Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
869/18.2JABRG.G1
Relator: CÂNDIDA MARTINHO
Descritores: ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS
CONCURSO EFETIVO DE CRIMES
CRIME DE TRATO SUCESSIVO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/27/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I) Estando em causa crimes de abuso sexual de crianças a pluralidade de condutas deve ser integrada na figura do concurso efetivo de crimes, afastando-se a possibilidade de subsunção a outras figuras, designadamente do crime de trato sucessivo.
II) Só de acordo com os critérios gerais de distinção entre unidade e pluralidade de crimes é que situações de multiplicidade de atos homogéneos, praticados contra a mesma vítima, numa mesma ocasião e local, poderão enquadrar-se num único crime de abuso sexual de crianças e não por apelo à caraterização daqueles crimes como crime de trato sucessivo, que o respetivo tipo legal não consente.
Decisão Texto Integral:
I. Relatório

1.
No processo comum coletivo com o 869/18.2JABRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Central Criminal de Braga – Juiz 6, por acórdão proferido em 8 de janeiro de 2021 foi o arguido S. A. condenado pela prática, como autor material, na forma consumada, em concurso efectivo, real e homogéneo, de:

(i) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs126, 127, 128 e 129], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de prisão;
(ii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs146, 147, 148 e 149], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(iii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs151, 152, 153 e 154], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(iv) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs156, 157, 158 e 159], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(v) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs161, 162, 163 e 164], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(vi) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs167, 168, 169 e 170], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(vii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs172, 173, 174 e 175], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(viii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs177, 178, 179 e 180], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(ix) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs182, 183, 184 e 185], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
(x) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs112, 113, 114 e 115], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos de prisão;
(xi) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs121, 122 e 123], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos de prisão;
(xii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs98 e 99], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xiii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs107 e 108], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xiv) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs110 e 111], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xv) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs117 e 118], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xvi) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs132 e 133], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xvii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs135 e 136], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xviii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs88 e 89], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
(xix) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº84], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº1, do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão;
(xx) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº142], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº1, do CP, na pena parcelar de 2 (dois) anos de prisão;
(xxi) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº137], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alíneas a) e b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;
(xxii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs92, 93 e 94], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alínea b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão; e
(xxii) 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº186], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alínea b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 7 (sete) meses de prisão.
Em cúmulo jurídico foi-lhe aplicada a pena única de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão (efectiva).
Foi ainda decidido Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela menor/assistente/demandante A. T. contra os arguidos/demandados F. C., R. B., S. F. e S. A., tendo este último, o ora recorrente, sido condenado a pagar-lhe a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais, quantia esta acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, a contar da data da prolação do acórdão, à taxa legal em vigor em cada momento

2.
Não se conformando com decidido, veio o arguido S. A., recorrer do acórdão extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem:

«(i) O recorrente foi condenado em cúmulo jurídico, ao abrigo do vertido no artigo 77º, nºs 1 e 2, do CP, na pena única de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão (efectiva) pela prática, como autor material, na forma consumada, em concurso efetivo, real e homogéneo, de vinte e dois crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelos artigos13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º,1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP.
(ii) O presente recurso tem por objeto a discordância absoluta do recorrente relativamente à aplicação do Direito efetuado, que considera, uma pena manifestamente excessiva, desadequada, desproporcional e absolutamente injusta.
(iii) O Recorrente considera que os factos dados como provados, supra elencados, resultam da interpretação subjetiva do Tribunal a quo, suportada esta, em muitos casos, em meras presunções naturais que extravasam as regras da experiência, tendo por base, por um lado, as declarações para memória futura da ofendida e, por outro, o teor das comunicações entre esta e o recorrente.
(iv) Objetivamente, todo o depoimento da Assistente não é mais do que uma pura confissão, ainda que de forma indireta, da assunção do seu relacionamento com o recorrente.
(v) Ao conjugarmos os depoimentos do arguido e da ofendida, facilmente extraímos que arguido e ofendida mantiveram, durante algum tempo, uma relação de namoro, relação essa que terminou por decisão do recorrente, atento o teor da factualidade levada a escrutínio nos presentes autos. (vi) Da prova produzida não há como dar-se como provado, com certeza, que o recorrente abusou por 22 vezes da ofendida A. T..
(vii) As declarações para memória futura prestadas pela menor, contrariamente ao que se exara no Acórdão recorrido, não resultam minimamente individualizadas e provadas as condutas que possam, de alguma forma, realizar, de modo autónomo e independente, com especificação necessária, de cada nova resolução criminosa que permita condenar o ora arguido pela prática daquele número em concreto de ilícitos de abuso sexual de criança, p.e.p. do art.º 171.º, n.º 2 C. Penal.
(viii)Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, a recolha de “declarações para memória futura” tem de garantir, em toda a sua plenitude, o princípio do contraditório, pois que constitui uma antecipação parcial da audiência de discussão e julgamento. (ix) A prova carreada e a que foi produzida em julgamento, não se revela bastante para efetiva imputação e condenação do Arguido pelo retromencionado número de crimes.
(x) As declarações para memória futura prestadas pela ofendida/assistente A. T. não permitem, desde logo, garantir o respeito pelo exercício do contraditório, atento o caráter vago, indeterminado e de “factualidade por estimativa” de que é revestido.
(xi) Verifica-se assim, salvo o devido respeito, a arbitrariedade latente no Acórdão recorrido relativamente à especificação da exata quantidade de resoluções criminosas autónomas e independentes entre si, não havendo elementos de prova bastantes ou suficientes para que se possa dar como provado que o Arguido realizou por 22 vezes autónomas e específicas, o crime de abuso sexual de criança.
(xii) Em momento algum o Tribunal logra individualizar especificada e autonomamente a realização em 22 vezes (portanto, 22 unidades de resolução criminosa autónomas e independentes), incorre o Tribunal a quo em vício quando, em prejuízo do recorrente, não procede ao enquadramento da realização do crime de abuso sexual de criança (art.º 171.º, n.º 2 C. Penal) no âmbito do crime de trato sucessivo.
(xiii) Ao caso sub iudice, a matéria de facto que ainda possa resultar apurada depois da reapreciação supra levada a cabo – e que haverá de ser validada pelo Venerando Tribunal ad quem –, sempre conduziria à manifesta conclusão da impossibilidade de concretização do número exato de vezes que o tipo de crime em discussão (abuso sexual de criança – art.º 171.º, n.º 2 C. Penal) possa ter sido realizado pelo Arguido em tão vasto período temporal identificado na Acusação lavrada.
(xiv)Ao deliberar pela condenação do Arguido em 22 unidades resolutivas criminosas autónomas e independentes sem que esteja suficientemente estribado em prova efectivamente produzida, o Tribunal a quo fere irremediavelmente os princípios da legalidade, nulum crimen sine lege e nula poena sine crimen.
(xv) Na sua motivação, o douto Acórdão, além das declarações prestadas pela ofendida A. T., socorre-se, ainda, das mensagens telefónicas trocadas ente ofendida e recorrente para “contabilizar” e presumir o número de vezes que ocorreu o alegado crime de abuso sexual de crianças.
(xvi)Encontrando-se, porém, o recorrente condenado pela prática – em concurso efetivo – de 22 crimes de abuso sexual de menor - importa saber se a matéria de facto provada comporta tal qualificação, designadamente em face das circunstâncias do caso concreto, em particular a relação de namoro estabelecida entre o arguido e a ofendida.
(xvii) No caso concreto é patente a existência de uma unidade de resolução criminosa em relação aos factos que, de um modo homogéneo, ocorreram durante um curto espaço temporal e no âmbito da relação de namoro estabelecida entre o arguido e a ofendida,a coberto do dolo inicial que apenas se foi renovando a cada episódio, revelando-se assim uma unificação da atividade criminosa.
(xviii) Tendo em conta a factualidade provada e o ora exposto, dúvidas inexistem de que os episódios de cópula devem ser agrupados num único crime de trato sucessivo.
(xix)A factualidade típica, antijurídica, censurável e punível imputada ao Recorrente, porque vem condenado em concurso efetivo, não respeita a construção dogmática jurídico-criminal da unidade fáctica e da unidade da norma, por existir uma execução plúrima mas reiterada e homogénea de realizações criminosas, sob um único processo volitivo e sob circunstância externas que se repetem ao longo do tempo e do mesmo espaço, e, ainda, sobre a mesma vítima menor, com quem, como dá como provado o Tribunal a quo, o Recorrente teve um enlace amoroso.
(xx) Entendendo-se que o crime de trato sucessivo é punido pelo facto mais grave, considera-se, em suma, que o recorrente cometeu um único crime de abuso sexual de criança, de trato sucessivo, previsto e punido no artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, com a pena de três a dez anos de prisão.
(xxi)O princípio da proporcionalidade em matéria de punição significa que a pena deve ser fixada na justa medida, ou seja,não se poderá situar nem aquém nem além do que importa para obtenção do resultado devido.
(xxii) Ponderada a globalidade da matéria factual provada, a medida da parcela de pena para cada crime de abuso sexual de criança de que foi condenado é excessiva.
(xxiii) O crime de abuso sexual de crianças previsto no artigo 171º, do CP, é punido, em abstracto: [i] nº1 – com pena de prisão 1 (um) a 8 (oito) anos; [ii] nº2 – com pena de prisão de 3 (três) a 10 (dez) anos;e [iii]nº3 – com pena de prisão de 1 (um) mês (cfr. artigo 41º,nº1, do mesmo diploma legal) até 3 (três) anos.
(xxiv) No caso concreto, o recorrente foi condenado na pena única de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão (efetiva), em concurso real e efetivo, de vinte e dois crimes de abuso sexual de crianças, tendo como moldura penal abstrata de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses até 25 (vinte e cinco) anos.
(xxv) O recorrente não se aproveitou da ingenuidade da assistente, a qual, aliás, manteve relações sexuais com, pelo menos, os coarguidos neste processo.
(xxvi) Não praticou atos de cariz sexual com outra(s) menor(es): afinal, bem ou mal, certo ou errado, encontrava-se numa relação amorosa com a assistente.
(xxvii) Indicia uma conduta social pública como tendencialmente adequada, sem registo de problemáticas aditivas ou criminais.
(xxviii) Tais razões fundamentam a fixação de penas inferiores às determinadas pelo Tribunal a quo para cada um dos vinte e dois crimes que foram pelo Tribunal considerados.
(xxix) Os fundamentos ora invocados não justificam a aplicação de penas parcelares tão distantes do limite mínimo previsto em abstrato, pelo que deverá conduzir à diminuição das penas parcelares aplicadas ao recorrente.
(xxx) Não obstante, a pena única de concurso determinada pela operação de cúmulo jurídico revela-se, no entender do recorrente, manifestamente exagerada, até porque os crimes seriam sempre um mero prolongamento do primeiro, praticados de forma homogénea, projetando uma imagem única dos factos, pelo que uma pena de 7 anos e 8 meses de prisão revelar-se-ia muito exagerada face às exigências de prevenção e ilicitude da conduta, e até desproporcional face a casos semelhantes, quando o recorrente, estaríamos perante a sua primeira condenação, mas por mero dever de patrocínio, mesmo na hipótese de atendendo às penas parcelares fixadas, nada justificaria uma pena única superior a cinco anos de prisão.

TERMOS EM QUE, E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO NO ALTO DA VOSSA SABEDORIA, E TUDO MAIS QUE FAVOREÇA O RECORRENTE, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA:

a) Alterar a qualificação e enquadramento jurídico operado na decisão recorrida e penas parcelares em que foi condenado o recorrente, aplicando a figura do crime de trato sucessivo e respetiva pena; ou
b) Reduzir a pena parcelar máxima aplicada para o mínimo de três anos e reformulando o cúmulo jurídico, sem prejuízo de atenuação especial, nos termos dos artigos 72.º e 73.º do Código Penal.
ASSIM SE FAZENDO INTEIRA JUSTIÇA!»

3.
A Exma Procuradora da República na primeira instância respondeu ao recurso e pugnando pela sua improcedência concluiu nos seguintes termos:

1-Não se conformando com o teor do douto acórdão condenatório, proferido nos autos, veio o arguido interpor o presente recurso.
2- Alega o arguido recorrente que a prova produzida, mormente, as declarações para memória futura da menor ofendida A. T., porque vagas e imprecisas, não comportam a condenação em 22 crimes, tendo sido violado o princípio in dúbio pro reo.
3-Sucede que o arguido escolheu e transcreveu na motivação do presente recurso, das mesmas, apenas as partes que sustentam a sua posição, omitindo completamente outras, em que a menor respondeu sem hesitação às questões que lhe foram colocadas e localizando no tempo e no espaço, os actos praticados pelo arguido.
4- Com efeito, para prova dos factos provados sob os pontos sob os pontos 81 a 89, o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita na pag. 16, junta aos autos a fls. 1205, reproduzida na motivação que antecede.
5- No que concerne à prova dos factos provados sob os pontos sob os pontos 95 a 99, o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita nas pags 19 e 21, juntas aos autos a fls. 1208, 1210, reproduzida na motivação que antecede.
6- No que concerne à prova aos factos provados sob os pontos sob os pontos 106 a 108: o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita na pag. 18, junta aos autos a fls. 1207, reproduzida na motivação que antecede.
7- Para suporte dos factos provados sob os pontos sob os pontos 109 a 111 e 112 a 115 o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita na pag. 17, junta aos auto a fls. 1206, reproduzida na motivação que antecede e ainda as declarações do arguido, prestadas em sede de 1.º interrogatório judicial em 18.06.2019, reproduzidas na sessão da audiência de julgamento que teve lugar em 28.10.2020.
De salientar que quer ambas as localidades (... e ...) pertencem ao concelho de Esposende.
8- No que concerne aos factos provados sob os pontos sob os pontos 116 a 118 o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita na pag. 27, junta aos autos a fls. 1216, reproduzida na motivação que antecede.
9-No que concerne aos factos provados sob os pontos sob os pontos 119 a 123118 o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita nas pags. 27 e 28, juntas aos autos a fls. 1216, 1217, reproduzida na motivação que antecede.
10-No que concerne aos factos provados sob os pontos sob os pontos 124 a 129 o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita na pag. 29, juntas aos autos a fls. 1218, reproduzida na motivação que antecede.
11-No que concerne aos factos provados sob os pontos sob os pontos 130 a 136 o Tribunal recorrido teve em conta as declarações para memória futura, prestadas pela menor A. T., mais concretamente a parte transcrita nas pags. 33 e 34, juntas aos autos a fls. 1222, 1223, reproduzida na motivação que antecede.
12-Resulta assim evidente que carece de razão o recorrente, quando diz que as declarações para memória futura da menor ofendida, não apresentam individualização e especificação suficiente, para se imputar ao arguido a prática dos 22 crimes pelos quais foi condenado, porquanto a menor concretizou os factos, com suficientes referências de tempo lugar que permitiram ao Tribunal situá-los espacial e temporalmente da forma como o fez, sem qualquer margem para reparos
13-Para prova destes factos contribuíram ainda as declarações do arguido prestadas em sede de primeiro interrogatório judicial em 18.06.2019 que, ao abrigo do disposto no art. 357.º, n.º1. al.b), do C.P.P., foram reproduzidas na sessão da audiência de julgamento que teve lugar em 28.10.2020.
14-O princípio da livre apreciação da prova, vertido no art. 127.º do C.P.P., permite “ às diversas entidades que apreciem a prova existente nos autos ou produzida perante si, com base exclusivamente na livre valoração destas e na sua convicção pessoal” (cfr. Marques Ferreira, “Meios de Prova”, in Jornadas do CEJ de Direito Processual Penal).
15- A livre apreciação ou valoração da prova, não se confunde com uma apreciação arbitrária, obrigando antes a uma fundamentação das decisões, com enumeração dos factos provados e não provados e ainda, a uma exposição dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, conforme resulta do disposto no n.º2, do art. 374.º do C.P.P., sendo a prova apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador.
16-Constitui, portanto, um trabalho de harmonização lógica e cronológica dos factos, da respectiva formulação de juízos de valor sobre eles, avaliando a razão de ciência e a credibilidade da prova produzida, bem assim do próprio enquadramento jurídico correspondente.
17-Ora, no douto acórdão recorrido, o Tribunal fez constar, não só os factos que considerou provados e não provados, como também enumerou, de forma exaustiva, os motivos de facto e de direito que o levaram a fazê-lo, com análise crítica de toda a prova carreada para os autos.
18-Com efeito, a propósito das declarações da menor, o Tribunal recorrido exarou de forma exaustiva e insusceptível de reparo, os motivos pelos quais as valorou, explicando, detalhadamente, todos os pontos das mesmas que levaram a concluir pela prova de cada facto e os motivos pelos quais assim considerou.
19-Assim, bem andou o tribunal recorrido em dar credibilidade à versão dos factos apresentada pela menor, consolidada em sede de declarações para memória futura, que se afigura consistente, segura e credível, de molde a não deixar dúvida que os vivenciou.
20-Não houve pois, ao contrário do que pretende o arguido, qualquer violação do princípio in dúbio pro reo, na medida em que se fez prova bastante de que o arguido praticou os factos postos em crise, dos quais vinha acusado, não ficando, pois, no espírito do julgador, qualquer dúvida insanável que implicasse, por recurso a esse princípio, a absolvição do arguido.
21-Não padece assim, a douta decisão recorrida do vício apontado, sendo inevitável, concatenados todos os meios de prova produzidos (documental, testemunhal e pericial) em audiência de julgamento e juntos aos autos, devida e criticamente analisados, considerar como provados os factos dados por assentes e condenação do arguido pela sua prática.
22- Também não assiste razão ao arguido quando considera que deveia ter sido condenado pela prática de um só crime de trato sucessivo.
23- A maioria da jurisprudência do STJ é no sentido de que, no caso do crime de abuso sexual de crianças, o entendimento é o da integração da pluralidade de condutas à figura do concurso efectivo de crimes, uma vez que a estrutura típica do crime de abuso sexual de crianças não pressupõe tal reiteração, isto é, não se pretende com o mesmo punir uma actividade, pelo que não é aplicável a figura do crime de trato sucessivo.
24-O crime de abuso sexual de crianças, p e p. pelo art. 171.º do Código Penal, não constitui um crime de mera actividade, ou de execução reiterada, como é, por exemplo, o crime de Tráfico de estupefacientes.
25-Na verdade, no crime de abuso sexual de crianças, p e p. pelo art. 171.º do Código Penal, pune-se a prática do acto sexual individualmente considerado. A prática de um só acto isolado já integra a prática do crime.
26-Segundo Helena Moniz, in “Crime de trato sucessivo”, Revista Julgar online, Abril de 2018:
“Temos, pois, situações de concurso de crimes quando o agente pratica vários atos sexuais de relevo, ainda que sobre a mesma vítima. Desde logo, deve afirmar-se que haverá concurso efetivo de crimes sempre que o contexto espácio-temporal seja distinto, bastando para tanto que aqueles atos sejam realizados em momentos temporais distintos. Além disto, deve também ser entendido como um caso de concurso aquele em que o agente procura oportunidades, ou cria situações para a prática dos atos típicos do crime — no seguimento da doutrina que entende que é de recusar “a figura do crime continuado sempre que seja o próprio agente a criar a circunstância facilitadora que conduz à prática do crime”.
27-Acresce que, o art. 30.º, n.º3, do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 40/2010, de 03-09, afasta a aplicação da figura do crime continuado dos crimes praticados contra bens eminentemente pessoais.
28-Assim, no caso, bem andou o Tribunal recorrido em condenar o arguido, pela prática em concurso efectivo, dos crimes em apreço, na medida em que estes foram praticados em momentos temporais distintos, em ocasiões que o arguido procurou e criou, solicitando à ofendida/menor que se encontrasse consigo, a que esta acedia, deslocando-se pelos seus meios, ou sendo o próprio arguido que a transportava no seu veículo para os diferentes locais onde praticou os factos, sendo evidente a renovação da vontade criminosa subjacente à prática de cada um desses actos.
29-Destarte, bem andou o Tribunal recorrido em condenar o arguido, pela prática, em concurso, real e homogéneo, de crimes.
30-Considera o arguido que as penas parcelares e única aplicadas pecam por excessivas, uma vez que o arguido e a menor tinham uma relação de namoro, não se aproveitou da ingenuidade da ofendida, nem praticou actos de cariz sexual com outras menores, indiciando uma conduta social pública adequada, sem registo de problemáticas aditivas ou criminais.
31-Também neste ponto, não podemos sufragar da posição do arguido.
Efectivamente, o arguido, ao praticar os factos, manifestou uma personalidade completamente avessa às regras sociais e jurídicas vigentes, satisfazendo os seus intentos libidinosos, completamente indiferente à pouca idade da menor e ao facto de esta, por decorrência da mesma, não ter maturidade suficiente para o efeito, denotando assim, além do mais, serem elevadas as exigências de prevenção especial que, no caso, não são anuladas pelo facto do arguido não ter antecedentes criminais pela prática de crime da mesma natureza.
32- Tudo ponderado, no quadro dos fins das penas, atendendo ao binómio culpa- ilicitude, aos factos e à personalidade do agente, as penas concretas parcelares e única aplicadas, revelam-se ajustadas, não ultrapassando de modo nenhum os limites da culpa e dando resposta cabal às exigências de prevenção geral e especial.
33-Com efeito, o quantum das penas concreta e única aplicadas não merecem quaisquer críticas, porquanto valorizou e teve em conta, correcta e ajustadamente, todas as circunstâncias subjectivas e objectivas, agravantes e atenuantes, com reflexos no grau da culpa do arguido, tendo sido tidos em atenção os fins das penas e os princípios da prevenção geral e da prevenção especial em termos de alarme e censura sociais e num correcto e ajustado quadro do binómio culpa- ilicitude.
34-Assim, as penas parcelares e única aplicadas ao arguido deverão se mantidas nos seus precisos termos, já que a sua concreta determinação atendeu aos critérios elencados nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, n.º 1 e n.º 2 e 77.º, todos do Código Penal,
Assim, negando provimento ao recurso interposto e mantendo, na íntegra o douto acórdão proferido, farão V.Exas., a costumada JUSTIÇA».

