Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
185/15.1T8BRG.G1
Relator: AFONSO CABRAL DE ANDRADE
Descritores: DANO FUTURO
DÉFICE FUNCIONAL
DANO BIOLÓGICO
SALÁRIO ATENDÍVEL
ESPERANÇA DE VIDA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/01/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO DE AMBAS AS PARTES
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Nos casos em que o lesado ficou a padecer do défice funcional de 10 pontos, por problemas cognitivos menores (dificuldade em concentrar-se, nível de ansiedade aumentado, dificuldade em suportar barulhos, dores de cabeça, dificuldade em dormir, rápido cansaço mental, tornou-se, por vezes, irritável e irascível, distúrbios de memória), mas que é compatível com a profissão habitual, exigindo esforços suplementares, não é possível determinar um valor concreto correspondente à perda de ganho decorrente das lesões causadas pelo acidente, pelo que o Tribunal deve decidir por recurso à equidade.
II- Neste caso, em que a autora sofreu o acidente quando tinha 18 anos, e frequentava o curso de Engenharia Química da Faculdade de Engenharia da Universidade ...; iniciou a sua actividade profissional em 1.9.2018, e encontra-se a trabalhar na área da indústria química na Holanda, onde aufere uma retribuição líquida de cerca de € 2.500,00; as sequelas do acidente não a impediram de iniciar e desenvolver a actividade laboral, mas exigem dela esforços suplementares, é equitativo e justo fixar a indemnização em € 115.000,00.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- Relatório

M. B., solteira, maior, contribuinte fiscal n.º ………, residente na Estrada …, n.º …, na Ilha da Madeira, intentou contra X – COMPANHIA DE SEGUROS, NIPC ……..., com sede na avenida …, n.º … Lisboa, Portugal, a presente acção declarativa sob a forma comum, tendo pedido a condenação da Ré no pagamento:

i. Da quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros) a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do sinistro em crise;

ii. Das quantias a liquidar em execução de sentença ou ampliação do pedido relativo ao agravamento do dano futuro e às despesas inerentes ao recurso a ajudas técnicas, como sejam, material médico, medicamentoso e necessidade de acompanhamento médico, conforme alegado nos artigos 109.º e 110.º, da petição inicial;

iii. Dos juros moratórios calculados à taxa legal e contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que no dia 06.06.2013, pelas 11h10, enquanto seguia transportada no banco do meio do veículo Fiat, modelo Doblo Dies, matrícula XX, pertencente a I. P., segurada da Ré, conduzido por A. T., sob as ordens e interesse da primeira, na A7 no sentido Guimarães – Vila Nova de Famalicão, foi vítima de acidente de viação causado por culpa exclusiva daquele condutor.

Em decorrência directa desse acidente teve de suportar graves lesões físicas e sofrimento psicológico, pelo que pretende ser indemnizada pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Regularmente citada, a Ré apresentou contestação, a fls. 42 a 48, na qual, impugnando a velocidade e o motivo da derivação do veículo para a esquerda, referiu que a Autora teve alta a 16.05.2014, com as lesões consolidadas, tendo sido determinado um período de incapacidade geral total de 90 dias, quantum doloris de 5/7, dano estético de 2/7 e IPG de 10 pontos, sem rebate profissional e sem necessidade de assistência médica ou medicamentosa futura.

Suscitou ainda o incidente de intervenção acessória do condutor A. T., alegando que, na sequência de exame efectuado a amostra de sangue que foi colhida, acusou uma TAS de 0,50 g/l e resultado positivo no exame toxicológico de determinação e quantificação de THC-COOH de 35,8 ng/ml.

Deferido o incidente por despacho de fls. 76 a 77, pelo Interveniente Acessório A. T., residente na rua … Porto, foi apresentada contestação, na qual aquele alegou que o acidente se deveu à intervenção da pessoa que seguia à sua direita, pelo que pediu, a final, a intervenção de M. M., o que foi indeferido por despacho de fls. 121 a 122/verso.

Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e a regularidade da instância, tendo-se ainda seleccionado o objecto do litígio e os temas da prova, sem que tenham sido deduzidas reclamações.

Realizada prova pericial, a autora ampliou o pedido, através de articulado superveniente, no sentido de passar a ser o da condenação da Ré no pagamento:

i. Da quantia global € 290.000,00 (duzentos e noventa mil euros) acrescida de juros legais vincendos, calculados sobre o capital em dívida, contados desde a citação até integral e efectivo pagamento;

ii. Das quantias a liquidar em ampliação do pedido ou execução de sentença, conforme peticionado nos artigos 109.º e 110.º da petição inicial.

A ampliação do pedido foi admitida pelo despacho de fls. 394, assim como o foi o articulado superveniente, através do despacho de fls. 393 a 394.

A Ré deduziu oposição ao articulado superveniente onde, em súmula, manteve o teor da contestação inicial, alegando o carácter excessivo da indemnização peticionada (desde logo, porque a incapacidade apurada na perícia é inferior à invocada na petição inicial e porque a situação profissional da Autora revela que ela não ficou diminuída ao nível da sua capacidade de ganho).

Realizou-se então a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência:

1. Condenou a Ré a pagar à Autora:
i) A quantia indemnizatória de € 115.000,00 (cento e quinze mil euros), para compensação da perda de capacidade de ganho/dano biológico, acrescida dos juros de mora civis, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença até integral pagamento;
ii) A quantia indemnizatória de € 30.000,00 (trinta mil euros), para compensação dos danos não patrimoniais, sobre a qual vencem juros de mora civis, à taxa legal de 4%, desde a data da prolação da presente decisão até integral pagamento;

2. Absolveu a Ré do restante peticionado.

Inconformada com esta decisão, a ré X dela interpôs recurso, findando a respectiva motivação com as seguintes conclusões:

1- Na douta sentença de que se recorre o Tribunal valorou de forma exagerada e injustificada os danos patrimoniais atribuíveis à Autora.
2- No respeitante à quantificação do dano patrimonial futuro, que para a Autora representa um Défice Funcional Permanente da Integridade Física e Psíquica de 10 pontos, há que considerar que a Autora não viu a sua capacidade de ganho afectada e que, por conseguinte, em nada vê limitada a sua vida profissional, bem como a respectiva remuneração.
3- Com efeito, o lesado que pretenda obter uma indemnização a título de lucros cessantes em consequência da lesão sofrida, terá de fazer prova do pressuposto médico-legal sem o qual não há lugar a lucro cessante.
4- Ora, a Autora não logrou provar a diminuição da capacidade de ganho, pelo contrário, limita-se a invocar ser portadora de um défice funcional de 10 P para assim fundamentar a perda da capacidade de ganho e justificar a indemnização por lucros cessantes.
5- A prova mais irrefutável de que a Autora não viu a sua capacidade de ganho diminuída é o principesco rendimento que aufere na Holanda, onde actualmente se encontra a trabalhar.
6- Salienta-se que do Relatório do IML consta “Neste caso as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicam esforços suplementares”.
7- A repercussão negativa do DFPIFP de que a Autora é portadora apenas se traduz num maior esforço no desenvolvimento de algumas actividades, não implicando uma diminuição da capacidade para o normal exercício da sua actividade profissional.
8- A indemnização a título de danos patrimoniais futuros de carácter essencialmente biológico, não afectou a capacidade de ganho da Autora, considerando a remuneração que esta aufere, conforme jurisprudência referida no corpo das alegações que se transcreve parcialmente (“Ora, os danos patrimoniais, nomeadamente os que se consubstanciam nos respeitantes aos lucros cessantes, reportam-se àquelas situações em que, por força da lesão de que foi vítima, o respectivo lesado vê reduzida a sua capacidade laboral, actual e futura, com a daí decorrente repercussão da redução da sua força laboral na contrapartida económica auferida pela actividade profissional pelo mesmo desenvolvida”.
“… Assim … embora o A. tivesse ficado afectado na sua integridade física de uma incapacidade permanente geral de 5%, desta não decorre, em termos de rebate profissional qualquer repercussão económica traduzia na diminuição de rendimentos auferidos no exercício da actividade profissional de médico dentista, situação essa, porém, já distinta da necessidade da realização de maiores esforços no exercício da mesma…, ")
9- A remuneração actual não deve ser considerada como elemento determinante para o cálculo dos danos patrimoniais futuros, uma vez que, não constituem lucros cessantes dado que não houve perda da capacidade de ganho.
10- Para um correcto entendimento da justiça e dos normativos legais em vigor é imprescindível a uma rigorosa ponderação de todos os elementos factuais para não surgir uma situação de locupletamento indevido.
11- Este ponto assume particular importância quando na situação concreta a incapacidade não afecta sob qualquer aspecto a capacidade de ganho da lesada, mormente, a título salarial.
12- Não se pode fazer depender a indemnização de um mero calculo matemático baseado no rendimento.
13- Pelo que não deve ser a remuneração considerada como elemento determinante para o calculo dos danos patrimoniais futuros,
14- Bem ao contrário, a remuneração da Autora é demonstrativa de que o sinistro não afectou a respectiva capacidade de ganho.
15- A Autora à data do acidente tinha 18 anos de idade e era estudante na Faculdade de Engenharia do …, não auferindo, qualquer remuneração.
16- A Autora acabou o percurso académico, tendo em 01.09.2018 ido exercer a sua profissão para a Holanda onde aufere a retribuição base bruta de 3 199,00 mensais e liquida de € 2 500,00.
17- É a própria A. que em sede de declarações de parte afirma que chegou onde as colegas não chegaram, situação confirmada pela amiga J. M. “sua antiga colega na universidade que mencionou, inclusive, que tentou, sem sucesso, idêntica colocação profissional”
18- A ora recorrida encontra-se a laborar na Holanda, país com um nível de vida substancialmente mais elevado do que o português.
19- Assim, não pode ser considerado o salário auferido pela Autora, até porque, recorrendo às regras da experiência de vida, e particularmente no país em causa, o avultado salário auferido está indubitavelmente associado a um custo de vida elevado e aos gastos substanciais ligados à sua obtenção.
20- O Tribunal ao desconsiderar estes factores arrisca a concretizar um enriquecimento injustificado à Autora pela quantia indemnizatória atribuída.
21- A jurisprudência determina que o valor de referência para o cálculo do dano patrimonial (lucros cessantes) deve ser o salário mínimo nacional à data do acidente – Neste sentido Acórdão do STJ de 22/01/2009, disponível em www.dgsi.pt.
22- Nesta perspectiva, no cálculo da indemnização por danos patrimoniais o rendimento a considerar para o cálculo do montante indemnizatório é o salário auferido pelo lesado aquando da verificação do acidente.
23- À data do acidente a Autora era estudante, não auferindo qualquer rendimento, pelo que o salário a considerar seria o salário mínimo nacional.
24- Ainda que assim se não entenda não deve ser considerada a alegada remuneração actual como elemento determinante para o cálculo dos danos patrimoniais futuros mas, quando muito, a remuneração média para um recém-licenciado à data do sinistro.
25- Sendo certo que à data do sinistro, 2013, estávamos em plena recessão económica, com desemprego elevado, mormente nos jovens, sendo que as saídas profissionais dos recém-licenciados, que conseguiam arranjar actividade na sua área de formação, cingiam-se na maior parte dos casos aos dos denominados estágios IEFP cujo valor para licenciados / mestrados era de € 656,15.
26- Ora, tendo o acidente ocorrido em 2013, se a acção tivesse sido julgada, por exemplo, antes de 2018 (ano em que a Autora terminou o curso e foi trabalhar para Holanda), o valor justo a considerar seria o do valor médio de mercado para engenheiros químicos recém-licenciados em Portugal e não ultrapassaria os 700,00€.
27- Existe basta jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que refere que o salário a considerar será o salário mínimo nacional à data do acidente ou, quando muito, o salário mínimo ou médio auferido para a categoria em causa, raciocínio que sufragamos.
28- Porém, a base de cálculo para a fixação da indemnização de danos patrimoniais futuros à Autora estriba-se no rendimento liquido de € 2 500,00 tendo para o efeito sido explanada a fórmula de cálculo como se a Autora tivesse ficado parcialmente incapaz, quando o que se equaciona é um défice funcional à integridade física e psíquica de 10 pontos com um rebate profissional de esforços acrescidos, que, segundo nosso entendimento, mais deveria caber em danos não patrimoniais do que em lucros cessantes.
29- Mais, o Tribunal não pode considerar rendimento líquido auferido pela Autora, porquanto, esse valor será necessariamente abatido pelo elevado custo de vida que se pratica na Holanda, local onde o salário auferido pela autora corresponde ao respetivo custo de vida e o que permite hipotizar o seguinte:
a) Situação de um trabalhador do ramo da construção civil que labore em Portugal onde não aufere quantia superior a 500€ mensais, sofre um acidente e em momento anterior à decisão da causa emigra para um pais europeu, consideremos a Suíça, onde passa a auferir um rendimento da ordem dos 2000/3000€.
b) Tomando por referência o exemplo citado, o mesmo era considerar que a Autora ao invés de ter ido trabalhar para Holanda, tivesse ido para os Emiratos Árabes Unidos ou um outro país qualquer do “reino do petróleo”, onde auferiria a quantia de 10.000€ mensais ou mais.
30- Recorrendo ao absurdo podemos, assim, constatar a injustiça que pode resultar do facto de a quantia a ser tida em consideração no momento de determinação do quantum indemnizatório ser a quantia que o trabalhador passa a auferir no momento posterior, ou seja, após a ocorrência do acidente.
31- Tal entendimento constituiria uma total denegação do princípio da equidade, do bom senso, da razoabilidade e da justiça.
32- Donde se pode inferir a violação do princípio da equidade que ocorreu na concreta apreciação dos presentes autos, atenta a elevada indemnização atribuída à Autora, que em nada viu prejudicado o respectivo percurso profissional.
33- Acresce, ainda, dizer que o cálculo da indemnização futura tendo como parâmetro a esperança média de vida não faz sentido quando se calcula o dano patrimonial futuro / lucro cessante.
34- Neste caso o limite de tempo deverá ser o da vida activa (66 anos) porquanto a partir dessa data a lesada deixará de auferir qualquer vencimento que será substituído pela sua reforma.
35- A acumulação destes dois valores – reforma e indemnização por danos patrimoniais futuros a partir dessa idade configura um enriquecimento ilegítimo.
36- Situação que é em tudo semelhante à acumulação de indemnizações decorrente de acidentes concomitantes em que as indemnizações por danos patrimoniais (decorrentes de responsabilidade civil automóvel e de acidentes de trabalho) não se podem acumular.
37- A recente tendência para considerar o período para a fixação da indemnização tendo em conta a esperança média de vida e não a vida activa poderá fazer sentido no caso da indemnização pelo danos biológico, cujo conceito é diferente dos lucros cessantes.
38- Já que apenas o dano biológico acompanha, neste caso a lesada, para toda a vida, já a capacidade de trabalho geradora de rendimento não acompanha a linha da vida, terminando com a idade da reforma, mais não seja compulsiva.
39- Calcular o dano patrimonial futuro com base na esperança média de vida, configura, mais uma vez, um enriquecimento que se afigura ilegítimo.
40- Nem que seja título exemplificativo devemos atender ao disposto na Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio - no Anexo IV da supra referida Portaria, aponta-se que no âmbito do chamado “dano biológico”, de 10 pontos e idade igual ou inferior a 20 anos o montante indemnizatório varia entre os 11 901,70 e os 13 848,24 €.
41- A referida portaria não contempla uma indemnização pelos esforços acrescidos no caso de uma DFIFP inferiores a 11P,
42- Ponderadas as circunstâncias do caso concreto considerando que o montante indemnizatório possa ultrapassar os valores plasmados na Portaria: a) Em termos dano biológico afigura-se equitativo um valor nunca superior a 20.000,00 €, b) E, em termos de esforços acrescidos o dano deve ser indemnizado atribuindo-se uma verba complementar nunca superior a € 25 000,00,
43- Deste modo, e em conformidade com o supra alegado, e tendo por base os critérios de ponderação determinados por lei, reputa-se fixar em quantia de 45.000,00€, o valor máximo a arbitrar aos denominados danos patrimoniais sofridos pela Autora, em virtude das sequelas que lhe advieram do acidente.
44- O Tribunal ao desconsiderar estes factores arrisca a concretizar um enriquecimento injustificado à Autora pela quantia indemnizatória atribuída, o que consubstancia na prática a violação dos normativos legais impostos pelo ordenamento jurídico.
45- A douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483º, 562º, 564º, nº 2 e 566º, todos do Código Civil.

A autora apresentou contra-alegações, sustentando a total improcedência do recurso, e, simultaneamente interpôs recurso subordinado, terminando com as seguintes conclusões:

(i) No cálculo da indemnização devida pelos danos patrimoniais resultantes da perda aquisitiva passada e futura, deverá o tribunal atender ao rendimento bruto auferido pelo lesado, na data mais recente que pode ser atendida pelo tribunal;

(ii) Para tanto, considerando as demais variáveis que vieram a ser atendíveis pelo tribunal a quo, esse dano deveria ser ficado num valor nunca inferior a € 200.000,00 (duzentos mil euros);

(iii) Nessa conformidade, a decisão em crise, constitui uma violação do disposto nos artigos 562.º, 564.º e 566.º, n.º 2 do Código Civil.

A ré/recorrente veio responder ao recurso subordinado, defendendo a sua total improcedência.

Nos termos conjugados dos artigos 627º,1, 631º,1, 633º,1,2, 635º,1, 638º,1, 641º,1, 644º,1,a), 645º,1,a) e 647º,1, todos do Código do Processo Civil (CPC), o Tribunal recorrido admitiu o recurso principal e o recurso subordinado, os quais são de apelação, a subir imediatamente e com efeito meramente devolutivo.

