Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
50/18.0T8PRG-F. G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE
PROVA DOS REQUISITOS LEGAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

I. O pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo devedor é liminarmente indeferido nos casos previstos no art.º 238º do CIRE, nomeadamente, e nos termos da alínea. d), do citado artigo, se o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar com culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica, sendo cumulativos os requisitos legais em referência.

II. Em face do circunstancialismo de cada caso concreto se apurará se da não apresentação atempada à insolvência resultou relevante prejuízo para os credores, nomeadamente, decorrente do avolumar do montante global da divida pelo acumular dos juros de mora, da maior dificuldade de satisfação dos créditos dos credores e/ou desvalorização do capital.

III. Os fundamentos previstos nas alíneas do n.º 1 do art.º 238.º do CIRE, consubstanciam factos impeditivos do direito à exoneração, donde a sua alegação e prova competirá aos credores ou ao administrador da insolvência
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Nos presentes autos Processo de Insolvência de Pessoa Singular n.º (…)., da Comarca de Vila Real, Peso da Régua – J1, em que são Insolventes Manuel (…) e Jacqueline (…), tendo sido proferido despacho a indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelos insolventes ao abrigo do disposto no artigo 239.º do C.I.R.E., vieram os insolventes interpor recurso de apelação do despacho que assim decidiu.

O recurso veio a ser admitido como recurso de apelação, com subida imediata, em separado, e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresentam, os apelantes formulam as seguintes Conclusões :

PRIMEIRA: Não está provado que pelo facto de os insolventes não se terem apresentado à insolvência em 2015 tenham resultado prejuízos para os credores e porque não está demonstrado nos autos que por motivo desse atraso tenha havido uma depreciação significativa do valor do seu património e que seja imputável a essa dilação temporal
SEGUNDA: O facto de as vinhas que foram apreendidas para a massa e que constituem o essencial dela não terem sido devidamente granjeadas ao longo do ano de 2018 não pode ser atribuído a conduta dos insolventes,
Sendo, ainda certo que TERCEIRA: em 2017 elas valiam 2.062.775,00 € e em 2018 foram avaliadas e com referência ao passado mês de Setembro em 2.224.857,00 €
QUARTA: a Meritíssima fez uma interpretação incorrecta dos factos carreados para os autos e supra descritos e, por isso, aplicou-lhes indevidamente a alínea d) do artº 238º do CIRE .

Foram oferecidas contra-alegações pelo credor (…), S.A.

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com o efeito fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.

Atentas as conclusões do recurso de apelação deduzidas, e supra descritas, é a seguinte a questão a apreciar:

- reapreciação da decisão recorrida que indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelos insolventes ao abrigo do disposto no artigo 239.º do C.I.R.E.

FUNDAMENTAÇÃO ( de facto e de direito )

I. 1.Nos presentes autos Processo de Insolvência de Pessoa Singular n.º 50/18.0T8PRG-F., da Comarca de Vila Real, Peso da Régua – J1, em que são Insolventes Manuel (…) e Jacqueline (…), tendo sido proferido despacho a indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelos insolventes ao abrigo do disposto no artigo 239.º do C.I.R.E., vieram os insolventes interpor recurso de apelação do despacho que assim decidiu, nos termos e pelos fundamentos acima expostos.
2. Na decisão recorrida a Mª Juiz “ a quo “ considerou estar verificada a previsibilidade da alínea d) do n.º 1 do artigo 238.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE ), tendo decidido indeferir liminarmente o pedido dos insolventes de exoneração do passivo restante, com base na seguinte fundamentação:

“ … V. Os devedores não se apresentaram à insolvência, a qual teve de ser requerida por credor em 12 de Fevereiro de 2018.

Na sentença de declaração da insolvência, por remissão para a petição inicial, deu-se como provado, para além do mais, que os insolventes tinham dívidas de montante global correspondente a, pelo menos, € 1.343.878,19, tendo vindo o senhor Administrador Judicial a apurar ascenderem as dívidas a € 3.609.927,51, que deixaram de pagar as suas dívidas desde 2014 e que existem várias execuções movidas contra os insolventes, pelo menos, desde aquele ano.

