Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1719/14.4TBVCT-A.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: CÓPIA DOCUMENTOS PARTICULARES
FALTA DE IMPUGNAÇÃO
VALOR PROBATÓRIO
SUFICIÊNCIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE REVISÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

.As cópias dos documentos particulares não impugnados terão o valor probatório dos originais.
. Se impugnadas, tanto relativamente às cópias como aos originais, incumbe à parte que os apresentou, provar a sua genuinidade e tanto o original como a cópia, são livremente apreciados pelo tribunal, em conjugação com a demais prova produzida.
. A circunstância de não estar junto aos autos o original de um documento impugnado, mas apenas a sua cópia, não invalida que se dê como provado o facto que o mesmo pretende provar, se esse mesmo facto resultar da demais prova produzida.
. Se o recorrente considerava determinante o original de um determinado documento que sabia estar na sua posse, deveria ter desenvolvido buscas mais aprofundadas, percorrendo, um por um, todos os documentos que guarda no seu escritório (ou na sua habitação), com o fim de o localizar, pois que não foi invocada qualquer circunstância anómala, no local onde foi localizado o documento que pudesse ter determinado ou contribuído para a sua não localização atempada.
. Se o tivesse feito, teria de o ter localizado, como veio a ocorrer, sendo certo que dispôs de tempo suficiente para o efeito, numa situação em que entre a sua citação para a ação (enquanto interveniente principal do lado ativo) e o encerramento da discussão decorreram quase dois anos.
. Tem assim de lhe ser imputada a falta da junção tempestiva do original.
. Não pode valer como confissão eficaz a declaração inserta num documento que se encontra apenas assinada por um dos cônjuges e relativa a bens que a direitos cuja alienação ou oneração necessite de autorização do outro, como acontece relativamente a imóveis quer sejam bens próprios quer sejam bens comuns.
. O reconhecimento de factos desfavoráveis que não possa servir como confissão, vale como elemento probatório a valorar livremente pelo tribunal, não podendo tal documento valer por si só para alterar a decisão a rever.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I - Relatório

A. J. veio interpor recurso extraordinário de revisão contra M. N., M. M. e marido A. T. e R. N. e marido J. P..

Alega, em síntese, que na ação principal se discutiu a propriedade de seis prédios identificados na petição iniciala e que se encontram registados a favor de M. M., filha do de cujus, J. N., autor da herança.
Tais bens, embora registados a favor da R. M. M., são pertença da herança do J. N., da qual a A. na ação, M. N., é cabeça-de-casal e da herança ilíquida e indivisa aberta por morte de M. C. (1ª mulher do J. N.), pedindo, designadamente, que os RR. sejam condenados a restituir à herança Autora a parte que lhe corresponde naqueles prédios. No decurso da ação e de forma a assegurar a legitimidade das partes, o ora recorrente foi chamado a intervir, pois era o único herdeiro que não era ainda parte dos autos.
O julgamento da matéria de facto, no qual se julgaram não provados os factos que permitiriam concluir pela aquisição por usucapião do direito de propriedade sobre os referidos bens pelo J. N., só teve esse resultado porque as declarações constantes do documento junto a fls 214 e que corporizam, em seu entender, uma confissão da Ré M. M., não foi relevada pelo Tribunal, o que ficou a dever-se apenas à circunstância da genuinidade da assinatura ter sido por esta impugnada e não ter sido possível realizar uma perícia que viesse a demonstrar o seu contrário, porque apesar das buscas incessantes nesse sentido não se logrou localizar o paradeiro do original, ficando aquele meio de prova inviabilizado.
E como não foi possível realizar uma perícia à assinatura aposta na referida declaração, o documento nem sequer foi ponderado na análise conjugada da restante prova produzida.
Acontece que, caso tivesse sido junto o original e realizada a perícia se viesse a concluir que, como de facto corresponde à verdade, que a assinatura aposta na declaração procede do punho da Ré M. M., este resultado determinaria a confissão desta de que “a compra que formalmente realizamos a nossos tios, R. N. e marido J. P., a qual foi realizada no dia 24 de abril de 2001, através de escritura pública lavrada a fls 08, do livr nº 288-E, do 1º Cartório Notarial de …, não corresponde, de facto, a transacção alguma para o nosso nome, uma vez que o prédio em causa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ... é propriedade plena e exclusiva dos pais e sogros dos declarantes, respectivamente J. N. e esposa M. C., pelo que nos obrigamos a respeitar e fazer respeitar a sua vontade quanto ao destino e forma de ocupação desse prédio, sendo que dele podem usufruir nos termos e condições que entenderem”, conforme consta da declaração.
Assim, este documento corporiza uma declaração com força probatória plena dos factos que nele se reconhecem, o que vincula a própria e o tribunal. Considerando-se confessados os factos constantes da declaração, a tese da Autora irá vingar, permitindo que se conclua que a ré M. M. mentiu sob juramento legal, assim como mentiram as testemunhas que esta apresentou e concluindo ainda pela credibilidade dos depoimentos do interveniente A. J., ora recorrente, filho do de cujus, assim como pela credibilidade do depoimento da mulher do recorrente, O. N..
O recorrente conseguiu localizar o original do documento no dia 3 de janeiro de 2020, o qual se encontrava no interior de um dos móveis do seu escritório destinado ao arquivo de processos.

