Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1792/11.7TBVRL.G1
Relator: AFONSO CABRAL DE ANDRADE
Descritores: PROCESSO DE EXPROPRIAÇÃO
PROVA PERICIAL
JUSTA INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/27/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1. Nos processos de expropriação a prova pericial assume uma importância central, pois as perguntas a que importa responder exigem conhecimentos técnicos altamente especializados, que o Julgador, por natureza, não domina.

2. Existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz conhecimentos técnicos que lhe permitam aferir qual deles é o mais correcto, deve aderir ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal, uma vez que estes, não tendo sido indicados pelas partes, oferecem mais garantias de isenção e imparcialidade.

3. O conceito de “solo apto para construção” não é um conceito fáctico: é um conceito normativo, traduzindo-se acima de tudo, numa questão de interpretação e qualificação jurídica.

4. O acto de expropriação, que se impõe ao proprietário de forma absoluta e incontornável, não lhe retira apenas o seu direito de propriedade. Retira-lhe igualmente a faculdade de escolher o momento em que seria do seu interesse transaccionar o seu prédio. Esse momento é-lhe imposto por força da lei, e acto administrativo. Daí que, na determinação da justa indemnização, qualquer visão que se prenda excessivamente ao momento do acto expropriativo, e feche os olhos a alguma forma de previsibilidade futura, corre o risco de ser prejudicial ao expropriado, e logo injusta.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- Relatório

Nos presentes autos de expropriação, é expropriante Auto-Estradas Y - Subconcessionária, SA. e expropriados Maria, Manuel, Isabel, José, Teresa e Francisco.

Por despacho de 11/11/2009 do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e Comunicações, publicado em suplemento do D.R. - II série, nº 226 de 20/11/2009, foi declarada a utilidade pública de uma parcela de terreno por ser necessária às obras de construção da A4/IP4 – Vila Real (Parada de Cunhos/Quintanilha – lote 1 – Vila Real (Parada de Cunhos)/Vila Real Nascente e consequentemente autorizada a posse administrativa de tal parcela, a saber:

- parcela de terreno nº 102, com a área de 10.377 m2, a destacar do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (...) da freguesia de (...) e omisso na Conservatória do Registo Predial, parcela essa que confronta a norte com parcela sobrante, sul com parcela sobrante e outros, nascente com caminho e poente com Afonso e outros.

Foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam e, 15.12.2009 (fls. 99).
Em 01/04/2010 (fls. 59) a entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela.
Procedeu-se à arbitragem perante a entidade expropriante, tendo os árbitros, por unanimidade, atribuído à parcela expropriada o valor de 287.396,23 euros.

Remetido o processo a Tribunal e efectuado o depósito da indemnização arbitrada, foi adjudicada à entidade expropriante a propriedade da sobredita parcela, tendo igualmente sido ordenada a notificação da decisão arbitral, e foi interposto recurso da decisão arbitral por parte da expropriante, por não se conformar com o valor da indemnização fixada pelos árbitros.

Foi ainda interposto recurso da decisão arbitral pelos expropriados Manuel e Maria.

Foi realizada peritagem, tendo os peritos do Tribunal e dos expropriados fixado a quantia de € 322.242,05 euros como a justa indemnização a atribuir aos expropriados e o perito da expropriante fixado tal valor em € 207.292,64.

A final foi proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os recursos interpostos pela expropriante e pelos expropriados, e em consequência fixou em € 322.242,05 o montante da indemnização a pagar pela entidade expropriante aos expropriados pela parcela objecto da presente expropriação, valor a ser actualizado à data da decisão final de acordo com o índice dos preços no consumidor.

Inconformados com esta decisão, os EXPROPRIADOS nos presentes autos vieram interpor recurso, que foi admitido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Terminam as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões:


I- Nas suas alegações de recurso de arbitragem, os expropriados Maria e outros delimitaram, com as conclusões aí contidas, o âmbito do seu recurso da decisão arbitral.
II- Sobre as mesmas a douta sentença tinha a obrigação legal de se pronunciar, só o fazendo em relação às conclusões I e II.
III- O que inevitavelmente conduz à nulidade da douta sentença recorrida, desde logo por omissão de pronúncia, pelo facto da Meritíssima Juiz a quo deixar de se pronunciar sobre questões que deveria apreciar, conforme imperativamente prescreve o normativo contido na d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.
IV- Pretendendo os Apelantes que este Venerando Tribunal da Relação venha agora a pronunciar-se sobre as conclusões em falta, quais sejam:
V- A vinculação aos parâmetros urbanísticos devidos em conformidade com o próprio regulamento do PDM então vigente e da Lei, deverá constituir obviamente matéria de apreciação jurídica por parte do julgador in caso, agora Vossas Excelências, no âmbito do presente recurso de Apelação.
VI- O art. 20º, nº 3 do PDM define três níveis : U1, índice de utilização máximo 1,2; U2 índice de utilização máximo 0,7; U3 índice de utilização máximo 0,5. A parcela em apreço insere-se no nível U1. Se para a área em questão fosse considerado excessivo um índice superior a 0,6, aquela área seria enquadrada no nível U2, e não no U1.
VII- Em sede de esclarecimento os peritos declaram não estar de posse de nenhum elemento que obstasse a que fosse permitida a construção com índice de 1,2.
VIII- É, salvo o devido respeito, um rotundo disparate fazer depender do poder discricionário da Câmara, ou o que é mais ridículo, dos seus “Serviços de Urbanização”,
a aprovação de projectos com índices de utilização do solo ou COS como bem lhes aprouver, in casu, dentro do limite máximo de 1,2m2/m2 previsto para a classe de solos “espaço urbano”, categoria de aglomerado urbano U1 que o RPDM de Vila Real então disciplinava, enquanto enquadramento legal urbanístico para o local, como o conclui a douta sentença recorrida, por força da posição tomada pelo relatório maioritário dos senhores peritos.
IX- Sendo o PDM, seu regulamento e planta de condicionantes, o único instrumento de gestão territorial aplicável ao local, qualquer proprietário do prédio de que a parcela expropriada é destacada tinha toda a possibilidade de apresentar um projecto de licenciamento de obra nova a implantar nesse mesmo prédio, verificadas as demais condicionantes legais, em que apresentasse um projecto de arquitectura que tivesse um uso do solo no que concerne ao seu índice de utilização ou COS de 1,2m2/m2, sem que o seu licenciamento estivesse dependente da “boa vontade” dos ditos serviços camarários.
X- Conforme ponto 5.2 do Laudo Maioritário dos peritos, à data da DUP a parcela
(expropriada) encontrava-se desimpedida de quaisquer outras construções, pelo que, para efeitos de cálculo do valor do solo expropriado, este deve ser determinado em função da potencialidade construtiva;
XI- Da sub parcela Nascente Marginal (5.5 do laudo) bastará pelo que dissemos em “A -DA ADOPÇÃO DE UM ÍNDICE DE OCUPAÇÃO DO SOLO DE 0,6 M2/M2 PARA A SUB PARCELA SITUADA NOS “WW – U1 – VILA REAL” corrigir o COS usado para o cálculo dessa sub parcela de 0,6m2/m2 para 1,2/m2/m2 para obtermos a determinação do justo valor para essa sub parcela;
XII- Assim, refazendo os cálculos, apenas e tão só a adopção dum COS de 1,2m2/m2 o valor da sub – parcela nascente Marginal é de € 368.318,10;
XIII- Quanto à avaliação da sub parcela Nascente Interior, além da alteração do COS deverá ser retirado o factor de 5% na avaliação do laudo, nos termos do n.º 10 do art.º 26º do CE, mantendo o factor de dedução de 30% aplicado nos seus cálculos, ainda que o achemos, como deixamos dito, exagerado.
XIV- Assim, refazendo também os cálculos, o valor da sub parcela nascente interior será de € 173.643,20;
XV- Quanto à sub parcela poente e, de acordo com o nº 7 do art.º do RPDM e reconhecido pelos senhores peritos estarem preenchidos todos os seus pressupostos e requisitos para avaliação dessa sub parcela poente como tal, aceitam, em resposta aos esclarecimentos solicitados ao quesito 21º, que igualmente poderia ser avaliada como destinada à construção de grande superfície, sendo que igualmente reconhecem que, como lhes foi colocado, dada a cércea permitida de 8,5 m e a mesma área de implantação de 30% da área da sub parcela, a área de construção possível seria substancialmente superior, com a construção com cave, r/c e 1º andar e com um custo de construção no cômputo de cálculo superior;
XVI- Assim sendo, tal como os Senhores peritos, também os expropriados consideram a possibilidade de construção de dois pisos acima da cota de soleira, que destinam a comércio, e, para servir os mesmos, prevêem a construção de um parque de estacionamento em cave;
XVII- Pelo que, satisfeitos os condicionalismos urbanísticos previstos nas alíneas e) e f) se justifica, como aproveitamento possível para superfície comercial, as referidas áreas de implantação em r/c, 1º andar e em cave para estacionamento de viaturas de apoio ao cento comercial, conforme os índices de implantação por piso correspondentes à área de implantação para cada um deles, tal qual os senhores peritos tinham calculado;
XVIII- E, quanto ao parâmetro urbanístico do custo de construção para comércio, a ter em consideração nos termos do n.º 5 do art.º 26º do CE para avaliação dessa mesma parcela, em audiência oral os senhores peritos respaldam-se no CIMI bem expresso, manifestamente exorbitante, por excessivo, para tentarem adequar o custo da construção para habitação ao uso para comércio ou serviços;
XIX- Ora, a adaptação do CIMI ao caso vertente só poderá ocorrer por vinculação ao supra citado n.º 5 do art.º 26 do CE. Isto é, não pode ser tomado um valor que está 254,28 € abaixo do que o C.E. impõe e torna-se até incompreensível que para a designada Sub Parcela Poente os Senhores Peritos abandonem o regime do preço por metro quadrado de habitação a custos controlados ou de renda condicionada e optem pelo regime do preço por metro quadrado de construção para habitação para fins de apuramento do imposto municipal sobre imóveis;
XX- Pelo que este cálculo terá que ser refeito nos seguintes termos: 741,48x 0,8 (coeficiente de afectação para comércio e serviços em construção tipo industrial) x 0,85 (conversão em área útil) = 504, 21€/m2;
XXI- Tal custo, mesmo assim abaixo do de referência, parece-nos o legalmente adequado ao cálculo do valor do solo, tendo em conta o disposto no nº 5 do art. 26º do CE;
XXII- Quanto ao reforço de infra-estruturas nos termos do nº 9 do art.º 26º do CE, a manutenção dos 30%, como a inexistência do factor correctivo pela ausência de risco nos termos do seu nº 10, mutatis mutandis a argumentação de facto et de jure que vertemos para a Sub parcela Nascente Interior;
XXIII- Refazendo os cálculos e de acordo com estes mesmos parâmetros urbanísticos, o valor da sub parcela poente será de 339.337,78 €;
XXIV- Devendo ser fixado a final, com base no laudo maioritário dos quatro peritos (os três indicados pelo Tribunal e a dos expropriados) e corrigidos os parâmetros urbanísticos do modo supra indicado, em conformidade com o Regulamento do PDM então vigente e a lei, como justa indemnização devida para a parcela expropriada, o valor em euros de 881.299,08 €, como é de Direito e Justiça.
XXV- Pretender sustentar-se, como o faz o relatório maioritário dos peritos e a douta sentença recorrida, no princípio da razoabilidade para a determinação do índice de 0,6m2/m2 (índice médio em relação ao máximo previsto para o local de 1,2m2/m2) expressamente constitui de jure uma violação do n.º 1 do art.º 26º do C.E. que, enquanto critério legal na determinação do cálculo do valor do solo apto para construção, imperativamente estatui que tal valor se calcula por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito à expropriação, de acordo obviamente com as leis e regulamentos em vigor. Sendo que o COS ou IU são determinantes para o cálculo da construção possível que, de acordo com o n.º 3 do art.º 20º do RPDM aplicável à situação sub facto et jure é de 1,2m2/m2.
XXVI- Ao fazê-lo, a douta sentença recorrida, violando o nº 3 do art. 20º do RPDM, o n.º 1 do art.º 26º e, consequentemente o art.º 23º nº 1 e art.º 62º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, não prossegue o desiderato constitucional e legal da justa indemnização.

