Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
726/16.7T8VVD-A.G1
Relator: JOSÉ CARLOS PEREIRA DUARTE
Descritores: HABILITAÇÃO DE HERDEIROS
TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA
COOPERAÇÃO
GESTÃO PROCESSUAL
ECONOMIA PROCESSUAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. No âmbito de um incidente de habilitações de herdeiros, em que o desenvolvimento dos autos torna patente que o requerimento inicial se mostra incompleto no que respeita à indicação da totalidade dos herdeiros, se o requerente do incidente invocar dificuldade séria na identificação dos herdeiros e respectivo grau de parentesco ( irmãos e sobrinhos), mas é conhecida a identidade do cabeça de casal da herança aberta por óbito do falecido, os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da cooperação, da gestão processual e da economia processual impõem que o juiz ordene a notificação daquele cabeça de casal para que preste as informações necessárias á identificação da totalidade dos herdeiros e respectivo grau de parentesco e, posteriormente, profira despacho de aperfeiçoamento.
II. Além disso e sobrevindo o falecimento de um dos habilitandos, os mesmos princípios impõem que o juiz ordene a notificação daquele cabeça de casal para que preste as informações necessárias á identificação da totalidade dos herdeiros desse habilitando e respectivo grau de parentesco e, posteriormente, convide o requerente do incidente a deduzir articulado superveniente em que requeira a habilitação de herdeiros daquele.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

1. Relatório[1]

AA e BB intentaram acção de divisão de coisa comum contra CC e DD, EE e FF, GG, HH e II.

Nos referidos autos foi requerida a habilitação de herdeiros de II.

As cartas de notificação dos requeridos FF, EE e HH foram devolvidas com a indicação de que tinham falecido.
 
Nos referidos autos, por decisão de 20/03/2017 foi habilitado como sucessor de II, JJ.

A 19.05.2017, por apenso aos referidos autos de acção de divisão de coisa comum, AA e BB deduziram o presente incidente de habilitação de herdeiros, por óbito da referida HH, que indicaram como tendo falecido no estado de viúva e tendo deixado “dois filhos“, referindo depois as seguintes pessoas:
a. KK;
b. LL;
c. MM;
d. NN;
e. JJ;
f. CC;
g. OO;
h. PP;
i. KK;
j. QQ.

E requereram “se oficie ao Serviço de Finanças ... para indicar as moradas dos mesmos, bem como proceder à junção aos autos de Habilitação de herdeiros, por ser a única forma de aceder à mesma, uma vez que o autor não tem meios de o fazer, embora tenha conhecimento que a mesma se encontra nesse instituto público”.

A 24/05/2017 foi proferido despacho a ordenar fosse pesquisada “nas bases de dados […]a certidão de óbito da parte falecida e pelas moradas completas dos habilitandos” e que após fosse dado cumprimento ao disposto no art.º 352º, n.º 1 do CPC.
 
Foram juntas ao processo físico, não constando do processo electrónico, impressões dos assentos de nascimento e de óbito – este a fls. 7 – de HH, não constando do primeiro qualquer inscrição de casamento e constando do último que a mesma faleceu no estado de solteira, a .../.../2016.

A 01/06/2017 foram os autos conclusos com a informação de que efectuada a pesquisa à base de dados, verifica-se que nenhum dos indicados pelo requerente é filho de HH.

Na mesma data foi proferida despacho a ordenar fosse solicitado ao Serviço de Finanças o envio dos documentos requeridos pelos requerentes.

A 26/06/2017, foi junto aos autos o oficio do Serviço de Finanças ... onde informa que “ junto à participação do imposto de selo por óbito de HH (…) não foi apresentada habilitação de herdeiros.”

Notificado do referido oficio, veio o requerente requerer fosse notificada NN na qualidade de cabeça de casal da herança “por preenchimento dos pressupostos legais para assumir o cargo e proceder à habilitação de herdeiros”.

A 21/09/2017 foi proferido despacho a ordenar a notificação dos requerentes para em 10 dias comprovar nos autos “ser NN a cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH [por lapso consta do despacho DD], uma vez que tal não resulta dos autos”.

A 18/10/2017 foi proferido despacho a ordenar a notificação dos requerentes de que os autos aguardam o devido impulso processual sem prejuízo do decurso do prazo previsto no art.º 281º, n.º 1 do Código de Processo Civil.”

A 20/10/2017 os requerentes vieram dizer saber que NN é a cabeça de casal, não têm em sua posse documentos que o comprovem, tais documentos encontram-se na posse do Serviço de Finanças ..., terminando requerendo fosse solicitado a este o auto de declarações de cabeça de casal.

Por despacho de 24/10/2017 foi ordenado se oficiasse ao Serviço de Finanças nos termos requeridos.

A 15/11/2017 foi junto aos autos oficio do Serviço de Finanças ... que capeia o Modelo 1 do Imposto de Selo n.º ...22, onde consta que NN é a cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH e a identificação dos beneficiários da transmissão, num total de 15 pessoas.

A 21/11/2017 vieram os requerentes requerer fossem habilitados como herdeiros de HH as pessoas indicadas no requerimento inicial e notificados para contestar.

A 24/11/2017 foi proferido despacho a ordenar fosse cumprido o disposto no art.º 352º, n.º 1, do Código de Processo Civil, citando os requeridos que ainda não tenham sido citados para a causa e notificando s restantes, para contestarem a habilitação.

Foi efetuada uma pesquisa às bases de dados a fim de averiguar a morada das pessoas que não constavam do requerimento inicial - NN, RR, SS, TT e UU.

Foram devolvidas as cartas de citação de SS, MM, KK, FF, NN, II e devolvidos os AR’s relativos á citação de PP, TT, LL, OO, KK e RR.

Foram remetidas cartas nos termos do art.º 241º do CPC para LL, OO e TT.

A carta enviada a LL veio devolvida com a menção de falecido.

Entretanto foram devolvidas as cartas de citação de NN e UU.

A 13/12/2017 os requerentes requereram a citação por agente de execução de
SS, MM, KK, FF e NN.

A .../.../2017 NN veio informar que a falecida HH, sua tia, faleceu no estado de solteira (e não de viúva como erroneamente vinha identificada no requerimento inicial), e deixou como seus únicos e universais herdeiros quatro irmãos e onze sobrinhos.

A 19/12/2017 os requerentes vieram requerer a citação de todos os intervenientes processuais que não foram citados através de agente de execução.

Notificados do requerimento de NN, a 09/01/2018, vieram os requerentes requerer fosse a mesma notificada para juntar prova documental bastante, que comprove que 1. Que HH faleceu no estado de solteira; 2. Que os seus únicos e universais herdeiros são quatro irmãos e onze sobrinhos, identificando-os, e juntando também prova documental.

A 15/01/2018 foi proferido despacho com o seguinte teor:
“ Requisite certidão de óbito de HH e certidões de nascimento dos Requeridos.
*
Fls. 44 – Cite na morada completa constante de fls. 39.
*
Fls. 46 – Cite na morada estrangeira constante de fls. 10.
*
Fls. 48 – Cite na morada completa constante de fls. 16.
*
Fls. 50 – Nada a ordenar, uma vez que não foi requerida a sua habilitação.
*
Fls. 52 – Nada a ordenar, face ao teor de fls. 69.
*
Fls. 64 – Oportunamente será apreciado, logo que juntas as certidões de nascimento a requisitar.
*
Fls. 65 – Solicite a citação ao consulado competente, nos termos do art.º 239.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
*
Fls. 67 – Proceda-se à citação por agente de execução.”

Foi novamente junta impressão do assento de óbito de HH e juntas impressões dos assentos de nascimento de SS, MM, KK, NN, LL, constando deste último que faleceu a .../.../2017, no estado de divorciado.

Remetidas novas cartas de citação nos termos ordenados, vieram devolvidas as cartas de citação SS e KK, foi junto o AR relativo á citação de MM e foi junto certidão de citação por agente de execução de UU.

Face ao teor da impressão do assento de nascimento de LL, onde consta que faleceu a .../.../2017, por despacho de 04/09/2018 foi declarada suspensa a instância até que seja notificada a decisão que julgue habilitados os sucessores do mesmo.

O Consulado de Portugal em ... veio informar não ter sido possível realizar a citação de NN.

A 18/01/2019, os requerentes vieram requerer a citação edital de “todos os intervenientes processuais ainda não citados”, o que foi deferido por despacho proferido em 13/02/2019.

Na diligência para citação edital de KK foi apurado que a mesma se encontrava num lar.

Procedeu-se à citação edital de NN, que, entretanto, juntou procuração aos autos.

Por despacho de 07/05/2019 foi ordenada a citação do Ministério Público, o que foi feito.

Por despacho de 30/05/2019 foi ordenado fossem requisitadas “certidões de nascimento de todas as pessoas identificadas a fls. 28, relativamente às quais ainda não se mostrem juntas tais certidões.”

Foram juntas aos autos impressões dos assentos de nascimento de NN, MM, JJ, KK de VV, OO, NN, RR, SS, QQ, TT, UU, KK – constando deste que faleceu a .../.../2019 -, CC, LL - onde consta que faleceu a .../.../2017 -, PP.

A .../.../2019 foi proferido despacho com o seguinte teor:
Requisite certidões de nascimento de:
- WW e XX (ou YY) XX, identificados a fls. 128 e 129;
- FF e EE, identificados a fls. 131 e 136;
- JJ e ZZ, identificados a fls. 130 e 135;
- AAA e BBB, identificados a fls. 133 a 134.
*
Uma vez que resulta de fls. 139 e 141 que KK e LL, Requeridos nestes autos, já faleceram, notifique os Requerentes para que requeiram o que tiverem por conveniente.”

Foram juntas aos autos impressão dos assentos de óbito de YY e AAA e a impressão do assento de nascimento de BBB e de EE.

