Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5481/19.6T8VNF.G1
Relator: SANDRA MELO
Descritores: AQUISIÇÕES SUCESSIVAS DO MESMO PRÉDIO
VENDA EXECUTIVA
REGISTO
PREVALÊNCIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/30/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- Para os efeitos do artigo 5 nº 1 do Código do Registo Predial são terceiros entre si os adquirentes em venda executiva de um mesmo bem que tenha sido penhorado a uma mesma pessoa, executada em ambos os processos que deram origem a tais vendas judiciais.
2- Assim, o primeiro adquirente de um imóvel, por venda judicial, que não registe o seu direito em data anterior ao registo de uma segunda aquisição, também em sede de execução, não pode opor o seu direito a este segundo adquirente, se for o mesmo o executado de ambos os processos contra quem foi dirigida a penhora.
Decisão Texto Integral:
Recorrente e Autora: --- X - TÊXTEIS E IMÓVEIS, S.A
Recorridos e Réus: --- Y – Unipessoal, Lda
--- J. P.
--- M. L.,
--- Banco ..., S.A.

Apelação (em ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum)

Relatório

A Autora pediu que:

A) Seja declarada a nulidade da venda judicial efetuada a favor da 1.ª Ré a respeito da fração designada pelas letras “..”;
B) Seja declarada a nulidade do contrato de compra e venda da referida fração celebrado entre a 1.ª Ré e os 2.ºs Réus;
C) Seja declarada a nulidade da hipoteca constituída a favor do 3.º Banco Réu;
D) Seja cancelado o registo da aquisição a favor da 1.ª Ré, designadamente a AP. 23112007;
E) Seja cancelado o registo de aquisição a favor dos 2.ºs Réus, designadamente a AP. 27 de 2008/07/15;
F) Sejam cancelados os registos de hipoteca a favor do 3.º Banco Réu pela AP. 28 de 2008/07/15 e AP. 29 de 2008/07/15;
G). Sejam os 2.ºs Réus condenados a entregar o imóvel, livre de pessoas e bens, por inexistência de qualquer título que legitime a sua ocupação.


Tudo em súmula, para fundar esse pedido, a Autora alegou que:
-- adquiriu, em venda judicial operada em 27/05/1997, uma fração autónoma que identifica, em execução que foi movida por Companhia Geral de ..., S.A. contra M. H. e M. R..
-- em 06/11/2007, teve lugar a venda judicial da fração penhorada, tendo sido adjudicada à 1ª R., no âmbito do processo executivo movido contra M. H., M. R. e “R. & S. – Construção Civil e Obras Públicas, Lda.” e essa aquisição foi registada sob a inscrição G-3, Ap. 23112007
-- a Autora registou a sua aquisição em 13/12/2007, registo que foi lavrado, provisoriamente, por dúvidas, com fundamento na existência da inscrição G-3 Ap. 47/23112007, em vigor a favor da 1ª R
-- em 15/07/2008, a 1ª R. vendeu a fração autónoma aos 2ºs RR., através de escritura de compra e venda, aquisição que foi registada sob a Ap. 27 de 2008/07/15.
-- o 3º Réu financiou a aquisição para o que se garantiu através da constituição de duas hipotecas sob a fração autónoma, registadas na mesma data.
-- no âmbito do processo nº 1118/09.0TJVNF foi reconhecido o direito de propriedade pleno da A. sobre a aludida fração autónoma, referindo-se na sentença que “a autora não está impedida de opor a nulidade da venda aos subadquirentes de boa fé, uma vez que a cadeia de negócios não tem origem no verdadeiro titular da fracção autónoma”.
-- os RR. não estão protegidos pelo disposto no artigo 291º do Código Civil, porque que a Autora fez registar essa ação judicial no prazo de 3 (três) anos a que se alude no n.º 2, do referido artigo 291º e a cadeia de negócios não teve origem no verdadeiro titular da fração autónoma

O 3.º Réu apresentou contestação,
sustentando, em resumo, que a aquisição a favor da 1.ª Ré prevalece sobre a compra realizada pela Autora em processo executivo, por ter obtido a propriedade de um transmitente comum e ter inscrito no registo a sua aquisição e, em segundo, que deve ser tutelada a confiança na aparência do registo, com base na qual os 2.ºs Réus compraram a fração e o Banco concedeu financiamento.
A 2.ª Ré, por seu turno, invocou a usucapião e o registo a seu favor, afirmando que se encontra de boa-fé. Deduziu reconvenção pedindo que seja reconhecido o seu direito de propriedade.
O 2º Réu sustentou a inoponibilidade da sentença que reconheceu à Autora o direito de propriedade, por ali não ter tido intervenção nessa qualidade e a inoponibilidade da compra realizada pela Autora, quer por força do regime previsto no artigo 291º, do Código Civil, quer por força do regime dos artigos 5º, 7º e 17º, do Código do Registo Predial. Também deduziu reconvenção, pedindo o reconhecimento do direito de propriedade, reportado a julho de 2008, com base na usucapião, em comum com a cor-Ré, seu cônjuge.
A Autora replicou, pugnando pela inadmissibilidade processual da reconvenção e, subsidiariamente, a sua improcedência visto que os Réus foram chamado à ação que intentou, cessando a sua boa-fé com a citação.
Foi proferido saneador-sentença, que julgou improcedentes a ação e as reconvenções, absolvendo do pedido os Réus e os reconvindos.

É desta decisão que a demandante apela, com as seguintes
conclusões:

1.- A douta sentença proferida, sem que tenha ocorrido produção de prova, julgou, sem fundamento legal bastante, não provada e improcedente a Ação, com base em que o que está em causa é um conflito entre os adquirentes em DUAS VENDAS EM DUAS ACÇÕES EXECUTIVAS, a primeira, a favor da demandante, X TÊXTEIS & IMÓVEIS, em 27/05/1997 e a segunda, a favor de Y - UNIPESSOAL Lda, em 06/11/2007, 10 anos, 5 meses e 15 dias mais tarde, da fracção autónoma designada pelas letras “..”, destinada a habitação, no 9º piso do bloco 2, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito no lugar do ..., freguesia de ..., ..., inscrita na matriz sob o artigo .../... e descrita na Conservatória do Registo Predial sob o nº ../..., sem que a primeira aquisição se mostrasse registada, contrariamente à segunda, o que implicava a PREVALÊNCIA desta.
2.- Estamos perante atos nulos decorrentes de venda de coisa alheia, que afetam e atingem as duas seguintes transmissões POSTERIORES à aquisição da demandante em 27/05/1997 - sendo que a VENDA efetuada, no dia 29/01/2007 pelos titulares inscritos, mas não proprietários, M. H. e mulher, M. R., à sociedade W IMOBILIÁRIA Lda, já foi anulada por douta sentença transitada em julgado, proferida no Processo nº 1118/09.0TJVNF, instaurado pela demandante, que correu termos na extinta Secção Cível - J 1, da Instância Local de ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Braga -:
I.- VENDA EXECUTIVA efetuada no dia 06/11/2007, na Execução nº 2984/04.0TJVNF do extinto 5º juízo cível do Tribunal Judicial da Comarca de ..., em que eram executados os aludidos titulares inscritos, não proprietários, M. H. e mulher, M. R., à sociedade Y - UNIPESSOAL Lda;
II.- VENDA, efetuada no dia 15/07/2008, por esta sociedade, a favor de M. L. e marido, J. P., que por sua vez, no mesmo momento, deram de HIPOTECA ao BANCO ..., S.A., negócios que foram e se mantém inscritos no registo.
3.- É ilegítimo e infundado o exame crítico da fatualidade dada como provada, que é feito na sentença ao compartimentar essas duas vendas, como se fossem alheias e autónomas uma em relação à outra.
4.- Na segunda venda judicial estamos perante uma venda de coisa alheia, nula, ao abrigo do disposto no artigo 892 do Códico Civil, pois o bem era e é propriedade da demandante apesar de não levado a registo e não dos executados/titulares inscritos.
5.- Esta nulidade não pode deixar de atingir os negócios jurídicos subsequentes e ùltimos, concretamente uma venda e uma hipoteca a favor de um banco, de 15/07/2008, ambos registados.
6.- Em 10 anos os executados M. H. e mulher, estiveram no centro de 3 transferências de propriedade: venda judicial, venda já anulada, por sentença transitada em julgado e venda judicial, situação que, caso não seja corrigida, atenta nomeadamente contra o respeito e o prestígio do próprio estado de Direito.
7.- A questão em causa nos autos, na jurisprudência, é versada, que se conheça, em dois acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 07/02/2013 e de 30/09/2014 respetivamente, sendo que no primeiro, no processo nº 3326/09.4TBVRF.P1.S1, fazem-se as seguintes considerações, que demonstram a complexidade da questão:
“(...)
“se é evidente e inquestionável que o exequente que se limitou a inscrever a penhora obtida a seu favor no registo não é terceiro em relação ao proprietário do bem (já que obviamente a faculdade, legalmente reconhecida ao credor, de unilateralmente penhorar bens do seu devedor/executado não é um negócio jurídico que seja susceptível de conduzir a uma aquisição derivada de direitos, provenientes de um mesmo autor ou transmitente), já se configura como muito mais discutível a posição do adquirente do bem no termo da acção executiva, tudo dependendo essencialmente do modo como se configurar a venda executiva (no caso dos autos, no âmbito de execução fiscal: quem é verdadeiramente o vendedor do bem - o Estado, ao exercer um poder coercitivo autónomo, que envolveu uma espécie de expropriação do direito objecto da execução; ou, pelo contrário, o transmitente do bem vendido judicialmente será ainda o devedor/executado, actuando o Estado em verdadeira subrogação deste, no exercício de um poder coercitivo que lhe permite dispor de direitos alheios no interesse da realização dos créditos fiscais?); e, muito em particular, o entendimento a adoptar depende decisivamente do juízo que se faça sobre as necessidades de tutela da confiança e segurança jurídica no domínio da venda executiva: deverá prevalecer sobre o interesse do verdadeiro proprietário que omitiu o registo da sua aquisição o interesse do adquirente em venda executiva que confiou inteiramente no registo nessa data existente e tratou de imediatamente consolidar a sua aquisição com a imediata feitura de registo a seu favor?
Merecerá, porventura, menor protecção a confiança de quem adquire um bem imóvel em venda executiva, confiando justificadamente no teor de registo existente, do que a confiança de quem, em situação paralela, adquire direitos reais no comércio ou tráfico jurídico, em negócio voluntariamente celebrado pelo próprio proprietário aparente? (...)”
8.- Está em causa a natureza jurídica da venda judicial em acção executiva, cuja discussão não se mostra encerrada.
9.- Deve considerar-se que o autor da transmissão da propriedade é o próprio executado e não o Estado, daí que a natureza de venda de coisa alheia seja inequívoca.
10.- A nulidade que se verifica não pode deixar de ter consequências legais nas esferas jurídicas das partes, nomeadamente de um adquirente que, não fora essa desconformidade entre duas realidades, viria a sê-lo e do próprio proprietário.
11.- Deve prevalecer a verdade substantiva sobre a verdade registral, sob pena de se infligirem danos patrimoniais importantes aos verdadeiros proprietários e estar em causa a protecção legal, basilar dada ao direito de propriedade num Estado de Direito, sendo que a primeira é algo de nuclear, fundador, basilar e essencial.
12.- Esta prevalência implica que a demandante mantenha a propriedade da fracção autónoma, devendo declarar-se a nulidade da venda judicial, com fundamento em venda de coisa alheia e da venda e da hipoteca que se lhes seguiram, também elas nulas, atenta a nulidade consequencial de que padecem, com cancelamentos dos respetivos registos.
13.- A douta sentença recorrida decidindo no sentido em que o fez, violou, pelo menos, o artigo 5º do Código do Registo Predial e o artigo 892º do Código Civil.
14.- Essa violação legitima a revogação e substituição da sentença recorrida por outra que, com todas as consequências legais, julgue a acção provada e procedente.
pelo exposto - requer-se a V. Exas. Senhores Juízes Desembargadores se dignem, com todas as consequências legais, julgar procedente e provido o presente recurso, revogando a douta sentença e substituindo-a por outra que julgue a acção provada e procedentes.”