AUTO-ESTRADAS Y – SUBCONCESSIONÁRIA, S.A., entidade expropriante, igualmente não se conformando com a sentença proferida nos autos, veio, nos termos e para os efeitos do artigo 633º,2 CPC, apresentar recurso subordinado da mesma para este Tribunal da Relação de Guimarães, que foi igualmente admitido.

Termina esse recurso com a formulação das seguintes conclusões:

1ª. o “jus aedificandi" só deve considerar-se factor de valoração dos solos nas situações em que os respectivos bens possuam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa, só então integrando o núcleo do direito de propriedade privada, porquanto as faculdades de urbanizar, lotear e edificar não decorrem directamente do direito de propriedade do solo, sendo, antes, um poder que acresce à esfera jurídica do proprietário, nos termos definidos pelas normas jurídico-urbanísticas” (neste sentido, v. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 18/09/2008 no proc. n.º 4233/08, in www.dgsi.pt).
2ª. Dispõe o artigo 14.º do Regulamento do PDM de Vila Real, aprovado por Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/93, de 7/10/1993, que os espaços agrícolas destinam-se “predominantemente às actividades agrícolas e pecuárias, englobando ainda áreas que apresentam, através de acções de recuperação ou reconversão, potencialidades de futura utilização agrícola.”
3ª. A consideração da capacidade edificativa de um solo tem de ter subjacente a certeza de que tal solo tem de facto capacidade edificativa ou condições para a adquirir, o que, como resulta claro do regime de utilização do solo previsto no PDM de Vila Real, não se verifica no caso da subparcela Poente, contrariamente ao defendido na sentença
recorrida (neste sentido v., a título exemplificativo, Acórdão proferido em 07/02/2011, no proc. n.º 549/08.7TBVLC.P1, in www.dgsi.pt).
4ª. O Tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao, aderindo ao laudo pericial maioritário, contabilizar no cálculo da indemnização a capacidade edificativa da subparcela Poente, já que não existia à data da DUP qualquer expectativa séria de que a mesma viesse a ser edificada, atenta a sua aptidão natural resultante da integração no PDM de Vila Real em Espaços Agrícolas, violando, consequentemente, de forma manifesta, o princípio da justa indemnização.
5ª. “só os solos que se encontram em zonas classificadas como zonas urbanas ou urbanizáveis, por instrumento de gestão territorial, devem, por regra, ser classificados e, pois, valorizados como solos aptos para construção” – cfr., por todos, o Ac. Trib. Rel. do Porto, de 07/15/2009, no Proc. nº 7142/07.0TBVNG.P1, in www.dgsi.pt.
6ª. O solo da subparcela Poente, não dispondo objectivamente de qualquer capacidade edificativa, não poderia em nenhum caso, ser avaliado em função de uma potencial e incerta capacidade edificativa, sob pena de violação dos artigos 25.º do CE e 26.º do PDM de Vila Real e dos princípios da igualdade e da justa indemnização.
7ª. Ao avaliar a subparcela Poente em função da sua capacidade edificativa, o Tribunal a quo incorre em errada interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis, em particular dos artigos 23.º, n.º 1 e 25.º do CE e 14.º do PDM de Vila Real.
8.ª O Tribunal a quo incorre em erro de julgamento por violação dos critérios legais de cálculo do solo apto para construção ao dividir a subparcela nascente em função da proximidade ao arruamento com o qual confronta, já que nenhuma disposição legal admite tal divisão.
9ª. Não existindo quaisquer infra-estruturas urbanísticas na subparcela nascente, à data da DUP, mas apenas no arruamento com o qual aquela confronta, sendo, por isso, necessárias obras de infra-estruturação para qualquer edificação que se pretendesse edificar em tal parcela, tanto mais se a mesma fosse, como gizado pelos Senhores Peritos, objecto de uma operação de loteamento, deveriam os Senhores Peritos ter considerado, para efeitos do artigo 26.º, n.º 9 do CE, a percentagem de 30% a toda a extensão de tal subparcela.
10ª. Em processo de expropriação, a força probatória do laudo pericial só abrange a percepção e a valoração técnica dos factos, não se estendendo aos juízos jurídicos que a lei reserva ao julgador” – Ac. RG de 4/10/2007, proferido no Proc. n.º 1565/07-1; negrito e sublinhado nossos.
11ª. O estrito cumprimento dos artigos 23.º, n.º 1, 25.º e 29.º do CE e 14.º do PDM de Vila Real implica a ponderação de conceitos que, embora assentes em pressupostos que são também técnicos, reconduz-se a uma reflexão eminentemente jurídica que, como tal, pode e deve ser sindicada pelo tribunal, sob pena de violação do princípio da justa indemnização.
12ª. Atendendo ao errado raciocínio constante do laudo maioritário, podia e devia o tribunal a quo ter-se afastado dele, por se encontrarem preenchidos os pressupostos legais para o efeito.
13ª. Constatando-se que o laudo minoritário avalia correctamente o valor do solo expropriado e não existindo qualquer outro elemento de prova nos autos que conteste a avaliação que no mesmo é feita, deverá a indemnização fixada na sentença recorrida ser corrigida em função dos parâmetros e métodos de cálculo fixados naquele relatório, fixando-se o justo montante indemnizatório a atribuir aos expropriados em não mais do que € 207.292,64.

Vieram os Expropriados apresentar contra-alegações, em resposta ao recurso subordinado apresentado pela Expropriante, findando com as seguintes conclusões:

a) A parcela expropriada deve ser avaliada, no seu todo, incluindo a designada pelos senhores peritos, como subparcela ponte com 6262 m2, conforme números 4 e 5 do Relatório de peritagem, “como solo apto para construção”, de acordo com a metodologia e conforme o fez, quanto à classificação do solo adoptado pelo maioritário dos quatro peritos – os do tribunal e a dos expropriados;
b) Tal fundamentação de facto e de direito foi sustentada na douta sentença recorrida a folhas 14 e 15 ab initio, que fez sua a própria fundamentação dos expropriados contida na petição do recurso de arbitragem e suas alegações;
c) Infirmando a já aí vertida fundamentação em contrário da expropriante que também, como agora, argumentara que essa subparcela poente deveria ser avaliada “como solo para outros fins;
d) Como é pacífico na Jurisprudência, a conclusão de que certo solo é apto para construção não pode ser conseguida através do recurso a um critério abstracto de aptidão edificativa, já que teoricamente todo o solo incluído ou integrado em prédios rústicos é passível de edificação, mas antes mediante um critério concreto de potencialidade edificativa;
e) Neste enquadramento, são classificados como solos aptos para construção os que, na realidade, apresentem condições materiais e jurídicas para neles se construir;
f) O que é manifestamente o caso;
g) Desde logo a factualidade dada como provada em sede de arbitragem permite-nos concluir que do ponto de vista material ou físico, o prédio no seu todo contém o critério objectivo de edificabilidade constante na al. a) do nº 2 do art.º 25º do CE, ou seja, dispõe de todas as infra-estruturas como acesso rodoviário, rede de abastecimento de água, energia eléctrica e de saneamento com características adequadas a nele construir. Veja-se a descrição e localização da parcela constante do nº 2 ponto 1 do relatório da arbitragem, em que a mesma é localizada a poente da estrada de ligação de Vila Nova a Torneiros, com uma frente para essa estrada de 55 metros, distando a sua extrema sul dessa frente cerca de 45 metros da estrada nacional nº 313;
h) E se não nos atermos apenas à parcela expropriada, mas ao prédio no seu todo da qual a mesma é destacada, o mesmo prédio tem igualmente frente para a estrada nacional nº 313, que constitui um eixo viário estruturante todo ele urbanizado que liga a cidade de Vila Real à zona industrial do concelho. No seu curso encontra-se a Universidade de Trás-os-Montes e diversos equipamentos desportivos, aeródromo e zona industrial a poucas centenas de metros;
i) Igualmente estão preenchidas as condições jurídicas para que no prédio no seu todo e na parcela expropriada em particular, o bem expropriado possa ser classificado “como apto para construção”;
j) Podendo-se concluir pela inexistência dos invocados erros de julgamento, assacados à douta sentença recorrida, no seu recurso subordinado de apelação pela expropriante;
k) Questão diferente é a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia ou revogação da mesma por inquinada por vício de violação de lei, nos termos e com os fundamentos do nosso recurso principal de Apelação que o recorrente subordinado nem sequer ousou contra-argumentar.

