Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1403/09.0TBEPS.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: INVENTÁRIO
COMPOSIÇÃO DE QUINHÃO
DIREITO DE ESCOLHA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Requerida a composição dos quinhões, na sequência de licitação em excesso e/ou de doação inoficiosa, assiste ao licitante e ao donatário o direito de escolha dos bens que hão-de compor o seu quinhão.

II - Tal direito de escolha não é, porém, absoluto, posto que deverá adequar-se ao preenchimento do seu quinhão (a excedê-lo, terá de ser pelo menor valor possível), bem como ao quinhão do não licitante (de modo a que o credor de tornas não passe a devedor delas, nem o devedor de tornas passe a credor delas).

III – Tendo o interessado licitado em diversos bens, sendo que o valor de um só deles excede manifestamente o respetivo quinhão hereditário e o somatório dos demais fica aquém desse limite, é abusiva a escolha feita no sentido de lhe serem adjudicados todos os bens licitados, pois desse modo lograria frustrar ou impedir o direito que assiste aos interessados a quem hajam de caber tornas de optarem pela composição dos seus quinhões em bens pelo valor da licitação, até ao limite do seu quinhão (art. 1377º, n.º 2 do CPC).

IV – A avaliação de outros bens da herança, não doados ou legados, a requerimento do donatário ou legatário, sendo as liberalidades inoficiosas, pode ser requerida até ao exame do processo para a forma da partilha (art. 1367º, n.º 3 do CPC).
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

M. C. veio requerer a abertura de inventário judicial para partilha de herança aberta por óbito de seus pais, Maria e Manuel, falecidos em 15/07 e 26/11/2006, respectivamente.
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O processo prosseguiu os seus trâmites processuais, designadamente com as declarações da cabeça-de-casal e apresentação da respetiva relação de bens (cfr. fls. 41 a 44, 75, 152 e 153).
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Na conferência de interessados realizada a 3/10/2012, face à inexistência de acordo, a cabeça-de-casal M. A. requereu a licitação do imóvel doado e identificado a fls. 75 dos autos, o que mereceu oposição da donatária Maria C., pelo que foi determinada a avaliação do referido imóvel doado (cfr. fls. 154).
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A 8.07.2014, procedeu-se à realização da conferência de interessados (cfr. fls. 189 e 190), na qual se procedeu a licitações, as quais obtiveram o seguinte resultado:

Relação de bens de fls. 41 a 44:

Verbas nºs 1 a 5 (móveis) - não obtiveram licitação.
Verba nº 6 - foi licitada pela interessada C. C., pelo valor de 50.000,00€;
Verba nº7 - foi licitada pela interessada C. C., pelo valor de 20,00€;
Verbas nºs 8 a 11- não obtiveram licitação.
Verba nº 12 - foi licitada pela interessada C. C., pelo valor de 5,00€.
Verba nº 13 - não obteve licitação.
Verba nº14 - foi licitada pela interessada Maria C., pelo valor de 50,00€.
Verbas nºs 15 e 16 - não obtiveram licitação.
Verba nº 17 - foi licitada pela interessada C. C., pelo valor de 250,00€.
Verba nº 18 - foi licitada pela interessada Maria C., pelo valor de 20,00€.
Verba nº19 - não obteve licitação.
Verba nº 20 - foi licitada pela interessada Maria C., pelo valor de 150,00€.
Relação de bens de fls. 75 - bens doados à interessada Maria C., cuja avaliação se encontra a fls. 158 - 63.360,00€.
Relação de bens de fls. 152vº/153 - Verbas nºs 1 e 2 - bens doados à interessada A. C..
Quanto à verba nº 21 - do Passivo relacionada a fls. 44, pelos restantes interessados foi dito que não reconhecem nem aprovam o mesmo.
Quanto ao passivo relacionado, foram os interessados remetidos para os meios comuns a respeito.
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Dado, por lapso, não terem sido colocadas a licitação as verbas n.ºs 3 a 8 da relação adicional de 22/06/2012, a fls. 152 e 153, foi agendada nova conferência de interessados, realizada a 2/12/2014, na qual se procedeu a licitações, que não obtiveram qualquer lanço (cfr. fls. 196 e 197).
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Posteriormente, o Mmº juiz proferiu despacho quanto à forma à partilha, nos termos constantes de fls. 208 a 210.
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Face ao mapa informativo do qual resultava o excesso de quinhão das interessadas Maria C. e C. C., foi determinado o cumprimento do disposto no art. 1377.º, n.º 1 do C.P.C (cfr. fls. 211 e 212).
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Regularmente notificados, os interessados M. C. e M. A. vieram requerer a composição dos respectivos quinhões nos termos contantes de fls. 213 vº e 215 vº.
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Responderam as interessadas C. C. e Maria C. nos termos que constam de fls. 217 vº a 220 e 221 a 223.
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Por despacho datado de 14/09/2015, verificando-se que existia excesso de bens licitados pelas interessadas Maria C. e C. C. e que a doação feita àquela primeira interessada era inoficiosa, foi determinada a reformulação do mapa informativo para, além do mais, os herdeiros serem também notificados nos termos do art. 1376º, nº 2 do Código de Processo Civil, ou seja, para requererem a redução daquela doação nos termos da lei civil (cfr. fls. 224 e 225).
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A interessada M. A. requereu que a donatária procedesse à restituição do bem doado em excesso ao seu direito, com vista a não ofender a legítima da requerente (cfr. fls. 226 vº).
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Elaborado mapa informativo do qual resulta o excesso de bens doados e licitados por parte das interessadas Maria C. e C. C., foi determinado o cumprimento do disposto no art. 1376.º, n.º 2 do C.P.C (cfr. fls. 228 a 230).
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As interessadas M. A., Maria C. e C. C. renovaram os anteriores requerimentos (cfr. fls. 231 vº e 233 vº).
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Seguidamente, o Mmº juiz proferiu o despacho datado de 4/04/2017, cujo teor, na parte relevante, se reproduz (cfr. fls. 235 a 239):

«(…)
Caberá nesta sede, apenas, aferir se as interessadas devedoras de tornas, ao exercerem o direito de escolha que lhes confere o nº 3 do artigo 1373º do Código de Processo Civil, o fizeram com respeito pelas regras e princípios que acima se enunciaram.

Ora, a interessada C. C. veio no seu requerimento (no artigo 24º) escolher para preencher a sua quota as verbas 6, 7, 12 e 17 que licitou. E a interessada Maria C. veio no seu requerimento (no artigo 17º) escolher para preencher o seu quinhão as verbas nº 14, 18 e 20 que licitou, assim como o bem imóvel que lhe foi doado.

Como decorre do mapa informativo, o valor do quinhão da interessada Maria C. é de € 56.034,80. E o valor do quinhão da interessada C. C. é de 14.645,45.

No que tange à interessada Maria C., constata-se que o valor do bem que lhe foi doado (avaliado em € 63.360,00) – bem esse que necessariamente irá integrar o seu quinhão, ante o disposto na al. a) do artigo 1374º do Código de Processo Civil – é por si só suficiente para preencher a sua quota na herança, excedendo-a até e implicando mesmo que tenha de ser reduzida por inoficiosidade.

Donde resulta que àquela interessada não assiste o direito a escolher outros quaisquer bens, de entre os que licitou, para preencherem também o seu quinhão, podendo todos eles ser utilizados para compor os quinhões dos interessados que o requereram, ou seja, os bens das verbas nºs 14, 18 e 20.

