Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1677/19.9T8BRG.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
DECLARAÇÃO DE ACTIVIDADE
FOLHAS DE REGISTO
DISCOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I - Não é a falta da denominada “Declaração de Actividade” que integra o tipo legal da contra-ordenação prevista no artigo 15.º n.º 7 do Regulamento (CEE) n.º 3821/85, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20/12, na redacção dada pelo art.º 26º do Regulamento (CE) nº 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006, conjugado com o artigo 25º n.º 1 da Lei n.º 27/2010, mas sim a falta das folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores, que devem estar na posse do condutor de forma a poderem ser apresentadas, de imediato, quando solicitadas.

II- O que justificaria a sua falta e excluiria a ilicitude da sua conduta seria a exibição, no acto da fiscalização, de documento justificativo da falta de registo, documento que poderia ser a declaração de actividade ou um qualquer outro documento.
Decisão Texto Integral:
RECURSO PENAL - PROC. N.º 1677/19.9T8BRG

RECORRENTE: RODOVIÁRIA ..., S.A.,
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO
Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Barcelos, Juiz 1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório

No âmbito da decisão administrativa proferida pela Unidade Local de Braga da Autoridade para as Condições do Trabalho em 13/02/2019, foi aplicada à Recorrente RODOVIÁRIA ..., S.A., a coima de 27 (vinte e sete) unidades de conta pela prática da contra ordenação prevista e punida no art.º 25.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto.
A arguida/recorrente não concordando com a decisão administrativa recorreu para o Juízo do Trabalho de Barcelos, pugnando pela procedência do recurso, com as demais consequências.

Recebido o recurso e realizado o julgamento foi proferida decisão que terminou com o seguinte dispositivo:

“Nestes termos e face ao exposto, julgo totalmente improcedente o presente recurso de impugnação judicial interposto pela arguida RODOVIÁRIA ..., S.A. e mantenho na íntegra a decisão proferida pela Unidade Local de Braga da Autoridade para as Condições do Trabalho em 13/02/2019.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça no valor equivalente a 3 UC’s - art.º 59.º do Decreto-Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro e art.º 8.º, n.º 7 e tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
Notifique.
Comunique à Unidade Local de Braga da Autoridade para as Condições do Trabalho - art.º 70.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro.”

A arguida RODOVIÁRIA ..., S.A. inconformada com esta decisão, que julgou improcedente a impugnação judicial e manteve a decisão proferida pela Unidade Local de Braga da Autoridade para as Condições do Trabalho, recorreu para este Tribunal da Relação de Guimarães pedindo a revogação da decisão com a sua substituição por outra que a absolva da infracção que lhe é imputada pela autoridade administrativa, motivando o seu recurso com as seguintes conclusões:

“ 1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual decidiu julgar improcedente o recurso de impugnação judicial interposto,
2. porquanto, em suma, considerou obrigatória a apresentação, por parte do Motorista da Recorrente, de Declaração de Actividade relativamente aos dias de que não disponha de registo tacográfico por se ter encontrado de férias.
3. Incorrendo, assim, a sentença recorrida em manifesto erro na aplicação e interpretação do Direito.
4. É que, nos termos da legislação — nacional e comunitária — aplicável ao caso vertente, os Motoristas não estão obrigados a fazer-se acompanhar nem a apresentar Declaração de actividade.
5. De resto, nos termos do art. 36º n.º 1 do Regulamento (CE) nº 165/2014, os Motoristas devem exibir ao agente autuante, sempre que solicitado:
a. as folhas de registo (referentes aos dias em que conduziu veículos equipados com aparelhos de tacógrafo analógico) e/ou
b. o cartão de condutor (quanto aos dias em que conduziu veículos equipados com aparelhos de tacógrafo digital).
6. Sendo que, poderá, ainda, ser exigida a exibição de registo manual e impressão do cartão do condutor, quando este cartão se encontre danificado, a funcionar mal ou não estiver na posse do condutor — cft. art.º 15º do Regulamento 561/2006 por remissão do art.º 36º iii) do Regulamento 165/2014.
7. E, ainda, nas situações previstas no n.º 3 do artigo 36º do Regulamento 165/2014, seja, em casos de roubo, extravio ou defeito de cartão de condutor, ou mau funcionamento do aparelho — cft. artigos 29º e 37º do Regulamento 165/2014.
8. O que, não sucedeu no caso em apreço.
9. Resultando, assim, à evidência que apenas e só nas supra identificadas situações é exigível aos motoristas que se façam acompanhar de documento comprovativo que justifique a ausência de registos tacográficos/ discos.
10. Não se encontrando, pois, prevista a obrigação de os Motoristas se fazerem acompanhar de declaração de actividade em situações de férias como a dos presentes autos.
11. Pelo que, mal andou a sentença recorrida ao afirmar que quando o aludido normativo se refere a “registo manual e impressão” engloba os discos bem como as declarações de actividade.
12. Pois que, e na verdade, inexiste qualquer norma — nacional ou comunitária — que obrigue à utilização e exibição de Declaração de Actividade.
13. Ademais, nos presentes autos, ficou provado que o condutor esteve de férias nos dias 03 a 15 de Setembro (Facto Provado F).
14. Tendo o Tribunal a quo, contrariando a lei, entendido que deveria tal Motorista fazer-se acompanhar da dita Declaração de Actividade, verificando-se a prática da infracção em apreço.
15. Com tal decisão, o Tribunal a quo descurou o disposto no artigo 15º nº 7 do Regulamento (CE) nº 3821/85 de 20 de Dezembro, incorrendo assim numa errada aplicação do Direito ao caso concreto.
16. Na verdade, o Motorista apresentou os documentos legalmente exigíveis, não podendo ser exigido, nos termos da lei, a exibição de qualquer outro documento, nomeadamente a Declaração de Actividade, impondo-se a revogação da sentença recorrida.
17. Acresce ainda que, a Doutrina e Jurisprudência Portuguesas têm sufragado a tese ora expendida pela Recorrente — seja, a de não obrigatoriedade da dita Declaração de Actividade no ordenamento jurídico Português — citando-se a título de exemplo as decisões preferidas nos processos 1269/16.4T8VFR, 981/17.5T8FIG e bem assim no Acórdão proferido pela 4ª Secção (Social) do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo nº 2010/16.7T8BRR.
18. Nesta conformidade, impõe-se a revogação da sentença recorrida, com a consequente absolvição da Recorrente.”
Por despacho de 12-09-2019, foi o recurso admitido na 1.ª instância.
O Ministério Público apresentou contra alegação, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
Remetidos os autos para este Tribunal da Relação de Guimarães, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, no sentido da improcedência do recurso, parecer esse que foi objecto de qualquer resposta.
Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.
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Objecto do Recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente na sua motivação – artigos 403º n.º 1 e 412º n.º 1, ambos do C.P.P. e aqui aplicáveis por força do artigo 50.º n.º 4 da Lei n.º 107/2009, de 14/09.
Atentas as conclusões de recurso a questão que importa decidir cinge-se em apurar se a arguida/recorrida cometeu a contra-ordenação que lhe foi imputada pela entidade administrativa.

Fundamentação de facto

O Tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto.

