Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1120/15.2T8CHV.G2
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: OCUPAÇÃO ILÍCITA
DANO DA PRIVAÇÃO DO USO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDÊNCIA DA APELAÇÃO
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.

II- Sendo o título executivo uma sentença, nem nos embargos à execução, muito menos na fixação de prazo para a prestação de facto pelo executado, ou na verificação do seu cumprimento, podem voltar a discutir-se questões que estão definitivamente assentes e que foram o fundamento da condenação na obrigação que aqui se executa.

III- Pode sim interpretar-se o título (sentença ou acórdão) em face do seu texto, mas nunca voltar a apreciar questões que não só respeitam à fase declarativa do direito, como nessa mesma sentença/acórdão foram apreciadas e decididas.

IV- Nesta fase incidental para fixação do prazo da prestação, em que os executados vieram declarar já ter cumprido a obrigação exequenda, cumpre apenas apreciar e decidir, se, em face dos factos provados, a ordenada reposição do direito de propriedade do autor/exequente, tal como definida na sentença exequenda, foi ou não cumprida e, caso não o tenha sido, fixar o prazo para o respectivo cumprimento.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I – RELATÓRIO

V. M. instaurou contra M. M. e J. M. execução para prestação de facto, titulada pela sentença e o acórdão desta Relação que a alterou, proferidos nos autos 1978/05.3TBVRL, que, entre o mais, condenou os executados a “demolir o muro que construíram no prédio identificado no artigo 3.º da P.I., a retirar todo o entulho que resultar dessa demolição, e a manter o regadio a céu aberto, livre e desimpedido, nos termos tradicionais”.

Alegaram que os executados ainda não procederam à realização das obras, nomeadamente de demolição do muro que construíram sobre o rego e colocação do rego a céu aberto, livre e desimpedido - com a inerente retirada dos portões colocados nos limites Nascente e Poente do prédio dos réus no acesso ao regadio e o caminho que une os 2 prédios dos RR e que passa sobre o regadio, e demais trabalhos que se venham a revelar necessários para esse fim - da forma ilustrada na planta em anexo. Indicando que para a realização das obras é suficiente o prazo de quinze dias.
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Os executados foram citados para, no prazo de VINTE DIAS, querendo, deduzirem oposição à execução e dizerem o que se lhes oferecer quanto à fixação do prazo para a prestação do facto.
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Foi nomeado perito para determinação do prazo necessário à realização da obra, que apresentou relatório junto ao processo electrónico em 23.1.2014, concluindo serem necessários 40 dias para a realização dos trabalhos necessários ao cumprimento da sentença.
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Em 16-4-2015 o Mm.º juiz “a quo proferiu o seguinte despacho:

«(…) Conclui-se, pois, que a competência para os presentes autos cabe à Secção de Execução de Vila Real e não a esta Secção.
Deste modo, declara-se esta Secção incompetente em razão da matéria
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Remetidos os autos à Secção de Execução, vieram os executados em 2.7.2015 declarar terem efectuado a obra, cumprindo a obrigação exequenda.
O exequente respondeu, afirmando que a obra não se mostra executada como sentenciado, requerendo a notificação dos executados para cumprirem no prazo que lhes for fixado.
Em 24.2.2016 decidiu-se:
«(…) Ora, assim sendo, cumpre fixar o prazo em 40 dias (conforme consta do relatório pericial – cfr. ref.ª1014598 ou fls.62 a 68), o qual nos aprece justo e razoável, dentro do qual os Executados deverão dar cumprimento, nos precisos termos plasmados na sentença que se executa, à obrigação exequenda. Notifique.»
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Em 15.3.2016 os executados interpuseram recurso de tal decisão, que veio a ser julgado por acórdão deste Tribunal da Relação de 23.3.2017, que anulou a decisão recorrida, determinando se proferisse nova decisão sobre a questão controvertida, devidamente fundamentada.
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Os autos baixaram à 1ª instância onde foi proferido o seguinte despacho:

– «Uma vez que foi decidido que deverá ser efectuada uma nova decisão onde se aprecie o invocado cumprimento da obrigação exequenda por parte dos Executados mas, previamente, deverão ser efectuadas as diligências que se entendam necessárias para o efeito, notifique as partes para, em 10 dias, querendo, se pronunciarem sobre as provas que entendam necessárias produzir nos autos com a finalidade supra descrita».
O exequente requereu perícia e os executados vieram também indicar os quesitos a que o perito deveria responder.