4.
A assistente não apresentou qualquer resposta ao recurso.

5.
Neste tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador – Geral Adjunto emitiu parecer, perfilhando integralmente a posição assumida pelo Ministério Público na instância recorrida, concluindo assim pela improcedência do recurso.

6.
Cumprido o art. 417º,nº2, do C.P.P., não foi apresentada qualquer resposta ao parecer.

7.
Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no art.419º,nº3,al.c), do diploma citado.

II. Fundamentação

A) Delimitação do Objeto do Recurso

Dispõe o art. 412º,nº1, do Código de Processo Penal que “a motivação enuncia especificadamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.
O objeto do processo define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, onde deverá sintetizar as razões da discordância do decidido e resumir as razões do pedido - arts. 402º,403º e 412º- naturalmente sem prejuízo das matérias do conhecimento oficioso (Cf.Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, VolIII, 1994,pág.340, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 3ª edição,2009,pág.1027 a 1122, Simas Santos, Recursos em Processo Penal, 7ªEd, 2008, pág.103).
O âmbito do recurso é dado, assim, pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, delimitando para o tribunal superior ad quem, as questões a decidir e as razões que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que eventualmente existam.

No caso vertente, atento teor das conclusões apresentadas pelo recorrente, as questões a decidir acabam por se resumir às seguintes:

- impugnação da matéria de facto/erro de julgamento/violação do princípio “in dúbio pro reo”;
- violação do princípio do contraditório;
- qualificação jurídica dos factos/«crime único de trato sucessivo».
- Medida da Pena - Redução das penas parcelares e pena única.

B) Com vista à resolução das questões supra enunciadas, importa ter presente a seguinte factualidade dada como provada no acórdão recorrido.

Da acusação pública/pronúncia

1.No assento de nascimento nº5908 do ano de 2008, da Conservatória do Registo Civil de Esposende, consta que no dia - de Agosto de 2005 nasceu a menor/assistente A. T., sendo seus progenitores A. J. e S. M..
2.Esta menor/assistente, à dos factos sob discussão nos presentes autos, residia com os seus progenitores na Rua …, nº.., da freguesia de …, do concelho de Esposende.
3.No assento de nascimento nº… do ano de 2007, da Conservatória do Registo Civil de Barcelos, consta que no dia - de Outubro de 2005 nasceu a menor B. D., sendo seus progenitores R. D. e C. D..
4.Do averbamento ao assento referido em 3., com o nº1, datado de 08 de Abril de 2009, resulta ter sido homologado o (…) acordo do exercício do poder paternal, nos termos da sentença de 17 de Fevereiro de 2009, proferida pelo Tribunal Judicial de Barcelos, 4º Juízo, ficando a menor confiada aos tios maternos J. V. e M. A. a quem incumbe o exercício do poder paternal e ficando o pai a exercer o poder paternal residual.
5.À data da factualidade em apreço nestes autos, as aludidas A. T. e B. D. eram menores de 14 (catorze) anos.
(…)
F)Do arguido S. A.

78.O arguido S. A., que nasceu no dia - de Novembro de 1992, tinha 24 (vinte e quatro) anos de idade, à data dos factos sob discussão nestes autos.
79.Em data que, em concreto, não foi possível apurar, mas situada nos meses de Setembro/Outubro de 2017, o arguido S. A. conheceu a menor/assistente A. T., na altura com 12 (doze) anos de idade, através da rede social Instagram, que, na ocasião, utilizavam regularmente.
80.A partir de então, o aludido S. A. e a mencionada A. T. mantiveram contacto várias vezes, através de telemóvel e também das redes sociais Instagram e WhatsApp.
81.Entretanto, em Novembro/Dezembro de 2017, aquele S. A. emigrou para Inglaterra, onde permaneceu até Abril de 2018, altura em que regressou a Portugal.
82.Nesse período, o mesmo arguido e a menor/assistente A. T. mantiveram contacto entre si de modo regular.
83.Na sequência dos vários contactos que estabeleceram (através de telemóvel e das redes sociais) e após prévia combinação para esse efeito, em dia que, em concreto, não foi possível determinar, mas situado no mês de Abril de 2018, durante a tarde, o arguido S. A. deslocou-se à cidade de Esposende, mais concretamente às piscinas, para encontrar-se pessoalmente com a menor/assistente A. T..
84.Durante este primeiro encontro, o aludido S. A., não obstante saber que aquela A. T. tinha apenas 12 anos (doze) anos de idade, mesmo assim beijou-a nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez inúmeras vezes.
85.Ainda nesse mesmo dia, o arguido S. A. propôs à mencionada A. T. encontrarem-se novamente, durante a noite, com o propósito de manterem relações sexuais, o que a menor/assistente aceitou.
86.Combinaram, então, que o arguido iria buscá-la a sua casa (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), sempre depois das 23h00m/23h30m, quando todos os familiares da menor/assistente já estivessem a dormir, para que a sua ausência não fosse detectada.
87.Na concretização deste seu desígnio, a hora que, em concreto, não foi possível apurar, mas posterior às 23h00m/23h30m, o arguido S. A. deslocou-se de carro até ao local acordado, onde a menor/assistente A. T. o aguardava e, de seguida, transportou-a até a uma zona de monte, situada na freguesia de ..., do concelho de Barcelos.
88.Depois de estacionar o veículo num local ermo, o arguido S. A. começou a beijar a identificada A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
89.Assim que se despiram, o arguido posicionou a menor/assistente sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o.
90.Entretanto, em dia que, em concreto, não foi possível determinar, mas situado em Junho de 2018, o mencionado S. A. foi viver para Lisboa.
91.Por essa altura, este arguido e a menor/assistente A. T. tinham iniciado uma relação de namoro.
92.Durante os inúmeros contactos mantidos entre o mesmo arguido e aquela A. T., em particular no período compreendido entre os dias 15 de Julho de 2018 e 04 de Agosto de 2018, o identificado S. A., titular do cartão com o número ........., trocou mensagens de telemóvel, através da aplicação WhatsApp, com essa menor/assistente.
93.Por via de tais mensagens, o arguido S. A. combinou com a aludida A. T. diversos encontros, com a finalidade de manterem relações sexuais, propôs-lhe que fosse ter com ele a Lisboa no dia 04 de Agosto de 2018 e que ficasse alguns dias com ele em sua casa, o que esta última aceitou, pediu-lhe, várias vezes, que lhe enviasse “nudes” dela, e manteve com a mesma conversas de teor sexual, falando dos actos sexuais que praticavam e que queria praticar com ela quando estivessem juntos.
94.Entre tais mensagens constam as seguintes [cfr. fls.3-66 e fls.87-98, do Apenso 1]:
a. no dia 15.07.2018, entre as 18:38 e as 21:51:
- A. T.: “Este ou o próximo fim de semana vou pah aí”;
- S. A.: “Sim, já tinhas dito”;
- S. A.: “E vídeo chamada não?”.
b. no dia 20.07.2018:
b1. entre as 20:59 e as 21:02: a menor A. T. gravou no seu telemóvel a seguinte conversa que teve com o arguido S. A.:
- A. T.: “S. A. fala coisas, não me deixas na seca”;
- S. A.: “eu falo de coisas, tu precisas disso porque andas sempre a pinar”;
- A. T.: “sabes que não…não é por causa de foder com outros, achas…eu só fodi contigo a minha vida toda..” [cfr. fls.89, do Apenso 1].
b2. entre as 21:00 e as 23:02:
- A. T.: “Tou com o período”;
- S. A.: “Menos mal”;
- S. A.: “Não tas gravida”;
- A. T.: “E que N fodes a quanto tempo sê. Sincero”;
- S. A.: “A um mês e meio”;
- A. T.: “A nossa última vez?”;
- S. A.: “Não”;
- A. T.: “Até me sinto mal”;
- S. A.: “Também fudeste com outro”;
- A. T.: “Tava na brinca tinhas todo o direito”;
- A. T.: “Sim tinhas que agr N tens tas quase compremetido cmg”;
- S. A.: “Yah quaseee”;
- A. T.: “Tenho msm de ir aí neh”;
- S. A.: “Claro”;
- A. T.: “E mal chegamos a casa que fazemos?”;
- S. A.: “Dormimos porque vai ser tarde”;
- A. T.: “Chama-lhe dormir como se N te conhecesse bby”;
- S. A.: “Ahaha”;
- S. A.: “Lambia te todinhaaa”;
- S. A.: “Olha, às vezes quando tou lá em baixo com a boca, parece que não te dou prazer, não gostas?”;
- A. T.: “Gosto! Mas como disse N podíamos fazer barulho e quando for para aí posso….Atão eu gemia ao teu ouvido pq N podia gemer alto”;
- S. A.: “Adoro ouvir te a gemer”;
- S. A.: “Juro”;
- A. T.: “Aii sim”;
- A. T.: “Tu de todos Jr és o melhor a fuder os outros são lentos credo...”;
- S. A.: “Ahahah”;
(…)
- A. T.: “Yh…Já tou com o período a três dias coração”;
- S. A.: “Ahhhh”;
(…)
- S. A.: “Entao tass bem”;
(…)
- S. A.: “Agora se sincera, com quantos gajos já fudeste”;
- A. T.: “Não sei pq?”;
- A. T.: “Mas desde K tu foste e ficamos chateados foi só 1 até hoje não fodi!tou a ser sincera”;
- S. A.: “OK..”;
- A. T.: “Até parece k guardas as minhas fts”;
- S. A.: “E guardo.. Lol”;
(…)
- A. T.: “N me digas que tens este vídeo também...”;
(…)
- S. A.: “Tenho”;
(…)
- S. A.: “Tira fotos novas pra. Mim”;
- A. T.: “Eu seii foi por isso k disse se Ainda o tinhas”;
- A. T.: “Eu tiro mas agr N dá. Mas eu prometo msm k tiro”;
- S. A.: “Está bem” (…).
c. no dia 21.07.2018:
c1. entre as 9:12 e as 22:25:
- A. T.: “Podes fazer chamada logo?”;
- S. A.: “Sim”;
- A. T.: “Ok bb”;
- S. A.: “Sempre vens hoje?” [referindo-se à viagem queria que a menor fizesse até a Lisboa, para esta com ele];
- A. T.: “Não. Mas vou no próximo”;
- A. T.: “Próxima sexta”;
- S. A.: “Ok”;
- S. A.: “Mas vens mesmo certo?”;
- S. A.: “Pra começar já a marcar as coisas”;
- A. T.: “Sim”;
(…)
- A. T.: “Qual o horário que queres.?”;
- S. A.: “Chegares às 22”;
- A. T.: “Tabom”;
(…)
- S. A.: “E as minhas fotos?”;
- A. T.: “N tirei ainda ma já tiro lindo”;
(…)
- S. A.: “Mamas”;
(…)
- S. A.: “Ahah há não podes vir de vez já sabes”;
- A. T.: “Yh mas eu queria bué”;
(…)
- S. A.: “Já sei que falas com gajos tipo” (…).
c2. entre as 21:03 e as 21:09: a menor A. T. gravou no seu telemóvel a seguinte conversa que teve com o arguido S. A.:
- A. T.: “S. A. amo-te muito, eu quero ir para aí, de vez, de preferência, se as coisas começarem a correr mal cá em casa eu vou de vez… S. A. quero ficar contigo” [cfr. fls.89, do Apenso 1].
d. no dia 22.07.2018, entre as 3:46 e as 20:37:
- A. T.: “Tas aí?”;
- A. T.: “Eu N podia falar ao tele quando me ligaste”;
- A. T.: “Vou dormir! Dps manda msg”;
- S. A.: “Claro que não, tinhas saído :)”;
- A. T.: “Yh com a B. D.”;
(…)
- S. A.: “Não atendes te porque estavas com gajos?”;
- A. T.: “Achas? N atendi pq nng pode saber k tu e eu falamos”;
(…)
- S. A.: “Podes bem ir apanhar no cuzinho. :)”.
e. no dia 24.07.2018, entre as 19:13 e as 19:25:
- A. T.: “Já não namoro ou vês mal no meu perfil?”;
(…)
- S. A.: “Epah vai te fuder meu”;
- S. A.: “Postaste isso ontem”;
- A. T.: “Sim”;
- S. A.: “E a beijar outro também!”;
(…)
- S. A.: “Pensas que sou burro ou que chavala?”.
(…)
- S. A.: “Vai enganar o caralho”;
- A. T.: “S. A. e namorado da B. D.”;
- A. T.: “FDS já nem namoro”;
(…)
- S. A.: “Eu vou mandar msg ao gajo”;
- S. A.: “E pergunto lhe”;
- A. T.: “O meu estado diz outra coisa mas ok”;
- S. A.: “Que eu sei quem ele é”;
(…)
- A. T.: “E eu apaguei pq acabei ontem com o gajo”;
(…)
- S. A.: “Olha nem uma foda mal dada vales”;
- A. T.: “O mentiroso até aqui foste tu…. K íamos “fugir” e não fugimos se fugissemos nd disto tinha acontecido por isso”;
- A. T.: “E eu disse eu acabo com ele pah ir ter cntg e acabei”;
(…)
- A. T.: “Prontos e eu disse eu acabo com ele! Acabei pah ir…. Cntg no dia seguinte já ia comprar bilhete… Pah ir”;
- S. A.: “Vem então”;
(…)
- S. A.: “Vens resolvemos e tamos bem pronto”;
- A. T.: “5 minutos! Mds S. A.!”;
- S. A.: “Tu percebeste”;
- A. T.: “Hm! Não sei não das últimas vezes é msm 5 minutos! Mas vah vou comprar os bilhetes….. Se for tenho de ir no sábado! Não este mas no próximo! Pq rp os meus pais tão fora e assim aproveito” (…).
f. no dia 27.07.2018, entre as 10:29 e as 23:20:
- S. A.: “Sempre vens hoje?”;
- S. A.: “Não he?”;
- A. T.: “Nop!”;
- A. T.: “Esta semana k vem mas vou msm?”;
- S. A.: “Yah”;
(…)
- A. T.: “Podemos falar por vídeo chamada”;
- S. A.: “Agora? Nao” (…).
g. no dia 29.07.2018, entre as 11:33 e as 22:20:
- A. T.: “Já vamos fazer vídeo espera só um pouco”;
- S. A.: “Despacha te que daqui a pouco vou sair” (…)”.
h. no dia 30.07.2018, entre as 10:37 e as 21:46:
- A. T.: “Tou a começar a tratar das cenas!” [referindo-se à viagem que iria realizar até Lisboa, em 04.08.2018, para estar com o arguido S. A.];
- S. A.: “Ok”;
- A. T.: “Se quiseres que eu vah na sexta só saio daqui as 18.25!”;
- S. A.: “Na boa”;
- A. T.: “Tabom… Então vou tratar do resto e bla bla bla”;
- S. A.: “Ok”;
- A. T.: “Quinta ou sexta agr é cntg”;
- S. A.: “Sexta”;
- A. T.: “Ok”;
(…)
- S. A.: “Depois precisas de dinheiro pra ir ne?”;
- S. A.: “So pra saber”;
- A. T.: “Não sei… Amanhã digo te pq vou lá ver melhor as cenas e tal”;
- A. T.: “Em principio manhã já tá tudo feito”;
- S. A.: “Oki”;
- A. T.: “Pah veres como não tou a mentir eu vou msm”;
- S. A.: “So acredito quando tiveres aqui”;
- A. T.: “Tabom!!”;
- A. T.: “Tu tens carro aí?”;
- S. A.: “Não :(”;
(…)
- S. A.: “E cá quando tiveres vai chover uma piça pra dentro de ti” (…);
i. no dia 31.07.2018, entre as 10:32 e as 23:20:
- A. T.: “Prontos! Como é de sexta eu ir as 07 só da pah gaja assim! O problema é que só chego aí a 13h” [referindo-se à viagem que iria realizar até Lisboa, em 04.08.2018, para estar com o arguido S. A.];
- S. A.: “Pois”;
- S. A.: “Não dá para vires mais. Tarde?”;
- A. T.: “Não S. A.! Só msm aquela hora!”;
(…)
- S. A.: “Porque eu só saio às 17”;
- A. T.: “Eu sei S. A.!”;
(…)
- A. T.: “Mais vale ir sábado! Chego cedo aí!”;
- S. A.: “Yah. Mas depois vais logo embora na segunda ou terça ne..”;
- A. T.: “Não!”;
- S. A.: “Então?”;
- A. T.: “Fim de semana porra.. N vou ir aí passar 3 dias ou 4”;
- S. A.: “Então?”;
- S. A.: “Ficas cá a semana toda?”;
- A. T.: “yh”;
- S. A.: “Ahhhh”;
- A. T.: “Até domingo”;
(…)
- S. A.: “Eu dou te piça todos os dias”;
- S. A.: “Duvidas que queiras outra”;
- A. T.: “Ando com falta da tua”;
- S. A.: “Se quiseres outra, eu também arranjo outra em dois tempos”;
- A. T.: “Sábado as 07.45 saio daqui chego aí a 13 tabom?”;
- S. A.: “Ta bom”;
(…)
- S. A.: “Olha, e os teus pais? Não vão stressar?”;
- A. T.: “Eles não sabem de nada nem precisam de saber lá quero saber deles…. Dps de eu sair daí vou ter com o meu irmão por isso”;
- S. A.: “Hm.. Ok”;
- S. A.: “Vou te buscar ao comboio”;
- A. T.: “Hmmmmmmmmm”;
(…)
- S. A.: “Quero o meu nude”;
- A. T.: “Mas eu N prometi nd criatura N me lembro”;
- S. A.: “Eu lembro meeee”;
(…)
- A. T.: “Eu naooooo”;
(…)
- S. A.: “Fico a espera”;
(…)
- A. T.: “Vou te mandar ft das pernas queres.”;
(…)
- S. A.: “E do resto”;
(…)
- S. A.: “Eu quando vou lamber é o resto, não é as pernas”;
- A. T.: “Pena”;
- S. A.: “Pena?”;
- S. A.: “Preferes que te lambia a perna do que a cona?”;
- A. T.: “Tava na brinca fds pah me lamber as pernas já basta a minha cadela”;
(…)
- S. A.: “Quero a minha fotoooo”;
(…)
- A. T.: “Foto de uma perna” [A menor A. T. remeteu uma fotografia onde é visível uma das suas pernas];
- S. A.: “Eu pedi do resto!”;
(…)
- A. T.: “Não”;
- S. A.: “Okay.”;
- A. T.: “Mandei te bues”;
(…)
- S. A.: “Mas ainda não me. Disseste se depois precisas do dinheiro pra ir” [referindo-se novamente à viagem que a menor iria realizar até Lisboa, no dia 04.08.2018, para estar com ele];
(…)
- S. A.: “Sábado ficamos em casa que é pra matar saudades” [referindo-se à estadia da menor na sua casa, em Lisboa, a partir do dia 04.08.2018];
- S. A.: “Vimos. Um. Filme.”;
- S. A.: “Fazemos. Um. Filme.”;
- A. T.: “Yh”;
- S. A.: “E matamos as saudades todas.”;
(…)
- A. T.: “Até quero ver como me vais acordar criatura”;
- S. A.: “Queres que te diga.”;
- A. T.: “Quero.. Pormenor a pormenor”;
- S. A.: “Entao”;
- S. A.: “Tu vais estar a dormir”;
- S. A.: “Eu começo a beijar te no pescoço”;
- S. A.: “E a passar te a mão nos peitos”;
- S. A.: “Começo a descer e a tirar te a cuecas”;
- S. A.: “E começo a descer com a minha cabeça por baixo”;
- S. A.: “Começo a dar te beijos na barriga e a descer”;
- S. A.: “E vou direitinho a tua cona gostosa”;
- S. A.: “Começo a lambela todinha”;
- S. A.: “Até ficares completamente molhada”;
- S. A.: “E fudemos assim bem gostoso pra começar bem o dia”;
- S. A.: “E tu começas a gemer tão alto”;
- S. A.: “Que eu tenho que tapar te a boca e tu começas a morder me a mão”;
- S. A.: “De quereres gemer mais e mais”;
- S. A.: “E eu não te deixar”;
- A. T.: “Uiii já tou a imaginar!”;
(…)
- S. A.: “As minhas fotos”;
- A. T.: “Mas N da”;
- S. A.: “Bosta..”;
- S. A.: “Olha não disseste que eles [referindo-se aos progenitores da menor A. T.] este fim de semana vão pra fora ou que era?” [referindo-se à estadia da menor na sua casa, em Lisboa, a partir do dia 04.08.2018];
- A. T.: “Houve problemas na fabrica com os camiões! E tem de fazer os carregamentos esta semana e a minha mãe tem de tar presente pq yh tem de assinar e pagar e bla bla bla”;
- S. A.: “Hmm ok”;
- S. A.: “Então tenho de tar atwnto as notícias”;
- S. A.: “Não vá eles fazerem queixa etc”;
- A. T.: “Duvido que fosse pah notícias”;
- S. A.: “Mais vale prevenir”;
- S. A.: “Assim que tivermos juntos”;
- S. A.: “Por favor”;
- A. T.: “Mas se for pelo menos que metam uma foto gira não uma de quando eu tava drogada”;
- S. A.: “Desligas o tele”;
- A. T.: “Eu não vou levar cartão nem nada nem sei se levo tele acho melhor não! Pq assim não conseguem conectar e assim”;
- S. A.: “Assim pensam que foste raptada”;
- S. A.: “Desligas so o telemóvel”;
- S. A.: “Ficas com o meu PC vais vendo filmes”;
(…)
- S. A.: “Juro te que um dia ficamos juntos”;
- S. A.: “Quero fotos porra”;
(…)
- S. A.: “Quando falo de fotos não respondes tu”;
(…)
[A menor A. T. remeteu uma primeira fotografia sua, onde está despida, em frente ao espelho da casa de banho, usando apenas a parte de cima de um biquíni reduzido a cobrir-lhe os seios e umas cuecas de fio dental - cfr. fotografia de fls.87, do Apenso 1];
- A. T.: “Esta foto ficou um pouco mal”
- S. A.: “Entoa manda me mais...”;
[A menor A. T. remeteu uma segunda fotografia sua, alterando a sua pose, onde está despida, em frente ao espelho da casa de banho, usando a mesma parte de cima de um biquíni estreito a cobrir-lhe os seios e umas cuecas de fio dental - cfr. fotografia de fls.88, do Apenso 1];
- A. T.: “Só muda o braço”;
(…)
- S. A.: “Manda mais”;
- S. A.: “Tou a gostar”;
- A. T.: “Tas então espera por amanhã eu tirar mais”;
- S. A.: “Está bem baby”;
(…)
- S. A.: “Queria fazer web”;
- A. T.: “Tou com os meus pais espera só que eles siam bby” (…).