A) A recorrente dedica-se à atividade de transportes terrestres de passageiros diversos;
B) A recorrente é proprietária do veículo pesado de passageiros com a matrícula NC;
C) Em 27/09/2017, pelas 11 horas e 25 minutos, a arguida fazia circular aquele veículo, conduzido pelo seu trabalhador D. F. (titular da carta de condução …, admitido em outubro de 1989 com a categoria de motorista de autocarros), sob a sua autoridade e direção;
D) No momento da fiscalização ocorrida nessa data e hora, após extração dos dados do cartão do condutor, o agente autuante verificou que não constava a informação respeitante à totalidade do período dos últimos 28 dias (entre 30/08/2017 e 27/09/2017), encontrando-se em falta os registos entre as 22:26 do dia 02 de setembro e as 05:12 do dia 16 de setembro;
E) No momento dessa fiscalização, o motorista não apresentou ao agente da autoridade qualquer outro registo que demonstrasse a atividade prestada nos dias em falta, nem apresentou qualquer declaração de atividade;
F) No período entre 03 e 15 de setembro de 2017, o motorista esteve a gozar férias;
G) A arguida, na qualidade de entidade empregadora, está obrigada a conhecer e cumprir a lei que regula as relações de trabalho subordinado e que lhe atribuiu a obrigação de organizar o trabalho do seu condutor de modo a que este possa dar cumprimento às obrigações de exibição dos discos e registos;
H) Com a diligência normal, a recorrente podia e devia ter atuado de forma diferente, satisfazendo os preceitos legais, não se tendo demonstrado que os desconhecesse e, muito menos, que estivesse impedida de os satisfazer;
I) A recorrente presta formação aos seus motoristas (entre os quais o que foi fiscalizado no âmbito destes autos) em matéria de tacógrafos analógicos e digitais e respetivos discos ou cartão de condutor e ainda de tempos máximos de condução, pausas e períodos de repouso;
J) A recorrente entrega mensalmente aos seus motoristas “flashes informativos” de onde constam diversas informações relacionadas com o transporte público de passageiros, nomeadamente sobre utilização e manuseamento dos aparelhos de tacógrafo, utilização exibição dos discos e utilização do cartão de condutor;
K) Todos os motoristas da recorrente conhecem a obrigação que sobre si impende de circularem com os discos dos 28 dias anteriores e de os exibirem às autoridades;
L) A recorrente procede à verificação e fiscalização dos registos tacográficos dos seus motoristas, entre os quais D. F..

Fundamentação de direito

Da prática da imputada infracção

Defende a recorrente que em função da factualidade provada deveria ter sido absolvida da imputada infracção, já que o motorista ao seu serviço não estava obrigado a apresentar à autoridade policial a denominada «Declaração de Actividade», tendo assim o tribunal a quo feito errada interpretação das normas aplicáveis.

A recorrente foi condenada por o seu motorista não ter apresentado todos os registos relativos aos 28 dias anteriores à fiscalização, já que em relação a esse período não exibiu os registos dos dias 03 a 15 de Setembro, infringindo assim o p. e p. pelo artigo 25.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 27/2010, de 30/08 (regime sancionatório por violação das regras sobre tempos de condução, pausas e períodos de repouso de condutores rodoviários), a qual sob a epígrafe de “Apresentação de dados a agente encarregado da fiscalização” prescreve o seguinte:

“1 — Constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização:
(…)
b) De cartão de condutor, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar;”

Por seu turno, importa ainda atentar no prescrito no artigo 36.º, n.º 1 do Regulamento (UE) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Fevereiro de 2014, respeitante à utilização de tacógrafos nos transportes rodoviários, no qual se estabelece o seguinte:

“1. Se conduzirem um veículo equipado com tacógrafo analógico, os condutores devem apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem:
i) As folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores;
ii) O cartão de condutor, se o possuir; e
iii) Qualquer registo manual e impressão efetuados durante o dia em curso e nos 28 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006.”

Por fim, ainda de acordo com a alínea a) do n.º 7 do artigo 15.º do Regulamento (CEE) n.º 3821/85, alterado pelo referido Regulamento (CE) n.º 561/2006:

“a) Sempre que o condutor conduza um veículo equipado com um aparelho de controlo em conformidade com o anexo I, deve poder apresentar, a pedido dos agentes encarregados do controlo:

i) as folhas de registo da semana em curso e as utilizadas pelo condutor nos 15 dias anteriores; o
ii) cartão de condutor, se o possuir; e
iii) qualquer registo manual e impressão efectuados durante a semana em curso e nos 15 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento (CE) n.º 561/2006.
No entanto, após 1 de Janeiro de 2008, os períodos referidos nas subalíneas i) e iii) abrangerão o dia em curso e os 28 dias anteriores.”

Da alínea b) do citado preceito resulta o seguinte:

Sempre que o condutor conduza um veículo equipado com aparelho de controlo em conformidade com o anexo 1B, deve poder apresentar, a pedido dos agentes encarregados do controlo:

i) Cartão de condutor de que for titular;
ii) Qualquer registo manual e impressão efectuados durante a semana em curso e nos 15 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006 e
iii) As folhas de registo correspondentes ao período referido na alínea anterior, no caso de ter conduzido um veículo equipado com um aparelho de controlo com anexo I.