Após notificações, requerimentos e diligências de prova foi proferida em 11.12. 2018 a seguinte decisão:

- «(…) Face ao predito, temos de concluir que os Executados não cumpriram com as obrigações a que estavam adstritos nos seus precisos termos.
Assim sendo, cumpre fixar o prazo em 40 dias (conforme consta do relatório pericial – cfr. ref.ª1014598 ou fls.62 a 68), o qual nos parece justo e razoável, dentro do qual os Executados deverão dar cumprimento, nos precisos termos plasmados na sentença condenatória que ora se executa, à obrigação exequenda.
Custas pelos executados, fixando-se a taxa de justiça em 1UC».
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Inconformados, os executados interpuseram o presente recurso, que instruíram com as pertinentes alegações, em que formulam as seguintes conclusões:

«1 - Pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, e princípio orientador da obrigação de facto a prestar pelos RR. estes foram condenados a absterem-se de praticar actos que impeçam o exercício do direito de propriedade do A. sobre o rego identificado nos artigos 19º a 35º da P.I. a demolir o muro que construíram no prédio identificado no artigo 3º da P.I. e retirar todo o entulho que resultar dessa demolição e a manter o regadio a céu aberto livre e desimpedido, nos termos tradicionais.
2 - Os/executados demoliram o muro a que se alude, tendo junto em 2/7/2015 fotos ilustrativas do regadio, e vieram aos autor informar por via de requerimento que cumpriram com a obrigação a que estavam adstritos.
3 - O exequente não concordou com o requerido pelos executados, mantendo o seu incumprimento.
4 - Em 24/2/2016 foi proferida decisão onde se conclui pelo incumprimento da prestação dos executados, tendo sido fixado um prazo de 40 dias para cumprimento daquela.
5 - Não se conformando com a decisão, os executados interpuseram recurso para este Venerando Tribunal.
6 - Os autos baixaram à 1ª Instância para ser proferida nova decisão de modo a suprir a falta da sua fundamentação, o que ocorreu em 11/12/2018, onde se concluiu pelo não cumprimento dos executados na obrigação a que estavam adstritos, isto porque, “deveriam deixar o rego ficar exatamente da forma em que existia, em termos tradicionais, ou seja, a céu aberto, livre e desimpedido, o qual deveria ficar em terra, e com as áreas preexistentes e sem portões que possam limitar ou impedir o direito de propriedade do exequente sobre as águas que vão regar os terrenos do exequente e demais comproprietários”.
7 - Os executados discordam, com devido respeito, desta decisão, entendendo que cumpriram com o que lhe foi imposto, nomeadamente a destruição do muro que construíram em cima do regadio e do entulho que retiraram, deixando o rego a céu aberto, livre e desimpedido em pelo menos 40 dos 50m de extensão, aceitando que a obrigação não se encontra integralmente cumprida nesta parte nem no que concerne às medidas preexistentes da profundidade e largura do rego provadas nos autos;
8 - Situações, todavia, que não inviabilizam, apenas restringem o exercício do direito reconhecido ao exequente de beneficiar da água de rega e de acompanhar o seu trajecto;
9 - Acresce que não ficou provado que a existência dos portões inviabilize ou restrinja o exercício do direito reconhecido ao exequente, uma vez que a sua colocação é lícita ao abrigo do disposto no art. 1.356ºC.C.
10 - O mesmo se diga quanto à reposição do rego de água em terra, porquanto não está provado esta sua composição ao longo da fase declarativa e /ou executiva dos autos, nem consta do pedido, estando fora dos limites deste, pelo que não estão os executados obrigados a cumprir tal facto.
11 - A expressão termos tradicionais não é uma situação de facto alegada e provada nos autos cujo significado ou alusão seja “ o rego de água em terra”
12 - A Srª Juiz da Instância Executiva deveria proferir decisão diversa, apontando para o cumprimento parcial da obrigação imposta na decisão condenatória e fixando um prazo para cumprimento restante no que concerne às medidas do rego e da livre e desimpedida circulação de água e seu acompanhamento no espaço de 10m conforme se alcança do facto provado em 1)4 e 5)
13-Foram violadas, entre outras, as normas dos arts. 413º e 609º 1)C.P.C., 341º, 362º, C. C. Devendo a decisão ser alterada por uma outra que defina os limites da condenação e ordene o cumprimento da consequente obrigação na parte em que parcialmente não se encontra cumprida, tudo com legais consequências, como é de Justiça..».
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O exequente apelado contra-alegou.
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Após decisão do apenso de prestação espontânea de caução requerida pelos recorrentes com vista a atribuir efeito suspensivo ao presente recurso, foi este admitido a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
O processo foi remetido a este Tribunal da Relação, onde o recurso foi distribuído e autuado em 27-09-2019.
Inscrito em tabela e colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos apelantes, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º nº2 do CPC).
As questões a resolver são as que constam das conclusões da apelação, acima reproduzidas.