E concluiu o seu recurso nos seguintes termos:

1ª - O presente recurso de revisão tem como fundamento a apresentação de um documento ORIGINAL que o Recorrente não pôde fazer uso no decurso do processo a rever e que, por si é, é suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida (cfr art. 6962 aI. c) do CPC).
2ª - Através dos presentes autos, a herança do de cujus J. N., encabeçada pela viúva deste e sua esposa em segundas núpcias, arroga-se com proprietária, conjuntamente com a herança da pré-falecida primeira esposa daquele, de determinados prédios que alega encontrarem-se ficticiamente registados em nome da filha do de cujus, M. M., por questões de oportunidade ligadas a ocultação de bens da esfera jurídica formal do de cujus, requerendo, entre o mais, a reinvindicação dos mesmos.
3ª - Perante a prova produzida nos autos, essencialmente testemunhal, o Tribunal, não tendo ficado suficientemente convencido acerca de nenhuma das versões apresentadas, que se revelaram contraditórias, julgou não provados os factos que conduziriam à procedência da acção, decidindo, assim, contra a parte onerada com a prova, a Autora.
4ª - Para este (infeliz e injusto) resultado foi decisiva a circunstância de a Ré M. M., em total desrespeito pela memória do seu pai e contra a verdade que bem conhece, ter impugnado, por falsa, a SUA assinatura numa declaração na qual CONFESSA, entre o mais, " ... que a compra que formalmente realizamos a nossos tios, não corresponde, de facto, a transação alguma para nosso nome, uma vez que o prédio em causa, é propriedade plena e exclusiva dos pais e sogros dos declarantes, respetivamente J. N. e esposa M. C.".
5ª - A então requerida e ordenada perícia à letra e assinatura da Ré M. M. ficou inviabilizada por não se ter logrado identificar o ORIGINAL desta declaração, que constituía seu objeto;
6ª - Acontece que, em benefício da Justiça material, o Recorrente, após aturadas e insistentes buscas, no passado dia 3 de Janeiro de 2020 logrou encontrar o dito ORIGINAL no interior de um dos móveis do seu escritório destinado ao arquivo de processos, o ALMEJADO ORIGINAL, sendo agora possível realizar-se a requerida e ordenada perícia, caso a assinatura que consta do mesmo venha, contra o que se deseja, em benefício de uma devida retratação por parte da Ré M. M., a ser novamente impugnada por falsa.
7ª - Este documento, envolvendo, como envolve, uma CONFISSÃO da Ré M. M. da trama dos autos e dos factos que foram tidos como não provados, determina a PROVA PLENA dos mesmos, pois, correspondendo a uma prova vinculada, é irrelevante criar no espirita do Juiz uma situação de dúvida, dado que a lei manda resolver essa situação de dúvida no sentido indicado pela mesma prova, o que conduz a uma inversão do sentido da decisão.
8ª - Aliás, a junção deste documento aos autos a rever, tem ainda a virtualidade de, por um lado, conferir total credibilidade aos depoimentos da esposa do Recorrente e deste próprio, que é irmão da Ré M. M. e filho do de cujus, advogado de profissão e pessoa que, nesta qualidade, mas também na de filho, acompanhou todos os negócios dos autos e redigiu os textos que os corporizam e, por outro lado, de comprovar as FALSAS DECLARAÇÕES que a Ré M. M. prestou, sob juramento, nos presentes autos.
9ª - A legitimidade recursiva do Recorrente funda-se na sua dupla qualidade de parte, visto ser interveniente principal, do lado ativo, tendo ficado vencido nos autos e ainda de pessoa direta e efetivamente prejudicada pela decisão. na medida em que é herdeiro do de cujus e a improcedência da acção determina que os bens cuja propriedade se reivindica não passem a integrar o acervo hereditário referido, ficando este prejudicado em termos patrimoniais (dr. art, 6319 do CPC);
10ª - O presente recurso é tempestivo (dr. art. 697º do CPC), sendo que para a instrução do mesmo o Recorrente junta certidão do documento em que se funda o pedido (dr. art. 6989 do CPC).