j. no dia 01.08.2018, entre as 13:11 e as 22:41:
- S. A.: “Se fosses boa pessoa já tinhas mandado os nudes”;
(…)
- S. A.: “Eu já te mandei nudes”;
- S. A.: “Contenta-te com isso agora”;
- A. T.: “Nem sei se os tenho”;
(…)
- S. A.: “Olha, se sairmos, um exemplo pra praia ou assim com o brasileiro ou alguém. Tu tens 17 anos ok?”;
(…)
- S. A.: “Só mandas uma foto?”;
- S. A.: “Estava a espera de outra”;
(…)
- S. A.: “As minhas fotos?”;
(…)
- S. A.: “E a minha fotoP?”;
(…)
- A. T.: “Já te disse N sou de mandar fts (nudes ou seminudes)!! Contenta te com o que tens…Dps quando eu estiver aí é diferente” (…).

l. no dia 02.08.2018, entre as 11:44 e as 23:40:
- S. A.: “És virgem és”;
- S. A.: “podias ser virgem com os gajos de pilinha pequena”;
- A. T.: “Pois”;
- S. A.: “Depois de mim deixaste de ser”;
(…);
- S. A.: “Cuidado… Tas a dar muita cana com a tua irmã”;
- S. A.: “Vais te embora e tipo ela ta sempre a falar do S. A.. Não sei se sou eu ou outro.. Mas se for eu ela pode dizer aos teus pais”;
(…)
- A. T.: “Ela N se chiva! Pq já Andei Com vários rapazes próximos da tua idd tp 21 23 e ela soube pq gente do café contou lhe e ela já nem sabe quem são… Foram tantos rapazes”;
(…);
- S. A.: “Comprei um vestido para ti”;
- S. A.: “E comprei uma coisa pra nos”;
(…);
- S. A.: “A coisa pra nos e pra quando tivermos assim mais coiso e ligamos aquilo”;
(…);
- S. A.: “Eu tenho um medo.. Mas yah”;
- A. T.: “Pois… Então imagina eu”;
- A. T.: “Medo de ser apanhado?”;
- S. A.: “Yah… De a tua mãe fazer queixa”;
- S. A.: “Alguma coisa…” (…).

m. no dia 03.08.2018, entre as 00:02 e as 22:04:
- S. A.: “Quando entrares no bus fiz sim?” [referindo-se novamente à viagem que a menor iria realizar até Lisboa, no dia seguinte, 04.08.2018, para estar com ele];
- S. A.: “Pra eu saber”;
- A. T.: “Sim”;
- A. T.: “Quer dizer não!”;
- S. A.: “Não?”;
- A. T.: “Pq a parte do telemóvel! É complicado! Acho k vou comprar outro cartão tp não sei… Compro um só pah te avisar e tal tas a ver!”;
(…);
- S. A.: “Mandas msg a dizer que já estás no bus”;
- S. A.: “E no caminho pra cá desligas”;
- A. T.: “Tabom mor!!”;
- A. T.: “Eu dps vejo a melhor forma”;
(…)
- S. A.: “E complicado”;
- S. A.: “Porque o telemóvel tem. Um. Número de serie…”;
- S. A.: “Quanto mais cuidado melhor”;
(…)
- S. A.: “Efazermos videos”;
- S. A.: “Video”;
- S. A.: “Não”;
- A. T.: “Daqui a bocado!”;
- A. T.: “Tenho a minha mãe perto!”;

n. no dia 04.08.2018, entre as 00:34 e as 02:41:
- A. T.: “Tp eu tou me a vestir.. Pah sair e yh não vou voltar a casa… Quer dizer.. Lá para as 06 da manhã venho a casa buscar as roupas e assim e dps espero por as 07.30 e vou pah baixo e dps yh”;
- S. A.: “Ok…”;
(…);
- S. A.: “Vais falar comigo”;
- S. A.: “Depois vocês vão se enrolar”;
- S. A.: “E vais dizer que ficaste sem bateria ou sem dados”;
- A. T.: “Oh mor já chega o gajo é feio que dói!!”;
- A. T.: “Porra eu disse que mudei só te quero a ti”;
(…)
- A. T.: “Vou fazer direta já disse não te preocupes eu pah tar cntg fico fininha!”;
- S. A.: “Ok..”;
- S. A.: “Até amanhã”;
- S. A.: “Beijinhos..”;
- A. T.: “Bjs”.
(os destacados são nossos)

95.No dia 04 de Agosto de 2018, pelas 07h45m, a menor/assistente A. T., acompanhada pelo seu amigo T. C., deslocou-se de Esposende até ao Porto e, uma vez aí, apanhou sozinha um autocarro com destino a Lisboa (Sete Rios), para assim ir ao encontro do arguido S. A., conforme haviam previamente combinado, designadamente através das mensagens referidas em 94.
96.Para esse efeito, esta menor/assistente convenceu o aludido T. C. a comprar-lhe um bilhete rodoviário, tendo como ponto de partida Esposende e como destino a cidade de Lisboa (Sete Rios).
97.Uma vez chegada à Central de Camionagem de Lisboa, cerca das 13h00m desse dia 04 de Agosto de 2018, aquela A. T. encontrou-se com o mencionado S. A., que estava à sua espera e que a levou para a margem sul, até à sua residência.
98.Chegados a essa habitação, este arguido beijou a menor/assistente nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas da identificada A. T., apalpando-as.
99.Seguidamente, depois de se despirem e de se deitarem na cama, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na vagina desta menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
100.Enquanto permaneciam nessa habitação, os mencionados S. A. e A. T., em circunstâncias que, em concreto, não foi possível apurar, tomaram conhecimento que os progenitores desta última já tinham participado às autoridades policiais o seu desaparecimento.
101.Em face do referido em 100., o arguido S. A. decidiu fazer regressar imediatamente a casa a aludida A. T..
102.Assim, cerca das 16h00m do mesmo dia 04 de Agosto de 2018, o arguido levou esta menor/assistente até à estação de caminhos de ferro.
103.Uma vez aí, o identificado S. A. adquiriu um bilhete de viagem, que entregou à mencionada A. T., e deixou-a sozinha, para que, à hora prevista, esta apanhasse o meio de transporte que a iria levar de volta a Esposende.
104.No seguimento da ocorrência dos factos descritos em 95. a 103. e logo que tomou conhecimento que os mesmos estavam a ser investigados pela Polícia Judiciária, por aquela A. T. ser menor de idade, o arguido S. A., receando poder vir a ser identificado e até ser preso, deixou de contactar com ela durante algum tempo.
105.Contudo, a partir de Outubro de 2018 – altura em que havia já regressado de Lisboa e encontrava-se a residir novamente em Esposende –, retomou os referidos contactos com a menor/assistente A. T. (através das redes sociais Instagram e WhatsApp) e também pessoalmente, com o propósito firme de continuar a relacionar-se sexualmente com ela.
106. Assim, em dia que, em concreto, não foi possível apurar, mas situado nos meses de Outubro/Novembro de 2018, sempre depois das 23h00m/23h30m, o arguido S. A. foi buscar aquela A. T. a casa (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.) e levou-a de carro até à sua residência sita em ... – Esposende, para manter relações sexuais com ela.
107.Já no quarto, este arguido começou a beijar nos lábios a aludida A. T., envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas da menor/assistente, apalpando-as.
108.Depois de se despirem e de se deitarem na cama, o arguido S. A. posicionou-se em cima da mencionada A. T. e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
109.Ainda durante os meses de Outubro/Novembro de 2018, em data que, em concreto, não foi possível determinar, à noite, sempre depois das 23h00m/23h30m, o arguido S. A. deslocou-se até à residência da menor/assistente A. T. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), que já o aguardava no exterior, e transportou-a até um local ermo situado na localidade de ..., do concelho de Esposende, com o intuito de manter relações sexuais com ela.
110.Chegados ao local e assim que imobilizou a viatura, o arguido começou a beijar a menor/assistente nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
111.Depois de se despirem, o arguido S. A. posicionou a aludida A. T. sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
112.Também durante os meses de Outubro/Novembro de 2018, à noite, sempre depois das 23h00m/23h30m, por 2 (duas) vezes, em datas que, em concreto, não foi possível determinar, o arguido S. A., depois de ter ido buscar a menor/assistente A. T. a casa (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), transportou-a até um local ermo situado em ... – Esposende, com o intuito de manter relações sexuais com ela.
113.Assim que imobilizou a viatura, o arguido começou a beijar essa A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
114.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca dessa menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
115.Seguidamente, posicionou a aludida A. T. sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
116.Em dia que, em concreto, não foi possível apurar, mas situado no mês de Fevereiro de 2019, à noite, sempre depois das 23h00m/23h30m, o arguido S. A. foi, mais uma vez, buscar a menor/assistente A. T. a casa (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.) e levou-a de carro até uma zona de monte, sita em ..., do concelho de Esposende, para manter relações sexuais com ela.
117.Depois de imobilizar o veículo, o arguido começou a beijar a mencionada A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
118.Quando já se encontravam sem roupa vestida, o arguido S. A. posicionou a menor sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
119.Entretanto, em finais de Fevereiro / inícios de Março de 2019, este arguido passou a residir na cidade de Barcelos.
120.Em dia que, em concreto, não foi possível determinar, mas situado no período referido em 119., sempre depois das 23h00m/23h30m, o arguido S. A. foi buscar a menor/assistente A. T. a casa (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.) e levou-a de carro até à sua residência, sita em Barcelos, para manter relações sexuais com ela.
121.Já no quarto, o arguido começou a beijar essa A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
122.Assim que retiraram as roupas que usavam, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca desta menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
123.Seguidamente, colocou a mesma A. T. sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o.
124.Entretanto, o arguido S. A. arrendou um quarto em ... – Esposende, onde passou a viver.
125.Em data que, em concreto, não foi possível apurar, mas situada no mês de Maio de 2019, durante a tarde, este arguido encontrou-se com a menor/assistente A. T. em Esposende e transportou-a de carro até ao quarto que tinha arrendado, referido em 124., para manter relações sexuais com ela.
126.Uma vez aí, o arguido S. A. começou a beijar a aludida A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
127.Depois de se despirem, este arguido introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
128.Seguidamente, deitou a menor/assistente na cama, acariciando-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
129.Após, colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
130.No mês de Junho de 2019, o arguido S. A. e a menor/assistente A. T. encontraram-se regularmente, sendo que naqueles que ocorriam à noite, mantinham, em regra, relações sexuais.
131.Assim, em data que, em concreto, não foi possível concretizar, mas situada antes do dia 18 de Junho de 2019, o arguido S. A. encontrou-se, mais uma vez, com a menor/assistente A. T. e levou-a de carro (próprio ou de terceiro ou de aluguer) até ao seu quarto arrendado, referido em 124., para manter relações sexuais com ela.
132.Uma vez aí, o arguido começou a beijar a identificada A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
133.Depois de se despirem e de a menor/assistente se ter deitado na cama, o arguido S. A. colocou-se em cima dela e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
134.Ainda no mês de Junho de 2019, em dia que, em concreto, não foi possível apurar, mas situado antes de 18 de Junho de 2019, o arguido S. A. encontrou-se, novamente, com a menor/assistente e levou-a de carro (próprio ou de terceiro) até a um local ermo, situado Esposende, para manter relações sexuais com ela.
135.Depois de imobilizar a viatura, o arguido começou a beijar aquela A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
136.Assim que retiraram as roupas que vestiam, o arguido S. A. colocou a menor/assistente sobre o seu colo e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
137.Em datas que, em concreto, não foi possível determinar, mas situadas no período compreendido entre os meses de Maio e de Junho de 2019, o arguido S. A., titular do cartão com o número ........., trocou com a menor/assistente A. T., entre outras, as seguintes mensagens de telemóvel, através das aplicações WhatsApp e Instagram, nas quais combinou com ela diversos encontros, com a finalidade de manterem relações sexuais, pediu-lhe, várias vezes, que lhe enviasse “nudes” dela, remeteu-lhe fotografias suas, onde exibia o seu pénis, e manteve com a mesma conversas de teor sexual, falando dos actos sexuais que praticavam e que queria praticar quando estivessem juntos [cfr. fls.441-454]:
I.
- A. T.: “Sexta à noite podes vir cmg à festa da minha escola”;
- S. A.: “Sim amor”;
- A. T.: “fixee”;
- S. A.: “Mas na escola mesmo? Vai ser um pouco arriscado..”;
- A. T.: “Tu entendes te amor a gente nem vai entrar na escola vamos tar sempre fora da escola”;
- S. A.: “Esta bem” [fls.442].