III - FUNDAMENTOS DE FACTO

Factos provados:

1) Os Executados deixaram o regadio a céu aberto na maior parte do trajecto (40 m) mas uma pequena parte do trajecto do regadio (10 m) não está a céu aberto pois está protegido por uma escadaria de pedra e por uma grade de ferro amovível.
2) A vala do regadio não está em terra mas em conduta com manilhas de meia cana de cimento e o passadiço é em pedra.
3) A largura para a passagem de água e para a circulação das pessoas tem em média 87 cm de largura, todavia, junto a um dos portões (a jusante), tem apenas 69 cm de largura.
4) O acesso à conduta de água é directo na maioria do trajecto, no entanto, no troço onde se encontra a escadaria de pedra (+/- 5 m) o acesso não é directo nem fácil devido ao impedimento que as pedras criam.
5) O trajecto está protegido por uma grelha de ferro pelo que para se ter acesso à conduta de água é necessário retirar a dita grelha.
6) A conduta de água não se distingue facilmente dos dois prédios do Executado tal é a integração do regadio no envolvimento dos prédios.
7) O regadio tem 87 cm de largura em média e 69 cm junto ao portão (jusante).
8) Os Executados mantêm no local os portões tanto a montante como a jusante.
9) Está construído um muro no prédio superior que faz com que a largura da vala de rega neste local, devido à existência de uma casa muito próxima, não possa ter a largura aprovada nos autos.
10) O prédio dos Executados está vedado com rede e com portões no acesso à propriedade, contudo, estes, aquando da peritagem, não se encontravam trancados.
11) A conduta confunde-se com o resto da construção, fazendo transparecer a ideia de que tudo pertence ao mesmo, tal a similitude de forma da construção e utilização dos materiais.
12) O Exmo. Sr. Perito estimou os custos da prestação, com a descrição das várias acções que deverão ser levadas a cabo para cumprimento integral da sentença condenatória que ora se executa em 3.710,00€, a que acresce o IVA à taxa legal em vigor.
13) No relatório pericial junto sob ref.ª1014598 (fls.62 a 68) foi fixado o prazo de 40 dias para realização dos trabalhos necessários ao cumprimento da prestação.

IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO

Os apelantes discordam da decisão recorrida, defendendo que se mostra cumprida a obrigação exequenda porquanto já destruíram o muro que construíram em cima do regadio e retiraram o respectivo entulho, deixando o rego a céu aberto, livre e desimpedido em pelo menos 40 dos 50m de extensão.
Aceitam que a obrigação não se encontra integralmente cumprida no que concerne às medidas preexistentes da profundidade e largura do rego provadas nos autos.
Alegam que a situação actual não inviabiliza nem restringe o exercício do direito reconhecido ao exequente de beneficiar da água de rega e de acompanhar o seu trajecto;
E que não ficou provado que a existência dos portões inviabilize ou restrinja o exercício do direito reconhecido ao exequente, uma vez que a sua colocação é lícita ao abrigo do disposto no art.º 1.356ºC.C.
O mesmo se diga quanto à reposição do rego de água em terra, porquanto não está provado esta sua composição ao longo da fase declarativa e /ou executiva dos autos, nem consta do pedido, estando fora dos limites deste, pelo que não estão os executados obrigados a cumprir tal facto.
Mais alegam que a expressão “termos tradicionais” não é uma situação de facto alegada e provada nos autos cujo significado ou alusão seja “ o rego de água em terra”

