Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2269/17.2T8BRG-A.G1
Relator: EUGÉNIA CUNHA
Descritores: ACÇÃO DE PREFERÊNCIA
PREÇO GLOBAL
VALOR DA ACÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/14/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.º SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (elaborado pela relatora):

1- Para a determinação do valor da ação, que equivale à utilidade económica imediata do pedido, há que atender ao concreto pedido formulado e, não bastando a análise do pedido, tem de se atentar ao que resulta dos factos integrantes da respetiva causa de pedir;

2- Havendo critério especial para fixação do valor da causa - dentro dos consagrados nos arts. 298º, 300º a 304º, do CPC, que mais não representam do que a concretização e a adaptação do critério geral estabelecido no art 297º, de tal diploma, em função da modalidade do pedido formulado - não se deve subsumir o caso ao critério geral (apenas aplicável na falta daquele);

3- Pedido o reconhecimento do direito de preferência, aplica-se o critério consagrado no nº1, do art. 301º, do CPC, por estar em apreciação a modificação de um ato jurídico (preço real estipulado pelas partes);

4- Em caso de venda conjunta de imóveis por preço global, permitida pelo nº1, do artigo 417º, do Código Civil, pretendendo o preferente exercer o seu direito apenas relativamente a alguns bens integrados no conjunto, o preço (e o valor a atribuir à causa) será o que efetiva e proporcionalmente lhe competir dentro do preço global fixado para a venda conjunta;

5- Cumpre ordenar o arbitramento, a que alude o art. 309º, do CPC, para fixação do valor da causa, quando se verificar falta de prova suficiente para determinar tal valor. Trata-se de um poder-dever (poder vinculado, não discricionário) que só pode deixar de ser exercido quando aquela diligência probatória for objetivamente desnecessária ou inútil;

6- Para o devido cálculo da supra referida proporcionalidade, na falta de provas suficientes, é necessário arbitramento, sendo que, para essa determinação e para a do valor da ação de preferência, é útil e necessária a separada e concreta determinação dos valores reais de mercado dos bens objeto da ação, podendo haver necessidade de o alargar aos demais bens objeto da venda conjunta (e com base nas separadas e concretas avaliações dos bens e no preço global fixado para a dita venda conjunta serem calculadas as mencionadas proporcionalidades).
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Escola de Condução X, Lda propôs a presente ação, com forma de processo comum, contra Y – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado e W – Investimentos Imobiliários, S.A pedindo que:

a) se declare que a Autora é arrendatária, há mais de três anos, das frações autónomas identificadas nas alíneas a), b), c) e d), do art. 13º, da petição inicial;
b) se reconheça à Autora o direito de preferência na venda das frações autónomas identificadas no artigo 13º supra, ou seja, o direito de haver para si as referidas frações autónomas e, consequentemente, seja declarada compradora das mesmas, substituindo-se à segunda demandada na sua compra, nas exatas condições em que a mesma foi feita;
c) se ordene a modificação subjetiva do adquirente, por efeito da preferência, com o consequente cancelamento do registo da aquisição a favor da segunda demandada das frações autónomas vendidas.
Indica como valor da causa 5.000,01 €.
*
Findos os articulados, foi proferido o seguinte despacho,
Tendo em vista fixar o valor da acção e consequentemente determinar o preço a depositar pelo A., impõe-se apurar o real valor dos bens objecto do direito de preferência aqui em causa.
Atente-se que tal como resulta das contestações apresentadas o valor atribuído às fracções na respectiva escritura de venda não corresponde ao seu real valor, outrossim representa um valor atribuído apenas para efeitos fiscais e da elaboração da respectiva escritura, uma vez que se tratou de uma venda conjunta de imóveis pelo valor global de 6.203.722,00€, não representando, de modo algum, o valor em causa, valor de mercado dos imóveis unitariamente e em caso de venda individual.

Aliás, compulsando os autos verificamos que o valor e causa é deveras irrisório (5001,00 € as 4 fracções), e manifestamente inferior ao respectivo valor patrimonial, somando as quatro fracções chegamos a 66.973,76€, valor esse que na esmagadora maioria das vezes, e como sabemos, se encontra abaixo do valor de mercado dos imóveis.

Isto posto, e sob pena de estarmos a dar cobertura a um exercício abusivo do direito de preferência, e antes disso, a dar seguimento a uma acção em que se mostra depositada uma quantia irrisória para aquisição de e fracções, quando na verdade, poderão estar em causa valores superiores que superem os 60.000,00€, entendemos que se mostra essencial, desde já, apurar o valor dos bens, caso se conclua pela possibilidade da venda em separado, que será no fundo o valor que a A. terá que despender para ingressar na posição de compradora.

Veja-se que a obrigação de depósito de preço pelo A. preferente tem subjacente a seriedade da vontade de adquirir o bem, pelo que só com o resultado da avaliação e posterior depósito do preço encontrado, poderemos concluir pela vontade efectiva do A. adquirir o bem pelo seu valor real e justo, isto sempre e, frisa-se, para a hipótese de se concluir pela possibilidade da venda em separado.

Mais, caso se conclua que as fracções objecto de preferência, se vendidas separadamente, têm valor superior a 50,000,00€, está inclusivamente posta em causa a competência deste juízo local cível para a tramitação da acção.

Nesta conformidade, determino a realização de arbitramento ( artº 309º do CPC) com vista a determinar o real valor das fracções em causa nos autos se vendidas separadamente, entendendo este tribunal que atento o objecto em causa não se mostra necessária a realização de avaliação colegial como requerido.

Indique a secção pessoa idónea para realizar a avaliação que fica, desde já, nomeada, devendo prestar compromisso de honra por escrito.