II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando as referidas conclusões, as questões a decidir consistem em saber se:

a) Recurso principal- a fixação do valor da indemnização pelos danos patrimoniais futuros se encontra incorrectamente efectuada, devendo ser aqueles fixados em € 45.000,00;
b) Recurso subordinado- no cálculo da indemnização devida por tais danos patrimoniais futuros deve o tribunal atender ao rendimento bruto auferido pelo lesado, na data mais recente que pode ser atendida pelo tribunal, e não ao rendimento líquido;

III
A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

a) No passado dia 06.06.2013, pelas 11:10 horas, na auto-estrada A7, ao km 25,230, na localidade e freguesia de …, Vila Nova de Famalicão, circulava o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula XX (doravante XX), de marca Fiat, modelo Doblo Dies, pertencente a I. P. e conduzido por A. T..
b) O veículo ligeiro de passageiros XX circulava pela Auto-estrada A7, no sentido Guimarães - Vila Nova de Famalicão, pelo corredor de circulação mais à esquerda, atento esse sentido de marcha, a uma velocidade de, pelo menos, 122 km/h.
c) No local indicado em a), a auto-estrada descreve-se em recta de boa visibilidade e é constituída por dois corredores de circulação, ambos afectos ao mesmo sentido de marcha, sendo ladeada da extremidade esquerda por uma berma com 0,80 cm de largura seguida de separador central e na extremidade direita por uma berma com 2,75 metros seguida de talude.
d) O piso era em asfalto, encontrava-se em bom estado de conservação e estava seco.
e) Eram transportados como passageiros nesse veículo, para além do condutor, a Autora, o A. S., a J. M., a A. R., o M. M. e a C. L..
f) Ao passar o km 25,150, sem que nada nem ninguém o fizesse prever, o condutor do veículo de matrícula XX começou a derivar a direcção do veículo para a sua esquerda, perdendo o controlo do mesmo.
g) Em derrapagem, transpôs a linha longitudinal contínua que delimitava o corredor de circulação mais à esquerda da berma desse mesmo lado, vindo a embater com a parte lateral esquerda do veículo no separador central.
h) Como o veículo continuou em marcha, o condutor do veículo de matrícula XX guinou a direcção para a sua direita, atravessou obliquamente ambos os corredores de circulação e a berma mais à direita, vindo a colidir com a frente do veículo na caleira da estrada, prosseguindo a sua marcha pelo talude/ravina durante cerca de 50 metros, capotando, até que embateu num eucalipto, local onde veio a imobilizar-se.
i) Desde que o veículo de matrícula XX perdeu o controlo até que veio a imobilizar-se percorreu cerca de 103 metros.
j) Logo após o embate, foi efectuada ao condutor do veículo XX, a colheita de sangue para exames de álcool e psicotrópicos.
k) Na sequência do exame efectuado no INML, a amostra de sangue recolhida ao condutor, submetida ao competente exame toxicológico, acusou uma taxa de álcool etílico no sangue de 0,50 g/l, e um resultado positivo no exame toxicológico de determinação e quantificação de THC-COOH tendo acusado 35,8 ng/ml.
l) A proprietária do veículo de matrícula XX, através da celebração de acordo de seguro de responsabilidade civil automóvel titulado pela apólice n.º 960108401, transferiu a sua responsabilidade civil emergente da circulação da referida viatura para a Ré.
m) A Autora seguia transportada no banco do meio (o veículo em apreço tem três filas de bancos) e foi esmagada contra o tejadilho, designadamente quando o veículo capotou e embateu contra o eucalipto.
n) Atenta a situação, foram accionados os meios técnicos de socorro, tendo comparecido no local equipas do INEM, ambulâncias e veículos de desencarceramento.
o) Após a sua chegada, os técnicos do INEM procederam à imobilização da Autora em plano duro e com colar cervical, tendo sido transportada de urgência para o Centro Hospitalar de São João, EPE, onde deu entrada no serviço de urgência, já que lhe tinha sido descortinado, logo no local do sinistro, um traumatismo crânio-encefálico EC Glasgow 5, para além de outros traumatismos.
p) Foi imediatamente sedada, entubada e ventilada na sala de emergência.
q) Realizaram-lhe exames da sala de emergência, designadamente:
-TC cerebral e cervical, onde foram apurados a existência de focos hemáticos fronto-basais e fronto-orbitários à direita e sem edema significativo, com pequeno volume de hemorragia subaracnoídea em alguns sulcos corticais adjacentes e do hemisfério cerebral direito;
-Ecografia abdominal: FAST negativo;
-RX à bacia, onde foi detectada uma fractura dos ramos ílio e isquiopúbicos à direita, sem desvio;
-RX ao úmero e antebraço sem aparentes fracturas;
-RX da grade costal: sem evidência de fracturas, hemo ou pneumotórax.
r) Foi ainda observada em ortopedia tendo mantido colar cervical até recuperação do estado de consciência.
s) Foi reavaliada posteriormente tendo realizado TC pélvico onde foi confirmada a existência de uma fractura alinhada do ramo iliopúbico direito, com hematoma na proximidade dessa fractura.
t) Segundo ortopedia, não tinha indicação para intervenção cirúrgica.
u) Esteve internada na UCIPU (Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente da Urgência), onde teve uma evolução favorável, apresentando melhoria neurológica e recuperação drive ventilatória.
v) Manteve-se hemodinamicamente estável, sem suporte vasoprosser.
w) Por hemorragia conjuntival direita e equimose peri-orbitária direita, realizou TAC das órbitas a 11.06, a qual não revelou sinais de fracturas ao nível das paredes das órbitas.
x) Foi transferida a 10.06.2013 para a UCIN intermédios.
y) Nessa data, apresentava Glasgow 15 na admissão com períodos de agitação e labilidade emocional.
z) Foi transferida para neurocirurgia a 14.06.2013.
aa) No dia 04.07.2013, fez uma ressonância magnética crânio-encefálica, tendo sido detectada focos de contusão hemorrágica em reabsorção, de localização cortico-subcortical frontobasal direita e de menores dimensões frontobasal esquerda, temporal direita e na região justainsular à direita - metahemoglobina direita extracelular; vestígios de hemossiderina; focos de hemossiderina visíveis adjacentes ao contorno do corno frontal esquerdo – justa joelho do corpo caloso, e em alguns sulcos corticais parietais parasagitais direitos, frontais periventriculares e cortico-subcorticais bilaterais, e na região temporal peri-insular anterior à esquerda, e temporais corticais à direita; vestígios de hemossiderina sobre a tenda do cerebelo em relação com restos de HSA prévia; vestígios de fimbria hemática extra-axial-subdural frontal esquerda em reabsorção, com patência dos sulcos curticais subjacentes e sem efeito massa sobre as estruturas medianas.
bb) A Autora teve alta hospitalar no dia 10.07.2013, passando a ser seguida em ambulatório, embora ainda dependente de terceira pessoa, sua mãe.
cc) De igual modo, manteve o acompanhamento ao nível neurológico na Clínica de Neurologia do Prof. Doutor R. V. e ao nível fisiátrico no Hospital da … (Porto).
dd) Começou a fazer tratamento específico de reabilitação cognitiva no Hospital … (Porto) sob orientação da neuropsicológica clínica Dra. F. V., o qual teve a duração de 6 meses.
ee) Em 27.02.2014, a Autora apresentava défices ao nível da memória, atenção, concentração e funções executivas consequentes do embate, com impacto significativo actual do estudo, nas aulas e na realização de tarefas diárias.
ff) A Autora deslocou-se a diversas consultas de acompanhamento médico, tendo-se sujeitado a tratamento fisiátrico, tentando assim obviar o período de recuperação.
gg) Não obstante, a Autora ficou a padecer do défice funcional de 10 pontos, por problemas cognitivos menores.
hh) A Autora, à data do sinistro, tinha 18 anos de idade.
ii) Estando a frequentar o curso de Engenharia Química da Faculdade de Engenharia da Universidade ....
jj) A Autora sofreu dores, não podendo efectuar qualquer movimento que implicasse qualquer deslocação dos membros inferiores e da coluna.
kk) Situação essa que se arrastou por praticamente todo o período de incapacidade temporária absoluta.
ll) Ainda hoje, e já passaram cerca de dois anos sobre o acidente, a Autora não raras vezes ainda recorre a ajuda medicamentosa para suportar as dificuldades que tem em concentrar-se.
mm) A Autora teve dificuldades em estudar mais de uma hora seguida, pois ficava com dores de cabeça, tendo necessidade de descansar.
nn) Por outro lado, o seu nível de ansiedade aumentou.
oo) A Autora tem dificuldade em suportar barulhos.
pp) A Autora tem dificuldade a ir a uma discoteca ou assistir a um concerto.
qq) A Autora estava habituada a ter uma vida activa e preenchida.
rr) A Autora praticava desporto (a nível federado), gostava de ouvir música, sair com amigos e passear.
ss) Durante todo o período da incapacidade temporária absoluta, a Autora ficou impedida de estudar e de fazer todas aquelas actividades que lhe davam prazer.
tt) A Autora não gozou os períodos de férias como habitualmente fazia, sendo certo que no ano de 2013 não teve férias de Verão nem de Natal.
uu) A Autora também não pôde frequentar as aulas, vindo a reprovar a cadeiras e a atrasar-se no seu percurso escolar.
vv) A Autora era autónoma, activa e bem-disposta e, no período que mediou entre o acidente e a data da consolidação médico-legal das lesões (ocorrida em 16.05.2014), transformou-se numa pessoa dependente, debilitada e triste.
ww) A Autora esteve amarrada a uma cama, a um hospital e a múltiplos tratamentos até 03.09.2013, mantendo-se parcialmente incapacitada até 16.05.2014.
xx) A Autora teve de se adaptar às dificuldades de concentração, às dores de cabeça, à dificuldade em dormir, ao rápido cansaço mental.
yy) A Autora está abalada psicologicamente, impaciente, com o sistema nervoso alterado e revoltada com a situação que lhe foi criada pelo acidente.
zz) Temeu pela sua vida e suportou um grande choque e abalo quando tomou consciência das sequelas sofridas.
aaa) Com as lesões do acidente ajuizado, tornou-se, por vezes, numa pessoa irritável e irascível.
bbb) Os quais implicaram distúrbios de memória e do sono, de que a Autora nunca padeceu.
ccc) Sofreu angústia e tristeza e, no presente, sente ainda tristeza pelas sequelas com que restou.
ddd) A Autora encontra-se a trabalhar na área da industria química na Holanda, país onde aufere uma retribuição base bruta de € 3.199,00.
eee) A Autora iniciou a sua actividade profissional em 01.09.2018.
fff) A retribuição líquida actual da Autora é de cerca de € 2.500,00.

