Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1353/21.2T8BGC-B.G1
Relator: ANA CRISTINA DUARTE
Descritores: EXECUÇÃO
SUSPENSÃO
EMBARGOS DE EXECUTADO
CAUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/04/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 - Considerando que o legislador pretendeu que a suspensão da execução, em consequência do recebimento dos embargos de executado, constitua uma situação excecional e não a regra, é de colocar uma particular exigência na admissibilidade da suspensão da execução com fundamento nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 733º do CPC.
2 – No caso da alínea b), não juntando os embargantes qualquer documento que constitua princípio de prova, designadamente por ser possível constatar diferenças significativas entre as assinaturas, não pode o juiz, sem que seja prestada caução, determinar a suspensão da execução fundada em documento particular.
3 – Ainda que tais documentos fossem juntos, para que seja decretada a suspensão da execução, ao abrigo deste normativo, é necessário que o julgador, após análise sumária dos documentos em confronto e da ponderação dos demais elementos existentes no processo, se convença da probabilidade séria do título dado à execução não ter sido subscrito pelo executado.
4 – Se tiver sido impugnada a exigibilidade ou liquidação da obrigação exequenda, é necessário que o embargante suporte a alegação numa versão factual verosímil, conforme às regras da experiência, apresentando logo meios de prova com forte valor probatório, sob pena de não se poder afastar a regra de que a suspensão da execução apenas se pode obter mediante a prévia prestação de caução.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

AA e BB, embargantes na execução que lhes é movida por CC interpuseram recurso do despacho que decidiu que o recebimento dos embargos não suspende o processo executivo, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes
Conclusões:

Os Recorrentes não se conformam com o D. Despacho, em crise, mormente quanto à sua Decisão – assenta –– No Recebimento dos Embargos não lhe tendo sido atribuído efeitos Suspensivo – “Assim, declaro que o recebimento dos presentes embargos não suspende o processo executivo.”- Despacho. Referência ...33.
2.º Não se conforma com a D. Decisão, por falta de fundamentação legal que possa sustentar a Decisão de Não suspender o processo executivo.
3.º Os Recorrentes apresentaram Embargos, assentam nos argumentos que importa analisar e interessam para a objeto do Recurso.
4.º Por Exceção: a)- Da Nulidade – Inexistência de Título – contra os Exe./Oponentes (falta causa de pedir, falsidade do título executivo e do conteúdo da declaração e impugnação assinatura.)
5.º Apresentaram o Exequente no seu R.E., como título executivo – quatro cópias que identificaram com a descrição de 5 contratos mútuo–porém das cópias anexaram, 4 anexos, alegam que os factos constam daquele título Executivo, não invocaram nem sustentam a relação subjacente, aos alegados Título Executivos
6.º E como tal os Recorrentes, apresentaram os Embargos, invocando além do mais, a exceção dilatória da nulidade de todo o processado, por ineptidão do requerimento executivo, em consequência, ser determinada a extinção dos autos executivos, com base na al. a) do n.º 2 do artº 186º CPC, conforme infra se expõe e se logra demonstrar.
7.º Mais, alegaram, conforme dispõe o artigo 552º, n.º1, al. d) do Código de Processo Civil que, como antecedente lógico da pretensão formulada, o autor terá de expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação.
8.º No domínio particular da acção executiva, tendo a execução por base um título executivo que deve acompanhar o requerimento executivo, a indicação da causa de pedir tem de ter lugar quando não conste do título, o que é o caso dos presentes autos Executivos – vide R.E-e documentos
10.º Decorre em síntese que a especificidade da ação executiva, assente necessariamente no título executivo, leva, em regra, a que não caiba ao exequente o ónus de “expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à ação”, artigo 810 n.º 1cpc r
11.º Decorre desta feita o seguinte, quando os elementos essenciais da obrigação exequenda não resultem do próprio documento oferecido como título executivo), o requerimento executivo deve conter, além do mais, uma exposição sucinta dos factos que fundamentam o pedido.