O 2º Réu contra-alegou, reproduzindo-se em letra menor, pela sua extensividade, as suas
conclusões:

“1 O recurso interposto é tão só do julgamento de direito da sentença e da improcedência dos pedidos formulados pela A. com base na respetiva subsunção da factualidade dada como provada às postuladas, para o caso, normas jurídicas aplicáveis na unidade do sistema jurídico (artºs. 874º, 879º, a), 1316º, 1317º, 408º e 409º do C. Civil e artºs. 2º, a), 5º e 7º do C. Registo Predial).
2 A factualidade julgada provada na sentença, e pela sentença submetida à respetiva “valoração de direito” e relevante para o conhecimento da apelação, é essencialmente a seguinte:
a) Na execução movida por C.G. de ..., SA, contra M. H. e M. R., que correu termos sob o nº 4432/1992, na 1ª Secção da 3ª Vara Civel do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, foi vendida e adjudicada em 27-05-1997, à Autora a fração “..”, descrita na C. do R. Predial de ... sob o nº .../...-... e inscrita na matris predial sob o artigo ...-... (cfr. titulo de transmissão de fls. 9/verso. PONTO 1) de FACTOS PROVADOS.
b) Na execução movida por K-Ldª, contra M. H. e M. R. e R. & S., Ldª, que correu termos sob o nº 2984/04.0TJVNF, pelo 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de ... foi vendida e adjudicada em 06-11-2007 à 1ª Ré Y-Unipessoal-Ldª a (referida) fração “..”, descrita na C. do Reg. Predial de ... sob o nº .../... “..” e inscrita na matriz predial sob o artº. ...-.... Ponto 5 e 6) de FACTOS PROVADOS.
c) A aquisição da propriedade da referida fração adquirida pela 1ª Ré Y-Ldª antes referida no nº 2 – foi registada pela 1ª Ré, aos 23-11-2007, constante da inscrição G.3- Ap. 47/23-11-2007.PONTO 9) de FACTOS PROVADOS.
d) E sem que, a tal data, tivesse sido objeto de inscrição no C. Registo Predial a compra, referida supra sob o nº 1, outorgada pela A.PONTO 2) de FACTOS PROVADOS.
e) Por escritura pública de 15-07-2008, a 1ª Ré Y-Unipessoal,Ldª e os 2ºs Réus, M. L. e J. P., outorgaram a compra e venda da dita fração “..”, objeto da compra judicial outorgada pela 1ª Ré.PONTO 10) de FACTOS PROVADOS.
f) E tal aquisição foi registada aos 15-07-2008 – pela Ap. 27.PONTO 11) de FACTOS PROVADOS.
g) A Autora quanto à compra e venda judicial referida no nº 1, de 27-05-1997, apenas promoveu “registo provisório por dúvidas, a 13-01-2007, pela Ap. 92.E, registo este que caducou, conforme Anot. G4.16.07.2008, Ap. 1 (fls 65 de 72, de doc. 4 da P.I.).PONTOS 2 e 3 de FACTOS PROVADOS.
h) A 1ª Ré e os 2ºs Réus desconheciam que a Autora tivesse adquirido a fração em 1997PONTO 15) de FACTOS PROVADOS.
I – A inaplicabilidade ao caso dos autos dos artºs. 285º e sgts do C.C., e nomeadamente do artº. 291º
3 Os artºs. 285º e sgts do C.C., e nomeadamente o artº. 291º, só têm aplicação nos casos em que “a cadeia de negócios tem origem num terceiro, num intruso” que nunca foi titular do direito transmitido.
O que não ocorre quando se está perante a hipótese “especialmente regulada” na Lei, no artº. 5º, nºs 1 e 4, do C. Reg. Predial.
3.1 Pois que este preceito especial confere “legitimidade” e “plena eficácia” “para uma segunda alienação”, e “registada” se o adquirente da primeira não a registou e como tal, tal primeira alienação, é inoponível, ineficaz: ou seja, “mão produz efeitos”, sejam eles efeitos gerais ou especiais.
4 ASSIM, o Ac. STJ de 05-07-2007 (Proc. 07B1361.dgsi.net) e de 21-06-2007 (C.J. –STJ – 2007, 2º, Proc. 07B1847 dgsi.net. E, identicamente, Menezes Cordeiro (Reais – 1979,384).
5 ASSIM, verificando num caso o “pressuposto” dos artºs. 1º, 2º e 5º, nºs 1 e 4, do C. Reg. Predial – ao caso não é aplicável o artº. 291º do C.C..
6 MAS REALCE-SE, que mesmo que – e sem prescindir – se aplicasse ao caso dos autos o normativismo do artº. 291º do C. Civil – todavia, também, por esse mesmo preceito a (eventual) “declaração de nulidade ou anulação” das compras e vendas outorgadas pelos Réus, não prejudicaria os direitos adquiridos pelos Réus.
6.1 POIS, a “declaração de nulidade ou anulação” de negócio jurídico que respeite a bens imóveis não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiros de bos-fé, se o registo da aquisição for anterior ao registo da ação de nulidade ou anulação.
Salvo se “a ação for proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio” (artº. 291º, nº 2, do C.C.).
6.2 ORA, as compras e vendas outorgadas pela 1ª Ré e 2ºs Réus foram outorgadas e registadas, respetivamente em 2007 e 2008 (artºs. 9 a 13 da P.I.) – e a ação, em causa, só foi proposta em 13-09-2019.
III - A inaplicabilidade ao caso dos autos do artº. 892º do C.C..
7 O regime dos artºs. 892º e sgts., de nulidade – não se aplica em relação ao (legítimo) proprietário: face a esta a venda é ineficaz (res inter alios acta).Ac. R.P., de 28-01-2020 (C.J. 300, T I – p. 165).E, no mesmo sentido Vaz Serra (R. L. J. 106º,26) e Batista Lopes (Compra e Venda, 141). E, identicamente Raúl Ventura (O contrato de Compra e Venda no Cód. Civil – ROA, 40º, pág. 307) e A. Varela (Rev. L. J., 116º, 16). E Pires de Lima e A. Varela (Cód. Civ. Anot., II, 3ª ed. p. 189).
8 Por sua vez, o artº. 892º e sgts. do C. Civil - como o artº 291º - também não definem quando se verifica a “nulidade” da compra e venda.A assunção da nulidade duma compra e venda resultará da subsunção do caso concreto à Lei – quer às leis genéricas quer ás leis especiais que respeitem a tal caso concreto.
E “na concordância entre si e na globalidade” (Batista Machado) como supra já se desenvolveu (artº. 5º).
9 Ora tratando-se, no caso, de compras e vendas de imóveis, há que atender às normas legais gerais (artºs. 879º, 1305º e 1316º do C. Civil) e às normas especiais do Cód. do Registo Predial (artºs. 1º, 2º, 5º, nºs 1 e 4 e 7º).
9.1 E, conforme Ac. STJ de 18-01-2003,-I A nulidade cominada no artº. 892º do CC reporta-se às relações inter-partes (vendedor-comprador).
-II Nas relações com terceiros vale, em termos de eficácia, o prescrito na lei do registo predial.
-III Pelo que perante sucessivas aquisições derivadas incompatíveis a regra da prioridade da aquisição é substituída pela prioridade da inscrição no registo (STJ – 18-01-2003 – CJ/STJ – 2003 – 1º - pág. 106).
IV - A densificação dos artºs. 1º, 2º e 5º, nºs 1 e 4 do C. Registo Predial
10 Esta densificação do conceito de terceiros, do nº 4 do artº. 5º, foi introduzida pelo DL 533/99, de 11/12. Antes defendia-se essa concepção restritiva, no Ac. Uniformizador do S.T.J., de 3/99 – que densificava o conceito de “terceiros” para efeitos do disposto no artº. 5º do CRP como sendo “os adquirentes de boa-fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis sobre a mesma coisa”. E, abandonando-se, com esse AUJ, o definido conceito amplo doutro AUJ, nº 15/97.
11 ASSIM, só há que densificar o referido “conceito de terceiro”, para efeitos do registo predial, que consta do cit. nº 4, do artº. 5º do C.R.P..Ora, “autor”, significa, etimologicamente “a causa principal de uma coisa” (Dicionário Pratico de Lello & Irmão – Editores). Ou seja, “o Criador”, “o responsável pelo ato”. O “progenitor”.
12 Por sua vez, realce-se que é “indiferente” “a pessoa concreta” em si, que realiza a venda, se não age em nome próprio mas ao serviço e por conta doutrem – caso em que, então, relevante, como “autor”, é esse outrem.
12.1 Assim, também, nas “vendas judiciais” é indiferente a “pessoa concreta”, em si, que participa na venda ou a “Entidade Estatal” em que se realiza a venda: Escrivão, Agente de Execução, Mº. Juiz ou esta ou aquela “Sede”.
12.2 Pois que todos e qualquer, e em qualquer “Sede”, agem ao serviço do Estado e em representação do Estado. Pelo que “autor” da venda será sempre o Estado. E, se antes se entender que agem em “representação” (legal e imperativa) do executado – então também o “autor é comum”: porque será o (mesmo) executado.
a) - O “caso especifico” de duas “vendas judiciais”, do mesmo bem, em duas execuções contra o mesmo executado
13 O caso dos autos integra o caso especifico referido em epígrafe.
13.1 Ou seja, não estamos a cuidar de avaliar, por exemplo, o caso de um mesmo bem, ser objeto de uma “venda judicial” contra o executado-proprietário e em concatenação com uma “venda particular” desse mesmo bem, outorgada pelo próprio particular – proprietário-executado – após a outorga da “venda judicial”.
b) - “Venda Judicial” - Quem é o “autor”
14 Ora, existem duas correntes. Uma que considera que na “venda judicial” transmitente é o executado, embora “representado” pelo Estado, e com “representação legal” imperativa.
14.1 Outra corrente, e como defende Lebre de Freitas (A Ação Executiva, 5ª ed. pág. 345, nota 44) – “quem aliena é o Estado … no exercício de um poder de alienar que é de direito público …
O poder do Estado é um poder de autoridade originário … pelo qual o Estado Vende em nome próprio sobrepondo-se ao executado”.
E, em sentido idêntico, de que o “Estado vende em nome próprio, sobrepondo-se ao executado”, Vaz Serra (Realização Coactiva, p. 3071). E Alberto dos Réis (Da Venda, p. 443).
14.2 Assim, na Doutrina, a predominância é a de quem o “autor” (“o responsável pelo ato”, o “criador”, a “causa” do ato), na venda judicial é o ESTADO.
E, nesse sentido também decidiu o Acordão do S.T.J. de 07-07-1999 (C.J. – STJ – T.II, pág. 164) – de que “na venda executiva o executado é substituído no ato da venda pelo Juiz, enquanto órgão do Estado”.