II.
A menor/assistente A. T. remeteu duas fotografias suas ao arguido S. A., onde está nua, em duas delas, aparece nua, numa delas, apenas da cintura para baixo, deitada na cama, com as pernas abertas e para cobrir a região genital, colocou um ícone em formato de coração, e noutra, surge sentada no chão, em frente ao espelho, de pernas cruzadas, tapando, com as pernas e os braços, os seios e a região genital [cfr. fls.446].
III. A menor A. T. remeteu uma fotografia sua, onde está vestida, em frente ao espelho da casa de banho, com uma perna apoiada no lavatório, para exibir e acentuar a região nadegueira - cfr. fls.447];
- S. A.: “Nossa que cu”
“Aiii amor”
“Olha tu assim e eu por trás”;
- A. T.: “Aiii amor quem me dera. Tenho tantas saudades de fazer amor cntg”;
- S. A.: “E eu”
“Tenho de bater 3728 vezes pra passar”
“E mesmo assimmmm” (…).
IV.
- A. T.: “Posso mandar vídeo a meter dedos?”;
- S. A.: “SIMMMM”
“QUE PERGUNTA”;
- A. T.: “tabem”;
- S. A.: “Mas tira fotos também”
“Nossa, ela quer meter dedos, kkkk”
“Já não metes a quanto tempo?”
“Aposto que ainda ontem ou a dois dias meteste?”;
- A. T.: “Tenho vontade”;
- S. A.: “Ao menos diz”
“Que assim eu ajudo digo assim coisas pra tu ficares tolinha”
- A. T.: “Aiii mo agora xau vou tirar fts e gravar o vídeo e já volto sim?;
- S. A.: “Sim Kkk”;
(…)
- A. T.: “Mooo”
“Tas preparado??”
- S. A.: “Sim mo”;
A menor/assistente A. T. remeteu ao arguido S. A. uma primeira fotografia sua, onde está nua, exibindo os seios, em frente ao espelho da casa de banho, sentada de lado sobre o lavatório [cfr. fls.448].
De seguida, remeteu uma segunda fotografia sua, onde está nua, de costas voltadas para o espelho da casa de banho e sentada de perfil sobre o lavatório, para exibir e acentuar a região nadegueira e mostrando um dos seios, parcialmente tapado por um dos braços [cfr. fls.449].
A menor/assistente A. T. remeteu, ainda, mais três fotografias, onde aparece despida, usando apenas um soutien e cuecas de fio dental, adoptando, em cada uma delas, poses distintas, de costas, de frente e de perfil, em frente ao espelho da casa de banho [cfr. fls.449].
- A. T.: “Agora vê e diz me msm a verdade amor”
“Tou gorda não tou”
- S. A.: “Amor”
- A. T.: “siiim”
- S. A.: “O meu pau começou a crescer sozinho!”
“Aiii amor!”
“Aiiiiii moooor”
“Juro te”;
(…)
- S. A.: “Quando tiver contigo, vou te fazer a mulher mais feliz do mundo”
“Vou te deixar a mulher mais desejada do mundo!”;
(…)
- S. A.: “Tas tola?! Tu tas perfeita”
“Antigamente eras esquelética mo!”
“Agora tas toda jeitosa”;
- A. T.: “bota ganhar mais??”
- S. A.: “Porque fazer anal faz ganhar cu”
“Aí amor, eu amo, mas sei que te dói”;
- A. T.: “Volto a perguntar”
“Ganhar mais??”;
- S. A.: “Eu quero”
“Juro te, tipo, imagina tu em cima de mim, com ele no rabo, e eu a mexer nela com a minha mão e a enfiar te os dedos”;
- A. T.: “Cala-te mooo. Fds não me deixes já molhadinha. Fazemos então da próxima vez eu faço um esforço, é que dói neh, mas pronto não dói tanto pq me dás carinho e assim momo”;
- S. A.: “Ou então tu de quatro e eu a meter ele no rabo depois tiro meto na cuca depois tiro meto no rabo”;
(…)
- S. A.: “Mas o Rabinho tem de tar bem lubrificado senão faz doidos”;
O arguido S. A. enviou um vídeo à menor A. T., no qual exibia o seu pénis e se masturbava [cfr.451-452].
- S. A.: “Vou te deixar tao tola tão tola”;
(…)
- S. A.: “Que vais te vir e eu ainda nem meti ele lá dentro”;
(…)
- S. A.: “Mas não podes reclamar nem dizer pra parar nem dizer que te tou a deixar tola tem de ser apenas a gemer”;
“E com as mãos e com a boca fazes o que quiseres”;
“Mas o resto não podes te mexer”;
(…)
- S. A.: “Por isso, se falares dou te uma palmada no rabo” (…).

V.
- A. T.: “Finalmente amanhã vamos matar as saudades vida fogo já não aguento tar sem ti”;
- S. A.: “nem eu sem ti”;
“Nem imaginas fogo”;
- A. T.: “so tenho 31 mo” (…);
- S. A.: “E eu a pensar que tinhas 13.”;
“Então podemos namorar”;
“Se tens 32”;
“31” (…);
- A. T.: “quem me dera ter 18 ou melhor a msm idade que tu (…)”;
- S. A.: “Nah se fosses da mesma idade que eu não me querias”;
- A. T.: “É pq não!??”;
- S. A.: “É a mesma coisa de não quereres gajos da tua turma kkkk”;
- A. T.: “É talvez tenhas razão”;
- S. A.: “Eu gosto de raparigas mais novas, as mais velhas tem a puta da mania”
“E depois as da minha idade são pessoas sem cabeça”;
- A. T.: “Pois mo então sou ideal para ti”;
- S. A.: “Acho que tu quando chegares a minha idade não vais ser assim porque o mais certo é já vivermos juntos”;
“Vai ser topppp”;
“Juro te, se os teus pais deixassem aos 16 casávamos”;
“Mas contigo casava mesmo porque quero!”;
(…)
- A. T.: “Tudo bem que não queiras ter um filho cmg para já. Eu sou bue nova e sim podes msm ir preso. Mas a gente tem bue tempo para isso”.

(os destacados são nossos)
138.No seguimento da sua detenção (fora de flagrante delito) nos presentes autos, pela prática dos factos mencionados em 79. a 137., o arguido S. A., no dia 18 de Junho de 2019, foi sujeito a 1º interrogatório judicial, no âmbito do qual lhe foi aplicada a medida de coacção de proibição de contactos, por qualquer meio [escrito, falado ou tecnológico], directo ou por interposta pessoa, com a menor/assistente A. T..
139.Contudo, depois de ter sido restituído à liberdade, ainda nesse mesmo dia 18 de Junho de 2019, o arguido S. A., indiferente à medida de coacção que lhe havia sido aplicada e às consequências que lhe pudessem advir do seu incumprimento, decidiu continuar a contactar com a aludida A. T., quer por telemóvel, quer pessoalmente.
140.Assim, nesse dia, à noite, o arguido S. A., através da aplicação Discord, enviou várias mensagens para o telemóvel desta menor/assistente, nas quais lhe dizia que a amava muito, que não queria saber da medida de coacção que lhe tinha sido aplicada, nem iria deixar de falar ou de estar com ela por esse motivo [cfr. fls.861-892].
141.Em dia que, em concreto, não foi possível apurar, mas situado no mês de Julho de 2019, após prévia combinação por telemóvel através da aplicação Discord, o arguido S. A. encontrou-se com a menor/assistente A. T. junto à Casa da Juventude, em Esposende.
142.Durante esse encontro, o arguido S. A. e esta menor/assistente beijaram-se nos lábios, envolvendo também a língua, o que fizeram por várias vezes.
143.Volvidos alguns dias, em data que, em concreto, não foi possível determinar, mas situada no mês de Julho de 2019, o arguido S. A., através da aplicação Discord, contactou a menor/assistente A. T. e combinou com ela que, nessa noite, iria buscá-la a casa para a levar para outro local, onde manteriam relações sexuais, acordando, ainda, aparecer apenas depois da 01h30m, altura em que os familiares dela já estariam a descansar e não dariam pela sua ausência.
144.Na concretização deste seu desígnio, na ocasião referida em 143., cerca da 01h30m/02h00, o arguido S. A. deslocou-se de carro até às imediações da residência da aludida A. T., referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), onde ficou a aguardar, enquanto esta saía sorrateiramente de casa, sem o conhecimento e consentimento dos seus progenitores.
145.De seguida, o mesmo arguido transportou a identificada A. T. até à sua casa, sita, à data, na Rua ..., nº.., em ... – Esposende.
146.Uma vez aí, o arguido levou menor/assistente logo para o seu quarto, onde a beijou nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
147.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
148.Seguidamente, deitou a menor/assistente A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
149.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
150.Alguns dias mais tarde, em data que, em concreto, não foi possível concretizar, também mas situada no mês de Julho de 2019, cerca da 01h30m/02h00, o arguido deslocou-se de carro até às imediações da residência da identificada A. T., referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), onde esta já o esperava, transportando-a, novamente, até à sua casa, sita em ... – Esposende, referida em 145., com o propósito de manter relações sexuais com ela.
151.Uma vez aí, foram para o quarto, onde o mesmo arguido beijou aquela A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
152.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
153.Seguidamente, deitou a menor/assistente A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
154.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
155.Volvidos alguns dias, em data que, em concreto, não foi possível determinar, mas situada no mês de Julho de 2019, cerca da 01h30m/02h00, o arguido S. A. deslocou-se de carro até às imediações da residência da identificada A. T., referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), onde esta já o esperava, transportando-a, novamente, até à sua casa, sita em ... – Esposende, referida em 145., com o propósito de manter relações sexuais com ela.
156.Já em casa, este arguido levou a menor/assistente para o quarto, onde a beijou nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
157.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
158.De seguida, deitou aquela A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
159.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
160.Decorridos mais alguns dias, em data que, em concreto, não foi possível concretizar, mas situada no mês de Julho de 2019, cerca da 01h30m/02h00, o arguido S. A. deslocou-se de carro até às imediações da residência da identificada A. T., referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), onde esta já o esperava, transportando-a, de novo, até à sua casa, sita em ... – Esposende, referida em 145., com o propósito de manter relações sexuais com ela.
161.Uma vez aí, este arguido levou a menor/assistente para o quarto, onde a beijou nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
162.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
163.De seguida, deitou esta A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
164.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
165.Entretanto, devido à intervenção da CPCJ de Esposende e à aplicação de uma medida de promoção e protecção de apoio junto de outro familiar, a menor/assistente A. T., a partir de - Julho de 2019, saiu da habitação dos progenitores e passou a residir na casa do seu irmão mais velho, V. J., em Vila Nova de Cerveira.
166.Porém, no dia 26 de Julho de 2019, durante a manhã, após prévia combinação para o efeito [cfr. fls.869-873], o arguido S. A. deslocou-se, desta feita, até Vila Nova de Cerveira, sabendo que a menor/assistente, durante esse período da manhã, iria estar sozinha em casa, por o seu irmão estar a trabalhar, e tendo em vista, durante essa ausência, manter relações sexuais com esta última.
167.Uma vez nessa habitação, os aludidos S. A. e A. T., foram para um dos quartos, onde o primeiro beijou a segunda nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
168.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca desta menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
169.Seguidamente, deitou a mencionada A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
170.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
171.Em data que, em concreto, não foi possível apurar, mas situada no período compreendido entre os dias 27 de Julho de 2019 e 24 de Agosto de 2019, cerca da 01h30m/02h00, quando a menor/assistente A. T. já havia regressado novamente à habitação dos seus progenitores, o arguido S. A. conforme previamente planeado, foi buscá-la às imediações dessa residência, referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), e levou-a, de seguida, até à sua casa, sita em ... – Esposende, referida em 145., para manter relações sexuais com ela.
172.Já em casa, este arguido levou a menor/assistente para o quarto, onde a beijou nos lábios, envolvendo também a língua, o que fez por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
173.Depois de se despirem, o arguido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca da menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
174.De seguida, deitou aquela A. T. na cama e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
175.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
176.Em data que, em concreto, não foi possível determinar, mas situada no período compreendido entre os dias 27 de Julho de 2019 e 24 de Agosto de 2019, cerca da 01h30m/02h00, o arguido S. A. conforme previamente estabelecido, foi buscar num carro a menor/assistente A. T. às imediações da residência desta, referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), e levou-a, de seguida, até a uma zona de monte, sita na localidade de ..., do concelho de Esposende, com o intuito de manter relações sexuais com ela.
177.Uma vez aí, este arguido começou a beijar aquela A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
178.Quando já se encontravam sem roupa, o aludido S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca desta menor/assistente, sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
179.Seguidamente, deitou a identificada A. T. no banco traseiro e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
180.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da menor/assistente e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
181.Em data que, em concreto, não foi possível concretizar, mas situada no período compreendido entre os dias 27 de Julho de 2019 e 24 de Agosto de 2019, cerca da 01h30m/02h00, o arguido S. A. conforme previamente planeado, foi buscar num carro a menor/assistente A. T. às imediações da residência desta, referida em 2. (junto do estabelecimento de café, denominado “P.”, referido em 10.), e levou-a, de seguida, até a uma zona de monte, sita na localidade de ..., do concelho de Esposende, com o intuito de manter relações sexuais com ela.
182.Aí chegados, este arguido começou a beijar aquela A. T. nos lábios, envolvendo também a língua, por várias vezes, ao mesmo tempo que colocava as suas mãos sobre os seios e as nádegas desta, apalpando-as.
183.Depois de se despirem, o identificado S. A. introduziu o seu pénis erecto na boca daquela A. T., sem utilizar preservativo, friccionando-o com sucessivos movimentos de vaivém.
184.Seguidamente, deitou a menor/assistente no banco traseiro e acariciou-lhe a região vaginal com a boca e a língua.
185.Após, o arguido colocou-se em cima do corpo da mencionada A. T. e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta, sem utilizar preservativo, friccionando-o até ejacular.
186.No período compreendido entre os dias 21 de Julho de 2019 e 24 de Agosto de 2019, o arguido S. A., titular do cartão com o número ........., também trocou, entre outras, as seguintes mensagens de telemóvel, através da aplicação Discord, com a menor/assistente A. T., nas quais combinou com ela diversos encontros, com a finalidade de manterem relações sexuais, pediu-lhe que lhe enviasse “nudes” dela, e manteve com a mesma conversas de cariz sexual [cfr. fls.861-879]:
aa. no dia 21.07.2019, entre as 18:05 e as 18:29:
- S. A.: “(…) Tenho saudades tuas, de termos na praia os dois a passear”;
(…)
- S. A.: “É só mais uam fase amor, em breve estaremos juntinhos (…)”.
bb. no dia 23.07.2018, entre as 21:34 e as 21:38:
- S. A.: “Não tiraste foto pra eu” (…).
cc. no dia 25.07.2018, wntre as 17:28 e as 21:10:
- A. T.: “Rua … Vila Nova de Cerveira Portugal. Esta é a morada da J.. Vens ter a este café andas para a frente um bocado tens um corte à tua direita mo” [referindo-se ao encontro que iriam ter no dia seguinte, -.07.2019, em Vila Nova de Cerveira, descrito em 167. a 171.];
- S. A.: “Tipo nessa rua do café e a primeira a direita”;
- A. T.: “Eu vou lá buscar te. Sim é o primeiro corte à direita”;
- S. A.: “E depois logo as primeiras casas? Ou ainda mais alguma?”;
- A. T.: “É a última casa do lado direito!! Mas não venhas para lá para a frente vai para a beira do contentor do lixo que eu vou lá ter pq tenho de ir msm despejar o lixo kkkk”.
dd. no dia 26.07.2018:
dd. I - Entre as 7:30 e as 7:31:
- A. T.: “Ta a sair agr de casa. Já tas a ouvir?”;
- S. A.: “Não (…)”;
- A. T.: “Já saiu ele. Pronto mo deixa eu calçar”;
(…)
- A. T.: “Vem para perto do caixote do lixo”;
- S. A.: “Ok amor”;
dd. II - Entre as 13:36 e as 13:44:
- A. T.: “Pelo menos correu tudo bem meu amor. Já tenho saudades tuas”;
- S. A.: “Ai mo e eu também. Pelo menos deu pra matar as saudades. Mo??”;
- A. T.: “Sim meu bem. Tava a acabar de arrumar momo. Sim deu para matar as saudades”.
dd. III - Entre as 23:51 e as 23:53:
- S. A.: “Acho que nunca fizemos amor como hoje. Tipo cmo foi devagarinho e demos mais beijinhos um ao outro. Sei lá parece que estávamos mais coiso”;
(…)
- S. A.: “Tipo eu gosto de dar de força e assim mas sei lá hoje foi diferente. Não te esqueças de apagar a conversa sempre amor. Do Discord.”
ee. no dia 20.08.2019, cerca das 23:05:
[a menor/assistente A. T. remeteu uma fotografia sua, onde está despida da cintura para cima, usando apenas um soutien – cfr. fls.877]
ff. no dia 24.08.2019, entre as 00:29 e as 00:30:
- S. A.: “Não queres falar? Anda ter comigo”;
- A. T.: “Como vou”;
- S. A.: “Ligas ao teu amigo taxista. Já que ele te trouxe ontem”;
- A. T.: “Ele é de longe e não ia ligar”.
- S. A.: “Já vieste a pé uma vez (…)”.

(os destacados são nossos)
187.O arguido S. A., ao proceder nos termos supra descritos, agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, motivado pelo propósito de satisfazer os seus desejos sexuais.
188.Não ignorava o arguido que a menor/assistente A. T., pessoa com quem manteve conversas e perante quem formulou propostas de teor sexual, enviou vídeos e fotografias suas de cariz pornográfico, aliciando, também, com sucesso, a tirar inúmeras fotografias a ela própria de teor idêntico, que depois lhe enviou, e ainda, manteve diversos contactos de natureza sexual, era, na ocasião, menor de 14 (catorze) anos e que os comportamentos que prosseguia eram atentatórios da liberdade e autodeterminação sexual desta, prejudicando, deste modo, o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade da mesma, nomeadamente na esfera sexual.
189.Sabia, ainda, o arguido que os seus comportamentos eram proibidos e penalmente puníveis e, mesmo assim, não se absteve de prossegui-los.
Do pedido de indemnização civil deduzido pela menor/assistente/demandante A. T.
190.Os comportamentos desenvolvidos pelos arguidos/demandados F. C., S. F., R. B., R. B. e S. A., supra descritos, afectaram a liberdade, a autodeterminação sexual e o desenvolvimento social global da menor/assistente/demandante A. T..
191.No âmbito do processo de promoção e protecção desta menor/assistente/demandante, decorrente da factualidade que ora se aprecia, foi decretada judicialmente (Processo nº2311/19.2T8BCL, do Juízo de Família e Menores de Barcelos – Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga) a medida de acolhimento residencial a favor da aludida A. T. na “...”.
192.Posteriormente, após ter ensaiado episódios de fuga desta “...”, foi a menor/assistente/demandante transferida para a “Casa do ...”, em Chaves.
193.Aquela A. T. adoptou comportamentos de risco quando aceitou manter relações sexuais sem que fosse usado preservativo.
194.Com a instauração dos presentes autos e a discussão dos factos que neles se encontram a ser apreciados, que saíram do domínio mais privado da menor/assistente/demandante e se tornaram conhecidos, designadamente, no seu contexto familiar e escolar, a aludida A. T., apesar de não evidenciar indicadores de sintomatologia psicopatológica clinicamente significativos e de o risco de revitimação ser moderado, experimentou alguma instabilidade emocional, vergonha, culpa, tristeza, comoção e perda de autoestima, razão pela qual é acompanhada por psicóloga.
195.Pelo mesmo motivo, experiencia também crises de choro.
196.A mencionada A. T. voltou a aplicar-se nos estudos – mostrando-se mais cumpridora – e perspectiva prossegui-los.

