Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3235/18.6T8VNF.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: TRABALHO SUPLEMENTAR
MEIOS DE PROVA
PERÍODO NORMAL DE TRABALHO
DESCANSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Sumário da Relatora:

I – O crédito correspondente ao trabalho suplementar vencido há mais de cinco anos só pode ser provado por documento idóneo, nos termos do art.º 337º nº2 do Código do Trabalho.

II - Os períodos de descanso/pausas correspondem, em princípio, a períodos de tempo em que o trabalhador não está vinculado à prestação de trabalho, sendo por isso livre de dispor do seu tempo, ainda que seja por curto período, não relevando assim para o cálculo do período normal de trabalho

III - Apesar das características das pausas em questão não estarem compreendidas no conceito de tempo de trabalho, o certo é que uma delas, independentemente das suas características, por força da regulamentação colectiva aplicável e independentemente da sua natureza tem de se considerar como incluída no período normal de trabalho.
Decisão Texto Integral:
APELANTE: A. P.
APELADO: X- MALHAS E CONFECÇÕES, LDA.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

A. P., residente na Rua …, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra X- MALHAS E CONFECÇÕES, LDA., com sede na Rua …, Vila Nova de Famalicão, pede que se condene a Ré a pagar-lhe o montante de €8.686,58, a título de trabalho suplementar, acrescido de €3.429,35 relativos a juros vencidos, bem como juros vincendos até integral pagamento.

A Réu contestou a acção concluindo pela total improcedência do pedido.

Os autos prosseguiram com a sua normal tramitação tendo por fim sido proferida sentença pela Mma. Juiz, que terminou com o seguinte dispositivo:

“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente por provada a acção e, consequentemente, condeno a ré a pagar à autora, a título de trabalho suplementar a quantia de 981,14€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde final do mês a que cada período de trabalho suplementar se refere até efectivo e integral pagamento e, no mais, absolvo a ré do pedido.
Custas pela autora e ré, na proporção do decaimento.
Registe e notifique.”

Inconformada com esta sentença, dela veio a Autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões:

1. A Apelante vem recorrer da decisão do Tribunal a quo que julgou a ação parcialmente procedente e em consequência, condenou a Recorrida ao pagamento do montante de em 981,14€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o mês a que cada período de trabalho suplementar se refere até efetivo e integral pagamento, absolvendo, quanto ao mais, a Recorrida do pedido.
2. A Recorrente alegou, em síntese, que prestou trabalho suplementar, por imposição da Ré, desde o ano 1996 até à cessação do contrato de trabalho, em 2017, tendo por isso um crédito sobre a Recorrida de EUR 8.686,58, acrescido de juros moratórios no montante de EUR 3.429,58, vencido até à data da interposição da ação.
3. Em concreto, os créditos por trabalho suplementar advêm da imposição por parte da Recorrida através do mapa de horário de trabalho, da prestação de trabalho que ultrapassava os limites máximos de trabalho estipulados por lei e pelas convenções coletivas de trabalho aplicáveis a esta relação laboral.
4. A Apelada defendeu-se alegando, que o horário de trabalho cumprido pela Recorrente incluía, para além do intervalo para almoço, dois intervalos mais curtos, sendo um de manhã, de 10 minutos, e outro na parte da tarde, também de 10 minutos, que não podem ser considerandos como período normal de trabalho.
5. A Recorrente respondeu à contestação juntando aos autos cópia do mapa de horário de trabalho que se encontra afixado nas instalações da Recorrida desde, pelo menos, 02 de dezembro de 1997.
6. Saneado o processo, o tribunal a quo admitiu os requerimentos probatórios tendo, no entanto, indeferido o requerimento de junção aos autos por parte da Recorrida dos recibos de vencimento da Recorrente.
7. Não obstante a seleção da matéria de facto julgada provada e não provada, está a Apelante convencida de que a M. Juiz a quo não teve em conta toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento nem a ponderou e avaliou corretamente, sem prejuízo do disposto no art. 396.º CC.
8. Na fundamentação, o tribunal a quo declara ter valorado a confissão das partes quanto a estes pontos, tal como resulta da audiência de julgamento.
9. Contudo a sentença não reproduz de forma fiel, mas sim tergiversada, a confissão judicial da legal representante da aqui Recorrida quanto ao alegado nos artigos 11 e 12 da petição inicial apresentada pela Recorrente.
10. A questão colocada (lida) pela Mma. Juiz à legal representante da Recorrida e que foi considerada confissão é, ipsis verbis, o que se encontra escrito nos artigos 11. e 12. da petição inicial, com a ressalva da existência das pausas de 10 minutos;
11. Pelo que da conjunção desta confissão com o documento junto aos autos, separadamente pela Recorrente e também pela Recorrida, correspondente ao mapa de horário de trabalho, deverão os factos n.º 5 a 8 que foram dados como provados ser substituídos pelos seguintes que, efetivamente, correspondem aos factos que ficaram provados nos autos:

a. A Autora por imposição da Ré trabalhava sempre das 8h00 às 17h30 de segunda a quinta e à sexta das 8h00 às 16h30, sendo que de segunda a sexta-feira tinha uma pausa de 10m na parte da manhã e uma pausa de 10m da parte da tarde, à sexta-feira, tinha apenas uma pausa de 10m na parte da manhã.
b. O horário de trabalho implementado na empresa Ré, pelo menos desde 02.12.1997 (data do documento denominado “Horário de Trabalho”, e imposto aos trabalhadores, incluindo-se aqui a Autora, era o seguinte:

De segunda a quinta-feira:
Entrada: 8h00
Descanso intermédio: 12h00 às 13h00
Saída: 17h30
Pausa: 10h00 às 10h10 e 16h00 às 16h10
Sexta-feira:
Entrada: 8h00
Descanso intermedio: 12h00 às 13h00
Saída: 16h30
Pausa: 10h00 às 16h00
12. O Tribunal a quo ao dar por provado que as máquinas industriais em que a Recorrente trabalhava eram desligadas durante os períodos de pausas e que toda a unidade industrial paralisava, pretende criar a ideia (completamente equivocada) de que a fábrica “encerrava” totalmente durante as pausas de 10 minutos, o que não é verdadeiro.
13. Isto porque, a verdade é que as trabalhadoras desligavam as máquinas industriais nas quais trabalhavam sempre que se afastavam do seu posto de trabalho (quando iam ao quarto de banho, ou inclusivamente quanto atendiam um telefonema), por instrução expressa dos seus superiores, conforme resulta provado pelo depoimento das testemunhas Maria, M. V. e, adicionalmente, pelas declarações de parte da Recorrente (Cfr. transcrição de depoimentos supra).
14. Pelo que o número 10. dos factos dados como provados na doutra Sentença deverá ser alterado, passando o mesmo referi que:

“10. As máquinas industriais em que a Autora laborava, tal como acontecia com as demais trabalhadoras, eram desligadas durante o intervalo para almoço, sendo que, também, eram desligadas por ordem da Ré sempre que, por qualquer motivo, as trabalhadoras tivessem de se afastar, ainda que momentaneamente das máquinas onde trabalhavam para ir ao quarto de banho ou para se deslocar a outro ponto, sendo que, por esse motivo, as mesmas também eram desligadas durante as pausas.”
15. O tribunal a quo cometeu também graves omissões relativamente a factos que resultaram provados em audiência de julgamento e que são absolutamente determinantes para aferir se as curtas pausas de 10 minutos que são praticadas pela Recorrida devem, ou não, ser consideradas tempo de trabalho à luz do nosso direito.
16. Na audiência de julgamento ficou provado que a Autora e demais trabalhadoras não picavam (nunca o fizeram) o ponto no início e fim das pausas de 10 minutos, pese embora este facto tenha sido omitido na decisão proferida.
17. Isto resultou comprovado pelo depoimento prestado de forma clara e esclarecedora por parte das testemunhas M. V., Maria e M. V..
18. Resultou também provado que durante os curtos intervalos de 10 minutos que tinham na parte da manhã, de segunda a sexta-feira, e na parte de tarde, de segunda a quinta-feira, a Recorrente e demais trabalhadoras estavam disponíveis e subordinadas à Recorrida para prestar trabalho caso lhe fosse solicitado.
19. Isto ficou demonstrado pelo depoimento das testemunhas Maria, L. S. e pelo próprio depoimento da parte da Recorrente, conduzido pela Mma. Sra. Juiz.
20. Pelo que resultou evidente que, tanto a Recorrente como todas as trabalhadoras encontravam-se em situação de subordinação durante esse período de pausa e estavam adstritas à prestação de trabalho durante aqueles curtos intervalos de pausa, caso a Recorrente assim o solicitasse.
21. Por estes motivos, conjugados com o constante no facto provado número 11., de donde resulta que as trabalhadoras permaneciam durante as pausas no exterior da unidade fabril ou na sala onde tomavam as refeições (mas que na verdade não abandonavam as instalações da Recorrida), deverá ser aditado o seguinte facto ao elenco de factos provados:

“A Autora, assim como as demais trabalhadoras, durante os períodos de pausas de 10 minutos, não registavam a sua saída e entrada ao serviço na máquina de ponto, sendo que permaneciam disponíveis para, se necessário, prestar trabalho quando solicitado pela Recorrente”.
22. Assim, quanto à natureza e modus operandi das pausas de 10 minutos que foi instituída pela Recorrida, ficou verdadeiramente provado o seguinte:

a. Nos aludidos descansos de almoço e de 10 minutos não eram dadas instruções pela ré à autora para que permanecesse no local de trabalho, ou para que se mantivesse à disposição da empresa, durante esse período de trabalho (Facto Provado n.º 9.)
b. A autora, tal como as demais trabalhadoras, durante esses 10 minutos desligava a máquina que lhe estava atribuída, saía do seu posto de trabalho e saía do salão industrial em que tinha lugar a laboração, para o exterior da unidade fabril ou para a sala em que tomavam as refeições. (Facto Provado n.º 11)
c. Somente regressando ao local e posto de trabalho quando a campainha que “contava” os 10 minutos de pausa e descanso tocava, chamando a autora e as demais trabalhadoras para o reinício da laboração industrial. (Facto Provado n.º 12)
E ainda, conforme foi supra evidenciado, ficaram também provados os seguintes factos:

d. As máquinas industriais em que a Autora laborava, tal como acontecia com as demais trabalhadoras, eram desligadas durante o intervalo para almoço, sendo que, também, eram desligadas por ordem da Ré sempre que, por qualquer motivo, as trabalhadoras tivessem de se afastar, ainda que momentaneamente das máquinas onde trabalhavam para ir ao quarto de banho ou para se deslocar a outro ponto, sendo que, por esse motivo, as mesmas também eram desligadas durante as pausas (Facto 10. com a alteração supra peticionada)
e. A Autora, assim como as demais trabalhadoras, durante os períodos de pausas de 10 minutos, não registavam a sua saída e entrada ao serviço na máquina de ponto, sendo que permaneciam disponíveis para, se necessário, prestar trabalho quando solicitado pela Recorrente. (Facto a aditar ao elenco de factos provados, de acordo com o supra peticionado)
23. Ficou também demonstrado inclusivamente pelo depoimento da Legal Representante da Recorrida que as trabalhadoras, incluindo a autora, nunca abandonavam o perímetro das instalações da Recorrida (nunca iam para a rua, fora dos portões da empresa), sendo que a expressão utilizada no Facto Provado 11. (exterior da unidade fabril) apenas diz respeito a sair para fumar um cigarro ou “apanhar um pouco de ar”, pelo que as trabalhadoras estavam a todo momento ao alcance da Recorrida.
24. Ficou demonstrado, com prova que foi produzida em julgamento, estas pausas de 10 minutos visavam conferir o tempo necessário para que a Recorrente e demais trabalhadoras lanchassem e fossem ao quarto de banho satisfazer as suas necessidades fisiológicas.
25. Ficou demonstrado que durante estas pausas, a Recorrente e demais trabalhadores mantinham-se dentro do edifício da Recorrida, fora do salão de laboração, mas nos cacifos e na sala de refeições, ou no exterior junto ao edifício (e tanto assim era que, de outra forma não poderiam ouvir a “campainha” para reiniciar la laboração).
26. Ficou demonstrado que durante estas pausas a Recorrente e as demais trabalhadoras não picavam o ponto, pelo que não havia registo de entrada e saída nessas pausas (como se pode verificar pela consulta dos registos de tempo de trabalho juntos pela Recorrente).
27. Que durante essas pausas a Recorrente e demais trabalhadoras estavam subordinadas e sob o poder de direção da Recorrida, porquanto estavam efetivamente disponíveis para prestação de trabalho normal, em caso de necessidade e sempre que lhes fosse solicitado, como aliás efetivamente chegou a acontecer (vide o depoimento supra transcrito da testemunha Maria, constante do ficheiro de áudio 20181023104939_5576507_2870547, minuto 06:00 a minuto 06:45).
28. A Recorrente considera que tribunal a quo andou mal ao não considerar que todas estas pausas (intervalos de 10 minutos) dadas as suas características, são subsumíveis na alínea d. do n.º 2 do artigo 197.º do Código do trabalho.
29. A CCT entre a ANIVEC/APIV e a FETESE, publicada no BTE nº 21 de 8/06/2009 (assim como nas suas versões anteriores e posteriores) é a CCT aplicável a esta relação labora, e estabelece na alínea d. do artigo 24.º que “a meio do 1.º período diário de trabalho ou do mais longo, os trabalhadores têm direito a uma pausa/interrupção de dez minutos, incluída no período normal de trabalho”.
30. Com base neste ínsito, o Tribunal a quo decidiu que apenas uma das pausas diárias (intervalos/interrupções de 10 minutos) que constavam do mapa de horário de trabalho da Recorrida devia ser considerada período normal de trabalho.
31. Ambas as pausas (matinal e vespertina) têm as mesmas características, têm a mesma duração, seguem o mesmo procedimento, prosseguem a mesma finalidade, as trabalhadoras em nenhuma das pausas picam o registo de ponto no início e fim da pausa, em ambas as pausas desligam a sua máquina de trabalho, permanecem no local de trabalho ou em sítio muito próximo, ficam às ordens da Recorrida para prestar trabalho normal se necessário, comem o seu lanche/refeição ligeira, vão ao quarto de banho, etc.
32. Ambas as pausas foram impostas por exclusiva vontade da empresa e não decorrem da aplicação da CCT em causa, pois tal como ficou demonstrado nos autos, a Recorrida desconhecia em absoluto a qual a CCT aplicável ao seu sector de atividade (nem sequer sabia o que era uma CCT), pelo que nada no espírito e procedimentos que norteiam ambas as pausas diverge uma da outra.
33. Aqui chegados e em suma, tendo ambas as pausas de 10 minutos (matinal e vespertina) as características que foram acima descritas, no entendimento da Recorrente são subsumíveis à alínea d) do n.º 2 do artigo 197.º do Código do Trabalho, e por isso, deveria o tribunal a quo tê-las considerado como período normal de trabalho.
34. E, ainda que assim não se entendesse (o que não se admite), tampouco se concebe que o tribunal tenha tratado de forma diferente aquilo que é idêntico, pois as pausas em causa (as matinais e as vespertinas) tinham as mesmas características, diferindo apenas pelo facto de que, tendo ambas sido determinadas pela Entidade Empregadora Recorrida, uma dessas pausas estivesse garantida em sede de CTT.
35. Motivo pelo qual deverá ser a sentença devidamente corrigida, sendo substituída a parte da decisão que apenas considera como período normal de trabalho a pausa/intervalo de 10 minutos que a Recorrente gozava de segunda a sexta-feira na parte da manhã, passando também a considerar como período normal de trabalho as pausas de 10 minutos que a Recorrente gozava na parte da tarde de segunda a quinta-feira.
36. Devendo-se considerar que o período normal de trabalho prestado pela Recorrente era de 8 horas e 30 minutos, de segunda a quinta-feira; e de 7 horas e 30 minutos à sexta-feira, totalizado 41 horas e 30 minutos por semana.
37. Ou seja, a trabalhadora prestava suplementar de 30 minutos de segunda a quinta-feira, por ultrapassar nesses dias o limite de 8 horas de trabalho diário imposto pela CT e CTT aplicável ao sector.
38. No fim de cada semana, a Recorrida trabalhava um total de 41 horas e 30 minutos.
39. Embora na Sentença recorrida o Tribunal a quo, sintomaticamente evite a todo custo referi-lo expressamente, não restaram quaisquer dúvidas, nem sequer no espirito do próprio julgador, que a Recorrente prestou trabalho suplementar nos termos já descritos, deste a implementação do mapa de horário de trabalho em causa.
40. Contrariamente ao entendimento que o Tribunal a quo subscreveu na sua Sentença, à luz do n.º 2 do artigo 337.º do Código do Trabalho, o citado Mapa de Horário de Trabalho onde constam as horas de entrada, intervalos e saída, constitui documento idóneo para a prova da existência de crédito decorrente da prestação de trabalho suplementar vencido há mais de cinco anos.
41. Recorde-se que o n.º 2 do artigo 337.º do Código do Trabalho refere que “o crédito correspondente a compensação por violação do direito a férias, indemnização por aplicação de sanção abusiva ou pagamento de trabalho suplementar, vencido há mais de cinco anos, só pode ser provado por documento idóneo.”
42. Por documento idóneo deve ser entendido, “como se assinalou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-12-2007 (Proc. n.º 3788/07, disponível em www.dgsi.pt), por “[…] documento escrito com origem na própria entidade empregadora, que demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito e que seja suficientemente elucidativo, de molde e dispensar a sua integração ou dilucidação através de outros meios de probatórios, designadamente testemunhas […]”.
(No mesmo sentido, veja-se o elucidativo Acórdão do TRP de 20 de Junho de 2016, proc. Proc. 2/15.2T8VLG-A.P1e Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 29 de Setembro de 2016, processo 1758/15.8T8EVR.E1, e do STJ de 19 de Dezembro de 2007, processo 07S3788, todos acessíveis em www.dgsi.pt)
43. Na presente ação e a diferença de outros casos, estamos perante um caso em que o mero cumprimento do mapa horário de trabalho, tal qual como ele existia, se traduzia na prestação de trabalho para além dos limites de tempo de trabalho legais e da CCT daquele setor de atividade.
44. O mapa de horário de trabalho, tal qual como foi aqui apresentado nos autos, foi elaborado emanado da entidade empregadora Recorrida (“ Compete à entidade patronal estabelecer o horário de trabalho dentro dos condicionalismos legais” – art. 49.º LCT, em vigor em 1997-; competência e prerrogativa que se mantém até ao mais recente Código do Trabalho de 2009, no seu artigo 215.º).
45. Recorde-se que em nenhum momento houve acordo entre a Recorrida e as trabalhadoras para elaboração do mapa de horário de trabalho.
46. Ora, este horário de trabalho ilegal, é documento idóneo para provar que existiu prestação de trabalho suplementar por parte da Recorrente e das demais trabalhadoras da Recorrida desde o ano 1997.
47. Verificamos, em abono ao reconhecimento da sua perfeição enquanto documento idóneo para os efeitos do n.º 2 do artigo 337.º, que (i) o mesmo foi emanado e teve origem na entidade empregadora;
(ii) é demonstrativo per se da existência de factos demonstrativos da existência do crédito, sem necessidade de outros meios de prova.
48. Facto que foi aliás corroborado pela confissão livre e espontânea da Legal Representante da Recorrida, M. J., que disse “A Autora por imposição da Ré trabalhava sempre das 8h00 às 17h30 de segunda a quinta e à sexta das 8h00 às 16h30, sendo que de segunda a sexta-feira tinha uma pausa de 10m na parte da manhã e uma pausa de 10m da parte da tarde, à sexta-feira, tinha apenas uma pausa de 10m na parte da manhã”.
49. Pretender que o documento idóneo a que se refere o n.º 2 do artigo 337.º do Código de Trabalho faça prova, ao mesmo tempo, do valor concreto dos créditos em causa, constitui uma leitura e interpretação descabida do Tribunal a quo, que metamorfoseia a outro nível o alcance deste meio de prova especial que é requerido pelo n.º 2 do art. 337.º do Código do Trabalho.
50. Por esse motivo, deveria ter-se considerado como provado, por documento idóneo, constituído pelo mapa de horário de trabalho, que a Autora prestou trabalho suplementar relativamente do qual resulta um crédito sobre a Recorrida, desde pelo menos 02.12.1997.
51. Precisamente nesta linha, veja-se o Acórdão do TRP datado de 16.04.2012 3, que refere no seu sumário o seguinte:

I - A condenação em montante a liquidar em incidente de liquidação tem como pressuposto a prova da existência do direito, mas a impossibilidade, na audiência de discussão e julgamento, de se apurar o objeto ou a quantidade do concretamente devido.
II - Provado o horário de trabalho dos AA., do qual resulta a prestação de trabalho suplementar, a subsequente liquidação do efetivamente prestado deverá ser relegada para incidente subsequente, sendo que a isso não obsta a circunstância de não terem eles feito prova dos dias, que alegavam, em que concretamente teriam prestado o invocado trabalho suplementar.
52. De facto, o ínsito legal apenas refere que é necessário documento idóneo para provar a existência de crédito decorrente da prestação de trabalho suplementar e, em nenhum momento, refere que esse documento tem de ser utilizado para quantificar o valor preciso do crédito.
53. Acresce que todos os depoimentos prestados, assim como das declarações e depoimentos de parte (e respetivas confissões) não foram devidamente valorados no momento de formar a convicção do julgador, que aparentemente permaneceu distorcida, tendo levado ao extremo o princípio da livre apreciação da força probatória dos depoimentos das testemunhas, constante do art. 396.º do CC.
54. Perante o teor dos elementos fornecidos pelo processo, para além do documento idóneo, impunha-se a prolação de uma sentença distinta, pois que se logrou fazer prova de que a Recorrente trabalhou respeitando aquele mapa de horário de trabalho e por conseguinte prestou trabalho suplementar desde a implementação daquele horário de trabalho.
55. De outro modo, e se Recorrente não tivesse cumprido pontualmente o horário que lhe tinha sido exigido, certamente que no decurso daqueles 20 anos de vincula laboral, teria sido objeto de sanções disciplinares ou, até mesmo, teria sido despedida, o que não aconteceu.
56. Sendo certo que o julgador é livre no ato de apreciação das provas produzidas, quer na fase dos articulados quer em sede de julgamento, tal apreciação tem que ser “vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório.”
57. Ora, in casu, questiona-se se haverá restado algum resquício de dúvida no espírito do julgador de que a Recorrente cumpriu aquele mapa de horário de trabalho e, por conseguinte, que detém um crédito sobre a Recorrida a título de trabalho suplementar, que em última análise se locupletou à custa do seu trabalho.
58. Perante o vertido na Sentença, a Recorrente apenas pode demonstrar estranheza e perplexidade perante a posição assumida pelo Tribunal a quo que, para os anos de 2013 a 2017, parece considerar que o mapa de horário de trabalho elaborados pela Recorrida é documento idóneo para prova da existência de trabalho suplementar, mas também para provar a existência das pausas alegadas pela Recorrida.
59. Mas que, posteriormente, em relação aos anos de 1997 a 2013, quando vigorou precisamente o mesmo mapa de horário de trabalho, o Tribunal a quo considera que aquele mesmíssimo mapa de horário de trabalho já não pode ser documento idóneo para prova da existência de créditos decorrentes de trabalho suplementar.
60. O Tribunal a quo aplica de forma grosseira dois pesos e duas medidas para considerar o mesmo documento como idóneo ou não idóneo, conforme a sua conveniência.
61. O registo de tempos de trabalho não é documento idóneo para a prova da existência de créditos decorrentes da prestação de trabalho suplementar há mais de 5 anos, pois este não reunir as características acima referidas.
62. Tendo ficado demonstrado a existência de factos constitutivos do crédito da Recorrente desde 1997, através de documento idóneo (mapa de horário de trabalho), e não tendo sido possível ao Tribunal a quo, com os meios e elementos que tinha ao seu dispor no processo, fixar o montante concreto da condenação, então tinha, em estrito cumprimento do n.º 2 do artigo 609.º do Código de Processo Civil, de ter condenado a Recorrida em montante a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.
63. Neste sentido, veja-se o sumário do Douto Aresto proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, datado de 30.03.2017