15 ASSIM, se adotarmos que na Venda Judicial o autor é o Estado, então, no caso dos autos e em apreço – o “autor”, na primeira venda judicial de 27-05-1997, e do qual a X-SA adquiriu o direito de propriedade sobre a questionada fração autónoma “..”, foi o Estado. Mas, identicamente, então, também o “autor”, na segunda venda judicial de 06-11-2007, e da qual a 1ª Ré, Y-Unipessoal-Ldª, adquiriu o direito de propriedade sobre a referida fração autónoma “..” também foi o Estado.
15.1 E, assim, nessa concepção, e para efeitos do artº. 5º, nº 1 e 4 do C. Reg. Predial – na concatenação das duas “vendas judiciais” – a 1ª Ré, Y-Ldª, é “terceiro”, “protegido” pelo disposto no artº. 5º, nº 1, do C. Reg. Predial, dado que registou a sua compra sem que a A. tivesse registado a sua.
16 Mas o mesmo ocorre – se defendermos que na venda judicial, “transmitente é o executado”, embora com “representação pelo Estado”, e “representação legal e imperativa”. Pois – então também haverá coincidência de “autor comum”, nessa concepção, e na concatenação das duas referidas vendas executivas, de 27-05-1997 e 06-11-2007.
Pois, então, a 1ª Ré Y-Unipessoal-Ldª, adquiriu, por tal venda, do “executado”, “com representação pelo Estado”, a referida fração autónoma CP: como a A. X-SA, pela 1ª referida venda, igualmente adquiriu “do executado”, “com representação pelo Estado” a mesma fração ....
16.2 Só que a 1ª Ré è “terceiro” protegido pelo disposto no artº. 5º, nº 1, do C. Reg. Predial, porque registou a sua compra antes que a A. a tivesse registado: e assim a 1ª compra da A. “não produz efeitos” contra a 1ª Ré.
c) - Aplicabilidade do artº. 5º, nºs 1 e 4 do C. Reg. Predial ao caso de “duas vendasexecutivas”, sucessivas, do mesmo bem e em dois processos executivos em que o executado é o mesmo (o proprietário do bem vendido)
17 Desde já se realce que “se” se “entendesse” que quando há uma “segunda venda”, por um “autor comum”, do mesmo bem, identificado como propriedade do mesmo proprietário – ocorre uma “cadeia de negócios” que não tem origem no “verdadeiro titular do bem vendido”, e, como tal, sendo nula a segunda venda (por aplicação do artº. 892º do C.C.), então, teríamos que nunca teria cabimento, nem “real aplicação prática” do disposto no artº. 5º, nºs 1 e 4 do C.R. Predial.
17.1 E, o legislador, “a assim ser”, teria legislado no papel, ou como diz o Povo para “inglês vêr”!!!
Seria uma mera Lawin the books!
E não, the Law in action … Violando o “princípio” da “concretude da Lei” (Rui Alarcão).
18 Por sua vez, os preceitos dos artºs. 2º, 5º, nºs 1 e 4 e 17º do C. Reg. Predial aplicam-se tanto a compras e vendas privadas entre si – como a duas compras e vendas executivas, entre si.
Nunca, na Doutrina ou na Jurisprudência se defendeu tal hipótese paradoxal de interpretação restritiva. Basta aceder ao Código do Registo Predial, anotado, por Isabel Pereira Mendes (14ª ed., 2004, Almedina) ou Blandina Soares (2009, Almedina).
18.1 Realce-se que o caso dos autos não é da concatenação duma “venda executiva” com uma “venda negocial”.
Mas a concatenação de duas “vendas executivas, em processos executivos em que é o mesmo o executado e é o “mesmo bem” a transmitir-se do património desse mesmo executado.
18.2 E, o Ac. T. R. L., proferido no Proc. 3326/09.4TBVRF.P1.S1, bem decidiu que:
(…) não pode deixar de entender-se haver um transmitente comum nessas duas alienações: quer se considere o transmitente o executado, quer se considere o tribunal, no exercício de uma função jurisdicional autónoma, essa posição jurídica é a mesma em ambas as ações executivas, sendo indiferente admitir que o autor comum da transferência foi o executado ou o tribunal.”
18.3 E também há que salientar que, como se realça na sentença recorrida, a pág. 21:
“No caso concreto, em primeiro lugar, quando foi realizada a segunda venda judicial a favor da 1ª Ré, a penhora que esteve na sua origem só foi inscrita no registo em 30-09-2005, ou seja, depois da primeira venda judicial realizada à Autora, a qual ocorreu a 27-05-1997, pelo que aquela penhora não foi abrangida pelo efeito extintivo dos direitos de garantia anteriores proclamado pelo artigo 824º/2 do C. Civil.”
E, aliás, realce-se que o disposto neste artº. 824º, só pode existir se a compra executiva em causa “produzir efeitos”, à luz do artº. 5º, nºs 1 e 4 do C. Reg. P..
19 ORA, as razões da lei, para valer entre “vendas sucessivas”, o “regime especial” do artº. 5º, nºs 1 e 4” tanto valem para “vendas particulares”, entre si, como para “vendas judiciais”, entre si, em que o executado seja o mesmo e a transmissão da propriedade seja do mesmo bem do executado.
19.1 Se tivermos em conta a “ratio legis”, a “racionalidade” e a “razoabilidade” e a “ponderação lúcida” dos “interesses públicos e do cidadão” em causa e a letra da Lei (artº. 9º do C.C.).
19.2 Não se vê justificação, pois, para uma interpretação restritiva do cit. artº. 5º, nºs 1 e 4 – para se aplicar tão só à concorrência de “vendas privadas” e excluindo da sua aplicação a concatenação de “venda executiva sucessiva”.
19.3 Pelo que tal interpretação restritiva, a ocorrer, será inconstitucional. Pois viola o “princípio constitucional da proibição do défice ou da insuficiência”
19.4 Aliás, excluir de tal regime especial as “vendas executivas”, sucessivas, e com as características referidas e – como existem no caso concreto subjudice – é, até trazer “desprestígio” aos Tribunais e “desconfiança na Justiça”, por parte do Cidadão Comum.
19.5 E, aliás também há que ter em conta que “se” o regime especial do artº. 5º, nºs 1 e 4, não se aplica a vendas executivas, sucessivas e entre si – e, então, a 2ª venda judicial é nula - que, então na relação entre o particular comprador e o vendedor, o Estado – estaremos na situação duma venda nula, cujo regime – nessa relação – é a dos artºs. 892º e sgts. do C. Civil: de venda de coisa alheia.
19.6 E, tratando-se, então, de coisa alheia, assim, o comprador prejudicado terá o direito de pedir indemnização ao Estado pelo “interesse contratual positivo” em que ficou lesado!
Ou seja, quem vai suportar os custos de tal interpretação restritiva do artº. 5º, nºs 2 e 4 do C. R. Predial – será o Povo!
20 E, na súmula de tal interpretação restritiva, e no contexto do antes realçado, também haverá inconstitucionalidade de tal densificação normativa do, em causa, artº. 5º, nºs 2 e 4 do C. Reg. Predial.
E, por violação do “principio da proibição constitucional do excesso” (artº. 2º da C.R.).
20.1 E, tal princípio é relevante na “Triple Vertente da necessidade, adequação e proporcionalidade, à luz da doutrina de ponderação de interesses” (Ac. STJ, de 17-02-2009, Proc. 159/07.6TUPRT-D.P1.S1). Está ínsito no artº. 2º da C.R. (Ac. T. C. 612, de 13-12-2011).
21 E tal causará óbvio Alarme Social ao Cidadão Comum – que não entenderia tal perda de crédito e tal desprestigio acarretado para os Tribunais, como tal ofensa do princípio da igualdade – e por mais que se invoquem razões que, para o Cidadão Comum não será mais que alegações exotéricas.
21.1E, por fim, toda essa insegurança para o comércio jurídico, como tal descrédito e desprestigio da Justiça, como tal custo ou fardo para o Povo – se teve origem, foi na “negligência” do comprador em não promover o registo predial da respetiva compra!
E, racionalmente e razoavelmente – a sibi imputat.
TODAVIA, a final – nessa interpretação restritiva - quem suportaria as consequências não era ele, mas os “outros”
V - EQUIDADE
a) 22 A improcedência dos pedidos da A. é postulada também pela equidade.
Na verdade, pelo lado do Réu contestante, e dos demais, desde logo, estes em nada contribuíram para a situação de duplicação de vendas da dita fração ....
22.1 E, em segundo lugar, a anulação da compra do réu contestante e da hipoteca outorgada com o Réu BCP redundaria, no caso, dados os escassos rendimentos do casal, num flagelo financeiro e num desaire de vida. E, como referido, para o qual em nada contribuíram.
22.2 Já, quanto à A., a importância dos pedidos, apenas consubstancia, por um lado, um mero mau “negócio” da vida da empresa imobiliária, e, por outro lado, que lhe é inteiramente imputável.
b)23 E, por outro lado, é de presumir que a A., como “imobiliária”, bem conhece a existência desse “ónus, legal” do registo Predial! Mas, então, tem cabimento doutrinal e racional perguntar: que interesses poderão estar em durante anos e anos, não se tornar pública, no registo predial, tal aquisição!
Tal será uma indagação que para o caso-tipo, objetivo, caberá à Doutrina fazer.
VI - Direito Indemnizatório
24 ALIÁS, se se admitir – e sem conceder – que a segunda venda executiva da fração em causa outorgada com a 1ª Ré, Y-Ldª é nula e por força do normativismo dos artºs. 291º e 892º e sgts. do C. Civil.
25 Então, o vendedor, no caso o Estado é obrigado a indemnizar o comprador de boa fé, ainda que tenha agido sem dolo nem culpa, e pelos danos emergentes. Conforme dispõe o artº. 899º do C.C..
VII - A inócua fundamentação das alegações da recorrente – para sustentar a procedência do recurso
26 No item 3 das Conclusões alega a recorrente que é “ilegítimo e infundado o exame crítico … que é feito na sentença”, em relação às duas vendas judiciais que constam da factualidade dada como provada.
Todavia, nada se invoca de “normativismo legal” para fundamentar tal crítica que, como tal, é inócua: pois há que fundamentar o que se sustenta.
27 No item 6 das Conclusões alega-se que há que “corrigir” a situação de durante 10 anos os executados estarem no centro de 3 transferências de propriedade – sob pena, “caso não se corrija”, de se “atentar nomeadamente contra o respeito e prestígio do próprio Estado de Direito”.