13.º Assim o requerimento executivo é inepto por não constar do mesmo a causa de pedir, designadamente, a natureza, a origem ou causa da dívida de que o embargante/executado alegadamente se confessa devedor no documento dado à execução
14.º O credor terá sempre de alegar o facto constitutivo do direito de crédito – o que é confirmado pela exigência da forma do art. 458º-2 do C.C., que pressupõe o conhecimento da relação fundamental.
15.º E, por não se consagrar aqui o princípio do negócio abstracto, mas apenas a inversão do ónus da prova da existência da relação fundamental, não fica o credor desonerado do ónus da alegação da relação fundamental, a servir de causa de pedir, aquando da apresentação do requerimento executivo sob pena de recusa do recebimento deste (art. 724º, nº1, al. e e n.º 4), com referência ao art. 725º, 726.º ). CPC
16.º Quando a causa da obrigação não constar do respetivo documento, O Exequente terá que invocar descritivamente tal obrigação no requerimento executivo, sob pena de, não o fazendo, tal requerimento padecer de falta de causa de pedir, o que o torna inepto (cf. artigos 186º, n.º 2, alínea a), e 724º, n.º1, alínea e), ambos do Código de Processo Civil, e artigo 458º, n.º 1, do Código Civil).
17.º Assim, e não alegando o exequente, no respetivo requerimento executivo, a causa da obrigação subjacente ao documento de reconhecimento de dívida, não pode vir a fazê-lo em momento posterior, sem o acordo do executado, uma vez que se trata de alteração da causa de pedir, até aí inexistente (cf. artigo186º, n.º 2, alínea a) e 265º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil
18.º Consequentemente conforme devidamente explanada a exceção invocada seja a falta ou ininteligibilidade de causa de pedir traduz-se numa falta de objecto do processo, constituindo nulidade de todo ele, nulidade que os Executados expressamente invocam nos presentes.
19.º Deverá pois, proceder a excepção dilatória de nulidade de todo o processado por força da ineptidão do requerimento executivo e, em consequência, absolver-se os executados da instância executiva, determinando a extinção da execução.
B) Alegaram ainda e assim invocaram os Recorrente a Exceção da Ilegitimidade – Executada BB, nos termos seguintes:
20.º Resulta dos documentos – a que identificam os Exequentes de Título Executivo – a identificação do executado, e que hipoteticamente assina declaração, por si. –
21.º o pressuposto processual da legitimidade afere-se exclusivamente pelo título executivo (n.º 1 do artigo 53.º do Código de Processo Civil). Daí que se deva considerar que tem legitimidade para promover e fazer seguir a execução é a pessoa que no título figure como credor e que só deve intervir como executado quem, à luz do título, seja devedor da obrigação exequenda (cfr. Acórdão do STJ, de 15 de abril, acessível em www.dgsi.pt).
22.º No seguimento, temos que sempre que se verifique falta de coincidência entre quem promove - ou contra quem é promovida - a ação executiva e o título executivo, verificar-se-á ilegitimidade da parte, que forçosamente constamos a inexistência desta coincidência do R. Executivo e do Título apresentado, perante a executada, sendo assim parte Ilegítima na Execução.
23.º Assim quanto à Executada estamos perante uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso o que expressamente se Requer o seu conhecimento, cuja verificação implicará o indeferimento liminar do requerimento executivo, conforme estatuído nos preceitos normativos (n.º 2 do artigo 576.º, alínea e) do artigo 577.º, artigo 578.º alínea b) do n.º 2 do artigo 726.º e n.º 1 do artigo 734.º, todos do Código de Processo Civil).
C) Sustentam ainda os Embargantes os seus Embargos – pela inexistência de Título Executivo
24.º Os documentos juntos como R.E.,designados pelos exequentes de Título Executivo para o qual remetem e assim servem de base à Execução, “ cópias certificadas “, tal título configura uma inexistência jurídica.