IV
Conhecendo do recurso principal.
Já vimos que a ré não concorda com o valor que o Tribunal recorrido fixou, a título de indemnização pelos danos patrimoniais futuros (perda de capacidade de ganho), de € 115.000,00.
Para começarmos a analisar se lhe assiste razão, vamos recordar uma súmula dos factos mais importantes que ficaram provados.
Depois do acidente de que foi vítima a 6.6.2013, a Autora teve alta hospitalar no dia 10.07.2013, passando a ser seguida em ambulatório, embora ainda dependente de terceira pessoa, sua mãe.
Em 27.02.2014, a Autora apresentava défices ao nível da memória, atenção, concentração e funções executivas consequentes do embate, com impacto significativo actual do estudo, nas aulas e na realização de tarefas diárias.
A Autora ficou a padecer do défice funcional de 10 pontos, por problemas cognitivos menores.
A Autora, à data do sinistro, tinha 18 anos de idade, e frequentava o curso de Engenharia Química da Faculdade de Engenharia da Universidade ....
Passados cerca de dois anos sobre o acidente, a Autora não raras vezes ainda recorre a ajuda medicamentosa para suportar as dificuldades que tem em concentrar-se.
A Autora teve dificuldades em estudar mais de uma hora seguida, pois ficava com dores de cabeça, tendo necessidade de descansar. O seu nível de ansiedade aumentou. Tem dificuldade em suportar barulhos.
A Autora iniciou a sua actividade profissional em 01.09.2018, e encontra-se a trabalhar na área da industria química na Holanda, país onde aufere uma retribuição base bruta de € 3.199,00, sendo que a retribuição líquida actual da Autora é de cerca de € 2.500,00.
A sentença considerou que o dano patrimonial de perda de capacidade de ganho no futuro deve ser calculado segundo critérios de probabilidade, de acordo com o que, em cada caso concreto, poderá vir a acontecer, pressupondo que as coisas seguem o seu curso normal, atribuindo ao lesado um capital a extinguir no final da vida, sendo que, não podendo apurar-se o seu valor exacto, o tribunal deve julgar segundo a equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566º,3, do CC. E que mesmo em casos em que não há afectação da capacidade de ganho, é inquestionável que, ao longo da vida, seja qual for a actividade que exerça, o lesado terá sempre que desenvolver um esforço acrescido para alcançar o mesmo rendimento que outra pessoa que não sofra de qualquer incapacidade, desde logo em todos os pequenos movimentos que terá que executar, quer no plano profissional, quer pessoal, indissociável daquele.
E considerou ainda que o dano biológico não deve ser mensurado apenas até ao termo da vida activa, mas até ao fim (provável) da vida do lesado (considerando a esperança média de vida), pois que, mesmo na situação de pensionista, existem, na normalidade da vida, trabalhos e actividades que se desenvolvem e que envolverão esforço necessariamente superior.
E, atentos os factos provados, considerou que a fixação da indemnização far-se-á, partindo da fórmula matemática aludida no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04.04.1995, Colectânea de Jurisprudência, tomo II, p. 23, por recurso à equidade, ponderando os critérios jurisprudenciais habitualmente relevantes na matéria: a idade que a vítima tinha quando ingressou no mercado de trabalho (24 anos); a actividade a que se dedica (profissional qualificada na indústria química) e o salário líquido auferido (€ 2.500,00); o défice funcional atribuído (10 pontos); a esperança média de vida (cerca de 78 anos). Uma vez que a Autora irá receber a indemnização de uma só vez e por se entender que, no período final da vida, após a reforma, haveria um abaixamento de rendimentos (sobretudo, regressando a território nacional), considerou ainda o Tribunal recorrido que se deve aplicar o factor de dedução por benefício de antecipação, de 10%. E assim encontrou como correcto e justo o valor de € 115.000,00.
Ora, a ré não se conforma com esta decisão, porque entende que a autora não viu a sua capacidade de ganho afectada e que, por conseguinte, em nada vê limitada a sua vida profissional, bem como a respectiva remuneração. E a autora não logrou provar a diminuição da capacidade de ganho, limitando-se a invocar ser portadora de um défice funcional de 10 pontos. E lembra que do Relatório do IML consta “Neste caso as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicam esforços suplementares”. Em suma, entende a recorrente, o acidente e as sequelas de que ficou a padecer não afectam a capacidade de ganho da Autora, considerando a remuneração que esta aufere. E para o cálculo da indemnização por danos patrimoniais o rendimento a considerar é o salário auferido pelo lesado aquando da verificação do acidente, e à data do acidente a Autora era estudante, não auferindo qualquer rendimento, pelo que o salário a considerar seria o salário mínimo nacional.

E suscita ainda as seguintes questões:

a) o cálculo do dano patrimonial futuro deve ser feita com recurso ao conceito de vida activa (66 anos), e não com recurso à esperança média de vida, porquanto a partir da data da reforma a lesada deixará de auferir qualquer vencimento que será substituído pela sua reforma. A acumulação destes dois valores – reforma e indemnização por danos patrimoniais futuros a partir dessa idade configura um enriquecimento ilegítimo.
b) para o cálculo da indemnização por danos patrimoniais o rendimento a considerar é o salário auferido pelo lesado aquando da verificação do acidente, e à data do acidente a Autora era estudante, não auferindo qualquer rendimento, pelo que o salário a considerar seria o salário mínimo nacional.
Donde, a douta sentença recorrida teria violado o disposto nos artigos 483º, 562º, 564º,2 e 566º, todos do Código Civil.

Vejamos.
A lei refere-se ao conceito de dano futuro no art. 564º CC, nos seguintes termos:

1) O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão;
2) Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior.

