Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
37/11.4TBBGC-I.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: ACÇÃO DE VERIFICAÇÃO ULTERIOR DE CRÉDITOS
ACÇÃO RELATIVA A DÍVIDA DA MASSA INSOLVENTE
MODIFICAÇÃO DO MEIO PROCESSUAL
PRAZO DE CADUCIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

I - Configurada a acção proposta, quer quanto à causa de pedir, quer quanto ao pedido, como acção relativa a dívida da massa insolvente - e inerente reconhecimento do seu crédito sobre a massa insolvente e não como crédito sobre a insolvência - nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE, há lugar à modificação do meio processual, devendo seguir os trâmites de acção declarativa (acção relativa a dívida da massa insolvente), nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE, e não de acção de verificação ulterior de crédito, ao abrigo do disposto no artº 146º, do CIRE.
II - Tal acção não está sujeita ao prazo de caducidade previsto no artº 146º, nº 2, al. b), do CIRE.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório;

Recorrentes: A. F. e T. N. (autores);
Recorridos: Massa Insolvente de H. G. e S. C. e Outros (réus);
*
Nos presentes autos de processo especial que A. F. e T. N. intentaram contra a Massa Insolvente de H. G. e S. C. e Outros, pediram aqueles o seguinte:

«1. Serem os RR condenados a reconhecer que os Autores são titulares de um crédito de 200.000,00 € (125.000,00 € + 75.000,00 €) sobre a Ré Massa Insolvente de H. G., NIF ......... e S. C., NIF ........., representada pelo Sr.Administrador de Insolvência, e que esta é devedora dessa quantia por força da aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, nos termos do artº 51º, nº 1, al. i) e nº 2, do CIRE.
2. Ser a mesma Ré Massa Insolvente de H. G. e S. C. condenada a pagar aos Autores aquela quantia de 200.000,00 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde 4-10-2018 no valor de 2.000,00 € e vincendos até integral e efetivo pagamento, nos termos do artº 172º, nºs 1 e 3, do CIRE.
3. Serem os RR condenados a reconhecer que, nos termos dos artºs 754º e 759º, de Código Civil, os Autores beneficiam de direito de retenção sobre (i) O prédio rústico sito no …, descrito na CR Predial de …. sob o nº …, então inscrito na matriz predial da freguesia da … sob o artº … e atualmente inscrito na matriz da União das Freguesias de …, ... sob o artº …; e (ii) As frações autónomas designadas pelas letras “T” e “F”, descritas na CR Predial de …, respetivamente, sob os nºs. … – T e … –F, então inscritas na matriz da freguesia da …, sob os artºs. … – T e … – F, e atualmente inscritas na matriz da União das Freguesias de …, ... sob os artºs … –T e … – F.».

Foi posteriormente proferido, em 30.01.2019, despacho nos seguintes termos:

«O CPEREF não tem aplicação nos presentes autos.
Mas resulta evidente, pelo teor do articulado (causa de pedir e pedido) e da invocação do artigo 205.º do CPEREF, o qual tem a epígrafe «Verificação ulterior de créditos ou de outros direitos», que os Autores pretendem fazer uso do expediente processual da verificação ulterior de créditos regulado no artigo 146.º e seguintes do C.I.R.E..
Assim, determino se corrija a autuação para «Verificação Ulterior de Créditos» do artigo 146.º do C.I.R.E..
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Após, providencie a Secção pelo disposto no artigo 146.º, n.º 3, do C.I.R.E..
*
Notifique os Requerentes do presente despacho.
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Oportunamente, concluam-se os autos para averiguação do disposto no n.º 2 do artigo 146.º do C.I.R.E..».

De seguida, em 21.02.2019, houve despacho a admitir liminarmente a presente acção de verificação ulterior de créditos e ordenou-se o cumprimento do disposto no artigo 146.º, n.º 1, in fine, do C.I.R.E..
Após, em 18.10.2020, foi prolatado o despacho recorrido em que se declarou verificada a caducidade do direito de os Autores virem reclamar o reconhecimento do seu crédito sobre a insolvência e, por conseguinte, absolvo a Massa Insolvente, os Credores e os Insolventes do pedido.