Objecto - determinar o real valor das fracções em causa nos autos (artº 24 da petição inicial) se vendidas separadamente,
Prazo – 20 dias.
Os custos do arbitramento serão adiantados pelas RR. entrando em regras de custas a final.
O perito nomeado deverá informar os mandatários da data em que se pretende deslocar ao prédio em causa nos autos, com vista a que, se assim o entenderem, acompanhem a diligência juntamente com as partes.
*
A Autora apresentou recurso de apelação, pugnando por que sejam revogadas as decisões ora impugnadas e se fixe em € 5.000,01 o valor da presente causa, ou subsidiariamente, não se admita o arbitramento, por impertinente ou dilatório. Formula as seguintes

CONCLUSÕES:

i.- O presente recurso tem por objeto a decisão da Sra. Juíza de Direito de ordenar «(…) a realização de arbitramento (artº 309º do CPC) com vista a determinar o real valor das fracções em causa nos autos se vendidas separadamente (…) tendo em vista fixar o valor da ação e consequentemente determinar o preço a depositar pelo Autor», e, bem assim, a decisão de determinar como objeto do aludido arbitramento “(…) o real valor das fracções (…)”.
ii.- Estas decisões têm importantes reflexos substantivos, na medida em que podem determinar (caso transitem em julgado), para a Autora, a obrigação de depositar um preço distinto do real;
têm, por outro lado, importantes reflexos processuais, uma vez que podem determinar a fixação de um valor para a causa diferente do valor do ato, que é o critério a ser observado em ordem à verificação e fixação do valor da causa, podendo, no limite, determinar a incompetência do tribunal em razão do valor e um agravamento dos custos processuais.
iii.- De forma largamente maioritária, têm entendido a doutrina e jurisprudência que o preço devido é o preço real, i.e., o montante da contraprestação satisfeita ou a satisfazer ao alienante pelo adquirente da coisa sujeita a prelação, ou, no caso de venda desta conjuntamente com outras, o valor que proporcionalmente lhe tiver sido atribuído.
iv.- Em caso da alienação da coisa objeto de preferência, e sob pena de caducidade, é necessário que o preferente deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à propositura da ação.
v.- O preço devido é o preço real, i.e., o montante da contraprestação satisfeita ou a satisfazer ao alienante pelo adquirente da coisa sujeita a prelação, ou, no caso de venda desta conjuntamente com outras, o valor que proporcionalmente lhe tiver sido atribuído.
vi.- De acordo com o contrato celebrado pelas rés, “(…) os preços individuais pelos quais cada um dos imóveis é vendido, constam do documento complementar UM à presente escritura, que dela faz parte integrante para todos os efeitos legais” (cfr., documento junto sob o número 12 com a petição).
vii.- Nos termos do referido documento complementar UM, os preços individuais pelos quais foram vendidas as coisas objeto de prelação perfazem a quantia de € 5 000,01, correspondendo este, ponderados todos os elementos do contrato, ao valor proporcional a estas atribuído pelos contraentes, idêntico, aliás, àquele dado a conhecer à Autora para efeito do (eventual) exercício do direito de preferência (cfr., documentos juntos sob os números 7 a 11, idem).
viii.- O valor proporcional atribuído a cada um dos bens equivale ao seu real valor venda atenta a economia do contrato, na medida que somente assim se compreende que o preço individual atribuído a muitos dos bens vendidos, curiosamente os mais valiosos, seja superior ao valor patrimonial tributário dos mesmos, já de si muito alto.
ix.- Não é suficiente para obstar a esta conclusão o facto de no contrato ser declarado que atribuição daqueles preços individuais tem apenas por fim cumprir normas fiscais, notariais ou contabilísticas (na medida em que a declaração não colide, afasta ou se destina a restringir o âmbito da declaração precedente) ou a circunstância de as rés, na sua defesa, alegarem que a atribuição daqueles preços individuais resultará de um exercício cego, aleatório, ou de uma declinação abstrata, sem qualquer outra preocupação que não fosse o de atribuir, em ordem a cumprir normas fiscais, notariais ou contabilísticas, um qualquer valor, fosse ele qual fosse.
x.- Assinale-se, ademais, que nenhuma das rés invoca que preço individual atribuído aos bens objeto da venda são simulados, ou que o seu preço real de venda, ou valor proporcional atribuído na venda, é superior ao declarado no contrato e indicado pelo Autor. Apenas aduzem que o seu valor comercial, ou de mercado, é superior, não indicando, todavia, valor distinto daquele constante do contrato.
xi.- Cumpre anotar que a Ré Y – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado aduz o seguinte: “o critério utilizado pelas partes nesse exercício foi um “critério cego” em que apenas relevou a área dos imóveis transmitidos e nenhum outro factor (…) Detalhando, as partes limitaram-se a dividir o preço global do portefólio transmitido pelos metros quadrados totais que compunham esse conjunto de imóveis, multiplicando depois esse valor/m2 pelo número de metros quadrados de cada um dos imóveis individualmente considerado” (cfr., artigos 126.º e 127.º da contestação).
xii.- Embora não aceite a Autora que o critério tenha sido esse, o certo que a afirmação constitui o reconhecimento de que foram atribuídos, com base num critério objetivo e que é evidenciado (seja ele acertado ou não), valores proporcionais a cada um dos imóveis objeto da venda.
xiii.- Considerando o texto do contrato celebrado e as afirmações constantes dos artigos 126.º e 127.º da contestação da Ré Y – Fundo de Investimento Imobiliário Fechadodúvidas não há que o valor proporcional atribuído aos bens objeto de prelação, o seu preço real de venda, corresponde a € 5 000,01.
xiv.- Considerando que, por um lado, é indicado no contrato o preço individual de venda de cada uma dos bens objeto de prelação e que, por outro, é ausente, da parte das rés, o alegação de ser outro o preço real, ou tampouco a invocação de ser simulado o preço indicado, impunha-se ao tribunal «a quo», em observância ao que dispõe o artigo 301.º, n.º1 e 308,.º do CPC, fixar o valor da causa em € 5 000,01, na medida em que os elementos constantes do processo são bastantes para o efeito, sendo desnecessárias quaisquer diligências instrutórias destinadas averiguar preço real da venda, ou o valor proporcional atribuído aos bens;
xv.- Ainda que se entendesse que os elementos constantes do processo são insuficientes em ordem a fixar o valor da causa, entendendo o Tribunal que não é possível, com base neles, conhecer o valor proporcional atribuído, o que não se aceita, sempre seria ilegal o arbitramento determinado considerando o objeto fixado, na medida em se dirige a percecionar um facto irrelevante para efeito de verificação do valor da causa.
xvi.- O critério a ter em conta em ordem a fixar o valor da causa nos presentes autos é o valor proporcional atribuído (cfr., artigo 301, n.º 1, do CPC) e não o real valor das fracções em causa nos autos se vendidas separadamente (…).
xvii.- Pelo exposto, ao decidir como decidiu violou o Tribunal «a quo», entre outras, o disposto nos artigos 232.º, 874.º, 1410.º, do Código Civil: e 301.º e 308.º, do CPC.
Subsidiariamente,
xviii.- A decisão de determinar o arbitramento com o objeto fixado corresponde à admissão de um meio de prova impertinente ou dilatório, na medida em que se destinará a aferir uma realidade – o valor real dos bens se vendidos separadamente – absolutamente inócuo para o objeto do processo e verificação do causa, configurando, por isso (pela sua impertinência ou por ser dilatório), uma ilegalidade (cfr., artigos 301.º, n.º 1, 308.º e 476.º, n.º1, do CPC).
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A 2ª Ré, W – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A., apresentou contra alegações requerendo se negue provimento à apelação e se confirme a decisão recorrida, concluindo:

A) Atento o disposto no artigo 308.º do CPC, “quando as partes não tenham chegado a acordo ou o juiz o não aceite, a determinação do valor da causa faz-se em face dos elementos do processo ou, sendo estes insuficientes, mediante as diligências indispensáveis, que as partes requererem ou o juiz ordenar”.
B) Resulta do disposto no artigo 630.º, n.º 1 do CPC que “não admitem recurso os despachos de mero expediente nem os proferidos no uso legal de um poder discricionário”.
C) O Despacho sub judice e cuja revogação é peticionada pela Recorrente foi proferido no âmbito do poder discricionário do Tribunal a quo, não sendo susceptível de recurso, razão pela qual deve ser indeferido o requerimento de recurso apresentado.
D) Como resulta amplamente do teor das Contestações apresentadas – e de toda a documentação junta aos autos – entre as Rés foi celebrado um negócio de venda conjunta de dezenas de imóveis sitos ao longo do território nacional.
E) Conforme resulta do Doc. n.º 12 da Petição Inicial, as partes fixaram o valor global de € 6.203.772,00 (seis milhões duzentos e três mil setecentos e setenta e dois euros) para aquisição pela ora Recorrida de portfólio composto por 4 (quatro) prédios urbanos e 62 (sessenta e duas) fracções autónomas, em que se inserem as fracções que a Recorrente pretende preferir.
F) As partes não fixaram um valor individual para cada fracção, atenta a natureza conjunta e global do negócio de compra e venda de dezenas de imóveis.
G) A separação das quatro fracções autónomas que a Recorrente pretende adquirir por via desta acção implicaria um prejuízo apreciável para o vendedor que, dessa forma, não conseguiria concretizar o negócio de alienação dos demais imóveis nos termos pretendidos.
H) Atenta a natureza conjunta e global do negócio, na escritura pública de compra e venda junta como Doc. n.º 12 da Petição Inicial, as partes outorgantes declararam expressamente que “a presente compra e venda é feita em conjunto (abrangendo a totalidade dos imóveis identificados no documentos complementar UM) e pelo preço global atrás indicado, não sendo separável sem prejuízo apreciável para o vendedor, sendo que os preços indicados para cada um desses imóveis no documentos complementar UM são atribuídos apenas para efeitos de cumprimento das normas notariais, contabilísticas e fiscais”. (negrito nosso)
I) As partes não tinham de atribuir a cada um dos bens um valor concreto nem tinham de indicar o prejuízo que sofreriam pela sua venda separada, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.03.2011, Proc. 1113/06.0TBPVZ.P1.S1, disponível para consulta em http://www.dgsi.pt.
J) O valor indicado no Documento complementar UM serviu apenas para dar cumprimento às normas previstas no Código do IMT (cfr. artigos 1.º, 2.º, 4.º, 7.º, 12.º, 20.º, 22.º, 36.º, 49.º, 50.º), no Código do Imposto do Selo (cfr. artigos 1.º, 2.º, 5.º, 9.º, n.º 4, 23.º, n.º 4, 38.º, 44.º), na Verba 1.1. da Tabela Geral anexa ao CIS e nos artigos 46.º, n.º 1, alínea f) e 63.º do Código do Notariado.
K) A declinação daquele valor global no Documento Complementar UM junto ao Doc. n.º 12 da Petição Inicial não corresponde ao valor proporcional de cada um dos imóveis no negócio.
L) Se a pretensão da Recorrente procedesse, esta asseguraria a aquisição de quatro fracções autónomas no centro e melhor artéria de Braga, em frente ao Teatro C, com a área bruta privativa de 118,30 m2 (22,08+22,2+14,2+59,82), pelo irrisório valor de € 40,27 (quarenta euros e vinte e sete cêntimos) por m2!
M) Face às diferentes soluções de Direito aplicáveis, em abstracto, ao caso concreto, é manifesto que bem andou o Tribunal a quo a determinar a realização de diligência de arbitramento para determinação do valor da coisa (quatro fracções autónomas) e, consequentemente, do valor da causa.
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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

- OBJETO DO RECURSO

Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações da recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, as questões a decidir são as seguintes:

- Da admissibilidade do arbitramento previsto no art. 309º, do CPC, para determinação do valor da causa na presente ação de preferência de parte dos imóveis objeto de venda conjunta por preço global.
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II.A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos provados, com relevância, para a decisão constam já do relatório que antecede.
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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Conclui a Autora que se impunha ao tribunal a quo fixar o valor da causa em € 5.000,01, na medida em que os elementos constantes do processo são bastantes para o efeito, e, entendendo o Tribunal que não, sempre seria ilegal o arbitramento determinado considerando o objeto fixado, na medida em se dirige a percecionar um facto irrelevante para efeito de verificação do valor da causa. Afirma que o critério a ter em conta em ordem a fixar o valor da causa nos presentes autos é o valor proporcional (cfr., artigo 301, n.º 1, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência) e não o real valor das frações em causa nos autos se vendidas separadamente, pelo que, ao decidir como decidiu, violou o Tribunal a quo, entre outras, o disposto nos artigos 232.º, 874.º, 1410.º, do Código Civil, e 301.º e 308.º, do CPC, e, subsidiariamente, a decisão de determinar o arbitramento com o objeto fixado corresponde à admissão de um meio de prova impertinente ou dilatório, na medida em que se destinará a aferir uma realidade – o valor real dos bens se vendidos separadamente – absolutamente inócua para o objeto do processo e verificação do valor da causa, configurando, por isso (pela sua impertinência ou por ser dilatório), uma ilegalidade (cfr., artigos 301.º, n.º 1, 308.º e 476.º, n.º1, do CPC).

Afirma que o preço devido é o preço real, i.e., o montante da contraprestação satisfeita ou a satisfazer ao alienante pelo adquirente da coisa sujeita a prelação, ou, no caso de venda desta conjuntamente com outras, o valor que proporcionalmente lhe tiver sido atribuído, equivalendo este ao seu real valor venda atenta a economia do contrato, não sendo suficiente para obstar a esta conclusão o facto de no contrato ser declarado que a atribuição daqueles preços individuais tem apenas por fim cumprir normas fiscais, notariais ou contabilísticas.
Sustenta a 2ª Ré que entre as Rés foi celebrado um negócio de venda conjunta de dezenas de imóveis sitos ao longo do território nacional tendo as partes fixado o valor global de € 6.203.772,00 (seis milhões duzentos e três mil setecentos e setenta e dois euros) para aquisição pela ora Recorrida de portfólio composto por 4 (quatro) prédios urbanos e 62 (sessenta e duas) frações autónomas, em que se inserem as frações que a Recorrente pretende preferir, sendo que não fixaram um valor individual para cada fração, atenta a natureza conjunta e global do negócio de compra e venda de dezenas de imóveis e a separação das quatro frações autónomas que a Recorrente pretende adquirir por via desta ação implicaria um prejuízo apreciável para o vendedor que, dessa forma, não conseguiria concretizar o negócio de alienação dos demais imóveis nos termos pretendidos. Atenta a natureza conjunta e global do negócio, na escritura pública de compra e venda junta como Doc. n.º 12 da Petição Inicial, as partes outorgantes declararam expressamente que “a presente compra e venda é feita em conjunto (abrangendo a totalidade dos imóveis identificados no documentos complementar UM) e pelo preço global atrás indicado, não sendo separável sem prejuízo apreciável para o vendedor, sendo que os preços indicados para cada um desses imóveis no documentos complementar UM são atribuídos apenas para efeitos de cumprimento das normas notariais, contabilísticas e fiscais”, não correspondendo o indicado ao valor proporcional de cada um dos imóveis no negócio.

Como refere a apelada, “Com a entrada em vigor do CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, passou a impender unicamente sobre os Juízes a obrigação de fixar o valor da causa, podendo para tanto ser realizadas, oficiosamente ou a requerimento das partes, as diligências consideradas indispensáveis para que esse valor corresponda à efectiva utilidade económica imediata do pedido, estando as partes apenas vinculadas a um dever de indicação de um valor e de contraditar o que seja indicado pela parte contrária”, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12.04.2016, Proc. 481/10.4TBSCR.L2-1, disponível em http://www.dgsi.pt.

Pretende a Apelante que sejam revogadas as “decisões ora impugnadas” e se fixe em € 5.000,01 o valor da presente causa e, subsidiariamente, que se não admita o arbitramento, por impertinente ou dilatório.

Ora, nenhum valor foi, ainda, fixado, e não cabe ao Tribunal superior fazê-lo (mas tão somente, uma vez fixado, apreciar a questão, caso seja interposto recurso e, ainda assim, limitado pelas conclusões da apelação).
A fixação do valor da causa é incumbência do Tribunal de 1ª Instância, ao abrigo do nº1, do art. 306º, do CPC, que para estar habilitado com os elementos que considerou necessários à análise da questão, ordenou a realização de arbitramento.

Com efeito, nenhum valor foi fixado e apenas se mostra decidido pelo Tribunal a quo:

“a realização de arbitramento ( artº 309º do CPC) com vista a determinar o real valor das fracções em causa nos autos se vendidas separadamente”, por, desde logo, “caso se conclua que as fracções objecto de preferência, se vendidas separadamente, têm valor superior a 50,000,00€, está inclusivamente posta em causa a competência deste juízo local cível para a tramitação da acção”.

Assim, apenas cumpre apreciar:

- Da admissibilidade do arbitramento ordenado para efeito de determinação do valor da causa (art. 308º-309º).

A atribuição de valor à causa é regulada pelos artigos 296º e seguintes, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência.
A toda a “causa” deve ser atribuído um valor certo em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido (nº1, do art. 296º), e constitui um dos elementos obrigatórios a indicar na petição inicial (art. 552º, nº1, al. f)). O pedido é, conforme resulta do nº3, do art. 581º, o efeito jurídico que se pretende obter com a demanda.
“A referida utilidade económica do pedido, ou seja, o benefício visado com a ação ou com a reconvenção, afere-se, segundo a expressão legal, à sua luz, que se não limita a enunciar o objeto imediato da demanda, na medida em que também enuncia o efeito jurídico que com ela se pretende obter.
A utilidade económica do pedido, expressa numa quantia em dinheiro ou no benefício que lhe equivalha pecuniariamente, é instrumental quanto à determinação do valor da causa, sem abstrair da respetiva causa de pedir.

A lei abstrai do facto de o pedido ser ou não de condenação no pagamento de determinada quantia (…). No caso de não bastar a análise do pedido para a determinação da sua utilidade económica imediata, deve ter-se em conta o que resulta dos factos integrantes da atinente causa de pedir.

