160) que “é uma taxa de tipo sancionatório, próxima da penalidade, não sujeita a juros de mora, aplicável pelo Juíz ou pelo colectivo de Juízes em decisão fundamentada nos factos processuais apurados no processo e na lei, visando essencialmente a moralização e a normalização da actividade processual e obstar à litigância imponderada ou irreflectida das partes nos tribunais. A ampla moldura desta taxa de justiça sancionatória implica que, na sua graduação, se considere o grau de convicção normal da manifesta improcedência da pretensão formulada pelas partes, conforme as circunstâncias envolventes”.

Quanto à verificação do primeiro requisito (a acção ser manifestamente improcedente) não pode haver qualquer dúvida, pois a decisão que julgou os embargos procedentes, e que não foi alvo de recurso, tendo transitado em julgado, concluiu que a exequente não tinha título para formular o pedido executivo, ocorrendo manifesta falta de título executivo relativamente ao pedido deduzido.

O que a apelante vem alegar para fundamentar o seu recurso, em síntese, é que a improcedência da acção não é resultado exclusivo da sua falta de prudência, que não visava qualquer intuito dilatório, e que não reconhece na sua actuação qualquer elemento abusivo ou censurável que justifique a sanção aplicada.

Ora bem.
Temos de começar por ter presente que a dicotomia acção declarativa – acção executiva não é apenas uma classificação legal e doutrinária de meios processuais pelos quais se visam efectivar os direitos conferidos pelo direito civil substantivo.
É uma distinção que tem as maiores e mais relevantes consequências práticas.
Em termos teórico-dogmáticos, a acção declarativa é aquela que visa definir os direitos das partes no caso concreto, e como tal, é em princípio uma fase prévia obrigatória que tem de ser percorrida, antes de se poder lançar mão da acção executiva.

Como é por demais sabido, o legislador preocupou-se em definir rigorosamente como e em que termos alguém pode intentar uma acção executiva, nos arts. 703º e seguintes CPC, estabelecendo no art. 703º,1 que à execução apenas podem servir de base: a) as sentenças condenatórias; b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação; c) Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo; d) Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.

Ora, a presente execução foi instaurada ainda ao abrigo da vigência do anterior CPC, o qual no seu art. 46º,1,c conferia exequibilidade aos documentos particulares assinados pelo devedor, constitutivos ou recognitivos de obrigações. Escreve Lebre de Freitas (A acção executiva, 7ª edição, fls. 73) que “para que os documentos particulares, não autenticados, constituíssem título executivo, era imposto: a) como requisito de fundo, que deles constasse a obrigação de pagamento de quantia determinada ou determinável por simples cálculo aritmético, de entrega de coisa ou de prestação de facto (…). Tal como acontecia com os documentos autênticos ou autenticados, o documento particular era título executivo tanto quanto formalizasse a constituição de uma obrigação como quando o devedor nele reconhecesse uma dívida pré-existente. A ele equivalia a pública-forma e a fotocópia atestada conforme por notário, a menos que o executado requeresse a exibição do original (arts. 386º CC e 387º,2 CC)”.

A Jurisprudência é ao que supomos unânime em negar exequibilidade a uma mera fotocópia de um documento particular, sem reconhecimento notarial (cfr., por todos, Acórdão do TRC de 14/12/2005, Relator António Piçarra).

Isto para dizer que é incontroverso que uma simples fotocópia de um documento particular, assinado pelo devedor, constitutivo de obrigação pecuniária (contrato de crédito), ilegível quanto ao número atribuído ao mesmo, não é título executivo.

O que se compreende bem demais, pois é da mais elementar prudência que só se permita a um particular lançar mão da máquina coerciva do Estado, com o que isso representa de agressão imediata ao património do alegado devedor, nos casos em que esse particular se apresente munido de um título que dê garantias sólidas da existência do direito que se pretende executar (cfr. art. 10º,5 CPC). E uma mera fotocópia não as dá, de todo.

