Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
121/14.2T8BRG.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: CONTRATO DE CONSÓRCIO
CONTRATO DE EMPREITADA
INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I – Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir a realização de actos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento quer de uma actividade contínua; a execução de determinado empreendimento; o fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; pesquisa ou exploração de recursos naturais; produção de bens que possam ser repartidos, em espécies, entre os membros do consórcio (arts. 1.º e 2º do Dec. Lei n.º 231/81, de 28 de Julho).

II – Sendo a fonte da obrigação objeto dos autos o contrato de consórcio, e não o contrato de empreitada, não há que indagar se a consorciada tinha ou não direito a receber os valores que lhe foram pagos pelo dono da obra; impõe-se tão só que determinar se, à luz do aludido contrato de consórcio, haverá lugar à retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados.

III – Mostrando-se inalterado o acordado no contrato de consórcio e respetivo aditamento, e considerando que uma das consorciadas apenas anuiu proceder à respetiva revisão e adaptação do projeto na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil) na condição de que daí não decorreria uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado naquela especialidade, independentemente da desconformidade que se venha a verificar entre os trabalhos orçamentados no projeto inicial e os executados no projeto variante, a referida consorciada não está obrigada a efetuar com a outra consorciada qualquer reajustamento ou retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados.

IV – Provada a existência de um direito de crédito atinente às contas de fecho das diversas empreitadas executadas em parceria (consórcio), mas não se tendo apurado com precisão o seu montante, e sendo inviável o recurso à equidade, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC há que condenar no que se vier a liquidar em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

X, S.L. intentou, no Juízo Central Cível de Braga - Juiz 4 - do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Y – ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, S.A., pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 909.535,65 € (novecentos e nove mil quinhentos trinta e cinco euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos.

Para fundamentar tal pretensão alegou, em síntese, que a Ré não cumpriu o estipulado no contrato de consórcio, não tendo pago o valor real do custo da obra por si executada em função da alteração do projeto da empreitada e de cuja diferença a Ré indevidamente se apropriara.
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Regularmente citada, a Ré apresentou contestação (cfr. fls. 169 a 183), pugnando pela total improcedência da ação.
Em abono da sua defesa impugnou a factualidade alegada pela Autora e alegou ter a faturação sido efetuada em conformidade com as percentagens estabelecidas no contrato de consórcio.
Deduziu reconvenção, pedindo a esse título a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de 301.492,52 €, acrescidos dos juros vincendos desde a citação até integral e efetivo pagamento.
Alega para tanto que suportou despesas comuns e encargos com meios de produção (vg. mão-de-obra e equipamentos), cujo pagamento, juntamente com o management fee, constitui obrigação da Autora nos termos do contrato de consórcio e respetivo aditamento.
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Replicou a autora (cfr. fls. 1138 a 1148), impugnando a factualidade aduzida em sede de reconvenção, justificando ter procedido à devolução das faturas que lhe foram enviadas pela Ré, concluindo como na petição inicial.
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Foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e regularidade da instância, organizando-se de seguida despacho sobre o objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova, tendo sido admitidos os meios de prova (cfr. fls. 1260 a 1264).
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Procedeu-se a audiência de julgamento (cfr. fls. 2161 a 2165, 2248 a 2250, 2266, 2267 e 2277 a 2278).
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Posteriormente, a Mmª. Julgadora a quo proferiu sentença (cfr. fls. 2284 a 2298), nos termos da qual decidiu:

1) julgar parcialmente procedente por provada a ação e, em consequência, condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de 539.385,95 €, acrescida de juros de mora desde de 20 de julho de 2010 e até efetivo e integral pagamento.
2) julgar a reconvenção improcedente por não provada e, em consequência, absolveu a Autora/Reconvinda do pedido reconvencional.
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Inconformada, a Ré Y – ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, S.A. interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 2299 a 2394) e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou parcialmente procedente a acção e totalmente improcedente a reconvenção, condenando a R., ora Recorrente, a pagar à A. a quantia de € 539.385,95, acrescida de juros legais de mora desde 20 de Julho de 2010 até efectivo e integral pagamento.
2. Salvo o devido respeito, que é muito, a douta sentença recorrida, para além de fazer uma errada interpretação dos factos e do direito, é nula, na medida em que os fundamentos estão em clara e manifesta oposição com a decisão e o tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre questões que deveria ter apreciado, em face do alegado e provado nos autos, tendo ainda conhecido de questões de que não podia ter tomado conhecimento (art.º 615.º, n.º 1, al. c) e d) do CPC).
3. Com efeito, para além de ser manifesta e evidente a contradição entre os factos provados e o decisório, a douta sentença recorrida não interpretou correctamente o relatório pericial e ignorou totalmente as confissões expressas de factos feitas pela A., nos articulados e na própria audiência de julgamento, violando assim o princípio da aquisição processual e desvirtuando a decisão final, que não encontra a mínima correspondência com a alegação e prova produzida nos autos.
4. A isto acresce o facto de a douta decisão recorrida colocar toda a tónica de análise processual (quaestio decidendi) na acção e, de forma inexplicável, desconsiderar totalmente a reconvenção deduzida pela R., desvalorizando-a e abstendo-se claramente de fazer uma análise crítica dos factos e das provas que foram concretamente alegadas e produzidas nos autos quanto à matéria da reconvenção, julgando-a mesmo improcedente em face dos próprios factos dados como provados.
5. Assim, relativamente à ACÇÃO, são os seguintes os concretos pontos de facto da douta decisão recorrida que a R. considera incorrectamente julgados:

Factos Provados

35º - A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu.
42º - (Na ETAR A) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), na parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.501.151,68 €, a parte do equipamento 1.798.387,27, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 96.650,26 €.
44º - (Na ETAR B) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.314.247,57 €, a parte do equipamento 1.587.568,23 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
46º - (Na ETAR C) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.438.276,21 €, a parte do equipamento 1.727.515,48 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 150.145,01 €.
48º - (Na ETAR D) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 877.861,06 €, a parte do equipamento 1.302.952,52 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
49º - No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (- 548.756,99).
50º - No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91).
54º - A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.

Factos Não Provados

A Ré apenas concordou com a alteração do projeto inicial, porque da mesma não decorria uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.

Para além destes factos, incorrectamente julgados nos termos supra referidos na alegação, o tribunal a quo deveria ter ainda dado como provados os seguintes factos:

55º–A: Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do Doc. n.º 111 da Contestação.
55º–B: Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do Doc. n.º 112 da Contestação.
56º–A: Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta com o teor que consta do Doc. n.º 113 da Contestação.
6. Relativamente à RECONVENÇÃO, são os seguintes os concretos pontos de facto da douta decisão recorrida que a R. considera incorrectamente julgados:

Factos Provados

66º As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.

Factos Não Provados

A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:

Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97

Para além destes factos, incorrectamente julgados nos termos supra referidos na alegação,, o tribunal a quo deveria ter ainda dado como provados os seguintes factos:

58º- A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 58º, a A. é devedora da R. da quantia de € 53.780,03 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 57º.
60º-A: Por falta de fundamento para a devolução das notas de débito id. em 60º, a A. é devedora da R. da quantia de € 101.795,80 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 59º.
62º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 62º, a A. é devedora da R. da quantia de € 136.767,54 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. Em 61º.
64º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 64º, a A. é devedora da R. da quantia de € 71.355,84 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 63º.
7. Para melhor sistematização e compreensão dos fundamentos do presente recurso, iremos primeiro abordar a matéria da Acção e só depois a da Reconvenção.

DA ACÇÃO

8. A douta sentença recorrida enferma, desde logo, de um manifesto erro no ponto III, ao começar por dizer que a enunciação das “questões a decidir” é feita pelo tribunal a quo nos seguintes termos: “Importa qualificar o contrato celebrado entre as partes e, subsequentemente, verificar do seu incumprimento quer pela Ré, em termos de faturação de trabalhos que não executou, quer pela Autora em termos de reembolso de despesas e encargos suportados pela Ré.”
9. Logo aqui, na enunciação das “questões a decidir”, é manifesto o desprezo do tribunal a quo pela reconvenção deduzida pela R., ignorando totalmente que, para além do contrato (de consórcio) que constitui a causa de pedir da acção, foram invocados, em reconvenção, um conjunto de créditos que resultam do incumprimento contratual da A., não só do contrato que constitui a causa de pedir da acção, mas também de outros contratos de consórcio que foram especificamente invocados em sede de reconvenção (vg. art.ºs 86.º, 90.º, 94.º e 98.º da contestação / reconvenção).
10. A que acresce o facto de o enunciado das questões a decidir não respeitar, sequer, os temas da prova que foram enunciados no despacho saneador.
11. Donde resulta que o enunciado das questões a decidir deveria ser alterado no sentido de passar a abranger toda a matéria da acção e da reconvenção, designadamente o incumprimento contratual da A. invocado pela R. em sede de reconvenção, e que abrange diversos contratos de consórcio celebrados entre A. e R., dos quais resultaram diversos créditos desta sobre aquela.
12. Isto posto, e debruçando-nos sobre cada um dos pontos da matéria de facto que se consideram incorrectamente julgados pelo tribunal a quo, constam da Fundamentação de

Facto os seguintes pontos:

35º A Autora questionou a Ré, se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu - Facto Provado.
A Ré apenas concordou com a alteração do projeto inicial, porque da mesma não decorria uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil - Facto não Provado.
13. Estes factos, apesar de corresponderem (parcialmente) à verdade, encontram-se incompletos ou deturpados, no sentido em que o tribunal a quo fez tábua rasa da prova produzida nos autos quanto à condição de que a R. fez depender a sua anuência à revisão e adaptação dos trabalhos da sua especialidade (construção civil) às propostas de alteração do projecto apresentadas pela A e que, sendo complementados com outros factos, alegados e provados em audiência, demonstram claramente em que condições é que a R. anuiu à alteração e revisão do projecto na componente de construção civil, dentro do contexto do contrato de consórcio e aditamento ao contrato de consórcio assinados por ambas em 22/09/2005 e 23/09/2005, respectivamente.
14. Conforme resulta do material probatório carreado nos autos, após a adjudicação da obra, a A. manifestou ao dono da obra o seu interesse e disponibilidade para proceder a alterações ao projecto base, alegando que o projecto variante decorrente dessas alterações serviria melhor os interesses do dono da obra, quer em termos de qualidade, quer em termos de eficiência de gestão.
15. E, em simultâneo, questionou a R. se em caso de aceitação do dono da obra do projecto variante, esta estaria na disposição de proceder à respectiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil).
16. Ao que a R. anuiu na condição de, após revisão e reorçamentação de projecto, não decorrer dessa alteração uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projecto já adjudicado, na componente de construção civil e que havia sido objecto do contrato de consórcio.
17. Nesta fase (Novembro de 2005), e conforme resulta dos pontos 32 e 33 dos Factos Provados, a A. apresentou um desenho individual para cada uma das quatro ETAR num total de setenta e duas peças desenhadas, dezoito por ETAR, as quais, conforme resultou do depoimento da testemunha Filipe, continham já um nível de detalhe suficiente (estudo prévio) para a R. proceder à reorçamentação dos trabalhos de construção civil.
18. Pelo que, após revisão e adaptação do projecto por parte da R., na componente da construção civil, esta procedeu à sua reorçamentação em face das alterações introduzidas, da qual resultou um valor dos trabalhos de construção civil de € 5.973.080,34 para o conjunto das quatro ETAR’s (Cfr. Docs. n.ºs 8 a 11 da Contestação). Isto é, mais € 63.078,92 em relação à orçamentação da componente de construção civil do projecto base (€ 5.910.001,42).
19. Tendo em conta a diferença de valor resultante da reorçamentação do projecto variante, por reporte à orçamentação do projecto base, a R. anuiu à execução do novo projecto na condição de não haver alteração no preço a receber, previsto na sua proposta inicial e no contrato de consórcio assinado, já que a diferença de preços entre o orçamento inicial (projecto base) e o reorçamento (projecto variante), no valor de € 63.078,92, se situava dentro da sua margem de risco comercial.
20. Razão pela qual, não obstante a anuência da R. à execução do projecto variante, não foi efectuada qualquer alteração ao contrato de consórcio, que a R. não aceitou, na medida em que ficou assente que cada parte executaria e facturaria os seus trabalhos de acordo com o preço e margem financeira prevista no contrato de consórcio para cada consorciada.
21. A intenção negocial e alcance da eficácia das disposições contratuais do consórcio encontra-se, aliás, bem demonstrada nas comunicações remetidas pela R. à A. que constituem os Docs. 111, 112 e 113 da Contestação, da qual resultam claros os princípios de risco contratual associados à alteração do projecto que ficaram definidos ab initio: cada parte era responsável por executar o novo projecto (variante) dentro dos valores que haviam sido definidos para cada uma na repartição resultante do projecto base.
22. Ou dito de outro modo, o risco contratual da gestão do novo projecto (variante) corria por conta de cada consorciada, sabendo ambas que o limite máximo de cada uma correspondia aos valores pré-definidos entre ambas no contrato de consórcio para a execução do projecto base.
23. Esta realidade foi confirmada em audiência, de forma absolutamente clara e objectiva, pelas testemunhas de ambas partes (A. e R.), que tiveram uma intervenção directa na negociação da alteração do projecto e reorçamentação, em particular pelas testemunhas Cristiano e Henrique, membros do COF, e sendo esta última a única testemunha pertencente aos quadros da A. que participou directamente e esteve presente nas reuniões onde a questão do projecto variante e respectiva reorçamentação foi colocada e discutida.
24. Nenhuma das demais testemunhas arroladas pela A. tiveram conhecimento directo desta negociação:

- A testemunha Francisco veio substituir a testemunha Henrique já numa fase final da obra, não tendo estado em nenhuma reunião inicial onde foram propostos e discutidos os termos da execução do novo projecto variante.
- A testemunha Maria limitou-se a participar na elaboração do orçamento da A.
- A testemunha César foi director de obra da parte da A., sem ter participado nem na fase de projecto, nem de orçamento, nem participado em qualquer reunião negocial.
- A testemunha Sónia limitou-se a fazer uma medição final de trabalhos, já depois concluídas as obras.
- Finalmente, a testemunha Elisabete é funcionária administrativa da A., não tendo participado jamais em qualquer reunião desta natureza.
25. Da concatenação da prova documental e testemunhal produzida em audiência, resulta cristalino que o pressuposto de a R. aceitar adaptar os trabalhos de construção civil ao novo projecto foi o de o valor inicial dos trabalhos de construção civil previsto no contrato de consórcio ser mantido.
26. A A. alicerça toda a pretensão deduzida nestes autos, única e exclusivamente, no alegado incumprimento pela R. da cláusula quarta, n.º 4 do contrato de consórcio (aditamento).
27. Segundo a interpretação da A., aquela disposição contratual confere-lhe o direito à revisão ou ajustamento de preços no final do contrato, tendo em consideração aquilo que cada uma executou. E, no caso de haver diferenças de trabalhos relativamente aos orçamentos parcelares iniciais, haveria lugar a uma espécie de direito de “revisão de preços”, “tornas” ou “direito de regresso” entre as partes.
28. Ora, esta interpretação não encontra o mais mínimo fundamento, nem no contrato de consórcio, nem no aditamento ao contrato de consórcio. As cláusulas do contrato de consórcio e do seu aditamento, relativas a este concreto (em particular a interpretação literal da própria cláusula quarta, n.º 4) apontam exactamente para a interpretação contrária.
29. Destacando-se, em particular, o teor das cláusulas 4.ª, n.ºs 4 e 5, e 5.ª, n.º 1, dos quais resulta claro que a determinação de percentagens de participação no consórcio apenas releva para efeitos de apuramento e repartição das despesas comuns do consórcio e não para qualquer ajustamento de contas sobre os trabalhos efectivamente executados por cada uma. Tendo esta interpretação sido totalmente corroborada pelas testemunhas ouvidas em audiência, com exemplos específicos de custos comuns para efeitos de reajustamento das percentagens de participação no consórcio.
30. Do acima exposto resulta que o ponto 35.º dos factos provados e o ponto 2.º dos factos não provados devem ser agregados num único facto provado, com a seguinte redação:

“35º A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu na condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.”
31. Debruçando-nos agora sobre a análise crítica dos pontos 42.º, 44.º, 46.º, 48.º, 49.º, 50.º e 54.º dos Factos Provados e sobre a prova produzida nos autos sobre tal matéria, também aqui iremos analisar em conjunto estes pontos, por estarem relacionados entre si e resultarem da conjugação dos mesmos meios de prova.
32. Salvo o devido respeito, a douta decisão recorrida não interpretou correctamente o relatório pericial, quer na componente da medição dos trabalhos de construção civil (da responsabilidade da R.), quer na componente dos equipamentos (da responsabilidade da A.), para além de desconsiderar totalmente os demais meios de prova produzidos nos autos quanto a esta matéria.
33. No seguimento da perícia realizada, foi feita uma medição dos trabalhos de construção civil (da responsabilidade da R.), não tendo sido feita qualquer medição ou valorização dos trabalhos de equipamentos executados pela A., por tal se mostrar impossível de efectuar.
34. No que respeita aos trabalhos de construção civil, a medição foi feita através da compaginação dos preços unitários previstos no orçamento inicial apresentado pela R. a concurso (projecto base) com as medições resultantes das telas finais (representação gráfica do projecto final).
35. Logo aqui nos deparamos com um erro de base que inquina toda a medição efectuada pelos senhores peritos: é que os preços unitários que os senhores peritos deveriam ter utilizado para efeitos de medição eram os preços unitários constantes da reorçamentação efectuada pela R. na sequência da apresentação do novo projecto (variante) e não os preços unitários constantes do orçamento inicial que serviu de base à elaboração da sua proposta a concurso público (feita muitos meses antes da reorçamentação, tendo por base o projecto base, e com preços unitários já fora de mercado na data da reorçamentação do projecto).
36. A que acresce o facto – assumido pelos próprios peritos em audiência – de que a medição efectuada foi a medição possível a partir de programas de orçamentação, tendo por base as telas finais e uma inspeção visual ao local das obras, mas que não contempla outros custos de produção que os próprios assumiram existir normalmente, mas que o relatório pericial não contempla (vg. diferentes metodologias de trabalhos, alterações de implantação de obras, variações de cotas, aterros e desaterros, custos de estaleiro, prorrogações de prazo, etc).
37. Dos esclarecimentos prestados em audiência pelos senhores peritos resulta que o método de medição utilizado foi o método possível e que, para além de não terem tido acesso a elementos essenciais pra efectuarem as suas medições (vg. mapas de medições), existem muitos custos associados à execução de uma obra que não podem ser quantificados a partir de uma mera medição de telas finais.
38. Dos depoimentos das testemunhas resultou claro que, para além de a medição do relatório pericial ter por base os preços do orçamento inicial (projecto base) e não os preços do reorçamento (projecto variante), existem erros de cálculo grosseiros no relatório pericial e o relatório não contempla, para além de outros, custos decorrentes da alteração de implantação das obras e de métodos de execução diferentes dos inicialmente orçamentados (e que serviram de suporte à medição dos senhores peritos).
39. Donde resulta que, não obstante a R. não pretender discutir, nesta sede, o resultado do relatório pericial na componente de construção civil (embora deturpado pela utilização dos preços do orçamento e não do reorçamento), certo é que ficou provado à exaustão que tal valor não representa com exactidão todos os custos incorridos pela R. na execução dos trabalhos, constituindo apenas um valor estimativo obtido a partir de uma medição efectuada muitos anos depois da obra concluída e a partir de uma mera representação gráfica constituída pelas telas finais, e sem poder contemplar todos os custos reais de produção.
40. Relativamente aos trabalhos executados pela A. (equipamentos e instalações mecânicas) a douta decisão recorrida fez uma errada interpretação da prova produzida nos autos (designadamente do relatório pericial) ao dar como provados factos e valores que, de forma alguma, podem ser dados como provados em face da prova produzida.
41. É verdade que no mapa comparativo anexo ao Relatório Pericial é referenciado um valor de € 7.361.396,86 referente à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque).
42. No entanto, trata-se de um valor que os senhores peritos, inadvertidamente, colocaram na tabela mas que não deveriam ter lá colocado. Pois, conforme resulta do próprio relatório pericial, os senhores peritos não efectuaram qualquer medição ou valorização dos equipamentos e instalalações mecânicas, tendo-se limitado a colocar no mapa o valor indicado pela própria A. na PI.
43. Com efeito, em resposta ao quesito 2 do Relatório Pericial, os senhores peritos afirmam que:

“Relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas não é possível apurar o seu exato valor na medida em que os elementos da solução inicial são distintos dos elementos da solução efetivamente executada. A determinação do respetivo valor de mercado reveste-se de uma dificuldade e de limitações consideráveis inerentes à especificidade de cada obra cuja solução técnica é composta por inúmeros equipamentos sempre distintos em função das soluções de tratamento adotadas, das respetivas marcas e fabricantes, dos caudais/cargas poluentes, da topografia do local de implantação, entre outros. Os valores dos equipamentos e instalações mecânicas considerados no Mapa Comparativo em anexo ao presente relatório correspondem integralmente aos valores reclamados pela Autora X, sendo que pelas razões anteriormente descritas os Peritos não puderam apurar com rigor os respetivos valores de mercado.”
44. E, logo a seguir, em sede de esclarecimentos ao Relatório Pericial, os senhores peritos vêm reiterar o já mencionado no Relatório Pericial, acrescentando, em complemento, as seguintes considerações:
“3.1. – No que diz respeito aos esclarecimentos / complementos solicitados pela Autora, esta facultou aos Peritos um conjunto de documentos consistindo numa folha de cálculo que expressa a comparação entre o preço faturado de cada artigo e o respetivo custo de aquisição / fabrico, complementada com os inerentes documentos contabilísticos que supostamente suportam parte dos valores aí considerados. Isto relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas que sofreram alteração em relação ao projeto inicial e que acabaram por ser fornecidos e instalados nas obras em causa. Nos restantes foram mantidos os valores contratuais.
45. Relativamente à documentação referida, os Peritos apresentam as seguintes considerações:

3.1.1. – A folha de cálculo e os anexos apresentados permitem identificar margens de lucro muito variáveis entre os vários artigos analisados, cuja média corresponde a cerca de 23%.
3.1.2. – No que diz respeito à validação da quantificação de custos internos reclamados e da correspondência entre os documentos contabilísticos apresentados e os equipamentos e as obras em causa, os peritos consideram encontrar-se fora do âmbito das suas competências.
3.1.3. – Independentemente da validação referida no ponto anterior, os Peritos não podem confirmar se existe enquadramento nos valores de mercado pelas razões já referidas no Relatório de Peritagem (…)”.
46. Finalmente, em sede de audiência de julgamento, os senhores peritos confirmaram o vertido no Relatório Pericial e respectivos esclarecimentos, reforçando ainda mais as razões pelas quais não efectuaram qualquer medição dos equipamentos e instalações mecânicas.
47. Donde resulta que, ao contrário do que parece indiciar a tabela comparativa, o valor dos equipamentos lá aposto não resulta de qualquer medição feita aos equipamentos que, aliás, de acordo com os próprios peritos, tal medição não é possível de ser feita, nem por eles nem por ninguém, já que se tratam de equipamentos de fabrico exclusivo da A. e feitos especificamente para aquelas obras, sem qualquer valor de mercado susceptível de quantificação.
48. Em suma, duas conclusões se podem extrair do Relatório Pericial e esclarecimentos prestados pelos senhores peritos, por escrito e em audiência:

1.ª - Relativamente aos trabalhos de construção civil, apesar de ter sido possível proceder à medição dos trabalhos e daí ter resultado um valor de € 5.378.331,78, existem muitos outros custos de produção associados à execução desses trabalhos, que não é possível aferir a partir da mera medição efectuada a partir das telas finais.
2.ª - Relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas, não foi possível nem efectuar qualquer medição, nem sequer apurar um valor aproximado de mercado, sendo certo que para o valor apontado pela A. (€7.361.396,86) foi possível apurar, a partir dos elementos contabilísticos analisados, uma margem de lucro média de 23%.
49. Ou seja, relativamente aos trabalhos de construção civil, não só a medição foi efectuada a partir dos preços unitários do orçamento inicial (e não do reorçamento, como deveria), como o valor apurado a partir desses elementos não pode ser considerado como exacto, na medida em que existem muitos outros custos de produção que a medição efectuada não é susceptivel de avaliar.
50. Já relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas, por se tratarem de equipamentos exclusivos da própria A. e feitos à medida para estas obras, não é possível medi-los nem apurar o seu valor de mercado, verificando-se porém uma margem muitíssimo relevante de lucro a partir dos elementos contabilísticos analisados pelos senhores peritos (23%).
51. O que significa que mesmo só considerando o valor apontado pela própria A. como correspondendo ao valor real dos seus trabalhos (€7.361.396,86), o custo real dos trabalhos da responsabilidade da A. foi, afinal, de € 5.984.875,50 (€7.361.396,86 – 23%). Ou seja, menos € 386.329,45 (€ 6.371.204,95 - € 5.984.875,50).
52. O que vale por dizer que, ao contrário daquilo que alegou, a A. não executou mais trabalho que o previsto na sua proposta inicial, antes tendo executado menos trabalho no valor de, pelo menos, € 386.329,45.
53. E, portanto, se é verdade que a partir da medição dos trabalhos de construção civil resulta aparentemente um menor custo para a R. no valor de € 548.756,99 por reporte à sua proposta contratual, certo é que a partir da análise dos mapas e registos contabilísticos fornecidos pela própria A. aos senhores peritos, se verifica um menor custo de € 386.329,45 relativamente à sua proposta contratual.
54. E sem prejuízo de o relatório pericial ser claríssimo quanto à não medição dos trabalhos da responsabilidade da A. (equipamentos e instalações mecânicas), caso ainda assim persistisse alguma dúvida, sempre teria de se lançar mão das regras gerais sobre a repartição do ónus da prova.
55. Nos termos do art.º 340.º do Código Civil, àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado. A R. impugnou o valor indicado pela A. na sua PI relativamente ao alegado custo com a componente dos equipamentos, não tendo a A. logrado fazer prova dos factos constitutivos do seu direito.
56. E caso houvesse alguma dúvida quanto à interpretação do relatório pericial nesta parte – e cremos que não pode haver – ainda assim sempre deveria esse facto ser dado como não provado ao abrigo do disposto no art.º 414.º do CPC.
57. Seja como for, o certo é que, conforme supra foi referido, independentemente do custo ou da margem de lucro de cada empresa na execução dos trabalhos da sua responsabilidade, foi celebrado um contrato de consórcio que define claramente o valor a facturar por cada parte e o risco contratual associado a cada parte. Sendo que, não obstante a alteração do projecto após a adjudicação, as partes não alteraram o contrato de consórcio, que se mantém inalterado nas suas condições e previsões contratuais até hoje.
58. Resulta de tudo o exposto que a factualidade supra referida, dada como provada pela douta sentença recorrida, deverá ser alterada, ajustando os factos provados à prova efectiva produzida nos autos, o que determina que os mesmos devam passar a ter a seguinte redação:

42º (Na ETAR A) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.501.151,68 € na componente de construção civil e um valor de 96.650,26 € no acerto de trabalhos e quantidades, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
44º (Na ETAR B) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.314.247,57 €, na componente de construção civil, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
46º (Na ETAR C) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.438.276,21 € na componente de construção civil e um valor de 150.145,01 € no acerto de trabalhos e quantidades, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
48º (Na ETAR D) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 877.861,06 €, na componente de construção civil, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
49º No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi medida, a partir das telas finais, a quantia de 5.378.331,78 € (- € 548.756,99).
50º No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 €, e apesar de não ter sido possível quantificar o respectivo valor a partir das telas finais, foi possível apurar, a partir de outros elementos, uma margem média de lucro de 23% relativamente aos equipamentos instalados (- € 386.329,45).
59. E, em consequência (apesar de se tratar de uma conclusão e não de um facto), deve ser dado como não provado o ponto 54.º dos Factos Assentes:

54º A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.
60. Feita a necessária correção dos factos assentes, cumpre agora apreciar o regime e enquadramento jurídico aplicável aos factos provados e não provados, supra referidos.
61. A douta sentença recorrida assenta toda a sua fundamentação na seguinte premissa: “A questão centra-se, pois, em saber se a Ré faturou mais do que aquilo que executou ou se a Autora não foi competente na gestão dos custos, faturando para além do valor que tinha disponível” (sic)
62. À qual dá, singelamente, a seguinte resposta: “Seja qual for a posição da Ré em face da interpretação a dar à harmonização das alterações do projeto com a percentagem de participação contratual, o que não é aceitável é que execute obra no valor de 5.378.331,78 € e fature e receba o valor de 5.917.717,73 €.”
63. Ora, salvo o devido respeito (que é muito), quer a premissa, quer a resposta formuladas pelo tribunal a quo não estão correctas, do ponto de vista do enquadramento juridicocontratual em discussão nestes autos.
64. Em primeiro lugar, trata-se de uma enunciação que viola flagrantemente os temas da prova elaborados aquando da prolação do despacho saneador. E, por outro lado, o tribunal a quo alicerça toda a sua fundamentação como se a relação contratual existente entre A. e R., tivesse por base um contrato de empreitada e não um contrato de consórcio (!).
65. Sendo certo que, para além de se tratarem de tipos contratuais com regimes jurídicos completamente diferentes, as partes contratantes e o risco negocial e contratual associado a cada tipo de contrato é totalmente distinto.
66. Com efeito, a questio decidendi não consiste em saber se a Ré “faturou mais do que aquilo que executou” mas sim em saber se a Ré “faturou mais do que aquilo que estava convencionado faturar ao abrigo do contrato de consórcio celebrado entre A. e R.”.
67. Conforme decorre dos Factos Provados (pontos 5.º e 8.º), entre A. e R. (agrupadas em consórcio) foi celebrado um contrato de consórcio, assinado em 22 de Setembro de 2015 (Doc. 1 P.I.), e um aditamento ao mesmo contrato, celebrado em 23 de Setembro de 2015 (Doc. 2 P.I.)
68. E entre A. e R. (consórcio adjudicatário) e a sociedade “Águas N”, foi celebrado, em 30 de Novembro de 2015, um contrato de empreitada, no qual aquelas figuravam como Empreiteiro e esta como Dona da Obra (ponto 19.º dos Factos Assentes - Doc. 3 P.I.).
69. Ao contrato de consórcio celebrado entre A. e R. é aplicável o Decreto - Lei nº 231/81, de 28 de Julho. E ao contrato de empreitada celebrado entre o consórcio e o dono da obra é aplicável o Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março.
70. O regime do contrato de empreitada de obras públicas é, por definição, imperativo (art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março). Pelo contrário, as cláusulas do contrato de consórcio são, na sua maioria, estabelecidas livremente pelas partes (cfr. art.º 4.º, n.º 1 do Decreto - Lei nº 231/81, de 28 de Julho).
71. No contrato de consórcio, foi livremente convencionado, no que à questão sub judice respeita, que:
- “As consorciadas facturarão e receberão directamente do Dono de Obra o valor dos respectivos trabalhos” (cláusula 9.ª).
- “As consorciadas prestarão individualmente as garantias exigidas pelo Dono de Obra segundo a proporção estabelecida no número anterior” (cláusula 8.ª, n.º 2).
- Cfr. Ponto 14.º dos Factos Assentes.
72. Tendo sido ainda convencionado, no aditamento ao contrato de consórcio o seguinte:

- “ (…) as signatárias não constituem qualquer pessoa ou entidade jurídica distinta das próprias consorciadas, nem estabelecem entre si qualquer vínculo do tipo societário ou forma de associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico” (Cláusula 2.ª, n.º 2).
- “Os trabalhos e tarefas necessários à execução da empreitada em conformidade com os termos do respectivo contrato serão repartidos entre as signatárias tendo em conta as respectivas especialidades (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 1).
- “Havendo dúvidas ou divergências quanto à distribuição entre as consorciadas de quaisquer trabalhos a mais, trabalhos complementares ou outros trabalhos adicionais de qualquer natureza, competirá ao Conselho de Orientação e Fiscalização efectuar essa distribuição, atendendo às especialidades de cada consorciada (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 2).
- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas” (Cláusula 4.ª, n.º 4).
- “O disposto no presente contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, nem visa a constituição de qualquer fundo comum, apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas” (Cláusula 4.ª, n.º 5).
- “Cada consorciada suportará todos os custos e despesas inerentes à execução dos trabalhos que lhe estejam atribuídos, bem como, na correspondente percentagem, as despesas e custos que, atendendo à respectiva natureza ou em consequência de acordo unânime das signatárias, sejam expressamente qualificadas como comuns a todas elas neste contrato, nos seus eventuais aditamentos, ou por deliberação do COF” (Cláusula 5.ª, n.º 1).
- “ (..) são, nomeadamente, obrigações das consorciadas: a) Executar todos os trabalhos da empreitada que lhe estão ou venham a estar cometidos segundo a repartição prevista na cláusula 4ª, supra, incluindo todos os fornecimentos de materiais, equipamentos, meios humanos, instalações, ensaios, formação e treino, supervisão, gestão e controlo, trabalhos temporários ou provisórios que se revelem necessários para a boa execução e completo acabamento dos mesmos trabalhos, em conformidade com os termos e condições do contrato de empreitada e com as alterações que venham a ser licitamente impostas ou acordadas com o Dono da Obra” (Cláusula 6.ª, n.º 1).
- “Cada uma das signatárias será plena e exclusivamente responsável pela perfeita e pontual execução de todos os trabalhos e tarefas que estão a seu cargo e pelo integral cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo consórcio relativas aos mesmos nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra” (Cláusula 7.ª, n.º 3).
- “São da exclusiva responsabilidade de cada uma das consorciadas a organização e orientação da sua própria actividade com vista à execução dos trabalhos que lhe competem, e bem assim todos os encargos daí resultantes e as receitas que lhe correspondam, nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra.” (Cláusula 13.ª).
- “As consorciadas facturarão e receberão directamente do Dono da Obra o valor dos respectivos trabalhos repartidos conforme o disposto na cláusula 4ª” (Cláusula 14.ª, n.º 1).
- “Em tudo o mais que não estiver aqui previsto e sem prejuízo das remissões expressas para outros diplomas, o presente contrato reger-se-á pelo disposto no Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de Julho, quanto às relações entre signatárias e ao funcionamento do consórcio e pelo disposto no Decreto-Lei nº 59/99 de 2 de Março no que respeita à definição das condições que as consorciadas estão obrigadas a observar na execução da empreitada” (Cláusula 22.ª).
-Cfr. Ponto 15.º dos Factos Assentes.
73. Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir qualquer dos objectos referidos no artigo 2.º do Decreto - Lei nº 231/81, de 28 de Julho.
74. No caso sub judice, estamos perante um consórcio externo, no qual as actividades ou os bens são fornecidos directamente a terceiros por cada um dos membros do consórcio, com expressa invocação dessa qualidade (vide nº 2 do citado normativo legal).
75. O consórcio é uma mera associação sem personalidade jurídica própria, formado por pessoas jurídicas distintas, cada qual com a sua autonomia e responsabilidade, sendo os membros que o integram (consorciados) directa e pessoalmente responsáveis pelas obrigações que assumam perante terceiros, sendo as cláusulas do contrato, na sua maioria, estabelecidas livremente pelas partes (cfr. art.º 4.º, n.º 1 do diploma legal citado).
76. Ora, no contrato e aditamento ao contrato de consórcio A. e R. convencionaram expressamente que cada um deles seria o único e pleno responsável pela realização das prestações a que se vincularam na proposta contratual, atendendo ao critério da especialização: cada consorciado executaria e receberia do dono da obra os trabalhos da sua especialidade, correndo o risco dos trabalhos de construção civil por conta da R. e dos equipamentos por conta da A.
77. Constituem corolário desse princípio, para além do demais, as cláusulas 8ª e 9ª do contrato de consórcio e as cláusulas 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª e 14ª do aditamento ao contrato de consórcio.
78. Donde decorre que, nos termos do contrato de consórcio, A. e R. seriam individualmente responsáveis pela execução, facturação e recebimento dos respectivos trabalhos junto do dono da obra (“conforme o disposto na cláusula 4ª”), suportando cada qual as despesas comuns de funcionamento do consórcio de acordo com a percentagem de trabalhos por si executados, tendo por referência o valor global do contrato de empreitada.
79. Conforme supra foi referido, durante a fase de execução dos trabalhos que constituíam o objecto do contrato de empreitada, foram introduzidas, por iniciativa da A., alterações ao projecto que determinaram a necessidade de execução de trabalhos adicionais por parte de ambas as consorciadas.
80. Tais alterações são legítimas pois, como determina o art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, “Em qualquer momento dos trabalhos, o empreiteiro poderá propor ao dono da obra variantes ou alterações ao projecto relativamente a parte ou partes dele ainda não executadas”.
81. E nos termos do n.º 2 do mesmo artigo e diploma legal, “Tais variantes ou alterações obedecerão ao disposto no presente diploma sobre os projectos ou variantes apresentados pelo empreiteiro, mas o dono da obra poderá ordenar a sua execução desde que aceite o preço global ou os preços unitários propostos pelo empreiteiro ou com este chegue a acordo sobre os mesmos”.
82. O que sucede é que após a revisão do novo projecto proposto pela A., a R. efectuou a sua reorçamentação e declarou aceitar a adaptação e execução dos trabalhos de construção civil de acordo com o novo projecto, por se conter dentro da sua margem de risco comercial, não tendo porém aceitado fazer qualquer alteração ao contrato de consórcio.
83. Donde resulta que, a R. aceitou reorçamentar e adaptar os trabalhos de construção civil ao novo projecto proposto pela A., mas desde que daí não resultasse qualquer alteração nos direitos e obrigações já convencionados no contrato de consórcio celebrado entre ambas.
84. Por isso, e só por isso, é que não foi alegado nem demonstrado nos autos que tenha havido qualquer alteração ou aditamento adicional ao contrato de consórcio, para além daquele que já havia sido assinado em 23/09/2005.
85. E, não tendo havido qualquer alteração ou aditamento ao contrato de consórcio, resulta inequívoco que a R. tinha direito a faturar o que faturou, por ser esse o direito que lhe decorre da cláusula 9.ª do Contrato de Consórcio e das cláusulas 4.ª, n.º 1 e 14.ª e do Aditamento ao Contrato de Consórcio.
86. O contrato de consórcio e respectivo aditamento não foram objecto de qualquer alteração ou aditamento na sequência da proposta e reorçamento do novo projecto variante apresentado pela A.
87. Nos termos do n.º 1 da cláusula 6.ª do Decreto - Lei nº 231/81, de 28 de Julho “As modificações do contrato de consórcio requerem o acordo de todos os contraentes, excepto se o próprio contrato o dispensar”, sendo que “As modificações devem revestir a forma utilizada para o contrato.”
88. Ora, para além de o contrato de consórcio não dispensar essa formalidade, certo é que não foi acordada ou assinada qualquer alteração ao contrato de consórcio entre as partes, estando por isso em vigor as suas disposições originárias.
89. Do exposto resulta, clara e inequivocamente, que as partes convencionaram livremente que cada uma delas era plenamente responsável pela execução dos trabalhos da respetiva especialidade, facturando e recebendo do dono da obra o valor dos seus trabalhos, de acordo com a repartição prevista no contrato de consórcio (cláusula 4.ª, n.º 1) e sem que entre elas existisse qualquer affectio societatis.
90. A douta sentença recorrida refere, a este propósito, que “Mantendo o respeito pelo firmado nos contratos de consórcio e de empreitada, não pode a Ré enjeitar o acordo dado às alterações do projeto, tanto que executou a obra em conformidade com as mesmas. Bem vistas as coisas, a Ré aceita o projeto alterado, cumpre o que nele está definido, atua conformemente ao mesmo, mas rejeita-o na parte do preço a receber, repristinando nesta parte o projecto inicial.”
91. Ora, foi exactamente isso que sucedeu. Só que essa posição da R. é totalmente legítima e está suportada por um direito que lhe advém do contrato de consórcio celebrado com a A., o qual não foi objecto de qualquer alteração e que lhe permite receber, pelos trabalhos que executou, a quanto nele prevista.
92. A douta sentença remata dizendo apenas que “Para o caso, o que verdadeiramente importa é que a Ré executou obra no valor de 5.378.331,78 € e faturou e recebeu no valor de 5.917.717,73 €. A Ré recebeu mais 539.385,95 € do que lhe era devido.”
93. Só que, para além de tal não corresponder à verdade, o que para o caso verdadeiramente importa é saber se a R. recebeu ou enriqueceu à custa da A. para além daquilo que estava previsto no contrato de consórcio.
94. E a resposta é não! A R. recebeu aquilo a que tinha direito de acordo com o contrato de consórcio e a A. recebeu aquilo a que a que tinha direito de acordo com o contrato de consórcio. Se cada uma delas teve lucro ou prejuízo nos trabalhos que executou, tal faz parte do risco do seu negócio e do contrato a que ambas livremente se vincularam – como sucede, aliás, com os milhares de consórcios e parcerias que diariamente são celebrados entre empresas, tendo em vista a execução de projectos comuns.
95. Não é demais voltar a reforçar, neste ponto, que a fonte da obrigação ínsita nestes autos é um contrato de consórcio (e não um contrato de empreitada), em que as partes estabeleceram livremente as suas cláusulas, cujo teor se manteve absolutamente inalterado nos seus termos e condições, não obstante as alterações verificadas no projecto que lhe serviu de base.
96. No regime do contrato de empreitada, as partes (dono da obra e empreiteiro) devem, no final do contrato, elaborar uma conta final da empreitada, procedendo ao ajustamento do preço em função dos trabalhos efectivamente executados e medidos (art.º 221.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março).
97. Pelo contrário, no contrato de consórcio, as condições da parceria são livremente estabelecidas no início do contrato entre os consorciados e mantêm-se inalteradas, salvo se ambas as partes estiverem de acordo em alterá-las durante a execução do contrato, de forma unânime e expressa (art.º 4.º, n.º 1 e art.º 6.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho).
98. Ora, no caso sub judice, resulta de meridiana clarividência que, não obstante as alterações propostas e aceites ao projecto base, não houve qualquer acordo (unânime e expresso) no sentido de alterar as disposições vigentes do contrato de consórcio.
99. A vontade das partes resulta, aliás, muito clara e inequívoca da conjugação de toda a prova:

a) Da R. que ficou com a expectativa de facturar e receber o mesmo que estava previsto no contrato de consórcio, por a diferença caber na sua margem de risco comercial.
b) Da A. que, ao propor como propôs alterações ao projecto, sabendo que nem o dono da obra aceitava pagar mais nem a R. receber menos, tinha naturalmente a expectativa de lograr, em fase de execução, uma optimização do projecto que lhe permitisse aumentar a sua margem de lucro relativamente à sua proposta inicial (o que, aliás, aparentemente sucedeu).
100. Do ponto de vista da A. a causa de pedir da acção tem na sua base o alegado incumprimento da cláusula 4.ª, n.º 1 do aditamento ao contrato de consórcio, segundo a qual (na interpretação da A.), as percentagens de participação no consórcio deveriam ser, a final, apuradas para efeitos de eventuais ajustamentos no preço entre as agrupadas.
101. Só que, para além de ser evidente que não é esse o sentido da cláusula, pelos motivos supra expostos, a verdade é que não tendo sido possível apurar com exactidão o volume e o preço dos trabalhos executadas por ambas as consorciadas (vg. Dos equipamentos), não se alcança sequer como é possível reajustar as percentagens aí previstas, posto que tal operação aritmética sempre dependeria do apuramento exacto do volume e preço dos trabalhos executados por ambas as consorciadas. O que in casu manifestamente não sucedeu.
102. Pelo que, independentemente do volume de trabalhos executados a final pelas partes, não tendo havido qualquer alteração do contrato de consórcio no seguimento das alterações ao projecto, nada há a rectificar ou reajustar entre as partes para além daquela que resultar do ajustamento dos custos comuns por elas suportados.
103. Resulta de tudo o exposto que a factualidade assente na fundamentação de facto supra referida deverá ser alterada, ajustando os factos à prova efectivamente produzida nos autos, o que determina que os mesmos devam passar a ter a seguinte redação:

Factos Provados:

35º A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu na condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil. (unificação dos pontos 35.º dos Factos Provados e 2.º dos Factos Não Provados).
42º (Na ETAR A) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.501.151,68 € na componente de construção civil e um valor de 96.650,26 € no acerto de trabalhos e quantidades, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
44º (Na ETAR B) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.314.247,57 €, na componente de construção civil, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
46º (Na ETAR C) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 1.438.276,21 € na componente de construção civil e um valor de 150.145,01 € no acerto de trabalhos e quantidades, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
48º (Na ETAR D) Das medições extraídas das telas finais foi apurado um valor de 877.861,06 €, na componente de construção civil, não tendo sido possível quantificar os equipamentos e os trabalhos durante o período de arranque.
49º No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi medida, a partir das telas finais, a quantia de 5.378.331,78 € (- € 548.756,99).
50º No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 €, e apesar de não ter sido possível quantificar o respectivo valor a partir das telas finais, foi possível apurar, a partir de outros elementos, uma margem média de lucro de 23% relativamente aos equipamentos instalados (- € 386.329,45).
55º–A: Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do Doc. n.º 111 da Contestação.
55º–B: Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do Doc. n.º 112 da Contestação.
56º–A: Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta com o teor que consta do Doc. n.º 113 da Contestação.
104. E, em consequência (apesar de se tratar de uma conclusão e não de um facto), deve ser dado como não provado o ponto 54.º dos Factos Assentes :

Factos Não Provados:

54º A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.
105. Em consequência da alteração da matéria de facto nos termos acima expostos, deve a acção ser julgada totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se a R. do pedido.

Por fim,

106. Relativamente aos juros de mora, a douta sentença recorrida considerou que os mesmos são devidos a partir de 20 de Julho de 2010, por considerar que o documento de fls. 43 e 44 corresponde a interpelação para pagamento.
107. Nos termos do n.º 1 do art.º 805.º do Código Civil, o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. Contudo, nos termos do n.º 3 do normativo legal citado, “Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor”.
108. Através da carta supra referida, a A. alegou ter prestado “serviços de valor superior a € 800.000,00, que não constavam do projecto inicial” (?). A essa missiva da A. respondeu a R. nos termos da carta junta sob Doc. 113 da Contestação. Por seu turno, na PI a A. veio reclamar da R. um crédito de € 909.535,65, correspondente a alegado “custo adicional” incorrido pela A. na execução dos trabalhos que lhe competiam de acordo com o contrato de consórcio. Em sede de instrução, foi realizada perícia colegial que liquidou em € 595.198,87 o alegado “benefício” da R. E, finalmente, após pedidos de esclarecimentos dos senhores peritos, tal quantia foi liquidada em € 548.756,99.
109. Resulta do exposto que em 20 de Julho de 2010 não existia qualquer obrigação certa, exigível e líquida, e ainda que se possa considerar – por mera hipótese de raciocínio
– que naquela data a obrigação pudesse ser considerada certa, não pode haver qualquer dúvida que a mesma sempre seria ilíquida, na medida em que o respectivo montante não se encontrava ainda fixado, o que sucedeu apenas através da prolação da douta sentença recorrida.
110. Quer a doutrina, quer a jurisprudência são unânimes nesta matéria, destacando-se, a título meramente exemplificativo, os Ac. STJ de 28/01/1997 (Proc. 422/96), Ac. STJ de 23/03/69, Bol. 185, pág 232; Ac. STJ de 06/12/84, Bol. 342, pág. 375º; Ac. STJ de 11/07/85, Bol. 349, pág. 460; Ac. STJ de 21/02/93, CJSTJ, I, 3º, pág. 19; e Ac. STJ de 28/05/91, in BMJ, nº 407, pág. 466.
111. Com efeito, perante a iliquidez da obrigação, manifestamente só após a liquidação do seu montante, o devedor sabe quanto há-de pagar - in iliquidis non fit mora -, donde só a partir daí serem devidos juros.
112. E ainda que assim não se entendesse – o que só por mera hipótese de raciocínio se concebe -, sempre se deveria aplicar o disposto no art.º 237.º do Código Civil, dando à condenação em juros um sentido que conduzisse ao "maior equilíbrio das prestações" (cfr. cit. Ac. STJ de 28 Jan. 1997 - Processo 422/96).
113. Em conclusão, a existir alguma obrigação da R. – que, como vimos, não existe – a mesma só se tornaria certa, líquida e exigível com a prolação da douta sentença recorrida, pelo que os juros de mora, a existirem, só poderiam ser devidos a contar da data do trânsito em julgado da decisão que liquidou a obrigação numa quantia certa.
114. Em suma, no que concerne à matéria da acção, a douta decisão recorrida deve, manifestamente, ser revogada e substituída por outra que absolva totalmente a R. do pedido.

DA RECONVENÇÃO

115. No que concerne à reconvenção, a douta sentença recorrida, para além da errada interpretação dos factos, ignorou totalmente as confissões expressas de factos feitas pela A., nos articulados e na própria audiência de julgamento, violando o princípio da aquisição processual e desvirtuando a decisão final, que não encontra a mínima correspondência com a alegação e prova produzida nos autos.
116. A que acresce o facto de, sem prejuízo do exposto, a decisão final estar em manifesta contradição com os factos provados.
117. No que concerne à matéria de facto, são os seguintes os concretos pontos de facto com os quais a Recorrente não concorda:

“66º As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.“
- Este facto (dado como provado) deve ser considerado não provado.
“3º A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97
- Este facto (dado como não provado) deve ser considerado provado.
118. Os factos constitutivos do direito de crédito invocado pela R. em reconvenção foram alegados, concreta e taxativamente, nos artigos 86.º a 108.º da contestação / reconvenção.
119. Aí foi alegada a natureza do crédito da R. sobre a A., a fonte da obrigação subjacente (contratual), os montantes parcelares e globais do crédito e os respectivos elementos documentais de suporte (facturas e notas de débito), os quais se encontram, individual e especificamente, discriminados nos artigos 86.º a 102.º da Reconvenção.
120. Todos os factos se encontram sustentados, desde logo, pela vasta prova documental junta com a Reconvenção (Documentos n.º 114 a 161).
121. R. alegou em sede de reconvenção, os factos constitutivos do seu direito de crédito sobre a A.: despesas comuns e encargos com meios de produção, mão-de-obra e equipamentos, e ainda management fee, suportadas pela R. nos termos dos contratos de consórcios e respectivos aditamentos concretamente celebrados com a A. para cada empreitada aí identificada.
122. E juntou aos autos os seguintes documentos de prova do alegado (Docs. n.º 114 a 161):
- Contratos de Consórcio
- Aditamentos aos Contratos de Consórcio
- Faturas e documentos de suporte anexos (vg. autos de medição de trabalhos)
- Notas de débito e documentos de suporte (vg. de despesas debitadas por terceiros).
123. Sobre a matéria da reconvenção pronunciaram-se as seguintes testemunhas da R.:
- Manuel, engenheiro civil, que foi inquirido sobre a matéria do crédito da R. referente às empreitadas id. no art.ºs 86.º e 90.º da Reconvenção.
- Filipe, engenheiro civil, que foi inquirido sobre a matéria do crédito da R. referente às empreitadas id. no art.ºs 90.º, 94.º e 98.º da Reconvenção.
- Luís, técnico oficial de contas, que foi inquirido sobre a matéria do crédito da R. referente às empreitadas id. no art.ºs 86.º, 90.º, 94.º, 98.º e 102.º da Reconvenção.
124. As sobreditas testemunhas, arroladas pela R., com conhecimento directo dos factos em discussão, pronunciaram-se de forma clara, objectiva e específica sobre cada contrato, cada factura e cada documento de suporte do crédito invocado pela R. sobre a A.
125. Porém, a A. não arrolou uma única testemunha que, com conhecimento directo dos factos, tivesse prestado depoimento a infirmar o crédito da R. sobre a A. ou os seus documentos de suporte.
126. Do conjunto das 40 (quarenta) facturas e notas de débito que titulam o crédito da R. sobre a A., e que foram dadas como provadas, a A alegou, em sede de réplica, ter procedido à devolução de 6 (seis) notas de débito, alegando não concordar, total ou parcialmente, com o respectivo valor.
127. No entanto, jamais a A. ou as suas testemunhas colocaram em causa a existência do crédito da R. ou a sua natureza, rejeitando apenas ser devido o respectivo valor na sua totalidade.
128. Com excepção dessas 6 (seis) notas de débito – identificadas nos factos 58.º, 60.º, 62.º e 64.º dos Factos Provados – a A. não só não impugnou as demais 36 (trinta e seis) facturas emitidas pela R. à A. e que constam da reconvenção, como inclusivamente confessou o crédito da R. nessa parte.
129. Com efeito, depois de se pronunciar sobre os motivos da devolução das 6 notas de débito supra referidas (art.ºs 7.º a 26º da Réplica), a A. confessou ser devedora da R. do montante de € 232.007,23 (art.ºs 27.º e 41.º da Réplica).
130. E embora sendo certo que a A. veio invocar um contra-crédito sobre a R., para efeitos de compensação, certo é que a A. não produziu nos autos qualquer prova do alegado contra-crédito:

- Não existe nem foi junto aos autos qualquer documento que prove o alegado contracrédito da A. sobre a R., nem qualquer documento em que a R. reconheça qualquer crédito da A.
- Nenhuma das testemunhas arroladas pela A., ouvidas em audiência de julgamento, depuseram ou se pronunciaram sobre o alegado contra-crédito invocado pela A. na Réplica.
131. O que, de resto, bem se entende, já que a R. não é devedora da A. de qualquer quantia.
132. Pelo contrário, conforme expressamente confessado, é a A. devedora da R., não só do montante por si confessado (€ 232.007,23), mas sim do valor total reclamado pela R. em reconvenção (€ 370.087,61), conforme se encontra cabalmente demostrado através dos documentos juntos aos autos, e também pela prova testemunhal produzida em audiência.
133. Mas o tribunal a quo, não só ignorou a confissão feita pela A. nos articulados, como também ignorou a confissão feita pela A. em audiência de julgamento.
134. Com efeito, a douta sentença recorrida deu como não provado o seguinte facto:

“3º A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97
135. Este facto corresponde ao facto alegado pela R. no art.º 102.º da Reconvenção, e trata-se de crédito da R. sobre a A. cuja existência, apesar de não negada na Réplica, foi, porém, aí invocado ainda não se encontrar vencida nessa data, por corresponder a retenção de preço para acautelar a correção de defeitos durante o período de garantia, não tendo ainda o mesmo decorrido e não havendo ainda recepção definitiva por parte do dono da obra aqui em causa (cfr. art.ºs 24.º, 25.º e 26.º da Réplica).
136. Porém, na sessão da audiência de julgamento que teve lugar em 10 de Julho de 2017, a A. confessou que tal quantia se encontra vencida desde 1 de Setembro de 2016.
137. Conforme se pode verificar na acta da audiência de julgamento de 10/07/2017, aí ficou lavrado o seguinte: “Consigna-se que a autora aceita a fatualidade constante do artº. 102º da contestação/reconvenção da ré no sentido que o crédito encontra-se entretanto vencido (vencimento ocorrido a 1 de setembro de 2016)”.
138. Trata-se de confissão expressa, feita pela A. em audiência de julgamento, que tem como consequência que tal facto deva ser considerado provado.
139. Pelo que, o ponto 3.º dos Factos não Provados deve passar a constar do elenco dos Factos Provados, considerando-se provado que:

“A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97
140. Nos termos do art.º 607.º, n.º 5 do C.P.C., “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”
141. Ora, conforme supra foi referido, o crédito reconvencional da R. resulta de confissão judicial expressa feita pelas partes nos articulados, nos termos dos art.ºs 46.º e
465.º, n.º 2 do C.P.C. pelo que, nessa medida, trata-se de matéria subtraída à livre apreciação do tribunal.
142. Por isso, ao decidir como decidiu, não reconhecendo um crédito que foi objecto de confissão pela parte contra quem aproveita, o tribunal a quo violou os limites da livre apreciação da prova. E ao fazê-lo, conheceu questão de que não podia tomar conhecimento, o que determina a nulidade da sentença, nos termos do art.º 615.º,n.º 1, al. d) do C.P.C.
143. A isto acresce ainda o facto de estarmos perante uma clara e manifesta violação do princípio da aquisição processual, ao fazer tabua rasa da confissão feita pela A. e assente nos autos, nos termos dos art.°s 46.º e 465.°, n.° 2 do C.P.C., na medida em que a R. aceitou especificamente, nos art.ºs 4.º (por falta de impugnação especificada) e 27.º da Réplica, e ainda na audiência de julgamento que teve lugar em 10/07/2017 os art.ºs 86º, 87º, 90º, 91º, 94º, 95º, 98º, 99º e 102.º da Reconvenção, o que equivale a confissão judicial espontânea, que determina que os factos confessados devam ser dados como assentes.
144. Sobre o valor probatório da confissão rege essencialmente o n.º 1 do art.° 358° do Código Civil, segundo o qual a confissão judicial escrita tem forca probatória plena contra o confitente.
145. O facto sobre que versa a confissão judicial escrita considera-se deste modo provado plenamente, passando a categoria de facto sobre o qual não é admissível qualquer dúvida ou discussão, isto é, a facto inquestionavelmente adquirido para o processo.
146. Pelo exposto, se conclui que por força do efeito cominatório da falta de impugnação (art.º 4.º da Réplica) e da confissão expressa feita nos articulados (art.º 27.º da Réplica) e ainda da confissão expressa feita em audiência de julgamento (sessão de 10/07/2017), nos quais é confessada a citada factualidade, deve ser determinado que se consideram confessados os factos alegados pela R. nos artigos 86º, 87º, 90º, 91º, 94º, 95º, 98º, 99º e 102.º da Reconvenção, os quais devem ser dados como provados.
147. Não obstante a confissão expressa da A. – ainda que parcial - feita na Réplica (€ 232.007,23) e na audiência de julgamento (€ 6.388,40), certo é que resulta de toda a prova produzida nos autos (documental e testemunhal), que o montante real do crédito da R. sobre a A. corresponde efectivamente ao alegado na sua reconvenção (€ 370.087,61).
148. Conforme supra se referiu, do conjunto das 40 (quarenta) facturas e notas de débito emitidas pela R. à A. e que se encontram elencadas nos artigos 87.º, 91.º, 95.º, 99.º e 102.º da Reconvenção, a A. confessou ser devedora de 34 (trinta e quatro) facturas e notas de débito.
149. E alegou não concordar, total ou parcialmente, com 6 (seis) notas de débito que, por isso, motivaram a sua devolução à R., nos termos referidos nos art.ºs 7.º, 11.º, 20.º e 22.º da Réplica.
150. Porém, conforme resultou da conjugação de toda a prova produzida nos autos sobre esta matéria (documental e testemunhal), também quanto às seis notas de débito devolvidas, a R. é credora da A.
151. A A. veio invocar que não aceitou e devolveu a Nota de Débito n.º 1209050002 de 08/05/2009, no valor de € 9.795,52 (art.ºs 7.º a 10º da Réplica), referente à empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, alegando tratar-se de crédito relativo a despesas relacionadas com atrasos da mencionada empreitada, parte dos quais da responsabilidade da R.
152. Ora, conforme decorre do Doc. n.º 126 da Reconvenção, a Nota de Débito n.º 1209050002 emitida pela R. à A. diz respeito a várias notas de débito emitidas pelo Dono da Obra à R., referentes a custos de energia debitados pela Eletricidade ao Dono da Obra na ETAR de “B”, da responsabilidade do consórcio adjudicatário.
153. Sendo que, pelos depoimentos prestados nas audiências de julgamento, de 25/05/2017 e 20/06/2017, ficou provado que esses custos de energia, não obstante terem sido debitados pelo Dono da Obra à R. (por ser ela a líder do consórcio), correspondem a custos de energia incorridos em obra durante o período de pré-arranque da ETAR de “B” e que, de acordo com o estabelecido no contrato de consórcio, constituem obrigação exclusiva da A. – Cfr. depoimento de Manuel (Ficheiro n.º 20170525105847_4667056_2870509 - Dia 25/05/2017 / Início: 10:58:48 / Fim: 12:19:56).
154. No que concerne ao crédito da R. sobre a A. referente ao contrato de consórcio celebrado entre ambas referente à empreitada designada por “Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R.”, a A. veio invocar que não aceitou e devolveu à R. as seguintes Notas de Débito:
- Nota de Débito n.º 1109040075 de 21/04/2009, no valor de € 6.665,08
- Nota de Débito n.º 1109080128 de 31/08/2009 no valor de 6.425,17
- Nota de Débito n.º 1210020026 de 28.02.2010 no valor de 1.924,00
Cfr. art.ºs 11.º a 18º da Réplica.
155. Alegando para o efeito que:
- Quanto à primeira Nota de Débito reporta-se a trabalhos executados pela A. e não pela R.
- Quanto à segunda Nota de Débito reporta-se a documento não acompanhado de auto assinado pela Direcção de Obra, faltando justificação ou referência de adjudicação.
- Quanto à terceira Nota de Débito reporta-se a quantias que dizem respeito a ambas as consorciadas e não apenas à A., avultando do documento n.º 45 da Réplica a aceitação pela A. da divisão de tal valor por ambas as consorciadas.
156. Conforme decorre do Doc. n.º 144 da Reconvenção, a Nota de Débito n.º 1109040075 de 21/04/2009, no valor de € 6.665,08emitida pela R. à A. diz respeito ao “valor relativo ao auto de medição n.º 29 de trabalhos efectuados na captação” da ETAR de R., a qual tem como documentos de suporte anexos um mapa de trabalhos da Fiscalização (...) e um mapa de trabalhos da R.
157. Relativamente a esta nota de débito, invoca a A. que a mesma se reporta a trabalhos executados pela A. e não pela R.
158. Ora, pelos depoimentos prestados na audiência de julgamento de 25/05/2017 e 20/06/2017, ficou provado que se tratam de trabalhos executados pela R. que a A. facturou na totalidade ao Dono da Obra e que a R. tinha direito a facturar parte (51,6706%). – Cfr. depoimentos das testemunhas Manuel e Filipe (Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 - Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05 e Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 - Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05).
159. Conforme decorre do Doc. n.º 147 da Reconvenção, a Nota de Débito n.º 1109080128 de 31/08/2009 no valor de 6.425,17 emitida pela R. à A. diz respeito ao “Valor relativo à execução dos trabalhos respeitantes ao artigo 4.20 – juntas de deflexão flangeadas, do auto de medição n.º 34 da empreitada em epígrafe, referente ao mês de Agosto de 2009”.
160. Relativamente a esta nota de débito, invoca a A. que a mesma se reporta a trabalhos executados pela A. e não pela R.
161. No entanto, em anexo a essa mesma nota de débito encontra-se uma comunicação da Fiscalização (“...”), dirigida aos representantes da A. e R., na qual é referido o seguinte: “Junto se envia 34.º auto de medição aprovado referente aos trabalhos do lote 4.2. Relembramos que relativamente ao artigo 4.20 da captação – juntas de deflexão flangeadas , cujo valor de facturação mensal foi de 12.434,73€, 51,6705% da totalidade do mesmo deverá ser facturado pela Y por via de trabalhos contabilizados pelo mapa real da Captação.”
162. Ora, o valor da nota de débito corresponde justamente àquele valor indicado pela fiscalização, referente à parte dos trabalhos executados pela R., não obstante terem sido facturados pela A. na sua totalidade ao Dono da Obra.
163. Acresce que, pelos depoimentos prestados na audiência de julgamento, de 25/05/2017 e 20/06/2017, ficou totalmente esclarecido o procedimento utilizado em obra pelas partes relativamente à execução e debito destes trabalhos e a bondade do crédito da R. sobre a A., neste concreto – Cfr. depoimentos de Manuel e Filipe (Ficheiro n.º 20170525105847_4667056_2870509 - Dia 25/05/2017 / Início: 10:58:48 / Fim: 12:19:56 e Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 – Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05).
164. Conforme decorre do Doc. n.º 148 da Reconvenção, a Nota de Débito n.º 1210020026 de 28.02.2010 no valor de 1.924,00 emitida pela R. à A. diz respeito a custos de energia debitados pela Eletricidade ao Dono da Obra, da responsabilidade do consórcio adjudicatário, mas respeitantes à fase de obra da responsabilidade da A.
165. A A., de resto, confessa na Réplica (art.º 17.º) ser devedora de metade desses custos.
166. Tal como sucedeu com a Nota de Débito n.º 1209050002 supra referida (referente à ETAR de “B”), tratam-se também aqui de custos que, não obstante terem sido debitados pelo Dono da Obra à R. (por ser ela a líder do consórcio), correspondem a custos de energia incorridos em obra durante o período de pré-arranque da ETA de “R.” e que, de acordo com o estabelecido no contrato de consórcio, constituem obrigação exclusiva da A.
167. O que ficou demonstrado na audiência de julgamento, através do depoimento da testemunha Filipe (Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 – Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05).
168. No que concerne ao crédito da R. sobre a A. referente ao contrato de consórcio celebrado entre ambas referente à empreitada designada por “Execução das ETAR E (SAR-DN-04 e SAR-DN-05), M. (SAR-DN-10), S. (SAR-DN-03) e SD (SAR-DN-06)” (art.ºs 94.º a 97.º da Reconvenção), a A. veio invocar que não aceitou e devolveu à R. a Nota de Débito n.º 1110070125 de 30/07/2010, no valor de € 95.819,97 (art.ºs 19.º a 21.º da Réplica), sob o singelo argumento de “… a obra ter sido encerrada e as respectivas contas saldadas” (?)
169. Ora, pela leitura e análise da Nota de Débito n.º 1110070125 e dos documentos a ela anexos pode-se constatar precisamente que esta Nota de Débito é que consubstancia o verdadeiro fecho de contas (“acerto de custos”) dessa empreitada, contendo os mapas anexos à nota de débito totalmente discriminados os trabalhos e acertos referentes a cada uma das quatro ETARs que constituem essa empreitada (ETAR E, Etar de M., Etar de S. e Etar de SD).
170. E o que a este respeito ficou provado em sede de audiência de julgamento foi justamente que a A. deve à R. a quantia a que respeita essa nota de débito, e que a deve na totalidade.
171. Pois, conforme aí se demonstrou, ao contrário do que alega a A., a Nota de Débito n.º 1110070125 de 30/07/2010 no valor de € 95.819,97, corresponde precisamente ao fecho de contas da empreitada “Execução das ETAR E (SAR-DN-04 e SAR-DN-05), M. (SAR-DN-10), S. (SAR-DN-03) e SD (SAR-DN-06)”.
172. Todos os trabalhos de construção civil executados pela R. para e a pedido da A. encontram-se devidamente discriminados, separados, medidos e valorizados nos quatro mapas de trabalhos anexos a essa nota de débito (um por cada ETAR), contendo todos os elementos suscetíveis de ser avaliados com total clareza e rigor.
173. Trabalhos esses acordados entre o Eng.º Henrique (director de projecto da A.) e o Eng.º Filipe (director de obra da R.).
174. Não podendo a R. aceitar que a devolução de uma nota de débito deste valor (ainda por cima referente ao fecho final de contas dos trabalhos executados a pedido da A.), seja acompanhada de um mero argumento de “… a obra ter sido encerrada e as respectivas contas saldadas” e, assim, ficar a haver uma quantia elevadíssima de dinheiro que suportou em trabalhos executados para a A. e que deixa agora de recuperar, pelo simples facto de a A. invocar que “as contas estão fechadas” (!)
175. Os factos supra referidos foram confirmados pelo depoimento, isento, claro, credível e com conhecimento directo dos factos da testemunha Filipe (Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 - Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05), não tendo sido infirmados por qualquer documento ou depoimento de testemunhas da A.
176. Finalmente, a Nota de Débito n.º 1208110003 de 25/11/2008, no valor de € 17.449,65 (Doc. n.º 159 da Reconvenção) diz respeito ao contrato de consórcio celebrado entre A. e R. referente à “Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub-Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã” (art.ºs 98.º a 101.º da Reconvenção) e corresponde a um débito efectuado pelo Dono da Obra, referente ao desperdício de 29.248 m3 de água relacionados com o não aproveitamento das águas de lavagem e os transbordos do decantador (cfr. Doc. 64 da Réplica).
177. Débito esse que foi, novamente, efectuado pelo Dono da Obra à R. por ser esta a líder do consórcio, não obstante se tratar de despesa totalmente alheia à R. (!)
178. Conforme resulta, aliás, da própria comunicação do Dono da Obra anexa à nota de débito: “Serve o presente para vos informar que o consórcio da empreitada em título vai ser notificado deste débito, aliás na sequência das informações que vos têm sido dadas no decorrer do arranque” (cfr. Doc. 64 da Réplica).
179. Ora, tendo em consideração a data dessa nota de débito a fase em questão (período de arranque), resulta claro do respectivo contrato de consórcio junto aos autos e dos depoimentos ouvidos em audiência, que se trata de despesas da total e exclusiva responsabilidade da A.
180. E a verdade é que é a própria A. que no art.º 23.º da sua Réplica vem confessar que “tratando-se de uma exploração da responsabilidade da Autora-reconvinda, era a esta que tal pagamento deveria ser efectuado e não à Ré-reconvinte” …
181. Tem toda a razão a A.! Mas tendo a factura desse custo sido emitida à R. e não à A., deve ela proceder ao seu pagamento à R., como de resto o reconhece (!)
182. Mais uma vez, não resta qualquer dúvida sobre de quem é a responsabilidade pelo pagamento da sobredita nota de débito, se atentarmos ao depoimento claro, isento e com conhecimento directo dos factos, prestado em audiência de julgamento pela testemunha Filipe (Ficheiro n.º 20170620105201_4667056_2870509 – Dia 20/06/2017 / Início: 10:52:01 / Fim: 11:42:05).
183. Pelo que, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, deve ser dado como provado que é a A. também devedora da R. da totalidade das seguintes Notas de Débito:

- Nota de Débito n.º 1209050002 de 08/05/2009, no valor de € 9.795,52
- Nota de Débito n.º 1109040075 de 21/04/2009, no valor de € 6.665,08
- Nota de Débito n.º 1109080128 de 31/08/2009 no valor de € 6.425,17
- Nota de Débito n.º 1210020026 de 28.02.2010 no valor de € 1.924,00
- Nota de Débito n.º 1110070125 de 30/07/2010, no valor de € 95.819,97
- Nota de Débito n.º 1208110003 de 25/11/2008, no valor de € 17.449,65
184. Todos os factos supra referidos, referentes às 6 (seis) notas de débito devolvidas pela A. foram confirmados em audiência por testemunhas arroladas pela R., com conhecimento directo dos mesmos, não tendo sido infirmados por qualquer documento ou depoimento de testemunhas da A.
185. Ficou cabalmente demonstrado nos autos que todas as 6 (seis) notas de débito supra referidas se reportam a trabalhos, custos, encargos e débitos da única e exclusiva responsabilidade da A., tendo sido devolvidas à R., sem que porém, a A. tivesse qualquer fundamento para tal.
186. De resto, na grande maioria dos casos é a própria R. que confessa ser devedora, senão da totalidade, pelo menos de parte dos respectivos montantes. Pelo que, salvo o devido respeito, não logra a R. entender a douta decisão recorrida, nesta parte.
187. A R. alegou o seu direito de crédito e provou os respectivos factos constitutivos (através de prova documental e testemunhal), conforme lhe competia (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil).
188. Por sua vez, a A., apesar de ter impugnado o crédito da R., não logrou fazer qualquer prova dos factos impeditivos do direito que alegou, para além da mera devolução de seis notas de débito (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil).
189. Aliás, com excepção da testemunha Elisabete – funcionária administrativa da A. que se limitou a confirmar a devolução das seis notas de débito – nenhuma outra testemunha arrolada pela A. depôs em audiência sobre a matéria da Reconvenção e da Réplica.
190. Pelo que, de acordo com o supra exposto e com as regras de repartição do ónus da prova, previstas no art.º 342.º do Código Civil, devem, em complemento dos factos provados, ser dados ainda como provados os seguintes factos:

58º- A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 58º, a A. é devedora da R. da quantia de € 53.780,03 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 57º.
60º-A: Por falta de fundamento para a devolução das notas de débito id. em 60º, a A. É devedora da R. da quantia de € 101.795,80 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 59º.
62º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 62º, a A. é devedora da R. da quantia de € 136.767,54 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 61º.
64º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 64º, a A. é devedora da R. da quantia de € 71.355,84 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 63º.
191. Por outro lado, tendo em consideração que, nos termos da al. a) do n.º 2 do art.º 805.º do Código Civil, todos os créditos reconvencionais estão titulados por facturas e notas de débito remetidas à A., os respectivos juros legais de mora deverão ser contabilizados à taxa legal desde a data de vencimento das facturas / notas de débito, por corresponderem a obrigações de prazo certo.

A finalizar,
192. De forma absolutamente incompreensível, a douta sentença recorrida desconsidera totalmente a factualidade provada em sede de Reconvenção, limitando-se a justificar a sua improcedência com base na seguinte fundamentação:

“A Ré pede a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de 383.368,54 € (trezentos e oitenta e três mil trezentos e sessenta e oito euros e cinquenta e quatro cêntimos), relativa, entre outras, a despesas comuns e encargos com meios de produção (vg. mão-de-obra e equipamentos), que suportou e cujo pagamento, juntamente com o management fee, constitui obrigação da Autora nos termos do contrato de consórcio e respetivo aditamento.
A Ré reclama da Autora o pagamento de faturas relativas à Empreitada de Execução das ETAR de D, C, B e A, mas também de outras empreitadas em que as partes se consorciaram e que aqui não foram apreciadas como é o caso da Empreitada de Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R., da Empreitada de Execução das ETAR E, M., S. e SD, da Empreitada de Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã, e ainda quantias correspondentes a deduções efetuadas pela Autora a Ré emergentes não se sabe de que relação contratual, tendo mesmo operado a compensação de parte deste crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, que afirma ser de € 183.520,10.
A Autora não aceita ser devedora da Ré dos valores reclamados na reconvenção adiantando ainda que existem outras dívidas da Ré para com a Autora, sendo que contrariamente ao afirmado pela Ré a Autora nunca aceitou tais valores tendo devolvido as faturas em apreço
Da posição assumida pelas partes resulta que, para além da empreitada dos autos, entre ambas subsistem questões contratuais a resolver respeitantes a diversos contratos que celebraram, havendo que proceder ao acerto de contas.” – Sublinhado nosso.
193. Salvo o devido o respeito, que é muito, a fundamentação aduzida pela douta decisão recorrida para a não apreciação da matéria da Reconvenção e para a análise crítica do respectivo suporte documental, viola o art.º 8.º do Código Civil (non liquet) e representa um manifesto erro de julgamento, na medida em que não encontra qualquer suporte nos factos e nas provas produzidas no processo.
194. A douta decisão recorrida começa por referir que “A Ré reclama da Autora o pagamento de faturas relativas à Empreitada de Execução das ETAR de D, C, B e A, mas também de outras empreitadas em que as partes se consorciaram e que aqui não foram apreciadas (…)”.
195. Sendo verdade o que vai dito no segmento supra referido, não se alcança em que medida é que o facto de o crédito reconvencional da R. ser oriundo de outros contratos para além daquele que constitui a causa de pedir da acção constitui facto impeditivo da apreciação da reconvenção.
196. Nos termos do art.º 583.º do CPC, é admissível reconvenção, não só quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção, mas também quando o réu se propõe obter a compensação ou tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter.
197. O pedido reconvencional in casu consiste na alegação de um (contra) crédito do Reconvinte sobre o Reconvindo, para operar por via de compensação e / ou condenação, sendo indiferente se existe ou não um nexo de causalidade directo entre as diversas causas de pedir, da acção e da reconvenção.
198. Qualquer que seja a fonte da obrigação das partes, sobre um crédito da acção foi invocado outro crédito em reconvenção e, no caso sub judice, a fonte da obrigação até é a mesma: a existência de diversas relações contratuais de consórcio entre as partes, das quais resultaram créditos e débitos recíprocos.
199. A invocação de compensação e reconvenção não estão limitadas aos casos em que o contra-crédito emerge da mesma relação contratual ou fonte da obrigação alegada na petição.
200. Tendo a R. legitimidade para deduzir reconvenção e tendo a reconvenção sido aceite, não poderia a mesma deixar de ser apreciada em toda a plenitude da causa de pedir que constitui o objecto da reconvenção, independentemente de dizer respeito ao mesmo ou a outros contratos, para além daquele que constitui a causa de pedir da acção.
201. Pelo que, se conclui que o tribunal a quo não poderia concluir como concluiu no sentido de desconsiderar a análise crítica das provas pelo “facto de a reconvenção respeitar a créditos relativos a outras empreitadas que não apenas a que está em discussão na acção” ou de “existirem outras contas por fechar entre as partes”.
202. Por outro lado, a douta sentença recorrida refere que foram também invocadas em sede de Reconvenção “ (…) quantias correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré emergentes não se sabe de que relação contratual (…)”.
203. Ora, as únicas quantias correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré são as que foram invocadas no art.º 102.º da Reconvenção, as quais foram dadas como não provadas pela douta decisão recorrida, no ponto 3.º dos Factos Não Provados.
204. Ora, estas quantias são precisamente as mesmas que deveriam ter sido dadas como provadas pela douta decisão recorrida, por corresponderem a confissão expressa da A. feita na audiência de julgamento de 10 de Julho de 2017.
205. Por outro lado ainda, a douta decisão recorrida refere a “compensação de parte deste crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, que afirma ser de € 183.520,10.” como tratando-se de facto que determinou a não apreciação do pedido reconvencional.
206. Ora, mais uma vez, não se alcança este segmento decisório, na medida em que, ao contrário do aí referido, quer a efectivação da compensação, quer o valor da compensação foram expressamente confessados pela A. devedora na Réplica.
207. Refere ainda a douta decisão recorrida que “A Autora não aceita ser devedora da Ré dos valores reclamados na reconvenção adiantando ainda que existem outras dívidas da Ré para com a Autora, sendo que contrariamente ao afirmado pela Ré, a Autora nunca aceitou tais valores tendo devolvido as faturas em apreço.”
208. Ora, conforme supra já se viu, da Réplica da A. resulta que foram apenas devolvidas 6 (seis) de entre as 40 (quarenta) facturas e notas de débito invocadas na Reconvenção (cfr. arts. 87º, 91º, 95º e 102º da Réplica e arts.7º, 11º, 20º e 22º da Réplica), não tendo as demais 36 (trinta e seis) facturas e notas de débito sido sequer objecto de impugnação (cfr. art.º 4.º da Réplica).
209. Finalmente, é referido pela douta decisão recorrida que “Da posição assumida pelas partes resulta que, para além da empreitada dos autos, entre ambas subsistem questões contratuais a resolver respeitantes a diversos contratos que celebraram, havendo que proceder ao acerto de contas.”
210. Com o devido respeito, não vemos de onde resulta esta afirmação, na medida em que não existem nem foram alegadas pelas partes ou provadas nos autos quaisquer outras relações contratuais para além daquelas que resultam dos contratos de consórcio mencionados na acção e na reconvenção.
211. As contas de fecho das diversas empreitadas executadas em parceria (consórcio) por A. e R. são justamente as que estão em causa na reconvenção, não existindo qualquer outras empreitadas para além das referidas nos art.ºs 86.º, 90.º, 94.º e 98.º da Reconvenção que tenham sido executadas pelas partes e que tenham contas por fechar.
212. Cumpre, aliás, relembrar a este respeito que, paradoxalmente, é a própria A. que afirma, relativamente a alguns créditos reconvencionais, e em modo de impugnação, que as notas de débito foram devolvidas em virtude de as contas dessas empreitadas já se encontrarem fechadas e as respectivas contas saldadas (cfr. art.º 21.º da Réplica)!
213. E seja como for, o certo é que o facto de as partes eventualmente terem outras contas pendentes de fecho para além daquelas que são discutidas num determinado processo não poderia nunca constituir facto impeditivo para que o tribunal pudesse e devesse apreciar o objecto das relações creditícias que constituem a causa de pedir de determinado processo, atento o princípio da instância.
214. No elenco dos Factos Provados, o tribunal a quo limita-se a dar como provados os factos referentes à emissão e devolução de facturas / notas de débito (pontos 57 a 64), descurando completamente a confissão feita pela A. nos articulados e em audiência e, bem assim, toda a prova documental e testemunhal produzida pela R.
215. E por isso, e salvo o devido respeito, no que respeita à reconvenção, o tribunal a quo abstraiu-se de analisar criticamente as provas carreadas nos autos pelas partes, quer a (vasta) prova documental, quer a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, provocando tal actuação um erro de julgamento que afecta seriamente os interesses patrimoniais da R.
216. Se, conforme parece resultar da fundamentação da douta sentença recorrida, o tribunal a quo considerava que subsistiam “questões contratuais a resolver respeitantes a diversos contratos que celebraram, havendo que proceder ao acerto de contas”, ficando com dúvidas sobre a respectiva quantificação, sempre deveria ter reconhecido a existência desses direitos, condenando na parte liquida e relegando, no demais, a respectiva liquidação para execução de sentença, em vez de optar por julgar a acção improcedente, colocando assim as partes na contingência de um caso julgado.
217. Com efeito, nos termos do n.º 2 do art.º 609.º do CPC, se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.
218. Este preceito tanto se aplica no caso de se ter inicialmente formulado um pedido genérico e de não se ter logrado converter em pedido específico, como ao caso de ser formulado pedido específico sem que se tenha conseguido fazer prova da especificação, ou seja, quando não se tenha logrado coligir dados suficientes para se fixar, com precisão e segurança, a quantidade de condenação (cfr., entre todos, Ac. Relação de Coimbra, de 03/10/2006 – Proc. n.º 497/2000.C1).
219. O que o tribunal não poderia fazer era ter decidido como decidiu, negando, pura e simplesmente, os créditos que constituem objecto da reconvenção, não só porque resulta evidente dos autos que os mesmos existem e são líquidos, como inclusivamente eles não foram objecto de impugnação, tendo, pelo contrário sido objecto de confissão (total ou parcial) por parte do Reconvindo.
220. A douta decisão recorrida refere que “no que se refere aos factos não provados, os mesmos radicaram na circunstância de se ter provado realidade distinta, nos termos acima explanados, ou de se ter verificado insuficiência probatória para que, com a segurança que se impõe, se pudesse dar tal factualidade como provada, sem esquecer que na dúvida sobre a realidade do facto decidiu-se contra a parte à qual o facto aproveita, cumprindo-se a regra estabelecida no art. 516º do CPC.”
221. Ora, não se logra entender esta afirmação quando em matéria de reconvenção foram dados como provados todos os factos constitutivos do direito de crédito alegado, com excepção da devolução de 6 das 40 notas de débito e o ponto 3.º dos Factos Não Provados, sendo que quanto a este ponto, conforme supra se referiu, deve o mesmo inequivocamente ser dado como provado por força da confissão, expressa, integral e sem reservas, feita pela A. na audiência de julgamento de 10/07/2017.
222. Pelo que, tendo em consideração a falta de impugnação especificada e as confissões efectuadas pela A., nos articulados e em audiência de julgamento, todo o acervo probatório produzido, e ainda o facto de não existirem quaisquer factos não provados quanto à matéria da reconvenção, não se consegue alcançar como é possível o tribunal a quo ter concluído pela improcedência do pedido reconvencional.
223. Assim, ao decidir como decidiu, sem apreciar cabalmente o pedido reconvencional, condenando o A. nos termos alegados, confessados e provados e sem, pelo menos, relegar para execução de sentença a liquidação do mesmo, o tribunal a quo violou o principio de non liquet previsto no art.º 8.º, n.º 1 do Código Civil e o princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrada no art.º 20.º da CRP, lesando gravemente os direitos da R., por não só lhe está a negar a tutela a que tem direito, como também a coloca-la em risco de ser confrontada com uma situação de caso julgado que muito penaliza os seus interesses patrimoniais, tendo em consideração o montante elevadíssimo do seu crédito sobre a A. (parcialmente confessado pela própria A. nos autos) constituído ao longo de quase uma década de relações de parceria existentes entre ambas.
224. Deveria, pois, o tribunal a quo ter valorado a confissão da A. e analisado criticamente toda a prova, documental e testemunhal, produzida nos autos, para concluir inequivocamente pela procedência do pedido reconvencional ou, em alternativa, relegar para execução de sentença a liquidação dos créditos aí invocados, condenando imediatamente na parte confessada e líquida, posto que cremos que nenhuma dúvida poderá existir (pelo menos) quanto à respectiva certeza e exigibilidade, em face da aquisição processual dos autos.
225. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida violou os artigos 46.º, 414.º, 465.º, 583.º, 607.º, n.ºs 4 e 5 e 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil; artigos 8.º, n.º 1, 237.º, 342.º, 356.º, n.º 1, 405.º e 805.º, n.º 3 do Código Civil; artigos 2.º, 30.º e 221.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março; artigos 4.º, n.º 1 e 6.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho; artigo 3.º da Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de Julho; e artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.

Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, considerando a acção improcedente e a reconvenção procedente, absolva a R. e condene a A. a pagar a quantia de € 301.492,52, acrescida de juros legais de mora.

Subsidiariamente e caso assim se não entenda, deve a acção ser julgada improcedente, relegando-se para execução de sentença a liquidação dos créditos invocados em reconvenção.
Em qualquer caso, deve ser decretado que os juros legais de mora referentes à ação devem ser contabilizados a partir do trânsito em julgado da sentença que liquide o valor do crédito a que se referem os juros.
Assim decidindo, como é de lei, Vossas Excelências farão inteira e costumada JUSTIÇA.».
*
Contra-alegou a autora X, S.L. (cfr. fls. 2396 a 2406), pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.
*
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cfr. fls. 2408).
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Questões a decidir.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso e não tenham sido ainda conhecidas com trânsito em julgado [cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho].