Termos em que, admitido o Recurso, devem os Recorridos ser oportunamente notificados para responderem, querendo, seguindo-se os ulteriores termos previstos nos arts. 700º, nº 1, e 701º, nº 1, al. b), do CPC, alterando-se a decisão em sentido mais favorável ao Recorrente, nos termos supra expostos.

E requereu a produção da seguinte prova:
A) - Documental:
1.O original da declaração, cuja fotocópia consta do processo a fls 214, sendo que, neste momento. se requer a Vª Exª que, desse documento original, se junte apenas uma CERTIDÃO, mais se requerendo que o respectivo originai apenas seja entregue em tribunal quando o Mmº Juiz assim o determinar e, em caso de impugnação da sua autoria, sempre previamente à realização ao exame à letra e assinatura nele constante e da autoria da Recorrida M. M., o que se requer como forma de prevenir eventual extravio e/ou dano nesse documento, o que inviabilizaria o desiderato que se pretende alcançar com a instauração do presente recurso de revisão.
2.Requer-se a Vª Exª que, na eventualidade da Recorrida M. M. alegar que a assinatura aposta no documento que ora se junta não procede do seu punho que para a realização da perícia requerida a fls.222v. e na qual se formularam os respectivos quesitos a fls.224, seja admitida a junção aos autos de diversos documentos autênticos e autenticados onde consta a assinatura do seu punho de forma exactamente igual à que existe no documento ORIGINAL - para além dos documentos Já incorporado nos autos a fls. 137/139, 148/152, 176 e ainda a fls 224v/227 - o que agora se requer como forma de auxiliar o referido exame pericial, documentos esses que, após douto despacho de Vª Exª, serão remetidos aos autos e em relação aos quais aquela poderá sempre exercer o respectivo contraditório.
B) Por Declarações de Parte do Recorrente, à matéria que constitui fundamento do presente recurso.
C) Por testemunhas, cuja notificação se requer:
a) - M. L., casada, advogada, residente na Rua …, Vila do Conde;
b) - C. M., casada, solicitadora, residente na Rua ..., Viana do Castelo;
c) - J. B., solteira, maior, funcionária forense, residente na Rua …, Viana do Castelo;
d) - M. F., casada, empregada de limpeza, residente no Caminho …, Viana do Castelo;
e) - O. N., casada, residente na Rua …, Viana do Castelo.