Inconformados, vieram então os autores interpor o presente recurso de apelação, em cujas alegações formulam, em súmula, as seguintes conclusões que se transcrevem:

1ª. Como resulta inequívoco do teor da petição inicial e respetivos causa de pedir e pedidos, os AA nunca interpuseram qualquer ação de Verificação ulterior de créditos, prevista no artº 146.º, n.º 2, alínea b), do C.I.R.E.
2ª. Os AA instauraram efetivamente uma ação declarativa de condenação relativa a dívidas da Massa Insolvente de H. G. e S. C., o que fizeram expressamente nos termos do artº 89º, nº 2 (cfr. respetivo intróito da Petição inicial), com referência aos artºs 46º, nº 1, 51º, nº 1, al. i) e nº 2, e 172º, nº 3, do CIRE, também invocados no decorrer da PI.
3ª. Tal é o que resulta inequívoco do teor da petição inicial e respetiva causa de pedir (cfr.,designadamente, artºs 10º, 25º, 27º e 29º, da PI), e pedidos formulados, e foi reiterado sucessivamente nos autos, seja, na sua resposta doa AA de 13-06-2019 (em exercício do contraditório relativo ás exceções invocadas pela “Massa Insolvente de H. G. e S. C.” na contestação), e nos seus requerimentos de 4-6-2020 e 23-07-2020.
4ª. No artº 33º da petição inicial, os Autores referiram também expressamente que “As partes são as próprias (atento o efeito útil da ação)”, justificando com isso que, para além da demanda da “Massa Insolvente de H. G. e S. C.”, também demandaram os restantes RR tendo em vista a respetiva produção e extensão dos efeitos a todos eles e assegurar o efeito útil da ação.
5ª. No mesmo artº 33º da PI referiram ainda que “a presente ação é tempestiva”, invocando para este efeito o Acórdão do TRC de 23-06-2015, processo nº 17 1622/10.7TBACB-H.C1, sendo que tal também resultava do teor do Acórdão do TRL de 6-7-2017, processo nº 1856/07.1TBFUN-K.L1-8, invocado no artº 29 da petição inicial.
6ª. Desde logo, como se disse, do teor da petição inicial e respetivos causa de pedir e pedidos resulta que os AA nunca invocaram o “artigo 205.º do CPEREF”, nem nunca instauraram, nem pretenderam instaurar, qualquer ação de Verificação ulterior de créditos regulada nos artºs 146º e ss do CIRE, não sendo possível concluir nesse sentido;
7ª. Por outro lado, o douto despacho de 30-01-2019 só pode padecer de mero lapso, por não qualificar adequadamente a ação proposta. Todavia, de qualquer forma, traduz despacho meramente instrumental e formal, não vinculativo dos efectivos termos da ação, destinado apenas a satisfazer o pedido de informação da respetiva Secção Judicial (relativamente a “duvidas na tramitação subsequente nos autos, formulado nesse mesmo dia 30-01-2019) e a autuar a ação para os efeitos do artº 212º, do CPC, sendo-lhe aplicável o artº 205º, nº 1, CPC.
8ª. Despacho esse que, de tal forma, é de mero expediente e insusceptível de constituir caso julgado formal, nos termos do artº 630º, nº 1 e 620º, nº 2, do CPC.
9ª. Finalmente, e como referiram no artº 33º da petição inicial, os Autores referiram expressamente que “As partes são as próprias (atento o efeito útil da ação)”, justificando com isso que a demanda dos restantes RR, para além da “Massa Insolvente de H. G. e S. C.”, tinha em vista a produção e extensão dos efeitos da ação a todos eles, e o respetivo efeito útil da mesma.
10ª. Por ser assim (e como resulta, reitera-se, dos seus requerimentos de 13-06-2019, de 4-6-2020 e 23-07-2020), os AA nunca configuraram, nem admitem, que a ação que instauraram nos termos dos artºs 89º, nº 2, 46º, nº 1, 51º, nº 1, al. i) e nº 2, e 172º, nº 3, do CIRE, se tenha transmutado afinal, por via daquele despacho de 30-1-2019, numa ação de “Verificação ulterior de créditos”, prevista no artº 146º do CIRE.