No que respeita à interessada C. C., verifica-se que um único bem de entre os que arrematou – o da verba nº 6, pelo valor de € 50.000,00 – é suficiente, bem mais do que suficiente, para preencher por completo o seu quinhão. Pelo que também essa interessada não pode legitimamente pretender escolher, para além daquele, outros quaisquer bens para preencherem o seu quinhão, ficando assim livres para composição do quinhão dos interessados que o requereram todos os demais bens em que aquela licitou, ou seja, os das verbas nºs 7, 12 e 17.

Sendo estes (os das verbas nºs 7, 12, 14, 17, 18 e 20) os bens que, ao abrigo do disposto no artigo 1373º, nº 2 do Código de Processo Civil, os interessados M. C. e M. A. podem pretender que lhes sejam adjudicados para comporem os seus quinhões, cabe, na esteira do que acima se disse, dar-lhes a possibilidade de, por acordo, fazerem a repartição de tais bens.

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, indeferindo o mais requerido, determino que sejam os interessados M. C. e M. A. notificados para indicarem, por acordo, de entre as verbas nºs 7, 12, 14, 17, 18 e 20 quais aquelas que pretendem lhes sejam adjudicadas para comporem os seus quinhões, sendo que, em caso de desacordo, decidirá o tribunal nos termos do nº 4 do artigo 1377º do Código de Processo Civil.
(…)».
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Foi designada data para realização de sorteio quanto às verbas 12 e 17 (cfr. fls. 251).
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No dia agendado para a realização de sorteio a interessada e donatária Maria C. apresentou requerimento, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 1367º do Código Processo Civil, no qual requereu a avaliação dos outros bens da herança não doados, com exceção da verba 6 – prédio urbano que foi objeto de licitação –, mais requerendo que fosse dada sem efeito a referida conferência (cfr. fls. 252 v.º),
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Realizada a diligência de sorteio, o Mmº juiz “a quo” proferiu o seguinte despacho (cfr. fls. 254):

«Através de requerimento apresentado nesta data, veio a interessada Maria C. requerer que, com excepção da verba nº 6, sejam avaliados os demais bens relacionados.
A realização da avaliação no processo de inventário tem o seu momento próprio, ou seja, aquando da realização da conferência de interessados, por acordo dos herdeiros, conforme previsto no art. 1353º, nº2 do CPC aqui aplicável, ou então em acto prévio às licitações, conforme decorre nomeadamente dos arts. 1362º, nº 4, 1365º, 1366º e 1367º, do CPC.
Ora, neste processo aquela fase encontra-se já ultrapassada, sendo, como tal, extemporânea a pretensão agora manifestada pela requerente Maria C..
Por esse motivo vai a mesma indeferida».
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Posteriormente foi determinada a elaboração do mapa de partilha (cfr. fls. 276), o qual consta de fls. 279 e 280.
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Por sentença de 17/04/2018, veio a ser homologada a partilha constante do mapa de fls. 279 e 280.
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Inconformada com essa sentença homologatória, bem como do despacho de fls. 235 a 239, a interessada C. C. interpôs recurso (cfr. fls. 285 a 292) e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1. A decisão que constitui o teor do despacho de fls. 235 a 239, bem assim a sentença que homologou o mapa de partilha de fls. 279 a 283 violam, de forma, clara a letra e o espirito dos artigos 1374 e 1377 do CPC.
2. Em processo de inventário, no preenchimento dos quinhões dos interessados, por força do disposto no art. 1374º do CPC, observa-se a regra de que os bens licitados são adjudicados aos respectivos licitantes,
3. sendo atribuído aos não licitantes os bens livres da herança e que sejam da mesma espécie ou natureza.
4. No presente processo os bens não licitados permitem que a cada um dos interessados sejam adjudicados bens específicos da mesma espécie e natureza dos já licitados, em concreto as verbas que constituem os prédios rústicos descritos sob os nºs 8, 9, 10, 11, 13, 15, 16 19 da relação de bens fls. 41 a 44, cuja soma excede os valores das verbas nºs 12 e 17, licitadas pela recorrente.
5. Não sendo possível compor a totalidade dos quinhões com bens da mesma natureza e espécie, sendo manifestamente excessiva a diferença entre o valor do quinhão de cada interessado (€ 14.645,46) e o valor da soma dos prédios rústicos que compõem a herança, com a adjudicação das verbas licitadas à licitante (17 e 12 por esta ordem de preferência), e a adjudicação das verbas indicadas pelos não licitantes (8, 13, 16 e 19), respeita-se a vontade manifestada de forma livre na licitação, obtendo-se igual e justa partilha, através da atribuição de bens da mesma espécie e natureza a todos os interessados, com maior equilíbrio de lotes e evitando-se a excessiva atribuição de verbas a uns interessados,
6. sendo que ficam ainda livres para adjudicação, por não terem sido nem licitadas nem escolhidas por qualquer dos interessados as verbas nºs 9, 10, 11 e 15, nos valores de € 124,50, € 60,83, € 13,70 e € 41,40 (tendo as verbas 17 e 12 sido licitadas respetivamente por € 250,00 – relacionada por 124,09 – e € 5,00 – relacionada por € 3,32).
7. A composição de acordo com o exposto não repele as hipóteses do art. 1377º, o qual só por si afasta a possibilidade de imposição da composição de quinhões em regime de compropriedade de verbas, como aconteceu,
8. nenhum dos bens rústicos preenchendo integralmente os quinhões dos interessados ou sequer se aproximando do valor necessário ao preenchimento de cada um dos quinhões (€ 14.465,46).
9. De resto, das escolhas dos não licitantes em bens licitados pela recorrente (verbas 17 e 12), paralelamente com outros não licitados, quando existem bens igualmente não licitados de valores superiores (individual ou em conjunto) resulta manifesta e excessiva atribuição de verbas, que deverão ser rejeitadas com base no Abuso do Direito de Escolha e na prevalência do direito da licitante.
10. Apenas a verba nº 6, de diferente espécie e natureza (prédio urbano) relacionada sob o valor de € 32.770,00 e licitada pelo valor de € 50.000,00 assume efetiva relevância face ao montante das tornas e quinhões.
11. Estando em causa a licitação de mais do que uma verba, a natureza dos bens que as integram e a disparidade de valores torna sempre inviável para a interessada que licitasse o imóvel urbano, a licitação em mais do que as necessárias para preencher a sua quota, pelo que, a admitir-se a possibilidade da licitante ser privada de qualquer dos bens, equivale a admitir perversa situação de negar o direito de licitação a quem valorizou a herança.
12. De qualquer forma, in casu, atendendo aos valores atribuídos aos prédios e aos valores dos quinhões, nunca esteve em causa a necessidade de proteção dos interessados que tem menor capacidade económica ou a necessidade de apelo ao mecanismo do art. 1377º do CPC.
13. Não mostrando os não licitantes qualquer interesse em que lhes sejam adjudicados bens livres, quer sejam da mesma ou de espécie e / ou de natureza diferente, esses bens não licitados devem ser vendidos judicialmente e os quinhões dos interessados não licitantes compostos, ainda que parcialmente, em dinheiro, vindo a elaborar-se novo mapa de partilha,
14. Tanto mais quando decorra dos seus requerimentos a oposição à adjudicação de bens em propriedade.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUT[O] SUPRIMENTO DE V. EXªS deve julgar-se procedente a presente apelação, revogando-se o despacho de fls. 235 a 239 e tudo o demais subsequente, designadamente o mapa de partilha e a sentença homologatória da partilha, devendo elaborar-se novo mapa de partilha que adjudique as verbas licitadas à licitante e as verbas livres indicadas da mesma espécie e natureza aos interessados não licitantes, devendo as restantes verbas livres, sejam ou não da mesma espécie e natureza, ser vendidas judicialmente e os quinhões desses interessados não licitantes compostos, ainda que parcialmente em dinheiro, como é de
JUSTIÇA!!!»
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Também a interessada Maria C. apresentou recurso da sentença homologatória, bem como dos despachos de fls. 235 a 239 e 254 (este último que indeferiu o pedido de avaliação dos bens por parte da donatária), formulando as seguintes conclusões (que se transcrevem) - cfr. fls. 294 a 301:

«1. Não assiste a qualquer dos interessados não licitantes o direito de composição dos seus quinhões mediante adjudicação dos bens licitados pela donatária, quando não foi requerida, por qualquer dos notificados, que as verbas em excesso ou algumas lhes sejam adjudicadas pelo valor da licitação;
2. O artigo 1377º, nºs 2 e 3 do CPC apenas se refere à licitação excessiva em relação à quota de qualquer interessado, pelo que sendo a quota hereditária da donatária do montante de € 56.034,80 e a dos restantes interessados a € 14.645,46, é de concluir que as licitações operadas, no valor de € 220,00 não ultrapassaram aquela quota (da donatária);
3. Sendo a donatária também herdeira legitimária, deve ser dada preferência à interpretação do nº 3 do art. 2174 do C Civil, e, por consequência à vontade do doador, no sentido dos bens ingressarem no património dos donatários;
4. Sendo a donatária herdeira legitimária, a redução por inoficiosidade da doação deve ser paga em dinheiro;
5. De resto, atendendo ao valor das 3 verbas licitadas, no total de€ 220,00, das quais apenas uma foi objeto de escolha por parte de não licitante, não existe nem diferença excessiva nem excesso de licitações,
6. Pelo que é de manter a regra geral da atribuição segundo a licitação, prevista no art. 1374º, al. a) do CPC.
7. A existir excedente, que resulte não de excesso de bens licitados mas da doação, a donatária deverá repor o valor em tornas (dinheiro).
8. Excessivo e abusivo, por violação dos princípios da proporcionalidade e da justa divisão dos bens a partilhar é deferir a adjudicação de bens a partilhar ou ordenar a adjudicação de bens licitados por outros, no caso a verba 18, no valor de € 200,00, quando há bens livres, da mesma espécie e natureza, nos valores de € 124,50, € 60,38, € 13,70 e € 41,40 (verbas 9, 10, 11 e 15), deixando-se a licitante completamente privada, como fez o Tribunal a quo de qualquer direito sobre os bens em que licitou.
9. Excessivo e abusivo, com tradução em abuso de direito, será o pedido da interessada não licitante de adjudicação de 6 das 13 verbas (prédios rústicos) que constituem a herança.
10. Aliás, no processo, os bens não licitados permitem que a cada um dos interessados sejam adjudicados bens específicos da mesma espécie e natureza dos já licitados – cfr. verbas 8, 9, 10, 11, 13, 15, 16 e 19;
11. Como existem bens que podem ser vendidos judicialmente (bens livres da mesma espécie e natureza que os interessados não pretendem e/ou não pretendem a comunhão), além de bens móveis, e com o produto da venda dos quais (dinheiro) podem compor-se os quinhões.
12. Daí que o despacho de fls. 235 a 239 deva ser revogado e, por força da composição dos quinhões os bens que constituem as verbas 14, 18 e 20 adjudicados à donatária licitante,
13. com a anulação de todos os atos subsequentes, nomeadamente o mapa definitivo de partilha e a sentença recorrida.

Quando assim se não entenda

14. Não pode ser recusado o requerimento de avaliação de bens por parte da donatária, como fez o Mmº Juiz a quo, com os fundamentos de que a realização da avaliação deve ser requerida aquando da realização da conferência de interessados ou em ato prévio às licitações, quando do normativo do nº 2 do art. 1367, tendo em vista a retificação de valores, na defesa dos interesses da donatária, resulta manifesto que a necessidade / obrigatoriedade de redução por inoficiosidade poderá ocorrer apenas depois das licitações.
15. Foram violados os artigos 1374º, al. a), 1377º, nº 2, al. b), ambos do anterior CPC e art. 2174º do C Civil.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. Ex.ªs, deve o despacho de fls. 235 e segs. ser revogado e, por consequência, por força da composição dos quinhões, os bens que constituem as verbas nºs 14, 18 e 20 ser adjudicados à licitante donatária, com a anulação de todos os atos subsequentes ao referido despacho, incluindo o mapa definitivo de partilha e a sentença recorrida, elaborando-se novo mapa e sentença que o homologue, adjudicando as verbas livres escolhidas, da mesma espécie e natureza aos não licitantes e as restantes verbas livres, não escolhidas, sejam ou não da mesma espécie e natureza ser vendidas judicialmente e os quinhões dos interessados não licitantes compostos, ainda que parcialmente em dinheiro ou, quando assim se não entenda,

Deve o douto despacho de fls. 254 e 255 ser superiormente revogado, ordenando-se a devolução dos autos à 1ª instância para que seja determinada a realização das avaliações dos bens descritos nas verbas 7 a 19, procedendo-se de seguida à elaboração de novo mapa de partilha que atenda ao valor dos bens das verbas 7 a 19, que venham a resultar da avaliação, afastando-se a possibilidade de redução por inoficiosidade da doação instituída por disposição de última vontade dos autores da sucessão / doadores, como é de
JUSTIÇA!!!».
*
Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
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Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos (cfr. fls. 311).
*
Foram colhidos os vistos legais.
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III. Objeto do (segundo) recurso.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s) [cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por NCPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho], ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:
– Da admissibilidade da composição dos quinhões dos interessados não licitantes em bens licitados pelas recorrentes.
– Se cumpre proceder à avaliação dos bens não doados, conforme requerido pela donatária.
*
IV. Fundamentação de facto.

As incidências fáctico-processuais relevantes para a decisão dos presentes recursos são os que decorrem do relatório supra – que por brevidade aqui se dão por integralmente reproduzidos –, a que acrescem os seguintes factos:

1. O valor total dos bens da herança é de € 114.616,64.
2. O valor da quota da interessada/donatária Maria C. é de € 56.034,80;
3. O valor da quota da interessada C. C., bem como de cada um dos restantes interessados, é de € 14.645,46.
4. Na conferência de interessados, realizada em 8.07.2014, a interessada C. C. licitou as verbas nºs 6 (prédio urbano), 7, 12 e 17 (prédios rústicos), pelos valores de 50.000,00€, 20,00€, 5,00€ e 250,00€, respetivamente.
5. E a interessada Maria C. licitou as verbas nºs 14, 18 e 20 (prédios rústicos), pelos valores de 50,00€, 20,00€ e 150,00€, respetivamente, a que acresce o bem imóvel doado constante da relação de bens de fls. 75 (prédio rústico), cujo valor ascende a 63.360,00€.
6. Os interessados M. C. e M. A. não licitaram em nenhuns bens.
7. Na conferência de interessados, realizada em 2.12.2014, foi determinado o cumprimento do disposto no artigo 1373.º, n.º 1, do C.P.C, de que foram os presentes imediatamente notificados (cfr. acta de fls. 196 e 197).
*
V. Fundamentação de direito.