Provou-se, ainda, que:
197.Com a instauração destes autos e a discussão da factualidade que neles se encontra a ser avaliada, a menor B. D. apresenta sintomatologia psicopatológica clinicamente significativa ao nível da depressão, da ansiedade e de alguns medos, nomeadamente ao nível do factor 1 – “Medo do falhanço e da crítica” e do factor 4 – “Medo do perigo e da morte”.
198.Para esta sintomatologia terão contribuído, além da experiência de revitimação, outros factores, como sejam: o processo judicial actual e as diligências associadas; o escrutínio público sentido no contexto escolar; a alteração das dinâmicas e rotinas familiares após a revelação; e as crenças que apresente face a potenciais consequências deste processo, especificamente à institucionalização.
199.A menor também assumiu a prática de comportamentos de automutilação como forma de gestão das emoções negativas advindas dos comentários depreciativos dos pares e por medo de poder vir a ser institucionalizada em consequência do presente processo.
Dos antecedentes criminais dos arguidos
(…)
205.O arguido S. A. foi já condenado no Processo Sumaríssimo nº224/17.1PSLSB, do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa – Juiz 5, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, por sentença proferida no dia 04 de Abril de 2019, transitada em julgado no dia 03 de Maio de 2019, pela prática, no dia 29 de Janeiro 2017, de um crime de burla simples, na pena única de 90 (noventa) dias de multa, à razão diária de €6,00 (seis euros), num total de €540,00 (quinhentos e quarenta euros).
(…)
Dos factos relativos à personalidade e condições pessoais do arguido S. A.
347.O arguido S. A. nasceu na Alemanha, país de emigração dos avós.
348.O seu processo de desenvolvimento decorreu junto do agregado de origem – progenitores e 2 (dois) irmãos mais velhos.
349.A subsistência da família esteve assente na actividade exercida pelo progenitor – operário numa empresa de aluguer de andaimes industriais.
350.A dinâmica relacional do agregado mostrou-se condicionada pelos consumos problemáticos alcoólicos do progenitor e subsequentes comportamentos agressivos para com a família, sobretudo para com o arguido.
351.Tal disfuncionalidade culminou no divórcio dos progenitores, que foi determinante para a autonomização precoce dos irmãos e para que o arguido fosse institucionalizado no Centro Juvenil ... aos 14 (catorze anos) de idade.
352.Este internamento decorreu na sequência dos seus pedidos de ajuda, designadamente, à Linha Nacional de Emergência Social 144.
353.Porém, de forma aparentemente episódica, alguns dos seus comportamentos deram origem ao processo tutelar educativo nº6805/07.4TBSXL-A, cujo termo ocorreu em Junho de 2011.
354.O percurso de escolarização do mencionado S. A. teve início em Sesimbra, concelho de residência da família de origem.
355.O percurso escolar foi marcado por baixo empenho nas actividades lectivas, com registo de 2 (duas) retenções até à conclusão do 5º ano de escolaridade.
356.Posteriormente, deu continuidade aos estudos no Porto, com a frequência de um curso profissional de comércio, na Escola Profissional do Centro Juvenil ..., que não concluiu, pelo que apenas se habilitou com o 7º ano de escolaridade.
357.Nessa época, com cerca de 17 (dezassete) anos de idade, mantendo vinculação fraternal com o seu irmão mais velho – P. R. –, foi por este convidado a passar pequenos períodos em sua casa.
358.Este irmão residia com o seu agregado – constituído por cônjuge e 3 (três) filhas menores –, em Amares.
359.Nesse período, o arguido foi acusado da prática de vários crimes de abuso sexual de criança agravado, no âmbito do Processo nº813/18.7JABRG, do Juízo Central Criminal de Braga – Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga.
360.Aos 19 (dezanove) anos de idade, o identificado S. A. abandonou o Centro Juvenil ..., passando a coabitar com a sua namorada – que era colega na supra referida Escola Profissional – na habitação da progenitora desta, em … – Barcelos.
361.Na constância desta relação, que manteve durante cerca de 30 (trinta) meses, nasceu o seu primeiro filho – G. –, actualmente com 8 (oito) anos de idade e com quem convive esporadicamente.
362.Sem casa própria e pretendendo manter a sua autonomia face à família de origem, arrendou em 2012 uma habitação em Barcelos, assegurando as despesas com o vencimento médio mensal de €700,00 (setecentos euros), como empregado do “Restaurante ...”, em horário noturno.
363.Decorrido 1 (um) ano, já com uma outra namorada – estudante da licenciatura de solicitadoria no “… – Instituto Politécnico do …”, que conheceu através das redes sociais –, de comum acordo foram trabalhar para Inglaterra como empregados de armazém.
364.Nesse período o arguido habilitou-se com um curso de informática e programação, com a duração de 6 (seis) meses.
365.Entretanto, a sua companheira engravidou e decidiu regressar a Portugal, sendo que o arguido fê-lo também quando se mostravam decorridos 2 (dois) meses.
366.O casal arrendou uma habitação na …, que partilharam com a filha L., recém-nascida, onde residiram durante 6 (seis) meses até ao termo da relação.
367.Durante esse período, o arguido trabalhou num café em ... – Barcelos.
368.Em 2016, conheceu L. D., de 17 (dezassete) anos de idade, estudante na Escola Profissional de ..., com quem passou a coabitar e com quem casou civilmente no dia - de Dezembro de 2017.
369.Em data posterior nasceu o seu terceiro filho, de nome S..
370.Aquela L. D. deu continuidade aos seus estudos e o arguido trabalhou durante algum tempo numa empresa de soldadura, em Esposende.
371.Depois, regressou a Inglaterra, situação que manteve cerca de 1 (um) ano, voltando, entretanto, a Portugal, com o objectivo de fortalecer a conjugalidade.
372.No entanto, a relação com a aludida L. D. mostrou-se conturbada e descontinuada, tendo culminado na separação do casal.
373.Desde então, o filho S. continuou à responsabilidade educativa da progenitora, que, posteriormente constituiu um novo agregado familiar.
374.O arguido ocupava algum do seu tempo livre de forma passiva, em convívio com alguns amigos e conhecidos, e a dedicar-se a conversações através das redes sociais.
375.No período a que se reportam os factos dos presentes autos e na sequência do término da relação com a identificada L. D., arrendou um quarto na Quinta …, em Sesimbra, onde trabalhou.
376.O arguido residia sozinho e não tinha qualquer tipo de contacto com o progenitor, nem com os irmãos, por não haver ligação afectiva com os mesmos.
377.No que respeita à progenitora – que há cerca de 10 (dez) anos que vive numa relação em segundas núpcias –, mantém alguns contactos ocasionais e alguma vinculação afectiva.
378.Decorridos meses, com o objectivo de se reaproximar dos filhos, em meados de Outubro/Novembro de 2018, arrendou um quarto particular em ... – Esposende, e empregou-se no estabelecimento comercial, denominado “Café ...”, sedeado em ..., por tempo determinado, em regime de part-time (das 8h00m às 13h00m).
379.Nos tempos livres dedicava-se à programação de jogos e convívio com jovens.
380.À data da sua prisão preventiva, encontrava-se desempregado e sem rendimentos próprios, vivenciando uma situação económica precária, não dispondo de casa própria, razão pela qual passou a pernoitar no seu veículo automóvel.
381.O arguido S. A. encontra-se presentemente no Estabelecimento Prisional de Braga, onde cumpre a medida de coacção de prisão preventiva que lhe foi aplicada.
382.Nesse estabelecimento tem adoptado uma conduta de acordo com o normativo institucional.
383.Relativamente ao presente processo, apresenta um discurso reservado, de externalização da responsabilidade e de arrependimento por ter desrespeitado a medida de coacção de proibição de contactos com a menor/assistente A. T..
384.Quando confrontado com situações passíveis de integrar a tipologia de crimes que se discutem neste processo, ainda que em abstracto, mostrou-se conhecedor da ilicitude e censurabilidade, sem referência ao impacto e aos danos potencialmente causados nas vítimas.
385.Para além da perda de liberdade, o arguido não sinaliza especiais repercussões no seu quotidiano, decorrentes da actual situação judicial, atendendo à instabilidade laboral e habitacional em que vivia.
386.Beneficia do apoio, ainda que ténue, da progenitora.
387.Sem prejuízo do referido em 386., a progenitora do aludido S. A. verbaliza mostrar-se disposta a, na medida do possível, auxiliá-lo a encontrar trabalho e a orientar a sua vida.
388.O arguido não percepciona rejeição social, em virtude dos factos ora sob apreciação não terem tido significativa visibilidade nem impacto.
389.A sua detenção preventiva é do conhecimento do irmão, da progenitora e do ex-cônjuge, que apoiam o arguido minimamente em contexto prisional – a mãe com visitas de carácter pontual e o ex-cônjuge por contactos telefónicos/videochamada.
390.No caso de vir a ser condenado, manifestou aceitar prestar trabalho a favor da comunidade ou sujeitar-se a intervenção psicoterapêutica/avaliação especializada/tratamento médico especializado, no âmbito da sexualidade/desviância sexual, com submissão a eventual acompanhamento/intervenção, se clinicamente avaliada essa necessidade.
*
II.2. Factos não provados

Não se provaram quaisquer outros factos alegados nos autos ou em audiência de julgamento com interesse para a justa decisão da causa, constantes da acusação pública/pronúncia e das contestações, que não se encontrem descritos como provados ou que sejam contraditórios em relação aos mesmos, sendo a demais matéria alegada irrelevante, conclusiva ou de direito, designadamente:
F) Do arguido S. A.
kkk)que o arguido S. A., à data em que conheceu a menor/assistente A. T., residisse na Inglaterra;
lll)que esta menor/assistente, na altura, tivesse 11 (onze) anos de idade;
mmm) que aquele S. A. conhecesse a aludida A. T. através da rede social Facebook;
nnn)que o encontro referido sob o nº83, dos factos provados, ocorresse em Março de 2017;
ooo)que na sequência dos beijos referidos sob o nº84, da factualidade provada, o arguido S. A. propusesse à aludida A. T. que iniciassem uma relação de namoro, o que esta aceitou;
ppp)que nas circunstâncias referidas sob o nº89, da factualidade assente, o arguido ejaculasse;
qqq)que em data não concretamente apurada, mas situada nos meses de Junho/Setembro de 2017, cerca das 23h00m, na sequência de prévia combinação, o arguido S. A. se deslocasse de carro até à residência da menor/assistente A. T., onde esta já o aguardava no exterior, e a levasse até à cidade de Barcelos;
rrr)que o arguido, nessas circunstâncias, beijasse esta menor/assistente nos lábios, por várias vezes;
sss)que o identificado T. C., na madrugada do dia 04 de Agosto de 2018, transportasse de carro a aludida A. T. até à Central de Camionagem de … e/ou à Central de Camionagem do …;
ttt)que os encontros descritos sob os nºs109 e 112, dos factos provados, ocorressem em Setembro de 2017;
uuu)que em dia não concretamente apurado, mas situado no mês de Janeiro de 2019, após prévia combinação para o efeito, o arguido S. A. fosse buscar a menor/assistente A. T. à sua escola, sita em …, e a levasse para um local ermo, próximo dali, onde a beijou nos lábios, por várias vezes;
vvv)que nas circunstâncias referidas sob o nº123, da factualidade assente, o arguido ejaculasse;
www) que o encontro referido sob o nº131, da factualidade provada, ocorresse à tarde e que o arguido S. A. se encontrasse com a menor/assistente A. T. em Esposende;
xxx) que no encontro referido sob o nº134, dos factos provados, este S. A. se encontrasse com a aludida A. T. em Esposende;
yyy)que no encontro referido sob o nº141, da factualidade assente, o arguido S. A. passeasse com esta menor/assistente pelo centro da cidade de Esposende;
zzz)que o arguido, nas circunstâncias referidas sob o nº166, da factualidade provada, se deslocasse de carro;

Do pedido de indemnização civil
(…)
bbbb) que após os actos de que foi vítima, esta menor/assistente/demandante alterasse o seu comportamento, piorando-o, e que também se tornasse revoltada e agressiva com os seus familiares e com quem convivia;
cccc) que devido à actuação dos arguidos/demandados H. P., F. C., S. F., R. B., R. B. e S. A., a aludida A. T. ficasse com o seu futuro comprometido, carregando para sempre, ao longo da sua vida, perante a comunidade e a família que um dia augure constituir, a vergonha e estigma dos actos de que foi vítima;
dddd) que esta A. T. vivesse em constante tristeza e profundamente abalada, recebendo tratamento psiquiátrico;
eeee) quaisquer outros factos para além dos descritos em sede de factualidade provada, que com os mesmos estejam em contradição ou que revelem interesse para a decisão a proferir.
(…)»

C)Apreciação do Recurso

- Impugnação da matéria de facto/erro de julgamento/violação do princípio “in dúbio pro reo”.

Nos termos do disposto no artigo 428.º os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito.
No que tange à matéria de facto, a mesma pode ser sindicada por duas vias: no âmbito restrito, no que se convencionou chamar de “revista alargada”, mediante a arguição dos vícios decisórios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código Processo Penal, ou por via da impugnação ampla a que se reporta o artigo 412.º, n.º 3, 4 e 6, do Código Processo Penal, caso em que a apreciação se alarga à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência.
No primeiro caso, o recurso pode ter como fundamento qualquer dos vícios previstos nas várias alíneas do nº2, do artigo 410.
Como se refere neste preceito legal “ «mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: al.a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; al. b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e al.c) erro notório na apreciação da prova».
Estes vícios são do conhecimento oficioso – conforme jurisprudência fixada no acórdão nº7/95, de 19 de outubro, in Diário da República, I Série – A, de 28/12/1995 - e constituindo um defeito estrutural da decisão têm que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos para os fundamentar como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento, tratando-se, assim, de vícios intrínsecos da decisão que, por isso, quanto a eles, terá que ser auto-suficiente.

No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos nº3 e 4 do artigo 412º.

Resulta das conclusões que o recorrente discorda do modo como o tribunal a quo valorou a prova produzida, ou seja, o uso que o tribunal recorrido fez do princípio da livre apreciação da prova.
Com efeito, considera o recorrente que «os factos dados como provados resultam da interpretação subjetiva do Tribunal a quo, suportada esta, em muitos casos, em meras presunções naturais que extravasam as regras da experiência, tendo por base, por um lado, as declarações para memória futura da ofendida e, por outro, o teor das comunicações entre esta e o recorrente».
Ora, ainda que a discordância do recorrente em relação à factualidade dada como provada com fundamento em errada apreciação dos meios probatórios possa ser sindicada nos termos da impugnação ampla da matéria de facto, regulada, essencialmente, no artigo 412º do Código de Processo Penal, no caso vertente, tal discordância, para além de genérica e conclusiva, não cumpriu o ónus a que reporta o artigo 412º,nº3, do C.P.P..
Como resulta do disposto no artigo 431.º, b), havendo documentação da prova, a decisão do Tribunal de 1ª instância sobre matéria de facto só pode ser modificada se esta tiver sido impugnada nos termos do art. 412.º, n.º 3.

Resulta deste último preceito legal que:
«Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas.»

A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorrectamente julgados.
A especificação das “concretas provas” só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essa “provas” impõem decisão diversa da recorrida
A especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1ª instância cuja renovação se pretenda, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo (cfr. artigo 430.º).
Estabelece ainda o n.º 4 do artigo 412.º que, havendo gravação das provas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, devendo o recorrente indicar as passagens (das gravações) ou os concretos segmentos de tais depoimentos que em que se funda a impugnação e que no seu entender invertem a decisão proferida sobre a matéria de facto, pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (n.º 6 do artigo 412.º).
Exige-se que o recorrente refira o que é que nos meios de prova por si especificados não sustenta o facto dado por provado ou não provado, de forma a relacionar o seu conteúdo específico, que impõe a alteração da decisão, com o facto individualizado que se considera incorretamente julgado.
No fundo, o que está em causa e se exige na impugnação mais ampla é que o recorrente indique a sua decisão de facto em alternativa à decisão de facto que consta da decisão de que se recorre, justificando, em relação a cada facto alternativo que propõe, porque deveria o Tribunal ter decidido de forma diferente.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Julho de 2006, proferido no processo 06P120 “visou-se, manifestamente, evitar que o recorrente se limitasse a indicar vagamente a sua discordância no plano factual e a estribar-se probatoriamente em referências não situadas, porquanto, de outro modo, os recursos sobre a matéria de facto constituiriam um encargo tremendo sobre o tribunal de recurso, que teria praticamente em todos os casos de proceder a novo julgamento na sua totalidade. Terá, pois, de se ir para uma exigência rigorosa na aplicação destes preceitos”.
Como facilmente se depreende da motivação do recurso e das respetivas conclusões, o recorrente não deu, de modo algum, cumprimento ao mencionado ónus de impugnação especificada a que estava vinculado.
De facto, o recorrente discorda da matéria de facto fixada, mas não se percebe porque razão as declarações da assistente e o teor das comunicações entre esta e o arguido, ora recorrente, não permitem chegar à conclusão a que o tribunal recorrido chegou ao dar como provadas as atuações do arguido consubstanciadoras dos concretos ilícitos que lhe vêm imputados, mas antes impõem uma decisão diversa.
Como vem sendo entendimento uniforme do STJ, o recurso da matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas uma reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente à decisão sobre “os pontos de facto” que o recorrente considere incorretamente julgados, na base da avaliação das provas que, na indicação do recorrente, imponham “decisão diversa” da recorrida.
Ora, face ao não acatamento do ónus de impugnação especificada, resta-nos concluir, como decorrência da sua própria noção, não ocorrer o condicionalismo referido na alínea b) do artigo 431.º, tornando-se inviável, por esta via, a modificabilidade da decisão proferida sobre a matéria de facto.