11ª. Discordando da douta sentença porque, os AA não reclamaram “o reconhecimento do seu crédito sobre a insolvência”, antes instauraram efectivamente uma ação relativa a dívidas da Massa Insolvente de H. G. e S. C. (tendo demandado os restantes RR, reiterase, para assegurar o respetivo útil), o que fizeram expressamente nos termos do artº 89º, nº 2, com referência aos artºs 46º, nº 1, 51º, nº 1, al. i) e nº 2, e 172º, nº 3, do CIRE.
12ª. E também discordam porque tal ação foi instaurada de forma tempestiva (conforme invocaram no artº 33º da petição inicial), na medida em que não está sujeita a qualquer prazo e, por decorrência, não existe qualquer caducidade da ação.
13ª. Desta forma, considera-se, deve ser revogada a douta sentença recorrida, considerando-se agora que a ação instaurada pelo AA é uma ação relativa a dívidas da Massa Insolvente de H. G. e S. C., e que a mesma foi interposta de forma tempestiva, nos termos conjugados dos artºs 89º, nº 2, artºs 46º, nº 1, 51º, nº 1, al. i) e nº 2, e 172º, nº 3, do CIRE.
14ª. Mesmo que, ao invés da ação efetivamente proposta, os AA tivessem instaurado ação para verificação ulterior de créditos, nos termos do artº 146º, nº 2, al. b), do CIRE, considera-se que, mesmo assim, a ação também deveria ter sido julgada tempestiva.
15ª. Conforme os AA invocaram no artº 9 da petição inicial, só na sequência do trânsito em julgado deste recurso para uniformização de jurisprudência, em 4-10-2018, é que se consolidou na ordem jurídica a douta sentença proferida nos autos principais (processo nº 37/11.4TBBGC), que validou a resolução efetuada pelo Administrador de Insolvência em benefício da massa insolvente.
16ª. Conforme invocaram no artº 25º da petição inicial, só com tal consolidação definitiva na ordem jurídica da resolução dos referidos negócios de compra e venda celebrados pelos Autores a favor da Massa Insolvente de H. G. e S. C., é que se constituiu a favor dos Autores o crédito de 200.000,00 € (125.000,00 € + 75.000,00 €), a que corresponde dívida da Massa Insolvente.
17ª. A presente ação deu entrada em 4-1-2019, e por isso dentro do prazo de três meses a contar do trânsito em julgado daquele recurso para uniformização de jurisprudência (4-10-2018), ou seja, dentro do prazo a que alude o artº 146º, nº 2, al. b), do CIRE.
18ª. Pelo que, mesmo que os AA tivessem instaurado ação para verificação ulterior de créditos, nos termos do artº 146º, nº 2, al. b), do CIRE, considera-se que tal acção também deveria ser sempre julgada tempestiva.
19ª. Neste sentido, em 21-11-2018 foi proferido douto despacho nos autos principais (processo nº 37/11.4TBBGC, de que a presente ação é apenso), e, em consonância, foi proferido nos presentes autos (respetivo apenso “I”) o douto despacho de 21-2- 2019.
20ª. Relativamente a este despacho a douta sentença considerou a fls 9, último paragrafo, que “…dada a fase preliminar em que o mesmo teve lugar, sem audição da parte contrária e previamente à citação, não existe, nem poderia jamais existir, caso julgado formal, tratando-se de uma averiguação perfunctória dos pressupostos de admissibilidade.”
21ª. Com o que os AA também não se conformam, por considerarem que, constituindo o presente processo um apenso do processo principal, o douto despacho tem de considerar-se como proferido dentro do mesmo processo e, por via disso, com força obrigatória e traduzindo caso julgado formal, nos termos do artº 620º, nº 1, do CPC.
22ª. Pelo que, sempre e de qualquer forma, deve considerar-se que a presente ação é tempestiva e deve ser admitida.