1. – Da composição dos quinhões dos interessados não licitantes em bens licitados pelas recorrentes.

Como ponto prévio importa ter presente que os presentes autos de inventário foram instaurados em 30-11-2009.

Ora, não obstante a Lei n.º 23/2013, de 5 de março, ter aprovado e posto em vigor (desde 02-09-2013) o novo regime jurídico do processo de inventário, continua a aplicar-se-lhe o Código de Processo Civil até então vigente – o aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28-12-1961 (revogado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) – abreviadamente designado CPC.

Com efeito, pelo art. 6º, n.º 2, da Lei n.º 23/2013, foram revogados, entre outros, os artigos 1326º a 1392º, 1395º e 1396º, 1404º, 1405º e 1406º do CPC. Todavia, conforme resulta do seu art. 7º, o novo regime do inventário que esta lei instituiu e que atualmente se encontra em vigor não se aplica aos processos de inventário que, como este, à data da sua entrada em vigor se encontravam pendentes.

Tal significa, portanto, que o regime processual aplicável ao inventário objeto dos autos é o subsequente à Reforma de 1995, concretamente os arts. 1326º e seguintes do CPC.

No que respeita ao preenchimento dos quinhões de interessados no processo de inventário e partilha, a regra é a de os bens licitados serem adjudicados aos respetivos licitantes, sendo atribuídos aos não licitantes, quando possível, bens da mesma espécie e natureza dos licitados - art. 1374º, als. a) e b) do CPC.

Mais precisamente, relativamente aos licitantes, donatários e legatários, o preenchimento das quotas «faz-se por certeza» Cfr. João António Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, vol. II, 4ª ed., 1990, Almedina, p. 464., sendo-lhe adjudicados os bens licitados, doados ou legados, respetivamente.
Porém, se «a secretaria verificar, no acto da organização do mapa, que os bens doados, legados ou licitados excedem a quota do respectivo interessado ou a parte disponível do inventariado, lançará no processo uma informação, sob a forma de mapa, indicando o montante do excesso» (art. 1376º, n.º 1, do CPC).

«Tal excesso pode dever-se ao facto de os interessados terem licitado em bens de valor superior ao dos seus quinhões, ou, quanto aos donatários e legatários, ao facto de essas doações ou legados serem inoficiosos. Também, há lugar a tornas (…) no caso de haver excesso derivado do acordo sobre a composição dos lotes» Cfr. Domingos Silva Carvalho de Sá, Do Inventário Descrever Avaliar e Partir, 3ª ed., Almedina, p. 229..
Havendo legados ou doações inoficiosas, «o juiz ordena a notificação dos interessados para requererem a sua redução nos termos da lei civil, podendo o legatário ou donatário escolher, entre os bens legados ou doados, os necessários a preencher o valor que tenha direito a receber» (art. 1376º, n.º 2, do CPC).

A este propósito, como se decidiu Ac. do STJ de 29-04-2010 (relator Mário Cruz)(1):

«I - Quando se constate a inoficiosidade de doação por afectar a legítima dos outros herdeiros, a lei não reconhece aos donatários herdeiros, face aos herdeiros não donatários, quanto ao preenchimento do quinhão hereditário (formado pela quota-parte da parte indisponível e pela quota disponível da herança, sendo a doação feita por conta desta), o direito de escolher bens em espécie que excedam o valor daquilo que têm direito a receber.
II - Havendo vários bens, se os donatários pretendem preencher o seu quinhão com bens que se mostram excessivos e os não donatários pretendem ver preenchidos os seus quinhões hereditários com um dos bens com que aqueles também pretendem preencher o quinhão deles, como beneficiários de tornas, os não donatários podiam optar pelo preenchimento dos seus quinhões com bens em espécie (art. 1377.º, n.º 1, do CPC), pelo que os donatários teriam de ceder, entre os bens doados, bem ou bens em espécie que permitissem aos demais herdeiros ver preenchido ou o mais possível aproximado, a composição dos quinhões destes».

Havendo lugar a tornas, os credores de tornas são notificados para requerer a composição dos seus quinhões ou reclamar o pagamento das tornas (art. 1377.º, n.º 1, do CPC).
Não obstante a disjuntiva utilizada (“ou”), tem-se entendido que a razão de ser da norma permite ao interessado a quem haja de caber tornas requerer, cumulativamente, a composição do seu quinhão até um certo limite e reclamar o pagamento de tornas relativamente ao montante pelo qual não fique completamente preenchido com as verbas que lhe venham a ser adjudicadas (2).

Assim, havendo excesso de bens licitados, relativamente ao quinhão do respectivo licitante, podem os interessados a quem, por via desse excesso, hajam de caber tornas, requerer a adjudicação dessas verbas, pelo valor da licitação e até ao limite do seu quinhão, devendo, então, o licitante escolher, de entre as que licitou, as que devem preencher a sua quota - art. 1377º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPC.

De notar que a lei estabelece claramente que o princípio, em sede de partilha dos bens, é o da sua adjudicação ao respectivo licitante e que, quando haja de intervir o critério corretivo acolhido pelas normas do art. 1377º do CPC, pressupondo sempre a licitação em mais verbas que as necessárias ao preenchimento do seu quinhão, o direito de escolha cabe ao licitante, ou seja, só depois da reserva deste o credor de tornas interessado na composição com bens licitados pode fazer escolha sobre os restantes (3). O credor de tornas limita-se a requerer a composição do quinhão, em abstrato, não tendo direito a escolher os bens licitados que hão-de compor esse quinhão. Mas se o fizer, indicando os bens que pretende, tal indicação não vinculará o licitante em excesso, «que a seu bel prazer, e dentro do condicionalismos legal, optará, querendo, pelas próprias verbas que o credor das tornas porventura tenha antecipadamente indicado como sendo as que pretenderia para si» (4).

Mas, se é verdade que o art. 1377º, n.º 3 do C. P. Civil, concede ao licitante em excesso o direito de escolher, de entre as verbas que licitou, as necessárias para preencher a sua quota, também não é menos verdade que é a própria lei que condiciona, duplamente, o exercício deste direito (5):

a) a escolha deve ser feita entre as verbas em que licitou e deve recair só nas verbas necessárias para compor o quinhão (citado n.º 3);
b) a escolha é presidida pelo princípio do justo equilíbrio das quotas consagrado no n.º 2 do citado art. 1377º do CPC e que se traduz na possibilidade de o credor de tornas, uma vez efetuada tal escolha, poder requerer a adjudicação das verbas em excesso ou de algumas delas pelo valor da licitação e até ao limite do seu quinhão.

Confere-se, assim, aos interessados não licitantes o direito a verem integrados os seus quinhões em bens que outros licitaram a mais e pelo valor em que os licitaram.

Isto porque, como refere Lopes Cardoso (6), “importa não esquecer que o processo de composição de quinhões tem por fundamento a necessidade, que se considerou de primária justiça, de corrigir a licitação, de acautelar os interesses dos menos afortunados, pondo-os a coberto da própria desvalorização da moeda. Este direito sobreleva, em parte, ao do licitante e na conciliação entre ambos só é possível admitir uma escolha que, afinal de contas, se não traduza num desapontamento”.