No que respeita aos bens de que os insolventes eram proprietários – maioritariamente prédios rústicos e urbanos integrantes de quintas de produção de vinho -, estavam onerados com penhoras e hipotecas, sendo certo que a não apresentação dos devedores à insolvência – a qual teve de ser requerida por credor – implicou uma desvalorização de tais bens, uma vez que os insolventes – debatendo-se havia já muitos anos com a falta de meios económicos – não cuidaram das vinhas. Com efeito, como já se deixou acima exposto, o senhor Administrador Judicial, no mês de Maio do corrente ano – o mês do requerimento e do decretamento da insolvência e da sua nomeação -, observou nas vinhas infestantes herbáceos nas entrelinhas e mesmo semi-arbustivos nos taludes, falta de poda – sendo que nessa época, com o desenvolvimento vegetativo, já não era mais possível fazê-la, a qual tem de ser feita, no limite, até finais de Fevereiro -, e no panorama da zona envolvente, as vinhas apresentavam um verde desmaiado de tonalidade bem diferenciada na paisagem, indício de falta de adubação e granjeio minimamente adequados, alguns cachos visíveis apresentavam sinais de míldio, indício de ausência de tratamento fitossanitário. Nessa altura, grande parte da frutificação das cepas estava já seriamente comprometida e os danos já eram irreparáveis e irreversíveis para a colheita de 2018.

Apurou ainda o senhor Administrador Judicial, pelo confronto dos relatórios de avaliações disponibilizadas quer pelo credor CCAM (via (..)) quer (…) (via (..) Consultoria e Avaliação) datados de maio e junho de 2017 e que representam 99% dos valores dos imóveis apreendidos, que os bens dos insolventes apresentavam então um valor de 2.062.775,00€, quando, segundo informações antes veiculadas pelos insolventes, deveriam ter um valor de 5.000.000,00€, de onde se conclui que houve uma perda de valor substancial reportada a, pelo menos, meados de 2017 (anterior à insolvência).

Significa isto que os devedores deixaram o património que servia de garantia às suas elevadas dívidas desvalorizar-se, sem que tivessem tido a iniciativa de, como era seu dever, se apresentarem à insolvência, causando assim sério prejuízo aos credores, não sendo para tal relevante, como pretendem os insolventes, qualquer juízo de apreciação sobre a forma como senhor Administrador Judicial e os credores passaram a administrar a massa insolvente posteriormente ao decretamento da insolvência.

Os insolventes encontravam-se em situação de insolvência, pelo menos, desde o início de 2015, altura desde a qual se revelaram incapazes de melhorar a sua situação económica, facto que não podiam desconhecer. Da sua não apresentação à insolvência resultaram prejuízos elevados para os credores nos termos já expostos, os quais já não conseguirão a satisfação integral dos seus créditos, para além de que já tiveram de propor execuções, como tiveram de suportar as respectivas custas processuais, tudo em virtude da referida actuação – por omissão – dos devedores.

Ora, prevê a alínea d) do n.º 1 do artigo 238.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas como motivo para o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante, precisamente, o incumprimento do dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a se apresentar, a abstenção dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica, situação que se verificou em relação aos aqui insolventes.

II. O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência (… ) – art.º 1º do CIRE, podendo ser sujeitos passivos da declaração de insolvência quaisquer pessoas singulares ou colectivas, considerando-se em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas ( art.°s 2º-n.º1-alínea a), e 3º, do citado diploma legal ).

Nos termos do disposto no art.º 235º do CIRE, sendo o devedor uma pessoa singular, pode ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste, nos termos das disposições regulamentadoras do diploma legal em causa, nomeadamente dos art.º 235 e 248º.

Pretende-se com esta medida, e tal como expressamente se consigna no ponto 45º do preâmbulo do Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março, que aprovou o CIRE, a possibilidade da extinção das dívidas e a libertação do devedor, segundo o princípio do fresh start, aí se declarando que o Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental de ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica, segundo o princípio do fresh start, face á ponderação dos requisitos exigidos ao devedor e da conduta recta que ele teve necessariamente de adoptar e que justificará, então, que lhe seja concedido o benefício da exoneração, permitindo a sua integração plena na vida económica.

O pedido de exoneração do passivo restante é feito pelo devedor nos termos e prazos consignados no art.º 236º do CIRE, mediante os pressupostos previstos no art.º 237º.

A concessão efectiva da exoneração do passivo restante pressupõe, nos termos dos art.º 237º e 239º, do diploma citado, a faculdade concedida ao devedor pessoa singular da exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento desta, pressupondo, nestes termos, tal benefício, que, após a sujeição a processo de insolvência, o devedor permaneça por um período de cinco anos – designado período de cessão – ainda adstrito ao pagamento dos créditos da insolvência que não hajam sido integralmente satisfeitos, e, obrigando-se, durante esse período, entre várias outras obrigações, a ceder o seu rendimento disponível a um fiduciário, que afectará os montantes recebidos ao pagamento aos credores, e, findo este período, tendo o devedor cumprido, para com os credores, todos os deveres que sobre ele impendiam, é proferido despacho de exoneração, que liberta o devedor das eventuais dívidas ainda pendentes de pagamento.