25.º Segundo o art 46 c) do CPC, previa que podem servir de base às execuções os documentos particulares, assinados pelo devedor…
26.º A jurisprudência dos Tribunais superiores tem entendido quase unanimemente a decidir que as fotocópias de títulos de crédito, mesmo certificadas, não são suporte válido de execuções . Só os originais, para evitar que ao devedor pudesse ser exigido repetidamente o cumprimento, da Execução – constam o R. Executivo – as ditas cópias.
27.º Temos por verificada a previsão do art 812 nº 2 a) ou seja que é manifesta a falta ou insuficiência do título, junto aos autos, exceção que os Executados expressamente invocam para os devidos efeitos legais,
D) Por último, por mera cautela, defendem os Embargantes
28.º A falta de exposição factual no R. Executivo, limitam-se aos documentos que apelidam de Título Executivo – cópia – e que interpelados os Executados não cumpriram o contrato, tal alegação é falsa assim como as declarações e assinatura que ressaem dos documentos juntos de igual guisa é falso o conteúdo das cartas interpelação – Título Executivo, razão pela qual expressamente vão impugnados.
29.º Os Executados não declararam nem assinaram em tempo algum – qualquer documento que configure os ditos contratos mútuos – T. E. junto, razão pela qual expressamente vão impugnados – os Executados apenas podem afirmar com toda a certeza que são falsas as declarações assim como qualquer assinatura que invocam ser do Executado e aposta em tais documentos é falsa.
30.º Os Executado não estavam, assim como não estão em incumprimento, para com os Exequentes.
31.º Pelo que deve a Execução Requerida, ser considerada nula, e em consequência seja extinta a execução com as devidas cominações legais.
32.º Pois, com ante se referiu a Execução requerida traduz a prática de um acto que a Lei não admite, assim e face ao previsto no artigo 195.º e ss.do C.P.C. deve ser considerado nulo todo o processado subsequente, com as cominações legais.
33.º A obrigação que exterioriza o título deve ser certa, líquida e exigível. A incerteza ou Iliquidez da obrigação constituem fundamento de oposição à execução, que se invoca nos presentes Autos para os devidos e legais efeitos.

II
34.º São estes os factos que apresentados em sede de Embargos pelos aqui Recorrentes, e que foram completamente desconsiderados no D. Despacho, que Decidiu – Não Suspensão da Execução,
35.º Em 23/10/2022, foi proferida Decisão pelo Tribunal a Quo nos termos Seguintes: “...constante dos 5 contratos de mútuo juntos como título executivo. Nos termos da norma citada, o recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execucão se, tratando-se de execucão fundada em documento particular, o embargante tiver impugnado a genuinidade da respectiva assinatura, “apresentando documento que constitua princípio de prova”.
Ora, tendo os Embargantes/Executados se limitado a impugnar a genuinidade da assinatura aposta nos documentos particulares juntos como título executivo, sem apresentar qualquer documento que constitua princípio de prova (a missiva e respectivo registo postal comprovativo de envio não tem a virtualidade de constituir princípio de prova da falsidade da sua assinatura, atenta a sua natureza e conteúdo), e tendo o Embargado/Exequente, para além de declarar que não concorda com a suspensão, apresentado, no respectivo requerimento probatório, pedido de realização de perícia à assinatura do Executado, entendo que não existe fundamento justificado para a suspensão da execução sem prestação de caução.
Assim, declaro que o recebimento dos presentes embargos não suspende o processo executivo. . *
36.º Antes demais, o Tribunal não cuidou de verificar os fundamentos que nortearam toda a matéria invocada em sede de Embargos.
37.º Nomeadamente, a questão que de per si lograria a imediata Suspensão do processo Executivo pela dúvida incerteza e inexistência do Título Executivo conf. Artigo 733 n.º 1 c) CPC
38.º Não assentam os Embargos na última das questões suscitadas /Impugnação da Assinatura /
39.º Ao contrário do assim decidido, não estamos perante qualquer Documento Particular, ou reconhecido como tal, mas antes perante – Fotocópias certificadas, segundo sufragado pelo Exequente contratos – sem qualquer Reconhecimento de Assinatura.