A 09/09/2019 foi proferido o seguinte despacho:
Aguarde que os Requerentes deem cumprimento à parte final do despacho de fls. 143 (ref.ª ...00), notificando-os de que os autos aguardarão nos termos do disposto no art.º 281.º, n.º 1, do C.P.C.

Notificados, a 10/09/2019 vieram os requerentes requerer fossem notificados:
1. Os registos centrais da Autoridade e Aduaneira, ou o Serviço de Finanças ..., no sentido de juntar aos autos o imposto sucessório por falecimento de KK e LL;
2. A Conservatória do Registo Civil ..., no sentido de juntar aos autos a habilitação de herdeiros de KK e LL, e ainda as certidões de nascimento/óbito dos mesmos.

Por despacho de 12/09/2019 foi ordenado que se cumprisse como requerido.

A CRCivil veio informar que não tem no seu arquivo as habilitações de herdeiros por óbito KK e LL e não consta do assento de óbito menção á mesma.

E o Serviço de Finanças ... veio dizer que não foram apresentadas relações de bens por óbito daqueles.

A 07/11/2019 vieram os requerentes requerer se oficiasse aos “registos centrais da autoridade tributária e aduaneira no sentido de indicarem aos autos o número de identificação fiscal e morada fiscal de CCC e DDD, herdeiras legitimárias de LL para que possam ser chamadas à presente habilitação de herdeiros” e fossem notificados os serviços centrais de registo civil do Instituto de Registo e Notariado para que sejam conhecidos os herdeiros legitimários de LL, nos termos do art.º 2133.º do CC, face a inexistência de conjugue, ascendentes ou descendentes sobrevivos.”

Por despacho de 02/12/2019 foi ordenado se cumprisse como requerido.

Foram juntas aos autos impressões dos assentos de nascimento de CCC e DDD.

E foram juntas ao processo físico (fls. 159 e 161), não se encontrando no processo electrónico, pesquisa de morada nas bases de dados das referidas CCC e DDD

A 20/01/2020 vieram os requerentes requerer que:

a) DDD (…)
b) CCC (…)
fosse reconhecidas como herdeiras legitimárias de LL.

A 23/01/2020 foi proferido o seguinte despacho:
Constata-se que os Requerentes nada dizem quanto aos sucessores de KK, pelo que os autos, por ora, ficarão a aguardar, sem prejuízo do disposto no art.º 281.º, n.º 1, do C.P.C.

A .../.../2020 vieram os requerentes “comunicar que KK faleceu no dia .../.../2019 e de acordo com as certidões de óbito e nascimento que se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos, que nada consta relativamente à existência de descendentes, naquilo que o requerente apurou, KK não tinha filhos, nem deixou qualquer testamento a familiares ou terceiros. Pelo que, se nos afigura impossível determinar se já foi feita alguma habilitação de herdeiros, bem como partilha de herança efetuada quanto a esta interveniente. Neste sentido, deverão os autos prosseguir.”

A 06/07/2020 foi proferido despacho com o seguinte teor:

“ Vêm os autores requerer o prosseguimento dos autos, alegando KK não tinha filhos, nem deixou qualquer testamento a familiares ou terceiros, pelo que, defende ser impossível determinar se já foi feita alguma habilitação de herdeiros.
Salvo o devido respeito, não se compreende o requerido, uma vez que compete aos requerentes habilitar os herdeiros das partes falecidas para com eles prosseguir a causa.
Tal habilitação não depende da existência da uma escritura de habilitação de herdeiros, mas apenas da identificação dos herdeiros das partes falecidas.
Assim sendo, notifique o autor para, em 10 dias, indicarem os herdeiros das partes falecidas, sendo certo que caso nada diga, negligenciando o andamento dos autos, tal será tido em consideração pelo Tribunal para efeitos do cômputo do prazo a que alude o artigo 281º, nº 1 do CPC.”

A 07/09/2020 veio o requerente dizer:

“ 1. Conforme certidão de nascimento já junta aos autos, KK faleceu, no estado de solteira.
2. Desconhece de todo o modo o A., se a herdeira KK, tem ascendentes/descendentes sobrevivos, ou deixou algum testamento a favor de familiares ou terceiros, na medida em que, o aqui requerente não é familiar dessa herdeira já falecida, nem de qualquer outro/a sobrevivo/a.
3. Neste sentido, vem o requerente uma vez mais, e mui respeitosamente solicitar a V.Exa., uma vez que se afigura essencial para o prosseguimento da presente lide, que se oficiem os Registos Centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, bem como os Serviços Centrais do Registo Civil do Instituto de Registo e Notariado, no sentido de indicarem, caso existam à presente data, aos presentes autos, elementos probatórios que nos permitam concluir que existem, ou não, ascendentes, ou descendentes sobrevivos.
4. De facto, só assim será possível aferir acerca da existência, ou não de herdeiros da falecida, no sentido de se requerer a habilitação de herdeiros, identificando-os, caso existam, uma vez que, reitera-se, o requerente nem sequer é familiar de nenhuma das partes na presente lide.
5. Por fim e sem prescindir, caso V. Exa. assim entenda, solicita-se que proceda à notificação da cabeça de casal da herança indivisa, já identificada nos autos, no sentido de, também ela, juntar aos autos todos as informações ou documentos necessários, para se aferir acerca da existência, ou não de herdeiros sobrevivos.”

Por despacho de 13/10/2020 foi ordenado se oficiasse nos termos requeridos.

O Serviço de Finanças ... veio informar que não foi apresentada relação de bens, pelo que se desconhecem os herdeiros.

O IRN veio informar que não foi localizado qualquer descendente de KK.

Os requerentes foram notificados a 12/02/2021 e nada disseram.

A 27/04/2021 foi proferido o seguinte despacho:
“Os presentes autos iniciaram-se para a habilitação dos herdeiros de HH.
Na pendência dos autos, apurou-se que os herdeiros desta LL e KK também já haviam falecido.
Fizeram-se as diligências possíveis com vista a apurar dos herdeiros de LL e KK.
Assim, convida-se o autor a em 10 dias, juntar requerimento em que atualize quem pretende habilitar e os requeridos no presente incidente de habilitação e/ou, caso ainda necessite, requeira novas diligências.”

A 12/05/2021, os requerentes vieram dizer:
1. Conforme resulta dos autos KK faleceu no estado de solteira e sem filhos.
2. Tendo deixado a suceder-lhe, tanto quanto foi possível apurar os seguintes herdeiros ( todos eles requeridos nos presentes autos):
a) LL (…) (Falecido), cujos descendestes são CCC e DDD.
b) OO (…)
c) NN (…)
d) MM (…)
e) NN (…)
f) RR (….)
g) TT (…)
h) QQ (…)
i) KK de VV (…)
j) UU (…)
k) PP (…)
l) SS (…)
m) JJ (…)
3. Assim, e enquanto sucessores de uma das partes falecida nos presentes autos devem os mesmos ser habilitados, com as demais consequências.
4. Pelo que, se requer a V/ Exa. que se oficie o serviço de finanças para indicar aos autos quais as moradas atuais dos referidos herdeiros.
Sem prescindir,
5. Requer-se a V. Exa. que sejam habilitados como herdeiros legitimários de LL, nos termos do art.2133.º do CC, face a inexistência de cônjuge, ascendentes ou descendentes sobrevivos, CCC e DDD.
6. Por fim, requer-se mui respeitosamente a V/ Exa. que se oficiem os Registos Centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira no sentido de indicarem aos autos o número de identificação fiscal e atual morada fiscal de CCC e DDD, herdeiras legitimárias de LL, para que estas possam ser chamadas à presente habilitação de herdeiros, face à impossibilidade de obtenção desses dados por outra via.
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exa. entenda ter lugar, requer-se que sejam habilitados como herdeiros de KK os já identificados nas als. a) a m), bem como sejam habilitados como herdeiros de LL, as requeridas CCC e DDD, com as demais consequências legais.
Para tanto requer-se a V. Exa. que se digne a ordenar a citação de todos os Requeridos para contestar, querendo, a habitação ora requerida, no prazo e sobre as cominações legais.”

Por despacho de 19/05/2021, foi ordenada a citação das requeridas CCC e DDD nas moradas já constantes de fls. 159 e 161 do processo físico, tendo sido devolvidos, devidamente assinados, os AR’s relativos à citação das mesmas.

A .../.../2021 a requerida DDD veio informar que o falecido LL, seu pai, tinha mais um filho, de nome EEE, requerendo a sua habilitação nessa qualidade, juntando a respetiva certidão de nascimento que atesta a filiação do indicado.

Por despacho de 01/07/2021 foi ordenada a sua citação do referido VV, tendo sido devolvido devidamente assinado o AR relativo à citação do mesmo.

A 04/10/2021 foi proferido o seguinte despacho:
“Antes de mais, notifique novamente os requerentes nos exactos termos determinados na parte final do despacho de refª ...03, de 27.04.2021.
Prazo: 10 dias.”

A 18/10/2021 vieram os requerentes “reiterar o teor do requerimento apresentado por si em juízo em 12.05.2021, mais requerendo, para a eventualidade de existir algum herdeiro ainda não citado e habilitado judicialmente, que se renove a citação”.

A 25/10/2021 foi proferido o seguinte despacho:
“Regularmente notificados do despacho que antecede, os requerentes vieram reiterar o teor do requerimento apresentado por si em juízo em 12.05.2021, mais requerendo, para a eventualidade de existir algum herdeiro ainda não citado e habilitado judicialmente, que se renove a citação.
Todavia, analisado o requerimento em referência, constata-se que já foram encetadas todas as diligências ali requeridas tendo em vista a citação dos requeridos CCC, DDD e EEE, encontrando-se qualquer um deles regularmente citado para a presente habilitação de herdeiros, nada mais havendo, assim, a determinar quanto a essa matéria.
Por outro lado, nesse mesmo requerimento, os requerentes identificam outros requeridos que acrescem aos dez que vêm identificados na própria petição inicial, sem que seja junta relativamente a cada um deles qualquer prova documental que ateste a sua qualidade de herdeiro da requerida aqui falecida.
Em face do exposto, notifique os requerentes para virem identificar cabalmente cada um dos herdeiros da falecida e qual a relação de parentesco com a mesma, juntando, na medida do seu conhecimento, prova documental que ateste essa sua qualidade, pois só desse modo estará o Tribunal em condições de encetar as devidas diligências tendo em vista o chamamento de todos eles à lide.
Prazo: 10 dias.”