27.1 ORA, foi o que exatamente fez a sentença recorrida – ao decidir que a venda prevalente, da dita fração ... que inicialmente foi propriedade dos ditos executados – é a venda judicial outorgada à Ré Y-Unipessoal,Ldª, de 06-11-2007, e devidamente inscrita no Registo Predial.
28 Alega a recorrente, no nº 11 das Conclusões – que “deve prevalecer a verdade substantiva sobre a verdade registral”.
28.1 ORA, na apreciação do tipo do caso concreto sub judice – não existe “nenhuma verdade substantiva” a prevalecer!!
Pois, a “realidade substantiva”, só valerá na sua submissão à Lei e sendo a “obediência à Lei e à Constituição” obrigatórias para o Juiz do caso .
28.2 E, por sua vez, a “verdade registral” – é a da “vontade da lei”.
Como a “prevalência” da “realidade registral”, é a que resultar da Lei – de obediência obrigatória para os Tribunais.
E nem sequer “o dever de obediência à lei” pode ser afastada sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo (artº. 8º, nº 2, do C.C.).
29 ASSIM, num Estado de Direito, o que “é algo de nuclear, fundador, basilar e essencial” – é o respeito pela LEI!
E, no caso, a LEI: é a concatenação, entre si, de todas as normas que regem as compras e vendas de bens imóveis.
Ou seja, as “normas gerais” (artºs. 879º, a) e 1316º do C.C.) e as “nomas especiais” (artº. 1º, 2º e 5º, nºs 1 e 4 do C. R. Predial).
29.1 E cuja legislação não pode sequer deixar de ser-se obediente com pretexto de ser injusta ou imoral (cit. artº. 8º, nº 2, do C.C.).
30 Consequentemente, num Estado de Direito, e para sustentar a revogabilidade da sentença recorrida, “por violação de normas jurídicas” (artº. 639º, nº 2, do C. Pr. C.) – tais conclusões são meramente inócuas!
ALIÁS, se assim não fosse, não se viveria, em Portugal, num Estado de Direito – rasgando-se os artºs. 2º, 20º, nº 4 e 203º da C.R. e as referidas “normas legais” do C. Reg. Predial … que passariam à história, de tempos idos.
II - Inexistência de “caso julgado” da sentença proferida no Proc. 1118/09.0TJVNF do Juízo local Cível de V.N. F. – extensível ao litigio dos presentes autos
31 Como bem realça a sentença recorrida – “… na ação com o nº 1118/09.0TJVNF … foi entendido como inadmissível a apreciação da validade da venda judicial realizada à ^ª Ré Y-Ldª, e, por consequência, a sentença não se lhe refere”
31.1 “ Donde, ficou de fora desse processo a apreciação judicial da validade do negócio celebrado entre os aqui 2ºs Réus e a 1ª Ré Y, assim como, por despacho proferido nesse processo o controlo da validade da venda judicial realizada à 1ª Ré Y”.
31.2“Assim, … essa decisão não faz caso julgado a respeito da venda judicial efetuada à 1ª Ré (por ter sido excluída do âmbito de cognição a efetuar pelo Tribunal) nem sobre a validade da transmissão posterior a favor dos 2ºs Réus (que nunca se colocou naquele processo)…”
32 POIS, NA REFERIDA Ação 1118/09.0TJVNF – a primeira compra e venda, em que interveio a A. como compradora, foi uma “venda executiva”, em que o vendedor foi o Estado. E, a segunda venda aí avaliada foi uma “venda negocial”, em que foram vendedores, os já antes executados, M. H. e Esposa e a aí 1ª Ré W-Imobiliária-Ldª.
E, até, estando tais vendedores de má-fé.
32.1 ORA, já na presente ação o que se julga é a validade das duas compras e vendas executivas, em que na segunda foi comprador a 1ª Ré, e eram executados os mesmos M. H. e esposa. E em que tal compradora (1ª Ré) e a 2ª Ré estavam de boa-fé. E, em que a 1ª Ré registou a compra antes da A.
33 E, também, “não é a decisão que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo” (Miguel Teixeira de Souza, Ensaio sobre o NOVO Proc. Civil, p. 578).
Na verdade, há que proceder “à aferição do âmbito e limites da decisão,” dos precisos termos e limites em que julga” (artº. 673º do C. Pr. C.) – como realça o Ac. STJ, de 13-07-2010, Proc. 464/05.6TBCBT. S1, dgsi.net) – e só “nesses precisos termos e limites” se circunscreverá a sua autoridade de caso julgado.
34 ORA, no referido Proc. 1118/09.0TJVNF a “decisão” considerou e avaliou que a “venda particular” feita pelo próprio executado à Ré W-Ldª, na interação “dessa compra” com a anterior “compra executiva” efetuada pela A., não interferia na prevalência da venda executiva.
34.1 E, como tal, se devendo considerar que a A. adquiriu a propriedade do prédio, sendo seu proprietário: nesses precisos termos e limites em que avaliou e decidiu.
35 E, assim, nesse processo, não foi proferida sentença cujo “conteúdo normativo”, consubstancie o “julgado da questão” “específica” - de se saber e decidir, “se” tendo embora a A. adquirido a “propriedade” da fração em causa, fração “..”, pela alegada compra judicial (artº. 1º da P.I.) – “todavia” “essa aquisição”, esse “direito assim adquirido”, é, ou não, oponível a outrem que como “terceiro” também adquiriu, por “compra executiva” a mesma fração e registou tal compra, na Cons. do Registo Predial: e assim tratando-se dum “autor comum”.
36 ORA, a invocação da “autoridade de caso julgado” pressupõe uma decisão proferida em processo anterior, cujo objeto se insere no objeto da segunda” (Ac. TRG de 7-8-2014, Proc. 600/12TBFLG.G1, 1ª Secção).
E, realçando A. dos Reis que “o que conta, pois … é a posição das partes quanto à relação jurídica substancial, e não a sua posição quanto à relação jurídica processual” (C. Proc. Civil, Anotado, III, pág. 94).
E, também “não há autoridade de caso julgado quando seja diferente da primeira o facto constitutivo invocado, enquanto acontecimento concreto e não como facto jurídico abstrato” (Ac. STJ de 08-03-2018 – CJ – STJ – II, 2018).
37 ORA, desde logo, “o acontecimento concreto” julgado no dito proc. 1118/09.0TJVNF – foi o de se considerar nula a “compra e venda negocial” do prédio em causa, em que foi outorgante vendedor M. H. e Esposa e comprador a, aí Ré, W - Imobiliária, Ldª, celebrado aos 29-01-2007 – e em revelia da “compra executiva”, em que em 27-05-1997, os A.A. tinham comprado o mesmo prédio.
E, em segundo lugar, também “o objeto”, da decisão proferida no referido Proc. 1118/09.TJVNF “não se insere no objeto” do processo pendente.
Pois, naquele tratava-se de avaliar, entre si, da prevalência duma “venda executiva”, em que foi “autor” o Estado e uma “venda negocial privada”, em que foi “autor” o executado.
E, em terceiro lugar, também as partes – no dito processo 1118/09.0TJVNF e neste processo – “não são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica”.
38 E, de qualquer modo – e sem prescindir – realce-se que está decidido na sentença recorrida de que a decisão proferida na ação nº 1118/09.0TJVNF “não faz caso julgado” quanto ao objeto do litígio dos presentes autos
E por sua vez, tal decisão transitou em julgado, nestes autos.
VIII Improcedência do Recurso, por falta de fundamentos legais
39 A sentença recorrida, na sua decisão final é exaustiva, racional e ponderadora da devida indicação, interpretação e aplicações das normas jurídicas correspondentes ao caso (artº. 607º, nº 3, do C.Pr.C.).
40 Aplicando, ao caso dos autos, (de duas “vendas judiciais executivas”, sucessivas, do mesmo bem) quer as normas legais gerais quer as normas especiais, pertinentes ao caso, e “numa coerência intrínseca da unidade do sistema jurídico”.
E, assim, chamando à colação não só as regras gerais da transmissão da propriedade imobiliária (nomeadamente, artºs. 879º, a), 1316º e 1317º, a) do C. Civil), como as “normas especiais” do Cód. de Registo Predial (DL. 224/84, e suas alterações, artºs. 1º, 2º, e 5º, nºs 1 e 4).
40.1 E, assim, e em concordância quer com a Doutrina, quer com a Jurisprudência predominantes, assumindo que o caso dos autos é o da concorrência de duas “compras e vendas judiciais”. Em que havendo “um autor comum”, o Estado – então a 1ª venda executiva, porque não foi registada antes da 2ª venda, e do registo desta, “não produz efeitos” contra a 1ª Ré, compradora na 2ª “venda judicial” e que a registou primeiro.
40.2 E, normas essas que são de obediência obrigatória, como dispõem os artºs. 2º, 20º, nº 4 e 203º da C.R.; artº 4º da LOSJ e artº. 607º, nº 3, do C. Civil. E muito especialmente o artº. 202º, nº 2, da C.R. que determina que “na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.
41 E, se a 1ª venda judicial, em que foi compradora a A., de 27-05-1997, “não produz efeitos” relativamente à 1ª Ré, Y-Unipessoal, Ldª, então a A. não adquiriu o direito de propriedade que era património dos referidos executados M. H. e M. H. e M. R..
42 - E, assim, sendo também, por sua vez, é plenamente válida e legítima a compra e venda outorgada pela 1ª Ré Y aos 2º Réus, M. L. e J. P., celebrada e registada aos 15-07-2008. E, com mútuo, garantia por hipotecas, contraídas entre os 2ºs Réus e o 3º Banco Réu – também.
42.1 Pois, se tal vendedor era “legitimo” – então também os 2ºs Réus “adquiriram” por tal compra, dum vendedor legitimo a propriedade da fração “..”, em litigio, e na “plenitude e exclusividade dos direitos de uso, fruição e disposição” (artºs. 874º, a), 1316º e 1317º, a) do C.C.).
43 E, então, quanto a tais vendas, e também na sua correlação com o A., não são aplicáveis os regimes legais nem dos artºs. 892º e sgts. (venda de bens alheios), nem do artº. 291º do C. Civil.
44 PELO QUE, não consubstanciando a decisão recorrida a violação de nenhuma norma jurídica; nem tendo havido qualquer erro de interpretação ou de aplicação das normas que constituem fundamento jurídico da decisão; e nem tendo ocorrido qualquer erro na determinação da norma aplicável (artºs, 677º, 1, e 639º, 2, do C. Pr. C.): - não pode o recurso deixar de ser julgado improcedente.”.