No caso, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:

i) – Das nulidades da sentença com fundamento nas als. c) e d) do n.º 1 do art. 615º do CPC.
ii) – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.
iii) – Quanto à acão, da inverificação dos factos constitutivos do direito de crédito da Autora.
iv) – Quanto à reconvenção, da verificação dos factos constitutivos do direito de crédito da Ré/reconvinte sobre a A./reconvinda.
*
III. Fundamentos

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

A Autora é uma sociedade comercial, de direito espanhol, que se dedica à atividade de instalações hidráulicas, elétricas e mecânicas, atuando primacialmente na área do ambiente e da gestão integral do ciclo da água.
Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial, de direito português, que se dedica à atividade de construção civil e obras públicas.
No âmbito do concurso público lançado pela sociedade Águas X S.A., destinado à adjudicação da empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Autora, a Ré e a sociedade MCA S.A. decidiram apresentar uma proposta conjunta.
A qual, tendo sido a vencedora do concurso público, foi adjudicada às empresas que constituíam o agrupamento concorrente por ofício da entidade adjudicante datado de 04/09/2005.
Em cumprimento da cláusula 9.3 do Programa de Concurso, as sociedades adjudicatárias agruparam-se em consórcio externo, tendo para o efeito a Autora, a Ré (então designada por Empreiteiros Y de AFS, S.A.) e a sociedade denominada MCA S.A., celebrado um contrato de consórcio externo, através de documento datado de 22 de Setembro de 2005.
A Ré foi designada líder de Consórcio.
De acordo com a cláusula 8.ª do contrato de consórcio, a participação de cada consorciada no consórcio correspondia, respetivamente, às seguintes percentagens:
- Espina: 51,80 %
- Y: 40,70 %
- MCA: 7,50 %
De acordo com o aditamento ao contrato de consórcio subscrito por todas as consorciadas em 23/09/2005 (conforme doc. n.º 2 junto com a P.I.), a Y assumiu a participação da sociedade MCA S.A. no consórcio, passando as participações no consórcio a serem as seguintes (cláusula 4.ª):
- Espina: 51,80 %
- Y: 48,20 %
A participação da Autora no consórcio (51,80%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de equipamentos no valor global do contrato de empreitada (€ 6.371.204,95).
10º E a participação da Ré no consórcio (48,20%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de construção civil no valor global do contrato de empreitada (€ 5.927.088,77).
11º A distribuição das participações da Autora e da Ré no consórcio resultava da repartição entre ambas dos trabalhos que constituíam o objeto do contrato de empreitada, tendo por base a execução das especialidades de cada empresa.
12º Ou seja, a Autora seria a responsável exclusiva pelo fornecimento e instalação dos equipamentos.
13º E a Ré seria a responsável exclusiva pela execução dos trabalhos de construção civil.
14º Foi ainda convencionado no contrato de consórcio que:
- “As consorciadas facturarão e receberão diretamente do Dono de Obra o valor dos respetivos trabalhos” (cláusula 9.ª).
- “As consorciadas prestarão individualmente as garantias exigidas pelo Dono de Obra segundo a proporção estabelecida no número anterior” (cláusula 8.ª, n.º 2).
15º Tendo sido ainda convencionado entre A. e R., no aditamento ao contrato de consórcio que:
- “ (…) as signatárias não constituem qualquer pessoa ou entidade jurídica distinta das próprias consorciadas, nem estabelecem entre si qualquer vínculo do tipo societário ou forma de associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico” (Cláusula 2.ª, n.º 2).
- “Os trabalhos e tarefas necessários à execução da empreitada em conformidade com os termos do respectivo contrato serão repartidos entre as signatárias tendo em conta as respectivas especialidades (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 1).
- “Havendo dúvidas ou divergências quanto à distribuição entre as consorciadas de quaisquer trabalhos a mais, trabalhos complementares ou outros trabalhos adicionais de qualquer natureza, competirá ao Conselho de Orientação e Fiscalização efectuar essa distribuição, atendendo às especialidades de cada consorciada (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 2).
- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas” (Cláusula 4.ª, n.º 4).
- “O disposto no presente contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, nem visa a constituição de qualquer fundo comum, apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas” (Cláusula 4.ª, n.º 5).
- “Cada consorciada suportará todos os custos e despesas inerentes à execução dos trabalhos que lhe estejam atribuídos, bem como, na correspondente percentagem, as despesas e custos que, atendendo à respectiva natureza ou em consequência de acordo unânime das signatárias, sejam expressamente qualificadas como comuns a todas elas neste contrato, nos seus eventuais aditamentos, ou por deliberação do COF” (Cláusula 5.ª, n.º 1).
- “(..) são, nomeadamente, obrigações das consorciadas: a) Executar todos os trabalhos da empreitada que lhe estão ou venham a estar cometidos segundo a repartição prevista na cláusula 4ª, supra, incluindo todos os fornecimentos de materiais, equipamentos, meios humanos, instalações, ensaios, formação e treino, supervisão, gestão e controlo, trabalhos temporários ou provisórios que se revelem necessários para a boa execução e completo acabamento dos mesmos trabalhos, em conformidade com os termos e condições do contrato de empreitada e com as alterações que venham a ser licitamente impostas ou acordadas com o Dono da Obra” (Cláusula 6.ª, n.º 1).
- “Cada uma das signatárias será plena e exclusivamente responsável pela perfeita e pontual execução de todos os trabalhos e tarefas que estão a seu cargo e pelo integral cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo consórcio relativas aos mesmos nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra” (Cláusula 7.ª, n.º 3).
- “São da exclusiva responsabilidade de cada uma das consorciadas a organização e orientação da sua própria actividade com vista à execução dos trabalhos que lhe competem, e bem assim todos os encargos daí resultantes e as receitas que lhe correspondam, nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra.” (Cláusula 13.ª).
- “As consorciadas facturarão e receberão directamente do Dono da Obra o valor dos respectivos trabalhos repartidos conforme o disposto na cláusula 4ª” (Cláusula 14.ª, n.º 1).
- “Em tudo o mais que não estiver aqui previsto e sem prejuízo das remissões expressas para outros diplomas, o presente contrato reger-se-á pelo disposto no Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de Julho, quanto às relações entre signatárias e ao funcionamento do consórcio e pelo disposto no Decreto-Lei nº 59/99 de 2 de Março no que respeita à definição das condições que as consorciadas estão obrigadas a observar na execução da empreitada” (Cláusula 22.ª).
16º Mais estipularam as partes que caso o dono da obra não aceitasse a faturação direta nem o pagamento separado às signatárias, o Chefe do Consórcio apresentaria ao dono da obra a faturação conjunta dos trabalhos das consorciadas, de acordo com as condições de pagamento do preço da empreitada previstas no respetivo contrato, faturação essa elaborada a partir dos elementos fornecidos por cada uma das consorciadas ou simplesmente remetendo-lhes esses elementos, recebendo daquele os correspondentes montantes e procedendo à sua distribuição entre as consorciadas, em determinados termos previstos concretamente no dito contrato,
17º Este contrato extinguir-se-ia uma vez verificadas a condições cumulativamente previstas na cláusula vigésima primeira, designadamente a regularização das contas e resolução dos diferendos entre as consorciadas, ou mesmo que estas não se verificassem, pelo decurso do prazo de 10 anos a contar da sua outorga.
18º O mesmo contrato e seu aditamento encontram-se ainda em vigor.
19º O contrato de empreitada com a ÁGUAS N foi outorgado em 30/11/2005, pelo preço global de € 12.298.293,72 acrescido de IVA à taxa legal em vigor (cfr. cláusula 5.ª do contrato) e com um prazo global de execução de 905 dias a contar da data de consignação da obra (cfr. cláusula 8.ª do contrato), junto como doc. 3 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
20º Contrato esse que foi objeto de um aditamento, constante de documento datado de 18 de Janeiro de 2008 e junto como doc. 4 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
21º De um segundo aditamento, celebrado por documento datado de 11 de Março de 2009, e junto como doc. 5 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
22º A Autora, para efeito da realização da sua parte da empreitada e conforme era permitido às consorciadas, à luz do disposto na cláusula décima-nona do referido aditamento ao contrato de consórcio, celebrou, para esse fim, com a sociedade denominada “FA-ENGENHARIA DO AMBIENTE, LDª”, um contrato de subempreitada por documento datado de 13 de Dezembro de 2005, doc.6 junto com a P.I., cujo teor aqui se dá por reproduzido.
23º Esta obra foi totalmente executada pelas referidas consorciadas e oportunamente recebida e o seu preço pago pela ÁGUAS N, S.A..
24º O projeto de obra que foi levado a concurso e que era suposto as consorciadas terem executado, por proposta da Autora foi objeto de alterações tendentes a melhorá-lo tecnicamente.
25º A Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR), que dele são objeto, foram redesenhadas pelos técnicos da Autora, em termos de obterem várias melhorias, entre as quais se destacam as seguintes:
26º Na ETAR de D, o fósforo e o azoto dissolvidos são eliminados de forma biológica, ao contrário do projeto original em que tal era feito de forma química.
27º No resto das Estações, tal ocorreu relativamente à eliminação do azoto, tendo sido dimensionada a instalação para a futura eliminação do fósforo do mesmo modo, o que não era possível ocorrer no anterior projeto.
28º Todas as Estações foram dimensionadas com mais vinte porcento de capacidade de oxigenação.
29º Melhorou-se o desenho das estações elevatórias da entrada, acrescentando equipamentos trituradores, para que não fosse necessária e extração de resíduos nestas estações elevatórias e corrigiram-se as cotas das mesmas, pois as do projeto original corriam o risco de inundação.
30º O desenho da obra de entrada para a receção de lamas das fossas sépticas, foi uniformizado para as quatro ETAR.
31º O novo desenho do projeto permitiu uma exploração mais simples e económica e a qualidade da água tratada pelas ETAR foi melhorada.
32º Estas modificações foram apresentadas pela Autora à ÁGUAS N, S.A., em Novembro de 2005.
33º Para o que foi feito um desenho individual para cada uma das quatro ETAR, num total de setenta e duas peças desenhadas, dezoito por ETAR.
34º A ÁGUAS N, S.A. concordou com as propostas da Autora de alteração do projeto, que tinham como condição não ultrapassar o valor global fixado para o projeto inicial.
35º A Autora questionou a Ré, se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu.
36º Assim, a Autora procedeu às alterações do projecto na componente de instalações técnicas e equipamentos, após o que o remeteu à Ré para esta proceder à sua revisão quanto à especialidade de construção civil.
37º Após revisão e adaptação do projeto por parte da Ré, na componente da construção civil, esta procedeu à sua reorçamentação em face das alterações introduzidas.
38º A este novo projeto a ÁGUAS N, S.A. acrescentou o seguinte:

- Dupla linha de tratamento totalmente independente em cada ETAR,
- Maior volume dos tanques de arejamento,
- Edifícios desodorizados com capacidade para albergarem a totalidade do pré-tratamento e desidratação de lamas e,
- Alteração da implantação dos elementos constituintes da ETAR.
39º Todas as consorciadas realizaram a obra de acordo com o projeto alterado.
40º A obra foi integralmente executada pelo consórcio, mas implicou a alteração no volume de trabalho executado pelas partes e seu valor.
41º Na ETAR A, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.535.394,95 €, a parte do equipamento 1.526.544,58, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 148.209,05.
42º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), na parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.501.151,68 €, a parte do equipamento 1.798.387,27, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 96.650,26 €.
43º Na ETAR B, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.525.600,66€, a parte do equipamento 1.329.275,17 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
44º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.314.247,57 €, a parte do equipamento 1.587.568,23 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
45º Na ETAR C, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.539.686,13 €, a parte do equipamento 1.423.531,50 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 272.075,26 €.
46º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.438.276,21 €, a parte do equipamento 1.727.515,48 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 150.145,01 €.
47º Na ETAR D, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 906.122,72 €, a parte do equipamento 1.146.880,34 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
48º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 877.861,06 €, a parte do equipamento 1.302.952,52 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
49º No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (-548.756,99).
50º No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91).
51º Por interesse e indicações da ÁGUAS N, S.A., designadamente relacionados com a celeridade da conclusão da empreitada, quer os autos de medição, quer a respetiva faturação das consorciadas e subsequentes pagamentos, se processaram de acordo com o projeto inicial da empreitada e, não, segundo as alterações que lhe foram introduzidas e que se traduziram na diferença de obra executada, quer pela Autora, quer pela Ré.
52º O que levou a que as diferenças de valor não se tivessem repercutido nos pagamentos feitos pelo dono da obra ÁGUAS N, S.A., à Autora e à Ré.
53º A Ré recebeu do dono da obra as seguintes quantias:
Rubricas Valor sem IVA Valor com IVA
Trabalhos Normais 5.917.717,73 6.188.143,51
Revisão de Preços 517.475,86 517.475,86
Trabalhos Adicionais 344.944,31 344.944,31
Despesas Contrato 20.096,59 24.115,91
TOTAL 6.800.234,49 7.074.679,59
54º A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.
55º Os legais representantes da Autora alertaram para este facto os representantes da Ré, no sentido de se efetuar o acerto resultante da alteração do projeto da empreitada, havendo a Ré que devolver à A. a diferença de valor que indevidamente havia recebido do dono da obra.
56º A Autora interpelou a Ré, por carta registada datada de 20 de Julho de 2010, para proceder ao pagamento da quantia em divida.
57º No âmbito da execução do contrato de empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108060207 30/06/2008 11.760,84
1108060209 30/06/2008 248,05
1108090263 30/09/2008 5.958,84
1108090264 30/09/2008 2.515,79
1108100101 31/10/2008 9.447,10
1108120214 31/12/2008 934,07
1108120215 31/12/2008 2.515,79
1209020016 27/02/2009 1.881,00
1209030010 26/03/2009 1.536,00
1109040190 30/04/2009 3.291,94
1209050002 08/05/2009 9.795,52
1209060009 12/06/2009 2.086,56
1110070126 30/07/2010 1.808,53
58º A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1209050002 datada de 08/05/2009 no valor de € 9.795,52, com o fundamento de se reportar a despesas relacionadas com atrasos na empreitada (ETAR D, C, B e A), parte dos quais da responsabilidade da Ré.
59º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R.”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108030142 31/03/2008 9.264,65
1108040122 30/04/2008 12.322,20
1108050126 30/05/2008 6.727,60
1108060118 30/06/2008 1.290,16
1108060208 30/06/2008 3.211,47
1108070147 29/07/2008 10.872,51
1108080102 29/08/2008 8.327,38
1108090140 30/09/2008 5.395,22
1108090261 30/09/2008 1.818,61
1108090262 30/09/2008 3.696,05
1108100098 31/10/2008 2.345,74
1108120216 31/12/2008 1.480,18
1108120217 31/12/2008 3.696,05
1109040075 21/04/2009 6.665,08
1109040191 30/04/2009 1.860,30
1109070171 31/07/2009 10.086,68
1109080128 31/08/2009 6.425,17
1210020026 28/02/2010 1.924,00
1110070127 30/07/2010 4.386,75
60º A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1109040075 datada de 21/04/2009 no valor de 6.665,08€, a Nota de Débito número 1109080128 datada de 31/08/2009 no valor de 6.425,17€ e a Nota de Débito número 1210020026 datada de 28/02/2010 no valor de 1.924,00€, num total de 15.014,25€.
61º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução das ETAR E (SAR-DN-04 e SAR-DN-05), M. (SAR-DN-10), S. (SAR-DN-03) e SD (SAR-DN-06)”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
15473/B 22/08/2007 136.767,55
1308010001 31/01/2008 136.767,55
1108020031 12/02/2008 40.947,57
1110070125 30/07/2010 95.819,97
62º A Autora não aceitou e devolveu à R. a Nota de Débito número 1110070125 datada de 30/07/2010 no valor de € 95.819,97.
63º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub-Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
14481/B 14/02/2007 53.906,19
1208110003 25/11/2008 17.449,65
64º A Autora não aceitou e devolveu à R. Nota de Débito número 1208110003 datada de 25/11/2008 no valor de 17.449,65 €.
65º Em 13/08/2010, através da carta junta sob Doc. n.º 113, a Ré comunicou à Autora que compensava parte do seu crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, no valor de 183.520,10 €.
66º As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.
*
E deu como não provados os demais factos alegados, designadamente:

O novo projeto não teve repercussão no preço total da obra.
A Ré apenas concordou com a alteração do projeto inicial, porque da mesma não decorria uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Fatura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97.
*
IV. Do objecto do(s) recurso(s)

1. Nulidade(s) da sentença respeitantes à ação e à reconvenção (conclusões 2º, 3º, 116º e 142º).
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3 do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.

Nos termos do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula quando:

«c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível».
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

No tocante à nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 615º do CPC - oposição entre os fundamentos e a decisão ou ocorrência de alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível -, trata-se de um vício lógico da sentença que a compromete; «se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença» (1). Não se trata de um simples erro material (em que o juiz, por lapso, escreveu coisa diversa da que pretendia escrever - contradição ou oposição meramente aparente), mas de um erro lógico-discursivo, em que os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, direção diferente (contradição ou oposição real) (2). O que não é, também, confundível com o chamado erro de julgamento, isto é, com a errada subsunção dos factos concretos à correspondente previsão normativa abstrata, nem, tão pouco, a uma errada interpretação desta, vícios estes só sindicáveis em sede de recurso jurisdicional (3). Na verdade, quando, embora indevidamente, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, está-se perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já se o raciocínio expresso na fundamentação apontar para determinada consequência jurídica e na conclusão for tirada outra consequência, ainda que esta seja juridicamente correta, verifica-se a apontada nulidade (4).

Subjacente a esta causa de nulidade está a ideia de que a sentença deve constituir um silogismo judiciário, em que a norma jurídica constitui a premissa maior, os factos provados a premissa menor e a decisão será a consequência lógica de tais premissas, não devendo, pois, existir qualquer contradição ou oposição entre os fundamentos e a decisão (5).

Esta nulidade substancial está para a decisão do tribunal como a contradição entre o pedido e a causa de pedir está para a ineptidão da petição inicial, posto que em ambos os casos falta um nexo lógico entre as premissas e a conclusão (6) (art. 186º, nºs 1 e 2, al. b) do CPC).

Por seu lado, como vício de limite, a nulidade de sentença enunciada na transcrita alínea d) do n.º 1 do art. 615º do CPC divide-se em dois segmentos, sendo o primeiro atinente à omissão de pronúncia (que é a que releva à situação dos autos) e o segundo relativo ao excesso de pronúncia (pronúncia indevida).
Como regra geral, o tribunal deve resolver todas e apenas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (cfr. art. 608.º, n.º 2, do CPC).
Verifica-se a omissão de pronúncia quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (7).
Doutrinária (8) e jurisprudencialmente (9) tem sido entendido de que só há nulidade quando o juiz não se pronuncia sobre verdadeiras questões não prejudicadas invocadas pelas partes, e não perante a argumentação invocada pelas partes. Por questões não se devem considerar as razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas sim as pretensões (pedidos), causa de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O que “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido (…)(10).
O juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente (11).
*
No caso sub júdice, a recorrente limitou-se a invocar (genericamente) que a sentença recorrida é nula, quer quando se pronuncia sobre a ação, quer relativamente à reconvenção, na medida em que os fundamentos estão em clara e manifesta oposição com a decisão, dizendo ser manifesta e evidente a contradição entre os factos provados e o decisório e que a decisão final está em manifesta contradição com os factos provados.

Ora, contrariamente ao propugnado pela recorrente, julgamos que a decisão alcançada na sentença recorrida (quer a relativa à ação, bem como a atinente à reconvenção) está em perfeita sintonia lógica com os fundamentos que lhe servem de suporte, inexistindo qualquer oposição entre o segmento decisório e a respetiva fundamentação.
Constata-se, aliás, que, os vícios apontados pela recorrente à sentença radicam essencialmente no alegado erro de julgamento na apreciação da prova produzida, o que, como vimos, não é subsumível à previsão normativa prescrita do art. 615º, n.º 1, al. c), do CPC.

Com efeito, os alegados vícios da decisão da matéria de facto poderiam, quando muito, reconduzir-se à previsão especial do art. 662º, do CPC, mas não ferem de nulidade a sentença. Dito por outras palavras, a possibilidade de anulação da decisão da matéria de facto decorre da alínea c), do n.º 2, e da alínea b), do n.º 3, do art. 662º do CPC, sendo que nenhuma delas respeita a erros de julgamento, sejam da matéria de facto, sejam da de direito (12).

A errada apreciação da prova produzida, podendo determinar a alteração dos factos dados como provados e não provados, não é confundível com a nulidade da sentença, seja por não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art. 615º, n.º 1, al. b), do CPC), seja por oposição entre os fundamentos a decisão (art. 615º, n.º 1, al. c), do CPC).
Trata-se de circunstâncias, de vícios e de regime completamente diversos do da nulidade da sentença.
Como se disse, as nulidades da sentença estão típica e taxativamente previstas no art. 615º do CPC e nenhuma destas se refere à decisão da matéria de facto naquela contida.
Por outro lado, no tocante ao apontado vício enunciado na al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC relativo à apreciação da reconvenção, constata-se que a sentença recorrida pronunciou-se sobre todas as questões colocadas à sua apreciação e, diversamente do aduzido pela recorrente, nessa apreciação não excedeu os limites de que lhe era lícito conhecer.
Mais uma vez as objeções invocadas pela recorrente reconduzem-se a um eventual erro de julgamento, no caso da matéria de facto – por o Tribunal “a quo” ter dado como não provado o ponto 3 dos factos não provados, o qual, no entendimento da recorrente, deve ter-se como provado, por confissão judicial –, com reflexo na matéria de direito, cuja apreciação não se confunde com a nulidade da sentença.
Nesta conformidade, conclui-se pela manifesta improcedência das nulidades da sentença arguidas pela recorrente.
*
2. Da impugnação da matéria de facto.

Em sede de recurso, a apelante impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1.ª instância.
Para que o conhecimento da matéria de facto se consuma, deve previamente o recorrente, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus de impugnação a seu cargo, previsto no artigo 640º do CPC, o qual dispõe que:

1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».

Aplicando tais critérios ao caso, constata-se que a recorrente indica quais os factos que pretende que sejam decididos de modo diverso, inferindo-se por contraponto a redação que deve ser dada (da modificação dos factos provados para não provados e destes para provados), como ainda o(s) meio(s) probatório(s) que na sua ótica o impõe(m), incluindo, no que se refere à prova gravada em que fazem assentar a sua discordância, a indicação dos elementos que permitem a sua identificação e localização, pelo que podemos concluir que cumpriu suficientemente o ónus estabelecido no citado artigo 640º.
Assim, no caso sub júdice, o presente Tribunal pode proceder à reapreciação da matéria de facto impugnada, uma vez que, tendo sido gravada a prova produzida em audiência, dispõe dos elementos de prova que serviram de base à decisão sobre o(s) facto(s) em causa.
*
Sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, preceitua o artigo 662.º, n.º 1 do CPC, que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».

Os recursos da matéria de facto podem envolver objetivos diversificados:

- Alteração da decisão da matéria de facto, considerando provados factos que o tribunal a quo considerou não provados, e vice-versa, a partir da reapreciação dos meios de prova ou quando os elementos constantes do processo impuserem decisão diversa (no caso de ter sido apresentado documento autêntico, com força probatória plena, para prova de determinado facto ou confissão relevante) ou em resultado da apreciação de documento novo superveniente (art. 662º, n.º 1 do CPC);
- Ampliação da matéria de facto, por ter sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litígio (art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC);
- Apreciação de patologias que a decisão da matéria de facto enferma, que, não correspondendo verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, se traduzam em segmentos total ou parcialmente deficientes, obscuros ou contraditórios (art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC).
A esse respeito, importa convocar o ensinamento de Abrantes Geraldes (13), nos termos do qual a decisão da matéria de facto pode apresentar patologias que não correspondem verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, podendo – e devendo – algumas delas ser solucionadas de imediato pela Relação, ao passo que outras poderão determinar a anulação total ou parcial do julgamento.
Como concretização de tais patologias enuncia o citado autor que as decisões sob recurso “podem revelar-se total ou parcialmente deficientes”, “resultante da falta de pronúncia sobre factos essenciais ou complementares”, “de modo que conjugadamente se mostre impedido o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso”.
Verificado esse vício, para além de o mesmo ser sujeito a apreciação oficiosa da Relação, poderá esta supri-lo a partir dos elementos que constam do processo ou da gravação.

Pode, assim, “revelar-se uma situação que exija a ampliação da matéria de facto, por ter sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo tribunal a quo”, faculdade esta que nem sequer está dependente da iniciativa do recorrente, bastando que a Relação se confronte com uma omissão objetiva de factos relevantes”; nesse caso, ao invés de anular a decisão da 1ª instância, se estiverem acessíveis todos os elementos probatórios relevantes, “a Relação deve proceder à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas”.

Por sua vez, o âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se, resumidamente, de acordo com os seguintes parâmetros (14):

- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento;
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes).
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância.
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de reapreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão.
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção - obtida com benefício da imediação e oralidade - apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
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Por referência às suas conclusões, extrai-se que a recorrente pretende:

i) - A alteração das respostas dos pontos 35, 42, 44, 46, 48, 49, 50, 54 e 66 da matéria de facto provada da decisão recorrida.
ii) - A alteração da resposta negativa para positiva dos pontos de facto 2 e 3 da matéria de facto não provada da decisão recorrida.
iii) - A ampliação da matéria de facto de modo a que sejam dados como provados outros factos atinentes quer à ação, quer à reconvenção.

Os referidos pontos fácticos objeto de impugnação têm o seguinte teor:

Factos provados:

35º - A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu.
42º - (Na ETAR A) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), na parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.501.151,68 €, a parte do equipamento 1.798.387,27, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 96.650,26 €.
44º - (Na ETAR B) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.314.247,57 €, a parte do equipamento 1.587.568,23 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
46º - (Na ETAR C) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.438.276,21 €, a parte do equipamento 1.727.515,48 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 150.145,01 €.
48º - (Na ETAR D) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 877.861,06 €, a parte do equipamento 1.302.952,52 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
49º - No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (- 548.756,99).
50º - No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91).
54º - A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.
66º - As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.
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Factos não provados:

- A Ré apenas concordou com a alteração do projeto inicial, porque da mesma não decorria uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
- A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97
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Ampliação da matéria de facto provada:

55º–A: Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do Doc. n.º 111 da Contestação.
55º–B: Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do Doc. n.º 112 da Contestação.
56º–A: Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta com o teor que consta do Doc. n.º 113 da Contestação.
58º- A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 58º, a A. é devedora da R. da quantia de € 53.780,03 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 57º.
60º-A: Por falta de fundamento para a devolução das notas de débito id. em 60º, a A. é devedora da R. da quantia de € 101.795,80 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 59º.
62º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 62º, a A. é devedora da R. da quantia de € 136.767,54 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 61º.
64º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 64º, a A. é devedora da R. da quantia de € 71.355,84 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 63º.
*
No dizer da recorrente, a análise crítica das provas (testemunhal, declarações de parte, documental e pericial) e os elementos que constam dos autos impõe resposta e decisão diferente daquela que foi dada pelo tribunal “a quo” aos pontos da matéria de facto impugnada.

Há, assim, que verificar se a discussão probatória fundamentadora da decisão corresponde à prova realmente obtida ou, ao invés, se a mesma se apresenta de molde a alterar a facticidade impugnada, nos termos invocados pela apelante.

Antes, porém, de iniciarmos essa análise importa deixar consignado que, com vista a ficarmos habilitados a formar uma convicção autónoma, própria e justificada, procedemos à audição integral da gravação dos depoimentos testemunhais invocados na apelação como justificadores da impugnação da matéria de facto, não nos tendo restringido aos trechos parcelares assinalados pela apelante; mais se procedeu à audição dos demais depoimentos das testemunhas referidas na motivação da sentença recorrida.

Igualmente se procedeu à integral audição das declarações de parte prestadas pelo legal representante da recorrida (Óscar), inclusive as declarações de parte de um administrador do grupo societário do qual faz parte a recorrida, no caso o Francisco, as declarações de parte do legal representante da recorrente (Carlos), assim como a audição dos esclarecimentos dos peritos prestados logo no início da audiência de julgamento.
Para além disso, foram analisados todos os documentos referenciados, bem como apreciada (e valorada) a prova pericial produzida nos autos.
*
Seguindo o critério adoptado na sentença recorrida, iniciaremos a nossa análise pela enunciação das declarações de parte e da prova testemunhal produzida nos autos, sem embargo dos demais meios de prova produzidos serem ulteriormente objeto de menção (e valoração) aquando da apreciação circunstanciada de cada um dos pontos de facto impugnados.

– Em sede de declarações de parte, o legal representante da Autora, Óscar, indicou que, uma vez adjudicada a obra em causa, numa reunião com o dono da obra, Águas N, esta lhes comunicou que o projeto base não cumpria as diretivas (normativas) europeias, pelo que a A. decidiu introduzir-lhe alterações visando melhorá-lo tecnicamente, tendo para o efeito elaborado 4 (quatro) projetos de raiz das ETAR`s..
A condição imposta pelo dono da obra foi a de que não se poderia alterar (para mais) o preço adjudicado (não se podia pagar um euro a mais).
Essa alteração do projeto implicou a execução de trabalhos a mais por parte da autora ao nível dos equipamentos e a execução de trabalhos a menos para a ré ao nível da especialidade de construção civil.

Segundo declarou, a ré não chegou a discutir os termos das alterações do projeto determinados pela A., o que significa que não teve qualquer intervenção nessa decisão tomada pela A..

Diversamente do que tinha ocorrido numa anterior empreitada das ETAR`s para as Águas de Trás-os-Montes e Alto Douro, na qual a A. e a Ré participaram também como consorciadas e em que se verificou uma alteração do projeto inicial, tendo ambas as partes faturado os respetivos trabalhos prestados de acordo com os trabalhos efetivamente executados, desta vez, por razões do interesse do dono da obra e por limitações temporais, a faturação foi sendo processada de acordo com o projeto inicial, sem embargo das consorciadas (A. e Ré) se poderem entender entre si quanto ao ajustamento do valor dos trabalhos prestados, subsistindo sempre como condição essencial que o preço final da adjudicação da empreitada não poderia ser alterado para mais.