Em matéria de danos patrimoniais rege, em primeiro lugar, o princípio da reconstituição natural expresso no art. 562º do CC e, quando esta não for possível, bastante ou idónea (art. 566º,1 CC) vale a indemnização em dinheiro a fixar de acordo com a teoria da diferença nos termos do art. 566º,2 do mesmo diploma, segundo a qual a indemnização tem como medida, em princípio, a diferença entre a situação patrimonial real do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal (encerramento da discussão em 1ª instância) e a situação hipotética que teria nessa data se não tivesse ocorrido o facto lesivo gerador do dano.
Assim, a chave, em matéria de ressarcibilidade dos danos futuros, como bem se compreende, é a sua previsibilidade.
E não estamos a falar de um conceito de danos futuros em geral: interessam-nos apenas os danos futuros previsíveis decorrentes da afectação da capacidade laboral do lesado. O conceito de dano biológico surgiu na Portaria nº 377/2008 de 26/05 em cujo preâmbulo se pode ler “(…) ainda que não tenha direito a indemnização por dano patrimonial futuro, em situação de incapacidade permanente parcial, o lesado terá direito à indemnização pelo seu dano biológico, entendido este como ofensa à integridade física e psíquica”. E o art. 3º b) do diploma considera indemnizável o dano biológico, resulte dele ou não, perda da capacidade de ganho.
A Jurisprudência tem aceite maioritariamente a reparação deste dano. “A lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afecta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”, dano primário, do qual podem derivar, além de incidências negativas não susceptíveis de avaliação pecuniária, a perda ou a diminuição da capacidade do lesado para o exercício de actividades económicas, como tal susceptíveis de avaliação pecuniária” (Acórdão do STJ de 19/4/2018 – Relator: António Piçarra).
Pode ler-se também no Acórdão do STJ de 11/11/2010, relatado por Lopes do Rego, disponível em www.dgsi.pt: “(…) o dano biológico, perspectivado como diminuição somático-psíquica e funcional deste, com substancial e notória repercussão na qualidade de vida pessoal e profissional de quem o sofre, é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial”.
E “tal compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades do exercício de uma profissão e de futura mudança ou reconversão de emprego pelo lesado, enquanto fonte actual de possíveis e eventuais acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar, quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediatamente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira “capitis diminutio” num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha de profissão, eliminando ou restringindo seriamente qualquer mudança ou reconversão de emprego e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuros lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais (…)”.
O défice funcional referido não pode deixar de traduzir redução na sua capacidade económica geral, na medida em que representa, para além das dificuldades acrescidas no exercício dessa actividade específica, limitações para o desempenho de outras actividades económicas, concomitantes ou alternativas, que lhe pudessem entretanto surgir, na área da sua formação profissional, bem como na realização de tarefas pessoais quotidianas. Nessa medida, tal défice não pode deixar de relevar em sede do chamado dano biológico patrimonial, susceptível, portanto, de indemnização reparatória daquela redução do rendimento económico potencial, como vem sendo seguido pela jurisprudência (Acórdão do STJ de 6 de Dezembro de 2017).
Este entendimento, que merece todo o nosso apoio, é, se não unânime, pelo menos claramente dominante.
As afirmações da recorrente de que “a prova mais irrefutável de que a Autora não viu a sua capacidade de ganho diminuída é o principesco rendimento que aufere na Holanda, onde actualmente se encontra a trabalhar”, e “bem ao contrário, a remuneração da Autora é demonstrativa de que o sinistro não afectou a respectiva capacidade de ganho”, salvo o devido respeito, não trazem nada de útil para a discussão. Dizendo um truísmo, as pessoas não são todas iguais, não têm as mesmas capacidades, circunstâncias e ambições. A recorrente, aparentemente, compara a autora a alguém que exerce uma profissão indiferenciada, com rendimentos próximos do salário mínimo nacional. E nessa comparação, o salário da autora avulta, aos olhos da recorrente, como principesco. Mas a recorrente podia, com a mesma facilidade, comparar a autora com pessoas como Bill Gates, Cristiano Ronaldo, Elon Musk, ou Roger Federer, apenas para citar alguns exemplos famosos. E aí o salário da autora não seria visto como principesco, de certeza. Donde, não é com este tipo de argumentos que se pode demonstrar que uma pessoa em concreto não viu a sua capacidade de ganho diminuída.
Ultrapassada a tese de que a autora não viu a sua capacidade de ganho afectada e que, por conseguinte, em nada vê limitada a sua vida profissional, bem como a respectiva remuneração, prossigamos.
A questão que se coloca a seguir é a da quantificação deste dano, para saber como fixar a indemnização em cada caso, de forma a que se chegue a um valor justo, sem perder de vista a segurança jurídica, que exige a homogeneidade de decisões, e repele a disparidade aleatória de valores indemnizatórios.
A primeira observação a fazer tem de ser esta: o cálculo dos danos futuros não é um verdadeiro cálculo, porque, apesar de envolver alguns elementos concretos e determinados, envolve acima de tudo realidades futuras não conhecidas e não cognoscíveis. É um adquirido que o direito positivo não contém regras precisas destinadas à fixação da indemnização pelo dano futuro, em casos como o que agora nos ocupa, de incapacidades decorrentes de acidentes de viação. Os traços distintivos desta situação são, por um lado, a evidência incontornável de que a capacidade daquela pessoa de funcionar em sociedade, de trabalhar e de produzir ficou irremediavelmente afectada, o que terá óbvias consequências negativas para o futuro, mas por outro a impossibilidade de quantificar agora, no presente, essa afectação.
A determinação do valor da indemnização num caso destes é sempre, no mínimo, uma operação delicada, porque obriga a ter em conta a situação hipotética em que o lesado estaria se não houvesse sofrido a lesão, o que implica a previsão pouco segura, sobre danos verificáveis no futuro. É por isso que tais danos se devem calcular segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que, no caso concreto, poderá vir a acontecer, seguindo as coisas o seu curso normal, e se mesmo assim não puder apurar-se o seu valor exacto, deverá o Tribunal julgar segundo a equidade, em obediência ao critério enunciado no art. 566º,3 do CC (neste sentido, cfr. Vaz Serra, RLJ,112º, 339 e 114º, 287 e seguintes; Dario Martins de Almeida, Manual de acidentes de viação, pág. 114 e Acórdão do STJ de 10.2.1998, CJSTJ, Tomo I, pág. 67) (1).
Procurando dizer de outra forma, a fixação destes danos envolve sempre um elemento inevitável de arbítrio. O arbítrio está em que não é possível no dia de hoje prever qual o montante monetário que certa pessoa vai deixar de receber nos próximos 2, 3, 5, 10, 30 ou 40 ou mais anos (!) em consequência de determinado evento lesivo ocorrido no passado recente. Desde logo por não sabermos se a pessoa em causa estará viva daqui a 1, 5 ou 15 anos. É evidente que se o lesado falecer daqui a 1 ano por causas que nada tenham a ver com o acidente, verificar-se-á um enriquecimento do seu património à custa da entidade obrigada à indemnização. E mesmo que ele sobreviva até ao final do período de vida previsível, ainda assim os imponderáveis a que a situação está sujeita são esmagadores: não é possível adivinhar qual seria a evolução da situação laboral do lesado, não é possível prever se ele não seria despedido ao fim de 5 anos, não é possível saber se a empresa não iria à falência ao fim de 2 anos, não é possível calcular o seu percurso profissional dentro daquela empresa em termos de saber se ele seria promovido ou despromovido, quando, em que termos, com que ganho patrimonial, não é possível antever se ele continuaria a exercer aquelas funções, ou seria reconvertido para outras totalmente diferentes, etc; e ainda por cima há situações como a presente, em que as lesões decorrentes do acidente geram uma indiscutível perda de capacidade de ganho, mas não impedem o lesado de ter a sua actividade profissional e de a exercer, embora com esforços suplementares. E não podemos adivinhar quanto tempo a autora conseguirá continuar a exercer estas funções, com a penosidade acrescida decorrente do acidente: 1 ano ? 5 anos ? 10 anos ? 30 anos ? Nem as consequências dessa acrescida penosidade: negligenciáveis ? Despedimento ? Mudança de funções ? Reconversão profissional dentro da mesma empresa ? Mudança de empregador ? Baixa de produtividade acompanhada de redução salarial ?
Em resumo, estamos a lidar com uma ficção. O montante que importa encontrar é uma pura ficção, uma previsão feita em abstracto, que apenas está ligada à realidade pelos ténues laços dos factos concretos do presente. Mas é a essa ficção que o sistema jurídico impõe que se recorra, a fim de determinar o quantum indemnizatório devido ao lesado pelos danos futuros.

Assim sendo, é possível detectar duas situações-tipo diversas:

a) aquelas em que é possível determinar um valor correspondente à perda de ganho decorrente das lesões causadas pelo acidente, temos a tarefa aparentemente facilitada;
b) e aquelas, como o caso presente, em que tal não é possível.

Para os casos que caiam na primeira situação, devemos seguir a orientação explicada pelo Acórdão do STJ de 28 de Março de 2019 (Relator: Conselheiro Tomé Gomes). Aí se pode ler:

A jurisprudência do S.T.J., que vem sendo aceite e aplicada nas instâncias, assenta em três pontos:
1- Determinação dum capital produtor dum rendimento que se venha a extinguir no final do período provável de vida activa do lesado, susceptível de lhe garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho.
2- Utilização de fórmulas abstractas ou critérios, como elemento auxiliar, com o objectivo de tornar o mais possível justas, actuais e minimamente discrepantes, as indemnizações.
3- Uso de juízos de equidade como complemento para ajustar o montante encontrado à solução do caso concreto, uma vez que não é possível determinar um valor exacto dos danos sofridos pelo lesado.