Pedem que seja revogada a sentença recorrida, julgando-se tempestiva a acção interposta pelos autores.

Houve contra-alegações pugnando-se pela confirmação do julgado.

II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar;

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações.

As questões suscitadas pelos recorrentes podem sintetizar-se da seguinte forma:

a) Se se verifica erro na qualificação do meio processual como ‘verificação ulterior de crédito’;
b) Se se verifica a decretada caducidade do direito de acção;

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

III – Fundamentos;

1. De facto;

I – As incidências fáctico-processuais a considerar são as descritas no Relatório I supra e ainda o seguinte:

a) Encontra-se certificado nos autos que a decisão proferida no âmbito do Apenso D transitou em julgado em 25.01.2018 – por nessa data ter transitado em julgado o acórdão do S.T.J. proferido em 09.01.2018 que recaiu sobre a reclamação deduzida nos termos ao disposto no artigo 643.º do C.P.C. – (vide ofício do S.T.J. com a ref.ª 1573613 datado de 20.05.2020).
b) Na sequência do referido acórdão do S.T.J., os Autores interpuseram recurso para uniformização de jurisprudência para o Pleno das Secções Cíveis do mesmo Supremo Tribunal de Justiça – “… por considerarem que tal douto acórdão recorrido se encontra em contradição com o douto acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça em 9-7-2014 (já transitado em julgado, como se presume – cfr. art.º 688.º, n.º 2, CPC), no processo nº 2577/05.5TBPMS-P.C3.S1, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito” (sic) –, tendo tal recurso sido julgado improcedente por acórdão proferido pelo S.T.J. em 18.09.2018, estando certificado que tal acórdão transitou em julgado em 04.10.2018 (vide ofício do S.T.J. com a ref.ª 1597517 datado de 02.07.2020).

2. De direito;

a) Se se verifica erro na qualificação do meio processual como ‘verificação ulterior de crédito’;
b) Se se verifica a decretada caducidade do direito de acção;

Os recorrentes começam por questionar o decidido no despacho judicial de 30.01.2019, no qual se corrigiu o erro na qualificação do meio processual, ordenando o tribunal a quo “que se corrigisse a autuação para «Verificação Ulterior de Créditos» do artigo 146.º do C.I.R.E.., por ter entendido que, pelo teor do articulado (causa de pedir e pedido) e pela invocação do artigo 205.º do CPEREF, o qual tem a epígrafe «Verificação ulterior de créditos ou de outros direitos», os Autores pretenderam fazer uso do expediente processual da verificação ulterior de créditos regulado no artigo 146.º e seguintes do C.I.R.E..
Notificados, os Autores nada disseram, com tal se conformando”.
Mais se fundamentou ali que “Que os Autores pretenderam fazer uso de tal expediente processual resulta, além do mais, também do facto de terem demandado a Massa Insolvente, os Credores e os Insolventes, conforme dispõe o artigo 146.º, n.º 1, do C.P.C. (“por meio de acção proposta contra a massa insolvente, os credores e o devedor”)”.
Contrapõem então os recorrentes que se trata de despacho de mero expediente e insusceptível de constituir caso julgado formal, nos termos do artº 630º, nº 1 e 620º, nº 2, do CPC.
Discorda-se.
Como se estatui claramente no artº 152º, nº 4, do CPC, os despachos de mero expediente são os que se destinam a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes.
Ora, tal despacho, como os próprios apelantes referem, tem o condão de tal interferência, já que se insurgem contra a qualificação do meio processual – concretamente de “Verificação Ulterior de Créditos” – levada a cabo pelo tribunal recorrido.
Logo, tem tal despacho a virtualidade de ser recorrível, ainda que não se tenha constituído caso julgado formal quanto ao mesmo.
Com efeito, tal ocorreria se pudesse ter sido objecto de apelação autónoma, nos termos do artº 644º, nº 2, do CPC, aquando da sua prolação, o que não é caso.