A 02/11/2021 vieram os requerentes “ requerer a V. Exa. o prazo não superior a 30 dias, no sentido de remeterem à lide toda a informação solicitada, uma vez que não são familiares dos demais intervenientes no processo, e por esse facto torna-se difícil reunir todos os elementos/informações/documentos que permitam a continuidade dos autos em relação a todos os sucessores.”

Por despacho de 09/11/2021 foi deferida a requerida prorrogação do prazo.

A 15/11/2021 vieram os requerentes “reiterar a identificação dos requerentes feita nos passados requerimentos já juntos aos autos, datados de 18/10/2021 e 12/05/2021, que se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos. Os Autores vêm ainda comunicar ao douto Tribunal o seguinte:
1. KK faleceu na pendência do presente Processo.
2. A mesma era herdeira de HH, cujo falecimento impulsou a habilitação de herdeiros tal como requerida na Petição Inicial, sendo sua irmã (cfr. Documento emitido pela Conservatória do Registo Civil ..., Assento de Nascimento n.º ... do ano de 2013) e tendo aliás sido chamada à presente lide.
3. É de notar que KK era herdeira de HH, uma vez que esta última faleceu solteira e sem filhos, tendo como herdeiros os seus irmãos e sobrinhos (sobrinhos estes na qualidade de herdeiros de irmãos da falecida que, entretanto, tinham também falecido), requeridos no processo e já chamados à lide na qualidade de herdeiros de HH.
4. Do mesmo modo, KK também faleceu solteira e sem filhos, tal como aliás consta igualmente dos autos.
5. Desta forma, uma vez que as ambas as irmãs faleceram solteiras e sem filhos, os herdeiros de ambas serão os mesmos seus irmãos e sobrinhos, dado que as relações de parentesco são idênticas.
6. Ora, se os herdeiros de HH já foram chamados à presente lide, a sua identificação completa e relação de parentesco com a falecida já se encontram no processo.
7. Assim, uma vez que os herdeiros de HH são exatamente os mesmos herdeiros de KK, requer-se as provas que comprovem a qualidade dos herdeiros de HH sejam também utilizadas em relação a KK, tendo em consideração os princípios da economia processual e da aquisição processual, uma vez que tais provas já se encontram reproduzidas no presente Processo.
Nestes termos e nos melhores de Direito, Requer-se a V/Exa,
Que sejam chamados à lide todos os herdeiros já requeridos no Processo em representação da também herdeira e requerida KK;
Que a prova documental constante do Processo seja bastante para atestar a qualidade de herdeiros e a sua relação de parentesco com KK.

A 07/02/2022 foi proferido o seguinte despacho:
Por despacho proferido a 25.10.2021, os requerentes foram notificados para “virem identificar cabalmente cada um dos herdeiros da falecida e qual a relação de parentesco com a mesma, juntando, na medida do seu conhecimento, prova documental que ateste essa sua qualidade”.
Para o efeito, os requerentes solicitaram a prorrogação do prazo por mais 30 dias, o que foi deferido pelo Tribunal.
Ora, não obstante o prazo concedido, os requerentes, em resposta ao convite endereçado pelo Tribunal, limitam-se a dar por reproduzidos os requerimentos datados de 18/10/2021 e 12/05/2021, ignorando que, como se deixou expresso no despacho acima referido, nesse requerimento são identificados “outros requeridos que acrescem aos dez que vêm identificados na própria petição inicial, sem que seja junta relativamente a cada um deles qualquer prova documental que ateste a sua qualidade de herdeiro da requerida aqui falecida”.
Em suma, permanece omissa a identificação cabal de cada um dos herdeiros de HH (pessoa relativamente à qual importa proceder à habilitação), não obstante a longevidade destes autos e as oportunidades já concedidas aos requerentes para clarificarem quem são os herdeiros a fim do Tribunal diligenciar pela sua habilitação, não tendo os requerentes logrado minimamente dar cumprimento ao determinado no despacho que antecede.
Pelo exposto, renova-se o despacho de 25.10.2021, concedendo-se um derradeiro prazo de 10 dias para o efeito.”

A 21/02/2022 vieram os requerentes “ informar V. Exa. que todas as provas e informações de que dispunham, comunicaram-nas aos autos atempadamente, nomeadamente no que se referem aos herdeiros de HH.
Ora, como já se disse no anterior requerimento, os herdeiros de HH são exatamente os mesmos herdeiros de KK.
De todo o modo, e uma vez que os requerentes nos presentes autos não são familiares (diretos/indiretos), nem detêm qualquer relação de afinidade com os herdeiros na presente lide, requer-se os bons ofícios a V. Exa., no sentido de, ao abrigo do princípio da cooperação e oficiosidade, notificar todos os herdeiros identificados no presente processo, para identificar cabalmente cada um dos herdeiros de HH.”

A 15/03/2022 foi proferido o seguinte despacho:
“Consigna-se que o requerente, uma vez mais, não logrou dar cumprimento ao ordenado.
Sem prejuízo das devidas ilações a retirar da conduta omissiva do requerente, previamente vão os autos com vista ao Ministério Público (que intervém nestes autos em representação dos habilitados ausentes), a fim de, querendo, requerer outras diligências para além daquelas já ordenadas, ou promover o que tiver por conveniente.”

O Ministério Púbico pronunciou-se, dizendo nada ter a promover.

A 20/04/2022 foi proferido despacho a ordenar fosse apresentado o processo físico para consulta de todos os documentos que o compõem.

A 16/05/2022 e depois de um relato das incidências processuais relevantes, foi proferida a seguinte decisão:

“Como resulta do exposto, o presente incidente tem em vista a habilitação de herdeiros da requerida HH, falecida que foi na pendência da causa principal de divisão de coisa comum.---
No decurso do incidente de habilitação, apurou-se que dois dos seus herdeiros – LL e KK – faleceram na pendência do mesmo.---
Nesta senda, caberia, pois, aos requerentes (desde logo por força do disposto no art. 342.º, n.º 1 do Código Civil) o ónus de alegar e identificar cabalmente cada um dos herdeiros das partes falecidas, de modo a serem citados para a causa e habilitados para o efeito, devendo nomeadamente instruir os autos com a informação relativa às datas do óbito, estado civil, existência ou não de descendentes ou outros herdeiros legitimários, e, quanto a estes, saber quem são e quantos são, e qual a relação de parentesco com os falecidos, a fim de determinar da legitimidade do chamamento à lide.--
Como se fez constar – e bem – no despacho proferido a .../.../2020, “compete aos requerentes habilitar os herdeiros das partes falecidas para com eles prosseguir a causa. Tal habilitação não depende da existência da uma escritura de habilitação de herdeiros, mas apenas da identificação dos herdeiros das partes falecidas”.---
Com efeito, a habilitação a modificação da instância quanto às pessoas, ou seja, a substituição de alguma das partes na relação substantiva em litígio por sucessão ou por acto entre vivos, constituindo uma excepção ao princípio da estabilidade da instância. Daí que importe apurar quem tem a qualidade legitimante da substituição da parte falecida na pendência da causa, ou antes da sua propositura, sendo o direito substantivo que estabelece quem a substitui na relação jurídica substantiva que constitui o objecto do litígio. Através do incidente de habilitação, determina-se quem assume a qualidade jurídica ou a legitimidade substantiva para ingressar na lide na posição da parte falecida
Na verdade é jurisprudência pacífica que para a dedução do incidente de habilitação basta a alegação da qualidade de sucessores, haja ou não bens na herança e tenha ou não sido indicada prova testemunhal para prova de que os nomeados são os únicos herdeiros – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 09.06.2005, processo n.º 1371/05-2, in www.dgsi.pt.---
Assim, para o requerente, a habilitação basta-se com a invocação de quem são os sucessores do de cujus – cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 08.09.2009, processo n.º 138-D/1998.C1, in www.dgsi.pt.---
Mister, é, portanto, que se proceda à identificação cabal dos sucessores, a fim de se diligenciar pela respectiva habilitação.---
Todavia, retornando aos autos aqui em apreço, é manifesto que, não obstante todas as diligências empreendidas, bem como as inúmeras oportunidades concedidas aos requerentes para virem identificar e actualizar os sucessores das partes falecidas, e mais de quatro anos volvidos desde a instauração do presente incidente, ainda não se sabe, por manifesta inércia dos requerentes, afinal, quem são os sucessores de HH (temos apenas a informação de que serão quatro irmãos e onze sobrinhos) de LL (sendo conhecidos três filhos, dos quais os requerentes apenas identificaram dois), nem se apurou de modo algum quem são os sucessores de KK, e qual a relação de parentesco dos sucessores indicados com os falecidos.---
Assim, o requerimento inicial afigura-se objectivamente incompleto, além de que o estado civil da pessoa a habilitar se encontrava incorrecto (a mesma era solteira, e não viúva, e não tinha descendentes, apesar de vir referido que tinha dois filhos).---
No requerimento apresentado a juízo em .../.../2020, vieram os requerentes informar que o falecido LL não deixara “cônjuge sobrevivo, ascendentes e descendentes”, quando, na verdade, apurou-se que o mesmo tem três filhos.---
No requerimento apresentado em juízo em 12.05.2021, os requerentes vêm fazer alusão a outros (novos) requeridos que acrescem aos dez identificados na própria petição inicial, sem que seja junta relativamente a cada um deles qualquer prova documental que ateste a sua qualidade de sucessor da falecida.---
Instados novamente a actualizar a lista de sucessores, não o fizeram até à presente data. Recorde-se que, pelo menos, nos despachos proferidos em 27.04.2021, 04.10.2021, 25.10.2021 e 07.02.2022, os requerentes foram convidados a actualizar a lista de pessoas a habilitar, procedendo à sua identificação e referindo qual a sua relação de parentesco com os falecidos. Todavia, os mesmos não deram cumprimento ao ordenado, não obstante as diversas oportunidades concedidas para o efeito, tendo optado por dar por reproduzidos anteriores requerimentos, ou a remeter para a prova documental constante do processo.---
Até que, no mais recente despacho de 07.02.2022, foi concedida uma última oportunidade aos requerentes, tendo-se concedido um “derradeiro prazo de 10 dias” para virem dar cumprimento ao ordenado.---
Ora, a tal despacho vieram os requerentes responder nos mesmos termos, por requerimento datado de 21.02.2022, invocando não serem familiares dos requeridos, nem terem com eles qualquer relação de afinidade, e requerendo a notificação de todos os herdeiros identificados no presente processo, para identificar cabalmente cada um dos herdeiros de HH---
Ora, tal diligência vai desde já indeferida.---
Efectivamente, o prazo de dez dias supra referido não se destinava aos requerentes virem pedir novas diligências de prova (as quais, aliás, têm sido sempre deferidas pelo Tribunal, precisamente com fundamento no princípio da cooperação, atentas as dificuldades alegadas), mas correspondia a um prazo de natureza peremptória, insusceptível de prorrogação, para que os requerentes viessem dar cumprimento ao ordenado pelo Tribunal desde, pelo menos, 27.04.2021, e assim cumprirem com o respectivo ónus de alegação. O princípio da oficiosidade a que os requerentes aludem no requerimento de 21.02.2022 carece em absoluto de fundamento, na medida em que, como vimos, para além de ser extemporânea a diligência requerida (podendo – e devendo – ter sido requerida logo a partir da notificação do despacho de 27.04.2021, ou em resposta aos demais convites entretanto endereçados), não cabe nas atribuições do Tribunal substituir-se às partes e diligenciar oficiosamente pela identificação dos sucessores, sendo esse um ónus que recai sobre os requerentes.---
Em suma, volvidos mais de quatro anos desde a data da instauração do incidente de habilitação de herdeiros, somos a concluir que os requerentes não deram cumprimento ao respectivo ónus de alegação que sobre si impendia de identificar quem são os sucessores das partes falecidas a fim de se proceder à respectiva habilitação.---
Ao não alegarem em qualquer factualidade relativa à identificação cabal dos sucessores – nem quando reiteradamente foram convidados pelo Tribunal para o efeito – temos assim o requerimento inicial por incompleto, insuficiente e inidóneo, que o mesmo é dizer que, ainda que não fosse contestada a matéria ali alegada, sempre a mesma seria necessariamente insuficiente para o preenchimento dos efeitos pretendidos com o presente incidente de habilitação de herdeiros.---
Ora, existirá manifesta improcedência sempre que seja inequívoco que essa argumentação de modo nenhum pode conduzir ao efeito jurídico pretendido pelo autor.-
No caso concreto, atento os pedido formulado e os seus fundamentos de facto e direito, e atento tudo quanto já se disse, verifica-se que o mesmo é manifestamente improcedente, razão pela qual se impõe julgar a acção totalmente improcedente, com as legais consequências.---
*
Em face do exposto, julga-se totalmente improcedente o incidente de habilitação de herdeiros, e, consequentemente, determina-se a absolvição dos requeridos do pedido.---“