40.º Mais, não cuidou o Tribunal de 1.ª Instância, ainda de verificar a coincidência entre as Descrições nos Documentos que sustentam o processo executivo – e da Ilegitimidade da Suscitada pela Executada que tão pouco figura em parte alguma, nas ditas Fotocópias.
41.º Tanto bastaria, para que a fundamentação dos Embargos adiada a invocada falta de Título Executivo/culminassem de imediato na Suspensão da Execução, como defendido pelos Embargantes, nos termos do artigo 733 n.º 1 al. c) do C.P.C.
42.º O executado pode opor-se à pretensão executiva, nos termos do art. 728 do C.P.C. socorrendo-se dos embargos, o que sucedeu com os presentes.
43.º A regra geral é que a dedução dos embargos não suspende a execução, ressalvadas as situações previstas no art.º. 733 do CPC
44.º No domínio específico da previsão do art.º 733, nº 1, al. c) que remete para a impugnação da exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda, dispõe o art.º 713 a propósito dos requisitos da obrigação exequenda, que ela deve ser certa, exigível e líquida, em face do título
43.º No concreto, os requisitos factuais são os elementos disponíveis no processo e consistentes no teor dos articulados e documentos juntos, no teor do requerimento executivo e na posição recíproca das partes em face do pretenso título exequendo.
44.º Outro enfoque possível das situações que podem justificar a suspensão da execução situa-se do lado da força da aparência do título e da posição do executado.
45.º É, pois, em face do título executivo apresentado e sua interpretação, que se deve apreciar se a obrigação obedece às exigências do art.º 713, ou seja, se ela é certa, líquida e exigível, sendo por referência a esses títulos que a impugnação da certeza, liquidez e exigibilidade deve ser dirigida
46.º Daí que, se o executado tiver nos embargos alegado factos destinados a demonstrar que a obrigação exequenda não é exigível, a suspensão da execução não pode ser recusada com o fundamento de que essa matéria é controvertida.
47.º Na sequência e com base na fundamentação de facto nos Embargos e no R. Executivo, salta à evidência, a nosso ver, que o exequente não junta aos autos um título que, aparentemente, detenha todos os requisitos legais de exequibilidade.
48.º Ora bem, a constituição do título executivo deveria ter sido precedida da demonstração da liquidação do crédito exequendo em dívida - o que não foi feito (nem) no requerimento executivo (nem nos embargos), não valendo como tal as fotocópias certificadas, o que dá consistência à posição dos embargantes
49.º Por outro lado, estamos perante uma execução com um valor superior a 80.000,00 euros, em face de dois cidadãos comuns, de idades superiores a 57 anos, sem qualquer circunstância especial, em que, pela natureza das coisas e da vida, o prejuízo da não suspensão da execução (se injusta) é incomensuravelmente superior ao prejuízo da suspensão (se injusta) a justificar que se conclua pela verificação de prejuízo «dificilmente reparável» para os embargante na prossecução dos autos executivos em tais circunstâncias
50.º Os Recorrentes não se conformam com a referida posição, entendendo, ao invés, que o juízo a efetuar não é de mérito, mas amplamente perfunctório é de considerar, em face do exposto, justificada a suspensão da execução, ao abrigo do artigo 733º, nº 1, alínea c), o que, como tal deve ser assim Doutamente decidido, em conformidade e, nos termos requeridos.
51.º Em conformidade, inexiste fundamento legal para o Despacho D. Decidiu pela não suspensão do processo executivo.
52.º A interpretação do Tribunal que se encontra plasmada no Despacho objeto de recurso limita os direitos dos Recorrentes a uma correta administração de justiça, porquanto limitadora dos direitos que lhe assistem.
53.º O referido Despacho viola a Constituição, nomeadamente o referido artigo 9.º, porquanto representa uma capitulação do Estado na prossecução de uma das suas principais atividades: a administração da Justiça.
54.º De igual forma, viola o disposto nos artigos 733.º, 46.º, 53.º, 186.º, 195.º,265.º, 458.º, 576.º, 578.º, 734.º, 812.º, 703.º, do Código de Processo Civil e 783.º, 784.º do Código Civil, e art.º 9 Constituição da República Portuguesa.