“I. O disposto no artigo 609º, n.º 2, do Código de Processo Civil, tanto se aplica ao caso de se ter formulado, inicialmente, pedido genérico, como ao de se ter formulado pedido específico, não se tendo, porém, chegado a coligir dados suficientes para se fixar, com segurança e precisão, o objecto ou a quantidade da condenação.
II. De harmonia com o estabelecido nos artigos 609º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e 565.º do Código Civil, se o tribunal verificar a existência de um crédito, mas não tiver elementos para fixar o seu montante exato, quer se tenha pedido uma quantia certa ou formulado um pedido genérico, pode e deve relegar-se a fixação desse montante para incidente de liquidação, podendo, no entanto, e desde logo fixar a parte que considera provada.
III. Provado que o trabalhador prestou trabalho suplementar, mas fracassando a prova do número exato de horas em que trabalhou para além do período normal de trabalho e durante o período do almoço, o apuramento dos valores devidos deve ser relegado para posterior liquidação, ao abrigo do n.º 2 do artigo 609º do Código de Processo Civil.”

No mesmo sentido, vejam-se:

a. Acórdão proferido pelo TRE, datado de 12.07.2016;
b. Acórdão proferido pelo TRP, datado de 16.04.2012;
c. Acórdão do TRE, datado de 20.12.2012;
d. Acórdão do TRP, datado de 15.11.2010”

Conclui a Recorrente/Apelante pela revogação da sentença, sendo substituída por outra que condene a Recorrida ao pagamento do trabalho suplementar prestado pela Recorrente desde 02.12.1997, remetendo a parte não líquida da condenação para incidente de liquidação, com as legais consequências.

A Ré/Apelada apresentou contra alegação concluindo que a sentença para além de fazer correcta interpretação e aplicação da lei, é uma decisão profundamente justa não merecendo os reparos reclamados pela Recorrente, razão pela qual deve ser mantida.
Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida e efeito devolutivo, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Realizado o exame preliminar foi dado cumprimento ao disposto no artigo 87º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer, no sentido da improcedência do recurso.
Não houve qualquer resposta ao parecer.
Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II – OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da Recorrente (artigos 635.º, nº 4, 637.º n.º 2 e 639.º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87.º n.º 1 do CPT), as questões trazidas à apreciação deste Tribunal da Relação são as seguintes:

- Impugnação da matéria de facto;
- Impugnação de direito

Da retribuição devida pelo trabalho suplementar.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Resultam provados os seguintes factos:

1) A autora intentou acção contra a ré que correu termos neste juízo, sob o n.º 8512/17.0T8VNF, na qual a autora pediu que fosse reconhecida a justa causa da resolução do contrato de trabalho também objecto destes autos, reclamando ainda créditos laborais emergentes da cessação e da vigência do contrato, processo no qual foi proferida sentença ainda não transitada em julgado, no qual foi dado como provado, com fundamento do acordo das partes nos articulados que:

A) A ré dedica-se à actividade de indústria de tecelagem (fabrico de malha) e confecção de vestuário interior.
B) Em Fevereiro de 1986 a autora e a ré celebraram um contrato, através do qual a autora obrigou-se a prestar actividade à ré com regularidade, sob autoridade e direcção desta e mediante retribuição.
2) A autora exerceu as funções de “revista”, “ajudante de bordadeira” e, mais tarde, de “bordadeira”.
3) A autora auferia o salário mínimo nacional, fixado no último ano da prestação de trabalho em 557€ (quinhentos e cinquenta e sete euros), acrescido de subsídio de alimentação.
4) Por carta datada de 15/05/2017, a autora comunicou à ré a resolução com justa causa do contrato de trabalho, nos termos do art. 394º do Código do Trabalho.
5) Durante a vigência do contrato de trabalho, a autora por imposição da ré trabalhava no seguinte horário:

- de segunda a quinta das 8h00 às 17h30, com 3 intervalos para descanso;
- à sexta das 8h00 às 16h30, sempre com 2 intervalos para descanso.
6) De segunda a quinta, a autora gozava, tal como as restantes trabalhadoras, de dois períodos de intervalo mais curtos, sendo um de manhã, de 10 minutos e um outro período de intervalo da parte da tarde, também de 10 minutos.
7) Para além desses períodos de descanso/intervalo, tinha a autora um intervalo para almoço, das 12.00 horas às 13.00 horas.
8) À sexta-feira a autora gozava um período de descanso e pausa da parte da manhã de 10 minutos e a pausa para almoço das 12h às 13h.
9) Nos aludidos descansos de almoço e de 10 minutos não eram dadas instruções pela ré à autora para que permanecesse no local de trabalho, ou para que se mantivesse à disposição da empresa, durante esse período de pausa e descanso.
10) As máquinas industriais em que a autora laborava, tal como acontecia com as demais trabalhadoras, eram desligadas durante esses mesmos períodos de pausa e descanso e toda a unidade industrial paralisava.
11) A autora, tal como as demais trabalhadoras, durante esses 10 minutos desligava a máquina que lhe estava atribuída, saía do seu posto de trabalho e saía do salão industrial em que tinha lugar a laboração, para o exterior da unidade fabril ou para a sala em que tomavam as refeições.
12) Somente regressando ao local e posto de trabalho quando a campainha que “contava” os 10 minutos de pausa e descanso tocava, chamando a autora e as demais trabalhadoras para o reinício da laboração industrial.
13) Foi pela autora prestado trabalho nos moldes descritos em 5) a 8) em cada um dos seguintes dias:

ANO 2013
Janeiro, nos dias 2; 3; 7; 8; 9; 10; 15; 16; 17; 21; 22; 23; 24; 28; 29; 30; 31;
Fevereiro, nos dias 4; 5; 6; 7; 13; 18; 19; 20; 21; 25; 26; 27; 28
Março, nos dias 4; 5; 6; 12; 13; 14; 18; 19; 20; 21; 25; 26; 27; 28
Abril, nos dias 2; 3; 4; 8; 9; 10; 11; 15; 16; 17; 22; 23; 24; 29; 30;
Maio, nos dias 2; 6; 7; 8; 13; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30;
Junho, nos dias 3; 4; 5; 11; 12; 17; 18; 19; 20; 24; 25; 26; 27;
Julho, nos dias 1; 2; 3; 4; 9; 10; 11; 15; 16; 17; 18; 22; 23; 24; 25; 29; 30; 31;
Agosto, nos dias 1; 4; 5; 6; 7 (a autora elencou a sequência dos dias 5; 6; 7; 8, mas por manifesto lapso de escrita, o que resulta claro do confronto entre a alegação que os 30 minutos a mais aconteciam de 2ª a 5ª feira com o registo do trabalho prestado pela autora junto pela ré, lapso que aqui se corrige ao princípio da descoberta da verdade material);
Setembro, nos dias 2; 3; 4; 5; 9; 10; 11; 12; 16; 17; 18; 19; 23; 24; 25; 26; 30
Outubro, nos dias 1; 2; 3; 7; 8; 9; 10; 14; 15; 16; 17; 21; 22; 23; 24; 28; 29; 30; 31;
Novembro, nos dias 4; 5; 6; 7; 11; 12; 13; 14; 18; 19; 20: 21; 25; 26; 27; 28;
Dezembro, nos dias 2; 3; 4; 10; 11; 12; 16; 17; 18; 19;