II
As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635.º n.º 3 e 639.º n.os 1 e 3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando a natureza jurídica da matéria versada, as questões a decidir consistem em saber:

a) Se existe nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
b) Se a sentença encontrou o valor de indemnização justo;

III
A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos, com relevo para a decisão e que emergem do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam, do laudo dos peritos e dos documentos juntos aos autos:

1. Por despacho de 11/11/2009 do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e Comunicações, publicado em suplemento do D.R. - II série, nº 226 de 20/11/2009, foi declarada a utilidade pública de uma parcela de terreno por ser necessária às obras de construção da A4/IP4 – Vila Real (Parada de Cunhos/Quintanilha – lote 1 – Vila Real (Parada de Cunhos) / Vila Real Nascente e consequentemente autorizada a posse administrativa de tal parcela com o número 102.
2. Estava prevista uma expropriação de 22.344 m2, dividida por diversas ocupações culturais e tipologias de solo.
3. Posteriormente, em consequência de uma proposta dos expropriados, aceite pela Câmara Municipal e pela entidade expropriante, e aprovada pela EP, Estradas de Portugal, SA, por despacho do vogal do Conselho de Administração de 9 de Março de 2011, foi efectuada uma alteração do traçado da via, desviando-se para sul do traçado inicialmente previsto, o que implicou uma redução de área na parcela de 11.967 m2, passando a área a expropriar a ser de 10.377 m2.
4. A parcela em causa, com a área de 10.377 m2, a destacar do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (...) da freguesia de (...) e omisso na Conservatória do Registo Predial, confronta a norte com parcela sobrante, sul com parcela sobrante e outros, nascente numa extensão aproximada de 55 m, com a estrada de ligação Vila Nova a Torneiros, distando a extrema Sul cerca de 45m da EN 313 e poente com Afonso e outros.
5. O prédio original confronta com a Estrada de ligação Vila Nova/Torneiros e a sul com a EN 313 (parcela sobrante sul).
6. A parcela sobrante norte confronta no seu limite nascente com a estrada de ligação Vila Nova/Torneiros.
7. A expropriação origina duas parcelas sobrantes, uma a norte e outra a sul.
8. As partes sobrantes apresentam grandes dimensões e a mesma qualidade de acessos, permitindo a continuação das produções existentes na propriedade.
9. A parcela é constituída por duas subparcelas separadas, tendo a que está mais a nascente uma configuração quase triangular e a outra, mais a poente uma configuração irregular.
10. Da vistoria complementar consta o seguinte:

“ A parcela a expropriar tem a área de 10.377 m2 (Dez mil trezentos e setenta e sete metros quadrados), divididos por diversas ocupações culturais e tipologias de solo como a seguir se descreve:
1- Zona de confrontação com a estrada, a nascente da parcela a expropriar, com a área de 3.592 m2;
Composta por solos franco-arenosos, de boa profundidade e com ligeira inclinação no sentido Nascente/Poente.
A ocupação cultural desta área é florestal com árvores dispersas a compassos irregulares, que em média se pode estimar em cerca de 10 x 10 metros.
Esta zona é limitada pela estrada a nascente da parcela a expropriar e a nascente pela estaca 297, formando uma subparcela de configuração quase triangular.
2- Na continuação da zona identificada anteriormente, encontra-se um olival ocupando uma área de 704 m2. (Esta área passou a devolver, a não incluir na parcela, pelo que sendo a área inicial de 1054 m2 a área abrangida pela expropriação passou a 350 m2).
Trata-se de uma zona plana de solos com boa fertilidade, predominando o regadio com oliveiras dispersas.
São afectadas pela expropriação seis oliveiras de pequeno porte.
3- Zona caracterizada por terreno de cultura de regadio, com boa profundidade e fertilidade. Esta parcela ocupa uma área de 135 m2.
4 e 5 – Zonas a lameiro e vinha que deixaram de ser afectadas pela expropriação.

Na parte Poente/Sul do prédio há a considerar 3 partes assim descritas na VAPRM: A partir desta zona a parcela expropriada é ocupada por terrenos de floresta com características diversas.
O solo apresenta características agrícolas, nomeadamente pela exigência de antigos socalcos, com disponibilidade de água nas zonas mais baixas da parcela.
São identificadas três zonas de acordo com a tipologia de ocupação florestal verificada:

A) A primeira zona, com uma área de 157 m2. Nesta zona a ocupação florestal é a seguinte:
80% de pinheiros de porte médio
10% de Medronheiros de porte médio
10% de Carvalhos de porte grande
B) Zona contigua à anterior, ocupando uma área de 2.306 m2. Nesta zona a ocupação florestal é a seguinte:
90% de Carvalhos de porte grande
10% de Pinheiros de porte médio
1 sobreiro de porte grande
C) Zona contígua à anterior e delimitada a norte pelo estremo da parcela, com uma área de 3.837 m2, ocupada por um pinhal com alguns carvalhos e medronheiros dispersos. Esta zona mantém a mesma área da inicialmente prevista.”

11. O prédio dista, em linha recta, aproximadamente 1,3 km da UTAD, 1,5 km da estação de correios (Araucária), Serviço de Finanças (Araucária) e centro comercial (Dolce Vita Douro), e é praticamente contígua das unidades industriais mais próximas, que se localizam junto da rotunda que dá acesso para a A4.
12. O acesso ao prédio era feito a Sul pela EN 313 e a nascente pela estrada que liga Vila Nova a Torneiros.
13. A área envolvente é de natureza agro-florestal, verificando-se a ocupação da envolvente com povoamentos dispersos de pinheiro bravo explorados em regime de alto fuste e pequenas explorações agrícolas familiares cujas produções são para consumo próprio e de natureza industrial, uma vez que fica no anel periférico da Zona Industrial de Vila Real.
14. Verifica-se ainda a existência de moradias na envolvente próxima e edifícios multifamiliares nomeadamente junto da EN 313.
15. De acordo com o PDM de Vila Real ratificado pela resolução do Conselho de Ministros nº 63/93 de 8 de Novembro, em vigor à data da DUP, a parcela 102 encontrava-se classificada nos seguintes termos: 4.075 m2 como “WW – U1- Vila Real”, correspondente à zona que confronta com a estrada a nascente e 6262 m2 como “Espaços Agrícolas não Incluídos na RAN”, correspondente à restante zona da parcela.
16. O prédio de onde a parcela é destacada confronta com a Estrada nº 313, que dispõe de rede de gás, e que dista apenas 45 m da subparcela poente.
17. A subparcela nascente confronta com uma rua com cerca de 5 metros de largura, composta por bermas e faixa de rodagem, com pavimento betuminoso e redes de energia eléctrica, iluminação pública, abastecimento de água, saneamento ligado a ETAR e telefone.
18. A parcela em causa dispõe das seguintes infra-estruturas:
-Estrada pavimentada a betuminoso;
-Rede de abastecimento de água;
-Rede de saneamento e respectiva ligação a estação depuradora;
-Rede de distribuição de energia eléctrica e iluminação pública;
-Rede telefónica;
-Rede de gás.
19. A última avaliação fiscal realizada ao prédio de onde é destacada a parcela 102, determinada em 2010, fixou o valor patrimonial de € 6.290,00.

IV
Conhecendo do recurso.

1. A primeira questão a decidir é a de saber se se verificou ou não omissão de pronúncia por parte do Tribunal recorrido.

Ora, olhando para o recurso que os expropriados interpuseram do acórdão arbitral (fls. 453), verifica-se que as questões que eles colocam, excluindo as indicadas em I e II, que segundo eles próprios foram tratadas na sentença recorrida, são as seguintes:

III e IV- Não só o solo da parcela expropriada, mas o do próprio prédio no seu todo, deve ser classificado como apto para construção.

Ora, salvo o devido respeito, a sentença começou justamente por conhecer desta questão, concordando com os peritos do tribunal e dos expropriados, que quer a subparcela nascente quer a subparcela poente devem ser classificadas como “solo apto para construção”, nos termos do artigo 25º,2,a,b,c) do Código das Expropriações. No mais, ou seja, em tudo o que excede a parcela de terreno que foi expropriada, não é relevante para estes autos.
V- Não concordam os expropriados com a qualificação da parcela de 6360 m2 como integrada no espaço agrícola não integrado na RAN, e com o valor que daí resulta. No fundo pretendem que a totalidade da parcela expropriada seja avaliada com base na sua edificabilidade. Afirmam que não é pela utilização normal e efectiva do solo dantes da DUP que se projecta a avaliação do prédio expropriado, sendo sempre possível, mesmo que um prédio esteja incluído na REN, que a Comissão da Reserva Ecológica proceda à sua desafectação para que por exemplo um Centro Comercial seja aí instalado.