55.º Pelo que carece de ser revogado o despacho que indeferiu e não Suspendeu o processo executivo, sendo substituído por um outro que Suspenda o processo Executivo, nos termos constantes.
Termos em que deverá dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se o douto despacho recorrido, com as devidas e legais consequências.

Não foram oferecidas contra-alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.

A questão a resolver traduz-se em saber se com o recebimento dos embargos deveria ter sido suspenso o processo executivo.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida tem o seguinte teor:

“Os Embargantes/Executados impugnam a genuinidade da assinatura aposta nos cinco documentos apresentados como título executivo (denominados de «contrato de mútuo»).
O Embargado/Exequente, convidado pelo Tribunal, através do mesmo despacho de 03.04.2022, a pronunciar-se sobre a possibilidade de suspensão da execução sem prestação de caução, nos termos do disposto no artigo 733.º, n.º 1, alínea b), do C.P.C., declarou que não concorda com tal e requereu a final a realização de perícia à letra e assinatura do Executado constante dos 5 contratos de mútuo juntos como título executivo.
Nos termos da norma citada, o recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execução se, tratando-se de execução fundada em documento particular, o embargante tiver impugnado a genuinidade da respetiva assinatura, “apresentando documento que constitua princípio de prova”.
Ora, tendo os Embargantes/Executados se limitado a impugnar a genuinidade da assinatura aposta nos documentos particulares juntos como título executivo, sem apresentar qualquer documento que constitua princípio de prova (a missiva e respetivo registo postal comprovativo de envio não têm a virtualidade de constituir princípio de prova da falsidade da sua assinatura, atenta a sua natureza e conteúdo), e tendo o Embargado/Exequente, para além de declarar que não concorda com a suspensão, apresentado, no respetivo requerimento probatório, pedido de realização de perícia à assinatura do Executado, entendo que não existe fundamento justificado para a suspensão da execução sem prestação de caução.
Assim, declaro que o recebimento dos presentes embargos não suspende o processo executivo.
Notifique e comunique à Sra. Agente de Execução”.

O despacho recorrido declara que o recebimento dos embargos não suspende o processo executivo. É este o objeto do recurso.
Nas suas alegações/conclusões da apelação, os recorrentes repetem todos os argumentos utilizados nos embargos para se oporem à execução – conclusões 3.ª a 34.ª e 39.ª e 40.ª – para concluir que a execução deveria ter sido suspensa, ao abrigo do disposto no artigo 733.º, n.º 1, alínea c) do CPC.
Vejamos.
Como se disse já, a única questão em apreciação é a da peticionada suspensão da execução.
No seu requerimento de oposição à execução mediante embargos de executado, os embargantes solicitaram a suspensão da execução nos termos do artigo 733.º, n.º 1, alínea b) do CPC e, convidado o exequente, pelo Tribunal, a pronunciar-se sobre tal pedido, declarou que não concorda com tal e requereu a realização de perícia à letra e assinatura do executado constante dos cinco contratos de mútuo juntos como título executivo.
Nos termos do disposto no artigo 733.º, n.º 1, alínea b) do CPC, “O recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execução se, tratando-se de execução fundada em documento particular, o embargante tiver impugnado a genuinidade da respetiva assinatura, apresentando documento que constitua princípio de prova, e o juiz entender, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução”.
No caso dos autos, estamos perante execução fundada em documentos particulares – cinco contratos de mútuo -  e o embargante impugnou a genuinidade da respetiva assinatura. Contudo, não apresentou qualquer documento que constitua princípio de prova, juntando apenas a procuração com assinatura efetuada recentemente, para conferir poderes de representação nestes autos.
Ora, não juntando os embargantes qualquer documento que constitua princípio de prova, designadamente por ser possível constatar diferenças significativas entre as assinaturas, não pode o juiz, sem que seja prestada caução, determinar a suspensão da execução fundada em documento particular.