Vieram os requerentes interpor recurso, pedindo a revogação da sentença recorrida, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

A. O tribunal a quo julgou a habilitação de herdeiros requerida, totalmente improcedente, determinando a absolvição dos requeridos do pedido.
B. Ora, não podem os Apelantes concordar com a douta sentença proferida, da qual se recorre, isto porque, e salvo o devido respeito, mal andou o tribunal a quo, fazendo uma apreciação errónea da matéria carreada para os autos, proferindo uma sentença que colide em absoluto com os princípios da cooperação, com o dever de gestão processual e agilização processual, que deve nortear a atuação dos tribunais.
C. Não obstante, e conforme se logrará demonstrar, a matéria trazida para os autos contempla todos os elementos necessários a proferir uma decisão mérito, ou seja, habilitar sucessores indicados.
D. Ora, no requerimento inicial, os Apelantes, na medida do seu conhecimento, e tendo sempre presente que não são familiares, nem conheciam a falecida HH indicaram no requerimento inicial dez herdeiros, a saber:
a) KK;
b) LL;
c) MM;
d) NN;
e) JJ;
f) CC;
g) OO;
h)PP;
i) KK;
j) QQ.
E. Ora, em 10-07-2017, foi apresentado pelos Apelantes novo requerimento com ref.ª ...88, no qual informam os autos que foi apresentado imposto de selo por óbito de HH, tal imposto encontra-se junto aos autos, mais foi requerido pelos Apelantes que fosse notificada NN, com NIF ..., para na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa com NIF ..., assumir o cargo e proceder à habilitação de herdeiros.
F. Sucede que, em 18-12-2017, foi apresentado por NN, na qualidade de cabeça de casal, um requerimento indicando que HH faleceu no estado de solteira, tendo deixado a suceder-lhe como seus únicos e universais herdeiros quatro irmãos e onze sobrinhos.
G. Sucede que, NN, não indica quem são os sucessores, nem apresenta qualquer prova daquilo que alega.
H. Sendo que, por requerimento com ref. ª...64, os Apelantes requereram que a mesma indicasse aos autos quem eram afinal os sucessores de HH. Contudo, o douto tribunal não atendeu ao peticionado.
I. Volvidos alguns anos, em 23-01-2020, foi aberta conclusão, com ref.ª ...88, tendo o tribunal a quo referido o seguinte:
“Constata-se que os Requerentes nada dizem quanto aos sucessores de KK, pelo que, por ora, ficarão a aguardar, sem prejuízo do disposto no art.281º, nº1 do CPC.”
J. Face ao que antecede, os Apelantes apresentaram requerimento com ref.ª ...37, indicando aos autos, na medida do que lhes foi possível identificar que KK, não tinha filhos nem deixou qualquer testamento a favor de familiares ou terceiros.
K. Ora, em 06-07-2020 foi proferida conclusão, com ref.ª ...93, tendo os Apelantes, em resposta, requerido, caso assim fosse o entendimento do douto tribunal a quo, que fosse notificada a cabeça de casal da herança a fim de se indicar os sucessores da falecida. Mas não, o douto tribunal a quo não atendeu ao peticionado.
L. Por documento junto aos autos, pela Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 27-10-2020 pode ler- se o seguinte: “KK – NIF ..., (…) até à presente data, não foi feita relação de bens pelo que ainda não
foi criado nif da herança, desconhecendo ainda quais são os herdeiros.”
M. Ademais em 11-02-2021,foi endereçado um email pelo Instituto dos Registos e Notariado ao Tribunal Judicial ..., no qual se pode ler o seguinte: “Em resposta ao solicitado no v/ ofício acima mencionado, informo que feitas as pesquisas ao SIRIC (Sistema integrado de Registo e Identificação Civil) não foi localizado qualquer descendente da cidadã KK”.
N. Assim, os Apelantes por requerimento com ref.ª ...72, vieram indicar aos autos, na medida do que lhes foi possível apurar que KK (irmã de HH), faleceu no estado de solteira e sem filhos, identificando os seus sucessores.
O. Ora, os Apelantes deram por reiterado o requerimento apresentado em 12-05-2021, o qual dava resposta na íntegra ao solicitado pelo douto tribunal, mais requerendo que, na eventualidade de existir algum herdeiro ainda não citado e habilitado, que se renovasse a citação.
P. Uma vez mais, em 25-10-2021, mediante despacho com ref.ª ...98, profere o seguinte“… notifique os requerentes para virem identificar cabalmente cada um dos herdeiros da falecida e qual a relação de parentesco com a mesma, juntando na medida do seu conhecimento, prova documental que ateste essa qualidade.”
Q. Ora, não se compreende o teor do despacho que antecede, isto porque, os herdeiros de HH já haviam sido identificados, no requerimento inicial do processo, tendo o rol de habilitados sido completado em requerimentos subsequentes.
R. Além disso, de esclarecer que os Requeridos que acrescem aos dez indicados na petição inicial são os sucessores de MM, que faleceu na pendência destes autos, sendo que dos autos conta certidões de nascimento destes requeridos, tendo até os mesmos sido notificados.
S. Ademais, reforçamos que os sucessores de HH já foram devidamente notificados, ou seja, já foram chamados à lide, e não apresentaram contestação.
T. Mais consta dos autos prova bastante e inequívoca de cada um dos sucessores, nomeadamente, certidões de nascimento e imposto de selo da herança com NIF ....
U. Pelo que, não se consegue destrinçar o que pretendia o douto tribunal a quo quando solicita a identificação cabal de quem se pretendia habilitar, quando já há muito que tinha sido junta aos autos a identificação completa dos sucessores de HH.
V. Não obstante, e face ao decurso do tempo que é longo, não deixando nunca de ter presente que este processo se iniciou em 19-05-2017, os Apelantes, de modo a elucidar o douto tribunal a quo, mediante requerimento com ref.ª ...37 vieram indicar uma vez mais aos autos quem pretendiam habilitar, e quem pretendiam habilitar seriam os sucessores de HH, os sucessoresde KK (identificando-os cabalmente)e os sucessores de MM (identificando-os), os quais faleceram na pendência do incidente de habilitação.
W. Uma vez mais os requerentes por requerimento com ref.ª ...67 vieram informar o tribunal que todas as provas que disponham já tinham sido juntas aos autos, designadamente, no que serefere aos herdeiros de HH
X. De facto, não se consegue alcançar o que pretendia o douto tribunal a quo com o último despacho apresentado, quando bem se sabe que os herdeiros de HH já haviam sido identificados e que há prova documental bastante junta aos autos.
Y. Porquanto, e salvo o devido respeito, também não se concebe que o tribunal volvido cinco anos desde a instauração do incidente de habilitação conclua que o requerimento inicial é incompleto, insuficiente e inidóneo.
Z. Vejamos ainda que, em 10-07-2017, foi apresentado pelos Apelantes um novo  requerimento com ref.ª ...88, requerendo que fosse notificada NN, com NIF ..., para na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa com NIF ..., assumir o cargo e proceder à habilitação de herdeiros.
AA. E qual foi o entendimento do douto tribunal quanto a esta parte, fazer tábua rasa quanto ao peticionado.
BB. Sendo certo, que na qualidade de cabeça de casal NN, estaria em melhores condições do que os Apelantes, que não conheciam diretamente os sucessores, para identificar o grau de parentesco de cada um dos requeridos na habilitação.
CC. Mas não, o douto tribunal a quo não logrou dar cumprimento ao requerido, sendo certo que se o tivesse feito, diligenciando pelo chamamento da cabeça de casal à lide, solicitando-lhe a completa relação do grau de parentesco dos requeridos, a causa já estaria decidida, e os autos não atingiriam esta grutesca longevidade.
DD. Contudo, e salvo o devido respeito, o tribunal a quo optou por não observar os deveres de simplificação e agilização processual, tendo durante cinco anos, optado pelo jogo de despachos e requerimentos, cujo desfecho foi apenas e só a absolvição dos requeridos do pedido.
EE. Vejamos que, o princípio da cooperação, deve ser observado por parte de cada um dos “intervenientes processuais em relação aos outros e deve ser exigida pelo juiz em relação a todos, a começar por si próprio, o que tem desde logo a vantagem da pedagogia. (Cfr. Código de Processo Civil e António Martins, in Código de Processo Civil, Comentários e Anotações Práticas, 2103, pág. 21).