Quanto ao exercício do direito de escolha do licitante pode suscitar-se controvérsia, visto serem muito raros os casos em que haja conjugação entre os valores das verbas escolhidas e o valor do quinhão do licitante.
Tal reconduz-nos à questão de saber se o licitante tem limites na sua escolha ou se há critérios a seguir quanto aos termos em que o licitante pode exercer esse direito de escolha.

Para responder a esta questão mais uma vez tomamos de empréstimo as palavras de Lopes Cardoso (7):

«(…) o escopo legal reside na atribuição ao licitante de verbas que preencham quantitativamente a sua quota, ou, não sendo possível – como raras vezes o será –, as que com menos diferença a excedam, pois as outras deixam de lhe pertencer para se adjudicarem aos que, por preenchidos a menos, requereram a composição quantitativa dos seus quinhões no uso de um inquestionável e justificado direito.

Daqui vem que não pode o licitante escolher verbas que excedam em muito o seu quinhão, como também lhe fica defesa a escolha restrita a verbas que o não preencham, que no justo equilíbrio as quotas é que está a realidade que a lei protege e não o seria nem um nem outro dos casos. Ali, subsistiria desrespeito dele enquanto continuava o licitante a chamar a si maior porção de bens do que legitimamente poderia atribuir-se; aqui, ficariam constituídos os requerentes da composição na obrigação de pagar tornas em dinheiro, o que não seria curial, justo, ou sequer possível. Pois se eles não afrontaram a licitação, ou por entenderem que o preço era excessivo ou porque não estavam habilitados á competição, como admitir prática que, afinal de contas, se traduziria na assunção de uma atitude a que procuraram furtar-se?

Conciliam-se, pois, os interesses de uns e outros permitindo que o licitante escolha pela forma que a própria licitação lhe garantia mas com o limite da medida do seu quinhão, ou com escasso excesso dele, mas sempre por forma a que da escolha não resulte para os que exercerem o direito conferido pelo art. 1377º-2 a obrigação de tornarem por sua vez

Estes são os princípios que temos por idóneos (…)».

Considerando pois que, face à letra expressa do n.º 2 do citado art. 1377º do CPC, o credor de tornas só pode requerer a adjudicação de verbas em excesso, pelo valor da licitação e até ao limite do seu quinhão, impõe-se concluir que o direito ao preenchimento dos quinhões não deve levar a uma inversão de posições, ou seja, o processo de composição de quinhões não há-de funcionar de modo que o credor de tornas (por se ter abstido de licitar ou ter licitado a menos) passe a devedor de tornas (por força do preenchimento do quinhão com excesso). Ou seja, para os não licitantes não há-de resultar a obrigação de pagar tornas.

Do mesmo modo, por referência ao limite ao direito de escolha do licitante imposto no n.º 3 do mesmo art. 1377º do CPC, estando tal direito limitado ao necessário para o preenchimento do seu quinhão é de evitar que o devedor de tornas passe a credor delas (8).

No mesmo sentido, veja-se o Ac. da RC de 8/04/2008 (relator Freitas Neto), in www.dgsi.pt., nos termos do qual “o preenchimento do quinhão do interessado não licitante (…) não poderá ter lugar sempre que dele resulte uma atribuição excedente do valor do referido quinhão.
O objectivo "igualitário" da norma não pode violar a vontade hipotética do não licitante, pois que se este não concorreu às licitações foi porque, pelo menos - sem prejuízo de outros motivos - não quis contrair dívidas com tornas originadas pelo excesso da respectiva quota”.

Por último, no que respeita à hierarquia entre o direito de escolha dos licitantes por excesso e o direito que todos os herdeiros, incluindo os não licitantes, têm aos bens em espécie, a primazia vai para estes últimos, pois o sistema de preenchimento de quinhões está ordenado para satisfazer este direito e não permitir que alguns dos herdeiros sejam desapossados dos bens por não terem meios financeiros para os licitar (9).

Expostos estes considerandos teóricos, cumpre, agora, analisar o caso dos autos.

Importa, para o efeito, ter em conta a seguinte matéria de facto com interesse para a decisão do presente litígio e resultante dos elementos constantes dos autos, designadamente:

- O valor da quota da interessada/donatária Maria C. é de € 56.034,80;
- O valor da quota da interessada C. C., bem como de cada um dos restantes interessados, é de € 14.645,46.
- Na conferência de interessados, realizada em 8.07.2014, a interessada C. C. licitou as verbas nºs 6 (prédio urbano), 7, 12 e 17 (prédios rústicos), pelos valores de 50.000,00€, 20,00€, 5,00€ e 250,00€, respetivamente.
- E a interessada Maria C. licitou as verbas nºs 14, 18 e 20 (prédios rústicos), pelos valores de 50,00€, 20,00€ e 150,00€, respetivamente, a que acresce o bem imóvel doado constante da relação de bens de fls. 75 (prédio rústico), cujo valor ascende a 63.360,00€.
- Os interessados M. C. e M. A. não licitaram em nenhuns bens.
- Notificados nos termos do art. 1377.º, n.º 1 do C.P.C, por se verificar que existe excesso de bens licitados pelas interessadas Maria C. e C. C., os interessados M. C. e M. A. vieram requerer a composição dos respetivos quinhões, o que mereceu oposição por parte daquelas.
- Notificados nos termos do art. 1376º, nº 2 do CPC, uma vez verificar-se excesso de bens licitados pelas interessadas Maria C. e C. C. e, ainda, que a doação feita àquela primeira interessada é inoficiosa, a interessada M. A. requereu que a donatária procedesse à restituição do bem doado em excesso ao seu direito, com vista a não ofender a legítima da requerente, ao que aquelas interessadas responderam pugnando que os bens licitados deverão ser adjudicados às interessadas licitantes.

Perante este quadro factual, decidiu o Mmº Juiz a quo:

a) - No que diz respeito à interessada/donatária Maria C., considerando que o valor do bem que lhe foi doado (avaliado em € 63.360,00) – bem esse que necessariamente irá integrar o seu quinhão, por força do disposto na al. a) do art. 1374º do CPC – é por si só suficiente para preencher a sua quota na herança, excedendo-a até e implicando mesmo que tenha de ser reduzida por inoficiosidade, não lhe assiste o direito a escolher outros quaisquer bens, de entre os que licitou, para preencher também o seu quinhão, podendo todos eles ser utilizados para compor os quinhões dos interessados que o requereram, ou seja, os bens das verbas nºs 14, 18 e 20.
b) No que concerne à interessada C. C., tendo presente que, de entre os bens que arrematou/licitou, um deles – o da verba nº 6, pelo valor de € 50.000,00 – é mais do que suficiente para preencher por completo o seu quinhão, igualmente não lhe assiste o direito de escolher, para além daquele, outros quaisquer bens para preencher o seu quinhão, ficando assim livres para a composição do quinhão dos interessados que o requereram todos os demais bens em que aquela licitou, ou seja, os bens das verbas nºs 7, 12 e 17.
c) Nessa decorrência, determinou a notificação dos interessados M. C. e M. A. para indicarem, por acordo, de entre as verbas nºs 7, 12, 14, 17, 18 e 20, quais as que pretendiam que lhes fossem adjudicadas para comporem os seus quinhões, sob pena de se devolver ao tribunal essa decisão nos termos do n.º 4 do artigo 1377º do CPC.