Notificada a parte contrária, veio esta responder, alegando, em síntese, que o documento no qual se pretende fundamentar o presente recurso de revisão não é um documento novo, uma vez que já foi junta a sua cópia nos autos da ação principal em 10.09.2015, em sede de audiência prévia, assumindo-se como cópia de um original datado de 21.04.2001. O ora recorrente já prestou depoimento de parte quanto ao teor e assinatura do mesmo, não constituindo a cópia e o seu original elementos probatórios distintos. As cópias impugnadas não deixam de constituir meios de prova, sendo livremente apreciadas pelo tribunal e valoradas em confronto com a demais prova produzida nos autos.
Por outro lado, o documento por si só não abala o que foi dado como provado no processo principal, pretendendo o recorrente que se venha a produzir prova nova – pericial.
Acresce que a não junção atempada aos autos do documento é de imputar ao recorrente, uma vez que este, como ele próprio reconhece, se encontrava guardado no seu escritório.
Por outro lado, o documento em que se baseia o recurso de revisão não tem a virtualidade de, por si só, demonstrar ou infirmar qualquer facto relevante, pois que exige a sua conjugação com prova pericial e testemunhal nem tem a virtualidade de, por si só, comprovar a situação de usucapião em que a A. baseou a sua pretensão na ação principal.
Por fim também não deve o recurso ser admitido com base na arguição de falsidade de depoimentos – alínea b) do artº 696º do CPC - porquanto essa arguição não é nova e já foi amplamente brandida tanto na primeira instância, como na Relação, tendo a A. propugnado pela contrariedade dos depoimentos prestados com a verdade dos factos.

Concluindo a sua resposta do seguinte modo:

I.- O documento que poderá fundamentar a revisão, tem que respeitar dois requisitos cumulativos: (i) a novidade (que significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão em causa, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pôde dele socorrer-se); e (ii) a suficiência (que implica que o documento constitua um meio de prova suscetível de, por si só, demonstrar ou infirmar facto ou factos relevantes por forma a conduzir a decisão mais favorável ao recorrente);
II.- O documento que consta de fls. 214 dos autos foi junto pela Autora, a 10/09/2015, em sede de audiência prévia, e assumia-se como cópia de um seu original datado de 21/04/2001;
III.- O documento original de que o ora Recorrente se pretende fazer socorrer, não é documento de produção nova ou de conhecimento superveniente à audiência de julgamento conduzida por este venerado tribunal;
IV.- A cópia e o seu original não se assumem como elementos probatórios distintos entre si, sem qualquer relação quanto ao seu teor ou conteúdo probatório;
V.- Das normas dos artigos 368.º e 397.º do CC extrai-se que existe uma relação entre reprodução e original na medida em que aquela é legalmente tida como representação deste último, tendo a cópia o propósito de, pela imitação/duplicação, dar a conhecer/disseminar o conteúdo do original;
VI-. Por se assumir como uma representação do original, a cópia é apreciada pelo tribunal em termos probatórios, podendo ser usada para alcançar a realidade vertida no documento copiado e, no geral, para se alcançar a verdade material dos factos;
VII.- Tal ocorre ainda que as cópias dos documentos que sejam impugnadas, nem que seja apenas quanto a uma sua parte, como sucede no caso da impugnação da assinatura por falsidade, uma vez que as mesmas podem ser livremente valoradas em confronto com a demais prova produzida em sede de audiência de julgamento;
VIII.- Em termos probatórios, a fotocópia, ainda que impugnada, tem valor probatório quanto à representação do teor do documento que lhe serve de base, podendo ser livremente apreciada pelo Tribunal;
IX.- O nosso ordenamento jurídico reconhece a ligação material (e de correspondência) entre o original e a sua cópia, ainda que esta seja impugnada, não se podendo dizer que esta última se trata de um documento integralmente novo e distinto daquele que lhe serviu de base;
X.- Pelo seu requerimento de 10/09/2015, a Recorrida não alegou a falsidade da reprodução mecânica junta aos autos mas sim que tivesse declarado o constante do texto do original e, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 374.º do CC, que a assinatura aposta nesse original fosse a sua;
XI.- Nunca esteve em causa que o documento junto a fls. 214 dos autos principais não fosse cópia do seu original, mas sim que o conteúdo do original era falso e falsa a assinatura e que o documento não representava qualquer real declaração da Recorrida M. M.;
XII.- O documento que o Recorrente agora pretende lançar mão não se trata assim de um documento novo ou superveniente quanto a este processo, sendo certo que já faz parte integrante dos elementos probatórios tido em consideração aquando da elaboração da douta sentença proferida sendo, ademais, um elemento sobre o qual o Recorrente pôde já produzir prova, por forma a atestar da veracidade da assinatura e da correspondência do aí declarado com o que teria sido assumido pela Recorrida M. M., como o mesmo fez;
XIII.- O Recorrente não abre o presente apenso com base numa verdadeira nova prova que só por si abala o caso julgado, mas sim pretende que através desse apenso se venha a produzir prova que seria nova aos autos principais e, esta sim, poderia vir a fundamentar a interposição de um recurso de revisão de sentença;
XIV.- O Recorrente alega que não pôde fazer uso do documento que agora se socorre, por não o ter encontrado antes, pese embora o mesmo estivesse em sua mão e posse;
XV.- É entendimento pacífico que o recurso de revisão de sentença, com fundamento na alínea c), do artigo 696.º, só é admissível se não for imputável à parte a impossibilidade de apresentação do documento no processo principal e se não lhe poder ser assacada a impossibilidade de o apresentar a tempo de interferir no resultado da decisão a rever;
XVI.- Como o próprio Recorrido aponta, o mesmo é advogado e o original encontrar-se-ia guardado em arquivo do seu escritório profissional, pelo menos, nos últimos 5 anos. O Recorrente dispôs assim de todos os meios e de todo o tempo para puder encontrar um documento que, presumivelmente, atento o papel que o mesmo afirma ter desempenhado na sua elaboração, se encontrava guardado por sua mão, certamente conforme as melhores práticas profissionais da atividade que desempenha, no arquivo do seu escritório;
XVII.- Qualquer “bom pai de família”, considerando o teor e a potencial relevância do documento em causa, teria assegurado saber do seu paradeiro para caso necessário dele fazer uso;
XVIII.- Estas exigências de zelo e de autorresponsabilização terão de ser consideradas ainda mais elevadas quanto ao Recorrente, atentas as faculdades jurídicas e forenses que lhe são sobejamente reconhecidas e que, indubitavelmente, melhor o habilitam, em comparação com um homem médio, a guardar e a apresentar esse documento em juízo;
XIX.- Apenas pode ser assacada a responsabilidade ao Recorrente por não ter agido processualmente com o zelo e a diligência que lhe eram exigíveis, sendo que só a si se tem de culpabilizar por não ter junto atempadamente aos autos principais o original que agora diz ter encontrado;
XX.- Em sede de saneamento dos autos, foi realizada a devida audiência prévia, na qual, a Autora, veio a desistir do pedido subsidiário, desistência essa homologada por sentença de fls. 215, sendo que desde esse momento o objeto do processo ficou circunscrito ao pedido formulado em via principal, no essencial, de que os RR. Fossem condenados a reconhecer que a herança Autora, era legítima dona, comproprietária com a herança ilíquida e indivisa por morte de M. C. e com esta possuidora dos prédios identificados nos artigos 7.º da douta pi;