FF. Entendem ainda que, “o dever de boa gestão processual implica para o juiz, a obrigação (…) de garantir o resultado do “andamento célere” do processo, se for o caso adotando ”mecanismos de simplificação e agilização processual” com vista a, em “prazo razoável”, o tribunal decidir da “justa composição do litígio” (Cfr. Código de Processo Civil e António Martins, in Código de Processo Civil, Comentários e Anotações Práticas, 2013, pág. 20.)
GG. Deste modo, na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.
HH. Este princípio é fundamental à dinâmica do processo e está intimamente ligado ao dever de gestão processual de que fala o artigo 6º do CPC.
II. Assim, sobre o Tribunal a quo impedia um poder-dever de auxílio das partes, poder este que se consubstancia no dever de auxiliar as partes na remoção das dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades ou no cumprimento dos seus ónus ou deveres processuais, tal como decorre do disposto no art.7º, nº4 do CPC, encontrando-se uma concretização deste dever no art.418.º, n.º 1, quanto à obtenção de informações na posse de serviços administrativos.
JJ. Neste contexto, é possível concluir que, atento o estatuído no art.º 7º do CPC, perante as dificuldades com que se deparava para identificar os herdeiros da falecida, o tribunal recorrido estava obrigado  pelo dever de colaboração / cooperação com as partes a auxiliar os Apelantes na obtenção dos elementos em falta.
KK. Vejamos, o mais recente entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa, segundo o qual “O cumprimento do ónus de promover a habilitação pressupõe que o   requerente identifique os sucessores do falecido, o que, as mais das vezes, não constituirá matéria acessível à parte contrária, pelo que a intervenção de auxílio do tribunal para suprir essa dificuldade constitui expressão do dever de cooperação. Invocando o exequente o desconhecimento dos herdeiros e o sigilo fiscal como obstáculo à obtenção das informações necessárias para a dedução do incidente de habilitação, deve ser deferida a sua pretensão no sentido de ser o Tribunal a diligenciar pela prestação das informações pertinentes, atento o princípio da cooperação consagrado no art. 7º do Código de Processo Civil, na vertente do dever de auxílio às partes, ao que não obsta o regime da suspensão da instância por não estar em causa a prática de actos com repercussão directa na tramitação processual da lide.” – Ac. da Relação de Lisboa de 25-05-2021.
LL. Neste sentido, consideramos que o tribunal a quo, para além de violar o princípio da cooperação, violou de igual modo os deveres de agilização, simplificação, e gestão processual, adotando, portanto, uma conduta que não se compadece com o processo judicial.
MM. Os princípios da gestão e da adequação processual e, bem assim, da cooperação, conjugados ainda com o dever de boa fé processual, devem reger todo o desenvolvimento do processo até que este chegue ao seu termo, sempre na perspetiva de que venha a ser proferida uma decisão de mérito que resolva a questão litigiosa introduzida em juízo pelas partes.
UU. A verdade é que o Tribunal “a quo” adotou determinado caminho processual que apontava num certo sentido e depois, ininteligivelmente, andou para trás sem qualquer justificação plausível.
VV. Temos para nós que a confiança que a parte deposita nos atos praticados pelo juiz e em função dos quais definiu a sua atuação processual, tem de ser tutelada, sob pena de infração de princípios processuais tão relevantes como são a da boa-fé ou da cooperação processual.
WW. Sendo que, no caso, verifica-se que o Tribunal a quo ao ter adotado a posição  que adotou ao longo de todo o processo, tendo notificado as partes, dando-lhes conhecimento no sentido da prática de atos processuais que pretendia e levou a cabo, criou a convicção nos Apelantes de que iria proferir uma decisão definitiva e fundamentada, ou seja, mais nenhum outro resultado se esperava do que a habilitação dos herdeiros.
XX. Deste modo, o Tribunal inculcou a ideia/ convicção/ confiança nos Apelantes de que o Requerimento Inicial era adequado, apto, idóneo para o efeito.
YY. A pronúncia do juiz a quo em sentença, sustentando incompletude e inidoneidade do Requerimento Inicial, com a consequente absolvição dos Requeridos do pedido, constituiu por parte do douto Tribunal a quo uma denegação do direito à tutela jurisdicional, impossibilitando desse modo aos Apelantes o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos – art.º 20.º n.º 1 da CRP.
ZZ. Assim, somos de concluir que face ao que foi decidido na sentença de que ora se recorre, existe uma clara e inequívoca violação da legítima proteção da confiança dos Apelantes, pois que tal decisão, como se viu, contraria a atuação anterior do Tribunal, sendo que foi essa atuação que justificou aquela confiança.
AAA.   Não tendo assim sucedido porque o Tribunal, ao invés de ter enveredado por esse caminho, optou por “impulsionar o processo”, criando, dessa forma, a convicção que o mesmo se encontrava a prosseguir os seus regulares termos não pode aquele, mais tarde e contraditoriamente com o comportamento anteriormente assumido, vir atribuir relevância a uma omissão à qual, no momento próprio nenhuma relevância atribuiu.
BBB.   Com efeito, traduzindo-se o princípio do processo equitativo, na dimensão do justo processo, além do mais, na confiança dos interessados ou dos sujeitos processuais nas decisões de conformação ou de orientação do processo, mal se compreenderia que aqueles pudessem ser surpreendidos, como o foram os Apelantes, por consequências processuais desfavoráveis com as quais, por força do próprio comportamento do tribunal, não podiam razoavelmente contar.

Contra alegou o Ministério Público que depois de referir o principio da auto responsabilidade das partes e que que não  cabe ao Tribunal substituir-se às partes nas diligências tendentes à realização dos seus direitos e ao cumprimento dos respectivos ónus, conclui que o requerimento inicial é insuficiente e inidóneo para o preenchimento dos efeitos pretendidos com o presente incidente de habilitação de herdeiros, ainda que não fosse contestada a matéria ali alegada, devendo o recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

2. Questões a decidir

O objecto do recurso, é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.

A questão a decidir é se a decisão recorrida violou o principio da cooperação e os princípios constitucionais da tutela da confiança, da tutela jurisdicional efectiva e do acesso à justiça.

3. Fundamentação de facto
Os factos a considerar são os que constam do Relatório

4. Fundamentação de direito
4.1. Enquadramento jurídico
Tendo em vista a decisão do presente recurso, impõe-se analisar, ainda que de forma breve, o incidente de habilitação de herdeiros, concretamente a função e a causa de pedir.

Mas o presente recurso também convoca alguns dos princípios enformadores do processo civil, a partir dos quais se organiza e estrutura o processo civil, estando na base de soluções normativas e que se deviam projectar na solução de problemas concretos, o que nem sempre sucede como é manifestamente o caso dos autos.

- Da habilitação de herdeiros -
Como decorre do disposto na alínea a) do art.º 262º do CPC, a instância pode modificar-se, quanto às pessoas, em consequência da substituição de alguma das partes, nomeadamente por sucessão, na relação substantiva em litígio, o que constitui uma excepção ao principio da estabilidade da instância consagrado no art.º 260º do CPC.

Tal substituição por sucessão opera através do incidente de habilitação de herdeiros, cuja regra geral consta do n.º 1 do art.º 351º, o qual dispõe:
1 - A habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa, para com eles prosseguirem os termos da demanda, pode ser promovida tanto por qualquer das partes que sobreviverem como por qualquer dos sucessores e deve ser promovida contra as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido que não forem requerentes.

A habilitação pode ser notarial ou judicial. É a última que aqui está em causa e a que nos referiremos.

A habilitação dos sucessores da parte falecida visa o prosseguimento da causa com eles e não a atribuição da titularidade da relação material controvertida aos mesmos.

