Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
67/17.2PTVRLT.G1
Relator: AUSENDA GONÇALVES
Descritores: CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
ELEMENTOS TÍPICOS DO ILÍCITO
ARTºS 2.º
20.º
N.º 4
32.º
N.º 1 E 2
TODOS DA CRP E ART. 6.º E 7.º DA CEDH
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I - No crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, nº. 1 do C. Penal, o elemento objectivo traduz-se na condução de veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20 g/l e, quanto ao elemento subjectivo, o mesmo pode ser cometido quer a título de dolo (em qualquer das suas modalidades), quer a título de negligência (consciente ou inconsciente), porquanto, atendendo à elevada sinistralidade das nossas estradas e a preponderância de circunstâncias atinentes ao condutor como factores causais de acidentes, tornou-se imperioso garantir a adopção de especiais medidas legislativas destinadas a garantir a segurança rodoviária, nomeadamente através da imposição da abstenção de conduzir a indivíduos que se encontrem em condições psicomotoras susceptíveis de propiciar um aumento do risco de produção de acidentes.

II - Sob pena de pôr em risco a própria operacionalidade da acção policial, os procedimentos de fiscalização dos condutores que circulam em determinadas vias rodoviárias ou daqueles que sejam detectados em violação das regras estradais não podem deixar de ser realizados através de meios expeditos, legalmente estabelecidos no Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei 18/2007, de 17 de Maio, em conjugação com o art. 153.º do Código da Estrada.

III - Nos termos das disposições conjugadas deste último preceito e do art. 1.º do Regulamento, o exame-regra para detecção do estado de influenciado pelo álcool é realizado por meio de teste no ar expirado, primeiro em analisador qualitativo e, posteriormente, em analisador quantitativo, se daquele resultar uma indicação positiva: essa detecção começa por ser realizada através de exame no ar expirado efectuado por agente de autoridade mediante a utilização de analisador qualitativo e só quando for indiciada a presença de álcool no sangue por esse meio é que se procede ao exame através de analisador quantitativo, ou, se não for possível, por via de análise de sangue.

IV - Conforme a jurisprudência pacífica dos nossos tribunais, não faz parte do elemento típico do crime o método ou procedimento utilizado para a determinação da TAS apresentada pelo arguido, tal como não integram a tipicidade de qualquer outro ilícito os meios de prova utilizados para a sua indiciação ou demonstração, sendo, pois, inócua a menção no rol dos factos provados à sujeição do arguido a exame do ar expirado em analisador quantitativo, em substituição da (irrelevante) referência que emergia da acusação ao analisador qualitativo: os meios de prova devem ser referenciados na exposição sucinta da motivação sobre a convicção formada sobre os factos, mas não devem constar da enunciação dos factos tidos na sentença por provados e não provados, como não têm de ser alegados no elenco dos que fundamentam a incriminação na acusação. Assim, o juiz não tem que alterar essa referência da acusação, incluindo na descrição dos factos provados o meio usado para a sua prova, porque irrelevante para o preenchimento do crime.

V - Como o ilícito em análise é justificado pela protecção de direitos e valores fundamentais e imprescindíveis à vida em comunidade, como são o da segurança da circulação rodoviária e da segurança da vida e da integridade física das pessoas, face ao trânsito de veículos, não se vislumbra como poderia violar o disposto nos arts. 2.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.º 1 e 2, todos da CRP e art. 6.º e 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem a interpretação acabada de expor quanto aos meios usados no procedimento de recolha da taxa, para exame do estado de influenciado pelo álcool, legalmente impostos para permitir e tornar exequível e operante a produção de prova daquele estado e o seu consequente sancionamento.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório.

No âmbito do processo comum singular nº 67/17.2PTVRL do Juízo Local Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, o arguido José, foi julgado e condenado por sentença proferida e depositada a 12/07/2018, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, n.º 1, do C. Penal, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de € 6,50 perfazendo €520 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias, nos termos do disposto no artigo 69º, nº 1, al. a), do mesmo Código.
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Inconformado com a referida decisão, o arguido interpôs recurso, pugnando pela sua absolvição, formulando na sua motivação as seguintes conclusões:

«A) O presente recurso vem interposto da decisão final que condenou o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez
B) Ora, tal como claramente resulta dos artigos 1 º e 2 º da Lei 18/2007 de 17 de Maio, uma vez indiciada a presença de álcool no sangue e através de exame qualitativo, o arguido é submetido ao exame quantitativo
C) O que vale por dizer que sem a realização do exame e em analisador qualitativo não há lugar à realização do exame e em analisador quantitativo
D) A acusação apenas referia a realização do exame qualitativo
E) O agente da PSP, testemunha da acusação L. F. em depoimento gravado no sistema informático 2018070510250 6 134489 8 2871887 nem sequer referiu o procedimento que foi adoptado no que toca aos analisadores (eventualmente) utilizado sentença para pesquisa de álcool no sangue.
F) Após alegações produzidas pelo signatário, e não obstante a posição do arguido, o tribunal veio a corrigir a acusação, substituindo a expressão qualitativo por qualitativo ao abrigo do disposto no art. 358º do CPP.
G) Mau grado, a referida correcção é manifestamente inócua pois apenas puxou de um lado para destapar do outro.
H) Ou seja, ao constar da acusação que o arguido foi submetido ao analisador quantitativo sem que tivesse sido submetido ao qualitativo, permanece ilegal o procedimento atinente à pesquisa de álcool no sangue.
I) Conclui-se, portanto, que o procedimento descrito na acusação e provado sob o ponto 2 da matéria de facto é manifestamente ilegal
J) O procedimento aqui em crise tem que ser entendido como um todo desconforma à lei.
K) Consequentemente não se encontram preenchidos os elementos objectivos do tipo legal
L) A interpretação, ainda que indirecta, no sentido de que é possível o exame/resultado obtido e analisador quantitativos sem que haja menção na acusação o procedimento concretamente adoptado (nem tal flua do julgamento), designadamente, o facto de primeiramente o arguido ter sido submetido a exame qualitativo como a lei impõe, é inconstitucional por violação do disposto nos arts. 2.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.º1 e 2 todos da CRP e art. 6º. e 7. º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem , o que expressamente se alega para todos os legais efeitos.
M) Normas jurídicas violadas: As referidas nas alíneas supra para as quais se remete por economia processual, bem assim, art. 358º, nº 1, alínea f) todos do CPP.».

O recurso foi regularmente admitido.

O Ministério Público junto da 1ª Instância apresentou resposta à motivação, defendendo a improcedência do recurso, na medida em que, segundo aduz, os elementos objectivos necessários da prática do crime de condução sob influência de álcool encontram- se devidamente plasmados na acusação, sendo que o modo como foram efectuadas as pesquisas ao álcool não faz parte desses elementos, tratando-se antes de uma questão de direito probatório. Também neste Tribunal, a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, defendendo, na mesma senda, que, da acusação constam todos os elementos essências que permitem a condenação do arguido, sustentando, assim, a improcedência total do recurso.

Foi cumprido o art. 417º, nº 2, do CPP.

Colhidos os vistos, vieram os autos à conferência.
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II. Fundamentação.

Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (arts. 412º, nº 1, do CPP), sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente por obstarem à apreciação do seu mérito, suscita-se neste recurso a questão de apurar se se verificam todos os elementos objectivos do crime de condução sob influência de álcool pelo qual o arguido foi condenado e em caso afirmativo se tal interpretação é inconstitucional por violação do disposto nos arts. 2.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.º 1 e 2 todos da CRP e arts. 6º. e 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Importa apreciar tal questão e decidir. Para tanto, deve considerar-se como pertinentes ao conhecimento do objecto do recurso os factos considerados provados na decisão recorrida e fundamentação que sobre os mesmos recaiu:

«1. No dia .. de … 2017, cerca das 03.31 horas, na Rua de …, o arguido conduzia um veículo automóvel ligeiro de passageiros.
2. Foi então o arguido interceptado pela Polícia de Segurança Pública e submetido ao exame quantitativo de pesquisa de álcool no sangue tendo acusado uma TAS de 1,814 g/l., após dedução do erro máximo admissível.
3. Embora soubesse que tinha ingerido bebidas alcoólicas e que não podia conduzir veículos automóveis em vias públicas ou equiparadas nessas circunstâncias, tal não o impediu de conduzir o referido veículo.
4. Agiu livre, voluntária e conscientemente, embora soubesse que tal conduta era proibida.
5. O arguido reside com um filho de 24 anos, o qual trabalha em part-time na área da restauração.
O arguido reside em casa própria, correspondente a uma vivenda de tipologia T4.
Declarou encontrar-se desempregado há cerca de um ano, não auferindo qualquer rendimento e subsistindo com base em poupanças e apoios de familiares.
Despende mensalmente em consumos básicos de água, electricidade e gás, a quantia de € 100,00.
É proprietário de um veículo automóvel de marca Audi, modelo A4, do ano de 1999, com a matrícula ….
10º É licenciado em Medicina, não exercendo tal profissão.
11º- Teve como última actividade profissional a de empresário no ramo imobiliário.
12º- Não tem antecedentes criminais.».

Motivação

A convicção do Tribunal relativamente aos factos que considerou provados fundou-se na apreciação livre e crítica da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, de acordo com o preceituado no artigo 127º do Código de Processo Penal.