II- Objeto do recurso

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º nº 2 do mesmo diploma.
As questões devem ser conhecidas por uma ordem lógica, começando-se pelas que determinem a decisão a dar às demais.

Assim, tendo em atenção as únicas questões levantadas pela Recorrente é questão a conhecer neste acórdão:

1) Se ocorrerem duas aquisições sucessivas do mesmo prédio em processos executivos dirigidos contra o mesmo executado e a primeira venda não tiver sido registada em data anterior à segunda, qual delas prevalece, face ao disposto nos artigos 892º, do Código Civil e 5º, nº 1, do Código do Registo Predial.

III - Fundamentação de Facto

A sentença vem com a seguinte matéria de facto provada:
1) No âmbito da execução ordinária movida por COMPANHIA GERAL DE ..., S.A., contra M. H. e M. R., que correu termos sob o n.º 4432/1992, na 1ª Secção da 3ª Vara Cível do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, foi penhorada, vendida e adjudicada à Autora, em 27.05.1997, a fração autónoma designada pelas letras “..”, correspondente a um apartamento sito no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../...-... e inscrita na matriz predial sob o artigo ...-... (cfr. título de transmissão de fls. 9/verso).
2) A Autora promoveu o registo da referida aquisição em 13.12.2007 (cfr. inscrição G-4 constante de fls. 37/verso, da certidão da descrição predial relativa à fração “..”).
3) Tal registo foi lavrado, provisoriamente, por dúvidas, tendo caducado (cfr. Inscrições G-4 constante de fls. 37/verso, da certidão da descrição predial relativa à fração “..”).
4) Por douta sentença proferida no âmbito do processo nº 1118/09.0TJVNF, que correu termos no J1, Secção Cível, Instância Local de ..., Tribunal da Comarca de Braga, foi decidido o seguinte: “Nos termos do exposto, julgo a ação procedente, por provada e, em consequência: a) condeno os réus a reconhecer o direito de propriedade pleno da A. sobre a fração autónoma “..”, melhor identificada nos autos;
b) declaro nulo o contrato de compra e venda da sobredita fração, celebrado entre os 1ºs RR. e a 2.ª R..
c) determino o cancelamento do registo da aquisição a favor da 2ª R. do registo de aquisição a favor da 2ª R., designadamente a inscrição G-2 AP. 20/300107” (cfr. cópia da sentença de fls. 132 a 136).
5) No âmbito do processo executivo movido por K – PAVIMENTOS INDUSTRIAIS, LDA., contra M. H., M. R. e R. & S. – CONSTRUÇÃO CIVIL E OBRAS PÚBLICAS, LDA., que correu termos sob o nº 2984/04.0TJVNF, pelo 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de ... foi penhorada a fração “..” em data posterior à venda a que se alude em 1) (cfr. inscrição F-3 constante de fls. 37, da descrição predial relativa à fração “..”).
6) Penhora essa que foi registada através da inscrição F-3 Ap. 09/300905 (cfr. Inscrição F-3 constante de fls. 37, da descrição predial relativa à fração “..”).
7) No processo executivo identificado em 5), em 06.11.2007, teve lugar a venda judicial da fração penhorada, mediante propostas em carta fechada, tendo sido aceite a proposta apresentada pela 1ª Ré Y, no valor de € 32.500,00 (cfr. título de transmissão e auto de abertura de propostas em carta fechada de fls. 242 e 242/verso a 243, respetivamente).
8) Por conseguinte, foi-lhe adjudicado o aludido imóvel, após o pagamento integral do preço cfr. título de transmissão e auto de abertura de propostas em carta fechada de fls. 242 e 242/verso a 243, respetivamente).
9) A aquisição da propriedade da referida fração foi registada pela 1ª Ré Y, constando da inscrição G-3, Ap. 47/23112007 (cfr. inscrição G-3 constante de fls. 37/verso, da certidão da descrição predial relativa à fração “..”).
10) Posteriormente, por escritura pública celebrada a 15.07.2008, a 1ª Ré Y declarou vender aos 2ºs Réus, que, por sua vez, declararam comprar, a aludida fração, pelo preço de € 60.000,00 (cfr. certidão da escritura de fls. 248/verso a 251).
11) Tal aquisição foi registada, constando da Ap. 27 de 2008/07/15 (cfr. inscrição G-5 constante de fls. 37/verso, da descrição predial relativa à fração “..”).
12) O preço da compra e venda referida em 10) foi financiado pelo 3º Banco Réu, através de acordo de mútuo, cujo reembolso foi garantido, entre o mais, através da constituição de duas hipotecas sobre o imóvel registadas sob as Aps. 28 e 29, ambas de 2008/07/15 (cfr. escrituras de mútuo com constituição de hipoteca de fls. 248/verso a 258 e inscrições C-4 e C-5 constantes de fls. 37/verso e 38, da descrição predial relativa à fração “..”).
13) A ação que correu termos sob o nº 1118/09.0TJVNF, no J1, Secção Cível, Instância Local de ..., Tribunal da Comarca de Braga, foi inscrita no registo predial através da AP. de 2593 de 2012/07/31 (cfr. AP. 2593 constante de fls. 24/verso, da descrição predial relativa à fração “..”).
14) Na ação referida em 13):
a) Foi apresentada petição inicial, na qual a ali autora (a sociedade X) pediu a condenação dos ali réus 1) M. H. e M. R., 2) W – IMOBILIÁRIA, L.DA (doravante W) e 3) Y: “a) A reconhecer o direito de propriedade pleno da A. sobre a fração autónoma “..”; B) Ser declarada a nulidade da venda judicial da mesma fracção efectuada a favor da 3ª R. C) Ser declarada a nulidade do contrato compra e venda da sobredita fração, celebrado entre os 1º RR e a 2ª R; D) Proceder-se ao cancelamento do registo da aquisição a favor da 2ª R., designadamente, a inscrição G-2 AP. 20/300107; E) Proceder-se ao cancelamento do registo da aquisição a favor da 3ª R., designadamente, a inscrição G-3 AP. 47/23112007” (cfr. certidão de fls. 156 a 163; vd. maxime fls. 156/verso a 161);
b) Foi proferido despacho a 24.07.2012, no qual indeferiram os pedidos formulados nas als. A) e B), da petição inicial, “face à impossibilidade do seu conhecimento” (cfr. certidão de fls. 156 a 163; vd. maxime fls. 161/verso a 163);
c) No despacho aludido em b), consignou-se que os pedidos a conhecer nessa ação eram os seguintes: “a) As rés sejam condenadas e reconhecer o direito de propriedade pleno da A. sobre a fração autónoma “..”; C) Ser declarada a nulidade do contrato de compra e venda da sobredita fração, celebrado entre os 1º RR e a 2ª R; D) Proceder-se ao cancelamento do registo da aquisição a favor da 2ª R., designadamente, a inscrição G-2 AP. 20/300107” (cfr. certidão de fls. 156 a 163; cfr. maxime fls. 162/verso).
d) No despacho referido em c), determinou-se o registo da ação (cfr. certidão de fls. 156 a 163; vd. maxime fls. 163).
e) Foi proferido despacho a 26.06.2013, a admitir o incidente de intervenção principal provocada de M. L. e J. P. (cfr. cópia dos despachos que consta de fls. 127 a 128), tendo estes citados em data anterior a 02.08.2018 (cfr. cópia dos AR’s de fls. 121 e 121, os quais, sendo ilegíveis quanto à data da sua assinatura, deles consta o registo de entrada na Secretaria do Tribunal a 02.08.2013).
15) A 1.ª Ré e os 2.ºs Réus desconheciam que a Autora tivesse adquirido a fração em 1997 (facto admitido por acordo).
*
IV- Fundamentação de Direito.

Discute-se aqui se a aquisição da fração autónoma dos autos em compra executiva efetuada pela Autora, não registada em data anterior à do registo da venda judicial posterior, é oponível a este último adquirente e aos que, de boa-fé, lha adquiriram e vieram a constituir direitos reais de garantia sobre ela (hipotecas).
A Recorrente, para ver reconhecido o seu direito sobre os posteriores adquirentes, defende que na segunda venda judicial estamos perante uma venda de coisa alheia, visto que o bem havia anteriormente sido adquirido por si, o que determina a nulidade da venda, a qual atinge os negócios jurídicos subsequentes. Afirma ainda que, quando estão em causa duas vendas judiciais, o Autor da transmissão da propriedade é o executado. Defende a prevalência da verdade substantiva sobre a registal, concluindo que a sentença violou o artigo 5º do Código do Registo Predial e o artigo 892º do Código Civil.
Vejamos ambas as normas e como se podem concatenar no presente caso, o que passa pela análise da velhíssima questão da noção de terceiro para efeitos de registo, visto que aqui não se põe em dúvida que a venda efetuada em segundo lugar, nos termos do artigo 892º do Código Civil, pode ser considerada alheia.
Assim, seria despiciendo discutir aqui se a nulidade prevista no artigo 892.º do Código Civil, pela venda de bens alheios, se refere apenas à relação entre o vendedor e o comprador de coisa alheia, e se quanto ao “verdadeiro” proprietário o vício se traduz na completa ineficácia.
O que se discute é a interferência dos efeitos do registo (ou da falta dele em tempo oportuno) na possibilidade do primeiro adquirente opor o seu direito àquele que a declarou adquirir posteriormente a quem já não podia dispor de tal direito, mas registou anteriormente, bem como os efeitos dessa aquisição perante os terceiros que, de boa-fé, adquiriram posteriormente à Autora, e registaram o seu direito (aquisição esta efetuada e registada já depois da caducidade do registo provisório que a autora entretanto efetuara do seu direito).
O mesmo é dizer, importa verificar se o facto da segunda venda judicial referida nos autos se dever considerar sobre bem alheio, por o bem ser da Autora, visto que a adquiriu pela primeira venda judicial (em 1997), pode ser oposto ao 1º Réu que o adquiriu em segundo lugar, também numa venda judicial (em 2007), mas que logo o registou (anteriormente aos registos da Autora) e aos 2ºs Réus que, negocialmente, o adquiriram ao 2º Réu, registando tal venda (em 2008) e ao credor hipotecário que financiou essa aquisiçao.