ANO 2014
Janeiro, nos dias 2; 6; 7; 8; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30
Fevereiro, nos dias 3; 4; 5; 6; 10; 12; 13; 17; 18; 19; 20; 24; 25; 26; 27;
Março, nos 3; 5; 6; 10; 11; 12; 17; 18; 19; 20; 24; 25; 26; 27; 31;
Abril, nos dias 1; 2; 3; 8; 9; 10; 14; 15; 16; 17; 22; 23; 24; 28; 29; 30
Maio, nos dias 5; 6; 7; 8; 12; 13; 14; 15; 19; 20; 21; 22; 26; 27; 28; 29
Junho, nos dias 2; 3; 4; 9; 11; 12; 16; 18; 19; 23; 24; 25; 26
Julho, nos dias 1; 2; 3; 7; 8; 9; 14; 15; 16; 17; 21; 22; 23; 24; 28; 29; 30; 31;
Agosto, nos dias 4; 5; 6; 7;
Setembro, nos dias 1; 2; 3; 4; 8; 9; 10; 11; 15; 16; 17; 18; 23; 24; 25; 29; 30;
Outubro, nos dias 1; 2; 6; 7; 8; 9; 13; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30;
Novembro, nos dias 3; 4; 5; 6; 10; 11; 12; 17; 18; 19; 20; 24; 25; 26; 27;
Dezembro, nos dias 2; 3; 4; 9; 10; 15; 16; 17; 18;

ANO 2015
Janeiro, nos dias 5; 6; 7; 8; 12; 14; 15; 19; 20; 21; 22; 26; 27; 28; 29;
Fevereiro, nos dias 2; 3; 4; 9; 10; 12; 18; 19; 23; 24; 25; 26;
Março, nos dias 2; 3; 4; 5; 9; 10; 11; 12; 17; 18; 19; 23; 24; 25; 26; 30; 31;
Abril, nos dias 1; 2; 7; 8; 9; 13; 14; 15; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30;
Maio, nos dias 4; 6; 7; 14; 18; 19; 20; 21; 25; 26; 27; 28
Junho, nos dias 1; 2; 3; 4; 8; 9; 11;15; 16; 17; 30;
Julho, nos dias 1; 2; 6; 7; 8; 9; 13; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30;
Agosto, nos dias 3; 4; 5; 6;
Setembro, nos dias 2; 3; 7; 8; 9; 10; 14; 15; 16; 21; 22; 23; 24; 29; 30;
Outubro, nos dias 5; 6; 7; 8; 12; 13; 14; 15; 19; 20; 21; 22; 26; 27; 28;
Novembro, nos dias 2; 3; 4; 5; 9; 10; 11; 12; 16; 17; 18; 19; 23; 24; 26;
Dezembro, no dia 1; 2; 3; 7; 9; 10; 14; 15; 16; 17;

ANO 2016
Janeiro, nos dias 4; 5; 6; 7; 11; 12; 13; 14; 18; 19; 20; 21; 25; 26; 27; 28;
Fevereiro, nos dias 1; 3; 4; 10; 11; 15; 16; 17; 18; 22; 23; 24; 25; 29;
Março, nos dias 1; 2; 3; 7; 8; 9; 10; 14; 15; 16; 17; 22; 23; 29; 30; 31;
Abril, nos dias 4; 5; 6; 7; 11; 12; 13; 14; 18; 19; 20; 21; 26; 27; 28;
Maio, nos dias 3; 4; 5; 9; 10; 11; 12; 16; 17; 18; 19; 24; 25; 30; 31;
Junho, nos dias 1; 2; 6; 7; 8; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 28; 29; 30;
Julho, nos dias 4; 5; 6; 7; 11; 12; 13; 18; 19; 20; 21; 25; 26; 27; 28
Agosto, nos dias 1;2; 3; 4; 8; 9; 10; 11;
Setembro, nos dias 5; 6; 7; 8; 12; 13; 14; 19; 20; 21; 22; 26; 27; 28; 29;
Outubro, nos dias 3; 4; 6; 10; 11; 12; 13; 17; 18; 19; 20; 24; 25; 26; 27; 31;
Novembro, nos dias 2; 3; 7; 8; 9; 10;14; 15; 16; 17; 21; 22; 23; 24; 28; 29; 30;
Dezembro, nos dias 5; 6; 7; 12; 13; 14; 15; 19; 20; 21; 22;

ANO 2017
Janeiro, nos dias 2; 3; 4; 5; 9; 10; 11; 12; 16; 18; 19; 23; 24; 25; 26; 30; 31;
Fevereiro, nos dias 1; 2; 6; 7; 8; 9; 13; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23;
Março, nos dias 1; 2; 6; 7; 8; 9; 13; 14; 15; 16; 20; 21; 22; 23; 27; 29; 30;
Abril, nos dias 3; 4; 5; 6; 10; 11; 12; 13; 18; 19; 20; 26; 27;
Maio, nos dias 3; 4; 8; 10; 11.
Mais se provou (factos que, apesar de não alegados, aqui se aditam ao abrigo do desposto no artigo 72.º do CPT):
14) A autora não é filiada em sindicato, nem a ré associada em associação patronal.

IV - APRECIAÇÃO DO RECURSO

1. Da impugnação da matéria de facto

Dispõe o artigo 662.º n.º 1 do C.P.C. aplicável por força do disposto no n.º 1 do artigo 87º do C.P.T. e no que aqui nos interessa, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Acresce dizer que resulta do prescrito no art.º 640.º do CPC. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto” que quando se impugne a decisão proferida quanto à matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, bem como, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Por fim, realçamos que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade do julgador ou da prova livre, consagrado no artigo no n.º 5 do artigo 607.º do CPC., segundo o qual tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha formado acerca de cada um dos factos controvertidos, salvo se a lei exigir para a prova de determinado facto formalidade especial.

Sobre a reapreciação da prova impõe-se toda a cautela para não desvirtuar o princípio da livre apreciação da prova testemunhal, consagrado no art.º 396.º do C.C., e os princípios da oralidade e da imediação, sem esquecer que não está em causa proceder-se a novo julgamento, mas apenas examinar a decisão da primeira instância e respectivos fundamentos, analisar as provas gravadas e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos, a fim de averiguar se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido quanto aos concretos pontos impugnados, impõe decisão diversa.

Cumprido pela Recorrente o ónus de impugnação cumpre apreciar

A Recorrente nos pontos 7) a 14) das suas conclusões sustenta que a decisão proferida pela 1ª instância quanto à matéria de facto revela-se de incorrecta, devendo proceder-se à alteração dos pontos de facto dados como provados sob os n.ºs 5 a 8 e 10, os quais devem ter uma outra redacção, fundamentado a sua pretensão na conjugação da confissão da legal representante da Ré, com a confissão da autora e com os documentos juntos aos autos, designadamente o correspondente ao mapa de horário de trabalho.