No entanto, após 1 de Janeiro de 2008, os períodos referidos na subalínea ii) devem abranger o dia em curso e os 28 dias anteriores.”

E a alínea c) do citado n.º 7 do artigo 15.º do Regulamento (CEE) n.º 3821/85 do Conselho estabelece ainda o seguinte:

Os agentes autorizados para o efeito podem verificar o cumprimento do Regulamento (CE) 561/2006 através da análise das folhas de registo ou dos dados, visualizados ou impressos, registados pelo aparelho de controlo ou pelo cartão de condutor, ou na falta destes meios, através da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de qualquer disposição, como as previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 16”. (sublinhado nosso).

Defende a recorrente a inexistência na ordem jurídica, nacional ou comunitária, de disposição legal que imponha a obrigatoriedade da apresentação de declaração de actividade pelos motoristas, bem como a inaplicabilidade do art.º 36º, n.º 1 do Regulamento CE nº 165/2014, que impõe a obrigatoriedade de apresentação pelos motoristas, ao agente autuante, de folhas de registo, cartão de condutor e ainda registo manual e impressão do cartão de condutor, apenas quando este se encontrar danificado, a funcionar mal ou não estiver na posse do condutor, ou ainda nos casos de roubo, extravio, defeito do cartão de condutor, ou mau funcionamento do aparelho.
Antes de mais importa esclarecer que a arguida/recorrente não foi punida pelo facto de não ter apresentado à autoridade fiscalizadora o formulário denominado “Declaração de Actividade”, mas sim e tal como resulta da factualidade apurada, foi punida por o seu motorista aquando da fiscalização não ter apresentado os registos referentes à totalidade dos 28 dias anteriores.
Dos citados normativos resulta patente que a fiscalização poderá ser efetuada através da análise das folhas ou dos dados visualizados ou impressos, registados pelo aparelho de controlo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, através da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de qualquer disposição.
O legislador não pretendeu, apenas, assegurar a existência dos registos em questão, mas sim e também a sua imediata apresentação ou justificação documentada da sua falta, às autoridades competentes quando tal lhes seja solicitado no controlo em estrada (sublinhado nosso).
Tal decorre da letra da lei, ao referir no art.º 15º, nº 7, do Regulamento (CEE) nº 3821/85 do Conselho, que o condutor “deve poder apresentar, a pedido dos agentes encarregados do controlo” (sublinhado nosso), da obrigação de conservar a bordo as folhas de registo dos 28 dias anteriores ao da fiscalização, do facto dos agentes poderem verificar o cumprimento do Regulamento, através da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de qualquer disposição (sublinhado nosso) e do facto de o controlo dever ser feito em estrada (por contraposição ao controlo nas instalações da empresa).
A lei prevê assim o momento da apresentação de tal documentação comprovativa quer da condução, quer a justificativa do incumprimento de qualquer disposição (designadamente da impossibilidade de apresentação da totalidade dos 28 discos anteriores ao do dia da fiscalização) – no acto da fiscalização -, razão pela qual tais documentos tem de estar na posse do condutor por forma a poderem ser apresentados às autoridades que procedem à fiscalização na estrada.
Em suma, para que o agente encarregado da fiscalização possa analisar e verificar do cumprimento do citado Regulamento tem o condutor necessariamente ter consigo ou os registos dos 28 dias anteriores ao da fiscalização ou documento comprovativo que permita justificar o facto de não possuir um ou mais destes registos.
Acresce dizer que tem sido entendimento dominante da jurisprudência, o de que a contra-ordenação muito grave prevista e punida nos termos das disposições conjugadas dos arts. 15.º, n.° 7, alínea a), e alíneas i) e iii) do Regulamento CEE n.° 3821, do Conselho, de 20/12/1985, na redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.° 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15/03/2006, e 25° n.°1, alínea b) da Lei n.° 27/2010, de 30/08, ou seja a não apresentação, pelo motorista, das folhas do registo tacógrafo relativas ao período dos 28 dias anteriores solicitadas pelo agente fiscalizadora, verifica-se com a não apresentação de qualquer uma destas folhas, já que esta não apresentação é o único facto constitutivo do tipo legal.
Este é também o entendimento que forma unânime tem sido sufragado por este Tribunal da Relação de Guimarães, designadamente nos seguintes arestos: Proc. n.º 1550/14.7T8VCT, Ac. de 6/10/2016 (não publicado); Proc. n.º 1154/15.7T8BCL.G1, Ac. de 20/10/2016 (relatora Alda Martins), Procs n.º 2169/17.6T8VNF, n.º 2401/17.6T8VNF e n.º 4016/17.0T8VNF por nós relatados, respectivamente, em 19/10/2017, em 16/11/2017 e em 05/04/2018 (consultáveis em www.dgsi.pt), passando a transcrever o sumário do que se fez constar a este propósito, neste último acórdão.
I –. Mostra-se praticada a infracção ao disposto no art. 15.º, n.º 7, als. a) e b) do Regulamento (CEE) n.º 3821/85, de 20 de Dezembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, se o condutor do veículo não apresentar as folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores, sendo necessário, para excluir a ilicitude da sua conduta, que no acto da fiscalização o mesmo exiba documento comprovativo que permita justificar o incumprimento, nos termos da al. c) do citado art. 15.º, n.º 7, seja a «Declaração de Actividade» ou um qualquer outro documento.”