Só que, também aqui constatamos que a sentença conheceu desta questão, remetendo para o laudo maioritário dos peritos, no fundo concordando com a subdivisão que os peritos fizeram no laudo maioritário, de existirem duas realidades distintas na mesma subparcela que face ao disposto no nº 9 do artigo 26º, onde se lê que “se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixados nos nºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas”, devem ser avaliadas de acordo com premissas distintas, assim justificando a subdivisão operada pelos Srs. Peritos no laudo maioritário).
VI- Porque se tratou de uma expropriação parcial, impugnaram ainda o critério de cálculo da parcela expropriada por expressa violação de facto e de direito da regra constante do art. 29º,1 CE. Ou seja, entendem os expropriados, os Árbitros deveriam ter calculado separadamente o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela DUP, o que só não sucederia quando os Árbitros justificadamente concluíssem que na parte sobrante, pela sua extensão, não ocorrem as circunstâncias a que se referem as alíneas a) e b) do nº 2 e nº 3 do art. 3º CE. A verdade é que a parcela sobrante viu substancialmente diminuídos os seus cómodos, pelo que a avaliação da parcela expropriada, porque parcial, deverá ser feita nos termos do art. 29º,1.
VII- E também aqui é pacífico que a sentença conheceu desta questão: pode ler-se na sentença: “entenderam os expropriados que a avaliação deve obedecer ao disposto no nº 1 do artigo 29º do CE porquanto a parcela sobrante situada a norte vê os seus cómodos substancialmente diminuídos, “não só por deixar de confinar com a EN313, que constitui uma infra-estrutura estruturante em torno da qual se desenvolve o aglomerado urbano da cidade de Vila Real, toda ela urbanizada, que liga a cidade de Vila Real à zona industrial do concelho, encontrando no seu curso a Universidade de Trás-os-Montes, como diversos equipamentos desportivos, aeródromos e zona industrial a poucas centenas de metros, como esta infra-estrutura é bem servida de transportes colectivos e ao longo dos últimos anos as construções habitacionais vizinhas deixaram de ser apenas unifamiliares, para serem cada vez mais colectivas, numa expansão natural da cidade. (…) Concluem assim os expropriados que não pode ser dispensada a avaliação da parte não expropriada, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 29º do CE. No Acórdão arbitral os Srs. Árbitros entenderam não ser de atribuir qualquer desvalorização às partes sobrantes (…). Tal posição veio a ser mantida no relatório pericial, onde por unanimidade, os Srs. Peritos consideraram não haver qualquer desvalorização das parcelas sobrantes (…). Em face do exposto, não se verificando qualquer erro grosseiro imputável aos Srs. Peritos e não dispondo o Tribunal de nenhum argumento que infirme quer o Acórdão Arbitral, quer o relatório Pericial (unânime), terá que improceder a pretensão dos expropriados, considerando-se que as partes sobrantes não sofreram qualquer desvalorização e concomitantemente tem-se por dispensada a avaliação da parte não expropriada tal como previsto no nº 3 do artigo 29º do CE.
VII- Também não podem aceitar os expropriados a própria avaliação do valor do solo urbano constante do ponto 4.2 do relatório de arbitragem. Isto porque a fixação do COS em 0,60 m2 por m2, a diferenciação da avaliação da parcela de 2.435 m2 até à profundidade de 50 m em relação à rua com a parte da parcela com a área de 1.642 metros para lá dos 50 metros em relação à mesma rua. É que ao fazer esta diferenciação de avaliação os árbitros adoptam como critério o de avaliação do lote padrão, critério do anterior CE hoje afastado do novo CE por declaração de inconstitucionalidade. Claro que a sentença também conheceu desta questão, dizendo: “revertendo ao caso dos autos não podemos deixar de atentar às características da sub parcela - confronta numa extensão aproximada de 55 m, com a estrada de ligação Vila Nova a Torneiros (facto provado 4) que por estar dotada de diversas infra-estruturas (a sub parcela nascente confronta com uma rua com cerca de 5 metros de largura, composta por bermas e faixa de rodagem, com pavimento betuminoso e redes de energia eléctrica, iluminação pública, abastecimento de água, saneamento ligado a ETAR e telefone – facto provado 16), permite concluir pela existência de infra-estruturas a servirem a subparcela apenas na zona marginal (aproveitamento económico normal, em face de uma contiguidade). No que respeita à restante área da parcela, para além da zona marginal tem que ser considerada a necessidade de reforço de novas infra-estruturas, pois que, as que servem a zona marginal, porque contíguas, não servem a zona mais interior. Temos assim duas realidades distintas na mesma subparcela que face ao disposto no nº 9 do artigo 26º, onde se lê que “se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixados nos nºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas, devem ser avaliadas de acordo com premissas distintas, assim justificando a subdivisão operada pelos Srs. Peritos no laudo maioritário”.

Assim, aqui chegados, estamos em condições de concluir que não houve qualquer omissão de pronúncia.

Resta agora apreciar se a decisão dada pela sentença recorrida às diversas questões suscitadas é merecedora de censura.

E antes de entrar nas questões concretas que os recorrentes colocaram, importa esclarecer uma regra central em todos os processos de expropriação.

Neste, como em tantos outros processos de expropriação, verificamos que a decisão recorrida assentou no laudo pericial maioritário que foi apresentado pelos Ex.mos Peritos do Tribunal, que umas vezes foram acompanhados pelo Perito indicado pela Expropriante, outras vezes ficaram isolados.

Não admira a importância da prova pericial neste tipo de litígios, pois a pergunta a que importa responder, qual o valor justo da indemnização, exige conhecimentos técnicos altamente especializados, que o Julgador, por natureza, não domina.

Estamos pois em matéria típica do domínio da prova pericial.

E a este respeito, além do que já consta na decisão recorrida, que aqui damos por reproduzido, recenseámos ainda, com interesse para a decisão, as seguintes decisões:

1) A justa indemnização é não apenas um pressuposto de legitimidade do acto expropriativo ou um elemento integrante do acto de expropriação, mas também a principal garantia do expropriado; 2) O conceito constitucional de justa indemnização leva implicado três ideias: a proibição de uma indemnização meramente nominal, irrisória ou simbólica, o respeito pelo princípio da igualdade de encargos e a consideração do interesse público da expropriação; 3) Existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz quaisquer conhecimentos ou elementos concretos que lhe permitam aferir qual deles tem melhor aptidão para alcançar o valor da justa indemnização, justifica-se que considere ou adira ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objectivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização. (Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 09/11/2017, Relator - António Figueiredo de Almeida).

I- Constitui entendimento pacífico dos nossos Tribunais superiores, que, “ainda que a prova não seja vinculativa, mas tratando-se de um problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade destes” [assim foi decidido no Ac. do TRC de 07/02/2012, Relator Jorge Arcanjo, entendimento este reiterado no Ac. do TRP de 16/09/2014, Relator Rui Moreira e igualmente nesta RG, Ac. de 02/02/2017, Relator José Fernando Amaral, Ac. 08/12/2016, Relator Fernando Freitas e ainda Ac. de 02/06/2016, Relator Miguel Morais todos in www.dgsi.pt] – ver o Acórdão desta mesma data e secção, supra mencionado (Relatora- Maria da Purificação Carvalho). (Acórdão do TRG de 11/07/2017 (Relatora - Eva Almeida)

I- Atenta a especificidade técnica que em sede avaliativa o processo expropriativo implica, tanto que a peritagem é obrigatória, ainda que a prova não seja vinculativa, mas tratando-se de um problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal, por contraponto aos peritos indicados pelas partes - no mais e quanto às competências técnicas e conhecimentos específicos se admitindo à partida serem todos equivalentes – que só será afastada quando o mesmo evidencie falhas no raciocínio lógico/dedutivo e justificativo ou desrespeito por regras legais e nomeadamente critérios referenciais. (Acórdão do TRG de 11/07/2017; Relatora- Purificação Carvalho)

I- Sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo Tribunal – art. 389º do Código Civil -, no processo de expropriação a perícia assume uma particular importância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do art. 61º,2 do CE. II – De modo que, as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas se o julgador, nos seus poderes de livre apreciação da prova, decorrentes dos art. 607º, 5 e 489º do Código de Processo Civil, constatar que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se lhe deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção. III- E se é certo que o tribunal não deve aceitar acriticamente os elementos fornecidos pelos Srs. Peritos, é também certo que os Srs. Juízes não devem substituir-se aos peritos, cedendo à tentação de emitir juízos valorativos de carácter eminentemente técnico, para o qual não estão – nem têm de estar – vocacionados (Acórdão do TRG de 01/06/2017; Relatora- Rita Romeira).

Procurando ser ainda mais claro: a tarefa jurisdicional de encontrar o valor justo a pagar por um terreno expropriado, envolve a interpretação e aplicação dos variados artigos do Código das Expropriações; e essa tarefa envolve, por seu turno, o recurso a conhecimentos técnicos específicos que o Julgador não tem preparação académica ou experiência para dominar. Daí que o Juízo Pericial emitido pela maioria dos Peritos, sobretudo se este provier dos Peritos nomeados pelo Tribunal, que por definição e até demonstração em contrário são alheios ao litígio e como tal são totalmente independentes das partes e isentos, tenha tendência a enformar e determinar a decisão final. O Julgador só deve sobrepor-se ao Juízo maioritário dos Peritos se o laudo pericial destes tiver incorrido em erro de interpretação ou de aplicação de normas legais, por uso errado de conceitos mais jurídicos do que técnicos.

Dito isto, vejamos então.

1. Entendem os recorrentes que é necessário assegurar a vinculação da decisão aos parâmetros urbanísticos devidos em conformidade com o próprio regulamento do PDM então vigente e da Lei.