Para se determinar o valor da causa ou se os pedidos são ou não distintos, deve atender-se à estrutura destes, aos interesses que os litigantes se propõem fazer valer e aos efeitos jurídicos que visam conseguir (1)(2) (negrito nosso).

Constitui critério geral o de que o valor de uma causa há de corresponder à utilidade económica imediata que através da mesma se pretende alcançar. Em termos genéricos o objeto da ação é determinado pelo pedido nela deduzido, o qual pode corresponder ou não a uma determinada quantia certa em dinheiro. Mas sendo a utilidade económica do pedido aferida pelos termos em que o mesmo é formulado – a delimitar não só o objeto imediato da demanda, mas ainda o efeito jurídico que pela mesma é perseguido – não será de olvidar que aquele (pedido) é também circunscrito pela causa de pedir que o sustenta, pelo que não poderá ser considerado isoladamente, antes no confronto com a causa de pedir, tudo em ordem a determinar o valor da acção (3)(4).

Os critérios gerais para a fixação do valor da causa estão consagrados no art. 297º, sendo o nº1, mero desenvolvimento do disposto no nº1, do artigo 296º (5).

A utilidade económica imediata do pedido, expressa em dinheiro, constitui o critério geral para a determinação do valor da causa. “Quando o pedido tenha por objeto uma quantia pecuniária líquida (“quantia certa em dinheiro”) a determinação está in re ipsa, constituindo essa quantia a utilidade tida em vista pelo Autor ou pelo reconvinte, independentemente de ser pedida a condenação no seu pagamento, a simples apreciação da existência do direito a essa quantia ou a sua realização em ação executiva; nos outros casos, há que encontrar o equivalente pecuniário correspondente à utilidade (benefício) visada (art. 297º- 1). As disposições sobre o valor da causa que consagram critérios especiais (arts. 298, 300 a 304) representam a concretização e a adaptação desse critério geral, em função da modalidade do pedido formulado.

Há, porém, que ter em conta que o pedido se funda sempre na causa de pedir (Lebre de Freitas, Introdução cit., nº1.4.6), que o explica e delimita. Dela não abstrai o critério da utilidade económica imediata do pedido, pelo que este não é considerado abstratamente, mas sim em confronto com a causa de pedir, para o apuramento do valor da causa (…) Tal como o pedido desligado da causa de pedir não basta à determinação do valor da acção, também a causa de pedir, por si, não o determina (6).

É jurisprudência uniforme, e foi decidido entre outros nos Acórdão da Relação de Coimbra, todos disponíveis in dgsi, de 26/11/2013, processo 9/11.9TBTCS-C.C1, de 18/2/2014, processo 316/11.0TBVZL.C1, de 20/1/2015, processo 360/12.0TBCNF.C1 e de 9/12/2015, processo 33/09.1TBPNC.C1, que nas ações de preferência é de convocar o critério consagrado no nº1, do art.º 301.º, devendo fixar-se à causa o valor correspondente ao preço pelo qual o bem foi vendido.

Refere-se neste último Acórdão “não se trata aqui de fazer aplicar o critério geral, será de convocar, em nosso entender, quanto dispõe o art.º 301.º, nos termos do qual “Quando a acção tiver por objecto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um acto jurídico, atende-se ao valor do acto determinado pelo preço ou estipulado pelas partes” (vide n.º 1). E isto porque “a acção de preferência cabe perfeitamente na letra do art.º 315.º porque com ela se pretende obter a modificação dum acto jurídico; a modificação consiste na substituição do comprador. Deve, por isso, atender-se ao valor do acto determinado pelo preço”.

Tal valor, conforme consta do n.º 1 do art.º 1410.º, é aquele que os titulares do direito de preferência hão-de depositar como condição do seu exercício, o qual representa e corresponde ainda à utilidade económica do pedido que formulam”.

No Acórdão da Relação de Coimbra de 20/1/2015, processo 360/12.0TBCNF.C1, acessível in dgsi, decidiu-se que “O valor a depositar corresponde ao preço constante do título de transmissão. O "preço devido", a que se refere o artigo 1410.º n.º1 do Código Civil e que deve ser depositado na acção de preferência, respeita à contraprestação paga pelo adquirente ao alienante, ou seja, ao preço devido pela transacção”.

Sendo o preço acordado para a venda um preço global para todos os bens vendidos, o valor a atribuir à causa é o correspondente ao que proporcionalmente competir aos bens objeto da preferência dentro do preço global fixado para a venda conjunta.

Como se decidiu no Acórdão do STJ de 20/6/2013, processo 1043/10.1TVLSB.L1.S1, in dgsi.net, “Por via do disposto no art. 417.º do CC, se o vendedor quiser alienar a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito de preferência ser exercido em relação àquela, pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, salvo se o mesmo já estiver concretamente determinado.”. Mais se acrescenta “Desconhecendo-se o valor de mercado da fracção objecto da preferência, não tendo sido invocada qualquer simulação do preço constante na escritura pública, na falta de dados concretos sobre o estado da mesma fracção, sabendo-se que estava arrendada, razões não há para se lhe atribuir um preço proporcional ao que, no conjunto, foi pago. Devendo aceitar-se como verdadeiro o que a respeito consta na escritura pública de compra e venda”.

Tendo a Autora indicado 5.000,01€, como valor da causa, o Tribunal a quo, que verificou não equivaler o valor indicado à utilidade visada com a demanda e não tendo elementos para fixar o valor, ordenou a realização de arbitramento previsto no artº 309º, do CPC, com vista a determinar o real valor das frações em causa nos autos, bens objeto do direito de preferência, se vendidas separadamente, tendo em vista fixar o valor da ação (e consequentemente determinar o preço a depositar pelo A.), pois que, tal como resulta das contestações apresentadas o valor atribuído às frações na respetiva escritura de venda não corresponde ao seu real valor, outrossim representa um valor atribuído apenas para efeitos fiscais e da elaboração da respetiva escritura, uma vez que se tratou de uma venda conjunta de imóveis pelo valor global de 6.203.722,00€, não representando, de modo algum, o valor em causa, valor de mercado dos imóveis unitariamente e em caso de venda individual. Constatou o Tribunal ser o valor indicado para a causa irrisório (5.001,00 € as 4 fracções) e manifestamente inferior ao respetivo valor patrimonial - de 66.973,76 € - valor esse que, na esmagadora maioria das vezes, se encontra abaixo do valor de mercado dos imóveis.