A aferição do preenchimento destes requisitos é deixada “em larga escala, ao critério do juiz, no confronto com os elementos, sempre diferenciados, a que possa aceder e dos argumentos que sejam apresentados por ambas as partes. Decidirá em função da análise sumária dos documentos e da ponderação dos demais elementos existentes no processo, declarando a suspensão sempre que se convença da probabilidade séria de que o título dado à execução não terá sido subscrito pelo executado, designadamente por existirem elementos que indiciem uma situação de burla ou que a assinatura do executado não encontra correspondência com a que consta de um documento autêntico” – Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís de Sousa, CPC Anotado, vol. II, pág. 93.
Certo que, para efeitos de ser decretada a suspensão da execução, é ao embargante que compete a prova indiciária de que a assinatura constante do título executivo não é do devedor, constituindo princípio de prova a comparação da assinatura constante do título dado à execução com a assinatura do devedor constante de um qualquer documento autêntico, atenta a presunção da sua genuinidade estabelecida no art. 370.° do Código Civil – cfr. neste sentido, Acórdão desta Relação de Guimarães, de 27/11/2002, processo n.º 658/02, in www.dgsi.pt.
Ora, no caso dos autos, como vimos já, não há nenhum documento que constitua princípio de prova a partir do qual o juiz se possa convencer que o título dado à execução não terá sido subscrito pelo executado, pelo que bem andou ao não decretar a requerida suspensão.

Vêm, agora, os apelantes, em sede de recurso, aludir à alínea c) daquele artigo 733.º, n.º 1 do CPC, onde se estabelece que o recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execução se tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda e o juiz considerar, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução.
Em primeiro lugar, deve dizer-se que na oposição à execução mediante embargos, os ora apelantes não colocaram esta questão.
Acresce que os fundamentos da própria oposição se prendem com a ineptidão da petição inicial por não constar da mesma a natureza, origem ou causa da dívida, sendo ainda invocada a ilegitimidade da executada mulher e a inexistência do título executivo por os documentos que servem de base à execução serem cópias certificadas e não os originais, não estando posta em causa a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda.
Conforme referem Abrantes Geraldes e outros, in obra citada, pág. 93, a razão de ser desta alínea prende-se com a certificação das condições de procedência, ou seja, “havendo alguma divergência séria em torno da exigibilidade da obrigação ou do montante da quantia exequenda, o prosseguimento da execução sem a certificação dessas condições de procedência, é suscetível de expor o executado a um risco significativo, justificando, em face das concretas circunstâncias, a suspensão da instância executiva”. Exige-se, no entanto, que o embargante suporte a alegação numa versão factual verosímil, conforme às regras da experiência, apresentando logo meios de prova com forte valor probatório, sob pena de não se poder afastar a regra de que a suspensão da execução apenas se pode obter mediante a prévia prestação de caução.
Ora, nada disso acontece nos presentes autos, em que os fundamentos da oposição são de caráter marcadamente formal – ineptidão, ilegitimidade – e o único elemento de prova junto é uma carta enviada pela advogada ao exequente.
Veja-se que, no que diz respeito à impugnação da exigibilidade da obrigação exequenda, prevista no artigo 733º, n.º 1, al. c), do CPC, haverá que ter presente o estatuído no artigo 713º do mesmo diploma, a propósito dos requisitos da obrigação exequenda, no qual se refere que ela deve ser certa, exigível e líquida, em face do título executivo. A obrigação que se pretende executar tem de ser exigível, isto é, tem de estar vencida (mas, obviamente, ainda não cumprida). Sempre que a obrigação preencha este requisito o credor pode promover a execução, a fim de lograr a satisfação coativa do seu direito.
Como decorre do requerimento executivo, o executado foi interpelado para pagar, não tendo liquidado qualquer valor.
Ora, advertindo para as “redobradas cautelas” a ter na aplicação do invocado fundamento de suspensão da execução, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, citados no Acórdão da Relação de Guimarães de 15/12/2022, processo n.º 31/22.0T8VNC-C.G1 (Alcides Rodrigues), in www.dgsi.pt, salientam que não se deverá perder de vista que o legislador pretendeu que a suspensão da execução, em consequência do recebimento dos embargos de executado, constitua uma situação excecional e não a regra. Daí ter de haver também uma particular exigência na admissibilidade da suspensão da execução com fundamento na al. c) do n.º 1 do artigo 733º do CPC.