Pugna também o recorrente pela alteração da matéria de facto com fundamento na violação do princípio in dúbio pro reo.
Da análise conjugada da motivação e respetivas conclusões, e se bem percebemos o raciocínio do recorrente, a violação de tal princípio processual decorre da circunstância das declarações da assistente A. T., porquanto vagas e imprecisas, não permitirem, no seu entender, individualizar e especificar suficientemente as concretas condutas consubstanciadoras dos crimes que lhe vêm imputados.
E assim sendo, impondo tais declarações um estado de dúvida, a consideração de tal factualidade como provada, sendo duvidosa e desfavorável ao arguido, não pode deixar constituir uma violação do princípio processual “in dúbio pro reo”, ainda que o tribunal recorrido não tenha sentido qualquer dúvida.
Vejamos então se assiste razão ao recorrente.
O art.32.º, n.º2, da Constituição da República Portuguesa, estatui que “ todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação”.
Este princípio é mais abrangente do que o princípio do “in dubio pro reo”, na medida em que este é exclusivamente probatório e aplica-se quando o tribunal tem dúvidas razoáveis sobre a verdade de determinados factos. Já o princípio da presunção de inocência impõe-se aos juízes ao longo de todo o processo e diz respeito ao próprio tratamento processual do arguido.
O princípio in dubio pro reo estabelece que na decisão de factos incertos a dúvida favorece o arguido, ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um non liquet.
Trata-se de uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não tiver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.
Ou seja, se produzida a prova subsiste no espirito do julgador um estado de incerteza, objectiva, razoável e intransponível sobre a verificação, ou não, de determinado facto, impõe-se proferir uma decisão favorável ao arguido.
A violação do princípio in dubio pro reo exige que o tribunal tenha exprimido, com um mínimo de clareza, que se encontrou num estado de dúvida quanto aos factos que devia dar por provados ou não provados.
Porém, nesta fase do recurso, a demonstração da sua violação passa pela respetiva notoriedade, aferida pelo texto da decisão, isto é, em termos idênticos aos que vigoram para os vícios da sentença, ou seja, têm que resultar da fundamentação desta, de forma clara, que o juiz, pese embora tenha permanecido na dúvida sobre a verificação de determinado facto favorável ao agente o considerou não provado.
A dúvida relevante para este efeito, não é a dúvida que o recorrente entende que deveria ter permanecido no espírito do julgador após a produção da prova, mas antes e apenas a dúvida que o julgador não logrou ultrapassar e fez constar da sentença ou que por esta é evidenciada.
Como resulta, entre outros, do acórdão do S.T.J. de 2 e Maio de 1996, in C.J., Ac. do STJ, ano IV, 1º, pág. 177, o Tribunal de recurso apenas pode censurar o uso feito desse princípio se da decisão recorrida resultar que o tribunal a quo - e não os sujeitos processuais ou algum deles - chegou a um estado de dúvida insanável e que, face a ele, escolheu a tese desfavorável ao arguido.
Refere Roxin, in “Derecho Processal Penal”, Editores del Puerto, Buenos Aires, pág. 111, “o princípio não se mostra atingido quando, segundo a opinião do condenado, o juiz deveria ter tido dúvidas, mas sim quando condenou apesar da existência real de uma dúvida”.
Assim, se na fundamentação aduzida na decisão recorrida o Tribunal não invoca qualquer dúvida insanável, ou, ao invés, se a motivação da matéria de facto denuncia uma tomada de posição clara e inequívoca relativamente aos factos constantes da acusação, com indicação clara e coerente das razões que fundaram a convicção do tribunal, inexiste lugar à aplicação do princípio in dubio pro reo.
No caso vertente, o recorrente invoca o princípio in dubio pro reo essencialmente como corolário da sua apreciação da prova.
Para si, de acordo com a sua própria apreciação/valoração, a prova produzida não permite concluir nos termos em que o tribunal recorrido concluiu a respeito dos mencionados pontos da factualidade.
Mas, como se refere no Acórdão da Relação de Coimbra, de 10/12/2014, in www dgsi.pt. “ Na fase do recurso, a detecção da violação do pro reo passa pela sua notoriedade, face aos termos da decisão isto é, deve resultar inequivocamente do texto da decisão que o juiz, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto desfavorável ao agente, o considerou provado ou, inversamente, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto favorável ao agente, o considerou não provado.
A dúvida relevante de que cuidamos, não é a dúvida que o recorrente entende que deveria ter permanecido no espírito do julgador após a produção da prova, mas antes e apenas a dúvida que este não logrou ultrapassar”.
Ora, da leitura do acórdão recorrido, particularmente na parte atinente à motivação aduzida a respeito da factualidade que o arguido põe em causa no presente recurso, não resulta que o tribunal coletivo tenha permanecido em qualquer dúvida.

A tal propósito consta do acórdão recorrido o seguinte:
(…) Quando se tratou de averiguar se os factos dos presentes autos ocorreram nos termos que constam descritos na acusação pública/pronúncia, verificamos não ter havido testemunhas presenciais, razão pela qual assumiram-se cruciais as declarações (para memória futura) prestadas pelas menores A. T. e B. D., bem como as declarações dos arguidos F. C., R. B., R. A. e S. A..
As menores foram, no cômputo geral, espontâneas, sinceras, claras e consistentes na explicação dos acontecimentos em que estiveram envolvidas.
O discurso de ambas afigurou-se-nos honesto e dotado de genuinidade, não se logrando descortinar que procurassem ampliar os factos sobre que depuseram.
Acresce que tais declarações, à luz do que ditam os juízos da experiência comum e da normalidade do acontecer, foram prestadas de modo concordante com a possibilidade de ocorrência de factos da natureza daqueles que descreveram, pelo que assumiram-se verosímeis.
O relato das aludidas A. T. e B. D. não se revelou, por isso, nem tendencioso, nem subjectivo.
Tampouco se denotou qualquer hostilidade das menores em relação aos arguidos.
Quiseram, pois, auxiliar o tribunal na tarefa da descoberta da verdade.
Deste modo, as características que se mostram apontadas à narrativa de ambas nas já supra referidas perícias psicológicas (quanto à mencionada A. T.: desenvolvimento cognitivo adequado, discurso fluente, lógico, espontâneo, estruturado, circunstanciado (temporal e contextualmente), consistente (interna e externamente), coerente e adequado à idade, capacidade de construir frases com linguagem clara e compreensível, boa capacidade de raciocínio e compreensão face às questões formuladas, boas competências de atenção, memória e capacidade narrativa, noções claras acerca dos conceitos descritivos básicos, distinção entre realidade e fantasia e entre verdade e mentira, adequada capacidade de diferenciação e expressão emocional, sem tendência para a sugestionabilidade e sem distorções significativas; e quanto à identificada B. D.: capacidade de raciocínio e compreensão face às questões formuladas, narrativa consistente e coerente, adequadas competências de memória, atenção e capacidade de narrativa, percepção clara acerca dos conceitos descritivos básicos, distinção entre fantasia e realidade e entre verdade e mentira (compreende a inadequação das mentiras e as suas potenciais consequências), capacidade de diferenciação e expressão emocional, sem tendência para a sugestionabilidade e sem distorções significativas), mantiveram-se nas declarações para memória futura que prestaram.
Em face do exposto, o que esclareceram assumiu inegável peso persuasivo.
No confronto destes relatos com as declarações dos arguidos, verificamos que o discurso daquelas A. T. e B. D. mantém a sua genuinidade e completude, ressalvando-se, porém, alguns aspectos que, atenta a natural erosão que o decurso do tempo provoca na memória humana, não afectam a credibilidade que se lhes reconheceu.
(…)
No que respeita ao arguido S. A., cremos que na organização da sequência cronológica dos factos que se prendem com a altura em que conheceu a menor/assistente A. T. – seja virtual, seja fisicamente –, foi mais rigoroso do que esta, razão pela qual considerou-se demonstrado que conheceram-se na rede social Instagram em Setembro/Outubro de 2017 (e não Fevereiro/Março de 2017, como afirma esta última) e pessoalmente em Abril de 2018 (e não Março de 2017, como refere esta última).
Este arguido, que esteve emigrado na Inglaterra desde Novembro/Dezembro de 2017 até, precisamente, Abril de 2018, foi mantendo contactos muito frequentes com a menor/assistente (por telemóvel e redes sociais) nesse período.
O equívoco apontado à aludida A. T. é, no entanto, compreensível, na medida em que, por esta ocasião, a par de encontros sexuais ocasionais (com, pelo menos, os arguidos F. C. e R. B.), mantinha outros relacionamentos amorosos (pelo menos, com os arguidos S. F. e R. A.).
De todo o modo, apesar da referência (errónea, segundo entendemos) que fez aos inícios de 2017, a verdade é que a mencionada A. T. situou os encontros que teve com o identificado S. A. sobretudo no ano de 2018 e também no ano de 2019.
Em face do exposto, ficamos convencidos que a primeira vez que os aludidos A. T. e S. A. se encontraram presencialmente – apesar de contactarem, com frequência, por telemóvel e redes sociais, desde Setembro/Outubro de 2017 – foi em Abril de 2018, iniciando uma relação de namoro algures entre Abril e Junho de 2018 (quando o arguido se mudou para Lisboa).
Em virtude desse relacionamento, mantiveram conversas e trocaram fotografias de cariz sexual (cfr. fls.3-66 e fls.87-135, do Apenso 1, e fls.442-454, fls.576-597, fls.861-892 e fls.1106-1137), além de que, por diversas vezes, tiveram relações sexuais entre si que, via de regra, para além de beijos nos lábios e apalpões, envolvia penetração vaginal (por vezes, preliminarmente, havia ainda sexo oral), sem protecção (são raras aquelas em que estavam protegidos), com ejaculação do arguido (são poucas aquelas onde não houve ejaculação).
Tais encontros sexuais foram devidamente elencados pela menor/assistente.
Importa, no entanto, esclarecer que os 3 (três) encontros que se descrevem nos artigos 95º a 105º, inclusive, da acusação pública/pronúncia, como tendo ocorrido em Setembro de 2017, foram antes por nós situados em Outubro/Novembro de 2018, tendo em consideração a sequência cronológica apresentada pelo arguido S. A. e o foco da aludida A. T. nos anos de 2018 e 2019, como se explicou supra.
Os encontros que, aqui, se discutem – na sua grande maioria ocorridos à noite, aproveitando a menor/assistente A. T. para sair de casa quando os seus progenitores e irmã já estavam a dormir – ter-se-ão verificado pela seguinte ordem: [i] o primeiro, em Abril de 2018, nas piscinas de Esposende, onde houve apenas troca de beijos; [ii] o segundo, no mesmo dia do primeiro, em ... – Barcelos, envolvendo relações sexuais (como os demais que se lhe seguiram); [iii] o seguinte em Lisboa, a 04 de Agosto de 2018; [iv] vários em Outubro/Novembro de 2018 e em diversos locais: na residência do arguido, em ... – Esposende, num local ermo em ... – Esposende e em ... – Esposende; [v] vários ao longo do ano de 2019 e em diversos locais: (i) em Fevereiro, numa zona de monte, em ... – Esposende; (ii) em finais de Fevereiro/inícios de Março, na residência arrendada pelo arguido em Barcelos; (iii) em Março e Maio no quarto que este arrendou em ... – Esposende; e (iv) em Junho/Julho/Agosto, nesse mesmo quarto, num local ermo em Esposende, na Casa da Juventude de …, na casa situada na Rua ... – ... – Esposende, em Vila Nova da Cerveira – na habitação do irmão mais velho da menor/assistente – e numa zona de monte em ... – Esposende.
A propósito destes encontros sexuais, o arguido S. A. não assumiu uma postura de negação, pois que reconheceu que, efectivamente, alguns – não todos – aconteceram e nos moldes descritos pela aludida A. T. (constantes da acusação pública/pronúncia).
Com efeito, tendo por referência a matéria definida no libelo acusatório/decisão de pronúncia, afirmou que no segundo encontro que teve com a menor/assistente A. T. (ocorrido no mesmo dia que o primeiro), embora tivessem combinado que seria para manterem relações sexuais, tal acabou por não se concretizar pois esta estaria com o período, razão pela qual apenas as mantiveram quando esta desceu até Lisboa, no dia 04 de Agosto de 2018.
Mais afirmou que depois do incidente de Lisboa, apenas em Outubro de 2018 é que voltou a falar com a identificada A. T., tendo-se deslocado a sua casa para dizer-lhe que só assumiria uma relação amorosa consigo desde que os seus progenitores soubessem e autorizassem, sendo que entre Novembro de 2018 e Janeiro de 2019 não se encontrou com esta menor/assistente, falando apenas por telemóvel e redes sociais.
A partir de Fevereiro de 2019, depois de a mencionada A. T. ter falado com a progenitora – numa conversa que o arguido ouviu –, iniciaram um relacionamento amoroso, tendo mantido relações sexuais com a menor/assistente a partir desse mesmo mês, designadamente, em ... – Esposende, na casa que arrendou em Barcelos, no quarto e no apartamento que arrendou em ... – Esposende (cerca de três a quatro vezes, entre Fevereiro de Agosto de 2019) e também na habitação do irmão desta menor/assistente, sita em Vila Nova de Cerveira.
Contudo, as declarações do arguido assim prestadas não se conciliam, desde logo, com o teor das mensagens que trocou com a aludida A. T..
Na verdade, alcança-se dessas mensagens que mantiveram relações sexuais antes de esta deslocar-se a Lisboa no referido dia 04 de Agosto de 2018:
(…)
Embora seja perceptível haver ressentimento, por parte do arguido S. A., devido ao facto de a menor/assistente A. T. envolver-se com outros indivíduos, verifica-se que da parte desta há igualmente algum desânimo com aquele por causa de um projecto que terão traçado e que acabou por não se concretizar.
De todo o modo, a postura assumida nessas mensagens denota que a relação de ambos não era frívola:
(…)
Para além das discrepâncias verificadas no confronto com as mensagens que trocou com a menor/assistente A. T., as declarações do arguido S. A. divergem ainda daquelas que prestou perante juiz de instrução em sede de primeiro interrogatório judicial, que se realizou no dia 18 de Junho de 2019 (cfr. fls.486-492 e transcrição a fls.517-523).
(…)
No caso dos presentes autos, o arguido S. A., encontrando-se assistido por defensor(a), foi ouvido em primeiro interrogatório judicial por juiz de instrução e advertido para o disposto no artigo 141º, nº4, alínea b), do CPP, isto é, de que não exercendo o direito ao silêncio as declarações que prestar poderão ser utilizadas no processo, mesmo que seja julgado na ausência, ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas à livre apreciação da prova (cfr. fls.486-verso).
Tais declarações foram reproduzidas na audiência de julgamento destes autos (cfr. fls.2236-verso) e serviram para o tribunal formar a sua convicção acerca dos factos ora sob discussão.
Ora, nessas declarações, o arguido confirmou que teve muitos mais encontros sexuais com a menor/assistente A. T. do que aqueles que relatou em julgamento e que foram já enunciados supra.

Na verdade, perante juiz de instrução (tenha-se presente que foi ouvido em Junho de 2019), afirmou:
(…)
Deste modo, na fase investigatória, o arguido S. A. confirmou que, até Junho de 2019, encontrou-se com a menor/assistente A. T., nos moldes que acabaram por ficar descritos na acusação pública/pronúncia, para manter relações sexuais com esta, apenas com o reparo de que nesse mesmo mês já não disporia de veículo automóvel, razão pela qual não poderia ir buscá-la.
Do que fica exposto resulta que a mencionada A. T., no confronto com o aludido S. A., foi mais segura, coesa e estruturada do que este na narração dos encontros sexuais que mantiveram, com excepção de alguns equívocos cronológicos atinentes ao início da sua relação com o arguido.
Assim, atentas as características que se reconheceram às declarações daquela A. T., consideramos que os actos sexuais que teve com o identificado S. A. desenvolveram-se nos termos que traçou e que este, no essencial, confirmou quando ouvido em Junho de 2019.
(…)
Em face desta motivação, não vislumbramos pois qualquer dúvida por parte do tribunal recorrido a respeito das concretas atuações do arguido na pessoa da assistente A. T..
O recorrente não concorda, não se revê na decisão do tribunal, e pretende impor a sua própria convicção que retirou das declarações da assistente e das conversões mantidas entre esta e o arguido – segundo ele tais meios probatórios deixam dúvidas a respeito da ocorrência das concretas atuaçãoes do arguido na pessoa da assistente - mas o que evola da motivação do acórdão recorrido é que a opção feita pelo tribunal recorrido, para além de lógica, racional e admissível à luz das regras da experiência comum e da normalidade, é segura, consistente, fora de qualquer dúvida, tribunal esse que pode contar com os benefícios da imediação e da oralidade na produção da prova.
Em conclusão, não se mostrando violado o princípio in dubio pro reo nem, por via dele, violada a presunção de inocência constitucionalmente consagrada, improcede também neste segmento o recurso, mostrando-se também por qui inviabilizada qualquer alteração da matéria de facto dada como provada no acórdão recorrido.

Violação do princípio do contraditório.

Alega o recorrente que as declarações para memória futura prestadas pela ofendida/assistente não permitem garantir o respeito pelo exercício do contraditório, atento o carácter vago e indeterminado das mesmas.
Salvo o devido respeito, não vislumbramos em que medida é que tal violação ocorreu.
O princípio do contraditório, consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da CRP, consiste no direito do arguido de contradizer ou de se pronunciar sobre as alegações, as iniciativas, os atos ou quaisquer atitudes processuais da autoria dos outros sujeitos processuais. Sendo que a decisão do juiz só pode ser proferida após ouvir todo o participante nos autos relativamente ao qual tome decisão que processualmente o afete.
O princípio do contraditório conforme é entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência, reconduz-se ao facto de nenhuma prova dever ser aceite na audiência, nem nenhuma decisão dever ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efetiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar.
Segundo Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, 1ªed, Coimbra Editora, pág. 153, o princípio do contraditório apresenta-se como a «oportunidade conferida a todo o participante processual de influir, através da sua audição pelo tribunal, no decurso do processo».
No caso vertente, independentemente do teor das declarações para memória futura prestadas pela ofendida/assistente, da maior ou menor concretização das mesmas, o arguido teve possibilidade de as contradizer e de sobre elas se pronunciar.
O arguido teve conhecimento do teor dessas mesmas declarações, foi confrontado com as mesmas, e não ele, aliás, assumido uma postura de negação total, a convicção do tribunal, a respeito da concretização das atuações consubstanciadoras dos abusos sexuais, resultou da análise crítica e conjugada dessas mesmas declarações com as prestadas pelo arguido, quer na fase de inquérito, quer em sede de audiência de julgamento, e ainda com o teor das conversações mantidas entre ambos.
Sem necessidade de outras considerações, improcede a invocada violação.

- Qualificação jurídica dos factos/«crime único de trato sucessivo».

Pretende o recorrente ser condenado pela prática de um um único crime de abuso sexual de criança, de trato sucessivo, previsto e punido no artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal.
Segundo o mesmo, “no caso concreto é patente a existência de uma unidade de resolução criminosa em relação aos factos que, de um modo homogéneo, ocorreram durante um curto espaço temporal e no âmbito da relação de namoro estabelecida entre o arguido e a ofendida, a coberto do dolo inicial que apenas se foi renovando a cada episódio, revelando-se assim uma unificação da atividade criminosa”.
De acordo com a decisão recorrida o recorrente foi condenado pela prática, como autor material, na forma consumada, em concurso efectivo, real e homogéneo, de 23 crimes (e não 22 como alega o recorrente, certamente devido ao facto de no dispositivo do acórdão aquando da enumeração dos ilícitos cometidos se repetir duas vezes a menção à numeração “XXII”) de abuso sexual de crianças, nos termos das seguintes disposições legais:

-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs126, 127, 128 e 129], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs146, 147, 148 e 149], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs151, 152, 153 e 154], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs156, 157, 158 e 159], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs161, 162, 163 e 164], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs167, 168, 169 e 170], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs172, 173, 174 e 175], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs177, 178, 179 e 180], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs182, 183, 184 e 185], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs112, 113, 114 e 115], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs121, 122 e 123], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs98 e 99], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs107 e 108], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs110 e 111], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs117 e 118], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs132 e 133], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs135 e 136], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs88 e 89], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nºs1 e 2, do CP, na pena parcelar de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº84], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº1, do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão;
-1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº142], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº1, do CP, na pena parcelar de 2 (dois) anos de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº137], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alíneas a) e b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [factos provados nºs92, 93 e 94], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alínea b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão; e
- 1 (um) crime de abuso sexual de crianças, na pessoa da menor/assistente A. T. [facto provado nº186], p. e p. pelos artigos 13º, 1ª parte, 14º, nº1, 26º, 1ª proposição, 30º, nº1, nº2, a contrario, e nº3 e 171º, nº3, alínea b), do CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 7 (sete) meses de prisão.