Considerou o Tribunal a quo que, e sob pena de estarmos a dar cobertura a um exercício abusivo do direito de preferência e a dar seguimento a uma ação em que se mostra depositada uma quantia irrisória para aquisição de quatro frações, quando na verdade, estarão em causa, desde logo, valores muito superiores, ser essencial apurar o valor dos bens.

Ordenou o tribunal a quo a produção de prova por arbitramento, ao abrigo dos art.s 308º e 309º, do CPC, por o mesmo se revelar necessário para apurar o valor, sem o injusto locupletamento (tratando-se de venda conjunta por preço global).
Não correspondendo o valor indicado pela Autora ao preço proporcional, como resulta do expressamente estipulado pelas partes no contrato de compra e venda, não pode o Tribunal, para cumprir o que lhe é imposto, deixar de realizar arbitramento, para o apurar.

Com efeito, revelando já os autos ser o valor indicado pela Autora para a compra dos quatro imóveis irrisório e abusivo - o que é notório e resulta, desde logo, dos valores patrimoniais dos imóveis, sendo que o preço acordado foi para todos os imóveis e em função do globalmente acordado entre as partes - e não fornecendo os elementos necessários à adequada determinação do valor, é essencial o arbitramento, por só ele munir o Tribunal dos indispensáveis elementos a tal.

E, na verdade, “só no caso de os elementos constantes do processo ou outras diligências requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz se mostrarem insuficientes para determinar o valor da causa ou do incidente é que arbitramento, isto é, a perícia, deve ser ordenada.

Não se trata de um poder discricionário do juiz, mas de um poder-dever, que ele só pode deixar de exercer quando aquela diligência probatória se revelar objetivamente desnecessária ou inútil para o fim em causa” (7) (8).
Sendo, in casu, necessário, até para o Tribunal, munido de valores reais de mercado, poder aferir do abuso (notório), da dimensão do locupletamento e de proporcionalidade de preços, nunca será de considerar o arbitramento impertinente nem dilatório.

Assim, em caso de venda conjunta de imóveis por preço global, permitida pelo nº1, do artigo 417º, do Código Civil, pretendendo o preferente exercer o seu direito apenas relativamente a alguns bens integrados no conjunto, o preço será o que efetiva e proporcionalmente lhe competir dentro do preço global fixado para a venda conjunta.

Para a devida determinação de tal proporcionalidade, na falta de provas suficientes, é necessário arbitramento (9), sendo que, para essa determinação e para a do valor da ação de preferência, é útil e necessária a concreta determinação dos valores reais de mercado dos bens objeto da ação, podendo haver necessidade de o alargar aos demais bens objeto da venda conjunta (e com base nas avaliações de todos os bens e no preço global fixado para a dita venda conjunta serem achadas as proporcionalidades).

O arbitramento impõe-se pelo dever de ser fixado valor à causa (pelo Tribunal a quo) havendo, para tal, necessidade de apurar as reais proporcionalidades do preço das frações objeto da presente ação do preço global fixado para a venda conjunta, sendo, para tal, necessário determinar o real valor das frações, se vendidas separadamente.

E, na verdade, prevê o art. 296º, o valor processual da causa e estatui sobre a sua função: determinar a competência do Tribunal (v. nº2), ou seja, in casu, se ela se inscreve na competência do Juízo Local Cível ou do Juízo Central Cível.

Compete aos Juízos Centrais Cíveis a preparação e o julgamento das ações declarativas cíveis de processo comum de valor superior a 50.000 € - artigo 117º, nº1, al. a), da LOSJ -, competindo aos Juízos Locais Cíveis a preparação e o julgamento dos processos relativos a causas não atribuídas a outros juízos ou tribunais – artigo 130º, nº1, da referida lei.

Assim, necessário se mostra determinar o valor real dos imóveis, como bem decidiu o Tribunal a quo - sendo que nada mais foi concretamente decidido senão da necessidade de proceder a arbitramento nos termos do art. 309º, do CPC -, para posterior verificação do valor da causa.

É evidente tratar-se de compra e venda conjunta dos imóveis e de o preço ser global e, atento o acordado e declarado na escritura pública de compra e venda - “a presente compra e venda é feita em conjunto (abrangendo a totalidade dos imóveis identificados no documentos complementar UM) e pelo preço global atrás indicado, não sendo separável sem prejuízo apreciável para o vendedor, sendo que os preços indicados para cada um desses imóveis no documentos complementar UM são atribuídos apenas para efeitos de cumprimento das normas notariais, contabilísticas e fiscais” (cfr fls 33, verso e 34, frente e verso) -, não podem, como bem se decidiu no Acórdão acabado de citar em rodapé (cfr. negrito), ser considerados os valores indicados, atento o acordado, como sendo o preço que proporcionalmente competia aos imóveis objeto dos presentes autos dentro do preço global fixado para a venda conjunta.
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Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pela apelante, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida.
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III. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida.
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Custas pela apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.
Guimarães, 14 de junho de 2018