XXI.- Perscrutada essa douta petição inicial, mormente os seus artigos 9.º a 31.º, alcança-se que a Autora sustentava a sua pretensão numa suposta aquisição originária da propriedade dos imóveis em questão, por parte do saudoso J. N., através do instituto da usucapião, previsto nos artigos 1287.º e ss. do CC;
XXII.- É depois em confrontação com este direito de propriedade que reclama caber-lhe por usucapião, que a A. Herança colocou em questão os negócios de compra e venda celebrados entre as RR. M. M. e R. N. – sendo que apenas o primeiro dos quais será abordado pelo documento de que se socorre o Recorrente;
XXIII.- Por forma a ver o merecimento do seu pedido, necessitava a Autora de ter logrado em juízo comprovar que, no caso concreto, se encontravam preenchidos todos os requisitos de que dependia o seu reconhecimento jurisdicional;
XXIV.- De modo a ter a virtualidade de se mostrar suficiente para abalar a sentença transitada absolvição, o documento ora junto teria de, por si só, conseguir comprovar a situação de usucapião em que a Autora baseou todo o seu pedido, o que manifestamente não é o caso;
XXV.- Ainda que fosse tido como uma confissão escrita, com força probatória plena, esse documento seria incapaz de atestar os elementos fácticos necessários para que este tribunal pudesse vir a reconhecer judicialmente a alegada propriedade adquirida por usucapião por parte de J. N.;
XXVI.- Do teor deste documento nunca se poderia afirmar que o negócio de compra e venda de 2001 tivesse sido realmente simulado entre os RR. M. M. e A. T. e a R. R. N. e, muito menos, do mesmo retirar um reconhecimento destas três intervenientes processuais de um direito de propriedade de J. N.;
XXVII.- Mesmo que se entendesse que os Recorridos M. M. e A. T. não quiseram adquirir a propriedade do imóvel à Recorrida R. N., a verdade é que deste documento não se retira que esta não o quis de facto vender àqueles;
XXVIII.- A Recorrida R. N. não é parte do documento que o Recorrente lança mão, pelo que este não a vincula nem se assume, como nunca se poderia assumir, como uma sua confissão, escrita ou não;
XXIX.- O documento ora junto também não abala a transmissão de propriedade para a Recorrida R. N., que ocorreu em 1986, uma vez que não se refere a ele nem ao título de aquisição da propriedade desta;
XXX.- Se é certo que a transmissão de propriedade para a Recorrida R. N. não é abalada por este documento, será inevitável concluir o mesmo também não é apto a atestar que a propriedade do imóvel cabia a J. N., nem que este direito lhe adveio por via de uma posse que se manteria desde 1965;
XXXI.- O documento que o Recorrente agora pretende fazer uso para reabrir a instância, não mostra, só por si, ter capacidade para demonstrar ou infirmar factos relevantes ao conhecimento da causa, mormente e como alegado na douta petição inicial, que, desde 1965, o extinto J. N. detinha posse boa para usucapião;
XXXII.- Faltando os requisitos da suficiência e da novidade ao documento ora junto, ínsitos na al. c) do artigo 696.º do CPC, deve considerar-se inexistir documento de que o recorrente não tivesse podido fazer uso e que, por si só, fosse suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável em consequência absolvendo-se os recorridos deste apenso;
XXXIII.- O artigo 696.º, al. b) do CPC exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos: (i) - A alegação da falsidade; (ii) - A alegação de que a sentença cuja revisão se pede tenha sido determinada por essa falsidade, ou seja, que o acto falso tenha “determinado a decisão a rever” (nexo de causalidade adequada) e (iii) - A alegação de que a falsidade não tenha sido discutida no processo em que foi proferida a sentença;
XXXIV.- O documento ora junto aos autos não demonstra ou infirma factos relevantes ao conhecimento da causa, na medida em que não se debruça sequer sobre os factos que constituem a causa de pedir da petição inicial, que desde 1965 o extinto J. N. detinha posse boa para usucapião sobre os imóveis em causa, pelo que não pode assumir a qualidade de abalar depoimentos que contrariam estas alegações;
XXXV.- Nada desse documento se refere ou aponta para uma eventual simulação e inexistência dos negócios de transmissão de propriedade para a Recorrida R. N. no ano de 1986, infirmando o declarado pelos Recorridos quanto a esta transmissão, o que foi corroborado pelas testemunhas M. R., A. N., R. N., M. A. e D. N.;
XXXVI.- Não existe, com base no documento presente aos autos, qualquer razão para se terem como falsas as declarações tomadas como relevantes para a boa decisão da causa inexistindo nexo de causalidade entre essas supostas falsidades e o bom julgamento de mérito da causa;
XXXVII.- Em sede de audiência de julgamento, sempre aí a Autora propugnou pela contrariedade dos depoimentos em causa com a verdade dos factos. A mesma atitude teve em sede de recurso de apelação, no qual impugnou o juízo de valor conferido por esta instância a esses depoimentos e declarações, procurando demonstrar a inveracidade do que havia sido dito nessa instância;
XXXVIII- Não se justifica a revisão da decisão transitada se se apurar que a materialidade invocada no recurso de revisão já fora invocada no decurso da ação, onde só não foi considerada em virtude de deficiente desempenho da parte interessada, o mesmo é dizer, da sua imperfeita perceção do princípio da autorresponsabilidade processual;
XXXIX.- Não deve o recurso de revisão a que se responde ser admitido com base na arguição de falsidade realizada, por não estarem preenchimento os requisitos da al. b) do artigo 696.º do CPC (nexo de causalidade e não arguição da falsidade em juízo), nessa sequência, absolvendo-se os Recorridos do apenso.