A Recorrente pretende que se altere a redacção dos referidos pontos de facto dados como provados fazendo deles constar o seguinte:

Pontos 5 a 8 A Autora por imposição da Ré trabalhava sempre das 8h00 às 17h30 de segunda a quinta e à sexta das 8h00 às 16h30, sendo que de segunda a sexta-feira tinha uma pausa de 10m na parte da manhã e uma pausa de 10m da parte da tarde, à sexta-feira, tinha apenas uma pausa de 10m na parte da manhã.
O horário de trabalho implementado na empresa Ré, pelo menos desde 02.12.1997 (data do documento denominado “Horário de Trabalho”, e imposto aos trabalhadores, incluindo-se aqui a Autora, era o seguinte:
De segunda a quinta-feira:
Entrada: 8h00
Descanso intermédio: 12h00 às 13h00
Saída: 17h30
Pausa: 10h00 às 10h10 e 16h00 às 16h10
Sexta-feira:
Entrada: 8h00
Descanso intermedio: 12h00 às 13h00
Saída: 16h30
Pausa: 10h00 às 16h00

Ponto 10 : As máquinas industriais em que a Autora laborava, tal como acontecia com as demais trabalhadoras, eram desligadas durante o intervalo para almoço, sendo que, também, eram desligadas por ordem da Ré sempre que, por qualquer motivo, as trabalhadoras tivessem de se afastar, ainda que momentaneamente das máquinas onde trabalhavam para ir ao quarto de banho ou para se deslocar a outro ponto, sendo que, por esse motivo, as mesmas também eram desligadas durante as pausas.”

Para dar como provados os pontos de facto 5 a 8, que respeitam ao horário cumprido pela autora o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção na confissão das partes efectuada em audiência de julgamento e para dar como provado o ponto de facto 10 o tribunal a quo fundamenou a sua convicção na confissão da autora efectuada em audiência de julgamento, tal como resulta da assentada que consta da acta de audiência de julgamento do dia 23/10 e que não foi objecto de qualquer reclamação.

Assim, para além de a Autora ter confessado os factos alegados nos artigos 7.º 9.º a 11.º, 16.º parcialmente, 17º a 20º da contestação cujo conteúdo corresponde precisamente aos pontos de facto dados como provados, não vislumbramos que tenha sido cometido qualquer erro pelo tribunal a quo que impusesse alteração na sua redacção, designadamente nos termos pretendidos pela Recorrente, que aliás, nem sequer tem qualquer suporte ou correspondência com os factos articulados pelas partes. Acresce dizer que a factualidade provada não permite de forma alguma retirar a conclusão ou criar a ideia que a empresa “encerrava” totalmente durante as pausas de 10 minutos que ocorriam uma a duas vezes por dia, pois o facto de as máquinas estarem desligadas e da produção estar paralisada, por algum tempo, de alguma forma insignificante, não permite concluir que a empresa estivesse encerrada durante esses períodos.
É assim de manter a redacção dos pontos de facto dados como provados sob os n.ºs 5 a 8 e 10, improcedendo nesta parte a douta impugnação.

Pretende ainda a Recorrente que se adite à matéria de facto provada um novo facto com a seguinte redacção:

“A Autora, assim como as demais trabalhadoras, durante os períodos de pausas de 10 minutos, não registavam a sua saída e entrada ao serviço na máquina de ponto, sendo que permaneciam disponíveis para, se necessário, prestar trabalho quando solicitado pela Recorrente.”

Defende que tal facto resultou comprovado dos depoimentos esclarecedores e claros prestados pelas testemunhas M. V., Maria e L. S..

Ora, o novo facto que se pretende aditar implicaria a ampliação da matéria de facto com factos que não foram alegados nos respectivos articulados, já que o facto que se pretende agora aditar não se encontra articulado por qualquer uma das partes.

Dispõe o art. 72.º do CPT, sob a epígrafe, “Discussão e julgamento da matéria de facto” o seguinte:

1 - Se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, desde que sobre eles tenha incidido discussão.
2 - Se for ampliada a base instrutória nos termos do número anterior, podem as partes indicar as respetivas provas, respeitando os limites estabelecidos para a prova testemunhal; as provas são requeridas imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prazo de cinco dias.
3 - Abertos os debates, é dada a palavra, por uma só vez e por tempo não excedente a uma hora, primeiro ao advogado do autor e depois ao advogado do réu, para fazerem as suas alegações, tanto sobre a matéria de facto como sobre a matéria de direito.
4 - Findos os debates, pode ainda o tribunal ampliar a matéria de facto, desde que tenha sido articulada, resulte da discussão e seja relevante para a boa decisão da causa.
5 - Os juízes sociais intervêm na decisão da matéria de facto votando em primeiro lugar, segundo a ordem estabelecida pelo presidente do tribunal, seguindo-se os juízes do coletivo por ordem crescente de antiguidade, mas sendo o presidente o último a votar.
6 - O tribunal pode, em qualquer altura, antes dos debates, durante eles ou depois de findos, ouvir o técnico designado nos termos do artigo 649.º do Código de Processo Civil.”.

Sendo, embora, verdade, que o art.º 72.º do CPT permite ao tribunal uma maior amplitude na aquisição factual, também é verdade, que tal aquisição obedece a um procedimento que passa pela enunciação dos factos e submissão a prova contraditória.

Assim, o mecanismo previsto neste artigo está, em princípio, previsto para a audiência de discussão e julgamento, no momento da decisão da matéria de facto.

Decorre desta norma a faculdade que o juiz tem de ordenar a reabertura da audiência a fim produzir nova prova, sempre que o julgue necessário ao cabal esclarecimento dos factos.

Contudo, apesar de tal poder caber ao juiz, nada obsta que as próprias partes requeiram ao Tribunal, quando se apercebam de que da produção de prova resultaram factos provados, que não obstante não terem sido expressamente alegados são relevantes para a boa decisão da causa, desde que se contenham nos limites da causa de pedir da parte.

No caso dos autos, não resulta quer dos articulados/requerimentos apresentados pelas partes, nem da própria ata da audiência de discussão e julgamento que a Recorrente/Apelante tenha requerido tal exercício por parte do Tribunal de primeira instância.

Importa realçar que o exercício dos poderes-deveres contidos no art.º 72.º, n.º 1 do CPT, está circunscrito à 1.ª instância, sendo que à Relação apenas é consentida a reapreciação dos meios de prova que conduziram à prova ou não prova dos factos sobre os quais incida o recurso da matéria de facto ou ordenar a ampliação da matéria de facto quando repute serem essenciais factos para a decisão que não mereceram da 1.ª instância qualquer pronúncia, mas que estejam alegados.

Os poderes do Tribunal da Relação estão, neste âmbito, concreta e claramente delimitados pelo n.º 1 do art.º 662.º do CPC: a decisão sobre a matéria de facto só deve ser alterada se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, o que significa que a decisão a alterar há-de respeitar a factos adquiridos – no sentido de provados/não provados ou alegados – e não a outros que sejam percepcionados no decurso da audição dos registos da prova.

Em suma, não tendo o tribunal da 1.ª instância feito uso do poder-dever previsto no art.º 72.º do CPT, no que respeita a estes novos factos, até ao momento do encerramento da discussão em 1.ª instância, como não o fez no caso dos autos, o Tribunal da Relação, em recurso da sentença final, também não pode determinar a anulação do julgamento a fim de ser ampliada a matéria de facto a tais factos não articulados, (mesmo que a prova tenha sido gravada), tal resultando do disposto no n.º 4 do transcrito artigo 72.º do CPT, tal como não pode pronunciar-se sobre os mesmos, como se eles tivessem sido alegados pelas partes.

Tenha-se presente que nem Autora, nem a Ré empregadora alegaram que “A Autora, assim como as demais trabalhadoras, durante os períodos de pausas de 10 minutos, não registavam a sua saída e entrada ao serviço na máquina de ponto, sendo que permaneciam disponíveis para, se necessário, prestar trabalho quando solicitado pela Recorrente.”

Como se escreve no acórdão do STJ de 2 de abril de 2014, proferido no Proc. n.º 612/09.7 TTST.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt

“Resulta do artigo 27.º, alínea b), do Código de Processo de Trabalho, sob a epígrafe «poderes do juiz» que o juiz deve «até à audiência de discussão e julgamento», «b) convidar as partes a completar e a corrigir os articulados, quando no decurso do processo reconheça que deixaram de ser articulados factos que podem interessar à decisão da causa, sem prejuízo de tais factos ficarem sujeitos às regras gerais sobre contraditoriedade e prova».