Tal concessão tem, porém, como pressuposto, que não exista motivo para o indeferimento liminar do pedido nos termos do art.º 238º.

O pedido é liminarmente indeferido nos casos previstos no art.º 238, do citado diploma, nomeadamente, e nos termos da alínea. d), do citado artigo, se o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar com culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica - ainda, devendo considerar-se cumulativos os requisitos legais em referência - Ac. STJ, de 21/1/2014, P. nº 497/13.9TBSTR-E-E1.S1, in www.dgsi.pt;

Dispõe o art.º 18º do CIRE, que estatuí sobre o “Dever de apresentação à insolvência” que o devedor deve requerer a declaração da sua insolvência dentro dos 30 (trinta) dias seguintes à data do conhecimento da situação de insolvência, tal como descrita no n.º1 do artigo 3º, ou à data em que devesse conhecê-la, dispondo o n.º1 do artigo 3º que é considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.

Sendo os requeridos/ insolventes pessoas singulares sobre eles não impende o dever de apresentação à insolvência, tal como preceitua o n. º2 do art.º 18º do CIRE, salvo se forem titulares de uma empresa na data em que incorreram em situação de insolvência.

Não obstante, em qualquer caso, e, mesmo a considerar-se que os requeridos não estavam vinculados ao dever de apresentação à insolvência, nos termos dos preceitos legais acima indicados, o pedido de exoneração do passivo restante, é liminarmente indeferido nos casos previstos no art.º 238, do citado diploma, nomeadamente, nos termos da alínea. d), do citado artigo, se o devedor, não estando obrigado a se apresentar à insolvência, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar com culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

Vem sendo firmada jurisprudência uniforme pelo Supremo Tribunal de Justiça (Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 21/10/2010, 19/6/2012, 19/4/2012, 24/1/2012, 3/11/2011) no sentido de que, nomeadamente:

Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 19/6/2012: “A existência do elemento «prejuízo para os credores», não decorre, automaticamente, do teor literal da al. d), do n.º 1, do art. 238.º, do CIRE, não tem natureza objectiva, tratando-se de um pressuposto independente da tardia apresentação do pedido de insolvência, devendo antes ser, concretamente, apurado, em cada caso, com afastamento terminante de qualquer tipo de presunção de prejuízo, que carece sempre de demonstração efectiva.”;

Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 24/1/2012: “Os requisitos tempestividade e prejuízo para os credores são autónomos, já que a apresentação do insolvente pode não causar prejuízos sensíveis aos credores, como está implícito na al. d), (…) O conceito de prejuízo, deve ser interpretado como patente agravamento da situação dos credores que assim ficariam mais onerados pela atitude culposa do insolvente. “

Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 3/11/2011: “O prejuízo para os credores previsto na al. d) do nº 1 do artigo 238º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas não resulta automaticamente do atraso na apresentação à insolvência, mas abrange qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos, provocada por esse atraso, desde que concretamente apurada, em cada caso. (…)”

Consideramos, assim, e, a par da jurisprudência que vem sendo firmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, e que acompanhamos, dever a conclusão sobre a verificação de prejuízo para os credores aferir-se face ao circunstancialismo concretamente apurado em cada caso concreto, e, se é tal prejuízo relevante para aplicação do art.º 238º-n. º1-alínea. d) do CIRE.

E, ainda, relativamente á verificação e aplicação da al.d) do artº 238º do CIRE, o ónus da prova da verificação dos respectivos requisitos incumbe aos credores ou ao administrador da insolvência.

“Em face do circunstancialismo de cada caso concreto se apurará se da não apresentação atempada à insolvência resultou “relevante” prejuízo para os credores, nomeadamente, decorrente do avolumar do montante global da divida pelo acumular dos juros de mora, e da maior dificuldade de satisfação dos créditos dos credores e desvalorização do capital; Os fundamentos previstos nas alíneas do n.º 1 do art.º 238.º do CIRE, consubstanciam factos impeditivos do direito à exoneração, donde a sua alegação e prova competirá aos credores ou ao administrador da insolvência” - Ac. STJ, de 21/1/2014, P. nº 497/13.9TBSTR-E-E1.S1, in www.dgsi.pt