O Registo Predial

O registo predial destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário (artigo 1º do Código do Registo Predial).
Esta publicidade é necessária, porque os direitos reais têm eficácia perante terceiros, pretendendo-se que o registo corresponda à realidade substancial da situação jurídica dos prédios para que o comércio jurídico funcione com segurança.
Porque vigora como regra no nosso sistema jurídico o princípio da consensualidade, a eficácia real decorre do próprio contrato, por meros efeitos da sua celebração, não dependendo deste modo do registo, como dispõe o artigo 408º do Código Civil. Hoje em dia o registo é obrigatório (artigo 8ºA do Código do Registo Predial), pelo que em princípio não deveria haver conflitos entre o transmitido substantivamente e o registado.
Por outro lado, por força do artigo 5º nº 1 do Código de Registo Predial, “os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respetivo registo”. Assim, apesar do princípio da consensualidade e do título, é necessário levar a registo os factos aquisitivos dos direitos para que se consolide a eficácia erga omnes anteriormente obtida. Enfim, pode-se dizer que antes do registo a eficácia do ato jurídico é vulnerável.
No entanto, nem sempre aquilo que consta do registo corresponde à realidade substantiva, nomeadamente, entre muitas outras situações, porque o adquirente do prédio não registou o ato substantivo (anteriormente a 2008 o registo não era sempre obrigatório) ou porque terceiros, que não são os titulares do direito segundo as regras substantivas, registam atos inválidos, ou porque se duplicam as descrições prediais sobre um prédio. Assim, por vezes verificam-se desconformidades entre estas realidades.
Importa, nesses casos, definir quem vê defendida a sua situação jurídica, mormente quando todos os intervenientes estão de boa-fé e confiaram na fé pública do registo.
Existem normas, quer no Código Civil, quer no Código do Registo Predial, que regulam estas situações, admitindo a jurisprudência e a doutrina que circunstâncias há em que o registo acaba por atribuir efeito a uma aquisição aparente que de outra forma a não teria.
Discute-se aqui a aplicação do artigo 5º, nº s 1 e 4, do Código de Registo Predial.
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O artigo 5º do Código do Registo Predial