Defendem que a Mmª Juiz da Instância Executiva deveria proferir decisão diversa, apontando para o cumprimento parcial da obrigação imposta na decisão condenatória e fixando um prazo para cumprimento restante no que concerne às medidas do rego e da livre e desimpedida circulação de água e seu acompanhamento no espaço de 10m conforme se alcança dos factos provados.
Pugnam no sentido de que a decisão deve ser alterada por uma outra que defina os limites da condenação e ordene o cumprimento da consequente obrigação na parte em que parcialmente não se encontra cumprida.
Começando pelo fim, desde já se esclarece que a decisão proferida visava tão somente verificar se a obrigação exequenda se mostrava cumprida e, não se mostrando cumprida, fixar o prazo em que o deverá ser pelos executados, sob pena de, se assim for requerido, vir a ser prestada pelo exequente ou por terceiro, à custa dos executados, prosseguindo os autos como execução para pagamento da quantia apurada como necessária a esse efeito (artºs 870º e segs. do CPC).
Está fora do âmbito da presente execução e por isso da decisão recorrida “definir os limites da condenação”.
Estes são os que constam da sentença exequenda, neste caso do douto acórdão da Relação do Porto, que revogou parcialmente a sentença da 1ª instância, “julgando procedentes os pedidos formulados em d), e) e f) do pedido, ou seja, condenando os réus, aqui executados e recorrentes a absterem-se de praticar actos que impeçam o exercício do direito de propriedade sobre as mencionadas águas, proibindo-os de por qualquer forma, ofender o referido direito; e assim, demolir o muro que construíram no prédio identificado no art.º 3º da P.I. e a retirar todo o entulho que resultar da demolição; devendo manter o regadio a céu aberto, livre e desimpedido nos termos tradicionais”.
´Na fundamentação de tal acórdão, que sustenta o que nele se decidiu, e á luz da qual a decisão exequenda deve ser interpretada, pode ler-se que as obras realizadas pelos réus (construção do muro e colocação de manilhas) foi efectuada em propriedade alheia.
Assim, não estamos perante um caso de servidão de aqueduto sobre o prédio dos réus, em que a obrigação destes seria apenas a de manter as utilidades que tal servidão proporcionava ao prédio dominante ou beneficiário de tal servidão.
As obras realizadas pelos réus foram-no em terreno alheio, o muro foi construído e as manilhas foram colocadas em terreno alheio.

Como se refere no acórdão da Relação, que aqui se executa, a propósito do abuso de direito invocado pelos réus, aqui executados: “abuso encontramos na actuação dos réus, pois sem qualquer direito, apoderaram-se de terreno alheio para o integrar em terreno próprio”.