No caso, temos que o arguido optou por não prestar declarações.

Todavia, a convicção do tribunal relativamente aos factos que deu como provados firmou-se, de forma inequívoca, com base no depoimento da testemunha L., Agente da PSP, o qual teve intervenção directa na situação dos autos.

Assim, pela forma clara, objectiva, pormenorizada e segura como depôs, a testemunha em apreço logrou convencer o tribunal, tanto mais que conhecia perfeitamente o arguido para além das suas funções, motivo pelo qual tinha bem presente a situação em análise.
Tal depoimento, de resto, foi conjugado com o teor do auto de notícia de fls. 4-4verso, bem como do talão anexo, os quais não nos suscitaram quaisquer dúvidas, saindo assim incólumes em sede de audiência de julgamento.

Relativamente às condições pessoais, sociais e económicas do arguido, o Tribunal baseou-se nos respectivos esclarecimentos, relativamente aos quais não se vislumbram razões para neles não fazer fé, e que foram conjugadas com o resultado das pesquisas à base de dados do registo automóvel.

Finalmente, foi tido em consideração o CRC junto aos autos.».
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III- O Direito.

1. Os elementos do crime de condução sob o efeito do álcool.

O arguido/recorrente, sem impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, vem questionar o respectivo enquadramento jurídico, dizendo que não constava da acusação que tivesse sido sujeito a exame teste no ar expirado, em analisador quantitativo, o que apenas sucedeu após a realização da audiência de julgamento, pela via da comunicação de alteração não substancial de factos, mas que de todo modo tal via é insuficiente pois a mesma mantem-se omissa quanto ao exame em analisador qualitativo.

Vejamos.

O crime de condução de veículo em estado de embriaguez pelo qual o arguido foi condenado é previsto e punido nos termos do disposto no artigo 292º, nº. 1 do C. Penal.

O elemento objectivo do citado crime traduz-se na condução de veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20 g/l. E, quanto ao elemento subjectivo, cumpre referir que nos encontramos perante um crime que pode ser cometido quer a título de dolo (em qualquer das suas modalidades), quer a título de negligência (consciente ou inconsciente).

Realmente, atendendo à elevada sinistralidade das nossas estradas e a preponderância de circunstâncias atinentes ao condutor como factores causais de acidentes, tornou-se imperioso garantir a adopção de especiais medidas legislativas destinadas a garantir a segurança rodoviária, nomeadamente através da imposição da abstenção de conduzir a indivíduos que se encontrem em condições psicomotoras susceptíveis de propiciar um aumento do risco de produção de acidentes.

Sob pena de pôr em risco a própria operacionalidade da acção policial, os procedimentos de fiscalização dos condutores que circulam em determinadas vias rodoviárias ou daqueles que sejam detectados em violação das regras estradais não podem deixar de ser realizados através de meios expeditos.

Assim, os procedimentos legalmente estabelecidos para a realização do teste de pesquisa de álcool no sangue, destinada à averiguação do grau de alcoolemia de que sejam portadores os condutores de veículos ou outros intervenientes na circulação rodoviária, para efeito de apuramento de responsabilidade criminal ou contra-ordenacional, encontram-se previstos no Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei 18/2007, de 17 de Maio, em conjugação com o art. 153.º do Código da Estrada.

Nos termos das disposições conjugadas deste último preceito e do art. 1.º do Regulamento, o exame-regra para detecção do estado de influenciado pelo álcool é realizado por meio de teste no ar expirado, primeiro em analisador qualitativo e, posteriormente, em analisador quantitativo, se daquele resultar uma indicação positiva. Extrai-se destas disposições legais que a detecção de álcool no sangue do condutor começa por ser realizada através de exame no ar expirado efectuado por agente de autoridade mediante a utilização de analisador qualitativo. Só quando for indiciada a presença de álcool no sangue por esse meio é que se procede ao exame através de analisador quantitativo, ou, se não for possível, por via de análise de sangue.

Efectivamente, do quadro legal de referência resulta que o aparelho qualitativo visa uma primeira despistagem e a consequente selecção dos condutores (ou peões) a submeter a teste quantitativo, ou seja, tão só, sinalizar a mera presença de álcool no sangue, não cuidando da quantificação de uma TAS: «a presença de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado efectuado em analisador qualitativo» e «quando o teste realizado em analisador qualitativo indicie a presença de álcool no sangue …».

Ora, resulta da matéria de facto apurada, a que este Tribunal se encontra adstrito, que o arguido no dia .. de … 2017, pelas das 03.31 horas, na Rua …, conduzia um veículo automóvel ligeiro de passageiros, com uma com uma taxa de álcool no sangue de 1,814 g/l., após dedução do erro máximo admissível, fazendo-o com pleno conhecimento de que tinha ingerido bebidas alcoólicas, aliás, em quantidade que ultrapassava, largamente, o limite legal de 1,2 g/l, de forma deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

É esta e apenas esta a factualidade que importava ser alegada na acusação e posteriormente vir a ser dada como provada.