Colocadas estas linhas gerais, vejamos o que nos diz o artigo 5º do Código do Registo Predial, que a Recorrente colocou no centro da discussão, por oposição à invalidade da venda efetuada à 1ª Ré, quanto à oponibilidade do seu direito nestas circunstâncias (não registado anteriormente ao registo da posterior aquisição pelo 2º Réu).
O nº 1 do artigo 5º deste Código determina que “Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respetivo registo”. Assim, caso o adquirente e titular do direito, não registe a sua aquisição, não pode opor o seu direito contra terceiros, ou seja, não pode invocar perante terceiros a eficácia erga omnes do seu direito.
Por seu turno, o nº 4 explana que terceiros, para efeitos de registo, são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Esta última norma, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 533/99, de 11 de Dezembro, teve em vista sanar as divergências quanto à noção de terceiros para este efeito, as quais tinham dado origem a dois acórdãos de uniformização de jurisprudência em sentido díspar com intervalo de cerca de dois anos (15/97 e 3/99).
Este último acórdão, de 18 de maio de 1999, definira que “terceiros, para efeitos do disposto no artigo 5.º do Código do Registo Predial, são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa”, tendo em conta a boa-fé, a qual não veio a integrar o conceito legal que se lhe seguiu.
Esta norma afastou o conceito amplíssimo de terceiro (que considerava como terceiros aqueles que adquiram direitos incompatíveis ou inconciliáveis, independentemente da sua origem, sufragado no AUJ nº 15/97), mas manteve a discussão sobre se devem considerar considerados terceiros aqueles que adquirem de um autor ou transmitente comum direitos incompatíveis, (sufrada no AUJ nº 3/99), quer a aquisição tenha sido por via negocial ou se também se devem integrar os que adquiriram tais direitos por via não negocial, como venda judicial (mas de um autor comum).
O afastamento do conceito amplíssimo de terceiro funda-se no “modo como está organizado entre nós o instituto do registo predial”, visto que o mesmo não tem função constitutiva e não pode assegurar a existência efetiva do direito da pessoa a favor de quem esteja registado um prédio, mas só que, a ter ele existido, ainda se conserva – ainda não foi transmitido a outra pessoa, como expressou Professor Manuel de Andrade, Negócio Jurídico, Reimpressão, Coimbra, 1992, p. 20 e que “a segurança resultante de um ato que a generalidade das pessoas não assimila bem, sobretudo desconhece, ou conhece vagamente, os efeitos da falta do registo, é contrariada pela insegurança e intranquilidade do reverso da situação: após se comprar, pagar e cumprir a formalidade, essa sim, ritologia bem assimilada e integrada no acervo cultural das populações, consubstanciada em escritura no notário, depara-se, surpreendentemente, com o objeto da compra a pertencer a outrem, por efeito (constitutivo) de um registo, com a agravante de poder perder-se o valor do preço escrupulosamente pago.”, como se escreveu no citado AUJ 17/99.
Ou, numa explicação mais atual, referindo situação não coincidente, mas que demonstra o perigo que pode advir da conceção amplíssima de terceiro: “Nos casos de falsidade do registo, em que, por exemplo, B obteve um registo falso, sem que tenha celebrado qualquer negócio jurídico com o verdadeiro proprietário (A) e transmitiu a C, que confiou na aparência e registou a sua aquisição, a proteção imediata do terceiro representa uma expropriação do verdadeiro titular, à responsabilidade de quem não pode ser imputada a perda do seu direito, pois nestas situações pode ser impossível ou muito difícil ter conhecimento do registo falso (…) Não basta a mera actuação com base num registo incorrecto (…) Tal permitiria, no nosso sistema, que se verificassem autênticas expropriações do verdadeiro proprietário, sem o concurso deste, e por mero erro dos serviços registrais. O princípio da fé pública do registo tem necessariamente, nos sistemas de registo declarativo, um âmbito de aplicação mais limitado, e não representa um caso de tutela da aparência registal” - Maria Clara Pereira de Sousa de Santiago Sottomayor, Invalidade e Registo, a Protecção do Terceiro Adquirente de Boa Fé, Almedina, Coimbra, 2010, pp. 717-718.
Assim, perante duas vendas sucessivas do mesmo imóvel, pelo mesmo autor, há que atender às normas gerais dos artºs. 879º, a), 1316º, 1317º, a), do Código Civil. No entanto, havendo desconformidades registais, há também que verificar o que dispõem as normas especiais dos artigos 2º e 5º, nºs 1 e 4 e 7º do C. Registo Predial, sendo pacífico que, caso se entenda que os adquirentes são entre si terceiros e se a primeira compra e venda não for registada antes do registo duma segunda compra e venda, do mesmo autor e do mesmo bem, a primeira compra não produz efeitos contra o segundo comprador.
Mas, como se disse, ainda hoje se discute o conceito de terceiro, embora a discórdia se situe essencialmente em descobrir se é de “excluir do elenco dos terceiros não só aqueles que não adquiram de um mesmo autor, mas também todos aqueles que não adquiram com base na vontade do sujeito passivo, quer por aquisição derivada constitutiva, quer por aquisição derivada translativa”.
E para tanto é hábito relacionar o conceito de terceiro com a natureza da venda executiva.
Entendemos, no entanto, na esteira do acórdão 07B4396 de 10/16/2008, (sendo este e todos os demais acórdãos citados sem menção de fonte, consultados in dgsi.pt com a data na forma ali indicada: mês/dia/ano) que “Qualquer que seja a natureza da venda judicial é do titular executado que provém o direito que o adquirente adquire”, pelo que se considera que duas pessoas que adquiriram um mesmo prédio em execução judiciais diferentes, mas ambas dirigidas contra o mesmo executado receberam tais direitos incompatíveis de um mesmo autor comum. Assim, ali se sumariou: “Recebem direitos (de propriedade) incompatíveis de um mesmo autor comum quem adquire esse direito por compra e venda de uma determinada pessoa e quem o adquire em execução contra essa mesma pessoa, como executada, dirigida. 2 – Estes dois adquirentes são, então, terceiros entre si para efeitos de registo. 3 – Qualquer que seja a natureza da venda judicial é do titular executado que provém o direito que o adquirente adquire. 4 – Coisa diferente se passa em relação a um simples arresto, penhora ou hipoteca judicial uma vez que, em tais casos, não estamos perante direitos reais de aquisição, mas simples direitos de garantia.”
Efetivamente, parece-nos cristalino que “Não há entre um proprietário – o executado – e outro proprietário – o adquirente – um terceiro proprietário (o Estado?) ou um vazio onde a propriedade não tenha aonde repousar e paire no universo jurídico sem um qualquer titular. Por isso, mesmo no caso de venda judicial o adquirente é um terceiro para efeitos de registo. Posto é que haja venda, que haja aquisição. E não apenas garantia.
Assim, tendo a Recorrente e a 1ª Ré recebido o direito de um mesmo executado (vendido, aliás, também por uma única pessoa: o Estado), são terceiro si entre si e, portanto, a Recorrente não pode opor àquele o direito que lhe adveio da aquisição que efetuou, visto que a não submeteu a registo em data anterior àquele.”
Como fundamento desta posição pode ter-se em atenção que “Se o registo predial se destina essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tão digno de tutela é aquele que adquire um direito com a intervenção do titular (…) como aquele a quem a lei permite obter o registo sobre o mesmo prédio sem essa intervenção. No caso presente a compra feita pelos autores não foi registada, nem antes, nem depois do registo da penhora da fração. Pelo que, procedendo a ré ao registo da sua aquisição, a compra feita pelos autores é ineficaz em relação à penhora registada e subsequente aquisição por banda da ré, na execução, mediante proposta em carta fechada. (…) Portanto, se é certo que se poderia pensar que, falando a lei em aquisição de um autor comum as aquisições dos autores e da ré (esta em venda judicial) não seriam aquisições desse mesmo autor, tal, porém, só aparentemente é assim. Poderá parecer estranho, numa observação desprevenida, que, em casos como este, a compra e venda anterior não inscrita no registo seja oponível ao exequente que penhorar o prédio e já o não seja contra quem o adquiriu em venda executiva realizada na sequência dessa penhora. Mas ambas as situações são bem diferentes entre si. Numa penhora, ou arresto, ou hipoteca judicial, estamos apenas perante garantias de um direito de crédito, sendo que a existência deste não fica prejudicada com a referida oponibilidade, pois se mantém íntegro na sua substância, podendo, por isso, vir ainda a ser satisfeito com recurso a outros bens do devedor. E os poderes do proprietário sobre a coisa penhorada não são transmitidos. Mas, havendo venda executiva, dá-se a transmissão do prédio para um adquirente que confiou na aparência evidenciada pelo registo predial, caracterizado pela sua função publicista. A proteção do terceiro adquirente não pode ser limitada aos casos em que o mesmo proprietário celebra dois negócios jurídicos sucessivos e compatíveis a respeito do mesmo prédio; ela tem a sua justificação na publicidade de atos aquisitivos de direitos reais que, pela sua inscrição registal, se presume serem válidos e eficazes e na confiança que ao público tem que inspirar essa sua inscrição.” , como escreveu Vaz Serra in RLJ, N.º 103, Ano 1970-1971, p.165.