Já quanto ao fulcro da questão atinente ao invocado erro na qualificação do meio processual - verificação ulterior de crédito, ao invés de, de acção declarativa proposta nos termos do artº 89º, nº 2, do CPC – assiste razão aos recorrentes.
Muito embora os apelantes, enquanto autores, tenham no preenchimento do cabeçalho da petição inicial, definido como “Espécie: Ação de Processo Comum Artº 205º do CPEREF) e Objecto de Acção: Reclamação de créditos [Cível (Local)]”, certo é que no texto da petição inicial, após se identificarem como partes, “A. F., NIF ……… e T. N., NIF ………,casados sob o regime da comunhão de bens adquiridos, residentes em França e com domicilio em Rua …”, afirmam expressamente que “ Vêm, nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE e por apenso aos autos de Insolvência referenciados, intentar ação declarativa de condenação, em processo comum, contra:
. Massa Insolvente de H. G., NIF ......... e S. C., NIF ........., representada pelo Sr. Administrador de Insolvência, Sr. Dr. F. J., com domicílio profissional na Praceta … Barcelos;
. Credores da Massa Insolvente de H. G., NIF ......... e S. C., NIF ........., identificados nos presentes autos;
. H. G., NIF ......... e S. C., NIF ........., casados, residentes em Rua …; e,
. X, Construções Unipessoal, Lda, NIPC ………, com sede na Av. …” (sublinhado nosso).
Ou seja, configuram a acção proposta como acção relativa a dívida da massa insolvente, nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE.
Por sua vez, quer do conteúdo dos factos que servem de base à sua pretensão (causa de pedir), quer do pedido propriamente dito – e isto independentemente do mérito ou não de tal alegação – os autores consubstanciam a presente acção como fundada em dívida da massa insolvente e o inerente reconhecimento do seu crédito sobre a massa insolvente e não como crédito sobre a insolvência.
Para tanto, alicerçam tal pedido no alegado enriquecimento sem causa por parte daquela massa insolvente e num empobrecimento dos autores, na exacta medida dos montantes por si pagos e que foram dados como provados para aquisição dos imoveis, num total de 200.000,00 €, restituídos à massa insolvente, por via dos efeitos da resolução em benefício desta decretada, com trânsito em julgado.
Em suma, os autores instauraram efetivamente uma acção declarativa de condenação relativa a dívidas da massa insolvente de H. G. e S. C., o que fizeram expressamente nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE com referência aos artºs 46º, nº 1, 51º, nº 1, al. i) e nº 2, e 172º, nº 3, do CIRE, também invocados no decorrer da petição inicial, pretendendo o reconhecimento do seu crédito sobre a massa insolvente e não sobre a insolvência.
Tal é o que resulta também especificamente do teor dos artigos 10º, 25º, 27º e 29º da petição inicial e foi reiterado sucessivamente nos autos, seja, na sua resposta de 13-06-2019 (em exercício do contraditório relativo ás exceções invocadas pela “Massa Insolvente de H. G. e S. C.” na contestação), e nos seus requerimentos de 4-6-2020 e 23-07-2020.
Assim sendo, impõe-se a modificação do meio processual decidido, devendo seguir os trâmites de acção declarativa (acção relativa a dívida da massa insolvente), nos termos do artº 89º, nº 2, do CIRE, e não de acção de verificação ulterior de crédito, ao abrigo do disposto no artº 146º, do CIRE.
Consequência do exposto, tal acção não está sujeita ao prazo de caducidade previsto no artº 146º, nº 2, al. b), do CIRE, mostrando-se tempestiva.

Fica prejudicado o conhecimento das demais questões, uma vez que pressupunham a qualificação da acção como de verificação ulterior de crédito, o que foi arredado.

Procede, pois, a apelação.

III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, devendo os autos seguir os seus ulteriores termos, nomeadamente conhecimento do mérito, se nada obstar a tal.

Custas pelos apelados.
Guimarães, 22.04.2021