Sustentam, porém, as interessadas/recorrentes, Maria C. e C. C., que tal despacho violou o disposto nos arts. 1374º e 1377º do CPC, na medida em que, devendo ser atribuídos aos não licitantes os bens livres da herança e que sejam da mesma espécie ou natureza, os bens não licitados permitem que a cada um dos interessados sejam adjudicados bens específicos da mesma espécie e natureza dos já licitados, em concreto as verbas que constituem os prédios rústicos descritos sob os nºs 8, 9, 10, 11, 13, 15, 16 19 da relação de bens fls. 41 a 44.

Acrescenta a interessada/donatária Maria C. que o art. 1377º, n.ºs 2 e 3 do CPC apenas se refere à licitação excessiva em relação à quota de qualquer interessado, pelo que, sendo a sua quota hereditária do montante de € 56.034,80 e a dos restantes interessados a € 14.645,46, é de concluir que as licitações operadas, no valor de € 220,00, não ultrapassaram aquela quota (da donatária), além de que sendo a donatária também herdeira legitimária, deve ser dada preferência à interpretação do nº 3 do art. 2174 do C Civil, e, por consequência, à vontade do doador, no sentido dos bens ingressarem no património dos donatários, pelo que a redução por inoficiosidade da doação deve ser paga em dinheiro.

Salvo o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que o tribunal recorrido fez uma correta subsunção das normas jurídicas aplicáveis ao caso ajuizado.

No tocante à interessada/donatária Maria C., cuidou desde logo de respeitar a regra segundo a qual o preenchimento do quinhão hereditário é feito mediante a adjudicação do bem doado.
Constata-se, porém, que sendo a quota da aludida interessada/donatária no valor de € 56.034,80 e ascendendo o valor do bem doado a 63.360,00€, é manifesto que este excede aquela, o que implica que tenha de ser reduzido por inoficiosidade, nos termos dos arts. 1376º, n.º 2 do CPC e 2174º do Cód. Civil, o que foi determinado por despacho de fls. 208 e segs..

Conforme resulta deste último normativo, se os bens legados ou doados forem divisíveis, a redução faz-se separando deles a parte necessária para preencher a legítima.
Se forem indivisíveis, há que fazer a seguinte distinção: se a importância da redução exceder metade do valor dos bens, estes pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário ou donatário haverá o resto em dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem integralmente ao legatário ou donatário, tendo este de pagar em dinheiro ao herdeiro legitimário a importância da redução.
Por conseguinte, quanto a esse bem doado, sendo este adjudicado à donatária, terá esta de pagar em dinheiro aos herdeiros legitimários a importância da redução.
Existindo, porém, excesso da quota hereditária da interessada donatária por a doação ser inoficiosa, e uma vez que a lei não confere um direito absoluto de licitação aos licitantes, na medida em que atribuiu aos não licitantes, ou preenchidos a menos, a faculdade de verem integrados os seus quinhões em bens que outros licitaram a mais e pelo valor em que os licitaram (art. 1377º, n.º 2 do CPC), julgamos ser de sufragar o juízo aduzido na decisão recorrida no sentido de não assistir àquela interessada «o direito a escolher outros quaisquer bens, de entre os que licitou, para preencherem também o seu quinhão, podendo todos eles ser utilizados para compor os quinhões dos interessados que o requereram, ou seja, os bens das verbas nºs 14, 18 e 20».

De igual modo, no que respeita à interessada C. C., sendo a sua quota hereditária no valor de € 14.645,46 e tendo licitado bens no valor de 50.275,00€, é manifesto que licitou em excesso.

Conforme já se deixou dito, malgrado ter consentido a licitação ilimitada (podendo cada interessado licitar em todos os bens e pelo preço que lhe aprouver), a lei, para temperar os malefícios que daí poderiam advir (em que os interessados que tenham mais capacidade económica e financeira poderão obter para si os melhores ou todos os bens da herança), conferiu aos não licitantes o direito a verem os seus quinhões integrados em bens que outros licitaram a mais e pelo valor em que os licitaram, pelo que o direito de escolha que cabe ao licitante deve ser exercido entre as verbas em que licitou e deve recair só nas verbas necessárias para compor o respectivo quinhão (a excedê-lo, terá de ser pelo menor valor possível).

Por sua vez, o direito de requerer a adjudicação das verbas em excesso ou de alguma delas só é reconhecido ao credor de tornas até ao limite do seu quinhão.

Ora, tendo os interessados não licitantes, M. C. e M. A., requerido a composição dos seus quinhões através dos bens que as interessadas licitantes licitaram em excesso e pelo valor em que os licitaram, o direito de escolha da interessada C. C. quanto aos bens licitados, atentos os limites objetivos e materiais a que está sujeito, restringia-se, de entre as verbas que licitou, à necessária para o preenchimento do seu quinhão, ou seja, à verba n.º 6, no valor de 50.000,00€, dado que esta excedia, por si só, o valor da quota hereditária. Nessa medida, para preenchimento do seu quinhão hereditário, podia – e devia – escolher a verba de maior valor em que licitou e superior ao valor do seu próprio quinhão – até porque tendo licitado não poderia receber bens que fiquem aquém do seu quinhão – , prescindindo das demais verbas licitadas de valor inferior (no valor global de 275,00€), visto estas serem manifestamente insuficientes para integral composição da quota da interessada licitante (o mesmo valendo quanto à quota de cada um dos interessados reclamantes, sendo que sempre seria de rejeitar uma solução em que estes passassem de credores de tornas a devedores delas).

O que não é admissível é que, face ao requerimento de composição de quinhões através das verbas licitadas, a interessada licitante – assim como a interessada donatária – pretenda manter intocado o direito de escolha sobre todas as verbas licitadas, quando é manifesto que uma só das verbas doadas e/ou licitadas excede o quinhão de cada uma delas, assim desrespeitando o limite do seu quinhão; na prática, a sufragar-se o entendimento das licitantes nos precisos termos em que estas pretendem exercitar tal direito, isso significaria erigir a faculdade de escolha dos bens licitados a um direito absoluto, frustrando por completo a faculdade de composição de quinhões que, por lei, assiste aos interessados não licitantes.

Daí que seja (também) de manter a decisão recorrida na parte em que decidiu que, relativamente à interessada C. C., não pode esta legitimamente pretender escolher, para além da verba n.º 6 (50.000,00€), outros quaisquer bens para preencher o seu quinhão, ficando assim livres para composição do quinhão dos interessados que o requereram todos os demais bens em que aquela licitou, ou seja, os das verbas nºs 7, 12 e 17.

Acresce dizer que, quanto aos bens não licitados, não têm os mesmos que integrar obrigatoriamente o quinhão dos interessados não licitantes (art. 1374º, alínea b), do CPC). A solução contrária propugnada pelas apelantes poderia conduzir a situações iníquas, como, por exemplo, quem tivesse dinheiro licitava, ainda que só com pequenos lances, nos bens que lhe agradassem e deixava os demais para os interessados que não tinham podido licitar, os quais, mesmo que os não quisessem, tinham agora que ficar com eles, assim evitando os licitantes dar-lhes tornas (10) (11).

Com vista a paralisar o direito de composição de quinhões dos interessados não licitantes invocam as recorrentes que seria excessivo e abusivo, por violação dos princípios da proporcionalidade e da justa divisão dos bens a partilhar, deferir a adjudicação de bens a partilhar ou ordenar a adjudicação de bens licitados por outros, quando há bens livres, da mesma espécie e natureza, deixando-se a(s) licitante(s) completamente privada(s), de qualquer direito sobre os bens em que licitou(aram).