Estes três pontos são indissociáveis, necessários para se encontrar, em cada caso, o montante indemnizatório mais adequado.
Há quem utilize fórmulas matemáticas mais ou menos sofisticadas, ligadas a tabelas financeiras, reduzindo substancialmente, para não dizer totalmente, a intervenção do julgador na determinação do montante indemnizatório, através de juízos de equidade.
Tabelas essas que, além de serem redutoras da intervenção do julgador, são complicadas, e, por vezes, de difícil utilização.
Através dum estudo apresentado pelo Juiz Conselheiro Sousa Dinis, na Colectânea de Jurisprudência, ano IX, Tomo I, 2001, do S.T.J., a fls. 6 a 12, foram delineados dois critérios, que atingem os mesmos resultados, que se revelam menos rígidos, e, em que o julgador acaba por ter grande intervenção na determinação do montante indemnizatório, através de juízos de equidade.
Um dos critérios assenta numa regra de três simples, tendo em conta uma determinada taxa de juro, adequada à realidade económica e financeira do país, ao aumento pecuniário que o lesado ou seus dependentes economicamente, deixaram de auferir, durante 14 meses, num ano, a idade activa provável do mesmo, fazendo um primeiro ajustamento com um desconto que variará com o nível de vida do país, do custo de vida, em que predominará o prudente arbítrio do juiz, tendo em conta estes dados ou outros relevantes.
E, encontrado um determinado valor, este poderá sofrer alterações para mais ou para menos, de acordo com juízos de equidade, tendo em conta a idade do lesado, a progressão na carreira e outros factores influentes, que possam existir.
O outro critério traduz-se na determinação do montante que o património do lesado deixou de auferir durante 14 meses, num ano, multiplicando-o pelo período de tempo provável de vida activa, reduzindo o montante encontrado de acordo com regras de equidade já apontadas, e finalmente, ajustando o respectivo valor ao caso concreto, recorrendo a juízos de equidade, de acordo com a progressão na carreira, ganhos de produtividade e outros elementos influentes existentes em cada caso.
Julgamos que estes critérios, e, em especial, o último, são mais fáceis de utilizar, mantendo critérios mínimos de segurança, e com a vantagem do julgador expressar o seu cunho pessoal ao caso concreto, recorrendo a juízos de equidade que a lei impõe, e que são a expressão jurisdicional mais rica e criativa.
Em face do exposto, julgamos que é de aplicar ao caso sub judice, o último critério enunciado, em detrimento das fórmulas matemáticas complicadas, apresentadas e usadas nas alegações da recorrente”.

Para as situações como a presente, em que não é possível determinar o valor correspondente à perda de ganho, não vemos outra solução que não seja o recurso à equidade.
Como também se escreve noutro Acórdão do STJ do mesmo Relator, de 7.3.2019, “apesar de o referido défice funcional de 19 pontos não representar incapacidade para o exercício da actividade profissional da A., não poderá deixar de traduzir, de algum modo, diminuição da sua capacidade económica geral, não podendo deixar de relevar em sede do chamado dano biológico patrimonial, susceptível, portanto, de indemnização reparatória daquela diminuição do rendimento económico potencial, com vem sendo seguido pela jurisprudência. Ponto é saber como calcular tal indemnização. Ora, diversamente do que foi entendido pelas instâncias, salvo o devido respeito, não se afigura que essa indemnização deva ser calculada com base no rendimento anual do A. auferido no âmbito da sua actividade profissional habitual, já que o sobredito défice funcional genérico não implica incapacidade parcial permanente para o exercício dessa actividade, envolvendo apenas esforços suplementares. Neste tipo de situações, a solução seguida pela jurisprudência deste Supremo Tribunal é a de fixar um montante indemnizatório por via da equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, em função das circunstâncias concretas de cada caso, segundo os padrões que têm vindo a ser delineados, atentos os graus de gravidade das lesões sofridas e do seu impacto presumível na capacidade económica do lesado, considerando uma expectativa de vida activa não confinada à idade-limite para a reforma. De referir que aqui só relevam as implicações de alcance económico e já não as respeitantes a outras incidências no espectro da qualidade de vida, mas sem um alcance dessa natureza. Temos ainda assim de reconhecer que nem sempre se mostra tarefa fácil estabelecer comparações entre os diversos casos já tratados na jurisprudência, ante a multiplicidade de factores variáveis e as singularidades de cada caso, em especial, o impacto concreto que determinado grau de défice funcional genérico é susceptível de provocar no contexto da actividade económica que estava ao alcance da iniciativa do sinistrado com a inerente perda de oportunidade de ganho”.

Aqui chegados, teremos necessariamente de divergir do método seguido pela decisão recorrida, de fixar a indemnização partindo da fórmula matemática aludida no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04.04.1995, Colectânea de Jurisprudência, tomo II, p. 23.
Não vamos recorrer a qualquer fórmula matemática pois, como vimos, não há números concretos e credíveis sobre os quais aplicar a dita fórmula.
O juízo de equidade a fazer obriga-nos a ponderar todas as circunstâncias do caso.
Assim, e recordando, a autora, quando tinha 18 anos, e frequentava o curso de Engenharia Química da Faculdade de Engenharia da Universidade ..., foi vítima de um acidente de viação quando era transportada como passageira num veículo automóvel, cujo condutor, que conduzia sob o efeito do álcool e de substância psicotrópicas, perdeu o controle do mesmo e se despistou.
Ficou a padecer do défice funcional de 10 pontos, por problemas cognitivos menores: tem dificuldade em concentrar-se, o seu nível de ansiedade aumentou, tem dificuldade em suportar barulhos, teve de se adaptar às dores de cabeça, à dificuldade em dormir, ao rápido cansaço mental, tornou-se, por vezes, irritável e irascível, tem distúrbios de memória.
A autora iniciou a sua actividade profissional em 1.9.2018, e encontra-se a trabalhar na área da indústria química na Holanda, onde aufere uma retribuição base bruta de € 3.199,00 (líquida de cerca de € 2.500,00).
As sequelas do acidente não a impediram de iniciar a actividade laboral, mas exigem dela esforços suplementares.
Parece-nos razoável e legítimo prever e aceitar que esses esforços suplementares irão, mais tarde ou mais cedo, interferir com a produtividade da autora, e, logo, colocar em causa a manutenção das próprias funções, num mundo cada vez mais obcecado não só com o conceito de produtividade, como com a introdução de sistemas para a medir com cada vez maior detalhe e rigor, a que nem os Tribunais e os Magistrados escapam (2).

É importante também dizer que a opção pelo recurso à equidade, ao invés da aplicação das referidas fórmulas matemáticas, retiram importância e relevo às questões concretas suscitadas pela recorrente, como a de saber se o rendimento a considerar é o salário auferido pelo lesado aquando da verificação do acidente, e se à data do acidente o lesado ainda era estudante, não auferindo qualquer rendimento, o salário a considerar seria o salário mínimo nacional; e ainda a questão de saber se para efeitos do cálculo a fazer, o período de tempo a considerar deve ser a vida laboral activa ou a esperança média de vida.
Não obstante, sempre diremos que, mesmo que tivéssemos de aplicar alguma fórmula matemática para chegar ao valor da indemnização, nessas questões concretas não assiste razão à recorrente.
Primeiro, quanto à tese da recorrente, segundo a qual quando na data do acidente o lesado ainda não auferir salário por ainda não ter começado a trabalhar, se deve aplicar o salário mínimo nacional, a mesma não colhe de todo. Por um lado, porque comete o pior pecado que se pode cometer em qualquer análise séria, que é fechar os olhos à realidade.
Se o objectivo é fazer a justiça do caso concreto, como indubitavelmente é (supomos que nem a recorrente o nega), e se é verdade que à data do acidente a autora ainda estava a estudar, não é menos verdade que se provou que actualmente a autora já aufere uma retribuição base bruta de € 3.199,00, e líquida de cerca de € 2.500,00.
Não percebemos a lógica de querer prender o Julgador a um valor abstracto e que nada tem a ver com a vida da autora, como o salário mínimo nacional, quando já sabemos o valor do salário real da autora. Para chegar a uma decisão justa, temos de olhar para o salário da autora, o salário que ela efectivamente aufere, e não para uma abstracção, como seja o salário mínimo nacional.
E podemos citar em apoio da nossa tese o Acórdão do STJ de 22-6-2017 (Relator- Abrantes Geraldes), no qual se pode ler: “o facto de o lesado ter apenas 14 anos de idade, de frequentar a escolaridade obrigatória e de, por tudo isso, não exercer ainda qualquer profissão, nem ter qualquer habilitação profissional ou académica não determina que, (i) como pretende a Seguradora, a indemnização seja calculada pelo valor da remuneração mínima garantida ou que, (ii) como decidiu a Relação, seja calculada pelo valor do salário mínimo nacional. Em tais circunstâncias é mais ajustado ponderar o valor do salário médio nacional, como elemento objectivo que sustenta o recurso à equidade. Já quanto à determinação do cálculo da referida indemnização a resposta não é tão evidente, sendo dificultada pelas especiais circunstâncias em que se encontrava o A. na ocasião em que ocorreu o acidente. Tendo nascido em 1990, o A. tinha na altura do acidente apenas 14 anos de idade e frequentava o 9º ano da escolaridade obrigatória. Por isso não exercia qualquer profissão, nem é possível conjecturar acerca da sua evolução educacional e profissional e da sua carreira profissional ou dos rendimentos que da mesma poderia auferir, por forma a calcular aproximadamente e com base em critérios de equidade a quantia ajustada a compensar os efeitos patrimoniais futuros das sequelas permanentes de que ficou a padecer. (…) A todos os títulos, parece mais razoável, mais previsível e, por isso, mais justo um critério que assente a referida indemnização, pelo menos, no salário médio nacional, já que não existe qualquer elemento que indicie que o A. se iria situar no patamar mais baixo de uma carreira profissional ou que iria conformar-se com o recebimento do salário que qualquer empresa é obrigada a pagar independentemente das habilitações ou da profissão exercida pelo trabalhador”.