Não merecendo qualquer reparo o entendimento perfilhado pelo tribunal recorrido a respeito da qualificação jurídica que fez corresponder a cada um dos respetivos episódios descritos na factualidade provada, a questão está apenas em saber se o arguido tem razão quando defende que não devia ter sido condenado por cada um dos enunciados 23 crimes de abuso sexual, mas apenas por “crime único de trato sucessivo”, p. e p. nos termos do artigo 171º,nº1 e 2º, do C.Penal, punido com pena de 3 a 10 anos de prisão.
Não estando prevista na lei a figura do “crime de trato sucessivo”, tal designação que começou por ser aplicada ao tráfico de droga, passou também a ter o seu campo de aplicação no âmbito dos crimes de natureza sexual, tendo alguma jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça enquadrado condutas de abuso sexual de crianças na figura do crime único de trato sucessivo, considerando-se uma unificação de condutas ilícitas sucessivas, desde que essencialmente homogéneas e temporalmente próximas, quando exista uma mesma resolução criminosa, desde o início assumida pelo agente.
Como refere Helena Moniz, in Crime de Trato Sucessivo, in Revista Julgar On line, Abril de 2018, pág. 13, tal entendimento parte do principio que “… aquele que abusa sexualmente de uma pessoa decide uma única vez (sem que haja constantemente renovação da resolução criminosa em cada ato que realiza, em cada circunstância que cria propiciadora da realização daquela conduta), e considerando-se que os diferentes atos (mais ou menos idênticos quanto ao modo de atuação e realização e quanto à vítima, sempre a mesma) realizados sucessivamente, reiteradamente, sequencialmente no tempo, apenas integram um único crime”.
Neste sentido, entre outros, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 29-03-2007 (Proc. n.º 1031/07-5.ª secção); de 17-05-2007 (Proc. n.º 1133/07-5.ª secção),de 23-01-2008 (Proc. n.º 4830/07-3.ª secção); de 29-11-2012 (Proc. n.º 862/11.6TDLSB.P1.S1-5.ª secção.

Considerou-se, neste último acórdão de 29/11/2012 que trata os crimes de abuso sexual de crianças que se prolongam no tempo, como crimes de trato sucessivo que:
«(…) quando os crimes sexuais são actos isolados, não é difícil saber qual o seu número. Mas, quando os crimes sexuais envolvem uma repetitiva actividade prolongada no tempo, torna-se difícil e quase arbitrária qualquer contagem.
O mesmo sucede com outro tipo de crimes que, tal como sexo, facilmente se transformam numa “actividade”, como, por exemplo, com o crime de tráfico de droga. Pergunta-se, por isso, se nesses casos de “actividade criminosa”, o traficante de rua que, por exemplo, se vem a apurar que vendeu droga diariamente durante um ano, recebendo do “fornecedor” pequenas doses de cada vez, praticou, “pelo menos”, 200, 300 ou 365 crimes de tráfico (o que aparenta ser uma contagem arbitrária ou, pelo menos, “imaginativa”) ou se praticou um único crime de tráfico, objectiva e subjectivamente mais grave, dentro da sua moldura típica, em função do período de tempo durante o qual se prolongou a actividade.
A doutrina e a jurisprudência têm resolvido este problema, de contagem do número de crimes, que de outro modo seria quase insolúvel, falando em crimes prolongados, protelados, protraídos, exauridos ou de trato sucessivo, em que se convenciona que há um só crime – apesar de se desdobrar em várias condutas que, isoladas, constituiriam um crime – tanto mais grave (no quadro da sua moldura penal) quanto mais repetidos.
(…)
O que, eventualmente, se exigirá para existir um crime prolongado ou de trato sucessivo será como que uma “unidade resolutiva”, realidade que se não deve confundir com “uma única resolução”, pois que, “para afirmar a existência de uma unidade resolutiva é necessária uma conexão temporal que, em regra e de harmonia com os dados da experiência psicológica, leva a aceitar que o agente executou toda a sua actividade sem ter de renovar o respectivo processo de motivação” (Eduardo Correia, 1968:201 e 202, citado no “Código de Penal Anotado” de P.P. Albuquerque).
Para além disso, deverá haver uma homogeneidade na conduta do agente que se prolonga no tempo, em que os tipos de ilícito, individualmente considerados são os mesmos, ou, se diferentes, protegem essencialmente um bem jurídico semelhante, sendo que, no caso de crimes contra as pessoas, a vítima tem de ser a mesma».
No entanto, consta deste mesmo acórdão um voto de vencido do Juiz Conselheiro Manuel Braz, o qual levou ao entendimento que hoje vem sendo seguido maioritariamente no STJ, no sentido da inaplicabilidade, in casu, da figura do crime de trato sucessivo, entendimento que comungamos e que já defendemos no âmbito dos processos nº1443/17.6T9BRG.G1 e 53/17.2JABRG.G1, enquanto juiz adjunta
Como se fez constar nesse voto de vencido “Não é, pois, a unidade de resolução que pode conferir a uma reiteração de actos homogéneos o cariz de crime de trato sucessivo, que se identifica com a categoria legal do crime habitual, mas somente a estrutura do respectivo tipo incriminador, que há-de supor a reiteração.
Parece claro que tanto os tipos de crime de abuso sexual de crianças e de abuso sexual de menores dependentes como o de violação não contemplam aquela «multiplicidade de actos semelhantes» que está implicada no crime habitual nem, por isso, a sua realização supõe um comportamento reiterado
A este propósito, salienta Helena Moniz, in obra citada, que « … quer no crime de violação (164.º), por exemplo, quer no crime de abuso sexual a conduta punida é a prática de ato sexual (cf. arts. 165.º, 166.º167.º, 171.º, 172.º, 173.º,174.º, do CP).Ou seja, ainda que se possa considerar que um possível crime de abuso poderia integrar diversos atos, verificamos, todavia, que o tipo pune a conduta não de abuso, enquanto integrante de múltiplos atos, mas cada ato individualmente considerado. Na verdade, olhando, por exemplo, para o disposto no art. 171.º, do CP, é punido todo aquele que pratica ato sexual de relevo com menor, e logo que pratica cada ato, e em cada ato que pratica. É o ato ainda isolado que já constitui um caso de abuso
Vem assim defendendo maioritariamente o STJ que “a estrutura típica do crime de abuso sexual de crianças não pressupõe reiteração, pelo que não se pretendendo com o mesmo punir uma atividade, não lhe é aplicável a figura do crime de trato sucessivo” e que “a eventual admissão da unificação de uma pluralidade de condutas essencialmente homogéneas, através da figura do crime de trato sucessivo, no âmbito do tipo penal de abuso sexual de crianças, poderia redundar num resultado que o legislador claramente quis afastar – ainda que por referência à figura do crime continuado – com a alteração ao n.º 3 do art. 30.º do CP realizada pela Lei 40/2010, de 03.09, que exclui expressamente a admissibilidade da possibilidade de unificação de uma pluralidade de condutas na figura do crime continuado, quando estejam em causa bens eminentemente pessoais” – (Acórdão do STJ de 14/01/2016, no qual foi relator o Conselheiro Manuel Augusto de Matos, e no mesmo sentido, entre outros acórdãos do STJ, os acórdãos de 6.04.2016, proc.19/15.7JAPDL, de 20.04.2016, proc.657/13.2JAPRT.P1, de 18/1/2018, proc.239/11.3TALRS, de 22/3/2018, proc.467/16.5PALSB,de 23/5/2019, proc. 134/17.2JAAVR.l e de 27/11/2019, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Como defende igualmente Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 3ªedição, anotação ao artigo 30º, pág. 224, “No caso de sucessão de vários crimes contra bens eminentemente pessoais, deve punir-se as condutas do agente em concurso efetivo. Esta é precisamente a consequência prática da supressão da benesse do crime continuado contra bens eminentemente pessoais. Foi este o resultado prático pretendido pelo legislador. Portanto é inadmissível a punição dos crimes contra bens eminentemente pessoais como um único crime de “trato sucessivo”, ficcionando o julgador um dolo inicial que engloba todas as ações. Tal ficção constituiria uma fraude ao propósito do legislador”.
Deve assim considerar-se que sempre que o crime é praticado em momentos diferentes estamos perante mais um crime, tanto assim que a sua prática pressupõe a criação pelo agente de circunstâncias que o permitam e que em cada ato individualmente perpetrado a vítima é renovadamente lesada (Cfr. Helena Moniz, obra citada, pág.22).
Como também salienta Cristina Almeida e Sousa, in Inconstitucionalidade da Jurisprudência do “Trato Sucessivo”, nos crimes sexuais – Revista Julgar On line/Outubro/2019, pág.26, estamos perante “comportamentos diferentes que requerem do seu autor a criação de situações favoráveis de secretismo e condicionamento da vontade da vítima, aptos à concretização do resultado proibido, a que tendencialmente estarão associados processos volitivos autónomos entre si e não uma única vontade, de cuja análise global transparecem diferentes sentidos técnico-jurídicos da ilicitude que exige o seu enquadramento jurídico como concurso real de infrações”.
Em resumo, no caso de crimes de abuso sexual de crianças, como ocorre no caso vertente, o entendimento que perfilhamos, na senda daquele que vem sendo defendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, é pois no sentido da integração da pluralidade de condutas na figura do concurso efetivo de crimes, afastando-se a possibilidade de subsunção a outras figuras, designadamente do crime de trato sucessivo.
A jurisprudência do STJ é, aliás, presentemente unânime ao afastar a figura do “trato sucessivo” dos casos de crimes contra a autodeterminação sexual.
Cremos assim que só de acordo com os critérios gerais de distinção entre unidade e pluralidade de crimes é que situações de multiplicidade de atos homogéneos, praticados contra a mesma vítima, numa mesma ocasião e local, poderão enquadrar-se num único crime de abuso sexual de crianças e não por apelo à caraterização daqueles crimes como crime de trato sucessivo, que o respetivo tipo legal não consente.

E assim, bem andou o tribunal recorrido ao concluir, como concluiu, que cada uma das 23 condutas descritas na factualidade provada nos pontos que a seguir se enunciam ou agrupam:
- 84º;
- 88º,89º;
- 92º,93º,94º;
- 98º,99º;
-107º,108º;
-110º,111º;
- 112º,113º,114º e 115º
- 117º,118º;
- 121º,122º e 123º;
- 126º,127,128 e 129;
- 132º,133º;
- 135º,136º;
- 137º;
- 142º;
- 146, 147º,148º e 149;
- 151º,152º,153º e 154º;
- 156º,157º,158ºe159º;
- 161º,162º,163º e 164º;
-167º,168º,169º e 170º;
- 172º,173º,174º e 175º;
-177º,178º,179º e 180º;
-182º,183º,184º e 185º;
-186º.
devem ser punidas em concurso efetivo, integrando cada uma delas um crime de abuso sexual de crianças, nos termos das disposições conjugadas constantes da decisão recorrida.
Com efeito, cada uma dessas 23 condutas (descritas por referência aos respetivos pontos da factualidade provada) foi levada a cabo num diverso contexto situacional, necessariamente comandado por uma diversa resolução e traduzindo-se numa autónoma lesão do bem jurídico protegido.
Cada uma dessas condutas não constitui um momento ou parcela de um todo projetado, nem uma conduta em que se tenha desdobrado uma atividade suposta no tipo, mas um “todo”, em si mesmo, um autónomo facto punível, devendo, por isso, entender-se que, em relação a cada grupo de atos, existe, usando as palavras de Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ªEdição, pág.989, “pluralidade de sentidos de ilicitude típica” e, portanto, de crimes.
Por conseguinte, em causa está não um só crime de trato sucessivo de abuso sexual de crianças, como pretende o arguido, punido com pena de 3 a 10 anos de prisão, mas sim uma pluralidade de crimes (23) por que foi condenado, a punir em concurso efetivo e de acordo com a respetiva qualificação jurídica que lhe fez corresponder o tribunal recorrido, a qual não merece qualquer reparo : 18 deles punidos nos termos do citado art.171º,1e 2, com pena de 3 a 10 anos de prisão, dois deles nos termos do art.171º,nº1, punidos com pena de 1 a 8 anos de prisão e três nos termos do art.171º,nº3 ( 1 deles com referências às alíneas a) e b) e dois com referência à alínea b)), com pena de 1 mês a 3 anos de prisão.
Sem necessidade de outras considerações, improcede também neste segmento o recurso.

- Medida da Pena - Redução das penas parcelares e pena única.

Por fim, insurge-se o recorrente contra as penas parcelares aplicadas, pretendendo a sua redução e acomodação numa pena única não superior a 5 anos.

Sustenta a pretendida redução, na seguinte alegação:
- não se aproveitou da ingenuidade da assistente, a qual manteve também relações sexuais com dois dos arguidos;
- encontrava-se numa relação amorosa com a menor;
- não tem registo de problemáticas aditivas ou criminais.

Ora, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1 do C. Penal) mas em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (nº 2 do mesmo artigo).
Por outro lado, estabelece o art. 71º, nº 1 do C. Penal que, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
Um dos princípios basilares do C. Penal vigente reside na compreensão de que toda a pena tem de ter como suporte axiológico-normativo uma culpa concreta, como desde logo pronuncia o artigo 13º ao dispor que só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.
Tal princípio da culpa significa não só que não há pena sem culpa, mas também que a culpa decide da medida da pena, ou seja, a culpa não constitui apenas o pressuposto-fundamento da validade da pena, mas firma-se também como limite máximo da mesma pena.
A este propósito, e conforme salienta o Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal II, pag. 229, dentro do binómio culpa-prevenção há que ter em conta que a medida da pena não poderá ultrapassar a medida da culpa; a verdadeira função desta na teoria da medida da pena reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso, pois, a culpa constitui um limite inultrapassável de todas e quaisquer questões preventivas, sejam de prevenção a nível geral positiva ou negativa, de integração ou intimidação; sejam de prevenção, neutralização ou pura defesa social.
Há decerto, uma medida óptima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias: medida, pois, que não pode ser excedida em nome de considerações de qualquer tipo. Mas, abaixo desse ponto óptimo, outros existem em que aquela tutela é ainda efectiva e consistente e onde, portanto, a medida da pena pode ainda situar-se sem que esta perca a sua função primordial; até se alcançar um limiar mínimo, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar. Nesta acepção, poderá até afirmar-se que é a prevenção geral positiva, ela sim (e não a culpa), que fornece um «espaço de liberdade ou de indeterminação, uma « moldura de prevenção », dentro da qual podem e devem actuar considerações extraídas das exigências de prevenção especial de socialização.
Assim, primordial e essencialmente, a medida da pena há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e referida ao momento da sua aplicação, protecção que assume um significado prospectivo que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade da norma infringida. Um significado, deste modo, que por inteiro se cobre com a ideia da prevenção geral positiva ou de integração que vimos decorrer precipuamente do princípio político-criminal básico da necessidade da pena.
De acordo com o direito vigente, na fixação da pena deve partir-se da teoria da união, a qual exige que se chegue a uma relação equilibrada dos diferentes fins da pena.
A pena deve determinar-se de modo a que garanta a função retributiva, esta equacionada com o ilícito em si e a culpabilidade, sem pressuposto e limite último, e seja possível, pelo menos, o cumprimento também da missão ressocializadora da própria pena com respeito ao próprio arguido, acrescendo, deste modo, o fim da prevenção especial.
Além disso, a defesa do ordenamento jurídico exige, por último, que a pena se determine de tal modo que possa alcançar um efeito sócio-pedagógico na comunidade, que sirva ele de exemplo, de contra motivo à prática de idênticos ilícitos pelos demais indivíduos. Foi para fazer ou atingir a possível concordância dos fins das penas no caso concreto, que se desenvolveu na jurisprudência a teoria da margem da liberdade, teoria segundo a qual a pena adequada à culpabilidade não é uma medida exacta.
A pena concreta é fixada entre um limite mínimo (já adequado à culpa) e um limite máximo (ainda adequado à culpa ) determinado em função da culpa, intervindo os outros fins das penas – prevenção geral e prevenção especial – dentro daqueles limites – neste sentido, vide Claus Roxin, in Culpabilidad y Prevencion em Derecho Penal, 94-113.
Assim, quanto à determinação da pena a aplicar ao agente e para além da culpa do mesmo e das exigências de prevenção, geral e especial, atender-se-á, ainda, a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo deponham a favor ou contra aquele.

São elas, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do doto ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
j) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena".
Assim, as circunstâncias e os critérios do art. 71º do Código Penal têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para codeterminar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (por exemplo, a natureza e o grau de ilicitude do facto impõem maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afetação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento) ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objetivas para apreciar e avaliar a culpa do agente - Cf. acórdão do STJ de 28-09-2005, in Coletânea de Jurisprudência-STJ, 2005, tomo 3, pág. 173.

Na determinação de cada uma das penas parcelares ponderou o tribunal recorrido o seguinte:
«(…) as necessidades de prevenção geral positiva revelam-se prementes, uma vez que os bens e valores jurídicos protegidos e tutelados pela norma incriminatória são indiscutivelmente muito valiosos, além de que este tipo de ilícitos gera forte alarme social.
(…)
Por isso, os propósitos preventivos de estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada reclamam uma intervenção forte do direito penal sancionatório, por forma a que a aplicação da pena, no seu quantum, responda às necessidades de tutela dos bens jurídicos, assegurando a manutenção, apesar da violação da norma, da confiança comunitária na prevalência do direito.
No que respeita às exigências de prevenção especial positiva ou de ressocialização, assume primordial importância que os arguidos (…) e S. A. compreendam o desvalor dos seus comportamentos nos acontecimentos que aqui se apreciam, de forma a prevenir a prática de futuros actos delinquentes.