“Os fundamentos previstos nas alíneas do n.º 1 do art.º 238.º do CIRE, consubstanciam factos impeditivos do direito à exoneração, donde a sua alegação e prova competirá aos credores ou ao administrador da insolvência, uma vez que o insolvente tem o direito potestativo a que o seu requerimento seja admitido e submetido à assembleia de credores, sem que tenha de apresentar prova daqueles requisitos, bastando-lhe declarar expressamente que os preenche (ao autor apenas “cabe a prova dos factos que segundo a norma substantiva aplicável, cabem serem de pressuposto ao efeito jurídico por ele pretendido” – v. A. VARELA, in RLJ, ano 117, 30/31), como decorre, inequivocamente, do disposto no n.º 3 do art.º 236.º, ao impor que do requerimento conste expressamente tal declaração e a disposição de observar todas as condições exigidas no artigo seguinte (Ac. do STJ de 21.10.2010, in www.dgsi.pt, no processo 3850/09TBVLG.D.Pl.S1. Ac do STJ de 06.07.2011 in www.dgsi.pt no processo 7295/08.0TBBRG.G1. S1, Ac. do STJ de 19-06-2012, na Revista n.º 1239/11.9TBBRG-E.G1 51 – 1.ª Secção).” - Ac. STJ, de 21/1/2014, P. nº 497/13.9TBSTR-E-E1.S1, in www.dgsi.pt.

No despacho recorrido foi o pedido de exoneração do passivo restante, formulado pelos requeridos, liminarmente indeferido, considerando a Mª Juiz “a quo “verificar-se, no caso em apreço, a previsibilidade da alínea d), do n.º1, do art.º 238º do CIRE, nos termos e pelos fundamentos acima expostos.

Opõem-se os apelantes, nos termos que expõem e concluem nas alegações do recurso de apelação, defendendo, designadamente, que não está provado que pelo facto de os insolventes não se terem apresentado à insolvência em 2015 tenham resultado prejuízos para os credores e porque não está demonstrado nos autos que por motivo desse atraso tenha havido uma depreciação significativa do valor do seu património e que seja imputável a essa dilação temporal; o facto de as vinhas que foram apreendidas para a massa e que constituem o essencial dela não terem sido devidamente granjeadas ao longo do ano de 2018 não pode ser atribuído a conduta dos insolventes, e, mais alegando que em 2017 elas valiam 2.062.775,00 € e em 2018 foram avaliadas e com referência ao passado mês de Setembro em 2.224.857,00 €.

Com efeito, atentos os autos, conclui-se que no caso sub judice não se realizou a prova dos legais requisitos previstos no artº 238º - nº1 al.d) do CIRE, e respectiva factualidade, sendo que não se tendo na decisão recorrida, sequer, fixado o elenco factual a tal integração respeitante, com a respectiva motivação, como se impunha, sob pena de nulidade da decisão, como decorre do artº 615º - nº1-al.b) do CPC, normativo este com a aplicação aos meros despachos nos termos do nº3 do artº 613º, do citado código, as conclusões, mesmo que factuais, expressas na decisão se baseiam, tão só, nas considerações e fundamentação do relatório do Sr. Administrador da Insolvência de fls.29/31 dos presentes autos, não se demonstrando, porém, sequer, de tal relatório, a razão de ciência e confirmação das conclusões expostas, e, que, assim, se não encontram provadas, aliás, ao próprio Administrador da Insolvência e credores incumbindo o ónus, não só da alegação, mas também da prova dos factos em referência, não aludindo o despacho recorrido a qualquer meio probatório e mais reportando a aludida “ perda de valor substancial” apurada pelo Sr. Administrador da insolvência a alegadas “informações antes veiculadas pelos insolventes” no sentido de que os bens deveriam ter um valor de € 5.000.000,00€, nenhuma prova se demonstrando assim existir da alegada desvalorização, a qual, é ainda, refutada pelos próprios insolventes, tratando-se também de matéria controvertida.

Nestes termos, em concreto, não poderá concluir-se que da não apresentação tempestiva à insolvência por parte dos requeridos haja resultado prejuízo relevante para a situação dos credores, não decorrendo do despacho recorrido a prova de tal verificação, e, assim, não poderá manter-se a decisão que conclui pela verificação dos pressupostos de aplicação do art.º 238º-n. º1-alínea. d) do CIRE, como causa de indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante.

Procede, consequentemente, a apelação, nos termos expostos, devendo revogar-se a decisão recorrida.

DECISÂO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida.
Custas pela massa insolvente
Guimarães, 21 de Fevereiro de 2019

Maria Luísa Duarte (relatora)
António Júlio da Costa Sobrinho (adjunto)
Jorge Alberto Martins Teixeira(adjunto)