De assinalar que o declarante jamais asseverou a feitura nem a formalização de qualquer acordo expresso entre as partes (A. e ré) na sequência da alteração do projeto tendo por objeto a introdução de alterações ao clausulado pelas partes no contrato de consórcio (ou ao respetivo aditamento outorgado em 23/09/2005) relativamente à participação de cada uma das consorciadas no projeto inicial (quer quanto ao tipo e volume dos trabalhos a executar, quer, sobretudo, quanto ao ajustamento ou retificação das percentagens fixadas no consórcio em função da obra executada), limitando-se a alicerçar esse acordo por referência ao teor da cláusula 4ª, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio (cuja cópia consta de fls. 89 a 100). Ou seja, não obstante as alterações do projeto patenteado a concurso assumidas pela A. e a condição imposta pelo dono da obra de que daí não poderia advir qualquer alteração (para mais) do preço final da empreitada, das declarações de parte prestadas pelo legal representante da A. resulta não ter havido entre as consorciadas um acordo específico no sentido de as partes se terem vinculado a efetivarem um ajustamento das percentagens de participação estabelecidas no consórcio em razão dos trabalhos efetivamente realizados ou atribuídos a cada uma das consorciadas.
Explicitou a ordem dos trabalhos executados (primeiro a movimentação de terras, depois as obras de construção civil e de condutas e, por fim, a colocação/instalação dos equipamentos).

Confirmou que a ré faturou (ao dono da obra) todos os trabalhos da sua especialidade (de construção civil) de acordo com o projeto base, o mesmo sucedendo com a A., especificando que, por aquela ter facturado e recebido em primeiro lugar, faltavam por pagar à A. cerca de “900 e tal mil euros”. Na sequência da interpelação feita pela A. quanto à necessidade de se fazer um reorçamento em função dos trabalhos da empreitada executados, os legais representantes da ré foram-lhe sempre referindo que cada um dos membros do consórcio tinha que defender os seus valores. Ou seja, face à reclamação pela A. do pagamento dos trabalhos a mais executados (na componente de equipamentos), a Ré contrapunha que aquela teria de reclamar do dono da obra tais valores, sendo que nas reuniões com o dono da obra este limitou-se a referir que as consorciadas é que teriam de se entender entre si quanto aos valores devidos a cada uma delas pela sua participação no consórcio.

As enunciadas declarações de parte são, no fundo, elucidativas da discordância das partes quanto ao ponto em discussão – de se impor, ou não, o reajustamento dos valores em função do valor dos trabalhos executados por cada uma das consorciadas na decorrência da alteração do projeto base –, o qual esteve na base da dedução da presente ação.
- Igualmente em sede de declarações de parte, Francisco (15), engenheiro eletrotécnico, contratado pela Autora em 2008 e que desde 2013 exerce as funções de administrador da Autora para a CPLP, referiu que, aquando da sua entrada para a empresa, a obra em causa encontrava-se (já) na sua fase final, pelo que não assistiu às negociações antecedentes à outorga do contrato de consórcio referente ao concurso público do tratamento de águas residuais de 4 estações (ETAR`s de D, C, B e A), nem tão pouco às que se lhe seguiram com vista à alteração do projeto base.

Não obstante tais limitações (ao nível da sua razão de ciência), por força do exercício das suas funções revelou ter conhecimento do projeto inicial e das razões que motivaram a sua modificação (por terem sido identificadas situações de incumprimento dos parâmetros das diretrizes europeias e de fundos comunitários, o que o tornava desatualizado), pelo que o consórcio decidiu apresentar um novo projeto desenvolvido pela autora, tendo o dono da obra imposto como condição a não alteração (para mais) do preço final da empreitada, o que foi aceite pelo consórcio.

Na sequência da sua contratação pela A. em 2008, foi contactado por dois engenheiros colaboradores da Ré (Eng. Rui e Eng. Cristiano) a fim de participar numa reunião conjunta com o dono da obra, Águas N, na sede desta, com vista à apresentação dos trabalhos a mais da empreitada, sendo que, no seu entendimento, não se tratava propriamente de trabalhos a mais, mas sim do acerto do fecho de contas, cujo pagamento (na ordem dos 800 mil contos apresentado pelo A.) foi recusado pelo dono da obra. Dessa reunião resultou igualmente uma resistência da ré em anuir no deferimento da pretensão da A. no sentido de ser reembolsada pelo valor dos equipamentos instalados em função do projeto variante executado, recusa essa que se manteve inalterada e que motivou a propositura da presente ação.

Segundo referiu, a alteração do projeto base implicou o incremento de equipamentos em detrimento dos trabalhos de construção civil, tendo a ré facturado trabalhos a mais dos que os previstos no projeto variante e que não chegou a executar.

Malgrado ter referido que, ao aceitar as alterações do projeto que implicavam a colocação de mais equipamento e o acréscimo de custos, a A. estava convicta de que esses valores acrescidos lhe seriam pagos tendo em consideração a redução dos trabalhos de construção civil por parte da ré, a verdade é que o declarante não presenciou nenhuma negociação em que os legais representantes da ré se tenham vinculado nesse sentido, além de que da prova documental carreada aos autos não resulta expressamente reconhecida essa vinculação (sem embargo, ressalve-se, da análise que ulteriormente será feita da cláusula 4, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio), pelo que aquela convicção não passa duma mera suposição subjetiva do declarante.
– O legal representante da Ré, Carlos, inquirido também em sede de declarações de parte, rejeitou perentoriamente que a alteração do projeto inicial tenha determinado um menor custo da obra realizada na componente de construção civil em consequência de um menor volume de trabalho nessa área. Especificou ter havido uma separação dos trabalhos em função das especialidades (o que é habitual suceder em todas as obras desta género), sendo que cada uma das empresas consorciadas apresentou o respetivo orçamento, sem embargo de haver um orçamento comum para os custos comuns (por ex., contentores, gruas e técnicos de segurança, etc.).
Referiu que a obra facturada pela Ré corresponde aos trabalhos que foram executados (ainda que sob outra forma), dizendo não ter competência para aferir se os valores reclamados pela A. a título dos equipamentos estão ou não corretos (dado ser uma matéria eminentemente técnica e muito específica e que nem os peritos conseguiram avaliar, posto que alguns desses equipamentos são produzidos exclusivamente pela própria Autora).
Rejeitou ter havido qualquer acordo, ainda que tácito, no sentido de, no final da empreitada, as partes efetuarem a correção dos valores devidos em função da sua percentagem de participação no consórcio, até porque cada uma das empresas era responsável pela sua parte/especialidade e a ideia que disse ter perdurado foi a de estar em causa a execução de “trabalhos a mais” (quer por parte da A., quer da Ré), os quais deveriam ser objeto de reclamação junto dono da obra e não do outro consorciado.
– A testemunha Maria, engenheira do ambiente, colaboradora da FA-Engenharia do Ambiente, Ldª - empresa esta que faz parte do grupo societário da Autora e com quem celebrou um contrato de subempreitada (cfr. ponto 22 dos factos provados) - foi responsável pela elaboração, ao nível da componente dos equipamentos/eletromecânicos, da proposta apresentada a concurso público para a empreitada de execução das ETAR`s em causa. Confirmou que, após a adjudicação da obra, o projeto foi alterado, com vista à introdução de melhorias técnicas. Ao nível dos custos, as alterações do projeto implicariam um menor volume de construção civil (dada se verificar uma concentração de edifícios) e um maior volume de trabalhos de equipamentos, embora só no final, depois das medições, seria possível apurar o seu real custo. A alteração do projeto foi objeto de aprovação pelo dono da obra, sob a condição de não haver aumento do preço final da empreitada.
Referiu a testemunha que, logo à partida, era claro (pelo menos para a Autora, sendo impossível que a Ré não se tivesse apercebido) que as alterações do projeto iriam ter tais implicações ao nível do volume de trabalho.
O projeto base (o mesmo sucedendo com o projeto variante) era um projeto de concepção-construção, que foi sendo desenvolvido quer pela A., quer pela ré, projeto esse que, ainda na fase do concurso, careceu de ser detalhado a fim de serem apuradas as quantidades (quer de construção civil, como dos equipamentos) e ulteriormente ser atribuído o preço ou orçamentadas as apuradas quantidades.
A Ré foi a primeira a executar os respetivos trabalhos, tendo-os facturado de acordo com o projeto inicial, pelo que a dado momento a A. passou a ter custos sem ter facturação.
Confirmou que nas diversas reuniões celebradas com a ré tendo em vista o reclamado acerto de contas esta recusou-se sempre a anuir nessa pretensão, justificando tratar-se de trabalhos executados a mais que teriam de ser reclamados junto do dono da obra.
– A testemunha César, engenheiro eletrotécnico, colaborador da supra referida FA-Engenharia do Ambiente, Ldª, que é uma empresa do grupo da Autora, exerceu as funções de diretor de obra na parte de equipamentos.

Confirmou a alteração do projeto inicial, que foi aceite pelo dono da obra, sob a condição de se manter inalterado o preço global da empreitada. O projeto variante implicava um aumento dos equipamentos e uma diminuição das obras de construção civil, dada a concentração de vários edifícios num só e a junção dos órgãos (de tratamento de águas), com menores percursos e poupança de betão.
Confirmou que a Ré aceitou a alteração dos projetos (o que não é por esta contestado, a qual se limita a refutar, isso sim, a aceitação dos novos preços) e que algumas das alterações entretanto introduzidas foram sendo solicitadas (não pela Ré, entenda-se) ao longo da execução do projeto.
Pese embora a Ré ter efetuado trabalhos a menos do que os que constavam do projeto inicial, faturou-os de acordo com o mapa de medições do projeto base ou inicial, recusando-se a fazer o acerto de contas com a A..
A reorçamentação foi feita mais tarde (em 20 de abril e 27 de novembro de 2007, respetivamente), estando a obra já em curso, e nunca foi aceite pela ré, dela resultando ser devido mais dinheiro à A. e menos à Ré.
No seu entendimento, o reajustamento dos preços em função dos trabalhos efetivamente executados está contemplado no aditamento do contrato de consórcio (querendo reportar-se à cl.ª 4ª, n.º 4).
– A testemunha Sónia, engenheira civil e técnica de higiene e segurança do trabalho, colaboradora desde outubro de 2008 da FA-Engenharia do Ambiente, Ldª, iniciou funções na obra em causa quando a mesma se encontrava já na fase de conclusão.

Foi-lhe solicitado para efetuar medições, porquanto, tendo havido alteração do projeto inicial (com alterações ao nível das percentagens dos trabalhos de construção civil e equipamentos), a faturação estava a ser processada de acordo com o projeto antigo (inicial) e não de acordo com o projeto novo e da obra executada.
Para o efeito deslocou-se às 4 (quatro) ETARS a fim de efetuar o respetivo levantamento, tendo constatado a existência de diferenças entre os dois projetos, nomeadamente menos trabalhos de construção civil (betão armado) e mais trabalhos de equipamentos, quer ao nível de unidades, quer do tipo de equipamentos.
A testemunha elaborou o documento cuja cópia conta de fls. 107 v.º a 168, tendo explicitado os pressupostos e o método utilizados na sua elaboração, designadamente confrontado para o efeito os mapas de quantidades do projeto novo com os mapas do projeto inicial, bem como atendido às medições por si efetuadas no terreno e à documentação que lhe foi fornecida pela Autora quanto ao custo dos equipamentos.
– A testemunha Manuel, engenheiro civil, que foi colaborador da Ré desde 2004 a 2014, tendo exercido as funções de diretor de obra da Ré em três das quatros ETARS objeto dos autos, sendo atualmente colaborador de uma outra empresa que faz parte do grupo da Ré, confirmou que, após o vencimento da proposta submetida a concurso público e de a obra lhes ter sido adjudicada, a autora tomou a iniciativa de proceder à alteração do projeto inicial, que seria mais vantajoso para o dono da obra, com melhorias significativas de qualidade de eficiência nas próprias infra-estruturas, o que mereceu anuência quer da ré, quer do dono da obra (sob a condição, por este, de não ser alterado para mais o preço final, por estarem em causa fundos comunitários), pelo que foi apresentado um projeto alternativo ou variante.

No dizer da testemunha, essa anuência teve como premissa a expetativa de que o volume de trabalho de construção civil teria de ser mantido, sob pena da Ré preferir manter o projeto base, além de que nas reuniões havidas entre as partes nunca a A. alertou (a Ré) que se tivesse de colocar equipamentos mais caros esse acréscimo teria de ser imputado na percentagem que competia a cada uma das especialidades, referindo que essa gestão era independente e que cada empresa avaliava os riscos das respetivas propostas, sendo que cada uma delas era responsável pela gestão da sua obra, não tendo sequer chegado a haver troca de reorçamentação entre as duas empresas consorciadas.
Especificou que, na diferença do custo entre os trabalhos previstos no projeto inicial e os executados, pode não estar em causa o preço unitário, mas o método de construção.
Apesar de a Ré (tal como a A.) ter facturado de acordo com os mapas de trabalho do projeto base, ao nível da construção civil executou trabalhos a mais do que os previstos no projeto inicial (na ordem dos sessenta e tal mil euros), cujo pagamento foi declinado pelo dono da obra.
Referiu que a Ré nunca assumiu o pagamento de qualquer quantia adicional em relação aos trabalhos realizados, reiterando que sempre ficou esclarecido que cada empresa seria responsável pela sua obra e pela gestão da sua parte, facturando cada uma delas diretamente ao dono da obra e dele recebendo os respetivos montantes facturados, pelo que o reajustamento das percentagens em função da obra efetivamente realizada se reportava apenas aos custos e gastos comuns (contentor, técnico de segurança, máquina de café).
– A testemunha Cristiano, engenheiro civil, colaborador da Ré, que exerceu as funções de diretor de produção da Ré e acompanhou a empreitada desde o início até ao final na parte de produção, em consonância com a testemunha antecedente, assinalou que a premissa que vigorava entre as empresas consorciadas era a de que cada uma delas tinha de controlar os respetivos orçamentos, dado serem orçamentos fechados (“não há vasos comunicantes”).
Mais referiu que a Ré teve sempre o cuidado no sentido de evitar um desvio (leia-se derrapagem) em relação aos custos previstos no projeto, o mesmo não sucedendo com a A. que, ao não fazer os trabalhos de casa, apresentou na fase final da empreitada um desvio avultado (na ordem dos 800 mil euros), cujo valor foi enviado pela Ré, na qualidade de líder do consórcio, ao dono da obra para efeitos de reclamação, tendo sido por este recusado (o que era já expetável, pois o dono da obra impôs como condição de aceitação da alteração do projeto a inamovibilidade do preço final da empreitada).
Só posteriormente à recusa do pagamento dos trabalhos pelo dono da obra é que a A. manifestou à Ré o propósito de abater aquele valor à componente da construção civil, sob a alegação de que esta teria tido um benefício (por diminuição de trabalhos executados), pelo que haveria que fazer uma compensação, o que foi rejeitado pela ré.

Mais explicitou que, no final da empreitada, na parte respeitante à construção civil a ré também apresentou um desvio (na ordem dos 60 mil euros) entre o orçamentado e o executado, tendo arcado com esse prejuízo, pois tinha conhecimento que o dono da obra não iria aceitar pagar qualquer valor excedentário (esse valor estava compreendido na margem de gestão do risco comercial da Ré).
– A testemunha Filipe, engenheiro civil, colaborador da Ré, que exerceu as funções de diretor de obra, não participou na orçamentação do projeto na fase do concurso público, tendo intervindo já após a adjudicação da obra.

À semelhança das testemunhas antecedentes, explicitou que, logo após a adjudicação da empreitada, a Autora contactou a Ré no sentido de a questionar se estaria disponível para aceitar alterações ao projeto apresentado e adjudicado (uma solução distinta da que havia sido patenteada a concurso público), tendo-lhe para o efeito apresentado um conjunto de elementos, ou seja, desenhos já com algum detalhe (similares ao programa do concurso que o dono da obra lhes havia facultado) – que correspondem ao documento de fls. 2192 vº a 2221 v.º, datado de março de 2006 –, os quais eram suficientes para a Ré poder avaliar se, em termos financeiros, esse risco se assemelhava ou não ao nível do risco do projeto inicial, tendo sido esse documento que serviu de base à revisão e reorçamentação dos trabalhos pela Ré.

Rejeitou que tenha sido acordado e assumido que o eventual sobrecusto de qualquer uma das especialidades da obra (construção civil/equipamentos) seria custeado e suportado pela outra parte, referindo ter sido condição da aceitação da alteração do projeto inicial de que não haveria diminuição dos trabalhos de qualquer uma das componentes (designadamente de construção civil) do valor adjudicado ao cliente, posto que, tratando-se de um consórcio externo, cada parte seria responsável pela sua área.

– A testemunha Henrique, engenheiro biológico, sócio da empresa FA-Engenharia do Ambiente, Ldª, que dentro do grupo era diretor geral da FA, tendo intervindo na qualidade de gestor do projeto do consórcio, explicitou os contornos atinentes à alteração do projeto inicial, visto ser percetível que este não dava garantias quanto ao cabal cumprimento dos parâmetros da qualidade da água tidos por adequados, alteração essa cuja iniciativa partiu da A. – à semelhança do que sucedera com o projeto anterior das ETAR`s de Trás-os-Montes e Alto Douro –, dando nota da sua aceitação pela Ré, pelo que foi apresentada uma nova proposta (com revisão e adaptação dos trabalhos) em função do novo projeto, a qual foi também aceite pelo dono da obra, sob a condição de não ser alterado (para mais) o preço final da empreitada.

Expressamente reconheceu não ter havido um acordo entre a A. e a Ré quanto ao ajustamento/retificação das mais valias contempladas no projeto variante, pois numa reunião de trabalho em que a testemunha participou a Ré desde logo informou não aceitar que as percentagens ajustadas no contrato para a especialidade de construção civil fossem alteradas, pelo que teria de ser o dono da obra a ter de pagar as diferenças. Essa posição da ré não impediu, no entanto, que o projeto variante fosse avançando (isto é, fosse sendo executado), referindo a testemunha que foi um assunto que se foi “empurrado com a barriga”, porque na altura era mais importante cumprir com o cliente, isto é, fazer a obra e entregá-la até porque se tratava de uma obra pública com fases definidas e prazos a cumprir, sendo que todos estavam de acordo em executar o projeto novo.
No seu entendimento, o volume de trabalho da obra da ré executado em conformidade com o projeto variante é inferior ao que constava do projeto base e, por sua vez, a alteração do projeto demandou a aplicação de mais equipamentos e mais etapas (ou seja, a percentagem da especialidade de equipamentos aumentou em relação ao projeto inicial).
Em conversas com o administrador da A., Óscar, este referiu-lhe que teria de haver um reequilíbrio do contrato, pelo que se porventura o dono da obra não assumisse o pagamento das mais valias teria de ser firmado um acordo com a Ré de modo a repor as percentagens do contrato em função dos trabalhos executados.

A testemunha reportou a situação ocorrida anteriormente na empreitada das ETAR`s de Trás-os-Montes e Alto Douro, realizada pelo mesmo consórcio e com contornos similares à dos presentes autos. Também nessa empreitada houve alteração do projeto inicial por iniciativa da A., com aumento do volume de serviço da especialidade de equipamentos e diminuição do volume de serviços de construção civil, em que o dono da obra recusou alterar o preço final da empreitada, mas em que a Ré aceitou o reajustamento das percentagens em função dos trabalhos executados, tendo recebido menos do que estava previsto no contrato inicial. Diversamente, na presente empreitada a Ré manifestou a não aceitação da mesma solução alcançada na ETAR de Trás-os-Montes, rejeitando a diminuição da sua percentagem.
Quando a testemunha deixou de exercer funções na obra em causa esta ainda não estava concluída e nem se mostravam fechadas as contas entre o dono da obra e o consórcio.
*
Feita esta enunciação (expositiva) das declarações de parte e da prova testemunhal produzida é altura de nos pronunciarmos sobre cada um dos pontos impugnados (atendendo-se para o efeito aos demais meios de prova produzidos nos autos):

Foi posta em crise, pelo R., a seguinte matéria de facto:

- < Ponto 35º dos factos provados: A Autora questionou a Ré, se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu.
- < Ponto 2º dos factos não provados: A Ré apenas concordou com a alteração do projeto inicial, porque da mesma não decorria uma diminuição do trabalho nem do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
- < Resposta pretendida: A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu na condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
Não pondo em causa a factualidade enunciada no ponto 35 dos factos provados, o que a recorrente diz é que essa facticidade encontra-se incompleta, na medida em que o tribunal a quo não atendeu – como devia – à prova produzida nos autos quanto à (concreta) condição de que aquela fez depender a sua anuência à revisão e adaptação dos trabalhos da sua especialidade (construção civil) às propostas de alteração do projecto inicial apresentadas pela A./recorrida.

Não oferece dúvidas, na medida em que se mostra definitivamente provado que:

- No âmbito do concurso público lançado pela sociedade Águas X, S.A., destinado à adjudicação da empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Autora, a Ré e a sociedade MCA S.A. decidiram apresentar uma proposta conjunta, a qual, tendo sido a vencedora do concurso público, foi adjudicada às empresas que constituíam o agrupamento concorrente (pontos 3 e 4 dos factos provados).
- Em cumprimento do Programa de Concurso, as sociedades adjudicatárias agruparam-se em consórcio externo, tendo para o efeito a Autora, a Ré (então designada por Empreiteiros Y de AFS, S.A.) e a sociedade denominada MCA S.A., celebrado um contrato de consórcio externo, através de documento datado de 22 de Setembro de 2005, tendo a ré sido designada líder de Consórcio (pontos 5 e 6 dos factos provados).
- Nos termos do contrato de consórcio, a participação de cada consorciada no consórcio correspondia, respetivamente, às seguintes percentagens:
- Espina: 51,80 %
- Y: 40,70 %
- MCA: 7,50 % (ponto 7 dos factos provados).
- De acordo com o aditamento ao contrato de consórcio subscrito por todas as consorciadas em 23/09/2005, a Ré/Y assumiu a participação da sociedade MCA S.A. no consórcio, passando as participações no consórcio a serem as seguintes (cláusula 4.ª):
- Espina: 51,80 %
- Y: 48,20 % (ponto 8 dos factos provados).
- A participação da Autora no consórcio (51,80%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de equipamentos no valor global do contrato de empreitada (€ 6.371.204,95) e a participação da Ré no consórcio (48,20%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de construção civil no valor global do contrato de empreitada (€ 5.927.088,77), sendo que a distribuição das participações da Autora e da Ré no consórcio resultava da repartição entre ambas dos trabalhos que constituíam o objeto do contrato de empreitada, tendo por base a execução das especialidades de cada empresa (pontos 9 a 13 dos factos provados).
- O contrato de empreitada com a Águas N foi outorgado em 30/11/2005, pelo preço global de € 12.298.293,72, acrescido de IVA à taxa legal em vigor e com um prazo global de execução de 905 dias a contar da data de consignação da obra (ponto 19 dos factos provados).
- Esta obra foi totalmente executada pelas referidas consorciadas e oportunamente recebida e o seu preço pago pela Águas N, S.A. (ponto 23 dos factos provados).
- O projeto de obra que foi levado a concurso e que era suposto as consorciadas terem executado foi, por proposta da Autora, objeto de alterações tendentes a melhorá-lo tecnicamente (pontos 24 a 31 dos factos provados).
- Estas modificações foram apresentadas pela Autora à Águas N, S.A., em Novembro de 2005, para o que foi feito um desenho individual para cada uma das quatro ETAR, num total de setenta e duas peças desenhadas, dezoito por ETAR (pontos 32 e 33 dos factos provados).
- A Águas N, S.A. concordou com as propostas da Autora de alteração do projeto, que tinham como condição não ultrapassar o valor global fixado para o projeto inicial (ponto 34 dos factos provados).
- A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu (ponto 35 dos factos provados).
- A Autora procedeu às alterações do projecto na componente de instalações técnicas e equipamentos, após o que o remeteu à Ré para esta proceder à sua revisão quanto à especialidade de construção civil., sendo que após revisão e adaptação do projeto por parte da Ré, na componente da construção civil, esta procedeu à sua reorçamentação em face das alterações introduzidas (pontos 36 e 37 dos factos provados).
- Todas as consorciadas realizaram a obra de acordo com o projeto alterado (ponto 39 dos factos provados).
- A obra foi integralmente executada pelo consórcio, mas implicou a alteração no volume de trabalho executado pelas partes e seu valor (ponto 40 dos factos provados).
O pomo da discórdia justificadora da impugnação da matéria de facto em apreço radica essencialmente nos termos e condições em que a Ré/recorrente anuiu na alteração e revisão do projecto inicial patenteado a concurso na componente de construção civil e o seu reflexo no âmbito do contrato de consórcio e respetivo aditamento assinados por ambas as consorciadas, respectivamente, em 22/09/2005 e 23/09/2005.
Da materialidade fáctica provada supra enunciada resulta inequívoco que, após a adjudicação da empreitada, a A., que é uma empresa experiente e prestigiada no sector de instalações hidráulicas, elétricas e mecânicas, manifestou ao dono da obra e à consorciada Ré a sua disponibilidade na introdução de alterações ao projeto de obra vencedor que havia sido levado a concurso, alterações essas tendentes a melhorá-lo tecnicamente, como melhor resulta dos pontos 24 a 31 dos factos provados.
O dono da obra, Águas N, S.A., concordou com as propostas da Autora de alteração do projeto, sob a condição de não ser ultrapassado o valor global fixado para o projeto inicial.
E mostrando-se assente que, face aos elementos que lhe foram apresentados pela A. (designadamente os desenhos constantes de fls. 2192 vº a 2221 vº), também a ré deu a sua anuência à alteração do projeto inicial, aceitando proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua exclusiva responsabilidade (construção civil), coloca-se a questão de saber se esta impôs, ou não, alguma condição a essa aceitação ou, ao invés, se essa anuência foi incondicional.

Como elemento relevante com vista a formularmos um juízo sobre a questão colocada importa desde logo ter presente que, não obstante não subsistirem dúvidas quanto ao acordo alcançado entre as consorciadas com vista à alteração do projeto inicial, as partes não cuidaram de formalizar, mediante documento escrito, os termos ou condições contratuais entre elas ajustados corporizadores dessa alteração do projeto inicial, nomeadamente a estipulação das implicações decorrentes de alteração (para mais ou para menos) dos custos ou volumes de trabalho de cada um das especialidades em causa e a necessidade do reajustamento, no final da obra, das percentagens de participação de cada uma das consorciadas em função dos trabalhos executados.

A afirmação antecedente, ressalve-se, deve ser lida com o cuidado necessário, visto a recorrida defender que o reajustamento das percentagens de participação em função dos trabalhos efetivamente executados se mostra suportada na cláusula 4ª, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio (entendimento este expressamente referido pelo legal representante da Autora, Óscar, em sede de declarações de parte), ponto este que será ulteriormente objeto de análise.

No tocante à prova testemunhal, urge sobrelevar o depoimento da testemunha Cristiano, que exerceu as funções de diretor de produção da Ré, mas sobretudo da testemunha Henrique, que dentro do grupo societário do qual a Autora faz parte exercia as funções de diretor geral da FA e interveio na qualidade de gestor do projeto do consórcio, sendo que ambas as testemunhas eram membros do COF (Conselho de Orientação e Fiscalização) do Consórcio.
A testemunha Henrique, como supra se explicitou, expressamente reconheceu não ter havido um acordo entre a A. e a Ré quanto ao ajustamento das mais valias, tendo a Ré desde logo manifestado a sua posição no sentido de não aceitar que as percentagens ajustadas no contrato para a especialidade (de construção civil) fossem alteradas, remetendo a responsabilidade pelo pagamento de tais diferenças para o dono da obra.

E das relatadas conversas que manteve com o administrador da A., Óscar – em que, como se disse, este lhe mencionou que teria de haver um reequilíbrio do contrato, pelo que se porventura o dono da obra não assumisse o pagamento das mais valias teria de ser firmado um acordo com a Ré de modo a repor as percentagens do contrato –, é plausível confluir no sentido da inexistência do aludido acordo prévio entre as consorciadas
Em termos mais assertivos (nos termos supra enunciados) no sentido da confirmação da enunciada premissa subjacente à aceitação, pela ré, da revisão e alteração do projeto na componente da especialidade de construção civil, foi o depoimento da testemunha Cristiano – postura essa que se compreende, na medida em que é colaborador subordinado da ré –, mas cujo teor do depoimento, nessa parte, coincide na sua essencialidade com o depoimento prestado pela indicada testemunha Henrique, pelo que os dois depoimentos nos mereceram credibilidade.
Para essa decisão de recusa por parte da ré com vista a salvaguardada da sua posição contratual foi, aliás, explicitado o facto de a área dos equipamentos ser bastante específica (de resto, algumas das máquinas são de fabrico exclusivo da A. e outros foram especificamente produzidas para aquela obra), inexistindo nalguns casos valores de mercado que permitam aferir (ou sequer confrontar/comparar) o seu valor, sendo que a ré não domina essa área, pelo que não pretendia a mesma ficar sujeita ou à mercê das imputações das mais valias dos equipamentos com que a A. entendesse por adequado dotar o projeto variante.
No mesmo sentido depôs a testemunha Manuel (como já atrás aludimos), que foi colaborador da Ré, tendo exercido as funções de diretor de obra da Ré em três das quatros ETARS objeto dos autos.