(...) depõe contra os arguidos (…) e S. A. o grau de ilicitude dos factos, de intensidade que, do ponto de vista do desvalor da acção, se reputa de elevada (cfr. artigo 71º, nº2, alínea a), do CP).
Quanto ao arguido S. A.: [i] relacionou-se sexualmente apenas com a menor/assistente A. T.; [ii] os actos sexuais de relevo que praticou são imensos, vincados e intensos, envolvendo beijos linguais, apalpões dos seios e das nádegas, sexo oral recíproco e cópula (na maioria das vezes sem fazer uso de protecção e com ejaculação); [iii] manteve uma relação de namoro com esta A. T. que se iniciou entre Abril e Junho de 2018 e que apenas cessou com a prisão preventiva do arguido; [iv] foram inúmeras as relações sexuais que manteve com a aludida A. T.; [v] os crimes que se apreciam foram praticados em diversos locais (habitação daquele S. A. em ... – Esposende, Barcelos e Lisboa, zonas de monte de ... – Barcelos e de ... – Esposende, local ermo em ... – Esposende e até na habitação do irmão mais velho da vítima, em Vila Nova de Cerveira, quando esta lhe estava confiada); [vi] a natureza do seu envolvimento com esta menor/assistente, determinou que a mesma se deslocasse sozinha até Lisboa, sem o conhecimento e autorização dos progenitores – circunstância que não mereceu qualquer oposição do arguido, nem qualquer tentativa de dissuadir a aludida A. T. –, que, por desconhecerem o seu paradeiro, fizeram uma participação do seu desaparecimento; [vii] manteve com a identificada A. T. conversas de teor sexual, fazendo uso de linguagem desbragada e muito grosseira na alusão a actos sexuais praticados e a praticar; e [viii] remeteu fotografias suas a esta menor/assistente, onde exibia o seu pénis, e pediu-lhe, de forma muito insistente, que enviasse fotografias de “nudes” dela, o que a mencionada A. T. fez, por várias vezes (cfr. artigo 71º, nº2, alínea a), do CP).
Ainda em relação ao arguido S. A., não poderemos deixar de realçar a persistência que demonstrou no desenvolvimento da sua conduta criminosa, pois que, como se apurou: [i] depois da deslocação da aludida A. T. a Lisboa e da participação do seu desaparecimento pelos progenitores, apesar de saber que as circunstâncias em que os factos ocorreram estavam a ser investigadas, apenas deixou de contactar com aquela durante algum tempo, tendo retomado o seu relacionamento amoroso a partir de Outubro de 2018, nos exactos moldes anteriores; e [ii] não obstante no dia 18 de Junho de 2019 ter sido sujeito a primeiro interrogatório judicial, com aplicação da medida de coacção de proibição de contactos, por qualquer meio [escrito, falado ou tecnológico], directo ou por interposta pessoa, com a mesma A. T., assim que foi restituído à liberdade, continuou a contactá-la por telemóvel e pessoalmente, como o fazia antes.
Esta postura, segundo entendemos, é suficientemente reveladora do claro desajustamento da personalidade do arguido S. A. com a normatividade.
Além disso, acarretou para a menor/assistente A. T. a sua deslocação do meio familiar e social onde se encontrava inserida para junto do irmão mais velho – residente em Vila Nova de Cerveira –posteriormente a sua institucionalização na “...” e, tempos depois, na “Casa do ...”, em Chaves.
As condutas dos arguidos (…) e S. A., no que respeita a esta menor/assistente, não foram graves, seja a nível físico, seja a nível psíquico, uma vez que, como se indica na perícia psicológica a que foi submetida, não evidencia indicadores de sintomatologia psicopatológica clinicamente significativos, sendo moderado o risco de revitimação (cfr. artigo 71º, nº2, alínea a), do CP).
A mencionada A. T. experimentou alguma instabilidade emocional, vergonha, culpa, tristeza, comoção e perda de autoestima – razão pela qual é acompanhada por psicóloga –, experienciando também crises de choro.
No entanto, cumpre ter em atenção que esta sintomatologia não constitui uma consequência directa dos comportamentos assumidos pelos arguidos, mas antes decorre da instauração destes autos e da discussão dos presentes factos, de natureza sensível, que saíram da esfera da intimidade daquela A. T. e passaram a ser conhecidos e até discutidos no contexto familiar e escolar, com o que acabou por sentir-se exposta.
Depõe, igualmente, contra os arguidos a intensidade do dolo nos crimes que praticaram, (…)na sua modalidade mais grave – o dolo directo –, para os aludidos (…)e S. A., projectando a sua actuação e as suas imediatas consequências e conformando-se com a sua actuação ilícita (cfr. artigos 14º, nºs1 e 3 e 71º, nº2, alínea b), do CP).
Não poderemos, também, desconsiderar os sentimentos de indiferença manifestados pelos arguidos no cometimento dos crimes sob discussão, tendo todos actuado com o propósito único de satisfazerem os seus instintos e prazeres sexuais, com desprezo pelo desenvolvimento psicológico e da personalidade das menores A. T. e B. D. na sua vertente sexual, assim revelando uma personalidade que apresenta qualidades desvaliosas (cfr. artigo 71º, nº2, alínea c), do CP).
O que acaba de afirmar-se assume maior intensidade em relação ao aludido S. A. que, pelos motivos já profusamente expostos, apresenta sérios défices ao nível do controlo dos seus instintos de natureza sexual, bem como ao nível da consciência ética do desvalor dos comportamentos adoptados e do impacto destes na pessoa da vítima A. T. (cfr. artigo 71º, nº2, alínea c), do CP).
(…)
Em relação ao arguido S. A., a sua condição pessoal, familiar, profissional, económica e social suscita-nos ponderadas reservas, atento o teor do respectivo relatório social, elaborado pela DGRSP, na medida em que: [i] no processo de crescimento do arguido, a dinâmica familiar era condicionada pelos hábitos alcoólicos do progenitor e subsequentes comportamentos agressivos deste para com a família, cuja subsistência dependia do mesmo por ser o único que desenvolvia uma actividade profissional; [ii] com o divórcio dos progenitores foi institucionalizado aos 14 (catorze) anos; [iii] mostra-se habilitado com o 7º ano de escolaridade e com um curso de informática e programação, com a duração de 6 (seis) meses; [iv] aos 17 (dezassete) anos mantinha um vínculo afectivo com um irmão mais velho – passando pequenos períodos na habitação deste, em Amares –, que se quebrou em virtude da pendência de um processo em que é acusado da prática de vários crimes de abuso sexual de criança agravado; [v] aos 19 (dezanove) anos passou a coabitar com a sua namorada, tendo esta relação durado 30 (trinta) meses, na constância da qual nasceu o seu primeiro filho, actualmente com 8 (oito) anos de idade e com quem convive esporadicamente; [vi] iniciou, entretanto, um outro relacionamento, do qual resultou o nascimento de uma filha, vivendo com a sua companheira na Póvoa de Varzim durante 6 (seis) meses, altura em que a relação terminou; [vii] em 2016, conheceu L. D., de 17 (dezassete) anos de idade, estudante na Escola Profissional de ..., com quem passou a coabitar e com quem casou civilmente no dia 22 de Dezembro de 2017, nascendo dessa relação o seu terceiro filho – essa relação, entretanto, findou e o casal separou-se, ficando o filho sob a responsabilidade educativa da progenitora, que constituiu um novo agregado familiar; [viii] por altura do termo da sua 1ª relação, trabalhou como empregado do “Restaurante ...”, em horário noturno; [ix] aquando da sua 2ª relação, quando residia na Póvoa de Varzim, o trabalhou num café em ... – Barcelos; [x] aquando da sua 3ª relação, trabalhou algum tempo numa empresa de soldadura, em Esposende, e 1 (um) ano em Inglaterra; [xi] com o término desta relação, trabalhou em Sesimbra; [xii] em Outubro/Novembro de 2018, com o objectivo de se reaproximar dos filhos, arrendou um quarto particular em ... – Esposende, e empregou-se no estabelecimento comercial, denominado “Café ...”, sedeado em ..., por tempo determinado, em regime de part-time (das 8h00m às 13h00m); [xiii] nos tempos livres dedicava-se à programação de jogos e convívio com jovens e conversações através das redes sociais; [xiv] não tem qualquer tipo de contacto com o progenitor, nem com os irmãos, por não haver ligação afectiva com os mesmos; [xv] no que respeita à progenitora, mantém alguns contactos ocasionais e alguma vinculação afectiva, beneficiando do seu apoio, ainda que ténue neste momento; [xvi] sem prejuízo do referido em [xv], a sua progenitora mostra-se disposta a, na medida do possível, auxiliar o arguido a encontrar trabalho e a orientar a sua vida; [xvii] à data da sua prisão preventiva, encontrava-se desempregado e sem rendimentos próprios, vivenciando uma situação económica precária, não dispondo de casa própria, razão pela qual passou a pernoitar no seu veículo automóvel; [xviii] no meio prisional tem adoptado uma conduta de acordo com o normativo institucional; e [xix] a sua detenção preventiva é do conhecimento do irmão, da progenitora e do ex-cônjuge, que apoiam o arguido minimamente em contexto prisional – a mãe com visitas de carácter pontual e o ex-cônjuge por contactos telefónicos/videochamada.
Em face do exposto, a vida pessoal, familiar, laboral e social do arguido apresenta-se desestruturada há já bastante tempo, apenas beneficiando de uma ténue retaguarda da parte da progenitora e de algum interesse do irmão e do ex-cônjuge subsequente à sua detenção.
Na verdade, o aludido S. A. vem demonstrando sérias dificuldades em estabilizar as suas relações afectivas, seja com a família biológica, seja com as ex-companheiras, seja com os próprios filhos.
E o mesmo se verifica no plano profissional, pois que nunca dispôs de um emprego regular e que lhe assegurasse uma fonte de rendimento sólida, em ordem até a assegurar a subsistência dos seus 3 (três) filhos.
A postura do mencionado S. A. nos vários planos da sua vida e, sem dúvida, errante.
Daí que, para além da perda de liberdade, não sinalize especiais repercussões no seu quotidiano decorrentes da sua actual situação judicial, atendendo à instabilidade laboral e habitacional em que vivia (desempregado, sem rendimentos próprios e a pernoitar no seu veículo automóvel).
O arguido apresenta, ainda, antecedentes criminais, embora pela prática de crime de diferente natureza daqueles ora sob censura, tendo sido condenado em pena patrimonial.
Este antecedente assume, assim, um peso (quase) írrito (cfr. artigo 71º, nº2, alínea e), do CP).
(…)
Os arguidos (…) e S. A. (…), sem prejuízo de terem, de certo modo, procurado justificar o seu comportamento e escudar-se em factores alheios à sua pessoa – onde prepondera a própria actuação das vítimas –, quando confrontados com factos semelhantes aos dos presentes autos, mostraram-se conhecedores da sua ilicitude e censurabilidade, bem como da existência de vítimas e danos para estas (…).
Este reconhecimento, no entanto, quanto ao arguido S. A., pelas razões já supra expostas, mostra-se mitigado.
(…)».
Cremos que a ponderação feita pelo tribunal coletivo em ordem à determinação das penas concretas parcelares mostra-se correta.
Começando pelo grau de culpa, o mesmo foi, de facto, de grau bastante elevado, tendo o arguido agido com dolo direto, forma mais grave da culpa, em relação a todas as condutas que lhe vêm imputadas.
Com efeito, o arguido agiu, em todas as situações com dolo intenso e persistente, revelador de acentuada energia criminosa.
Atuou num crescendo dos seus propósitos criminosos, prolongando os abusos num período superior a um ano, os quais não abandonou sequer após ter sido sujeito a primeiro interrogatório no dia 18 de junho de 2019, na sequência do qual lhe foi aplicada a medida de coação de proibição de contatos com a vítima, revelando uma particular resistência à força de apelo dos valores jurídico-penalmente tutelados, tendo sempre atuado com o propósito único de satisfazer os seus instintos e prazeres sexuais com completa indiferença pelas consequências dos seus atos ao nível de um saudável e harmonioso desenvolvimento da esfera afetivo-sexual da menor – persistência que não podia deixar de ser atendida, como não foi, nas diferentes penalidades para atos de igual natureza – apenas tendo parado quando foi preso preventivamente à ordem dos presentes autos.
No que tange à ilicitude, entendida como um juízo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento por este lesar e pôr em perigo bens jurídico-criminais, a mesma é, de facto, elevadíssima, no que tange a todas as concretas atuações, atento o tipo de atos praticados, assumindo, porém, um grau intolerável, evidenciador de uma personalidade absolutamente deformada, as condutas em que sujeitou a menor – à data com 12 anos - à pratica de mais do que um ato sexual – para além da cópula, sexo oral recíproco – o que não deixou de merecer, como não podia, diferente penalidade, dento dos factos integradores dos crimes de abuso sexual de criança p. e p. pelo artigo 171º,nº1 e 2 (18 no total), cabendo ainda ressaltar, como também se referiu no acórdão recorrido, que o arguido não fez uso de preservativo, indiferente à possibilidade de lhe transmitir doenças venéreas.
De ponderar, porém, como também não foi esquecido no acórdão recorrido, a ausência de consequências para a menor, quer ao nível físico, quer ao nível psíquico, decorrentes das concretas atuações do arguido, ainda que, no futuro, sejam suscetíveis de vir a ter repercussões negativas no desenvolvimento afetivo-sexual da menor.
São, por outro, muito elevadas as exigências de prevenção geral, impondo-se repor a confiança dos cidadãos na validade das normas jurídicas violadas com os comportamentos lesivos dos bens jurídicos protegidos, porquanto os crimes em apreço têm ganho avanços preocupantes na nossa sociedade, gerando justificado alarme social nos mais diversos estratos populacionais, face ao ênfase que lhe vem sendo dado pelos meios de comunicação social.
Com efeito, a comunidade rejeita veementemente a prática de tais atos e exige que os seus autores sejam punidos com uma pena que os faça sentir a enorme dimensão da censura social por tais condutas e que ao mesmo tempo se mostre suficientemente intimidante para futuros comportamentos idênticos.
Há assim que reforçar a validade das normas violadas aos olhos da comunidade.
As exigências de prevenção especial fazem-se também sentir, não tanto em face dos antecedentes criminais, na medida em que o arguido conta com uma condenação por um ilícito de natureza diferente, mas sobretudo pela sua personalidade deformada, evidenciada nos factos e pelo seu reduzido juízo critico acerca da ilicitude das suas condutas.
Ademais, o arguido desvalorizou a gravidade da sua atuação, tendo procurado justificá-la e legitimá-la – no que insiste no presente recurso - na relação de namoro mantida com a menor e nos relacionamentos sexuais que esta já havia mantido também com outros arguidos, tudo a evidenciar que, não obstante todo o tempo decorrido desde a ocorrência dos factos e o seu período de reclusão, não interiorizou verdadeiramente a desconformidade e imensa gravidade da sua atuação, desconsiderando que independentemente da experiência sexual da menor ou da sua anuência, as condutas sexuais em apreço são suscetíveis de prejudicar o desenvolvimento da sua personalidade, em particular na esfera sexual.
Por fim, a evidenciar também estas exigências de prevenção especial, está ausência de um projeto sério de vida pessoal, familiar, profissional e social por banda do arguido.
Aqui chegados, situando-se a sindicabilidade da pena em via de recurso na deteção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei, sindicância essa que não abrange a determinação/fiscalização do quantum exato de pena que, decorrendo duma correta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada – neste sentido, o Acórdão do TRE de 22-04-2014, disponível em http//www.dgsi.pt. – sendo nosso entendimento que as penas parcelares aplicadas pelo tribunal a quo asseguram adequada e suficientemente as finalidades da punição, não excedendo o limite estabelecido pela medida da culpa, tendo o tribunal a quo seguido corretamente o procedimento e as operações de determinação da pena concreta e observado os princípios gerais que lhe devem presidir, deverão as mesmas ser mantidas.
Cremos, com franqueza, que penas abaixo das fixadas – já perto dos seus limites mínimos - não salvaguardariam as elevadíssimas exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir no caso vertente.
Insurge-se também o arguido com a medida da pena única de 7 anos e 8 meses de prisão que lhe foi fixada, dentro da moldura penal abstrata de 4 anos e 3 meses a 25 anos de prisão.
A este propósito, alega o recorrente, nas suas conclusões, que a pena única do concurso revela-se manifestamente exagerada face às exigências de prevenção e ilicitude da conduta e até desproporcional face a casos semelhantes, pois no caso do recorrente trata-se da primeira condenação.
Sem qualquer razão.
Em sede de determinação da pena única, nos termos do artigo 77°/1 Código Penal, são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, na busca da imagem global dos factos.
Ou seja, há que ponderar o binómio factos-personalidade.
Fundamental na determinação da pena única é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse pedaço global de vida criminosa com a personalidade do agente.
A pena única deve assim formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do agente e das diversas penas parcelares.
Assim, com vista à determinação da pena única, decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos – a relação dos diversos factos entre si, a sua frequência, a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados, a forma de execução, a determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido – assumindo, claro está, um significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, e ao núcleo de bens essenciais, em relação à ofensa de bens patrimoniais.
“O conjunto dos factos fornecerá assim gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique (Figueiredo Dias, in Consequências Jurídicas do Crime, § 420 e segs).
Uma vez estabelecidas as conexões entre todos os factos abrangidos pelo concurso e relacionados os mesmos, apurar-se-à “a personalidade do agente, destarte se o mesmo tem propensão para o crime, ou se na realidade, estamos perante um conjunto de eventos criminosos episódicos, sem relação com a sua concreta personalidade” (Tiago Caiado Milheiro, Cúmulo Jurídico Superveniente, Noções Fundamentações, pág.59).
“Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta (Figueiredo Dias, in obra citada, § 421).
De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
Relativamente à prevenção geral o significado do conjunto de atos praticados em termos de perturbação da paz e segurança dos cidadãos e, num outro plano, o significado da pena conjunta em termos de ressocialização do delinquente, para o que será preponderante e decisivo, o resultado da ponderação dos seus antecedentes criminais e da sua personalidade expressa no conjunto dos factos.
Serão pois esses fatores que deverão ser tomados em consideração na determinação da medida da pena única.
Volvendo-nos no caso vertente, não pode deixar de reconhecer-se que o ilícito global é de acentuadíssima gravidade, desde logo, pelo tipo de condutas em que se corporiza e respetivos bens jurídicos protegidos (23 crimes de abuso sexual de criança, tendo dezoito deles consagração no artigo171º,1e 2, punidos com pena de 3 a 10 anos de prisão, dois deles no nº1 do citado art.171º, punidos com pena de 1 a 8 anos de prisão e três nos termos do nº3 desse mesmo preceito legal ( 1 deles com referência às alíneas a) e b) e dois com referência à alínea b)), punidos com pena de 1 mês a 3 anos de prisão), atuações que provocam na comunidade um enorme sentimento de receio e, concomitantemente de repulsa.
De ponderar ainda o lapso de tempo considerável, cerca de um ano e meio (desde abril de 2018, situando-se a ultima atuação descrita na factualidade em agosto de 2019), durante o qual o arguido reiterou a sua conduta e manteve inalterados os seus intentos, pese embora o primeiro confronto judicial ocorrido em junho de 2019 e que não o demoveu de praticar mais 10 crimes de abuso sexual.
Sobressai pois, na imagem global do facto, o aproveitamento do arguido da especial vulnerabilidade da menor A. T. de 12 anos de idade, estando subjacente a toda a sua atuação a satisfação dos seus desejos libidinosos, desconsiderando a personalidade da menor, designadamente na sua esfera sexual.
A respeito da personalidade do arguido valem aqui as considerações já tecidas, sobressaindo a sua reduzida sensibilidade à conformação com os valores tutelados pelas normas penais violadas, pouco relevando a seu favor a circunstância de apenas ter um antecedente criminal pouco significativo.
Não obstante, na senda da decisão recorrida, cremos que o quadro geral desenhado não permite concluir ainda pelo começo de uma verdadeira carreira criminosa, antes refletindo uma situação de pluralidade, razão pela qual a acumulação de crimes não deve funcionar como elemento agravante da pena conjunta.
Por conseguinte, em face do conjunto dos factos e da personalidade do arguido, a pena única de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão fixada pelo tribunal recorrido, não padece de qualquer exagero, pecando até de alguma brandura.
Também por aqui improcede o recurso.

III. Dispositivo

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso interposto pelo recorrente/arguido S. A., mantendo-se o acórdão recorrido.

Custas pelo arguido/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em quantia correspondente a quatro unidades de conta (arts. 513º,nº1 do C.P.P. e 8º,nº9, do Regulamento das custas Processuais, e Tabela III anexa a este último diploma).

(Texto elaborado pela relatora e revisto por ambos os signatários – art.94º,nº2, do C.P.P.)
Guimarães, 27 de setembro de 2021

Desembargadora Relatora
Cândida Martinho
Desembargador Adjunto
António Teixeira