Mais concretamente, entendem que, quanto aos níveis definidos pelo art. 20º,3 do PDM (o nível U1 tem como índice de utilização máximo -1,2; o U2 tem índice de utilização máximo 0,7; e U3 tem índice de utilização máximo 0,5, a parcela em apreço insere-se no nível U1. E que se para a área em questão fosse considerado excessivo um índice superior a 0,6, aquela área seria enquadrada no nível U2, e não no U1. E em sede de esclarecimentos, os peritos declararam não estar de posse de nenhum elemento que obstasse a que fosse permitida a construção com índice de 1,2. E acrescentam ainda, de forma desnecessariamente “enfática” que não concordam que se faça depender do poder discricionário da Câmara, ou dos seus “Serviços de Urbanização”, a aprovação de projectos com índices de utilização do solo ou COS como bem lhes aprouver, in casu, dentro do limite máximo de 1,2m2/m2 previsto para a classe de solos “espaço urbano”, categoria de aglomerado urbano U1 que o RPDM de Vila Real então disciplinava, enquanto enquadramento legal urbanístico para o local, como o conclui a douta sentença recorrida, por força da posição tomada pelo relatório maioritário dos senhores peritos.

E sendo o PDM, seu regulamento e planta de condicionantes, o único instrumento de gestão territorial aplicável ao local, qualquer proprietário do prédio de que a parcela expropriada é destacada tinha toda a possibilidade de apresentar um projecto de licenciamento de obra nova a implantar nesse mesmo prédio, verificadas as demais condicionantes legais, em que apresentasse um projecto de arquitectura que tivesse um uso do solo no que concerne ao seu índice de utilização ou COS de 1,2m2/m2, sem que o seu licenciamento estivesse dependente da “boa vontade” dos ditos serviços camarários.

Ora, ficou provado sob o nº 15 -e as partes não se insurgiram contra a decisão de facto-, que de acordo com o PDM de Vila Real ratificado pela resolução do Conselho de Ministros nº 63/93 de 8 de Novembro, em vigor à data da DUP, a parcela 102 encontrava-se classificada nos seguintes termos: 4.075 m2 como “WW – U1- Vila Real”, correspondente à zona que confronta com a estrada a nascente e 6262 m2 como “Espaços Agrícolas não Incluídos na RAN”, correspondente à restante zona da parcela.

E escreve-se na decisão recorrida:

avançando, urge então atentar no artigo 20º,3,a do Regulamento do PDM de Vila Real segundo o qual: “Em casos excepcionais a aprovar pela Câmara Municipal, como áreas degradadas ou de renovação urbana, e enquanto não existirem planos de urbanização ou planos de pormenor, a construção obedecerá às seguintes regras: a) Nível U1 – o índice de utilização máximo será de 1,2, o número máximo de pisos será de sete para a cidade de Vila Real”. Entenderam os Srs. Árbitros e os Srs. Peritos de forma unânime que considerando a envolvente o índice de utilização deve ser fixado em 0,6. Por seu turno os expropriados consideram que tal índice deve ser fixado no máximo e a expropriante em 0,5 considerando o índice de construção médio na zona envolvente.
Mais uma vez reiteramos tudo quanto deixamos aqui dito sobre o valor probatório da perícia efectuada, que neste ponto se mostrou unânime, acrescentando que resulta dos factos provados que a envolvente é caracterizada por habitações unifamiliares, que segundo os esclarecimentos dos Srs. Peritos são compostas de r/c e andar. O índice de construção tem que ser determinado em função da envolvente, como bem referem os Srs. Peritos – repita-se – de forma unânime, esclarecendo (em esclarecimentos) não ser viável a execução de cálculos, razão pela qual se basearam nos seus conhecimentos técnicos e na sua experiência, concluindo como adequado o índice de utilização igual a 0,6. Sobre a posição dos expropriados, designadamente no que concerne à aprovação pela Câmara Municipal de um índice de utilização de 1,2 relativo à construção de um centro comercial sobre o prédio da Quinta B, e a urbanização que se localiza a uma distância de cerca de 270 metros da parcela também com índice de utilização a rondar 1,2, os Srs. Peritos mencionaram que a envolvente mais próxima da parcela é composta por construções com índice menor, sendo que foram estas que entenderam ser caracterizadoras da parcela por se apresentarem mais expressivas.
Em face do exposto não vemos qualquer razão que justifique a discordância face ao índice fixado pelos Srs. Peritos, que se situa a meio do legalmente permitido, razão pelo qual somos compelidos a concordar com a posição unânime manifestada pelos Srs. Peritos, improcedendo, nesta parte a pretensão dos expropriados e da expropriante”.

E, na sequência do que acabámos de dizer supra, a escolha do índice de utilização máximo é justamente um perfeito exemplo do que é uma decisão técnica, na qual o Julgador não tem competência técnica para intervir. Se a decisão recorrida tivesse fixado esse índice em 2,2, acima do máximo permitido por lei, então o Julgador estaria legalmente habilitado a intervir, fazendo respeitar a lei.

Não é esse o caso, pois o valor fixado está dentro dos limites legais, e supomos ser evidente que este Tribunal da Relação não tem competência técnica para dizer se o valor correcto é 0,5, 0,6 ou 1,2, ou outro qualquer. Dizendo de outra forma: esta Relação só poderia alterar esse valor se o mesmo estivesse errado, legalmente incorrecto. Mas isso é justamente o que não podemos afirmar, por falta de competência técnica (não jurídica). E tendo os árbitros e os peritos nomeados pelo Tribunal sido unânimes em fixar o índice de utilização em 0,6 (valor que, significativamente, se situa entre o valor pretendido pelo perito nomeado pelos expropriados, superior, e o pretendido pelo perito indicado pela expropriante, inferior), não pode agora este Tribunal deixar de considerar que é o valor mais equilibrado.

E note-se que não é arbitrário. Os peritos começaram por responder ao quesito 19º dos expropriados, escrevendo que “Nos termos do disposto no nº 2, alíneas a), b) e c) do art. 20º do Regulamento do PDM, a possibilidade de novas construções tem de respeitar as características da envolvente, pelo que o índice de construção terá de ser determinado em função da envolvente que se caracteriza por habitações unifamiliares de R/C e andar. Por esse motivo, entenderam os peritos que o índice de construção é de 0,6 m2 / m2”.

Inconformados, os expropriados pediram esclarecimentos.

E os peritos esclareceram nestes termos: “De acordo com o descrito no art. 20º do Regulamento do PDM de Vila Real, “Em casos excepcionais a aprovar pela Câmara Municipal, como áreas degradadas ou de renovação urbana, e enquanto não existirem planos de urbanização ou planos de pormenor, a construção obedecerá às seguintes regras: a) Nível U1 – o índice de utilização máximo será de 1,2, o número máximo de pisos será de 7 para a cidade de Vila Real”. Resulta do art. 20º que fica sujeito ao poder discricionário dos Serviços de Urbanismo da Câmara Municipal a aprovação da construção. O índice lá referido é o máximo admissível, o que não implica que a Câmara Municipal aprove esse índice para todas as situações. Assim, pelo atrás transcrito do PDM de Vila Real, e tomando em consideração a envolvente, consideram os Peritos, como adequado o índice de utilização igual a 0,6. E esclarecem ainda mais os peritos: para chegar ao índice de 0,6 m2 / m2 tomou-se em consideração a envolvente descrita em 2.6 e 3.1. Não é viável a execução de cálculos; os peritos basearam-se nos seus conhecimentos técnicos e na sua experiência, concluindo como adequado o índice de utilização igual a 0,6. Como é sabido, o índice é um dos pontos dos relatórios de peritagem em que é exigido aos Peritos tais determinações. E acrescentam mais: como referido na resposta anterior, o índice de utilização (de 1,2) referido no art. 20º é o máximo admissível, o que não implica que a Câmara Municipal aprove esse índice para todas as situações. A Câmara Municipal tem o poder de decidir qual o valor de índice de utilização que autoriza para cada situação. Os Peritos tomaram como adequado o índice de utilização igual a 0,6 pelas características das construções existentes na envolvente mais próxima. Atendendo aos exemplos alegados pelo Ilustre Mandatário dos Expropriados nomeadamente a aprovação pela Câmara Municipal de um índice de utilização de 1,2 relativo à construção de um Centro Comercial (Dolce Vita) sobre o prédio da Quinta B, e a urbanização que se localiza a uma distância de cerca de 270 metros da parcela também com índice de utilização a rondar 1,2, existem também, em contrapartida, construções, nomeadamente as da envolvente mais próxima da parcela com um índice menor, e foram essas que foram consideradas como mais expressivas e caracterizadoras da zona da parcela, e daí a consideração de um índice de utilização de 0,6. Mais se informa que os Peritos não têm em seu poder qualquer informação ou documento que obste que na zona da expropriação a CM não pudesse aprovar o licenciamento de construção com um índice de utilização de 1,2 m2/m2, assim como não têm em seu poder qualquer informação ou documento que obste que na zona de expropriação que não pudesse aprovar o licenciamento de construção com um índice de utilização de 0,6 m2/ m2”.
Esta explicação é inteiramente convincente, e os argumentos apresentados pelos recorrentes não colhem, de todo.

Assim como não vemos onde esteja a violação ao disposto no art. 26º,1 CE, que, recordemos, dispõe: “o valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no nº 5 do artigo 23º”.

Improcede assim esta pretensão dos recorrentes.

2. Pretendem ainda os expropriados que, quanto à avaliação da sub parcela Nascente Interior, além da alteração do COS deverá ser retirado o factor de 5% na avaliação do laudo, nos termos do nº 10 do art. 26º do CE. E assim, refazendo os cálculos, o valor da subparcela nascente interior será de € 173.643,20.