A expressão “sucessores” tem um significado mais amplo que o conceito de herdeiros a que alude o artigo 2133º do CC, na medida em que abrange todos os que segundo o direito substantivo sucederam ao falecido na titularidade do direito ou das obrigações objecto da causa, podendo incluir legatários, a própria herança, como herança jacente, nos casos em que a mesma ainda não foi aceita ( art.º 355º n.º 4 do CPC) e, em vez de herdeiros certos, herdeiros incertos ( art.º 355º n.º 1 do CPC)

E por isso se afirma na decisão recorrida:
“Daí que importe apurar quem tem a qualidade legitimante da substituição da parte falecida na pendência da causa, ou antes da sua propositura, sendo o direito substantivo que estabelece quem a substitui na relação jurídica substantiva que constitui o objecto do litígio. Através do incidente de habilitação, determina-se quem assume a qualidade jurídica ou a legitimidade substantiva para ingressar na lide na posição da parte falecida.”

O incidente é deduzido contra as partes sobrevivas e os sucessores que se pretende sejam habilitados, que não sejam requerentes.

Os factos essenciais constitutivos da causa de pedir são: a) os factos consubstanciadores da legitimidade dos requerentes; b) a identificação da parte falecida, data do óbito e estado civil em que faleceu; c) identificação dos sucessores- todos os sucessores - em que se inclui, tratando-se de alguma pessoa que integre alguma das categorias a que se referem as alíneas a) a d) do n.º 1 do art.º 2133º do CC, a indicação do grau de parentesco, pois este é determinante para aferir se a pessoa chamada tem a qualidade de sucessor, sendo certo que, como decorre do mesmo normativo, os sucessores são chamados por determinada ordem de prioridade, sendo portanto essencial que não existam outras pessoas que prefiram aos indicados, na sucessão.

Assim, cabe aos requerentes da habilitação alegar ( art.º 5º n.º 1 do CPC) e provar (342º n.º 1 do CC) os factos que permitam concluir que os habilitando são titulares prioritários da vocação sucessória.

Entretanto, se na pendência do incidente se apurar o falecimento de um dos habilitandos, deverá o requerente aduzir os factos constitutivos da nova sucessão por articulado superveniente, cumulando-se a segunda habilitação com a primeira por razões de economia processual (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC Anotado, I, 4ª edição, pág. 694).

- Direito de acesso aos tribunais -
A CRPortuguesa, no seu art.º 20º n.º 1, garante a todos «o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (…)».

Mas não é suficiente a consagração legal do direito de acção e defesa.

É necessário que seja assegurada uma tutela jurisdicional efectiva, principio contido nos n.ºs 4 e 5 do art.º 20º da CRPortuguesa, o qual se desdobra em vários direitos, sendo um deles o direito ao processo e a um processo equitativo, como consagra o n.º 4 do art.º 20º da mesma CRP.

O direito ao processo, conjugado com o direito à tutela jurisdicional efectiva impõe a prevalência da justiça material sobre a justiça formal, isto é, sobre uma pretensa justiça que, sob a capa de “requisitos processuais”, se manifeste numa decisão que, afinal, não consubstancia mais de que uma denegação de justiça. (Rui Medeiros, CRP Anotada, Universidade Católica Editora, Volume I, anotação ao art.º 20º, pág. 321, sublinhado nosso).

O direito a um processo equitativo impõe, antes de mais, normas processuais que proporcionem aos interessados meios efectivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialéctica que elas protagonizam no processo. Um processo equitativo postula, por isso, a efectividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas (aut. e ob. cit., pág. 322-323).

Mas é, também, um principio interpretativo das normas.

- Principio do dispositivo –
O principio do dispositivo, traduz-se na liberdade de decisão sobre a instauração do processo e, sobre a conformação do seu objecto (pedido e causa de pedir) e das partes na causa e sobre o termo do processo.

Ao autor cabe solicitar a tutela jurisdicional, sem que o tribunal se lhe possa substituir nesse impulso processual inicial ( art.º 3º n.º 1 do CPC).

No âmbito da conformação do objecto da causa, às partes e só às partes, cabe alegar os factos principais que integram a causa de pedir e as excepções, alegação essa que é feita nos articulados, como dispõe o art.º 147º n.º 1 do CPC.

As partes têm o ónus, têm a responsabilidade de alegar os factos principais, sob pena de não o fazendo sofrerem as consequências que em concreto couberem.

Mas o tribunal deve convidar as partes ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido ( art.º 590º n.º 4 do CPC).

Não podendo substituir as partes na alegação de factos principais, à parte convidada cabe apresentar novo articulado em que complete ou corrija o inicialmente produzido.

Caso não o faça, serão aplicáveis as consequências que ao caso couber, nomeadamente a improcedência do pedido por insuficiência de factos para julgar como correspondendo ao Direito a pretensão deduzida.

- Principio da autorresponsabilidade das partes -
Como referiu Manuel de Andrade, «As partes é que conduzem o processo por sua conta e risco. Elas é que têm de deduzir e fazer valer os meios de ataque e de defesa que lhes correspondam (incluindo as provas), suportando uma decisão adversa, caso omitam algum. A negligência ou inépcia das partes redunda inevitavelmente em prejuízo delas porque não pode ser suprida pela iniciativa e actividade do juiz. É patente a conexão deste princípio com o dispositivo» (Noções Elementares de Processo Civil. Coimbra Editora/1979, pág. 378)

Para Castro Mendes, «Estreitamente ligado ao princípio dispositivo está o da auto-responsabilidade das partes. Na medida em que o juiz está vinculado às alegações concordes ou incontestadas, ou a ausência de alegações, das partes, são estas que são responsáveis pelo resultado probatório e pelo conteúdo da decisão» (Do Conceito de Prova em Processo Civil. Edições Ática, 1961, pág. 162).

Por sua vez Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, 3ª edição, 182-183, refere que «A auto-responsabilidade da parte exprime-se na consequência negativa (desvantagem ou perda de vantagem) decorrente da omissão do acto»

- Principio da cooperação -
O principio da cooperação está plasmado no n.º 1 do art.º 7º do CPC, onde se dispõe que na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.

Lebre de Freitas, in Introdução.., pág. 186 refere:
“ Partes e juízes devem cooperar para que o processo realize a sua função em prazo razoável (“para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litigio”: art.º 7-1). O apelo à realização da função processual aponta para a cooperação dos intervenientes no processo no sentido de nele se apurar a verdade sobre a matéria de facto e, com base nela, se obter a adequada decisão de direito. O apelo ao prazo razoável aponta para a sua cooperação no sentido de, sem dilações inúteis, proporcionarem as condições para que essa decisão seja proferida no menor período de tempo compatível com as exigências do processo (…). No primeiro sentido falar-se-á em cooperação em sentido material; no segundo duma cooperação em sentido formal.”

Uma das expressões do referido principio em sentido formal está plasmada no n.º 4 do mesmo normativo, o qual dispõe que sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo.

Um dos âmbitos em que tal se verifica são as habilitações de herdeiros, se o requerente do incidente invocar dificuldade séria na identificação dos herdeiros ou em provar a qualidade destes, deve o juiz notificar o co-réu ou um terceiro familiar do falecido para que preste as informações necessárias á observância do ónus de requerer a habilitação (Lebre de Freitas, Introdução…pág. 190 e em sentido idêntico Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, in CPC Anotado, 2ª edição, pág. 37).

Miguel Teixeira de Sousa, in Omissão do Dever de Cooperação do Tribunal. Quais as consequências?, consultável in https://www.academia.edu/10210886/TEIXEIRA_DE_SOUSA_M_Omiss%C3%A3o_do_dever_de_coopera%C3%A7%C3%A3o_do_tribunal_que_consequ%C3%AAncias_01_2015_ refere que “ O dever de cooperação do tribunal (trata-se, na realidade, de um poder-dever ou de um dever funcional) destina-se a incrementar a eficiência do processo, a assegurar a igualdade de oportunidades das partes e a promover a descoberta da verdade”.

E mais adiante refere ainda:
“Da função assistencial que é inerente ao dever de cooperação do tribunal decorrem ainda algumas outras consequências. Assim, são irrelevantes os motivos pelos quais a parte exerceu deficientemente ou mesmo omitiu o exercício de um desses poderes: o tribunal não tem de se preocupar com a circunstância de essa deficiência ou omissão se ficar a dever a uma eventual negligência da parte, dado que, mesmo que esta exista, o tribunal tem o dever de exercer a sua função assistencial. Dessa função decorre ainda que o dever de cooperação do tribunal deve ser exercido perante qualquer das partes, sem atender se, no processo pendente, ela é uma parte “forte” ou uma parte “fraca”.

Mas consigne-se que o principio da cooperação não pode servir para suprir a preclusão de direitos processuais das partes, substituindo-se o juiz á parte na prática de dado acto que cabia á parte praticar, sob pena de violação do principio do dispositivo, da preclusão, da autorresponsabilidade das partes, da igualdade das partes e do dever de imparcialidade do juiz.

- Principio da economia processual –
O resultado processual deve ser atingido com a maior economia de meios.
Esta economia de meios exige que cada processo resolva o maior número possível e litígios (economia de processos) e comporte só os atos e formalidades indispensáveis ou úteis (economia de atos e formalidades) ( cfr. Manuel de Andrade in Noções…, pág. 371. Para as manifestações deste principio, Lebre de Freitas, Introdução…, pág. 203-223)

- Principio da gestão processual –
Uma vez instaurado cabe ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável ( art.º 6º n.º 1 do CPC), nomeadamente, cabe ao juiz providenciar oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo ( art.º 6º n.º 2 do CPC).