E esse vem sendo o entendimento da jurisprudência.
Veja-se o Acórdão da Relação de Coimbra de 05/05/2015 (relator Manuel Capelo), in www.dgsi.pt, «[d]eixando o art. 733º, nº1, al.c) do CPC ao critério do juiz a consideração de entender ou não como justificado suspender a execução sem prestação de caução, em face da regra restritiva que é a de os embargos não suspenderem a execução (a não ser mediante caução), não bastará a impugnação da existência, validade, vencimento, liquidez ou exigibilidade da prestação exequenda para obter a suspensão sem caução, exigindo-se que dos termos da impugnação, confrontados com os elementos de apreciação, maxime o título executivo, nesse momento liminar do recebimento dos embargos, se revele algo de importante e manifesto que dispense o imperativo de colocar o exequente a coberto dos riscos da demora no prosseguimento da ação executiva».
No mesmo sentido, o Acórdão da Relação do Porto de 2/07/2015 (relator Aristides Rodrigues de Almeida), in www.dgsi.pt, no qual se decidiu que «[p]ara obter a suspensão da execução sem prestar caução não basta ao embargante impugnar a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda, sendo ainda necessário alegar circunstâncias em função das quais se possa concluir que se justifica excecionalmente o afastamento da regra de a suspensão depender da prestação de caução».
Ainda no mesmo sentido, como se explicitou no Acórdão da Relação de Coimbra de 13/11/2018 (relator Fonte Ramos), in www.dgsi.pt., «[q]uando nos embargos o executado impugna a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda a conclusão de que se justifica a suspensão sem prestação de caução há-de exigir que o embargante suporte essa alegação numa versão factual consistente, verosímil, conforme às regras da experiência e do comportamento humano e apresente logo meios de prova com forte valor probatório que se anteveja difícil de superar em sede de audiência de julgamento»[12].
Finalmente, no mesmo sentido, vejam-se os Acórdãos desta Relação de Guimarães de 14/10/2021 (relator José Cravo) e de 24.2.2022 (relator Maria dos Anjos Melo Nogueira), in www.dgsi.pt., especificando-se neste último aresto que «[j]ustificar-se-á, pois, suspender a execução (trazendo justo equilíbrio à relação de interesses opostos e conflituantes), ao abrigo da alínea c), do n.º 1 do art. 733.º do CPC, quando os elementos carreados aos autos (conjugando os que constem do processo executivo com os carreados aos embargos) permitam concluir (num juízo forçosamente sumário e não definitivo – prévio ao que a contraditoriedade da audiência permitirá formular a final), pela consistência da argumentação, ou seja, quando os elementos existentes nos autos imponham concluir estar abalada (pelo menos consistentemente questionada) a exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda».
Claro que, na decisão a proferir está arredada a formulação de qualquer juízo sobre a bondade do mérito (ou falta dele) dos embargos de executado e do seu eventual ou provável sucesso, daí que nos absteremos de quaisquer desenvolvimentos sobre essa matéria (decisões de mérito, aliás, vieram já a ser tomadas em sede de despacho saneador nos embargos de executado, conforme nos foi dado observar pela consulta do processo respetivo no CITIUS)
Assim, considerando que o legislador pretendeu que a suspensão da execução, em consequência do recebimento dos embargos de executado, constitua uma situação excecional e não a regra, é de colocar uma particular exigência na admissibilidade da suspensão da execução com fundamento, tanto na al. b), como na alínea c) do n.º 1 do artigo 733º do CPC e, em face do que fica dito, entendemos que foi correta a decisão proferida em 1.ª instância, que, assim, deverá ser mantida.

III. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes.
***
Guimarães, 4 de maio de 2023

Ana Cristina Duarte
Alexandra Rolim Mendes
Maria dos Anjos Melo Nogueira