Dispõe o art. 334º do Código Civil que:

É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

Como ensina o Prof. Almeida Costa (12), o princípio do abuso do direito constitui um dos expedientes técnicos ditados pela consciência jurídica para obtemperar, em algumas situações particularmente clamorosas, às consequências da rígida estrutura das normas legais.
A parte que abusa do direito, actua a coberto de um poder legal, formal, visando resultados que, clamorosamente, violam os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social do direito.
As conceções que procuram precisar o conteúdo do abuso do direito reduzem-se basicamente a duas diretrizes opostas: uma subjetivista e outra objetivista.
A teoria subjetiva considera decisiva a atitude psicológica do titular do direito, ter ele agido com o único propósito de prejudicar o lesado (acto emulativo).
A teoria objetiva, pelo contrário, desliga-se da intenção do agente, dando antes relevância aos dados de facto, ao alcance objetivo da sua conduta, de acordo com o critério da consciência pública.

Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, "a concepção adoptada de abuso de direito é a objectiva. Não é necessária a consciência de se excederem, com o seu exercício, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito; basta que se excedam esses limites" (13).

De seguida, continuam os mesmos autores a afirmar que:

«Exige-se que o excesso cometido seja manifesto. Os tribunais só podem, pois, fiscalizar a moralidade dos actos no exercício de direitos ou a sua conformidade com as razões sociais ou económicas que os legitimaram, se houver manifesto abuso. É esta a lição de todos os autores e de todas as legislações. Manuel de Andrade refere-se aos direitos "exercidos em termos clamorosamente ofensivos da justiça» e o Prof. Vaz Serra à «clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante».

O abuso de direito pressupõe logicamente que o direito existe, embora o seu titular se exceda no exercício dos seus poderes.

A fórmula adoptada no atual Código Civil não se delimita tão só ao acto de emulação, entendido como o exercício de um direito sem utilidade própria e só para prejudicar outrem. Numa visão bem mais abrangente e ampla, o citado preceito normativo abrange o exercício de qualquer direito por forma anormal, quanto à sua intensidade ou à sua execução, de modo a poder comprometer o gozo dos direitos de terceiro e a criar uma desproporção objectiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular, e as consequências que outros têm de suportar (14).

Segundo o legislador, a determinação da legitimidade ou ilegitimidade do exercício do direito, ou seja, da existência ou não de abuso do direito, afere­-se a partir de três conceitos: a boa fé, os bons costumes e o fim social ou económico do direito.

A manifestação mais clara do abuso do direito é a chamada conduta contraditória (venire contra factum proprium) em combinação com o princípio da tutela da confiança - exercício dum direito em contradição com uma conduta anterior em que a outra parte tenha confiado, vindo esta com base na confiança gerada e de boa fé, a programar a sua vida e a tomar decisões (Vaz Serra, RLJ, 111º, 296). Como figuras próximas, temos a renúncia e a neutralização do direito. Segundo Baptista Machado, esta última figura é considerada, em geral, como uma modalidade especial da proibição do venire contra factum proprium e ocorre quando se verificam cumulativamente as seguintes circunstâncias: o titular dum direito deixa passar longo tempo sem o exercer; com base neste decurso do tempo e com base ainda numa particular conduta do dito titular ou noutras circunstâncias, a contraparte chega à convicção justificada de que o direito já não será exercido; movida por esta confiança e com base nela, essa contraparte orienta em conformidade a sua vida, tomando medidas ou adotando programas, de sorte que o exercício tardio e inesperado do direito lhe acarretará uma desvantagem maior do que o seu exercício atempado (RLJ 118º pág. 228).

Como já atrás salientámos, este instituto pressupõe como requisito essencial a existência do direito por banda da pessoa contra quem é invocada tal exceção perentória, sob pena de ficar prejudicado o abuso do seu exercício.

Ora, no caso em apreço, nada nos permite concluir que os credores reclamantes, ao requererem a composição dos seus quinhões, através de bens licitados em excesso ou como decorrência da inoficiosidade do bem doado, estejam a agir em abuso do direito.

Até porque importa não perder de vista que os princípios que regem a matéria indicam-nos que os interessados têm direito a ver preenchidos os seus quinhões com bens em espécie.

Como já se decidiu (15), havendo licitações, o licitante tem preferência na escolha dos bens que hão-de compor o seu quinhão, mas essa escolha não é arbitrária, estando o licitante obrigado a escolher os bens que preencham e excedam em menor quantidade a medida do seu quinhão.

Por sua vez, o não licitante, depois de preenchido o quinhão dos licitantes com bens por estes licitados, tem o direito de ver o seu quinhão composto por bens, se os houver disponíveis.
Por outro lado, a apregoada vontade dos interessados manifestada na licitação não é argumento decisivo tendente a paralisar o direito dos credores não licitantes, porquanto a mera licitação de um bem não assegura necessariamente a sua adjudicação ao licitante, atenta a faculdade conferida aos preenchidos a menos de virem requerer a composição do seu quinhão em bens.

E o facto de os interessados reclamantes se terem abstido de licitar sobre as verbas em causa não consubstancia uma vinculação irreversível de forma a impedi-los de exercer o direito de composição de quinhões através de bens licitados ou doados em excesso.

Abuso existe, sim, por parte das licitantes que, apesar de lhes ter sido facultado o direito de escolha dos bens que haverão de ser-lhes adjudicados, pura e simplesmente pretendem manter inalterada a situação pré-existente, de modo a que todos os bens licitados lhes sejam adjudicados, sem cuidarem de respeitar os já indicados critérios que presidem ao processo de composição de quinhões.

Tendo os não licitantes (ou licitantes por diferença) o direito de reclamar que as verbas (licitadas ou doadas) em excesso ou alguma delas lhes sejam adjudicadas, sempre seria de considerar abusiva a escolha das licitantes que, desse modo, lograriam frustrar ou impedir por completo o direito daqueles, não sendo despiciendo relembrar que, em caso de colisão de direitos desiguais (o do licitante e o do preenchido a menos), prevaleça o superior, isto é, o deste último (arts. 334º e 335º, n.º 2, ambos do Cód. Civil) (16).

A ser de outro modo, estaria encontrado o «remédio» para os interessados devedores de tornas – seja os que licitaram em excesso, seja os donatários cujas doações sejam inoficiosas – inutilizarem ou impedirem o direito que assiste aos interessados a quem hajam de caber tornas de optarem pela composição dos seus quinhões em bens pelo valor da licitação (art. 1377º, n.º 2 do CPC).

Não é, pois, possível concluir que os recorridos tenham excedido – muito menos de forma manifesta - os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico do direito.

Improcedem, por isso, todas as conclusões das apelantes quanto à composição dos quinhões.
*
2. – Da avaliação dos bens imóveis não doados, conforme requerido pela interessada/donatária a fls. 252.

Defende a interessada Maria C. que o requerimento de avaliação dos bens imóveis não doados deveria ter sido admitido, uma vez resultar dos autos que a doação terá de ser reduzida por inoficiosidade e os bens constantes da relação de bens estarem subavaliados.