Por seu turno, decorre do n.º 1 do artigo 72.º do mesmo código, que «se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, desde que sobre eles tenha incidido discussão» e do n.º 2 do mesmo artigo resulta que «se for ampliada a base instrutória nos termos do número anterior, podem as partes indicar as respetivas provas, respeitando os limites estabelecidos para a prova testemunhal; as provas são requeridas imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prazo de cinco dias».

Finalmente decorre do n.º 4 do mesmo artigo que «findos os debates, pode ainda o tribunal ampliar a matéria de facto, desde que tenha sido articulada, resulte da discussão e seja relevante para a boa decisão da causa».

Lidos estes dispositivos, emerge dos mesmos um complexo de poderes relativos à matéria de facto atribuídos à iniciativa do Tribunal, mas que nada impede que sejam exercidos a requerimento das partes, e que configura uma situação que ultrapassa o regime do processo civil decorrente do n.º 2 do artigo 264.º do CPC, e que é motivada pelas preocupações da natureza pública e de busca da verdade material que estão subjacentes à aplicação do Direito do Trabalho.

Mau grado seja legítimo o conhecimento de factos não articulados pelas partes e que chegam ao conhecimento do Tribunal, nomeadamente, no contexto da audiência, essa oportunidade de conhecimento não legitima, sem mais, a possibilidade de utilização desses factos como base na decisão a proferir, impondo-se a sujeição dos mesmos às exigências de contraditório estabelecidas, única forma de evitar atropelos relativamente à normalidade da gestão do processo, principalmente aos direitos das partes.

O regime previsto aponta para a oficiosidade da intervenção do Tribunal relativamente a esses factos, mas isso não impede, aliás tudo aconselha a que as partes, no contexto da audiência, suscitem o aditamento dos mesmos à Base Instrutória e o estabelecimento do contraditório que permita a respetiva utilização como suporte da decisão a proferir.

No caso dos autos, nada foi requerido no contexto da audiência, vindo os Autores suscitar a questão da ampliação da matéria de facto em sede de alegações de recurso para o Tribunal da Relação, o que manifestamente atropela os princípios relativos à gestão do processo.

Com efeito, mau grado o CPT preveja essa intervenção oficiosa não estabelece qualquer disciplina que ultrapasse os quadros que emergem do processo civil e se sobreponha aos mesmos, pelo que aquela disciplina terá de ser articulada com o regime geral que resulta do Código de Processo Civil.

Não é, pois, possível tratar a omissão de intervenção sobre a factualidade relevante na perspectiva das partes, prevista no artigo 72.º do CPT, como se a mesma tivesse sido alegada nos articulados respectivos pelas partes, o que poderia viabilizar o recurso ao disposto no n.º 3 do artigo 729.º do Código de Processo Civil.

Na verdade, não se mostram preenchidos os requisitos definidos no artigo 729.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, para ampliação da matéria de facto dada como provada «em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito».

Com efeito, nos termos daquele dispositivo e do n.º 1 do artigo 730.º do Código de Processo Civil, o Supremo pode mandar «julgar novamente a causa», quando «entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito».

Porém, conforme se vem entendendo uniformemente, a faculdade concedida a este Supremo Tribunal de ordenar a ampliação da matéria de facto, só pode ser exercida no respeitante a factos articulados pelas partes ou de conhecimento oficioso, em consonância com o prevenido no artigo 264.º do Código de Processo Civil.

Acresce que apesar da oficiosidade do exercício dos poderes previstos no artigo 72.º, tais poderes nada têm a ver com os factos de conhecimento oficioso previstos no n.º 2 do referido artigo 264.º do Código de Processo Civil.

Tenha-se ainda presente a disciplina que emerge do artigo 511.º do Código de Processo Civil relativamente à inclusão de factos na BI, necessariamente articulados pelas partes, a necessidade de reclamação relativamente à não inclusão e a forma de impugnação das decisões que recaiam sobre essas reclamações.”

Concluindo, não é admissível aditar aos factos provados quaisquer outros factos que não tenham sido alegados pelas partes, caso não tenha sido observado o procedimento previsto no artigo 72.º do CPT., razão pela qual improcedem as conclusões 15 a 28 do recurso.

Insurge-se ainda a recorrente quanto ao facto do tribunal a quo não ter considerado o Mapa de Horário de Trabalho do qual constam as horas de entrada, intervalos e saída, como documento idóneo para a prova da existência do crédito decorrente da prestação de trabalho suplementar vencido há mais de cinco anos.

Estabelece n.º 2 do art.º 337.º do Código do Trabalho que “o crédito correspondente a compensação por violação de direito a férias, indemnização por aplicação de sanção abusiva ou pagamento de trabalho suplementar, vencido há mais de cinco anos, só pode ser provado por documento idóneo.”

A este propósito o tribunal a quo na motivação da matéria de facto consignou o seguinte:

No que respeita ao ponto b), prescreve o artigo 377.º, n.º 2 do C. Trabalho um regime de prova específico dos créditos vencidos há mais de 5 anos, que só poderão ser provados por documento idóneo.

Como é entendimento sedimentado da jurisprudência (ver, por todos, os Acórdãos do STJ de 16/11/2011 e da RP de 10/02/2014, disponíveis em www.dgsi.pt) este “documento idóneo” é um “documento escrito, emanado da própria entidade empregadora e que, por si só, tenha força probatória bastante para demonstrar a existência dos factos constitutivos do crédito, sem recurso a outros meios de prova, designadamente prova testemunhal”.

A acção deu entrada em juízo em 11/05/18, tendo a autora, com vista a comprovar o trabalho realizado requerido que a ré juntasse os registos de ponto desde o início do contrato.

A ré juntou os registos desde Janeiro de 2013 configurando os mesmos documento idóneo – porque emanados pela própria ré – para provar o trabalho prestado no período anterior a 11/05/13 (de Janeiro àquela data).

Já quanto ao período anterior não foi junto qualquer documento que comprovasse o trabalho prestado.

Uma palavra apenas para esclarecer que naturalmente a prova a que alude o artigo 377.º, n.º 2 do C. Trabalho pode ser feita por confissão da empregadora.

Porém, apesar de a ré ter confessado que a autora sempre fez o horário por esta invocado, não confessou (nem nos articulados, nem no depoimento de parte prestado, que nem sequer teve por objecto o artigo 22º da petição inicial, por não ter sido requerido) que a autora nos dias concretos que alega tenha trabalhado.

É que estamos perante alegações diferentes. Uma coisa é o facto de a autora ter feito sempre um determinado horário e outra é o ter trabalhado em dias concretos naquele horário.

Assim, não tendo sido junto “documento idóneo” ou confessada tal matéria, não deu o tribunal como provada a prestação de trabalho por parte da autora no período que antecede o mês de Janeiro de 2013.”

Desde já diremos que se concorda com a posição assumida pelo tribunal a quo, uma vez que nem o Mapa de Horário de Trabalho do qual constam as horas de entrada, intervalos e saída não constitui documento idóneo para prova do crédito vencido há mais de 5 anos pela prestação de trabalho suplementar, nem a confissão da legal representante da ré no que respeita ao facto da autora ter prestado o horário que consta do mapa nos permite concluir pela confissão da existência do crédito vencido há mais de 5 anos referente à prestação de trabalho suplementar.

Na verdade, o n.º 2 do art.º 337.º do CT consagra uma norma de direito material probatório, cuja razão radica no facto dos créditos emergentes da relação laboral, independentemente da sua antiguidade, poderem ser exigidos até um ano depois de cessada a relação contratual (cfr. n.º 1 do art. 337.º do CT).Trata-se de um regime especial que consagra a imprescritibilidade dos créditos durante a vigência do contrato, daí o estabelecer-se um regime probatório especial, em relação aos créditos por trabalho suplementar vencidos há mais de cinco anos relativamente ao momento em que foram reclamados, através de “documento idóneo”.