E neste caso a preterição do direito do primeiro adquirente, face à posição do segundo, (tendo-se os dois de boa-fé) funda-se no menor cuidado que aquele teve em defender o direito que adquirira (neste caso ainda não vigorava a obrigatoriedade do registo aquando das aquisições, pelo que não se pode ver aqui qualquer sanção pelo incumprimento de qualquer norma jurídica), não se observando qualquer “expropriação” do direito, desprovido que foi da eficácia concedida pelo registo.
Também José de Oliveira Ascensão, in “A desconformidade do registo predial com a realidade e o efeito atributivo”, in CDP, N.º 31, julho/setembro, 2010, p. 12, entende que “através do n.º 4 do art.º 5.º do CRPred., o legislador não fez depender a qualidade de terceiros do facto de os direitos conflituantes terem sido adquiridos com base na vontade do mesmo autor, limitou-se, isso sim, a rejeitar a conceção amplíssima de terceiros” (neste sentido, entre outros, cf. O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 06/19/2001, no processo nº 1446-2001)
É certo que esta posição não é, de todo, pacífica, quer junto da doutrina, nem sequer junto do Supremo Tribunal de Justiça.
Em sentido oposto ao acórdão supracitado, foi prolatado acórdão no processo 03B3488 em 12/11/2003: “I - Na execução o tribunal não vende no exercício de poder originariamente pertencente ao executado, mas sim em virtude de um poder autónomo, que se reconhece à própria essência da função judiciária. II - Assim, o anterior adquirente do direito de propriedade (sobre imóvel) não registado não é terceiro, para efeitos de registo nos termos do nº4 do artigo 5º do CRP, relativamente ao arrematante em venda executiva do direito de propriedade registado (sobre o mesmo imóvel), nem, muito menos, relativamente ao adquirente posterior ao arrematante”, e, menos antigo, o acórdão no processo 121/09.4TBVNG.P1.S1, de 01/12/2012 : “O comprador na venda voluntária e o comprador na venda executiva não são terceiros para efeitos de registo; é que a aquisição advinda da execução ao seu titular é atribuída ao comprador diretamente da lei e não por acto singular do executado, isto é, não se verifica uma disputa de direitos adquiridos de um mesmo autor comum.”
E, ainda defendendo esta tese do que é terceiro nos termos do nº 4 do artigo 5º do Código de Registo Predial, fazendo breve resenha, podemos seguir o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no processo 3326/09.4TBVFR.P1.S1 de 02/07/2013: “Para Heinrich Hörster é seguro que Manuel de Andrade – coerente dentro da lógica negocial da aquisição derivada – não incluiu, e nem podia ter incluído, o adquirente a título coercivo no seu conceito de terceiro. Assim, unicamente o adquirente por via judicial, a todos os títulos coercivo e completamente fora da lógica negocial, não é terceiro para efeitos de registo, por não ter adquirido o seu direito de acordo com as formas e regras da aquisição derivada, que pressupõem uma relação, mesmo tendo havido uma intervenção judicial, entre transmitente e adquirente.”
Mas o mesmo acórdão explana que a posição de Manuel de Andrade, em que se fundou a norma em análise, tem outras interpretações: “Já para Videira Henriques, o conceito de terceiro ensinado por Manuel de Andrade não exclui a tutela daqueles que adquirem sem o concurso da vontade do transmitente ou causante. Não exclui, por exemplo, a tutela do adquirente por venda executiva.
Categórico era também Orlando de Carvalho que, embora aderindo à orientação tradicional de Manuel de Andrade, não excluía os casos de venda executiva (e de concurso de direitos reais de garantia e de aquisição).”
No entanto, este acórdão nº 3326/09.4TBVRF.P1.S1, salvo melhor opinião, não julga esta questão (ao contrário do que afirma a Recorrente): apenas decide sobre a inadmissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Mas, além disso, produz afirmação que vai em sentido oposto ao defendido pela Recorrente: “Também nos parece que não se justifica que se excluam do conceito de terceiro, para este efeito, aqueles que, confiando na situação publicitada pelo registo e exercendo legitimamente uma faculdade que a lei lhes atribui, inscrevem direitos a seu favor, sem a cooperação ou contra a vontade do titular inscrito, como no caso da venda judicial. Também neste caso devem ser protegidos segundo a regra de prevalência ou de prioridade.”
Já em sentido oposto a este, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão nº 3959/05.8TBSXL.L1.S1, de 09/30/2014, assumindo o conceito restritíssimo de terceiro, exigindo a voluntariedade da venda: “O art. 5.º, n.º 4, do CRgP consagra uma noção restritiva do conceito de terceiro para efeitos de eventual oponibilidade do registo a adquirente anterior omisso, devendo concluir-se que não são terceiros (entre si) dois adquirentes em duas vendas executivas do mesmo bem imóvel.”
Tem sido salientado, cada vez mais, que releva essencialmente a boa-fé dos adquirentes, tentando com a noção restrita de terceiro impedir situações injustas: “tem-se assistido a uma autêntica corrida ao registo de penhoras e à precedente caça da inexistência de registo de escrituras públicas de transferência da propriedade, por vezes, conhecendo o registador, perfeitamente, a venda anterior” como se referiu no citado ac 3/99, sendo que à data não era possível alargar o conceito de terceiros, porque o registo ainda não era obrigatório.
Mas face ao tempo já decorrido face à imposição da obrigatoriedade do registo, com a alteração do Código do Registo Predial em 2008, não se pode dizer que atualmente se encontrem com frequência a ignorância e lacunas registais que justifiquem que se mantenha esta menor segurança no que toca à venda judicial, contrária à pretendida pelo sistema registal.
Nem se vê argumentos fortes que justifiquem a desconfiança e menor crédito da venda judicial neste aspeto em relação à venda negocial.
Por outro lado, tal como afirma a Recorrente, as declarações de transferências da propriedade sucessivas têm tido o mesmo centro comum: os executados. Não há que as distinguir, quando todas partiram do seu direito: “Em 10 anos os executados M. H. e mulher, estiveram no centro de 3 transferências de propriedade: venda judicial, venda já anulada, por sentença transitada em julgado e venda judicial”.
Assim, como a mesma também alega “Deve considerar-se que o autor da transmissão da propriedade é o próprio executado e não o Estado”. Mas tal determina, visto que não é possível esquecer que a mesma não registou o seu direito, que há que verificar quais as consequências dessa omissão. Ora, nos termos do artigo 5º nº 1 e 4 do Código de Registo Predial do Código de Registo Predial, cuja aplicação a Recorrente pretende discutir, porque se deve considerar que quer à Autora, quer à Ré foi declarada a transmissão de um direito proveniente de uma mesma pessoa (os executados), se deve considerar a Autora e a 1ª Ré são terceiras entre si para os efeitos deste artigo, sendo inoponível a esta última o direito anteriormente adquirido, mas não registado.
Desta forma, bem andou a sentença quando decidiu que “por a 1.ª Ré ter registado a sua aquisição em primeiro lugar (em relação à Autora) e por desconhecer a anterior venda judicial [als. 2), 3), 9) e 14), dos factos provados], o seu direito prevalece sobre o primeiro negócio.
A Recorrente não põe em causa que “os direitos adquiridos pelos 2.ºs Réus, subadquirentes, e pelo 3.º Banco Réu, titular de hipoteca sobre o bem, ficam consolidados nas respetivas esferas jurídicas, por via da oponibilidade do direito adquirido pela 1.ª Ré em relação à Autora, cujo direito se deve considerar preterido por força da realização do registo prioritário da aquisição por parte daquela”. Ou seja, a manutenção da eficácia da aquisição efetuada pela 1ª Ré face à Autora, determina que os atos que se fundaram naquela aquisição também se mantêm válidos e operantes, não lhe podendo ser opostos vícios baseados na falta de direito do transmitente que não valem contra o próprio transmitente.
Assim, mantém-se a decisão recorrida, concordando-se, aliás, com a consistente fundamentação nela exposta.

V – Decisão

Por todo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a presente apelação improcedente e, em consequência, mantêm a decisão recorrida.
Custas pela apelante (artigo 527º nº 1 do Código de Processo Civil)
Guimarães, 30-06-2022

Sandra Melo
Conceição Sampaio
Elisabete Coelho de Moura Alves