Segundo o art. 1367º do CPC:

«1 - Quando do valor constante da relação de bens resulte que a doação ou o legado são inoficiosos, pode o donatário ou o legatário, independentemente das declarações a que se referem os artigos anteriores, requerer avaliação dos bens doados ou legados, ou de quaisquer outros que ainda o não tenham sido.
2 - Pode também o donatário ou legatário requerer a avaliação de outros bens da herança quando só em face da avaliação dos bens doados ou legados e das licitações se reconheça que a doação ou legado tem de ser reduzida por inoficiosidade.
3 - A avaliação a que se refere este artigo pode ser requerida até ao exame do processo para a forma da partilha».

O normativo emergente do n.º 2 do art. 1367º, do CPC tem em vista a retificação de valores, na defesa dos interesses do donatário ou legatário, conquanto resulte da avaliação dos bens doados ou legados e das licitações que a doação ou legado tem de ser reduzido por inoficiosidade, sendo o meio idóneo e eficaz para o ajustamento de valores entre os bens doados e legados e os outros bens da herança.

Aos donatários e legatários importa não só que os bens doados ou legados sejam computados nos seus exatos valores, pois se estiverem avaliados em excesso poderão ver-se desapossados daqueles bens, como igualmente lhes releva que essa justa valia se generalize a todos os bens da herança. A avaliação por valor inferior ao justo, dos bens não doados ou legados, acrescida da valoração justa dos que o inventariado doou ou legou, implica uma maior probabilidade de revogação das liberalidades (17).

O pedido desta avaliação de outros bens da herança, não doados ou legados, a requerimento do donatário ou legatário, sendo as liberalidades inoficiosas, pode ser requerido até ao exame do processo para a forma da partilha.

Ora, no caso é manifesto que o requerimento de avaliação dos bens não doados foi apresentado pela interessada/donatária muito para além do prazo para exame do processo que os interessados dispunham para dar parecer sobre a forma da partilha.

Com efeito, tendo os interessados sido notificados para se pronunciarem, querendo, sobre a forma à partilha (cfr. art. 1373.º, n.º 1, do C.P.C), aquando da conferência de interessados realizada em 2.12.2014 (cfr. fls. 196 e 197), o requerimento de avaliação, deduzido pela interessada/donatária, só veio a ser formulado no dia 11/07/2017 (cfr. fls. 252 e 253), quando há muito se mostrava esgotado o prazo de 10 dias que as partes dispunham para aquele efeito.

Nestes termos, dada a sua manifesta extemporaneidade, é de manter o despacho recorrido que indeferiu a requerida avaliação dos bens imóveis não doados (cfr. fls. 254).
Improcede, assim, também este fundamento da apelação apresentada pela recorrente Maria C..
*
Por todas as razões aduzidas, os recursos não merecem provimento.
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, nº 7 do CPC):

I - Requerida a composição dos quinhões, na sequência de licitação em excesso e/ou de doação inoficiosa, assiste ao licitante e ao donatário o direito de escolha dos bens que hão-de compor o seu quinhão.
II - Tal direito de escolha não é, porém, absoluto, posto que deverá adequar-se ao preenchimento do seu quinhão (a excedê-lo, terá de ser pelo menor valor possível), bem como ao quinhão do não licitante (de modo a que o credor de tornas não passe a devedor delas, nem o devedor de tornas passe a credor delas).
III – Tendo o interessado licitado em diversos bens, sendo que o valor de um só deles excede manifestamente o respetivo quinhão hereditário e o somatório dos demais fica aquém desse limite, é abusiva a escolha feita no sentido de lhe serem adjudicados todos os bens licitados, pois desse modo lograria frustrar ou impedir o direito que assiste aos interessados a quem hajam de caber tornas de optarem pela composição dos seus quinhões em bens pelo valor da licitação, até ao limite do seu quinhão (art. 1377º, n.º 2 do CPC).
IV – A avaliação de outros bens da herança, não doados ou legados, a requerimento do donatário ou legatário, sendo as liberalidades inoficiosas, pode ser requerida até ao exame do processo para a forma da partilha (art. 1367º, n.º 3 do CPC).
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VI. Decisão

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedentes os recursos de apelação, confirmando as decisões recorridas.
Custas a cargo das apelantes (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 22 de novembro de 2018

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)


1. Cfr. O Processo Judicial de Inventário na jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça (Sumários de Acórdãos de 2007 a Setembro de 2012), https://www.stj.pt/wpcontent/uploads/2018/01/cadernoregimeprocessojudicialinventario.pdf, p. 40.
2. Cfr. Lopes Cardoso, obra citada, p. 414/415 e Domingos Silva Carvalho de Sá, obra citada, p. 230.
3. Cfr. Ac. do STJ de 5/12/2006 (relator Alves Velho) e Ac. da RG de 19/12/2011 (relatora Ana Cristina Duarte), in www.dgsi.pt.
4. Cfr. João António Lopes Cardoso, obra citada, p. 422.
5. Cfr. Ac. desta Relação de 30/11/2006 (relatora Rosa Tching), in www.dgsi.pt.
6. Cfr. obra citada, pp. 423/424.
7. Cfr., obra citada, pp. 424/425.
8. Cfr. Ac. desta Relação de 30/11/2006 (relatora Rosa Tching), in www.dgsi.pt.
9. Cfr., Ac. da RC de 29/11/2011, CJ, n.º 234, Ano XXXVI, T. V/2011, pp. 29/32 e Lopes Cardoso, obra citada, pp. 428/429.
10. Cfr. Ac. da RE de 26/01/2012 (relator Canelas Brás), in www.dgsi.pt.
11. No Ac. da RP de 27/09/2011 (relator João Ramos Lopes), in www.dgsi.pt. decidiu-se que. «Os bens não licitados são adjudicados a todos os interessados, em compropriedade, na proporção necessária ao integral preenchimento dos quinhões (as interessadas licitantes, na exacta proporção em falta depois de considerados os bens por elas licitados, e os não licitantes, na proporção necessária ao preenchimento do seu quinhão». Em sentido similar, o Ac. da RC de 15-01-2013 (relator Teles Pereira), in www.dgsi.pt.: «Em processo de inventário, os bens não licitados por qualquer dos interessados são, em princípio, atribuídos (adjudicados) em compropriedade aos interessados, na proporção dos respectivos quinhões e procurando preencher, assim, o que estiver em falta no quinhão de cada um». Foi esta, de resto, a solução alcançada nos autos, como se depreende do despacho de fls. 210 determinativo do modo como deve ser organizada a partilha, no qual se exarou: «O preenchimento dos quinhões será feito conforme o que resulta da conferência de interessados, sendo que os bens não licitados deverão ser atribuídos em comum, na proporção dos respetivos quinhões» (sublinhado nosso).
12. Cfr Direito das Obrigações, 6ª ed., Almedina, p. 64.
13. Cfr Código Civil Anotado, Vol. 1, 2ª ed., Coimbra Editora, p. 298; em sentido idêntico, António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Tomo I, 2ª ed., 2000, Almedina, p. 247.
14. Cfr neste sentido, entre outros, J. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código Civil, Vol. II, p. 102, Antunes Varela, RLJ, ano 114º, p. 75 e Das obrigações Em Geral Vol. I, 6ª ed., Almedina, p. 515 e Ac. do STJ de 28.11.1996, CJSTJ, 1996, T. III, p. 118.
15. Cfr., Ac. da RC de 29/11/2011, CJ, n.º 234, Ano XXXVI, T. V/2011, pp. 29/32.
16. Cfr., neste sentido, Lopes Cardoso, obra citada, p. 430.
17. Cfr., neste sentido, Lopes Cardoso, obra citada, pp. 230/231.