Também decorre do dito acórdão que, os réus, ao integrarem terreno que não lhes pertencia no respectivo prédio, impedem o seu acesso pleno e livre, salvo se os portões estiverem abertos e que assim, “o que era compropriedade do autor passou, com estas obras, a ser terreno dos réus e aquele(s) para terem lá acesso necessitam agora da bondade desteschaves e portão são exemplo da limitação desse direito de propriedade. E não se diga que não há qualquer prejuízo para o autor, por não ficarem impedidos de seguirem a pé o curso do regadio, pois há prejuízo evidente, na medida em que a sua qualidade de comproprietário, tal como a define os artigos 1305º e 1405º do CC, deixa de ocorrer e de proprietários passam a ser uns mero(s) detentor(es) de um direito de servidão – artigos 1544º e 1561º do CC – na medida em que fica impedido o seu acesso pleno e livre salvo se os portões continuaram abertos ou facultada a chave para o seu acesso. (…) É que a passagem pelo curso de regadio deixou de ser possível, pois as obras levadas a cabo pelos réus cobrem o dito regadio, obrigando os autores e demais beneficiários a entrar no prédio dos réus, correndo o risco de estes não os deixarem passar uma vez que não beneficiam de qualquer direito contra eles”. (Sublinhado nosso)
Assim o acórdão exequendo é claríssimo quanto às obras (prestação de facto positivo) que aos réus, aqui executados, incumbe fazer para reporem o direito de propriedade (compropriedade) do autor, que incide sobre o terreno que indevidamente ocuparam (o prédio dos réus, conforme facto nº 41 da sentença, confronta com o rego, que assim não o integra).
Consequentemente, impõe-se a demolição do muro em toda a extensão do rego e a reposição do “regadio” (rego e faixa de terreno que o acompanha, com 1 metro de largura e 50 cm de profundidade, conforme facto nº 13 da sentença), retirando as manilhas e tampas de visita, tudo por forma a que o autor e demais comproprietários tenham livre acesso ao rego, nos moldes em que antes o faziam (nos “termos tradicionais”), sem necessitarem de entrar no respectivo terreno através dos portões colocados pelos réus, portões esses que, se parcialmente ocuparem terreno que não integra o prédio dos réus recorrentes (o terreno do regadio), obviamente terão de ser retirados, pois só assim se respeitará o direito de compropriedade do autor, que é um direito pleno, bem diferente do limitado direito de servidão, com o qual seria compatível a existência dos portões.
Assim, contrariamente ao defendido pelos apelantes no presente recurso, os limites da condenação, estão, como teriam de estar, bem definidos na sentença e acórdão que se executa.
Não há que fixar o que já foi cumprido e o que falta cumprir (salvo se fosse para reduzir o prazo, o que aqui nem se questiona, até porque o exequente não recorreu).
O que falta fazer tem apenas interesse para a determinação do custo da prestação, sendo que na avaliação efectuada já foi tido e conta (facto nº 12). Contudo, tal avaliação é normalmente efectuada numa fase posterior, isto é, se os executados não cumprirem no prazo que lhes foi fixado na sentença recorrida, como prevê o art.º 870º do CPC.
Nesta fase cumpre apenas apreciar e decidir, se, em face dos factos provados, a ordenada reposição do direito de propriedade (compropriedade) do autor/exequente foi ou não cumprida e, caso não o tenha sido, fixar o prazo para o respectivo cumprimento.
Ora, em face dos factos provados, os executados terão ainda de repor a céu aberto os cerca de 10 metros do trajecto do regadio que estão “protegidos por uma escadaria de pedra e por uma grade de ferro amovível”.
Bem como, na “vala do regadio” terão de retirar as manilhas de meia cana de cimento e o passadiço em pedra, repondo o que antes existia – rego a céu aberto com cerca de um metro de largura e 50 cm de profundidade, dividido em duas partes, uma para a condução da água outra para a passagem de pessoas (factos nº 13º e 16º da sentença exequenda), em toda a sua extensão e sem qualquer tipo de obstrução, de forma a que o exequente e demais comproprietários continuem a ter acesso ao dito “regadio”, isto é ao terreno de que são proprietários, como sempre tiveram.
É precisamente isto que significa nos “termos tradicionais”, ou seja, como sempre foi efectuado, nos moldes anteriores à ocupação pelos réus, aqui executados, de terreno que não lhes pertencia.
A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.
Nem por embargos à execução, muito menos na fixação de prazo para a prestação pelo executado, ou na verificação do seu cumprimento, podem voltar a discutir-se questões que estão definitivamente assentes e que foram o fundamento da condenação na obrigação que aqui se executa.
Pode sim interpretar-se o título (sentença ou acórdão) em face do seu texto, como fizemos, mas nunca voltar a apreciar questões que não só respeitam à fase declarativa do direito, como nessa mesma sentença/acórdão foram apreciadas e decididas (questão do portão).
Pelo exposto não acolhemos as conclusões dos apelantes, impondo-se a confirmação da decisão recorrida.

V – DELIBERAÇÃO

Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o presente recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes.
Guimarães, 17-10-2019

Eva Almeida
Maria Amália Santos
Ana Cristina Duarte