Conforme a jurisprudência pacífica dos nossos tribunais, não faz parte do elemento típico do crime o método ou procedimento utilizado para a determinação da TAS apresentada pelo arguido, tal como não integram a tipicidade de qualquer outro ilícito os meios de prova utilizados para a sua indiciação ou demonstração.

É, pois, inócua a menção no rol dos factos provados à sujeição do arguido a exame do ar expirado em analisador quantitativo, em substituição da (irrelevante) referência que emergia da acusação ao analisador qualitativo: os meios de prova devem ser referenciados na exposição sucinta da motivação sobre a convicção formada sobre os factos, mas não devem constar da enunciação dos factos tidos na sentença por provados e não provados, como não têm de ser alegados no elenco dos que fundamentam a incriminação na acusação (1).

Assim, o Senhor Juiz não teria que alterar essa referência da acusação, incluindo na descrição dos factos provados o meio usado para a sua prova, porque irrelevante para o preenchimento do crime.

Por fim, sempre se dirá que o ilícito em análise é justificado pela protecção de direitos e valores fundamentais e imprescindíveis à vida em comunidade, como são o da segurança da circulação rodoviária e da segurança da vida e da integridade física das pessoas, face ao trânsito de veículos. Por isso, contrariamente ao invocado pelo recorrente mas sem qualquer concretização, não vislumbramos como poderia a interpretação acabada de expor violar o disposto nos arts. 2.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.º 1 e 2, todos da CRP e art. 6.º e 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Na verdade, como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 418/2013 (2) «A circulação rodoviária, constituindo uma atividade de manifesta utilidade social, acarreta riscos consideráveis de lesão de bens jurídicos fundamentais como a vida, a integridade pessoal, a propriedade privada.

Atendendo à elevada sinistralidade das nossas estradas e a preponderância de circunstâncias atinentes ao condutor como fatores causais de acidentes, tornou-se imperioso garantir a adoção de especiais medidas legislativas destinadas a garantir a segurança rodoviária, nomeadamente através da imposição da abstenção de conduzir a indivíduos que se encontrem em condições psicomotoras suscetíveis de propiciar um aumento do risco de produção de acidentes.

Sendo conhecida a interferência do consumo de álcool no comportamento dos condutores - designadamente quanto ao processamento e interpretação de estímulos exteriores, bem como quanto ao tempo e qualidade da reação aos mesmos - o legislador intensificou a tutela dos bens jurídicos afetados pelo incremento do risco resultante da condução sob influência de tal substância.

Neste contexto, no âmbito da tutela penal, antecipou a proteção do bem jurídico segurança rodoviária - e, reflexamente, a tutela da vida e integridade pessoal, bem como do direito à propriedade privada - a um momento prévio à produção do resultado de dano ou de perigo, consagrando um tipo legal de perigo abstrato, no artigo 292.º do Código Penal (condução de veículo em estado de embriaguez). (…)

Acontece que, correspondendo a proteção dos direitos fundamentais a uma exigência positiva de atuação dos poderes públicos, consubstanciada na garantia de efetiva tutela material de tais direitos, nomeadamente tutela penal (cf. J. Miranda e R. Medeiros, op. cit., p. 557), a criação de tipos legais incriminatórios não pode deixar de ser acompanhada de meios legais que permitam tornar exequível e operante a produção de prova dos factos respetivos e o seu consequente sancionamento, sob pena de ficar prejudicada a satisfação das necessidades de proteção dos bens jurídicos tutelados e as restantes finalidades de prevenção das penas.».

Em suma, podemos concluir, na linha desta jurisprudência do Tribunal Constitucional, que os meios usados no procedimento de recolha da taxa, para exame do estado de influenciado pelo álcool, legalmente impostos para permitir e tornar exequível e operante a produção de prova daquele estado e o seu consequente sancionamento, tal como qualquer outro meio de prova, não têm que constar da acusação, não comportando tal conclusão qualquer juízo de desconformidade constitucional.
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Decisão:

Pelo exposto, julgando-se o recurso improcedente, decide-se manter integralmente a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em quatro UC´s.
Guimarães, 11/02/2019

Ausenda Gonçalves
Fátima Furtado

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Neste sentido, ver acórdãos desta Relação de 05-06-2017 e de 8-10-2018, proc. 70/16.0PTBRG.G1 e 678/17.6GBVVD.G1, respectivamente.
2 Proferido a 15-07-2013, proc. n.º 120/11.