Ora, resulta com efeito da sentença recorrida que, quanto à subparcela interior, com a área de 1.640,00 m2, e com:

Ac - Área de construção: 984,00 m2 (1.640 x 0.6)
Cc - Custo de construção: 630,26 €/m2 (741,48 x 0.85);
If - Índice fundiário = 11% + 9,0% = 20%
RI - Reforço de infra-estruturas nos termos do n.º 9, artigo 26 = 30% (face à necessidade de reforço de novas infra-estruturas, pois que, as que servem a zona marginal, porque contíguas, não servem a zona mais interior).
I.R. - Factor correctivo pela inexistência de risco nos termos do n.º 10, artigo 26 = 5%
Valor do solo apto para construção por m2:
V.s.a.c./m2 = [Ac x Cc x If x (1 - RI) x (1 - I.R.)] / Aparcela = [984,00 m2 x 630,26 €/m2 x 0,20 x (1 - 0,3) x (1 - 0,05)] / 1.640,00 m2 =50,29 €/m2
Daí a sentença ter concluído que o valor da subparcela Nascente Interior é de € 82.475,60 (1.640,00 m2 x 50,29 €/m2)

Vejamos.

Dispõe o art. 26º,10 CE que “o valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos nºs 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15 % do valor da avaliação”.

E os recorrentes citam jurisprudência sobre esta matéria de deduções na fixação da avaliação do solo, nos termos dos números 4 a 8 do art. 26º; concretamente citam o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16-01-2006, JTRP 39949, onde se pode ler:
(…) “entende-se, por isso que com este normativo se tem em vista reduzir o valor da avaliação resultante da aplicação dos factores fixados nos números 4 a 9 do art.º 26º, através da incidência da percentagem nele prevista e no pressuposto de que o expropriado não suporta o risco e o esforço inerente à actividade construtiva, a fim de ajustar ao valor de mercado. Mas o funcionamento do factor correctivo pela inexistência de risco não é automático. É que, por um lado, a indemnização já é fixada por valores médios; por outro, no custo de construção, factor a tomar em consideração para o cálculo do valor do terreno, já se entra em linha de conta com o esforço construtivo na situação concreta, e, finalmente, o risco construtivo nem sempre existe, desde logo, se o expropriado, como acontece na maioria das vezes, vender o terreno a alguém que depois vai construir…”.

E acrescentam: ora, in casu, são os próprios peritos que subscreveram o laudo maioritário que atribuem ao dito factor correctivo pela inexistência de risco uma percentagem de 5%, considerando, “… a difícil conjuntura à data da “DUP” do sector industrial, em particular do sector imobiliário e da construção civil, em geral, em que a oferta supera a procura, e os excedentes de crédito “mal parado”.

Daí, entendem que a avaliação deveria ter em consideração a normalidade económica e não a situação excepcional de crise que atravessamos em 2009 de sub prime e posterior das dívidas soberanas que efectivamente condicionaram o sector da construção em particular.

E por isso pedem que seja retirado o factor de 5% na avaliação do laudo, nos termos do n.º 10 do art.º 26º.

A solução da lei é assim explicada por Salvador da Costa (Código das Expropriações anotado e comentado, Almedina, 2010): “prevê o nº 10 deste artigo o valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos nºs 4 a 9, e estatui dever ser objecto de aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação. Reporta-se pois este normativo ao valor da indemnização calculado por via do critério subsidiário relativo ao valor do solo apto para a construção em condições normais de mercado, a que se reporta o nº 4, este complementado pelo disposto nos nºs 5 a 9, inclusive, todos deste artigo. O valor assim obtido vai ser negativamente afectado por via da aplicação de um factor correctivo variável entre 1 e 15%, tanto maior quanto maior for o risco e o esforço envolvidos pela construção possível em causa”.

E note-se que, também aqui, não estamos perante uma decisão puramente arbitrária dos peritos. Resulta da sentença, que reproduz o laudo pericial, que o factor correctivo pela inexistência de risco nos termos do nº 10, artigo 26º é = 5%, face à difícil conjuntura económica que se fazia sentir à data da DUP (crédito mal parado e excesso de oferta de imóveis) e que atingiu o sector imobiliário e da construção civil, tal como entenderam por unanimidade os Srs. Árbitros (e não foi objecto de recurso) e os Srs. Peritos no seu relatório.

O citado autor refere ainda que “com efeito, em situação normal de mercado, há não raro riscos inerentes à construção, como acidentes, mau tempo, encarecimento da mão-de-obra e dos materiais, bem como inerentes à comercialização, designadamente a depreciação do imóvel, as dificuldades de venda por retracção do mercado em virtude do aumento da taxa de juro, por exemplo. Temos pois que no cálculo da indemnização deve ser considerado o referido factor correctivo, com o limite máximo de 15%, por virtude de o expropriado não ter desenvolvido qualquer actividade construtiva, sendo certo que se a tivesse desenvolvido, teria suportado o respectivo custo e o inerente risco empresarial”.

E ainda acrescenta Salvador da Costa que “obedece aos princípios da igualdade entre os expropriados e os não expropriados e da justa indemnização, visando evitar que o expropriado, contra os referidos princípios, obtenha indemnização correspondente ao valor do terreno como solo apto para a construção, sem suportar as despesas inerentes ao respectivo aproveitamento construtivo, designadamente de marketing, organização, taxas diversas e impostos”.

Bastam estas breves explicações para perceber que a pretensão dos recorrentes não tem qualquer base de sustentação.

Repare-se que os mesmos não se insurgem contra o valor encontrado pelos peritos, de 5%, defendendo que o valor em causa não deveria passar dos 2%, explicando essa posição. Eles pretendem a abolição total desse factor correctivo. E aqui sim estamos perante uma interpretação contra legem, pois o artigo citado é claro quanto à obrigatoriedade de fixação do mesmo. E, com todo o respeito por opiniões divergentes, o legislador foi claro: escreveu: “será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva”. O carácter injuntivo desta frase não deixa margem para discussões. Se a solução fosse outra, então o legislador não teria dito “será objecto”, mas antes, “pode ser objecto de…”.

E quanto à fixação do valor nos 5%, dentro dos limites impostos pela lei, para além de não vir questionada pelos expropriados, damos por reproduzido o que dissemos supra sobre o juízo técnico pericial por detrás deste tipo de fixação de valores, que o julgador não deve alterar, por não ter nem os conhecimentos nem a experiência acumulada que lhe permitam encontrar um valor mais correcto. O juízo pericial que subjaz a este tipo de escolha não é de natureza jurídica, antes é um juízo de natureza económica, cuja fluidez escapa normalmente ao raciocínio jurídico.
A maioria dos Peritos escolheu o valor de 5%.
Não houve nessa escolha ultrapassagem dos limites legais.
Assim, não existe razão para alterar o decidido.
Também nesta parte improcede o recurso.

Vejamos agora o recurso da EXPROPRIANTE.

- 1 -
Afirma esta recorrente que ao avaliar a subparcela Poente em função da sua capacidade edificativa, o Tribunal a quo incorre em errada interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis, em particular dos artigos 23º,1 e 25º do CE e 14º do PDM de Vila Real.

E isto porque, afirma a recorrente, “o “jus aedificandi" só deve considerar-se factor de valoração dos solos nas situações em que os respectivos bens possuam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa, só então integrando o núcleo do direito de propriedade privada, porquanto as faculdades de urbanizar, lotear e edificar não decorrem directamente do direito de propriedade do solo, sendo, antes, um poder que acresce à esfera jurídica do proprietário, nos termos definidos pelas normas jurídico-urbanísticas” (neste sentido, v. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 18/09/2008 no proc. n.º 4233/08, in www.dgsi.pt). E dispõe o artigo 14.º do Regulamento do PDM de Vila Real, aprovado por Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/93, de 7/10/1993, que os espaços agrícolas destinam-se “predominantemente às actividades agrícolas e pecuárias, englobando ainda áreas que apresentam, através de acções de recuperação ou reconversão, potencialidades de futura utilização agrícola.”

A consideração da capacidade edificativa de um solo tem de ter subjacente a certeza de que tal solo tem de facto capacidade edificativa ou condições para a adquirir, o que, como resulta claro do regime de utilização do solo previsto no PDM de Vila Real, não se verifica no caso da subparcela Poente, contrariamente ao defendido na sentença recorrida.

Entende assim a expropriante que o Tribunal recorrido incorre em erro de julgamento ao, aderindo ao laudo pericial maioritário, contabilizar no cálculo da indemnização a capacidade edificativa da subparcela Poente, já que não existia à data da DUP qualquer expectativa séria de que a mesma viesse a ser edificada, atenta a sua aptidão natural resultante da integração no PDM de Vila Real em Espaços Agrícolas, violando, consequentemente, de forma manifesta, o princípio da justa indemnização.

Quid iuris ?

Vejamos primeiro o que ficou provado, nesta parte: a parcela expropriada tem a área de 10.377 m2, a destacar do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (...) da freguesia de (...) e omisso na Conservatória do Registo Predial. (…) A expropriação origina duas parcelas sobrantes, uma a norte e outra a sul. As partes sobrantes apresentam grandes dimensões e a mesma qualidade de acessos, permitindo a continuação das produções existentes na propriedade. A parcela é constituída por duas sub-parcelas separadas, tendo a que está mais a nascente uma configuração quase triangular e a outra, mais a poente uma configuração irregular.
O solo apresenta características agrícolas, nomeadamente pela exigência de antigos socalcos, com disponibilidade de água nas zonas mais baixas da parcela”.

Pode ler-se na sentença recorrida que as sub parcelas que compõem a parcela expropriada foram classificadas no acórdão arbitral da seguinte forma:

Subparcela nascente - “solo apto para construção”, nos termos do artigo 25º,2,a,b,c) do Código das Expropriações.
Subparcela poente - “solo para outros fins” a contrario do artigo 25º,2 do Código das Expropriações.

Atentemos ao que nos diz o artigo 25º do CE.

“Para efeitos do cálculo de indemnização por expropriação, o solo classifica-se em (nº1):
a) Solo apto para construção;
b) Solo para outros fins.
Considera-se solo apto para construção (nº2):
a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir;
b) O que apenas dispõe de parte das infra-estruturas referidas na alínea anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
c) O que está destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as características na alínea a);
d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui, todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública, desde que o processo respectivo se tenha iniciado antes da notificação a que se refere o n° 5 do artigo 10°;

Considera-se solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas no número anterior (nº3)”.