Com efeito, o legislador não pretendeu assegurar apenas a existência dos registos em causa, mas também, a sua imediata apresentação às autoridades fiscalizadoras quando tal seja por elas solicitado no controlo em estrada, a fim de permitir àquelas autoridades percepcionar os tempos de trabalho e não trabalho, pausas e períodos de repouso dos trabalhadores envolvidos no transporte rodoviário quer de mercadorias, quer de passageiros nos últimos 28 dias e isto, quer o motorista tenha, ou não, exercido a condução nesse período que antecedeu o dia da fiscalização.

Impunha-se assim que a arguida/empregadora tivesse entregado, atempadamente, ao seu motorista os documentos que o mesmo pudesse exibir às entidades policiais e que justificassem a ausência de registos.

Retornando ao caso dos autos diremos que não tendo o motorista consigo a totalidade dos registos correspondentes ao trabalho realizados nos últimos 28 dias, designadamente por não ter conduzido pelos mais diversos motivos, neles se incluindo o gozo de férias, mostra-se verificada a imputada infracção, sendo certo que de forma de excluir a ilicitude da sua conduta, teria a arguida de ter preenchido e entregue ao motorista quer o formulário previsto no artigo 11°, n° 3, da Directiva n.° 2006/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Março de 2006 e na Decisão da Comissão de 14 de Dezembro de 2009 (a denominada Declaração de Actividade), quer qualquer outra justificação que viesse a ser apresentada nos termos da alínea c) do artigo 15.º, n.°7 do Regulamento n.°3821/85.