Como se escreve a este propósito no Ac. do STJ de 1-06-2011, proc. n.º 1001/05.0TTLRS.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt. «a exigência de prova especial justifica-se pela circunstância de a obrigação de indemnização poder gerar-se em épocas recuadas, pretendendo o legislador, assim, acautelar a posição do empregador quanto a débitos vencidos há já bastante tempo e relativamente aos quais poderia ser difícil a prova de que os mesmos haviam sido satisfeitos, pois o decurso do tempo vai diluindo as provas ou pelo menos dificultando a produção das mesmas conducentes à formação de uma convicção segura».

Em rigor o que está em causa no n.º 2 do art.º 337.º do CT é o estabelecimento de meios de prova específicos, quanto à matéria nele referido e no que à fixação da matéria de facto respeita, na medida em que o tribunal só pode dar como provados factos inerentes, além do mais, ao trabalho suplementar vencido há mais de 5 anos sobre a propositura da ação se dispuser de documento idóneo para tal, o que tem sido entendido como documento escrito, com origem na própria entidade empregadora, que demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito e que seja suficientemente elucidativo, de molde e dispensar a sua integração ou dilucidação através de outros meios de probatórios, designadamente testemunhas. Neste sentido, ver entre outros, o Acórdão do STJ de 19-12-2007, Recurso n.º 3788/07 - 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.

No seguimento deste entendimento, diremos que o crédito correspondente ao trabalho suplementar vencido há mais de cinco anos só pode ser provado por documento idóneo, nos termos do art. 337.º nº2 do Código do Trabalho, sendo certo que relativamente ao trabalho suplementar alegadamente prestado pela Autora em data anterior a 2013 não foi junto aos autos qualquer documento idóneo que demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito correspondente a trabalho suplementar prestado, sem recurso a outros meios de prova, tal como impõe o citado artigo.

Aliás do mapa do horário de trabalho desacompanhado de qualquer outra prova, apenas se retira ser esse o horário praticado na empresa, e tal é insuficiente para se concluir quer pela realização de trabalho fora do horário de trabalho, quer pela existência de qualquer crédito resultante da prestação de tal trabalho. Anote-se ainda que a prova do trabalho suplementar prestado pela autora referente os anos 2013 a 2017, também não resultou apenas do referido mapa, mas sim de outros documentos juntos pela Ré, designadamente dos registos electrónicos de presença da autora, os quais esses sim permitem concluir que naqueles dias concretos a autora prestou trabalho no horário estipulado e que foi dado como provado.

Tal é suficiente para concluir que no período de tempo compreendido entre 1996 e o final de 2012 não ficou demonstrada a existência do crédito referente a trabalho suplementar, nada havendo assim para relegar em sede de liquidação.

Salientamos que não se pode condenar a Recorrida no que se liquidar em execução de sentença a título de trabalho suplementar uma vez que esta condenação prevista no art.º 609.º, n.º 2 do CPC. pressupõe a demonstração da obrigação do condenado, embora não fixado o objecto ou a quantidade dela. Ora, não estando demonstrada a efectiva prestação de trabalho suplementar pela Recorrente naquele período de tempo, não podemos afirmar sequer que a obrigação existe.

Por fim, no que respeita ao depoimento prestado pela legal representante da Ré não se vislumbra que do mesmo possa resultar confessado o suposto trabalho suplementar prestado em data anterior ao ano de 2013, pois tal como entendeu o tribunal a quo a Ré não confessou que a autora nos dias concretos que alega tenha trabalhado, sendo distintos e não confundíveis o facto de a autora estar sujeita a determinado horário, bem o como o facto de ter trabalhado em dias concretos em cumprimento desse horário.

Em suma, não foi junto aos autos qualquer documento idóneo para prova do crédito correspondente ao trabalho suplementar vencido há mais de 5 anos, com excepção do período de Janeiro a Maio de 2013, em que foi junto o registo electrónico de presença da autora que conjugado com o horário que foi dado como provado permitiu ao tribunal a quo apurar o trabalho suplementar prestado nesse período, pelo que se impõe a manutenção da factualidade apurada, improcedendo assim a impugnação da matéria de facto.

2 – Da impugnação da decisão de direito

Da retribuição devida pelo trabalho suplementar

Mantendo-se a factualidade provada desde já diremos que é de confirmar a decisão recorrida no que respeita ao trabalho suplementar prestado e seu consequente pagamento, uma vez que para além do apurado pelo tribunal a quo, nenhum outro se apurou ter sido realizado pela Recorrente.

No entanto, apesar de se concordar com a posição assumida quanto a esta questão pelo tribunal a quo para a qual se remete e nos dispensamos de reproduzir, ainda assim importa referir o seguinte:

A recorrente insurge-se quanto ao facto do tribunal a quo não ter considerado como tempo de trabalho o segundo intervalo de 10 minutos gozado pela trabalhadora de segunda a quinta-feira, alegando que tratou de forma diferente aquilo que é idêntico, uma vez que as pausas em causa tinham as mesmas características, diferindo apenas no facto duma dessas pausas está garantida pela CCT aplicável como integrando o período normal de trabalho.

Ora, salvo o devido respeito por opinião em contrário à Recorrente não assiste razão, pois não fora a CTT aplicável (CCT entre a ANIVEC/APIV – Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confecção e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Têxteis, Lanifícios, Vestuário, Calçado e Peles de Portugal, publicada no BTE nº 21 de 8/06/2009) à relação contratual em causa, por força das Portarias de Extensão, publicadas no BTE nº 38 em 15/10/2009 e no BTE n.º 30 em 15/08/2015 e nenhuma das pausas em questão seria de considerar como tempo normal de trabalho.

Da factualidade apurada resulta suficientemente provado que quer na pausa para almoço, quer nas pausas para descanso, a autora não ficava disponível para prestar o seu trabalho em caso de necessidade, ao invés tal constituía um espaço de tempo da inteira e livre disponibilidade da trabalhadora, que interrompia a prestação de trabalho e só a retomava depois do intervalo, não existindo prestação de trabalho efectivo durante esse tempo (cfr. pontos 9 a 12 dos pontos de factos provados). Daí não ser de considerar de tempo de trabalho, em conformidade com o previsto no n.º 1 do art.º 197.º do CT.

Com é consabido os períodos de descanso/pausas correspondem, em princípio, a períodos de tempo em que o trabalhador não está vinculado à prestação de trabalho, sendo por isso livre de dispor do seu tempo, ainda que seja por curto período, não relevando assim para o cálculo do período normal de trabalho. Daí que resulte do n.º 1 do artigo 197.º do CT. que só se considera tempo de trabalho os períodos em que o trabalhador exerce a sua actividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como os intervalos e interrupções previstos no n.º 2 do citado artigo, no qual não se encontram abrangidas as interrupções para descanso que a autora usufruía diariamente.

Resumindo, mais não restava ao tribunal a quo do que tratar diferente, o que efectivamente é diferente, pois apesar das características das pausas em questão não estarem compreendidas no conceito de tempo de trabalho, o certo é que uma delas, independentemente das suas características, por força da regulamentação colectiva aplicável e independentemente da sua natureza tem de se considerar como incluída no período normal de trabalho, já que tal decorre da al. e) do n.º 1 da cláusula 24ª do citado CCT.

Como afirma o Exmo. Procurador Geral-Adjunto no douto parecer junto aos autos “a decisão de facto sustenta em absoluto a decisão de direito no sentido de considerar que a autora não tem direito a receber da Ré mais qualquer retribuição a título de trabalho suplementar do que aquela que lhe foi atribuída”, razão pela qual improcedem as restantes conclusões da apelação e consequentemente improcede o recurso.

V – DECISÃO

Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 87.º do C.P.T. e 663.º do CPC., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso de apelação interposto por A. P., confirmando-se na íntegra a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Guimarães, 10 de Julho de 2019

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Alda Martins