Entenderam os Srs. Peritos que subscreveram o laudo de peritagem com excepção do perito indicado pela expropriante que ambas as subparcelas deveriam ser classificadas como “solo apto para construção”, argumentando que a subparcela nascente (inserida em zona de aglomerado urbano) cumpre os requisitos das alíneas a) e c) do nº 2 do artigo 25º e a subparcela poente (inserida em zona agrícola não incluída em RAN) cumpre os requisitos da alínea a) do nº 2 do artigo 25º.

Por seu turno a expropriante entende que não é possível edificar em tal parcela nos termos do artigo 20º do Regulamento do PDM de Vila Real, na medida em que de acordo com o preceito legal nos aglomerados urbanos “são permitidos os usos residenciais e actividades complementares”, sendo que apenas são permitidas novas construções nestas áreas, quando não abrangidas por plano de urbanização ou plano de pormenor, em caso de colmatação substituição, beneficiação ou ampliação de edifícios envolventes, podendo a Câmara Municipal aprovar projectos de construção nos casos de áreas degradadas ou de renovação urbana, não se verificando nenhuma das condições.

Tal como refere o próprio perito da expropriante as características definidas no regulamento do PDM para os espaços inseridos em zona de aglomerado urbano e a sua localização adjacente às vias de acesso ao prédio, conferem ao prédio capacidade construtiva, embora limitada ao verificado na envolvente e às condições de acesso que se verificam no local (artigo 20º,2 do Regulamento do PDM), sendo por isso evidente que o ordenamento do território prevê a possibilidade de construção nos espaços de aglomerado urbano, nas zonas adjacentes às vias públicas, onde se localizam as infra-estruturas.

Assim não podemos deixar de considerar no que respeita à subparcela nascente inserida em “espaço urbanos – U1 – Vila Real” de acordo com o regulamento do PDM, que confronta com estrada pavimentada, que a mesma deve ser classificada como “solo apto para construção”, improcedendo as alegações da expropriante quanto a este ponto.

Vejamos agora a subparcela poente inserida em “espaços agrícolas não incluídos na RAN”.
É certo que esta subparcela não confronta com a via pública. No entanto como resultou provado, o prédio de onde a parcela é destacada confronta com a Estrada nº 313 a poente, que dispõe de rede de gás, e que dista apenas 45 m da parcela.

No Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21.12.2010, processo 4001/08.2TBVIS.C1, www.dgsi.pt escreveu-se o seguinte a propósito do texto do artigo 25º,2 CE: “Quando a lei estabelece aquele conjunto de infra-estruturas para considerar o solo apto para a construção, quando fala em “dispor”, fá-lo numa perspectiva não de impor que o terreno expropriado delas esteja dotado, ou sequer por elas marginado, mas de que pelo menos tenha a possibilidade de se servir de tais infra-estruturas porque existam nas proximidades, e o seu alcance e utilização, também sob o ponto de vista técnico, seja óbvio e simples. Enfim, que existam, a elas se possa aceder, e sejam ajustadas ao local e à construção que nele se possa levantar.
A distância em metros que as separa do terreno expropriado será sempre um factor a ponderar, e podendo ser impressivo não tem, todavia, de ser decisivo.
Caso a caso se relevará do seu peso, em função das características do local, da parcela expropriada e do tipo de construção urbanístico viável.”
No caso em apreço a Estrada 313 fica a 45 metros da subparcela poente e dispõem de rede de gás. Para além disso o prédio dista, em linha recta, aproximadamente 1,3 km da UTAD, 1,5 km da estação de correios (Araucária), Serviço de Finanças (Araucária) e centro comercial (Dolce Vita Douro), e é praticamente contígua das unidades industriais mais próximas, que se localizam junto da rotunda que dá acesso para a A4.

Em face do exposto temos que concluir que a subparcela poente preenche o requisito da alínea a) do nº 2 do artigo 25º do CE, tal como defendido pelo laudo maioritário dos peritos.
Contudo não podemos deixar de abordar a questão de saber se a capacidade edificativa de um solo se basta com o preenchimento dos requisitos do nº 2 do artigo 25º do CE.
Cremos que não, uma vez que a construção tem que ser possível face ao PDM em vigor.
Olhando ao que dispõe o artigo 27º do regulamento do PDM de Vila Real em vigor à data da DUP, temos que considerar que a subparcela poente em causa tem capacidade edificativa e como tal deve ser classificada como “solo apto para construção”, ao contrário do que vem dito no acórdão arbitral e defende a expropriante.

Procede assim nesta parte o recurso interposto pelos expropriados.

Ora, esta fundamentação é clara, abrangente e merece a nossa concordância.

Como ponto prévio, importa ter presente que a classificação atribuída no acórdão arbitral (ou na sentença, acrescentamos nós) à parcela, como solo apto para construção, envolve manifestamente (conclusão ou) qualificação jurídica, sendo legítimo ao tribunal, em sede de recurso e nos termos do art. 664.º do CPC, alterar aquela classificação Acórdão do STJ de 26-11-2009, proferido na Revista nº 2416/04.4TJVNF.S1 - 7.ª Secção - Ferreira de Sousa (Relator), Pires da Rosa e Custódio Montes).
E mais uma vez não é despiciendo começar por lembrar que, num painel de 5 peritos, 4 deles defenderam a solução contra a qual a recorrente agora se bate. Apenas o perito por esta indicado divergiu. Só o facto de 3 peritos isentos, equidistantes das partes, terem defendido a solução adoptada na sentença, juntamente com o perito de uma das partes, já é suficiente para, só por si, conferir peso determinante a esse juízo pericial.
Mas vejamos melhor, porque esta é, acima de tudo, uma questão de qualificação jurídica, que envolve um conceito jurídico, de “solo apto para construção”.
4 peritos consideraram que a subparcela poente deve ser considerada como solo apto para construção, ao abrigo do disposto no art. 25º,2,a CE.

Continuando a citar Salvador da Costa, em anotação a este artigo, “não se trata, porém, de um elenco cumulativo, e dentro de cada alínea, o respectivo elenco também não é absoluto. (…) Os elementos objectivos que constam da alínea a) deste normativo, que implicam a classificação do solo como apto para construção, exigem que o acesso rodoviário, a rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento tenham características adequadas às edificações nele existentes ou que nele venham a ser construídas. O acesso rodoviário a que este normativo se reporta é, naturalmente, o que dispõe de pavimentação adequada à normal circulação de viaturas automóveis. A lei não exige, porém, que ela revista especiais características de pavimento, designadamente em calçada betuminosa ou equivalente, bastando que tenha condições de servir de via de comunicação aos utentes das edificações existentes ou a construir”.

Como se pode ver do relatório pericial, os peritos do Tribunal e o perito dos expropriados consideraram que “estão verificados os requisitos certos e objectivos da potencialidade edificativa do prédio (incluindo as partes abrangidas e não abrangidas pela DUP), especialmente que o mesmo dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele a construir, conforme art. 25º,2,a CE.
E consideraram ainda que igualmente estão preenchidas as condições jurídicas para nele se construir, pelo facto de os requisitos certos e objectivos de potencialidade edificativa do prédio de modo algum poderem ser afastados por qualquer tipo de vinculação situacional ao regulamento do PDM então em vigor. Designadamente pelo facto de 6,360 m2 da parcela expropriada se situar num espaço de solo classificado, no RPDM como “áreas agrícolas não incluídas na RAN”.

E ainda que “para além da área dos 4.077 m2 que se situa de acordo com a categoria de solos previstos no Regulamento do PDM em “WW U1 – Vila Real”, da parcela expropriada fazem igualmente parte 6.360 m2 localizados em “Espaços Agrícolas não incluídos no RAN”, que, de acordo com a sua utilização possível, nos termos do art. 27º do Regulamento do PDM, é nessa mesma categoria de solos, possível a construção, designadamente para fins industriais ou de armazenagem ou de grandes superfícies comerciais (1)”.

“Podendo-se concluir que a parcela expropriada, na sua totalidade (incluindo a parte da mesma localizada em espaço agrícola não incluído na RAN, de acordo com o Regulamento do PDM vigente à data da DUP) deverá ser avaliada como solo apto para construção”.

“Tendo em conta o prédio na sua totalidade (a parte abrangida e não abrangida na DUP) verificam-se cumulativamente as condições previstas nas alíneas a) a k) do nº 7 do art. 27º do Regulamento do PDM, designadamente o prédio, assim como a parcela expropriada, confina com a via pública pavimentada cujas características permitam o acesso e suporte das novas cargas viárias geradas pela actividade a instalar”.

Concluindo: a afirmação da recorrente segundo a qual “o jus aedificandi só deve considerar-se factor de valoração dos solos nas situações em que os respectivos bens possuam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa, só então integrando o núcleo do direito de propriedade privada, porquanto as faculdades de urbanizar, lotear e edificar não decorrem directamente do direito de propriedade do solo, sendo, antes, um poder que acresce à esfera jurídica do proprietário, nos termos definidos pelas normas jurídico-urbanísticas”, não nos suscita especial oposição.

Sucede que no caso concreto, como resulta do laudo maioritário dos peritos, que não vemos razões para não seguir, estão reunidas as condições objectivas para a qualificação da referida subparcela como solo apto para construção, e não se verifica nenhum impedimento legal absoluto a tal qualificação.

Por exemplo, é hoje pacífico que os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo apto para construção», nos termos do art. 25º,1,a e 2 do CExp, aprovado pelo art. 1º da Lei n.º 168/99, de 18-09, ainda que preencham os requisitos previstos naquele n.º 2 (Acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ de 07-04-2011 - Álvaro Rodrigues (Relator).