Eugénia Marinho da Cunha
José Manuel Alves Flores
Sandra Melo


1. Ac. da RL, de 27/5/77, CJ, Ano II, Tomo 3, pág. 641.
2. Salvador da Costa, Os incidentes da instância, 2017, 9ª Edição, Almedina, pág 19-20.
3. Ac. Da Relação do Porto de 23/11/2006, Processo 0636022.dgsi, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª edição Revista e Ampliada, Anotado, 2017, Ediforum, págs 424, 425
4. Ac. da Relação de Guimarães de 28/1/2016, Processo 64/15.2T8MLG-A.G1.dgsi, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª edição Revista e Ampliada, Anotado, 2017, Ediforum, pág 425.
5. Salvador da Costa, Idem, pág 23
6. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1º, 3ª Edição, Coimbra Editora, pág 586.
7. Salvador da Costa, Idem, pág 66
8. Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 31/5/2007:Processo 0732912.dgsi.net, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª edição Revista e Ampliada, Anotado, 2017, Ediforum, pág 437, onde se considerou No incidente de verificação do valor da causa, só deve ser ordenada a produção de prova através de arbitramento quando a mesma se revelar estritamente necessária, quando se mostrarem insuficientes os elementos constantes do processo, quando os elementos da convicção judicativa ainda não constem dos autos. Facultando os autos tais elementos, não há que recorrer a quaisquer diligências, nomeadamente à do arbitramento.
9. Cfr. Acórdão do STJ de 1/7/2014, Proc. 599/11.6TVPRT.P2.S1, in dgsi.net , relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, onde se considerou Decorre do art. 417º, nº1, do Código Civil que o obrigado à preferência tem direito a vender a coisa sobre que incide um direito de preferência conjuntamente com outras e por um preço global; neste caso o titular/preferente não interessado na opção pela aquisição do conjunto a vender pode exercer o seu direito pelo preço que proporcionalmente for atribuído; o obrigado à preferência só pode opor-se a esta pretensão de “divisão proporcional do preço”, exigindo que a preferência incida sobre as coisas restantes “se estas não forem separáveis sem prejuízo apreciável”. Quando o preferente acede a exercer o seu direito sobre o conjunto de coisas a alienar – art. 417º do Código Civil – vê estendido o seu original direito de preferência, direito esse que pode exercer facultativamente. O direito a exercer a preferência pelo preço proporcional pode ser paralisado pela invocação/exigência dos obrigados à preferência de que a venda seja global, porque a venda parcelar e o inerente preço proporcional, lhe causam prejuízo apreciável, não sendo as coisas pretendidas vender separáveis; a lei visa a protecção do interesse económico do vendedor. Não aceitando o preferente a aquisição conjunta de bens comunicada pelo obrigado à preferência, além daquele sobre que recai o seu direito, não estando o obrigado à preferência vinculado a discriminar o preço de cada coisa integrante do conjunto, assiste ao preferente parcelar, mesmo em caso de notificação extrajudicial, requerer arbitramento judicial para determinar o valor proporcional e assim exercer o direito de prelação, não sendo de afastar por analogia a aplicação do regime jurídico do art.1459º (preferência limitada) do Código de Processo Civil e o recurso à acção de suprimento prevista no art. 1429.º daquele diploma. A menção discriminada dos preços dos imóveis vendidos em conjunto, constante da escritura pública de compra e venda resulta, obrigatoriamente, do art. 63º do Código do Notariado que impõe que nos actos sujeitos a registo predial, a indicação “do valor de cada prédio, da parte indivisa ou do direito a que o acto respeitar (negrito nosso). Aí doutamente se analisa o que dada a pertinência para o enquadramento jurídico do caso caso se cita Importa, então, analisar este regime jurídico para saber como pode o titular da preferência defender o seu direito de prelação.Acerca do art. 417º do Código Civil, Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, págs. 369 e 370, ensina:“…Na primeira, não sendo justo agravar os pressupostos da preferência fixados no pacto, concede-se ao respectivo titular faculdade de restringir o seu direito à coisa a que o pacto se refere, reduzindo o preço devido à importância que proporcionalmente corresponde a essa coisa dentro do preço global estabelecido; na falta de acordo sobre tal determinação, haverá que recorrer à acção de arbitramento necessária para fixar o valor proporcional da coisa. [a faculdade concedida ao obrigado à preferência só vale, porém, para a hipótese de se ter fixado um preço global para a alienação conjunta e não (como pretende Vaz Serra, na anotação ao Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-11-1966, na RLJ, 100. °-167 e segs.) para o caso de alienação conjunta de várias coisas, mas com discriminação do preço de cada uma delas. Também se nos afigura contrária à lei a tese, sustentada na RLJ, 100.°-171), de que seria o adquirente (e não o alienante) quem pode exigir que a preferência se estenda, neste caso, às coisas restantes – nota de rodapé)]. O obrigado pode, contudo, opor-se à separação das coisas, se ela envolver um prejuízo apreciável para os seus interesses; nesse caso, o titular da preferência terá de exercer o seu direito, se o não quiser perder, relativamente ao conjunto das coisas alienadas, pelo preço global que houver sido fixado (…).”O Professor Agostinho Cardoso Guedes, in “O Exercício do Direito de Preferência” – págs. 402 a 407, aborda a problemática do âmbito da preferência na venda da coisa conjuntamente com outras, depois de referir que o art. 417º do Código Civil derroga regras gerais do instituto do direitos de preferência (antes referira os arts. 1409º - direito de preferência do comproprietário - e 2130º preferência dos co-herdeiros na venda ou dação em cumprimento a terceiros do quinhão hereditário) – afirma “que outra derrogação a essas regras gerais encontra-se no art.417º do Código Civil”, escrevendo:“ […] Na situação de facto descrita, a lei permite ao preferente o exercício do direito em relação ao negócio efectivamente ajustado com o terceiro abrangendo, além da coisa sujeita a prelação, todas as outras incluídas nesse negócio – a lei alarga o âmbito primitivo do direito de preferir por mero efeito da decisão do sujeito passivo em alienar o bem naquelas condições.No caso de o preferente não exercer o seu direito nestes termos e, ao invés, pretender exercer a faculdade de reduzir esse preço ao bem efectivamente sujeito à prelação, a lei atribui ao sujeito passivo a possibilidade de se opor