Como refere o Tribunal da Relação de Évora, no Acórdão proferido em 1/10/2015, Proc. n.º 77/15.4T8STC.E1, que pode ser consultado em www.dgsi.pt,
“Da interpretação conjugada dos referidos normativos legais, resulta, pois, em síntese, que quando solicitado por agente encarregado de fiscalização, o condutor de veículo de transporte rodoviário pesado de mercadorias deve apresentar o cartão de condutor de que for titular, as folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores, sendo que a não apresentação de tais elementos constitui contra-ordenação muito grave.
Naturalmente que a fiscalização poderá ser efectuada através da análise das folhas ou dos dados, visualizados ou impressos, registados pelo aparelho de controlo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, através da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de qualquer disposição.
Note-se que, tratando-se, por exemplo, de um condutor inserido em escalas de serviço, deve ser portador de um extracto da escala de serviço e de uma cópia do horário de serviço, devendo incluir o período mínimo que abranja os 28 dias anteriores (cfr. artigo 16.º do Regulamento 561/2006).”
Resumindo, não sendo apresentada ao agente fiscalizadora todos ou alguns dos registos referentes aos 28 dias que antecederam o dia da fiscalização de condução, deve o condutor apresentar documento comprovativo que justifique a ausência das folhas de registo em relação aos dias em falta, pois só por esta via, se pode concluir que foram apresentadas ou não, ao agente fiscalizador todas as folhas referentes a período temporal em questão e assim excluir ou não a ilicitude da sua conduta.
Neste sentido ver entre outros, Acórdão da Relação do Porto de 05/12/2011, Proc. 68/11.4TTVCT.P1, relatora Paula Leal de Carvalho; Acórdão da Relação Évora de 8/11/2017, Proc.1523/15.2T8BJA.E1, relatora Paula Paço; Acórdão da Relação de Lisboa, de 16/03/2016, Proc. 196/15.7T8BRR.L1.4, relator José Eduardo Sapateiro e de 19/04/2017, Proc. 14013/16.7T8LSB.L1, relatora Maria José Costa Pinto.
Cabe-nos dizer que a inexistência no acto da fiscalização de documento justificativo ou comprovativo da falta do registo dos 28 dias anteriores ou de alguns destes dias, não pode ser colmatada a posteriori, pois tal conduziria à completa inutilidade das ações inspetivas, revelando-se assim desprovido de interesse o facto de se ter apurado que o condutor no período entre 03 e 15 de Setembro de 2017, esteve de férias, uma vez que não foi exibido ao agente fiscalizador qualquer documento que atestasse tais factos, o que como acima já deixámos expresso teria excluído a ilicitude da conduta.
Caso assim não se entendesse, levaria a que os condutores circulassem sem a documentação legalmente exigível, inviabilizando a fiscalização da sua actividade e permitindo ocultar a existência das folhas de registo nas quais se verificassem infracções, com o pretexto de que nesse dia não tinham registos por o condutor não ter conduzido, de nada assim servindo a atividade dos agentes fiscalizadores. A que acresce dizer que tal obstaria, sem margem para dúvidas, ao efectivo controlo dos tempos de trabalho prestados pelos condutores pondo em causa os princípios subjacentes à regulamentação comunitária nesta matéria referentes à melhoria da segurança rodoviária, à melhoria das condições sociais dos trabalhadores dos transportes rodoviários e à promoção da concorrência leal no sector do transporte rodoviário
Por fim, voltamos a repetir que não é a falta de declaração de actividade que integra o tipo legal da contraordenação do artigo 15.º n.º 7 do Regulamento (CEE) n.º 3821/85, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20/12 conjugado com o artigo 25º n.º 1 da Lei n.º 27/2010, o que integra o tipo legal da infracção é a falta das folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores.
No caso em apreço, o tipo legal, mormente o elemento objectivo da infracção mostra-se preenchido, pois o condutor efetivamente não possuía consigo os 28 registos.
O que justificaria a sua falta e excluiria a ilicitude da sua conduta seria a exibição, no acto da fiscalização, de documento justificativo da falta de registo, documento que poderia ser a declaração de actividade, que constitui documento idóneo justificativo do incumprimento ou um qualquer outro documento, o que no caso em apreço não sucedeu.

Improcede assim o recurso

DECISÃO

Por todo o exposto e nos termos dos artigos 50.º e 51.º do Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais e de Segurança Social (Lei n.º 107/2009, de 14/09), acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se a sentença recorrida
Custas do recurso a cargo da arguida/recorrente, fixando a taxa de justiça em 4 UC.
Após trânsito em julgado comunique à ACT com cópia certificada do acórdão.
Guimarães, 17 de Dezembro de 2019

Vera Maria Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
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Sumário:

I - Não é a falta da denominada “Declaração de Actividade” que integra o tipo legal da contra-ordenação prevista no artigo 15.º n.º 7 do Regulamento (CEE) n.º 3821/85, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20/12, na redacção dada pelo art.º 26º do Regulamento (CE) nº 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março de 2006, conjugado com o artigo 25º n.º 1 da Lei n.º 27/2010, mas sim a falta das folhas de registo do dia em curso e dos 28 dias anteriores, que devem estar na posse do condutor de forma a poderem ser apresentadas, de imediato, quando solicitadas.
II- O que justificaria a sua falta e excluiria a ilicitude da sua conduta seria a exibição, no acto da fiscalização, de documento justificativo da falta de registo, documento que poderia ser a declaração de actividade ou um qualquer outro documento.

Vera Sottomayor