Das demais testemunhas arroladas pela A. nenhuma delas revelou ter conhecimento directo da negociação firmada entre as consorciadas:

- A testemunha Maria teve apenas intervenção na elaboração da proposta da A. apresentada a concurso público para a empreitada de execução das ETAR`s.
- A testemunha César, que exerceu as funções de diretor de obra da A. na parte de equipamentos, não participou na fase de projecto, nem de orçamento, nem teve qualquer participação em reuniões negociais.
- A testemunha Sónia iniciou funções na obra quando a mesma se encontrava já na fase da conclusão e limitou-se a fazer medições de trabalhos, não tendo participado em qualquer reunião negocial.
- A testemunha Elisabete é funcionária administrativa da A., revelando total desconhecimento sobre a matéria em causa.
- Por fim, o Francisco (inquirido em sede de declarações de parte), que veio substituir a testemunha Henrique já numa fase final da obra, não assistiu às negociações tendentes à outorga do contrato de consórcio respeitante à obra em discussão nos autos, nem tão pouco às que se lhe seguiram com vista à alteração do projeto base; já na fase final dos trabalhos, esteve presente numa reunião com os representantes da Ré, na sede do dono da obra Águas N, em que a questão atinente ao reajustamento das percentagens da participação nos trabalhos do consórcio foi debatida, mas tendo a mesma sido rejeitada pela ré.
A prova documental trocada entre as partes é igualmente elucidativa da inexistência de qualquer aceitação por parte da ré quanto à alteração ou reajustamento das percentagens contratuais fixadas no projeto inicial.
A esse respeito damos conta do documento cuja cópia consta de fls. 1015 e 1016 (identificado como n.º 111, junto com a contestação), datado de 26/03/2009, correspondente a uma comunicação da R. à A., expedida via telefax; do documento cuja cópia consta de fls. 1019 (identificado como n.º 112, junto com a contestação), correspondente a uma carta, datada de 1/07/2010, expedida pela Ré à A.; por último, o documento cuja cópia consta de fls. 1021 vº a 1023 (identificado como n.º 113, junto com a contestação), correspondente a uma carta, datada de 13/08/2010, expedida pela R. à A. em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010 através do seu mandatário (doc. n.º 9 da P.I., cuja cópia consta de fls. 43).

Destas missivas resulta que, no entendimento da Ré, a sua aceitação da alteração do projeto pressupunha que cada parte seria responsável por executar o novo projecto (variante) dentro dos valores que haviam sido definidos para cada uma das consorciadas na repartição resultante do projecto base, mantendo-se inalterada a percentagem contratual ajustada no projeto inicial, pelo que se porventura houvesse alguma derrapagem ou desfasamento por parte de qualquer uma das consorciadas na execução do projeto variante em relação ao preço definido para o projeto base esse risco contratual correria por conta da respetiva parte.
Resta, por fim, analisar e (tentar) interpretar a cláusula quarta, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio.
A referida cláusula foi erigida como decisiva pela A. para exigir da ré o reembolso da quantia correspondente a parte do preço da empreitada por esta recebido e que, como resultado da execução do projeto variante, pertenceria à A. (veja-se não só a causa de pedir que serve de fundamento à pretensão da Autora, como as próprias declarações de parte do legal representante da autora, Óscar).
Segundo a interpretação que a A. faz da referida cláusula, as percentagens de participação no consórcio seriam, no final da empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efetivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas (art. 12º da p.i.), pelo que uma vez que o projeto de obra levado a concurso público e que era suposto as consorciadas terem executado foi objeto de substanciais alterações em termos do tipo de obra realizada pelas consorciadas, tendo implicado mais trabalhos para a A. e menos trabalhos da parte da ré, esse circunstancialismo deverá ter repercussão na divisão do preço entre as consorciadas (arts. 28º a 34º da p.i.).
Posição diversa tem a Ré, a qual defende que a fixação da percentagem de participação no consórcio estabelecida na referida cláusula apenas releva para efeitos de repartição das despesas comuns no âmbito do consórcio (art. 72º da contestação).

Vejamos como decidir.

De acordo com o aditamento ao contrato de consórcio subscrito por todas as consorciadas em 23/09/2005, a Ré Y assumiu a participação da sociedade MCA S.A. no consórcio, passando as participações no consórcio a serem as seguintes (cláusula 4.ª):
- Espina: 51,80%
- Y: 48,20%

Nesse aditamento ao contrato de consórcio foi ainda convencionado entre A. e R. que:

- “(…) as signatárias não constituem qualquer pessoa ou entidade jurídica distinta das próprias consorciadas, nem estabelecem entre si qualquer vínculo do tipo societário ou forma de associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico” (Cláusula 2.ª, n.º 2).
- “Os trabalhos e tarefas necessários à execução da empreitada em conformidade com os termos do respectivo contrato serão repartidos entre as signatárias tendo em conta as respectivas especialidades (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 1).
- “Havendo dúvidas ou divergências quanto à distribuição entre as consorciadas de quaisquer trabalhos a mais, trabalhos complementares ou outros trabalhos adicionais de qualquer natureza, competirá ao Conselho de Orientação e Fiscalização efectuar essa distribuição, atendendo às especialidades de cada consorciada (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 2).
- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas” (Cláusula 4.ª, n.º 4).
- “O disposto no presente contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, nem visa a constituição de qualquer fundo comum, apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas” (Cláusula 4.ª, n.º 5).
- “Cada consorciada suportará todos os custos e despesas inerentes à execução dos trabalhos que lhe estejam atribuídos, bem como, na correspondente percentagem, as despesas e custos que, atendendo à respectiva natureza ou em consequência de acordo unânime das signatárias, sejam expressamente qualificadas como comuns a todas elas neste contrato, nos seus eventuais aditamentos, ou por deliberação do COF” (Cláusula 5.ª, n.º 1).
- “(...) são, nomeadamente, obrigações das consorciadas: a) Executar todos os trabalhos da empreitada que lhe estão ou venham a estar cometidos segundo a repartição prevista na cláusula 4ª, supra, incluindo todos os fornecimentos de materiais, equipamentos, meios humanos, instalações, ensaios, formação e treino, supervisão, gestão e controlo, trabalhos temporários ou provisórios que se revelem necessários para a boa execução e completo acabamento dos mesmos trabalhos, em conformidade com os termos e condições do contrato de empreitada e com as alterações que venham a ser licitamente impostas ou acordadas com o Dono da Obra” (Cláusula 6.ª, n.º 1).

Foi ainda convencionado no contrato de consórcio que:

- “As consorciadas facturarão e receberão diretamente do Dono de Obra o valor dos respetivos trabalhos” (cláusula 9.ª).
Fazendo uma leitura isolada da enunciada cláusula 4.ª, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio, tenderíamos, sem dúvida, a concordar com a interpretação que dela faz a A./recorrida nos termos supra expostos.
Acontece, porém, que uma adequada interpretação da vontade negocial firmada no contrato de consórcio pressupõe necessariamente que se tomem em consideração as demais cláusulas inseridas no dito aditamento, mormente as que com ela se relacionam diretamente, por esclarecerem ou complementarem (ampliando ou restringindo) o respetivo âmbito.
E, nessa pressuposição, afigura-se-nos que o sentido interpretativo que a A. pretende retirar da referida cláusula é-lhe vedado pelo teor da Cláusula 4.ª, n.º 5 do referido aditamento, o qual, com cariz eminentemente restritivo, delimitativo e explicativo, expressamente consigna que o estipulado no referido “contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, (…), apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas(sublinhado nosso).
A existência dessas despesas ou encargos comuns do consórcio (tais como, por exemplo, a utilização conjunta de contentores, água, luz, máquina de café, técnico de higiene e segurança, dado as consorciadas exercerem as suas funções no mesmo local – estaleiro –, dividindo entre si meios ou serviços prestados) foi confirmada, entre outras, pelas testemunhas Manuel e Henrique, e a sua previsão não é despicienda ou inócua, visto os encargos comuns inicialmente previstos no projeto poderem variar em função da obra executada por cada uma das especialidades, sendo usual para o efeito atender à facturação de cada uma das empresas consorciadas, contanto que esta reflita o trabalho executado.
Serve isto para dizer que, a nosso ver, a cláusula quarta, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio destina-se exclusivamente ao apuramento, no final da empreitada, dos custos comuns das consorciadas a fim de se proceder a eventuais correções nas imputações provisórias efetuadas durante a execução da obra em função das percentagens iniciais, o que não se confunde com qualquer ajustamento de percentagens de participação no consórcio em função do trabalho executado por cada uma das especialidades.
Propendemos, por isso, a julgar adequada a interpretação que a ré faz do referido clausulado, no sentido de que a determinação de percentagens de participação no consórcio, cujo reajustamento se imporá no final da empreitada, apenas releva para efeitos de apuramento e repartição das despesas comuns do consórcio e não para qualquer ajustamento de contas sobre os trabalhos realmente executados por cada uma das consorciadas.
Por conseguinte, a referida cláusula não é apta a servir de amparo ou suporte à interpretação que a Autora dela pretende extrair.

Julgamos justificar-se uma última nota para dizer que as situações verificadas nas empreitadas das ETAR`s de Trás-os-Montes e Alto Douro e do R., nas quais as presentes partes igualmente se consorciaram e em que, no final das empreitadas, acordaram efetuar o reajustamento ou a retificação das percentagens de participação fixadas no consórcio em função da obra efetivamente executada, não habilitam este Tribunal a concluir nos mesmos termos uma vez que tais situações não são necessariamente transponíveis para o caso ora em discussão. Desde logo por se desconhecer os precisos termos das negociações ocorridas entre as partes naquelas empreitadas (nomeadamente se foi, ou não, formalizado contrato que contemplava essa situação), bem como por não ser conhecido o volume do ajustamento da percentagem de participação de cada uma das especialidades (por hipótese, sendo diminuto o valor em causa e/ou dado o bom relacionamento comercial que então subsistia entre as partes, podem estas ter preferido firmar um acordo extra-judicial ao invés de enveredar por um via litigiosa).

Em suma, conjugando o clausulado do contrato de consórcio e do respetivo aditamento com os meios probatórios supra elencados que sobre a matéria em causa nos mereceram credibilidade pela razão de ciência invocada (reportamo-nos especificamente às testemunhas Cristiano e Henrique, os quais foram perentórios e esclarecedores ao enunciar que, não obstante a aceitação da alteração do projeto base, desde sempre a R. manifestou expressamente à A. a sua recusa em rever as percentagens de participação das consorciadas fixadas no contrato de consórcio, e não apenas já no decurso da execução do projeto ou na sua fase final), por apelo às regras da experiência comum, lógica e da normalidade, a prova produzida impõe, de modo decisivo e inequívoco, que se dê como verificado que a aceitação por parte da Ré da proposta de alteração do projeto apresentada pela A. teve como pressuposto essencial a não diminuição dos valores já definidos em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil, facto este que era do conhecimento da A..

Nesta conformidade, procede a impugnação em apreço, pelo que o ponto 35.º dos factos provados e o ponto 2.º dos factos não provados devem ser agregados num único facto provado, com a seguinte redação:

35º A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu, na condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
*
- < Ponto 42º dos factos provados: - (Na ETAR A) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), na parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.501.151,68 €, a parte do equipamento 1.798.387,27, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 96.650,26 €.
- < Ponto 44º dos factos provados: - (Na ETAR B) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.314.247,57 €, a parte do equipamento 1.587.568,23 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
- < Ponto 46º dos factos provados: - (Na ETAR C) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.438.276,21 €, a parte do equipamento 1.727.515,48 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 150.145,01 €.
- < Ponto 48º dos factos provados: - (Na ETAR D) Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 877.861,06 €, a parte do equipamento 1.302.952,52 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
- < Ponto 49º dos factos provados: - No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (- 548.756,99).
- < Ponto 50º dos factos provados: - No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91).
- < Ponto 54º dos factos provados: - A Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora.

A principal razão de discórdia da recorrente radica na valoração (indevida) feita pelo Tribunal recorrido do relatório pericial produzido nos autos, quer por não o ter interpretado corretamente, tanto na componente da medição dos trabalhos de construção civil (da responsabilidade da R.), como na componente dos equipamentos (da responsabilidade da A.), quer por ter desconsiderado, de forma total e absoluta, todos os demais meios de prova produzidos a este respeito.
Como é sabido, tendo por função a demonstração da realidade dos factos (art. 341° do Código Civil), a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem (art. 388° do Código Civil),
Atribui-se, pois, a técnicos especializados a verificação/inspeção de factos não ao alcance direto e imediato do julgador, já que dependem de regras de experiência e de conhecimentos técnico-científicos que não fazem parte da cultura geral ou experiência comum que pode e deve presumir-se ser aquele possuidor.

Assim, e não obstante a força probatória da prova pericial ser fixada livremente pelo Tribunal (art. 389º do Cód. Civil), importará não olvidar que a indagação das matérias em causa, dada a sua especificidade e o seu cariz iminentemente técnico, constitui uma matéria de particular complexidade, que exige ou pressupõe especiais conhecimentos técnicos, que o julgador não possui.

No caso, como explicitaram no relatório pericial (cfr. fls. 1364 a 1369) e confirmaram em sede de esclarecimentos prestados em audiência de julgamento, os peritos começaram por explicar a metodologia adotada na elaboração da perícia, especificando que, para além da análise de toda a documentação junta aos autos e da solicitação de elementos adicionais, seguida de reuniões colegiais, consultaram os mapas de medições contratuais e as telas finais das 4 ETARs, tendo-se deslocado aos locais das quatro obras visadas, no que foram acompanhados pelo Sr. Eng.º Paulo e Sr.ª Eng.ª Ana, em representação do dono de obra.
As especiais dificuldades e limitações inerentes à feitura do relatório pericial não deixaram, porém, de ser desde logo assinaladas pelos peritos, quer por as obras se encontrarem já concluídas e em utilização, sendo inviável a sua exata indagação (tanto quanto à aferição do método e processo construtivo de alguns dos trabalhos executados, como relativamente ao apuramento do seu custo), sendo que, nalguns casos, dada a sua especificidade tal só poderia ser realizado com a remoção ou escavação de terras, o que diz bem da sua impraticabilidade, e, noutros casos, estar-se-ia sempre dependente do critério utilizado por cada perito; acresce que não acompanharam o processo construtivo das ETAR`s, pelo que lhes foi impossível proceder à validação do método construtivo (supostamente apenas o consórcio ou a fiscalização representada pelo dono da obra poderiam em tese avaliar o método construtivo), e, não obstante o terem solicitado, não lhes foram facultados elementos com os mapas das medições finais dos trabalhos executados, nem com os preços da reorçamentação (o próprio dono da obra referiu-lhes que o consórcio não lhe facultou tais elementos, informação esta que o dono da obra reiterou nos autos – cfr. esclarecimentos prestados pela Águas N, SA constantes de fls. 1300 a 1302).

Daí que, tendo em conta as limitações inultrapassáveis com que se confrontou, o colégio de peritos, por unanimidade, optou por adotar um critério objetivo com base nos elementos disponíveis (nomeadamente as quantidades dos preços do projeto inicial, efetuando a medição do projeto final com base nas telas finais e no que puderam diretamente constatar nas ETAR`s) com vista a responder às questões que constituíam o objeto da perícia.

Reconheceram (os peritos) que o documento contante de fls. 107 v.º a 168 (doc. 7 junto com a petição inicial), da autoria da autora e que contém um mapa comparativo dos trabalhos de construção civil e de equipamentos previstos no projeto inicial e os executados em obra, serviu-lhes como base de orientação, sem embargo de ulteriormente terem procedido às medições dos trabalhos de construção civil com base nas telas finais. Ou seja, os valores referentes a essa especialidade resultaram da aplicação dos preços unitários previstos no orçamento inicial às quantidades apuradas a partir da análise das telas finais, sendo que alguns dos trabalhos constantes do projeto final não constavam do projeto inicial.

E, como salientaram em sede de esclarecimentos complementares escritos (cfr. fls. 2019 e 2020), não consideraram razoável atender às alegadas diferentes metodologias de execução utilizadas pelo empreiteiro, dado que não fizeram o acompanhamento “in loco” dos trabalhos realizados, além de que as quantidades e os valores considerados refletem valores médios de mercado os quais absorvem ou mitigam as eventuais ligeiras diferenças de valor decorrentes da utilização de diferentes metodologias de trabalho.

Assim, embora se admita que existam variados custos associados à execução de uma obra que não possam ser quantificados a partir de uma mera medição de telas finais, a verdade é que, por referência às especificidades técnicas da obra em causa, o método de medição utilizado pelos peritos, tendo sido o método possível, alicerçou-se em critérios objetivos e inteligíveis, sendo que a metodologia utilizada observou os padrões e normas de qualidade vigentes, sustentando-se o laudo em suficientes factos e dados, não sendo despiciendo destacar que foi obtido por unanimidade dos seus membros, pelo que é de concluir que o seu resultado se afigura (e bem) como decisivo na formação da convicção do Tribunal.

Não sufragamos, por outro lado, o entendimento propugnado pela recorrente no sentido de que dos depoimentos das testemunhas por si arroladas (designadamente, Manuel e Filipe) resulta existirem erros de cálculo grosseiros no relatório pericial e o relatório não contempla, para além de outros, custos decorrentes da alteração de implantação das obras e de métodos de execução diferentes dos inicialmente orçamentados. Tais erros ou imprecisões não se mostram evidenciados, sendo certo que os peritos tiveram o cuidado de justificar a opção pelo procedimento adotado, denotando-se coerência e motivação nas conclusões por si apresentadas.

E, no confronto da prova pericial com a invocada prova testemunhal, não se poderá deixar de ter presente que as supra identificadas testemunhas têm – ou tiveram – uma relação de subordinação jurídica com a recorrente, não sendo de excluir que estas possam sentir-se tentadas a depor no sentido de beneficiarem a posição da sua entidade empregadora, sendo que no caso o que releva é que, a nosso ver, tais depoimentos testemunhais não são idóneos a colocar em crise as conclusões do relatório pericial, dada a validade científica por estas reveladas.

Relativamente à componente dos equipamentos e instalações mecânicas executados pela A., em resposta ao quesito 2 do Relatório Pericial (cfr. fls. 1367 e 1368) os peritos especificaram que:

Relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas não é possível apurar o seu exato valor na medida em que os elementos da solução inicial são distintos dos elementos da solução efectivamente executada. A determinação do respetivo valor de mercado reveste-se de uma dificuldade e de limitações consideráveis inerentes à especificidade de cada obra cuja solução técnica é composta por inúmeros equipamentos sempre distintos em função das soluções de tratamento adotadas, das respetivas marcas e fabricantes, dos caudais/cargas poluentes, da topografia do local de implantação, entre outros. Os valores dos equipamentos e instalações mecânicas considerados no Mapa Comparativo em anexo ao presente relatório correspondem integralmente aos valores reclamados pela Autora X, sendo que pelas razões anteriormente descritas os Peritos não puderam apurar com rigor os respetivos valores de mercado.”
E, em sede de esclarecimentos escritos ao Relatório Pericial (cfr. fls. 2019 a 2021), os peritos referiram que:
“(…) relativamente a “Equipamentos e Instalações Mecânicas”, os trabalhos correspondentes à Autora (…) não foram analisados exaustivamente dada a sua especificidade
(…)
3.1. – No que diz respeito aos esclarecimentos / complementos solicitados pela Autora, esta facultou aos Peritos um conjunto de documentos consistindo numa folha de cálculo que expressa a comparação entre o preço faturado de cada artigo e o respetivo custo de aquisição / fabrico, complementada com os inerentes documentos contabilísticos que supostamente suportam parte dos valores aí considerados. Isto relativamente aos equipamentos e instalações mecânicas que sofreram alteração em relação ao projeto inicial e que acabaram por ser fornecidos e instalados nas obras em causa. Nos restantes foram mantidos os valores contratuais.”

Relativamente à documentação referida, os Peritos apresentam as seguintes considerações:

3.1.1. – A folha de cálculo e os anexos apresentados permitem identificar margens de lucro muito variáveis entre os vários artigos analisados, cuja média corresponde a cerca de 23%.
3.1.2. – No que diz respeito à validação da quantificação de custos internos reclamados e da correspondência entre os documentos contabilísticos apresentados e os equipamentos e as obras em causa, os peritos consideram encontrar-se fora do âmbito das suas competências.
3.1.3. – Independentemente da validação referida no ponto anterior, os Peritos não podem confirmar se existe enquadramento nos valores de mercado pelas razões já referidas no Relatório de Peritagem (…)”.

Finalmente, em sede de esclarecimentos prestados em audiência de julgamento, os peritos confirmaram ter verificado em obra a existência dos equipamentos, que correspondem aos identificados nas telas, reiterando, no entanto, tratar-se de um domínio muito específico, especificidade essa que se revela no facto de se tratarem de equipamentos feitos à medida daquela obra, de fabrico exclusivo da A., inexistindo por isso valor de mercado susceptível de quantificação.

Ora, embora nessa parte se reconheça que a conclusão alcançada pelos peritos não se baseia nos seus conhecimentos científicos ou técnicos, a verdade é que, como é salientado na sentença recorrida, mesmo admitindo que os valores apurados quanto à execução da obra atinente à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) “têm por referência os valores dos equipamentos e instalações mecânicas considerados no Mapa Comparativo indicados pela própria Autora, não foi apresentado qualquer outro elemento de prova que contrarie a sua adequação”.

No caso, julgamos, pois, ser de aceitar tal asserção, visto a Ré não ter logrado colocar minimamente em dúvida os valores atinentes a equipamentos e instalações mecânicas indicados no documento cuja cópia consta de fls. 107 v.º a 168.

Em reforço da afirmação antecedente é de invocar o depoimento da testemunha Sónia, a cuja autoria se deve a elaboração do aludido documento, a qual –nos termos supra aludidos e que aqui se dão por reproduzidos – explicitou os pressupostos e o método utilizados na sua elaboração.

Pelo exposto, inexistindo razões válidas para infirmar o resultado da perícia colegial, é de julgar improcedente a impugnação à matéria dos pontos 42, 44, 46, 48, 49 e 50 dos factos provados.
Mas já quanto ao ponto 54 dos factos provados (“a Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora”) somos levados a concordar com as objeções colocadas pela recorrente, dado que o ponto impugnado corresponde a um juízo eminentemente valorativo e conclusivo, que em si comporta a (peticionada) solução da decisão de mérito e que, por conseguinte, deve ser expurgado da seleção da matéria de facto provada e não provada.

A esse propósito, dispõe o art 607.º, n.º 4 do CPC que, na fundamentação da sentença, o juiz tomará «em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência».

No âmbito do anterior regime do Código de Processo Civil, o art. 646.º, n.º 4, previa, ainda, que têm-se «por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes».

Muito embora esta norma tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no art. 607.º, n.º 4, do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos (16).

Com efeito, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, os juízos conclusivos ou de valor não retratam ocorrências da vida real, quer internas, quer externas, mas sim o efeito e consequência dessas mesmas ocorrências, conclusões essas que cabe ao julgador extrair na prolação da sentença, dos factos dados como provados. Trata-se de matéria que não se cinge ao elencar do facto, mas tem em si, explicita ou implicitamente, considerações valorativas sobre esse facto, ou seja, apreciações que ultrapassam a objetividade do facto e trazem consigo a subjetividade da análise valorativa de uma determinada ocorrência da vida real. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova (17).

O que significa que, quando tal não tenha sido observado pelo tribunal “a quo” e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, considerando-as provadas ou não provadas, deve tal pronúncia ter-se por não escrita (18).

Feitas estas considerações torna-se evidente que o enunciado ponto impugnado encerra matéria de índole conclusiva. Saber se a Ré recebeu importância correspondente a parte do preço da empreitada que pertencia à Autora será conclusão a extrair na sentença dos factos materiais, concretos e precisos alegados e provados. Na verdade, esse juízo conclusivo apenas poderia ser formulado na sentença a jusante, aquando da apreciação crítica da matéria de facto provada, pelo que deve ser excluído do elenco factual (provado e não provado) a considerar.
Em suma, afora a eliminação ou exclusão do ponto 54 dos factos provados do elenco da matéria de facto, julga-se improcedente a impugnação dos demais pontos de facto em apreço.
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- < Ponto 66º dos factos provados: As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.
- < Ponto 3º dos factos não provados: A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Factura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97

Começando pela análise da materialidade objeto do ponto 66º dos factos provados, permitimo-nos lançar mão da motivação aduzida na sentença recorrida – por retratar com fidelidade a prova produzida –, na qual se exarou que, se «é certo que as testemunhas Filipe e Manuel, descreveram a base do cálculo dos valores faturados, fazendo menção a acertos e acordos das partes e a montantes validados pela fiscalização das obras, a verdade é que para além da empreitada em discussão, estão em causa montantes reportados a outras empreitadas em que as partes se consorciaram. Do depoimento destas testemunhas, bem como dos documentos juntos a fls 1185 a 1232, resulta que ainda não foi operado o fecho de contas entre as partes relativa às várias obras que executaram em comum (consórcio), admitindo as testemunhas ouvidas a existência de créditos/débitos recíprocos, não logrando, contudo, demonstrar os montantes».

Em abono da resposta dada ao ponto fáctico impugnado pelo Tribunal “a quo” acrescentar-se-á o depoimento da testemunha Maria, a qual confirmou a existência de contas por fechar entre as consorciadas, não só relativas às ETAR`s de D, B, C e A, mas também de outras obras em que participaram consorciadas, sem que tenham ainda alcançado acordo quanto às mesmas.

Relativamente à pretendida demonstração da materialidade objeto do ponto 3º dos factos não provados, correspondente ao alegado no art. 102º da contestação, e não obstante na audiência de julgamento de 10/07/2017 ter sido expressamente consignado “que a autora aceita a fatualidade constante do artº. 102º da contestação/reconvenção da ré no sentido que o crédito encontra-se entretanto vencido (vencimento ocorrido a 1 de setembro de 2016)”, a verdade é que o referido ponto fáctico corporiza ou traduz um juízo ou uma conclusão de direito, que comporta a solução (parcial) da decisão de mérito atinente à reconvenção.

Pretendendo a Ré/reconvinte reclamar o respetivo crédito (reconvencional), tinha a mesma de alegar os correspondentes factos constitutivos, o que, salvo o devido respeito, não fez, com a consequente inviabilização daquele ponto impugnado poder ser dado como provado. Com efeito, como anteriormente se disse, na fundamentação (de facto) da sentença, só mesmo os factos, e não juízos valorativos, interessam.
Serve isto para dizer que inexistem razões para alterar as respostas dadas aos apontados itens impugnados.
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Ampliação da matéria de facto provada:

55º–A: Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do Doc. n.º 111 da Contestação.
55º–B: Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do Doc. n.º 112 da Contestação.
56º–A: Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta com o teor que consta do Doc. n.º 113 da Contestação.
58º- A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 58º, a A. é devedora da R. da quantia de € 53.780,03 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 57º.
60º-A: Por falta de fundamento para a devolução das notas de débito id. em 60º, a A. é devedora da R. da quantia de € 101.795,80 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 59º.
62º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 62º, a A. é devedora da R. da quantia de € 136.767,54 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 61º.
64º-A: Por falta de fundamento para a devolução da nota de débito id. em 64º, a A. é devedora da R. da quantia de € 71.355,84 referente ao contrato de consórcio da empreitada id. em 63º.
A materialidade atinente aos pontos 55º–A, 55º–B e 56º–A mostra-se documentalmente provada (cfr. documentos de fls. 1015 e 1016, 1019 e 1021 vº a 1023), sendo que a ela já anteriormente nos reportámos a propósito da análise do ponto 35º dos factos provados e 2º dos factos não provados.
O teor dos referidos documentos retrata a correspondência trocada entre as partes em consequência do diferendo entre elas suscitado relativo ao reajustamento das percentagens contratuais fixadas no projeto inicial em função das obras executadas, sendo de aceitar que a referida facticidade possa ser incluída no elenco dos factos provados com vista a complementar outros pontos de facto que já ali constam (como seja os pontos 55 e 56 dos factos provados).
Já no que concerne à inclusão no elenco dos factos provados dos enunciados pontos 58º- A, 60º-A, 62º-A e 64º-A é manifesta a improcedência dessa pretensão, posto que, como já tivemos oportunidade de salientar, só os factos materiais são susceptíveis de poderem ser considerados provados, sendo que os pontos que a ré pretende ver como demonstrados correspondem a juízos conclusivos ou de valor, o que necessariamente determina a sua não inclusão no elenco factual a considerar.