Mas não é esse o caso destes autos, pois como ficou provado (nº 15), de acordo com o PDM de Vila Real ratificado pela resolução do Conselho de Ministros nº 63/93 de 8 de Novembro, em vigor à data da DUP, a parcela 102 encontrava-se classificada nos seguintes termos: 4.075 m2 como “WW – U1- Vila Real”, correspondente à zona que confronta com a estrada a nascente e 6262 m2 como “Espaços Agrícolas não Incluídos na RAN”, correspondente à restante zona da parcela.

E é igualmente assente que “a obrigação de indemnização por expropriação, segundo a actual ciência do direito, deriva do princípio da igualdade. A indemnização, para ser justa, não deve criar a favor do expropriado uma situação mais vantajosa do que a dos proprietários não expropriados, em idênticas circunstâncias. A nossa lei acolhe a teoria da substituição no domínio da fixação da indemnização por expropriação, só sendo, assim, justa a indemnização que compense integralmente o dano suportado pelo expropriado. O jus aedificandi, sem embargo de não possuir tutela constitucional directa no direito de propriedade, deve ser considerado como um dos factores de fixação valorativa, na indemnização que advém do acto expropriativo. Assim podendo, também, criar uma obrigação de indemnizar” - Acórdão do STJ de 31-01-2012 - Serra Baptista (Relator).

E, salvo melhor opinião, não podemos esquecer que o acto de expropriação, que se impõe ao proprietário de forma absoluta e incontornável, não lhe retira apenas o seu direito de propriedade. Retira-lhe igualmente a faculdade de escolher o momento em que seria do seu interesse transaccionar o seu prédio. Esse momento é-lhe imposto por força da lei, e acto administrativo. Podendo haver ou não razões para supor que os terrenos naquela zona se irão valorizar no futuro, o proprietário expropriado fica sempre duplamente amputado: não pode decidir se transacciona o seu prédio ou não, uma vez que ele é transaccionado à força. E não pode sequer escolher o momento em que o vai transaccionar, pois esse momento é-lhe igualmente imposto pela entidade expropriante.

Daí que, na determinação da justa indemnização, qualquer visão que se prenda excessivamente ao momento do acto expropriativo, e feche os olhos a alguma forma de previsibilidade futura, corre o risco de ser prejudicial ao expropriado, e logo injusta.

Veja-se até o disposto no art. 26º,12 CE, regime introduzido pelo legislador para obstar às classificações dolosas dos solos ou à manipulação das regras urbanísticas pelos planos municipais de ordenamento do território. Como decidiu o Acórdão do STJ de 17-10-2013 - Oliveira Vasconcelos (Relator), nada impede a aplicação analógica do regime estabelecido no n.º 12 do art. 26.º do CExp, de 1999, à avaliação de solos situados em RAN ou REN. Na verdade, aquele nº 12 destinou-se fundamentalmente a impedir a ocorrência de quaisquer tentativas de “manipulação” das regras urbanísticas por parte da Administração, que poderiam traduzir-se na classificação dolosa por parte da mesma em planos de ordenamento territorial de um terreno como não passível de edificação, desvalorizando-o, para mais tarde o adquirir, por expropriação, pagando por ele um valor correspondente ao do solo não apto para construção, protegendo o proprietário de um terreno que podia ser considerado como “apto para construção”, que depois foi desclassificado como tal pela Administração e a seguir expropriado.

Assim, aderimos na íntegra à fundamentação da sentença recorrida, nomeadamente o relevo dado ao facto de a parcela, apesar de não confrontar com a via pública, o prédio de onde a parcela é destacada confrontar com a Estrada nº 313 a poente, que dispõe de rede de gás, e que dista apenas 45 m da parcela, e a jurisprudência aí citada. E ainda o facto de o prédio distar, em linha recta, aproximadamente 1,3 km da UTAD, 1,5 km da estação de correios (Araucária), Serviço de Finanças (Araucária) e centro comercial (Dolce Vita Douro), e é praticamente contígua das unidades industriais mais próximas, que se localizam junto da rotunda que dá acesso para a A4.

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Finalmente, entende a entidade expropriante que o Tribunal não poderia ter aderido ao laudo pericial maioritário, de forma inexplicável e que não encontra qualquer respaldo na lei, distinguindo para efeitos de avaliação a parte interior da parte exterior da subparcela Nascente, considerando para o efeito, que apenas a parte interior sofreria uma sobrecarga nas infra-estruturas existentes. Afirma que o raciocínio expendido não encontra qualquer suporte na lei, tanto no Código das Expropriações como no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação. Nesta medida, os cálculos aplicados à parte interior devem ser necessariamente os mesmos aplicados à parte exterior. Acresce que, em nenhum momento se poderia deixar de aplicar a percentagem de 30% considerada para a subparcela interior, para efeitos do n.º 9 do artigo 26.º do CE também à parte exterior daquela subparcela, já que a mesma não detinha, à data da DUP, quaisquer infra-estruturas.

Considera pois a recorrente que o tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao, aderindo ao laudo pericial maioritário, dividir a subparcela nascente em função da proximidade ao arruamento com o qual confronta, violando, para o efeito, os critérios legais de cálculo do solo apto para construção, já que nenhuma disposição legal admite tal divisão. E isto porque, afirma, o estrito cumprimento dos artigos 23º,1, 25º e 29º do CE e 14º do PDM de Vila Real implica a ponderação de conceitos que, embora assentes em pressupostos que são também técnicos, reconduzem-se a uma reflexão eminentemente jurídica que, como tal, pode e deve ser sindicada pelo tribunal, sob pena de violação do princípio da justa indemnização.

Ora bem.
Vamos começar por divergir da afirmação da recorrente de que mais do que uma afirmação assente em pressupostos que são também técnicos, estaríamos perante uma reflexão eminentemente jurídica. Não é verdade: estamos a procurar determinar o valor justo a pagar pela parcela expropriada. E apesar de todas as normas do CE destinadas a encontrar o valor correcto, o valor de um prédio não emerge directamente da aplicação da lei, como um dado da natureza; não está inscrito em bronze, nem é uma realidade objectiva que possa ser encontrada, a partir de leis naturais, universais e imutáveis; é um valor decorrente do funcionamento da economia, da lei da oferta e da procura. E procurando uniformizar critérios, o legislador estabeleceu um conjunto de normas destinadas a auxiliar o intérprete na busca do valor correcto.

Assim, a determinação do valor de uma parcela alvo de expropriação, apesar das normas jurídicas supra citadas, envolve um raciocínio mais técnico e pericial, de experiência na avaliação de imóveis, do que jurídico.

Dito isto, acrescentemos outra coisa óbvia. Ao contrário dos peritos, que foram ao local e têm um conhecimento directo de todas as características e particularidades do mesmo e da sua envolvente, os Juízes que compõem este Tribunal não têm esse conhecimento, e o que sabemos do local é o que se retira dos autos: conhecimento indirecto, pois.

Os peritos fizeram constar do relatório o seguinte: “a subparcela nascente confronta (numa extensão apreciável) com a Estrada de Ligação de Vila Nova a Torneiros, que se considera com as infra-estruturas de que dispõe, com capacidade para servir as construções nesta zona marginal da parcela face à estrada. Numa outra parte da subparcela nascente, de maior interioridade, face à Estrada, considera-se um agravamento de custos para execução das infra-estruturas e cedências segundo a Portaria 216-B/2008. Isto origina a seguinte subdivisão:

-subparcela nascente marginal, até uma profundidade de 50 m em relação à Estrada, com uma área de 2.435 m2;
-subparcela nascente interior, para o interior dos 50m em relação à estrada, com uma área de 1640 m2”.

Respondendo a pedidos de esclarecimento, escreveram ainda no laudo o seguinte: “a distância de 50 m é a distância considerada a partir da qual se considera existir um agravamento de custos para a execução das infra-estruturas e cedências segundo a Portaria nº 216-B/2008, nomeadamente para os arruamentos necessários para concretização do loteamento, as cedências de áreas necessárias para construção de espaços verdes e equipamentos colectivos”. O perito da expropriada acrescenta ainda: “a metodologia adoptada na delimitação da proposta de perímetros urbanos definidos nos planos de ordenamento do território, assenta basicamente na definição de uma frente urbana, suportada por arruamento existente e infra-estruturado, com uma profundidade de 50m. Neste âmbito e tendo por base a metodologia anteriormente referida, entende-se adequado a definição de uma frente urbana suportada pelo arruamento já existente, com uma profundidade de 50m, que será enquadrada na categoria funcional de WW.

Parece óbvio que na base destas afirmações está um juízo de natureza mais técnica que jurídica. Por isso é que para realizar a peritagem foram escolhidos Engenheiros Civis, e não Juristas.

E, salvo o devido respeito, não vemos onde a opção dos peritos que subscreveram esta solução viola lei expressa. Nem a recorrente o indica, limitando-se a dizer que não há norma que o permita. Ora, não havendo norma que o proíba, é quanto basta para que, na busca da solução mais justa, se aceite esta solução defendida pelos peritos do Tribunal, que se nos afigura mais próxima da realidade concreta, logo mais justa.

Assim, somos levados a concordar com a sentença recorrida, quando nela se escreve:

“temos assim duas realidades distintas na mesma subparcela que face ao disposto no nº 9 do artigo 26º, onde se lê que “se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixados nos nºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas”, devem ser avaliadas de acordo com premissas distintas, assim justificando a subdivisão operada pelos Srs. Peritos no laudo maioritário”.

Assim, chegamos à conclusão de que os recursos devem ser julgados improcedentes, e a sentença confirmada na íntegra.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar os recursos interpostos por expropriados e expropriante totalmente improcedentes, confirmando na íntegra a sentença recorrida.

Custas pelos recorrentes (art. 527º,1,2 CPC).
Data: 27/9/2018


Relator

­(Afonso Cabral de Andrade)

1º Adjunto
(Alcides Rodrigues)

2º Adjunto
(Joaquim Boavida)

1 - Destaque nosso.