Vem agora a apelante dizer que não existe culpa ou mera negligência na sua actuação, uma vez que o extravio de um documento pode acontecer a qualquer pessoa colectiva ou singular, independentemente do nome da sua firma ou do objecto social que prossegue; e que pautou sempre a sua actuação pelo cumprimento dos deveres de actuação para com o douto tribunal, informando o tribunal do sucedido; e que segundo o critério de um bom pai de família, diligente e prudente, não está este isento de um acontecimento como o é, o extravio de um documento sem culpa; e que a apelante não visava qualquer intuito dilatório, nem reconhece na sua actuação qualquer elemento abusivo ou censurável que justifique a sanção aplicada; e que também ela foi apanhada de surpresa.

Ora, parece que a recorrente está a querer defender a sua postura processual, isto é, está a pretender convencer o Tribunal da lisura do seu comportamento após ter instaurado a execução.
Só que, e salvo melhor opinião, o que levou à sua condenação não foi a forma como se comportou durante a pendência da acção executiva.

Foi tê-la instaurado.
E foi tê-la instaurado, apesar de manifestamente não ser portadora de um título executivo, não podendo ignorar que estava a lançar mão do processo de execução sem título executivo. Repare-se que irreleva a afirmação de que apesar de ter procurado por todo o lado, o original do documento não foi encontrado. O Tribunal não sabe, e nem é especialmente relevante, se isso é verdade ou não. O facto relevante é que a exequente sabia que não tinha nas mãos um título executivo, mas uma mera fotocópia particular sem qualquer valor executivo, e mesmo assim optou por instaurar a acção. Ao fazê-lo, indevidamente, o património do executado foi logo agredido, com a penhora do seu salário, o que é indiscutivelmente grave. Ao pretender instaurar a acção, a exequente tinha por obrigação aperceber-se que o título executivo que tinha para apresentar não era um verdadeiro título executivo, donde deveria ter sobrestado na instauração da acção enquanto localizava o documento original. E se o não encontrasse, nunca poderia instaurar a acção. Teria de recorrer a uma acção declarativa, primeiro. O que não poderia ter feito era avançar com o requerimento executivo.

Assim, parece evidente que, ao instaurar uma acção executiva com base num documento que é pacífico na jurisprudência que não tem força executiva, a exequente actuou com falta de prudência.

E assim acompanhamos integralmente a apreciação feita na sentença segundo a qual “sendo a exequente uma entidade que se dedica, como a sua designação o indica, a efectuar «Serviços de Tratamento e Aquisição de Dívidas», é de concluir que não agiu com a prudência e diligência devida ao instaurar a execução com base numa fotocópia ilegível.

E não se pode afirmar, como o faz a apelante, que ela está a receber um tratamento desfavorável, desproporcional, e gravoso só e apenas pelo nome da sua firma, ou pelo seu objecto social.

Note-se que estamos perante uma taxa sancionatória, que, como o próprio nome indica, se destina a penalizar litigâncias irreflectidas e irrazoáveis. Donde, ser legítimo ponderar na fixação da taxa, a diferença entre alguém que recorreu ocasional e esporadicamente ao Tribunal, e a actividade profissional de uma empresa que se dedica a efectuar «Serviços de Tratamento e Aquisição de Dívidas”, e que por isso tem uma muito maior propensão para instaurar acções de cobrança das mesmas dívidas. E o facto de o fazer de forma profissionalizada e especializada, aumenta as exigências de cuidado e de rigor. Que não estiveram presentes, neste caso. Daí a decisão recorrida ser acertada e não merecer qualquer censura.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar o recurso totalmente improcedente, e confirmar na íntegra a decisão recorrida.

Custas pela recorrente (art. 527º,1,2 CPC).

Data:10/7/2018

Relator

(Afonso Cabral de Andrade)

1º Adjunto
(Alcides Rodrigues)

2º Adjunto
(Joaquim Luís Espinheira Baltar)