Nesta conformidade, julgando improcedente a impugnação da matéria de facto relativamente aos referidos pontos 58º- A, 60º-A, 62º-A e 64º-A, por outro lado é de deferir o aditamento à matéria de facto provada dos seguintes factos:

55º–A: Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do documento cuja cópia consta de fls. 1015 e 1016 (doc. n.º 111 da contestação).
55º–B: Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do documento cuja cópia consta de fls. 1019 (doc. n.º 112 da contestação).
56º–A: Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta, datada de 13/08/2010, com o teor que consta do documento de fls. 1021 vº a 1023 (doc. n.º 113 da contestação).
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Face às alterações introduzidas na decisão relativa à matéria de facto, é a seguinte a factualidade (provada e não provada) a atender para efeito da decisão a proferir:

- Factos provados.

A Autora é uma sociedade comercial, de direito espanhol, que se dedica à atividade de instalações hidráulicas, elétricas e mecânicas, atuando primacialmente na área do ambiente e da gestão integral do ciclo da água.
Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial, de direito português, que se dedica à atividade de construção civil e obras públicas.
No âmbito do concurso público lançado pela sociedade Águas X S.A., destinado à adjudicação da empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Autora, a Ré e a sociedade MCA S.A. decidiram apresentar uma proposta conjunta.
A qual, tendo sido a vencedora do concurso público, foi adjudicada às empresas que constituíam o agrupamento concorrente por ofício da entidade adjudicante datado de 04/09/2005.
Em cumprimento da cláusula 9.3 do Programa de Concurso, as sociedades adjudicatárias agruparam-se em consórcio externo, tendo para o efeito a Autora, a Ré (então designada por Empreiteiros Y de AFS, S.A.) e a sociedade denominada MCA S.A., celebrado um contrato de consórcio externo, através de documento datado de 22 de Setembro de 2005.
A Ré foi designada líder de Consórcio.
De acordo com a cláusula 8.ª do contrato de consórcio, a participação de cada consorciada no consórcio correspondia, respetivamente, às seguintes percentagens:
- Espina: 51,80 %
- Y: 40,70 %
- MCA: 7,50 %
De acordo com o aditamento ao contrato de consórcio subscrito por todas as consorciadas em 23/09/2005 (conforme doc. n.º 2 junto com a P.I.), a Y assumiu a participação da sociedade MCA S.A. no consórcio, passando as participações no consórcio a serem as seguintes (cláusula 4.ª):
- Espina: 51,80 %
- Y: 48,20 %
A participação da Autora no consórcio (51,80%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de equipamentos no valor global do contrato de empreitada (€ 6.371.204,95).
10º E a participação da Ré no consórcio (48,20%) correspondia à proporção da totalidade dos trabalhos de construção civil no valor global do contrato de empreitada (€ 5.927.088,77).
11º A distribuição das participações da Autora e da Ré no consórcio resultava da repartição entre ambas dos trabalhos que constituíam o objeto do contrato de empreitada, tendo por base a execução das especialidades de cada empresa.
12º Ou seja, a Autora seria a responsável exclusiva pelo fornecimento e instalação dos equipamentos.
13º E a Ré seria a responsável exclusiva pela execução dos trabalhos de construção civil.
14º Foi ainda convencionado no contrato de consórcio que:

- “As consorciadas facturarão e receberão diretamente do Dono de Obra o valor dos respetivos trabalhos” (cláusula 9.ª).
- “As consorciadas prestarão individualmente as garantias exigidas pelo Dono de Obra segundo a proporção estabelecida no número anterior” (cláusula 8.ª, n.º 2).
15º Tendo sido ainda convencionado entre A. e R., no aditamento ao contrato de consórcio que:

- “(…) as signatárias não constituem qualquer pessoa ou entidade jurídica distinta das próprias consorciadas, nem estabelecem entre si qualquer vínculo do tipo societário ou forma de associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico” (Cláusula 2.ª, n.º 2).
- “Os trabalhos e tarefas necessários à execução da empreitada em conformidade com os termos do respectivo contrato serão repartidos entre as signatárias tendo em conta as respectivas especialidades (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 1).
- “Havendo dúvidas ou divergências quanto à distribuição entre as consorciadas de quaisquer trabalhos a mais, trabalhos complementares ou outros trabalhos adicionais de qualquer natureza, competirá ao Conselho de Orientação e Fiscalização efectuar essa distribuição, atendendo às especialidades de cada consorciada (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 2).
- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas” (Cláusula 4.ª, n.º 4).
- “O disposto no presente contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, nem visa a constituição de qualquer fundo comum, apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas” (Cláusula 4.ª, n.º 5).
- “Cada consorciada suportará todos os custos e despesas inerentes à execução dos trabalhos que lhe estejam atribuídos, bem como, na correspondente percentagem, as despesas e custos que, atendendo à respectiva natureza ou em consequência de acordo unânime das signatárias, sejam expressamente qualificadas como comuns a todas elas neste contrato, nos seus eventuais aditamentos, ou por deliberação do COF” (Cláusula 5.ª, n.º 1).
- “ (..) são, nomeadamente, obrigações das consorciadas: a) Executar todos os trabalhos da empreitada que lhe estão ou venham a estar cometidos segundo a repartição prevista na cláusula 4ª, supra, incluindo todos os fornecimentos de materiais, equipamentos, meios humanos, instalações, ensaios, formação e treino, supervisão, gestão e controlo, trabalhos temporários ou provisórios que se revelem necessários para a boa execução e completo acabamento dos mesmos trabalhos, em conformidade com os termos e condições do contrato de empreitada e com as alterações que venham a ser licitamente impostas ou acordadas com o Dono da Obra” (Cláusula 6.ª, n.º 1).
- “Cada uma das signatárias será plena e exclusivamente responsável pela perfeita e pontual execução de todos os trabalhos e tarefas que estão a seu cargo e pelo integral cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo consórcio relativas aos mesmos nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra” (Cláusula 7.ª, n.º 3).
- “São da exclusiva responsabilidade de cada uma das consorciadas a organização e orientação da sua própria actividade com vista à execução dos trabalhos que lhe competem, e bem assim todos os encargos daí resultantes e as receitas que lhe correspondam, nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra.” (Cláusula 13.ª).
- “As consorciadas facturarão e receberão directamente do Dono da Obra o valor dos respectivos trabalhos repartidos conforme o disposto na cláusula 4ª” (Cláusula 14.ª, n.º 1).
- “Em tudo o mais que não estiver aqui previsto e sem prejuízo das remissões expressas para outros diplomas, o presente contrato reger-se-á pelo disposto no Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de Julho, quanto às relações entre signatárias e ao funcionamento do consórcio e pelo disposto no Decreto-Lei nº 59/99 de 2 de Março no que respeita à definição das condições que as consorciadas estão obrigadas a observar na execução da empreitada” (Cláusula 22.ª).
16º Mais estipularam as partes que caso o dono da obra não aceitasse a faturação direta nem o pagamento separado às signatárias, o Chefe do Consórcio apresentaria ao dono da obra a faturação conjunta dos trabalhos das consorciadas, de acordo com as condições de pagamento do preço da empreitada previstas no respetivo contrato, faturação essa elaborada a partir dos elementos fornecidos por cada uma das consorciadas ou simplesmente remetendo-lhes esses elementos, recebendo daquele os correspondentes montantes e procedendo à sua distribuição entre as consorciadas, em determinados termos previstos concretamente no dito contrato,
17º Este contrato extinguir-se-ia uma vez verificadas a condições cumulativamente previstas na cláusula vigésima primeira, designadamente a regularização das contas e resolução dos diferendos entre as consorciadas, ou mesmo que estas não se verificassem, pelo decurso do prazo de 10 anos a contar da sua outorga.
18º O mesmo contrato e seu aditamento encontram-se ainda em vigor.
19º O contrato de empreitada com a ÁGUAS N foi outorgado em 30/11/2005, pelo preço global de € 12.298.293,72 acrescido de IVA à taxa legal em vigor (cfr. cláusula 5.ª do contrato) e com um prazo global de execução de 905 dias a contar da data de consignação da obra (cfr. cláusula 8.ª do contrato), junto como doc. 3 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
20º Contrato esse que foi objeto de um aditamento, constante de documento datado de 18 de Janeiro de 2008 e junto como doc. 4 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
21º De um segundo aditamento, celebrado por documento datado de 11 de Março de 2009, e junto como doc. 5 com a PI cujo teor aqui se dá por reproduzido.
22º A Autora, para efeito da realização da sua parte da empreitada e conforme era permitido às consorciadas, à luz do disposto na cláusula décima-nona do referido aditamento ao contrato de consórcio, celebrou, para esse fim, com a sociedade denominada “FA-ENGENHARIA DO AMBIENTE, LDª”, um contrato de subempreitada por documento datado de 13 de Dezembro de 2005, doc.6 junto com a P.I., cujo teor aqui se dá por reproduzido.
23º Esta obra foi totalmente executada pelas referidas consorciadas e oportunamente recebida e o seu preço pago pela ÁGUAS N, S.A..
24º O projeto de obra que foi levado a concurso e que era suposto as consorciadas terem executado, por proposta da Autora foi objeto de alterações tendentes a melhorá-lo tecnicamente.
25º A Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR), que dele são objeto, foram redesenhadas pelos técnicos da Autora, em termos de obterem várias melhorias, entre as quais se destacam as seguintes:
26º Na ETAR de D, o fósforo e o azoto dissolvidos são eliminados de forma biológica, ao contrário do projeto original em que tal era feito de forma química.
27º No resto das Estações, tal ocorreu relativamente à eliminação do azoto, tendo sido dimensionada a instalação para a futura eliminação do fósforo do mesmo modo, o que não era possível ocorrer no anterior projeto.
28º Todas as Estações foram dimensionadas com mais vinte por cento de capacidade de oxigenação.
29º Melhorou-se o desenho das estações elevatórias da entrada, acrescentando equipamentos trituradores, para que não fosse necessária e extração de resíduos nestas estações elevatórias e corrigiram-se as cotas das mesmas, pois as do projeto original corriam o risco de inundação.
30º O desenho da obra de entrada para a receção de lamas das fossas sépticas, foi uniformizado para as quatro ETAR.
31º O novo desenho do projeto permitiu uma exploração mais simples e económica e a qualidade da água tratada pelas ETAR foi melhorada.
32º Estas modificações foram apresentadas pela Autora à ÁGUAS N, S.A., em Novembro de 2005.
33º Para o que foi feito um desenho individual para cada uma das quatro ETAR, num total de setenta e duas peças desenhadas, dezoito por ETAR.
34º A ÁGUAS N, S.A. concordou com as propostas da Autora de alteração do projeto, que tinham como condição não ultrapassar o valor global fixado para o projeto inicial.
35º A Autora questionou a Ré se estaria na disposição de proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), ao que a Ré anuiu, na condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil.
36º Assim, a Autora procedeu às alterações do projecto na componente de instalações técnicas e equipamentos, após o que o remeteu à Ré para esta proceder à sua revisão quanto à especialidade de construção civil.
37º Após revisão e adaptação do projeto por parte da Ré, na componente da construção civil, esta procedeu à sua reorçamentação em face das alterações introduzidas.
38º A este novo projeto a ÁGUAS N, S.A. acrescentou o seguinte:

- Dupla linha de tratamento totalmente independente em cada ETAR,
- Maior volume dos tanques de arejamento,
- Edifícios desodorizados com capacidade para albergarem a totalidade do pré-tratamento e desidratação de lamas e,
- Alteração da implantação dos elementos constituintes da ETAR.
39º Todas as consorciadas realizaram a obra de acordo com o projeto alterado.
40º A obra foi integralmente executada pelo consórcio, mas implicou a alteração no volume de trabalho executado pelas partes e seu valor.
41º Na ETAR A, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.535.394,95 €, a parte do equipamento 1.526.544,58, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 148.209,05.
42º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), na parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.501.151,68 €, a parte do equipamento 1.798.387,27, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 408.882,60 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 96.650,26 €.
43º Na ETAR B, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.525.600,66€, a parte do equipamento 1.329.275,17 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
44º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.314.247,57 €, a parte do equipamento 1.587.568,23 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 186.002,28 €.
45º Na ETAR C, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 1.539.686,13 €, a parte do equipamento 1.423.531,50 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 272.075,26 €.
46º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 1.438.276,21 €, a parte do equipamento 1.727.515,48 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 222.084,36 € e o valor de acerto de trabalhos e quantidades em 150.145,01 €.
47º Na ETAR D, no orçamento contratual, a parte da construção civil importava a quantia de 906.122,72 €, a parte do equipamento 1.146.880,34 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
48º Os trabalhos efetivamente executados (medições extraídas das telas finais), a parte da construção civil ascendeu à quantia de 877.861,06 €, a parte do equipamento 1.302.952,52 €, os trabalhos durante o período de arranque a quantia de 128.004,12 €.
49º No que respeita à parte da construção civil estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (-548.756,99).
50º No que respeita à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91).
51º Por interesse e indicações da ÁGUAS N, S.A., designadamente relacionados com a celeridade da conclusão da empreitada, quer os autos de medição, quer a respetiva faturação das consorciadas e subsequentes pagamentos, se processaram de acordo com o projeto inicial da empreitada e, não, segundo as alterações que lhe foram introduzidas e que se traduziram na diferença de obra executada, quer pela Autora, quer pela Ré.
52º O que levou a que as diferenças de valor não se tivessem repercutido nos pagamentos feitos pelo dono da obra ÁGUAS N, S.A., à Autora e à Ré.
53º A Ré recebeu do dono da obra as seguintes quantias:
Rubricas Valor sem IVA Valor com IVA
Trabalhos Normais 5.917.717,73 6.188.143,51
Revisão de Preços 517.475,86 517.475,86
Trabalhos Adicionais 344.944,31 344.944,31
Despesas Contrato 20.096,59 24.115,91
TOTAL 6.800.234,49 7.074.679,59
54º - Os legais representantes da Autora alertaram para este facto os representantes da Ré, no sentido de se efetuar o acerto resultante da alteração do projeto da empreitada, havendo a Ré que devolver à A. a diferença de valor que indevidamente havia recebido do dono da obra.
55º Em resposta, a R. remeteu à A., em 26/03/2009, comunicação, via telefax, com o teor que consta do documento cuja cópia consta de fls. 1015 e 1016 (doc. n.º 111 da contestação).
56º Em 01/07/2010, na sequência de reunião ocorrida em 19/05/2010 na qual foi novamente abordada a questão da reorçamentação da empreitada, a R. remeteu uma carta à A., com o teor que consta do documento cuja cópia consta de fls. 1019 (doc. n.º 112 da contestação).
57º Autora interpelou a Ré, por carta registada datada de 20 de Julho de 2010, para proceder ao pagamento da quantia em divida.
58º Em resposta à missiva da A. remetida em 20/07/2010, a R. remeteu-lhe carta, datada de 13/08/2010, com o teor que consta do documento de fls. 1021 vº a 1023 (doc. n.º 113 da contestação).
59º No âmbito da execução do contrato de empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108060207 30/06/2008 11.760,84
1108060209 30/06/2008 248,05
1108090263 30/09/2008 5.958,84
1108090264 30/09/2008 2.515,79
1108100101 31/10/2008 9.447,10
1108120214 31/12/2008 934,07
1108120215 31/12/2008 2.515,79
1209020016 27/02/2009 1.881,00
1209030010 26/03/2009 1.536,00
1109040190 30/04/2009 3.291,94
1209050002 08/05/2009 9.795,52
1209060009 12/06/2009 2.086,56
1110070126 30/07/2010 1.808,53
60º A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1209050002 datada de 08/05/2009 no valor de € 9.795,52, com o fundamento de se reportar a despesas relacionadas com atrasos na empreitada (ETAR D, C, B e A), parte dos quais da responsabilidade da Ré.
61º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R.”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108030142 31/03/2008 9.264,65
1108040122 30/04/2008 12.322,20
1108050126 30/05/2008 6.727,60
1108060118 30/06/2008 1.290,16
1108060208 30/06/2008 3.211,47
1108070147 29/07/2008 10.872,51
1108080102 29/08/2008 8.327,38
1108090140 30/09/2008 5.395,22
1108090261 30/09/2008 1.818,61
1108090262 30/09/2008 3.696,05
1108100098 31/10/2008 2.345,74
1108120216 31/12/2008 1.480,18
1108120217 31/12/2008 3.696,05
1109040075 21/04/2009 6.665,08
1109040191 30/04/2009 1.860,30
1109070171 31/07/2009 10.086,68
1109080128 31/08/2009 6.425,17
1210020026 28/02/2010 1.924,00
1110070127 30/07/2010 4.386,75
62º A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1109040075 datada de 21/04/2009 no valor de 6.665,08€, a Nota de Débito número 1109080128 datada de 31/08/2009 no valor de 6.425,17€ e a Nota de Débito número 1210020026 datada de 28/02/2010 no valor de 1.924,00€, num total de 15.014,25€.
63º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução das ETAR E (SAR-DN-04 e SAR-DN-05), M. (SAR-DN-10), S. (SAR-DN-03) e SD (SAR-DN-06)”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
15473/B 22/08/2007 136.767,55
1308010001 31/01/2008 136.767,55
1108020031 12/02/2008 40.947,57
1110070125 30/07/2010 95.819,97
64º A Autora não aceitou e devolveu à R. a Nota de Débito número 1110070125 datada de 30/07/2010 no valor de € 95.819,97.
65º No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub-Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
14481/B 14/02/2007 53.906,19
1208110003 25/11/2008 17.449,65
66º A Autora não aceitou e devolveu à R. Nota de Débito número 1208110003 datada de 25/11/2008 no valor de 17.449,65 €.
67º Em 13/08/2010, através da carta junta sob Doc. n.º 113, a Ré comunicou à Autora que compensava parte do seu crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, no valor de 183.520,10 €.
68º As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.
*
Factos não provados (os demais factos alegados, designadamente):

O novo projeto não teve repercussão no preço total da obra.
A Autora é ainda devedora da Ré das seguintes quantias, que já se venceram, correspondentes a deduções efetuadas pela Autora à Ré no pagamento das seguintes faturas:
Fatura Data Valor Dedução
16136/B 30/11/2007 4.728,43
16395/B 31/12/2007 1.659,97
*
3.– Fundamentação de direito

3.1. – Quanto à acão, da inverificação dos factos constitutivos do direito de crédito da Autora.

De acordo com a matéria de facto provada, no âmbito do concurso público lançado pela sociedade Águas X, S.A., destinado à adjudicação da empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Autora, a Ré e a sociedade MCA S.A. decidiram apresentar uma proposta conjunta, a qual, tendo sido a vencedora do concurso, foi adjudicada às empresas que constituíam o agrupamento concorrente (pontos 3 e 4 dos factos provados).
Em cumprimento do Programa de Concurso, as sociedades adjudicatárias agruparam-se em consórcio externo, tendo para o efeito a Autora, a Ré e a sociedade denominada MCA S.A. celebrado um contrato de consórcio externo, através de documento datado de 22 de Setembro de 2005, tendo a Ré sido designada líder de Consórcio (pontos 5 e 6 dos factos provados).

Por sua vez, o contrato de empreitada entre a A. e Ré (consórcio adjudicatário) e a Águas N foi outorgado em 30/11/2005, pelo preço global de € 12.298.293,72, acrescido de IVA à taxa legal em vigor (cfr. cláusula 5.ª do contrato), e com um prazo global de execução de 905 dias a contar da data de consignação da obra (cfr. cláusula 8.ª do contrato), contrato esse que foi objeto de um aditamento, datado de 18 de Janeiro de 2008, e de um segundo aditamento, datado de 11 de março de 2009 (pontos 19 a 21 dos factos provados).
A este contrato de empreitada celebrado entre o consórcio e o dono da obra é aplicável o Decreto- Lei n.º 59/99, de 2 de Março.
E ao contrato de consórcio celebrado entre a A. e a R. é aplicável o Decreto Lei n.º 231/81, de 28 de Julho.
Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir a realização de actos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma actividade contínua; a execução de determinado empreendimento; o fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; pesquisa ou exploração de recursos naturais; produção de bens que possam ser repartidos, em espécies, entre os membros do consórcio (arts. 1.º e 2º do Dec. Lei n.º 231/81).

O contrato de consórcio é um contrato de cooperação empresarial (19).

Revestindo uma natureza formal (art. 3º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 231/81), o contrato de consórcio “representa assim, forçosamente um negócio bilateral ou plurilateral (extingue-se logo que, por qualquer razão, desapareça a pluralidade das partes), que é tipicamente celebrado entre empresários singulares ou coletivos, personificados (sociedades comerciais, cooperativas, fundações, etc.) qualquer que seja o tipo de atividade económica por estes desenvolvida (que poderá ser comercial ou civil, conexa ou irrelacionada, etc)(20).

Do art. 20º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 231/81 resulta, expressa, a proibição de constituição de fundos comuns em qualquer consórcio o que vem sendo entendido como sinal de impossibilidade de considerar o consórcio como dotado de personalidade colectiva, uma vez que esta pressupõe autonomia patrimonial (21). O mesmo é dizer que, no quadro normativo criado, não se concebe o consórcio como um ente societário dotado de personalidade jurídica: a personalidade jurídica é a dos contraentes (pessoas singulares ou colectivas) e o contrato de consórcio não cria uma nova entidade societária: o contrato (como qualquer outro) cria direitos e obrigações para cada um dos contraentes e define o quadro de actuação comum e específica de cada um deles (22).

Segundo a classificação legal (art. 5º do citado Dec. Lei), podem distinguir-se duas modalidades de consórcio, tendo em conta a projeção externa deste, isto é, consoante aquele é ou não apresentado aos terceiros.

O consórcio diz-se interno quando:

a) - As actividades ou bens são fornecidos a um dos membros do consórcio e só este estabelece relações com terceiros:
b) - As actividades ou os bens são fornecidos directamente a terceiros por cada um dos membros do consórcio, sem expressa invocação dessa qualidade” (n.º 1 do art. 5º).

O consórcio diz-se externo “quando as actividades ou os bens são fornecidos directamente a terceiros por cada um dos membros do consórcio, com expressa invocação dessa qualidade” (n.º 2 do art. 5º).

Segundo Pedro Pais Vasconcelos (23), o “critério distintivo, tal como resulta da lei, é no fundo o carácter oculto ou patente do consórcio. São consórcios internos aqueles em que essa existência é revelada. O consórcio interno é uma estrutura contratual apenas relevante internamente entre os consorciados sem eficácia externa; no consórcio externo, a estrutura contratual do consórcio não se limita às relações internas entre os consorciados e projeta-se externamente ao relacionamento com terceiros”.

Do contexto dos factos provados e do contrato outorgado entre as partes resulta que o consórcio era externo e é enquadrável na al. b) do art. 2.º do Dec. Lei n.º 231/81 – tem como objetivo a execução de determinado empreendimento –, pelo que, por força do contemplado no n.º 1 do art. 16.º deste mesmo citado diploma legal, cada um dos membros percebe directamente os valores que lhe forem devidos pelo terceiro com quem o consórcio contrata, o que foi expressamente plasmado nas cláusulas 9.ª do contrato de consórcio e 14.ª do aditamento ao contrato de consórcio.

De acordo com o aditamento ao contrato de consórcio subscrito por todas as consorciadas em 23/09/2005, a Y assumiu a participação da sociedade MCA S.A. no consórcio, passando as participações no consórcio a serem as seguintes (cláusula 4.ª):

- Espina: 51,80 %
- Y: 48,20 % (ponto 8 dos factos provados).
A distribuição das participações da Autora e da Ré no consórcio resultava da repartição entre ambas dos trabalhos que constituíam o objeto do contrato de empreitada, tendo por base a execução das especialidades de cada empresa, ou seja, a Autora seria a responsável exclusiva pelo fornecimento e instalação dos equipamentos e a Ré seria a responsável exclusiva pela execução dos trabalhos de construção civil (pontos 11º a 13 dos factos provados).
Sem prejuízo das normas imperativas estabelecidas no Dec. Lei n.º 231/81, os termos e condições do contrato de consórcio são livremente estabelecidos pelas partes (art. 4º, n.º 1, do citado diploma legal).

Em obediência a esse princípio da liberdade contratual, mais convencionaram as partes, no aditamento ao contrato de consórcio (24), que:

- “(…) as signatárias não constituem qualquer pessoa ou entidade jurídica distinta das próprias consorciadas, nem estabelecem entre si qualquer vínculo do tipo societário ou forma de associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico” (Cláusula 2.ª, n.º 2).
- “Os trabalhos e tarefas necessários à execução da empreitada em conformidade com os termos do respectivo contrato serão repartidos entre as signatárias tendo em conta as respectivas especialidades (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 1).
- “Havendo dúvidas ou divergências quanto à distribuição entre as consorciadas de quaisquer trabalhos a mais, trabalhos complementares ou outros trabalhos adicionais de qualquer natureza, competirá ao Conselho de Orientação e Fiscalização efectuar essa distribuição, atendendo às especialidades de cada consorciada (…)” (Cláusula 3.ª, n.º 2).
- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas” (Cláusula 4.ª, n.º 4).
- “O disposto no presente contrato quanto a repartição de participação no consórcio não pode ser entendido como constituindo qualquer forma de repartição de resultados da actividade do mesmo, nem visa a constituição de qualquer fundo comum, apenas relevando quanto à repartição de despesas comuns e repartição provisória de responsabilidade comum nele expressamente previstas” (Cláusula 4.ª, n.º 5).
- “Cada consorciada suportará todos os custos e despesas inerentes à execução dos trabalhos que lhe estejam atribuídos, bem como, na correspondente percentagem, as despesas e custos que, atendendo à respectiva natureza ou em consequência de acordo unânime das signatárias, sejam expressamente qualificadas como comuns a todas elas neste contrato, nos seus eventuais aditamentos, ou por deliberação do COF” (Cláusula 5.ª, n.º 1).
- “(…) são, nomeadamente, obrigações das consorciadas: a) Executar todos os trabalhos da empreitada que lhe estão ou venham a estar cometidos segundo a repartição prevista na cláusula 4ª, supra, incluindo todos os fornecimentos de materiais, equipamentos, meios humanos, instalações, ensaios, formação e treino, supervisão, gestão e controlo, trabalhos temporários ou provisórios que se revelem necessários para a boa execução e completo acabamento dos mesmos trabalhos, em conformidade com os termos e condições do contrato de empreitada e com as alterações que venham a ser licitamente impostas ou acordadas com o Dono da Obra” (Cláusula 6.ª, n.º 1).
- “Cada uma das signatárias será plena e exclusivamente responsável pela perfeita e pontual execução de todos os trabalhos e tarefas que estão a seu cargo e pelo integral cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo consórcio relativas aos mesmos nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra” (Cláusula 7.ª, n.º 3).
- “São da exclusiva responsabilidade de cada uma das consorciadas a organização e orientação da sua própria actividade com vista à execução dos trabalhos que lhe competem, e bem assim todos os encargos daí resultantes e as receitas que lhe correspondam, nos termos do contrato celebrado com o Dono da Obra” (Cláusula 13.ª).
- “As consorciadas facturarão e receberão directamente do Dono da Obra o valor dos respectivos trabalhos repartidos conforme o disposto na cláusula 4ª” (Cláusula 14.ª, n.º 1).
- “Em tudo o mais que não estiver aqui previsto e sem prejuízo das remissões expressas para outros diplomas, o presente contrato reger-se-á pelo disposto no Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de Julho, quanto às relações entre signatárias e ao funcionamento do consórcio e pelo disposto no Decreto-Lei nº 59/99 de 2 de Março no que respeita à definição das condições que as consorciadas estão obrigadas a observar na execução da empreitada” (Cláusula 22.ª).
Está também provado que o projeto de obra que foi levado a concurso e que era suposto as consorciadas terem executado, por proposta da Autora, foi objeto de alterações tendentes a melhorá-lo tecnicamente, o que permitiu uma exploração mais simples e económica e a qualidade da água tratada pelas ETAR foi melhorada (pontos 24º a 31º dos factos provados).
Estas modificações do projeto base propostas pela Autora mereceram a concordância do dono da obra, sob a condição de não ser excedido o valor global fixado para o projeto inicial (pontos 32º a 34º dos factos provados).
E, identicamente, mereceram a anuência da Ré, que se predispôs a proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), sob a condição de daí não decorrer uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil (ponto 35º dos factos provados).
A Autora procedeu, assim, às alterações do projecto na componente de instalações técnicas e equipamentos, após o que o remeteu à Ré para esta proceder à sua revisão e adaptação do projeto quanto à especialidade de construção civil, o que esta fez, tendo posteriormente procedido à sua reorçamentação em face das alterações introduzidas (pontos 36º e 37º dos factos provados).

As aludidas alterações ao projeto propostas pela autora são legítimas pois, como determinava o art. 30.º do, então vigente, Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, “[e]m qualquer momento dos trabalhos, o empreiteiro poderá propor ao dono da obra variantes ou alterações ao projecto relativamente a parte ou partes dele ainda não executadas”, acrescentando o n.º 2 do mesmo artigo que “[t]ais variantes ou alterações obedecerão ao disposto no presente diploma sobre os projectos ou variantes apresentados pelo empreiteiro, mas o dono da obra poderá ordenar a sua execução desde que aceite o preço global ou os preços unitários propostos pelo empreiteiro ou com este chegue a acordo sobre os mesmos”.