4.2. Em concreto
A decisão recorrida assenta, essencialmente, no seguinte:
“ Nesta senda, caberia, pois, aos requerentes (desde logo por força do disposto no art. 342.º, n.º 1 do Código Civil) o ónus de alegar e identificar cabalmente cada um dos herdeiros das partes falecidas, de modo a serem citados para a causa e habilitados para o efeito, devendo nomeadamente instruir os autos com a informação relativa às datas do óbito, estado civil, existência ou não de descendentes ou outros herdeiros legitimários, e, quanto a estes, saber quem são e quantos são, e qual a relação de parentesco com os falecidos, a fim de determinar da legitimidade do chamamento à lide.--
(…)
Todavia, retornando aos autos aqui em apreço, é manifesto que, não obstante todas as diligências empreendidas, bem como as inúmeras oportunidades concedidas aos requerentes para virem identificar e actualizar os sucessores das partes falecidas, e mais de quatro anos volvidos desde a instauração do presente incidente, ainda não se sabe, por manifesta inércia dos requerentes, afinal, quem são os sucessores de HH (temos apenas a informação de que serão quatro irmãos e onze sobrinhos) de LL (sendo conhecidos três filhos, dos quais os requerentes apenas identificaram dois), nem se apurou de modo algum quem são os sucessores de KK, e qual a relação de parentesco dos sucessores indicados com os falecidos.---
Assim, o requerimento inicial afigura-se objectivamente incompleto, além de que o estado civil da pessoa a habilitar se encontrava incorrecto (a mesma era solteira, e não viúva, e não tinha descendentes, apesar de vir referido que tinha dois filhos).---

No requerimento inicial os requerentes indicaram que HH faleceu no estado de viúva e deixou “dois filhos“, muito embora, depois, sejam referidas 10 pessoas.

O desenvolvimento dos autos, caótico, sem uma linha condutora lógica e coerente, quer em função do que foi sendo requerido pelos requerentes, quer em função do que foi sendo determinado pelo tribunal, revelam que:
- HH faleceu no estado de solteira, como resulta da impressão do assento de óbito da mesma, que se encontra a fls. 7 do processo físico,  ordenada juntar pelo tribunal;
- as pessoas indicadas pelos requerentes não são filhos da falecida, como desde logo informou, diligentemente, a secretaria do tribunal recorrido, na conclusão aberta a 01/06/2017 e a cabeça de casal da herança aberta por óbito daquela, NN, a .../.../2017, dizendo que a falecida deixou quatro irmãos e onze sobrinhos.

Além disso, a 15/11/2017 o Serviço de Finanças ... remeteu aos autos informação da qual resulta que os herdeiros da falecida são 15 – o que confirma a afirmação da cabeça de casal -, mas não diz qual o grau de parentesco e nomeadamente quais deles são irmãos e quais deles são sobrinhos, o que releva, tendo em consideração a ordem estabelecida no art.º 2133º do CC.

Desde logo se impõe observar que tendo em consideração a informação do SF, o principio da gestão processual plasmado no art.º 6º n.º 1 do CPC impunha que o tribunal a quo tivesse ordenado a notificação de NN, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, para vir indicar quem eram os herdeiros da mesma e o respectivo grau de parentesco.

E em função das informações que a mesma prestasse, fosse proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento inicial, pois já então se vislumbrava que o mesmo estava incompleto – indicava 10 sucessores, quando no imposto de selo os sucessores eram 15.

Porém e ao invés, a 24/11/2017 foi proferido despacho a ordenar a citação, desenvolvendo-se, a partir daí, um processado distante dos princípios da  tutela jurisdicional efectiva, da cooperação, da gestão processual e da economia processual.

Ainda no desenvolvimento dos autos apurou-se o falecimento de dois dos habilitandos indicados no requerimento inicial - LL e KK – tendo o tribunal, por despacho de .../.../2019 notificado os requerentes para requererem o que tivessem por conveniente.

Relativamente a LL, falecido a .../.../2017 e abreviando caminho, resulta do desenvolvimento dos autos que o mesmo deixou três filhos – CCC, DDD e EEE, os quais foram os três citados para o presente incidente de habilitação.

Relativamente a KK falecida a .../.../2019, o desenvolvimento do processo revela-se incoerente.

Assim a .../.../2019 foi proferido despacho onde consta que FFF faleceu e a ordenar a notificação dos requerentes para requererem o que tivessem por conveniente.

Os requerentes, nada disseram

A 09/09/2019 foi ordenado que os autos aguardassem que os requerentes dessem cumprimento à parte final do despacho de .../.../2019 e que fossem notificados que os autos aguardavam nos termos do disposto no art.º 281.º, n.º 1, do C.P.C.

A 10/09/2019 vieram os requerentes requerer fossem notificados o Serviço de Finanças ..., no sentido de juntar aos autos o imposto sucessório por falecimento de KK e LL e a Conservatória do Registo Civil ..., no sentido de juntar aos autos a habilitação de herdeiros de KK e ainda as certidões de nascimento/óbito da mesma.

Por despacho de 12/09/2019 foi ordenado que se cumprisse como requerido.

A CRCivil veio informar que não tem no seu arquivo as habilitações de herdeiros por óbito KK e LL e não consta do assento de óbito menção á mesma.

E o Serviço de Finanças ... veio dizer que não foram apresentadas relações de bens por óbito daqueles.

Os requerentes impulsionaram o processo relativamente à sucessão de LL, mas não quanto à falecida KK.

Assim, a 23/01/2020 foi proferido despacho que constata tal facto e determina que os autos aguardem nos termos do disposto no art.º 281º n.º 1 do CPC.

A .../.../2020 vieram os requerentes “comunicar que KK faleceu no dia .../.../2019 e de acordo com as certidões de óbito e nascimento que se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos, que nada consta relativamente à existência de descendentes, naquilo que o requerente apurou, KK não tinha filhos, nem deixou qualquer testamento a familiares ou terceiros. Pelo que, se nos afigura impossível determinar se já foi feita alguma habilitação de herdeiros, bem como partilha de herança efetuada quanto a esta interveniente. Neste sentido, deverão os autos prosseguir.”

A 06/07/2020, foi proferido despacho em que, consignando que o que relevava era identificar os herdeiros, ordenou a notificação do requerente para indicar os herdeiros das partes falecidas.

A 07/09/2020 veio o requerente dizer que desconhecia se KK tinha deixado herdeiros, na medida em que não é da família da mesma, requerer diligências junto dos “Registos Centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, bem como os Serviços Centrais do Registo Civil do Instituto de Registo e Notariado “, no sentido de indicarem elementos probatórios que permitam concluir que existem, ou não, ascendentes, ou descendentes sobrevivos e caso o tribunal o entendesse, requerendo que fosse notificada a “cabeça de casal da herança indivisa, já identificada nos autos, no sentido de, também ela, juntar aos autos todos as informações ou documentos necessários, para se aferir acerca da existência, ou não de herdeiros sobrevivos.”

Por despacho de 13/10/2020 foi ordenado se oficiasse nos termos requeridos.

Olvidaram os requerentes e olvidou o tribunal que na sequência do requerido pelos requerentes a 10/09/2019 e do despacho de 12/09/2019 já haviam sido realizadas diligências tendentes a averiguar os herdeiros de KK junto da CRCivil e do Serviço de Finanças ..., sem sucesso.

Destarte as diligências requeridas e ordenadas eram inúteis, tanto assim que o Serviço de Finanças ... veio informar que não foi apresentada relação de bens, pelo que se desconhecem os herdeiros e o IRN veio informar que não foi localizado qualquer descendente de KK.

Mas, além disso, não houve qualquer pronúncia quanto á requerida notificação da cabeça de casal da herança indivisa, já identificada nos autos, ou seja, à notificação de NN, cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, identificada no oficio do Serviço de Finanças de 15/11/2017.

E com isto omitiu-se uma diligência essencial para desbloquear o andamento dos autos, inclusive em relação aos sucessores de HH.

Como ficou referido em sede de enquadramento jurídico e concretamente aquando da apreciação do principio da cooperação, quando a parte a quem cabe o ónus de deduzir e impulsionar a habilitação de herdeiros invoca - ou é patente, face ao teor dos autos - a dificuldade séria na identificação dos sucessores  ou em provar a qualidade destes – e esta questão coloca-se nos autos, pois muito embora o oficio do Serviço de Finanças de 15/11/2017 identifique os sucessores, não indica o grau de parentesco - e, notificadas as entidades administrativas, as mesmas não têm elementos que permitam essa identificação ou a qualidade dos mesmos, a solução que resta é a notificação de  um familiar do falecido, desde que seja conhecido e mesmo que não seja parte nos autos, para que preste as informações necessárias á realização da finalidade da habilitação.

E no caso dos autos, mesmo que não tivesse sido requerida, como foi, sendo conhecida a existência daquele cabeça de casal, devia o Sr. Juiz a quo ter providenciado pela sua notificação, pois, nos termos do n.º 1 do art.º 6º do CPC, cumpre-lhe dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação.

E isto é assim independentemente de os requerentes, notificados a 12/02/2021 das diligências junto do SF e do IRN, nada terem dito.

Retomando a sequência, a 27/04/2021 foi proferido despacho a convidar o requerente a juntar requerimento em que atualize quem pretende habilitar e os requeridos no presente incidente de habilitação e/ou, caso ainda necessite, requeira novas diligências.”

Se por um lado, tendo em consideração o desenvolvimento dos autos relativamente à habilitação dos sucessores de HH, o sentido deste despacho é claro – que, em face aos elementos entretanto surgidos no processo, o requerente elencasse, de forma actualizada, quem eram, afinal, os sucessores da parte que tinha dado causa à dedução do incidente, ou seja, HH -, por outro lado constitui um desenvolvimento processual descontextualizado, pois o que por último vinha sendo objecto dos autos era estabelecer os sucessores de KK e LL.

Recorde-se que, como ficou referido no enquadramento jurídico e concretamente na parte relativa à habilitação de herdeiros, se na pendência do incidente se apurar o falecimento de um dos habilitandos, deverá o requerente aduzir os factos constitutivos da nova sucessão por articulado superveniente, cumulando-se a segunda habilitação com a primeira por razões de economia processual (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC Anotado, I, 4ª edição, pág. 694).

E por isso se compreende que a 12/05/2021, os requerentes tenham vindo indicar as pessoas que no seu entendimento consideravam ser os sucessores de KK e de LL e que fossem os mesmos habilitados nessa qualidade.

A 19/05/2021 foi proferido despacho em que foi ordenada a citação das pessoas indicadas como sucessoras de LL.
           