Decorre daqui que sendo conhecido nos autos o valor do salário actual da lesada é a ele que se deve olhar, na busca da melhor solução. Porque é desta lesada concreta que estamos a tratar, e não de uma abstracção. São os danos futuros desta lesada que nos interessam, e não um valor abstracto retirado do salário mínimo nacional, outra abstracção. E, como o que nos interessa é só o dano futuro desta lesada, e felizmente temos o valor do seu salário, é por ele que nos devemos guiar, em busca da solução que a equidade dita. Nem conseguimos começar a perceber a lógica de quem se insurge contra tal solução.

Igualmente não assiste razão à recorrente na outra questão que coloca, a de não se dever ter em conta a esperança média de vida, mas apenas o período de vida activa (laboral).
Basta-nos remeter para o Acórdão do STJ de 1/3/2018 (Relatora: Maria da Graça Trigo): “a afectação da integridade físico-psíquica (que tem vindo a ser denominada “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial, compreendendo-se na primeira categoria a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais. A fixação da indemnização por danos patrimoniais resultantes do “dano biológico” não pode seguir a teoria da diferença (art. 566º,2 do CC) como se tais danos fossem determináveis, devendo antes fazer-se segundo juízos de equidade (art. 566º,3 do CC). Para tanto, relevam: (i) a idade do lesado à data do sinistro; (ii) a sua esperança média de vida (e não a sua previsível idade da reforma, já que a perda da capacidade geral de ganho tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado); (…)”.
A esperança média de vida das mulheres, segundo os dados mais recentes do INE que localizámos, é de 83 anos.

Olhando agora para o Relatório Pericial do INML junto aos autos em a 16.4.2018, vemos que aí se escreve: “Repercussão Permanente na Actividade Profissional (corresponde ao rebate das sequelas no exercício da actividade profissional habitual da vítima – actividade à data do evento, isto é, na sua vida laboral, para utilizar a expressão usada na Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio, tratando-se de parâmetro de dano anteriormente designado por Rebate Profissional). Neste caso, as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares, nomeadamente esforço suplementar de atenção, concentração e de memorização”.
O relatório pericial final, junto a 4.4.2019, não trouxe nada de diferente. Reafirmou que a perda funcional decorrente das sequelas não afecta a examinada em termos de autonomia e independência, mas são causa de sofrimento físico, e limitam-na em termos funcionais, e daí a atribuição do Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica fixável em 10 pontos. E afirmou que essas sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares.

Ora, fazendo uma análise global, a autora sofreu o acidente ainda antes de ter terminado o curso superior, o que quer dizer que o défice funcional permanente supra referido a acompanha desde o primeiro dia em que começou a trabalhar, e irá acompanhá-la até ao fim da sua vida.
E sabemos igualmente que as sequelas decorrentes do acidente são compatíveis com o exercício da actividade habitual da autora, mas implicam esforços suplementares, nomeadamente esforço suplementar de atenção, concentração e de memorização.
Ora, tendo presente que a autora exerce uma profissão de natureza intelectual (Engenheira Química), estando a trabalhar na indústria química, onde o rigor técnico e científico é essencial, não custa perceber como o esforço suplementar de atenção, concentração e de memorização pode ser desgastante a longo prazo. E o longo prazo é justamente o que a espera, pois estas sequelas são algo com que a autora vai ter de conviver durante toda a sua vida.
O recurso à equidade implica que se tenha em atenção a comparação com outros casos semelhantes, de maior ou menor gravidade, decididos nos nossos Tribunais.

Vejamos alguns exemplos.