A obra foi integralmente executada pelo consórcio, mas implicou a alteração no volume de trabalho executado pelas partes e seu valor, porquanto, no que respeita à parte da construção civil, estava contratualmente orçamentada a quantia de 5.928.088,77 € e foi executada obra no valor de 5.378.331,78 € (-548.756,99), ao passo que na componente dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e foi executada obra no valor de 7.361.396,86 € (+990.191,91) - (pontos 40º a 50º dos factos provados).

Acontece que, por interesse e indicações do dono da obra, Águas N, S.A., designadamente relacionados com a celeridade da conclusão da empreitada, quer os autos de medição, quer a respetiva faturação das consorciadas e subsequentes pagamentos, processaram-se de acordo com o projeto inicial da empreitada e não segundo as alterações que lhe foram introduzidas e que se traduziram na diferença de obra executada, quer pela Autora, quer pela Ré, o que levou a que as diferenças de valor não se tivessem repercutido nos pagamentos feitos pelo dono da obra à Autora e à Ré (pontos 51º e 52º dos factos provados).

Na verdade, a Ré executou obra no valor de 5.378.331,78 € e faturou e recebeu no valor de 5.917.717,73 € (pontos 49º e 53º dos factos provados), verificando-se (a seu favor) um saldo positivo de 539.385,95 € (neste montante está já excluído o valor da revisão de preços e dos trabalhos adicionais).

Por sua vez, quanto à parte dos equipamentos (incluindo trabalhos durante o arranque) estava contratualmente orçamentada a quantia de 6.371.204,95 € e a Autora executou obra no valor de 7.361.396,86 € (ponto 50º dos factos provados), verificando-se um saldo negativo de 990.191,91 €, pois que recebeu menos do que o valor dos trabalhos que executou.
A Ré fundamenta a sua posição para justificar o valor recebido no contrato de consórcio celebrado e na percentagem de participação nele estipulado tendo por referência o preço global fixado para a empreitada, especificando que, após a revisão do novo projecto proposto pela A., a R. efectuou a sua reorçamentação e declarou aceitar a adaptação e execução dos trabalhos de construção civil de acordo com o novo projecto, por se conter dentro da sua margem de risco comercial, não tendo porém aceitado fazer qualquer alteração ao contrato de consórcio.
Essa posição não foi, porém, acolhida pelo Tribunal da 1ª instância, aduzindo para o efeito que «o que decorre do contrato de consórcio é que Autora e Ré seriam individualmente responsáveis pela execução, faturação e recebimento dos respetivos trabalhos junto do dono da obra, suportando cada qual as despesas comuns de funcionamento do consórcio de acordo com a percentagem de trabalhos por si executados, tendo por referência o valor global do contrato de empreitada, sendo as percentagens de participação no consórcio no final da empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efetivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas», pelo que mantendo «o respeito pelo firmado nos contratos de consórcio e de empreitada, não pode a Ré enjeitar o acordo dado às alterações do projeto, tanto que executou a obra em conformidade com as mesmas», não lhe sendo lícito aceitar «o projeto alterado», cumprir «o que nele está definido», atuar «conformemente ao mesmo, mas» rejeitá-lo «na parte do preço a receber, repristinando nesta parte o projeto inicial».

Concluiu-se, assim, na sentença recorrida pela necessidade de se impor o reajustamento dos valores em função do valor dos trabalhos efetivamente executados por cada uma das consorciadas, ressalvando os que se traduzem numa derrapagem nos custos suportados pela Autora.

Como é bom de ver, a conclusão estabelecida pelo Tribunal “a quo” seria indubitavelmente de sufragar se, porventura, a matéria de facto provada não tivesse sido objeto de alteração.
Tendo-se, todavia, provado que a Ré anuiu nas alterações a introduzir ao projeto patenteado a concurso público, aceitando proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos de construção civil, mas na condição que daí não decorresse uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil, somos levados a concluir que o quadro fáctico conducente à decisão de mérito se mostra substancialmente modificado.

Na verdade, considerando que na sequência da proposta e reorçamento do novo projecto variante apresentado pela A. não houve qualquer alteração ou aditamento ao contrato de consórcio, para além do que já havia sido assinado em 23/09/2005, de acordo com a cláusula 9.ª do Contrato de Consórcio e das cláusulas 4.ª, n.º 1, e 14.ª e do Aditamento ao Contrato de Consórcio, a ré tinha direito a receber (do dono da obra) a sua participação no consórcio (48,20%) correspondente à proporção da totalidade dos trabalhos de construção civil no valor global do contrato de empreitada (€ 5.927.088,77), correspondendo a participação da A. no consórcio (51,80%) ao valor de € 6.371.204,95 ajustado para a execução dos trabalhos de equipamentos.
E, como (bem) refere a recorrente, já após a assinatura do contrato de consórcio (bem como do respectivo aditamento datado de 23/09/2005), tendo a proposta da A. de alteração do projeto a executar sido aceite pelo dono da obra na condição de não ser ultrapassado o valor do contrato de empreitada, e pela R. sob a condição de não ser afectado o valor convencionado no contrato de consórcio apurado a partir do projecto base, certo é que a essa aceitação não se seguiu qualquer alteração do contrato de consórcio ou do seu aditamento, cujos termos se mantiveram inalteráveis, sem qualquer adenda ou alteração.

Nos termos do n.º 1 da art. 6.º do Decreto-Lei n.º 231/81, “[a]s modificações do contrato de consórcio requerem o acordo de todos os contraentes, excepto se o próprio contrato o dispensar”, acrescentando o n.º 2 do mesmo artigo que “[a]s modificações devem revestir a forma utilizada para o contrato”.
Ora, para além dessa formalidade não se mostrar dispensada pelo contrato de consórcio (ou do seu aditamento), certo é que não consta dos autos ter sido subscrita, por escrito, qualquer alteração ao contrato de consórcio e respetivo aditamento celebrados entre as partes, respetivamente, em 22/09/2005 e 23/09/2005.
Acresce resultar da matéria fáctica apurada que a Ré só aceitou proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), na condição que daí não resultasse uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil, facto este que contraria o propósito (da autora) de reajustamento ou retificação das percentagens fixadas no consórcio em função da obra efetivamente realizada.

Por outro lado, ainda com atinência quer com as exigências formais, quer com o fundo da pretensão deduzida pela A., sempre se imporia aferir se o direito que aquela reclama da Ré se mostra suportado na cláusula 4ª, n.º 4, do aditamento ao contrato de consórcio, cujos termos se reproduzem:

- “As percentagens de participação no consórcio fixadas nos termos do número anterior serão, no final da Empreitada, reajustadas em função do valor dos trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consorciadas, sendo os custos qualificados no presente contrato ou por deliberação no COF como comuns suportados por cada uma delas na proporção dessas participações reajustadas, procedendo-se à consequente rectificação das imputações de custos entretanto efectuadas”.

No entendimento da A., da referida cláusula extrai-se a conclusão “de que as partes previram expressamente a hipótese de, no desenvolvimento da execução da empreitada pública, tal pudesse vir a ocorrer, isto é, que por qualquer razão, os trabalhos efectivamente executados ou atribuídos a cada uma das consociadas, pudessem vir a ser alterados, como no caso em apreço veio realmente a suceder” e “que nessa circunstância, as percentagens iniciais fossem, no final da empreitada, reajustadas, como nesta acção se pretendeu que fossem”.

Como tivemos já oportunidade de explicitar a propósito da impugnação da matéria de facto, não é essa a interpretação que temos como mais adequada da referida cláusula.
Como se disse – e ora se reitera, ainda que de um modo breve –, da leitura conjugada das diversas cláusulas inseridas no dito aditamento ao contrato de consórcio extrai-se que a determinação de percentagens de participação no consórcio, cujo reajustamento se imporá no final da empreitada, apenas releva para efeitos do apuramento e repartição das despesas e custos comuns do consórcio e não para qualquer ajustamento de contas sobre os trabalhos realmente executados por cada uma das consorciadas.
Por conseguinte, destinando-se a referida cláusula ao apuramento, no final da empreitada, dos custos comuns das consorciadas a fim de se proceder a eventuais correções nas imputações provisórias efectuadas durante a execução da obra em função das percentagens iniciais, o que não é confundível com qualquer ajustamento de percentagens de participação no consórcio em função do trabalho executado por cada uma das especialidades, forçoso será concluir pela inviabilidade do recurso àquela cláusula a fim de servir de fundamento ao direito reclamado pela Autora.

Como é sabido, em obediência ao princípio da liberdade contratual, dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver (cfr. art. 405º, n.º 1 do Código Civil).
E, nos termos estatuídos no n.º 1 do art. 406º do Código Civil, "o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei".

Deste princípio resultam três comandos essenciais:

- o cumprimento do contrato é obrigatório;
- só o mútuo consenso das partes pode legitimar a sua modificação;
- ambos os contraentes estão reciprocamente em posição de igualdade.

Trata-se, no fundo, da consagração do velho princípio “pacta sunt servanda”, o qual deve ser entendido, como referem Pires de Lima e Antunes Varela (25), como significando que os contratos devem ser cumpridos ponto por ponto, ou seja, diremos nós, no tempo e no modo convencionado pelas partes.
Assinale-se que, não sendo a fonte da obrigação objeto destes autos o contrato de empreitada (26), mas sim o contrato de consórcio, não há aqui que indagar se a ré tinha ou não direito a receber os valores que lhe foram pagos pelo dono da obra (27). Impor-se-á tão só determinar se, à luz do contrato de consórcio celebrado entre as partes, havia lugar à retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados.

Ora, mostrando-se inalterado o acordado no contrato de consórcio e do respetivo aditamento, e considerando que a ré apenas anuiu proceder à respetiva revisão e adaptação na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil), na condição de que daí não decorria uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado, na componente de construção civil, forçoso será concluir que, independentemente da desconformidade entre os trabalhos orçamentados no projeto inicial e os executados no projeto variante, no âmbito do contrato de consórcio estabelecido entre as consorciadas a ré não estava obrigada a efetuar com a A. qualquer reajustamento ou retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados, o que nos reconduz, nesta parte, à procedência da apelação, com a consequente revogação da sentença recorrida.
*
3.2. – Quanto à reconvenção, da verificação dos factos constitutivos do direito de crédito da Ré/reconvinte sobre a A./reconvinda.

Insurge-se a recorrente/reconvinte contra a decisão que determinou a improcedência do pedido reconvencional, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que condene a A./reconvinda a pagar-lhe a quantia de € 301.492,52, acrescida de juros legais de mora ou, subsidiariamente, que relegue para execução de sentença a liquidação dos créditos invocados em reconvenção.
Nesta parte, mercê da improcedência da impugnação da decisão da matéria de facto, o quadro factual relevante com vista à sua subsunção jurídica é o mesmo que serviu de base à prolação da sentença recorrida.
A título reconvencional, pediu a Ré a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de 301.492,52 € relativa, entre outras, a despesas comuns e encargos com meios de produção (vg. mão-de-obra e equipamentos), que suportou e cujo pagamento, juntamente com o management fee, diz constituir obrigação da Autora nos termos do contrato de consórcio e respetivo aditamento.

Para tanto, a Ré reclamou da Autora o pagamento de faturas relativas à Empreitada de Execução das ETAR de D, C, B e A, mas também de outras empreitadas em que as partes se consorciaram e que aqui não foram apreciadas, como é o caso da Empreitada de Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R., da Empreitada de Execução das ETAR E, M., S. e SD, da Empreitada de Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub-Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã, e, ainda, quantias correspondentes a deduções efetuadas pela Autora a Ré no pagamento de facturas, tendo mesmo comunicado à A. a compensação de parte daquele crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, que afirma ser de € 183.520,10, dizendo subsistir um crédito sobre a A. que computou em 186.567,51€, acrescido de juros de mora que, à data da reconvenção, ascendiam a 114.925,01€, computando, assim, em 301.492,52 € o montante global do crédito de que se arroga sobre a A..
A Autora não aceitou ser devedora da Ré dos valores reclamados na reconvenção, embora reconhecendo ser apenas devedora do montante de € 232.007,23, mas referindo deter um contra-crédito sobre a ré no montante de € 340.816,10 por força das empreitadas mencionadas na contestação-reconvenção, pelo que invocou a seu favor a excepção da compensação.

Dos autos mostra-se com relevância provado que:

- No âmbito da execução do contrato de empreitada designada por “Empreitada de Execução das ETAR de D – FD I, C – FD 2, B – FD 7 e A – FD 8 – AR 04/2005 – Lote 4.1 + Lote 4.2”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108060207 30/06/2008 11.760,84
1108060209 30/06/2008 248,05
1108090263 30/09/2008 5.958,84
1108090264 30/09/2008 2.515,79
1108100101 31/10/2008 9.447,10
1108120214 31/12/2008 934,07
1108120215 31/12/2008 2.515,79
1209020016 27/02/2009 1.881,00
1209030010 26/03/2009 1.536,00
1109040190 30/04/2009 3.291,94
1209050002 08/05/2009 9.795,52
1209060009 12/06/2009 2.086,56
1110070126 30/07/2010 1.808,53 (ponto 57º dos factos provados).
- A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1209050002 datada de 08/05/2009 no valor de € 9.795,52, com o fundamento de se reportar a despesas relacionadas com atrasos na empreitada (ETAR D, C, B e A), parte dos quais da responsabilidade da Ré (ponto 58º dos factos provados).
- No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Condutas Adutoras, Estações Elevatórias e Reservatórios de Abastecimento de Água – Sistemas Das AD e do R.”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
1108030142 31/03/2008 9.264,65
1108040122 30/04/2008 12.322,20
1108050126 30/05/2008 6.727,60
1108060118 30/06/2008 1.290,16
1108060208 30/06/2008 3.211,47
1108070147 29/07/2008 10.872,51
1108080102 29/08/2008 8.327,38
1108090140 30/09/2008 5.395,22
1108090261 30/09/2008 1.818,61
1108090262 30/09/2008 3.696,05
1108100098 31/10/2008 2.345,74
1108120216 31/12/2008 1.480,18
1108120217 31/12/2008 3.696,05
1109040075 21/04/2009 6.665,08
1109040191 30/04/2009 1.860,30
1109070171 31/07/2009 10.086,68
1109080128 31/08/2009 6.425,17
1210020026 28/02/2010 1.924,00
1110070127 30/07/2010 4.386,75 (ponto 59º dos factos provados).
- A Autora não aceitou e devolveu à Ré, a Nota de Débito número 1109040075 datada de 21/04/2009 no valor de 6.665,08€, a Nota de Débito número 1109080128 datada de 31/08/2009 no valor de 6.425,17€ e a Nota de Débito número 1210020026 datada de 28/02/2010 no valor de 1.924,00€, num total de 15.014,25€ (ponto 60º dos factos provados).
- No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução das ETAR E (SAR-DN-04 e SAR-DN-05), M. (SAR-DN-10), S. (SAR-DN-03) e SD (SAR-DN-06)”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
15473/B 22/08/2007 136.767,55
1308010001 31/01/2008 136.767,55
1108020031 12/02/2008 40.947,57
1110070125 30/07/2010 95.819,97 (ponto 61º dos factos provados).
- A Autora não aceitou e devolveu à R. a Nota de Débito número 1110070125 datada de 30/07/2010 no valor de € 95.819,97 (ponto 62º dos factos provados).
- No âmbito da execução do contrato de empreitada designado por “Execução de Captações, Estações Elevatórias, ETA e Reservatórios dos Sub-Sistemas da Vila Chã, Sordo e Campeã”, a Ré emitiu à Autora as seguintes faturas e notas de débito:
Fatura Data Valor
14481/B 14/02/2007 53.906,19
1208110003 25/11/2008 17.449,65 (ponto 63º dos factos provados).
- A Autora não aceitou e devolveu à R. Nota de Débito número 1208110003 datada de 25/11/2008 no valor de 17.449,65 € (ponto 64º dos factos provados).
- Em 13/08/2010, através da carta junta sob Doc. n.º 113, a Ré comunicou à Autora que compensava parte do seu crédito com a totalidade da dívida da Ré à Autora, no valor de 183.520,10 € (ponto 65º dos factos provados).
- As partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrado respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A (ponto 66º dos factos provados).
Da enunciada factualidade apurada resulta que, para além da empreitada de execução das ETAR`s de D, C, B e A que esteve na base da outorga do contrato de consócio objeto dos autos, as partes consorciaram-se para a execução de outras empreitadas (não apreciadas nesta ação), mostrando-se, ainda, por liquidar despesas comuns e encargos resultantes da execução dessas empreitadas, arrogando-se as partes reciprocamente credoras uma da outra.
Está, de facto, provado que as partes têm ainda acertos de contas a efetuar emergentes dos contratos de empreitada celebrados respeitantes a outras ETARS, que não as de D, B, C e A.
Na sentença recorrida, partindo-se do pressuposto de que a Ré não logrou demonstrar nesta sede os créditos que reclamava sobre a Autora, foi determinada a improcedência do pedido reconvencional.
Com o devido respeito, à luz dos factos apurados julgamos que a referida decisão não deverá manter-se.

Com efeito, a facticidade apurada, em consonância, aliás, com a posição processual assumida pelas partes nos articulados (28), é não só elucidativa de que a ré é detentora de créditos sobre a autora (29), mas também da existência de contas pendentes de fecho como decorrência de diversas empreitadas executadas em parceria (consórcio), sendo manifesto que os elementos disponíveis nos autos não nos permitem determinar o quantitativo preciso dos correspetivos créditos.

Nesta situação, e mostrando-se para já inviável o recurso à equidade com vista à fixação do montante dos créditos de que a Ré é credora sobre a Autora (art. 4º do Código Civil), importa ter presente o estipulado no art. 609º, n.º 2 do CPC, segundo o qual, se não houver elementos para fixar a quantidade, «o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida».

Esta norma de direito adjetivo só pode atuar, como resulta dos seus próprios termos, quando, reconhecido um direito e a correspondente obrigação, não haja elementos que permitam definir o seu conteúdo, designadamente em termos quantitativos.

Nada obsta, com efeito, a que, em face da insuficiência de elementos para determinar o montante dos créditos peticionados, se profira uma condenação ilíquida, com a consequente remissão do apuramento do quantitativo de tais créditos para momento posterior, desde que – como acontece no caso dos autos – essa segunda oportunidade de prova não incida sobre a existência dos créditos reclamados, mas apenas sobre o respetivo valor.

Este entendimento é o mais consentâneo com o princípio da igualdade, uma vez que não se vislumbra fundamento material para tratar diferentemente aqueles que formulam de início um pedido genérico e os que apresentam, logo à partida, um pedido específico.
E esta orientação no sentido de que o tribunal, se não tiver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, condena no que vier a ser liquidado, é válida quer o pedido inicialmente formulado seja de montante determinado, quer se trate de pedido genérico (30).

Não seria curial que, tendo a Ré/reconvinte provado a existência de um direito de crédito sobre a Autora/reconvinda atinente às contas de fecho das diversas empreitadas executadas em regime de consórcio, crédito que de resto por esta é reconhecido (embora não com a extensão da sua reclamação), apesar disso a reconvenção devesse ser julgada improcedente apenas porque se não provou o exato montante que se encontra, a esse título, em dívida.
Mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade à autora do pedido (reconvencional), não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, porquanto a existência do crédito já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor, ou seja, o seu concreto montante.

Na verdade, não se está a conceder à autora do pedido reconvencional uma nova oportunidade de provar os créditos, na parte ilíquida (pois esses já ficaram provados nesta acção declarativa), mas somente de os quantificar (que está dependente da ultimação do acerto de contas das consorciadas).

Além de que, a manter-se a decisão proferida pela 1ª instância, a Ré ficaria sujeita a não poder ulteriormente reclamar da Autora/reconvinda esses créditos, dada a eventualidade de ser confrontada com a exceção do caso julgado inerente à improcedência da reconvenção, sendo essa exceção inclusivamente de conhecimento oficioso (arts. 577º, al. i), 578º, 580º, 581º e 582º, todos do CPC).

Não fornecendo os autos elementos que permitam quantificar os créditos reclamados a título reconvencional, impõe-se, por isso, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC, a condenação da autora/reconvinda no pagamento dos créditos invocados em sede de reconvenção, a liquidar em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação, nos termos do art. 358º, n.º 2, do CPC.
No tocante à reconvenção, ao ficarem vencidas por decaimento, as partes são responsáveis pelo pagamento das custas, provisoriamente e em partes iguais, na instância recorrida e na apelação, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art. 527.º, n.º s 1 e 2, do CPC (31).

Nesta conformidade, também na parte atinente à reconvenção a pretensão neste recurso da recorrente é de julgar parcialmente procedente.
*
Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):

I – Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir a realização de actos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento quer de uma actividade contínua; a execução de determinado empreendimento; o fornecimento a terceiros de bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio; pesquisa ou exploração de recursos naturais; produção de bens que possam ser repartidos, em espécies, entre os membros do consórcio (arts. 1.º e 2º do Dec. Lei n.º 231/81, de 28 de Julho).
II – Sendo a fonte da obrigação objeto dos autos o contrato de consórcio, e não o contrato de empreitada, não há que indagar se a consorciada tinha ou não direito a receber os valores que lhe foram pagos pelo dono da obra; impõe-se tão só que determinar se, à luz do aludido contrato de consórcio, haverá lugar à retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados.
III – Mostrando-se inalterado o acordado no contrato de consórcio e respetivo aditamento, e considerando que uma das consorciadas apenas anuiu proceder à respetiva revisão e adaptação do projeto na parte referente aos trabalhos da sua especialidade (construção civil) na condição de que daí não decorreria uma diminuição do preço a receber em função do projeto de execução já adjudicado naquela especialidade, independentemente da desconformidade que se venha a verificar entre os trabalhos orçamentados no projeto inicial e os executados no projeto variante, a referida consorciada não está obrigada a efetuar com a outra consorciada qualquer reajustamento ou retificação das percentagens fixadas no consórcio em função dos trabalhos executados.
IV – Provada a existência de um direito de crédito atinente às contas de fecho das diversas empreitadas executadas em parceria (consórcio), mas não se tendo apurado com precisão o seu montante, e sendo inviável o recurso à equidade, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC há que condenar no que se vier a liquidar em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação.
*
V. Decisão

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogando a sentença recorrida decidem:

- julgar a ação improcedente, absolvendo a ré dos pedidos.
- julgar a reconvenção parcialmente procedente, condenando a Autora/reconvinda a pagar à Ré/reconvinte os créditos invocados em sede de reconvenção relativos a despesas comuns, a liquidar em incidente de liquidação posterior ou subsequente à condenação, nos termos do art. 609º, n.º 2, do CPC.
*
Custas em ambas as instâncias, na parte relativa à ação, a cargo da apelada.
Custas em ambas as instâncias, na parte relativa à reconvenção, a cargo da apelante e da apelada, na proporção que, provisoriamente, se fixa em partes iguais, a corrigir em função do que resultar da posterior liquidação.
*
Guimarães, 13 de setembro de 2018

Alcides Rodrigues
Joaquim Boavida
Paulo Reis



1. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 736.
2. Cfr. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, Coimbra Editora, p. 141 e Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, 1985, p. 690.
3. Cfr. Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, p. 371.
4. Cfr. José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum À luz do Código de Processo Civil, 4ª ed., Gestlegal, 2017, p. 383.
5. Cfr. Helena Cabrita, A fundamentação de facto e de Direito da Decisão Cível, Coimbra editora, p. 258/259.
6. Cfr. Luís Correia de Mendonça/Henriques Antunes, Dos Recursos (regime do Dec. Lei n.º 303/2007), Quid Iuris, 2009, p. 117.
7. Cfr. Ac. do STJ de 28/02/2013 (relator João Bernardo), in www.dgsi.pt.
8. Cfr., entre outros, Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, p. 371 e António Júlio Cunha, Direito Processual Civil Declarativo, 2ª ed., Quid Juris, p. 364.
9. Cfr. Ac. do STJ de 8/11/2016 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt.
10. Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, obra citada, p. 713.
11. Cfr. Ac. do STJ de 30/04/2014 (relator Mário Belo Morgado), in www.dgsi.pt. e Cardona Ferreira, Guia de Recursos em Processo Civil, 6.ª edição, Coimbra Editora, pp. 69/70.
12. Cfr. Ac. da RG de 30/03/2017 (relator José Amaral), in www.dgsi.pt.
13. Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª ed., Almedina, pp. 291/293.
14. Cfr., na doutrina, Abrantes Geraldes, obra citada, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova testemunhal, 2017 – reimpressão, Almedina, p. 384 a 396, Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, in Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina pp. 462 a 469; na jurisprudência, Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24/09/2013 (relator Azevedo Ramos), de 03/11/2009 (relator Moreira Alves) e de 01/07/2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt.
15. Inicialmente indicado como testemunha, foi inquirido em sede de declarações de parte, dado exercer as funções de administrador da Autora (cfr. acta de fls. 2163).
16. Cfr., neste sentido, Ac. do STJ de 28/09/2017, proc. n.º 659/12.6TVLSB.L1.S1 (relatora Fernanda Isabel Pereira), Ac. do STJ de 28/09/2017, proc. n.º 809/10.7TBLMG.C1.S1 (relatora Fernanda Isabel Pereira) e Acs. da RP de RP 24/10/2016 (relator Oliveira Abreu) e de 18/09/2017 (relator Manuel Domingos Fernandes), todos acessíveis in www.dgsi.pt.; no sentido de que às conclusões de direito são assimiladas, por analogia, as conclusões de facto, ou seja, “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados”, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil-Anotado, Vol. II, 2008, Coimbra Editora, pp. 637 e 638.
17. Cfr., Acs. do STJ de 28/09/2017 (relatora Fernanda Isabel Pereira), de 29/04/2015 (relator Fernandes da Silva), de 14/01/2015 (relator Fernandes da Silva), de 14/01/2015 (relator Pinto Hespanhol); na doutrina, Tiago Caiado Milheiro, In Nulidades da Decisão da Matéria de Facto, www.julgar.pt., e Antunes Varela, “Juízos de valor da lei substantiva, o apuramento dos factos na acção e o recurso de revista”, CJ, Ano XX, tomo IV, pp. 7 a 14.
18. Cfr., Ac. RP de 23/04/2018 (relator Jerónimo Freitas), in www.dgsi.pt..
19. Cfr. José A. Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, p. 392. Nas palavras do citado autor, “[p]or contratos de cooperação empresarial designamos genericamente aqueles acordos negociais, típicos ou atípicos, celebrados entre duas ou mais empresas jurídica e economicamente autónomas (singulares ou colectivas, públicas ou privadas, comerciais ou civis), com vista ao estabelecimento, organização e regulação de relações jurídicas duradouras para a realização de um fim económico comum” (cfr. obra citada, p. 209).
20. Cfr., José A. Engrácia Antunes, obra citada, p. 400.
21. Cfr. Ac. do STJ de 17/06/2014 (relator Fonseca Ramos), in www.dgsi.pt.
22. Cfr. Ac. do STJ de 6/10/2011 (relator Orlando Afonso), in www.dgsi.pt.
23. Cfr. Direito Comercial, volume I, 2017, reimpressão, Almedina, p. 155.
24. Cuja cópia consta de fls. 89 a 100.
25. Cfr. Código Civil Anotado, volume I, 4ª ed., 1987, Coimbra Editora, p. 373.
26. No regime jurídico das empreitadas de obras públicas, as partes (dono da obra e empreiteiro) devem, no final do contrato, elaborar uma conta final da empreitada, da qual deverá constar um mapa de todos os trabalhos executados a mais ou a menos do que os previstos no contrato, com a indicação dos preços unitários pelos quais se procedeu à sua liquidação, com eventual relevância no ajustamento do preço em função dos trabalhos efectivamente executados e medidos (arts. 220.º a 222.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março).
27. A propósito, como já vimos, a Ré executou obra no valor de 5.378.331,78 € e faturou e recebeu no valor de 5.917.717,73 € (pontos 49º e 53º dos factos provados).
28. Na réplica (cfr. fls. 1138 a 1148) a Autora/reconvinda expressamente reconheceu ser devedora do montante de € 232.007,23, embora se arrogue titular de um contra-crédito sobre a ré no montante de € 340.816,10.
29. Do conjunto das 40 (quarenta) facturas e notas de débito que titulam os créditos que a R. se arroga sobre a A. – e que foram dadas como provadas (pontos 57º, 59, 61 e 63º dos factos provados) –, a A. procedeu apenas à devolução de 6 (seis) notas de débito (pontos 58º, 60º, 62º e 64º dos factos provados), não impugnando as demais facturas.
30. Cfr. Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 2017 – 9º ed., Almedina, p. 234 e os Acs. do STJ de 19/05/2009 (Relator Azevedo Ramos) e de 22/02/2011 (relator Garcia Calejo), ambos consultáveis in www.dgs.pt..
31. Cfr. Abrantes Geraldes, in Temas Judiciários, I Vol. (1 - Citações e notificações em processo Civil 2 – Custas judiciais e multas cíveis), Almedina, 1998, p. 238 – 242, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, p. 419 e Ac. do STJ de 13/07/2017 (Relator Olindo Geraldes), in www.dgs.pt.