Mas o tribunal não se pronunciou quanto ás pessoas indicadas como sucessoras de KK.

E não só não se pronunciou, como a 04/10/2021 proferiu despacho a ordenar a notificação dos requerentes “nos exactos termos determinados na parte final do despacho de refª ...03, de 27.04.2021.”, ou seja, “juntar requerimento em que atualize quem pretende habilitar e os requeridos no presente incidente de habilitação e/ou, caso ainda necessite, requeira novas diligências.”, despacho este que surge  descontextualizado, pois o que por último vinha sendo objecto dos autos era estabelecer os sucessores de KK e LL.

E por isso, a 18/10/2021 vieram os requerentes “reiterar o teor do requerimento apresentado por si em juízo em 12.05.2021, mais requerendo, para a eventualidade de existir algum herdeiro ainda não citado e habilitado judicialmente, que se renove a citação”.

Recorde-se que neste requerimento, os requerentes tenham vindo indicar as pessoas que no seu entendimento consideravam ser os sucessores de KK e que fossem os mesmos habilitados nessa qualidade.

A 25/10/2021 foi proferido despacho em que se considerou que “já foram encetadas todas as diligências ali requeridas tendo em vista a citação dos requeridos CCC, DDD e EEE, encontrando-se qualquer um deles regularmente citado para a presente habilitação de herdeiros, nada mais havendo, assim, a determinar quanto a essa matéria” e ordena a “notificação dos requerentes para virem identificar cabalmente cada um dos herdeiros da falecida e qual a relação de parentesco com a mesma, juntando, na medida do seu conhecimento, prova documental que ateste essa sua qualidade, pois só desse modo estará o Tribunal em condições de encetar as devidas diligências tendo em vista o chamamento de todos eles à lide.”

Mais uma vez se olvidou que o que por último vinha sendo objecto dos autos e não estava resolvido era estabelecer os sucessores de KK.

E por isso a 15/11/2021 vieram os requerentes “reiterar a identificação dos requerentes feita nos passados requerimentos já juntos aos autos, datados de 18/10/2021 e 12/05/2021, que se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos. “

Além disso, os requerentes vieram ainda dizer que KK faleceu solteira e sem filhos, era herdeira de HH, por ser sua irmã, uma vez que as ambas as irmãs faleceram solteiras e sem filhos, os herdeiros de ambas serão os mesmos seus irmãos e sobrinhos, dado que as relações de parentesco são idênticas, os herdeiros de HH são os mesmos herdeiros de KK, requerendo que as provas que que comprovem a qualidade dos herdeiros de HH sejam também utilizadas em relação a KK.

A 07/02/2022, na senda dos despachos de 27/04/2021, 04/10/2021 e 25/10/2021 – que, como ficou referido, surgem descontextualizados porque o que vinha sendo objecto dos autos e não estava resolvido era estabelecer os sucessores de KK - foi proferido despacho em que se consigna que “  permanece omissa a identificação cabal de cada um dos herdeiros de HH (pessoa relativamente à qual importa proceder à habilitação), não obstante a longevidade destes autos e as oportunidades já concedidas aos requerentes para clarificarem quem são os herdeiros a fim do Tribunal diligenciar pela sua habilitação, não tendo os requerentes logrado minimamente dar cumprimento ao determinado no despacho que antecede “ e em que renova “o despacho de 25.10.2021, concedendo-se um derradeiro prazo de 10 dias para o efeito.”

E a 21/02/2022 vieram os requerentes dizer que “os requerentes nos presentes autos não são familiares (diretos/indiretos), nem detêm qualquer relação de afinidade com os herdeiros na presente lide, requer-se os bons ofícios a V. Exa., no sentido de, ao abrigo do princípio da cooperação e oficiosidade, notificar todos os herdeiros identificados no presente processo, para identificar cabalmente cada um dos herdeiros de HH.”

Perante este requerimento, tendo em consideração que os autos estavam pendentes desde 2017, que era conhecida a identidade da cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, devia o Sr. Juiz a quo ter providenciado pela sua notificação, pois, nos termos do n.º 1 do art.º 6º do CPC, cumpre-lhe dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação.

Porém, a 15/03/2022 é proferido despacho a ordenar que os autos vão com vista ao MP para “querendo, requerer outras diligências para além daquelas já ordenadas, ou promover o que tiver por conveniente.”, tendo o MP declarado nada ter a promover.

Cabe perguntar para quê, quando não tinha sido o MP a deduzir a habilitação.

E, finalmente, a 16/05/2022 é proferido o despacho recorrido, que julga o incidente improcedente pelas razões já referidas.

Mas, muito embora seja um facto que, face ao desenvolvimento dos autos, o requerimento inicial se mostra incompleto, quer quanto á identificação dos sucessores de HH, quer quanto ao grau de parentesco dos mesmos, muito embora se vislumbre que os requerentes não identificaram de forma completa os sucessores de KK, muito embora estejam juntas aos autos impressões dos assentos de nascimento dos sucessores - o que permitiria aos requerentes, ainda que com algum esforço, estabelecer quem eram os sucessores e o grau de parentesco -, não tendo sido colocada em crise a alegação dos mesmos de que não eram familiares da falecida e, portanto, não tinham conhecimento dos seus herdeiros, o despacho recorrido, em que culmina o desenvolvimento dos autos, não se pode manter.

E não se pode manter porque traduz:
- uma violação do principio da tutela jurisdicional efectiva, na medida em que, passados 5 anos desde a instauração do incidente e de todo o seu desenvolvimento, se considera que o requerimento inicial se mostra incompleto, o que constitui uma decisão meramente formal quando em diversos momentos do processo foram violados, como assinalado a seu tempo, os princípios da gestão processual e da cooperação;
- uma violação do principio da gestão processual, logo no inicio do processo e em face do oficio do SF de ... de 15/11/2017, como se deixou assinalado;
- uma violação do principio da cooperação, em face dos requerimentos dos requerentes de 07/09/2020 e 21/02/2022, como também se deixou assinalado;
- uma violação do principio da economia processual, tendo em consideração que os autos estavam pendentes há 5 anos, na vertente de economia de processos pois obriga á instauração de um novo incidente e de economia de actos, desaproveitando todos elementos probatórios carreados para os autos.

A procura da justiça material impunha uma actuação devida de todos os referidos princípios através:

- num primeiro momento, da notificação de NN, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, para vir indicar quem eram os herdeiros da mesma e o respectivo grau de parentesco e quem eram os herdeiros de KK e grau de parentesco, pois, atenta a similitude dos nomes, aquela aparente ser familiar da última;
- num segundo momento, obtidas tais informações e em simultâneo:
a) fosse proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento inicial, tendo em vista a indicação precisa dos sucessores de HH e o seu grau de parentesco, verificando-se, face às citações entretanto efectuadas, se todos haviam sido regularmente citados;
b) fossem os requerentes convidados a apresentar articulado superveniente, tendo por objecto a habilitação dos sucessores de KK, cumulando esta habilitação com a primeira, citando-se os sucessores e notificando-se as partes primitivas;
- num terceiro momento, fossem então extraídas as consequências do desenvolvimento dos momentos anteriores.

Deve assim o despacho recorrido, em que culmina um desenvolvimento do processo, ser revogado e substituído por outro que determine a notificação de NN, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, para vir indicar quem eram os herdeiros da mesma e o respectivo grau de parentesco e quem eram os herdeiros de KK e grau de parentesco.

Posteriormente, num segundo momento, obtidas tais informações e em simultâneo deve ser:
a) proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento inicial, tendo em vista a indicação precisa dos sucessores de HH e o seu grau de parentesco, verificando-se, de seguida se, face às citações entretanto efectuadas, se todos estão regularmente citados;
b) devem os requerentes ser convidados a apresentar articulado superveniente, tendo por objecto a habilitação dos sucessores de KK, cumulando esta habilitação com a primeira, citando-se os sucessores e notificando-se as partes primitivas.

E finalmente, num terceiro momento, devem ser extraídas as consequências do desenvolvimento dos momentos anteriores.

4.3. Custas
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º, do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que a elas houver dado causa, entendendo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção, ou, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.

No caso em análise, o Ministério Público, tendo contra-alegado no sentido da manutenção da decisão recorrida e improcedência do recurso, ficou vencido, pois se impõe a revogação da decisão recorrida.

No entanto o Ministério Público está isento do pagamento de custas ao abrigo do disposto no art.º 4º, nº 1, al. a), do RCP.

Destarte, conclui-se que no presente recurso não há lugar ao pagamento de custas.

5. Decisão

Termos em que acordam os Juízes que compõem a 1ª Secção da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso, revoga-se a decisão recorrida a qual se substitui por outra que determine a notificação de NN, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de HH, para vir indicar quem eram os herdeiros da mesma e o respectivo grau de parentesco e quem eram os herdeiros de KK e grau de parentesco.

Posteriormente, num segundo momento, obtidas tais informações e em simultâneo deve ser:

a) proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento inicial, tendo em vista a indicação precisa dos sucessores de HH e o seu grau de parentesco, verificando-se, de seguida se, face às citações entretanto efectuadas, se todos estão regularmente citados;
b) devem os requerentes ser convidados a apresentar articulado superveniente, tendo por objecto a habilitação dos sucessores de KK, cumulando esta habilitação com a primeira, citando-se os sucessores e notificando-se as partes primitivas.

E finalmente, num terceiro momento, devem ser extraídas as consequências do desenvolvimento dos momentos anteriores.
*
Sem custas, por delas estar isenta a parte vencida.
*
Notifique-se
*
Guimarães, 27/04/2023
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
           
Relator: José Carlos Pereira Duarte
Adjuntos: Maria Gorete Roxo Pinto Baldaia de Morais
José Fernando Cardoso Amaral


[1] O Relatório apresenta-se anormalmente extenso em virtude das incidências processuais que cumpre ter em consideração na decisão do recurso.