I- “Mostra-se conforme a tais critérios ou padrões, o valor de 10.000 atribuído a título de indemnização dos danos patrimoniais futuros com fundamento no seguinte quadro provado: (i) à data do acidente, o autor tinha 10 anos de idade e era (e é) estudante; (ii) em consequência do acidente, ficou a padecer de um défice permanente da integridade físico-psíquica fixável em 3 pontos, que demanda maiores esforços no exercício da actividade habitual e demandará perda de capacidade de ganho quando ingressar no mercado de trabalho)” (Acórdão do STJ de 27/2/2018- Relatora: Fátima Gomes).
II- Decidiu-se no Acórdão do STJ de 9/1/2018 (Relator- José Raínho) que “é adequada a indemnização de €250.000,00 por danos patrimoniais futuros (supressão da capacidade de ganho) ao sinistrado, pessoa de 41 anos de idade e com um rendimento mensal de €750,00, que, em decorrência de acidente de viação, e entre outros danos:- sofreu amputação de parte de uma perna;- ficou afectado de um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 30 pontos em 100;- as sequelas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual”.
III- Ou então: “Daqui se colhe, em síntese, que o A., à data do acidente, contava com pouco mais de 59 anos de idade (…); em consequência das lesões sofridas pelo acidente em causa, ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 25,6 pontos percentuais, a partir da alta médica em 14-03-2012, défice esse que o obriga a um relevante acréscimo de esforço na sua actividade profissional. O referido défice funcional de 25,6 pontos, apesar de não representar incapacidade para o exercício da actividade profissional habitual do A., não pode deixar de traduzir redução na sua capacidade económica geral, na medida em que representa, para além das dificuldades acrescidas no exercício dessa actividade específica, limitações para o desempenho de outras actividades económicas, concomitantes ou alternativas, que lhe pudessem entretanto surgir, na área da sua formação profissional, bem como na realização de tarefas pessoais quotidianas. Posto isto, tendo em conta todo o circunstancialismo acima retratado, em especial a situação em que ficou o A. em consequência da sequelas sofridas com o acidente, quando dantes gozava de boa saúde, importa considerar que as limitações de mobilidade de que ficou afectado, correspondentes a um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 25,6 pontos percentuais, a partir da alta médica em 14-03-2012 (data em que o A. contava quase 60 anos de idade), além do acréscimo de esforço físico no desenvolvimento do tipo de actividade que vinha então exercendo com deslocações ao estrangeiro e permanência demorada em reuniões profissionais, implicam inegável redução da sua capacidade económica geral, mormente para se dispor ao desempenho de actividades económicas concomitantes ou alternativas que, presumivelmente, ainda lhe pudessem surgir na área da sua formação profissional e até para a execução de tarefas quotidianas, ao longo da sua expectativa de vida, mesmo para além da idade-limite da reforma. Nessas circunstâncias, tudo ponderado, sem esquecer o tempo decorrido entre a data da alta médica (14-03-2012) e a data da sentença da 1.ª instância (09/06/2016), no quadro dos padrões da jurisprudência mais recente, tem-se como razoável valorar o dito dano biológico, na respetiva vertente patrimonial, na quantia de € 100.000,00 (cem mil euros), tida por actualizada à data da sentença, a que acrescem os juros legais nos termos fixados em 1.ª instância” (Acórdão do STJ de 6 de Dezembro de 2017).
IV-No que toca à indemnização por perda de capacidade de ganho, o Tribunal recorrido ponderou, para efeito da determinação da referida indemnização, o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 24 pontos de que o Autor ficou a padecer, bem como as circunstâncias de o mesmo ter à data do acidente a idade de 36 anos, trabalhar como motorista de pesados e auferir o salário mensal de € 857,90, bem como o facto de, apesar das sequelas e do défice funcional de que ficou a sofrer, poder continuar a exercer a sua profissão, ainda que com um esforço acrescido, o que, aliás, vem fazendo, agora trabalhando por conta própria. (…) Aplicando estes considerandos aos factos apurados nos autos e tendo presentes os aludidos critérios habituais da jurisprudência, aquilo que se nos apraz dizer é que se de defeito padece a decisão a este respeito tomada na decisão recorrida é o de ser exígua a indemnização fixada (€ 60.000,00), nenhuma razão havendo para a reduzir ainda mais” (Acórdão desta Relação de 07.12.2017).
V- Ainda: Analisando os factos concretos temos que a Autora tinha à data do atropelamento 38 anos de idade e ficou afectada por Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 23 pontos e viu limitadas as hipóteses de ascensão na carreira profissional; a incapacidade não a impede do exercício da actividade profissional habitual, mas implica esforços suplementares. À data do acidente estava matriculada e frequentava o quarto e último ano do curso de Licenciatura em Comunicação Social. “Sabendo-se que a Autora frequentava o último ano de um curso superior - o que, de acordo com o que acima se foi dizendo, com toda a probabilidade, lhe permitiria, no futuro, usufruir de um rendimento, senão equivalente ao médio do sector privado, pelo menos superior ao mínimo -, que, à data da consolidação das sequelas (abril de 2009), tinha 39 anos de idade, e, por último, que a mesma viu limitadas as hipóteses de ascensão na carreira profissional, como revisora de braille, de obras didácticas, literárias e outras, para cegos e amblíopes, na medida em que as sequelas de que ficou a padecer -correspondentes, recorde-se, a um Défice Funcional fixável em 23 pontos - embora não sejam incompatíveis com a sua actividade profissional habitual implicam esforços suplementares, tendo presente tudo o que já se deixou dito, e, ainda, que actualmente dificilmente se obtém juros superiores a 2% e que a esperança média de vida das mulheres se situa nos 80 anos de idade (certo que não há que atender apenas à duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma, aos 65 anos), mas tendo também presente o facto de se ter por certo que, no futuro, independentemente da ocorrência ou não de um acidente, o rendimento auferido no período correspondente à reforma será sempre substancialmente inferior ao rendimento auferido no período de vida activa e, por último, procedendo à necessária actualização da indemnização a fixar - como já se frisou o acidente ocorreu há quase 9 anos (em 10.10.2008) -, cremos justo e adequado fixar a indemnização a este título devida nos peticionados 50.000 €” (Acórdão desta Relação de 8 de Fevereiro de 2018 (Relatora: Raquel Baptista Tavares).
VI- A autora tinha à data da acidente quase 78 anos, encontrava-se reformada, a esperança média de vida para as mulheres é de 83 anos, em consequência do acidente ficou com um défice funcional permanente de 18 pontos. A decisão jurisprudencial mais próxima que encontramos corresponde a uma senhora de 78 anos, com um défice funcional permanente de 4 pontos, reformada, a quem foi arbitrado um valor de € 8.000,00 para compensação do dano biológico (Ac.da R.P. de 07/04/2016, in www.dgsi.pt). No Ac. da R.L. de 13/12/2016, in www.dgsi.pt, fixou-se uma indemnização de € 3.000,00 a título de indemnização pelo dano biológico sofrido por sinistrada em acidente de viação, reformada, de 66 anos, que ficou afectada de IPP de 2%. Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerações, afigura-se-nos equitativa a indemnização fixada de € 20.000,00” (Acórdão desta Relação de 20/03/2018 (Relatora- Margarida Almeida Fernandes).
VII- “Tendo em atenção que o autor tinha à data da alta quase 54 anos, teria mais 13, 14 anos de vida activa, uma esperança de vida de 77 anos, que em consequência do acidente ficou com um défice funcional permanente de 1 ponto, que algumas tarefas profissionais podem causar-lhe dor e auferia um rendimento anual de cerca de € 12.670,00 afigura-se-nos equitativa a indemnização fixada de € 3.000,00. A título de exemplo da prática dos nossos tribunais superiores no Ac. da R.G. de 23/03/17, in www.dgsi.pt, foi fixada uma indemnização de € 2.000,00 numa situação de um lesado de 43 anos com uma incapacidade funcional permanente de 1 ponto sem rebate profissional” (Acórdão desta Relação de 12/04/2018).
VIII- “Insurge-se o apelante contra o valor de € 20.000,00 arbitrado à autora a título de dano biológico contrapondo o valor de € 10.000,00. A autora tinha à data da acidente quase 78 anos, encontrava-se reformada, a esperança média de vida para as mulheres é de 83 anos, em consequência do acidente ficou com um défice funcional permanente de 18 pontos. Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerações, afigura-se-nos equitativa a indemnização fixada de € 20.000,00” (Acórdão desta Relação de 20/03/2018).
IX- Também: “as sequelas decorrentes do acidente são compatíveis com o exercício da profissão do A., mas implicam esforços suplementares da sua parte, o que, sem dúvida, traduz uma afectação da capacidade de ganho. Assim sendo, tendo presente tudo o que se deixou exposto e considerando, nomeadamente, que, no caso sub judice, o lesado exercia e exerce a profissão de Agente da Guarda Nacional Republicana, ficou a sofrer de cervicalgias residuais com agravamento na mudança de tempo e com irradiação para as omoplatas, sequelas que correspondem a um défice funcional de 3 pontos e que, embora compatíveis com o exercício da sua actividade profissional, implicam esforços suplementares no exercício dessa mesma actividade, que o Autor tinha 43 anos de idade à data da consolidação das lesões, com o inerente período de vida activa que, nessa data, ainda lhe restava, bem como considerando o quantum salarial que nos dá a valorização pecuniária do trabalho pelo mesmo realizado, cremos não ser desadequado, sendo ao invés equitativo e consentâneo com os padrões habituais da jurisprudência nesta matéria, o valor indemnizatório de 6.500 € fixado a este título pela 1ª instância” (Acórdão desta Relação de 24.05.2018; Relatora- Margarida Sousa).
X-Considera a apelante que a quantia fixada pelo tribunal a quo a título de perda de capacidade de ganho e dano biológico de € 45.000,00 é exagerada. Vejamos. Tendo em atenção que a autora tinha à data do acidente 52 anos, teria, pelo menos, mais 13, 15 anos de vida activa, uma esperança de vida de 83 anos, que em consequência do acidente ficou com um défice funcional permanente de 17 pontos, que as sequelas sofridas são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares e auferia um rendimento anual líquido de cerca de € 9.400,00 como assistente técnica numa unidade de saúde familiar (vide declarações de IRS dos anos 2011 e 2012 juntas a fls. 34 a 42) afigura-se-nos equitativa a indemnização fixada pelo tribunal a quo” (Acórdão desta Relação de 7/06/2018).

Assim sendo, procurando um valor equitativo para o caso concreto, que ao mesmo tempo não ponha em causa a uniformidade jurisprudencial necessária a qualquer sistema jurídico, e tendo presente, repete-se, que toda a vida futura (profissional e pessoal) da autora vai ser ensombrada pelas sequelas supra referidas, e ainda o valor do seu salário, consideravelmente superior ao dos exemplos supra citados, e que, é bom não esquecer, corresponde ao início de carreira, pensamos que o valor fixado na primeira instância, de € 115.000,00 não padece de qualquer erro ou desequilíbrio, pelo que deve ser mantido.

Recurso subordinado: como vimos, a autora interpôs recurso subordinado, com o qual pretende que no cálculo da indemnização devida pelos danos patrimoniais resultantes da perda aquisitiva passada e futura, deverá o tribunal atender ao rendimento bruto por si auferido, e não ao rendimento líquido, pelo que a indemnização deveria ser fixada num valor nunca inferior a € 200.000,00.
Como já referimos supra, o facto de o presente litígio não dever ser resolvido com recurso a qualquer fórmula matemática, mas antes com recurso à equidade, faz com que esta questão perca relevância, pois não estamos obrigados a fazer cálculos exactos com valores exactos.
No entanto, como também fizemos supra, não deixaremos de dizer que não cremos que assista razão à autora.
O valor da indemnização fixada não resulta directamente de uma perda de capacidade de ganho, mas sim de um julgamento na base da equidade, que procura abarcar no momento presente toda uma previsão da vida futura da autora, nomeadamente de uma vida profissional exigente, como engenheira química, que será sempre exercida com maior penosidade do que deveria ser, caso não tivesse sido vítima do apontado sinistro.
Não é de todo possível encontrar um valor numérico exacto que corresponda à perda de rendimentos decorrente dessa acrescida penosidade.
Ou seja, podemos afirmar com segurança que o défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de que a autora ficou afectada, fixado em 10 pontos, irá prejudicá-la profissionalmente, mas não se consegue prever de que forma concreta é que esse prejuízo se irá manifestar, se numa redução de salário, se na não progressão na carreira, se numa despromoção, num despedimento, numa mudança de categoria, se em problemas de saúde que impliquem baixas médicas, etc.
Assim, se tivermos de tomar em conta um valor a fim de calcular a indemnização devida, no meio de tanta incerteza e imprevisibilidade, ao menos que seja o valor monetário que mensalmente é depositado na conta da autora e com que ela pode contar para a sua vida e as suas despesas, e não num valor falseado, abstracto, valor esse com que a autora não pode, para todos os efeitos práticos, contar.

Assim, improcede também o recurso subordinado.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar os recursos interpostos improcedentes, e confirma na íntegra a sentença recorrida.

Custas de cada recurso pelo respectivo recorrente (art. 527º,1,2 CPC).
Data: 1/10/2020

Relator (Afonso Cabral de Andrade)
1º Adjunto (Alcides Rodrigues)
2º Adjunto (Joaquim Boavida)



1. Amélia Ameixoeira, revista do CEJ, 1º semestre de 2007, nº 6, pág. 37 e seguintes.
2. Esquecendo por vezes os ensinamentos do princípio da incerteza de Heisenberg, aplicável ao mundo físico mas sugestivo ao ponto de o citar aqui, com alguma liberdade gramatical, segundo o qual a observação minuciosa de uma realidade altera a realidade que se observa.