ao exercício de tal faculdade, restando ao preferente a celebração do nas condições ajustadas com o terceiro, sem separação das coisas, desde que esta separação não seja possível sem prejuízo apreciável.Em ambas as hipóteses, a lei introduz um desvio importante à regra de que o direito do preferente se refere apenas ao bem (e ao contrato) objecto da preferência, pois verificada a decisão do sujeito passivo de vender a coisa objecto da preferência juntamente com outras, o direito de preferência passa a abranger outros bens além do inicialmente sujeito à prelação, e o seu exercício relativamente apenas a este bem poderá mesmo ser precludido no caso de esta, em virtude da necessária separação, provocar prejuízo apreciável. Esta solução legal merece algumas considerações, relativas quer ao âmbito de aplicação da norma, quer ao seu regime jurídico. O primeiro dado a ter em conta é que o art. 417º do Código Civil não se aplica a todos os casos em que o vinculado à preferência decida alienar o bem objecto da preferência em conjunto com outro ou outros bens; a aplicação daquela norma só se verificará no caso de esta alienação ser decidida pelo vinculado à preferência por um preço global.De facto, não se colocará nenhum problema especial relativo ao exercício da preferência na eventualidade do sujeito passivo decidir vender um conjunto de bens, neles incluindo a coisa sujeita à prelação, cada um por determinado preço […] o art. 417º só intervirá se o vinculado à preferência decidir alienar o bem objecto da mesma em conjunto com outros bens por um preço global, isto é um preço que não resulta da mera soma de vários preços individuais mas, pelo contrário, traduz uma contrapartida única por aquele conjunto de bens.”É eficaz – por preencher os requisitos do art. 416º do Código Civil – a comunicação ao titular do direito de preferência do “projecto de venda”, deixando os obrigados à preferência, inequivocamente expresso, que só venderão, em conjunto e por um preço global que indicam, a coisa objecto da preferência, com outras, por a separação lhes causar prejuízo apreciável.(…) “ […] Estamos, por isso, de acordo com Antunes Varela, quando este afirma que o preferente tem a faculdade “de restringir o seu direito à coisa a que o pacto se refere, reduzindo o preço devido à importância que proporcionalmente corresponde a essa coisa dentro do preço global estabelecido; na falta de acordo sobre tal determinação, haverá que recorrer à acção arbitramento necessária para fixar o valor proporcional da coisa.” Não aceitando o preferente a aquisição conjunta de bens, comunicada pelo obrigado à preferência, além daquele sobre que recai o seu direito, não estando o obrigado à preferência adstrito a discriminar o preço de cada coisa integrante do conjunto, assiste ao preferente parcelar, mesmo em caso de notificação extrajudicial, o direito de requerer arbitramento judicial para determinar o valor proporcional e assim exercer o direito de prelação com o âmbito inicial, não sendo de afastar por analogia a aplicação do regime jurídico do art.1459º (preferência limitada) do Código de Processo Civil, nos termos da acção de suprimento prevista no art. 1429.º deste diploma. Assim se sentenciou no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 16.3.2011, Proc. 1113/06.0TBPVZ: P1. S1., in www.dgsi.pt “I – Ao exigir a comunicação do projecto da venda e das cláusulas do respectivo negócio – cf. art. 416.º, n.º1, do Código Civil –, pretende-se levar ao conhecimento do preferente os elementos essenciais do contrato, ou seja, aqueles que lhe permitam, e sejam decisivos, para determinar a sua vontade de exercer ou não o direito de preferência. II – Decorre do art. 417.º, n.º1, do Código Civil, que é lícito ao obrigado à preferência vender a coisa objecto da preferência juntamente com outra (ou outras) por um preço global (haja ou não prejuízo), mas, se for essa a sua pretensão comunicada ao titular da preferência, este, por sua vez, pode exercer o direito apenas em relação àquela que é objecto do direito, pelo preço que proporcionalmente lhe competir dentro do preço global fixado para a venda conjunta. III – No caso concreto, se os réus pretendiam vender dois prédios conjuntamente e tinham comprador para eles, pelo preço de € 500 000, e foi esse o projecto concreto que comunicaram ao autor marido, concedendo-lhe a preferência nessas condições, não tinham que discriminar os preços de cada um dos prédios que pretendiam alienar, exactamente porque queriam vendê-los por um preço global (como a lei lhes faculta), nem tinham que alegar que lhes adviria prejuízo se os vendessem separadamente. IV – Tendo o autor marido sido notificado para exercer o direito de preferência, no prazo de 8 dias – prazo que se refere à declaração de preferência e não à concretização do negócio –, competia-lhe declarar que pretendia preferir ou no conjunto e pelo preço global proposto, ou apenas em relação ao prédio de que é arrendatário (objecto do seu direito de preferência). Nesta última hipótese, devia requerer ao tribunal a determinação do preço que competiria proporcionalmente ao arrendado, nos termos da acção de suprimento prevista no art. 1429.º do Código de Processo Civil, por aplicação do art. 1459.º do mesmo Código, apesar da notificação ter sido efectuada extrajudicialmente”. (relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Moreira Alves) (…) A menção discriminada do preço dos imóveis vendidos em conjunto resulta, obrigatoriamente, do art. 63º do Código do Notariado que impõe que, nos actos sujeitos a registo predial, a indicação “do valor de cada prédio, da parte indivisa ou do direito a que o acto respeitar”. Como refere Agostinho Guedes, in “O Exercício do Direito de Preferência”, págs. 403/404; “Ora, é por demais evidente que este dispositivo legal não pode impedir a aplicação do art. 417º do Código Civil, aos casos de venda de prédio sujeito a preferência em conjunto com outros bens, móveis ou imóveis, por preço global. Assim, se o vinculado à preferência decide celebrar um contrato nestes termos e realiza a comunicação devida ao preferente, indicando o respectivo preço global, sem que aquele exerça o seu direito, não poderá o mesmo preferente recorrer à acção prevista no art. 1410.° do Código Civil com vista a obter para si o bem alienado alegando o valor atribuído prédio na escritura pública de venda em cumprimento do acima aludido art. 63.° do Código do Notariado.”. Neste sentido o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 9.3.1978 – Proc.067034, in www.dgsi.pt. (negrito nosso).