NESTES TERMOS e nos melhores de direito aplicáveis, que v/exa. doutamente suprirá, deve o recurso de revisão de sentença a que se responde ser indeferido, absolvendo-se os recorridos do apenso.

DA PROVA:

A) DA PROVA PERICIAL PETICIONADA: A final do seu douto recurso de revisão requer o Recorrente a produção de prova pericial sobre o documento que protesta juntar, caso a Recorrida M. M. não reconheça a assinatura nele inserida.
Desde já se reafirmando a impugnação dessa mesma rúbrica, por falsidade, (impugnação que se entende já ter sido plena e validamente feita em sede de julgamento), opõem-se os Recorridos à realização dessa perícia por tal extravasar o âmbito do processo de revisão de sentença, porquanto somente após a produção da mesma, em hipótese, poderá o Recorrido dispor de prova nova para fundamentar o recurso já interposto – o que se assumiria como uma inversão do normal andamento deste apenso. Não se pretende aqui adquirir as provas que venham a fundamentar a sua existência.
B) DA PROVA TESTEMUNHAL ARROLADA: Pelo presente apenso não caberá proceder a uma repetição do julgamento já transitado, mas sim verificar a existência de uma anomalia que, pela sua gravidade, implique colocar em causa os princípios da segurança e da certeza jurídicas, génese do caso em julgado.
As testemunhas ora arroladas têm ligações familiares, mas principalmente profissionais com o Recorrente, sendo que M. L., C. M., J. B. e M. F., trabalham no escritório daquele.
Nesta medida, não se procurando proceder a um novo julgamento, olvidando o já realizado, apenas se vislumbraria necessária a audição destas testemunhas quanto à questão da tempestividade do presente recurso (já que o documento em questão teria sido encontrado no escritório do Recorrente).
Ora, não tendo os Recorridos contestado esse aspeto do presente apenso, inexiste razão para que seja admitido o rol de testemunhas apresentado, devendo-se indeferir esta pretensão do Recorrente.
C) De qualquer modo, a produzir-se prova, os recorridos arrolam como testemunhas, a notificar, as que já indicou na ação principal.

Importa para o conhecimento do presente recurso proceder a uma breve resenha da ação principal.

Assim:

M. N., na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de J. N. intentou ação declarativa, sob a forma de processo comum contra M. M. e marido, A. T., e R. N. e marido, J. P., pedindo que os Réus fossem condenados a reconhecer que a herança Autora, é legítima dona, comproprietária com a herança ilíquida e indivisa por morte de M. C. e com esta possuidora dos prédios identificados nos artigos 7º da p.i.; fossem os RR. condenados a restituir à herança Autora a parte que lhe corresponde naqueles prédios, a absterem-se da prática de quaisquer actos turbativos da propriedade, posse e domínio da herança Autora sobre os aludidos prédios e, consequente, do recebimento na proporção que lhe caiba das rendas do prédio urbano e a indemnizar a herança Autora pelos prejuízos suportados e que vierem a suportar, em virtude dos actos praticados pelos Réus, bem como a restituir as rendas recebidas, na parte que lhe caiba, desde a data do óbito do autor da herança (3 de Março de 2013) até à restituição, a liquidar em execução de sentença.

Subsidiariamente peticionou a Autora que:
. seja a escritura de doação e partilha em vida celebrada em 22.09.1986, declarada nula por simulação na parte respeitante à doação à 2.ª Ré dos prédios identificados no artigo 7º da p.i. e, consequentemente, reconhecer-se como válido o negócio dissimulado de doação dos mesmos prédios a J. N., casado em primeiras núpcias e sob o regime de comunhão geral de bens com M. C. e determinar-se o cancelamento do registo de aquisição a favor da 2ª Ré a que se referem as apresentações melhor descritas no petitório em referência;
. seja a escritura de compra e venda celebrada em 24.04.2001 declarada nula por simulação;
. seja a escritura de compra e venda celebrada em 03.05.2001 declarada nula por simulação;
. sejam os Réus condenados a reconhecer que a herança Autora, é, na parte correspondente dos bens melhor identificados no artigo 7º do articulado inicial legítima dona, proprietária e possuidora daqueles bens;
.sejam os Réus condenados a indemnizar a herança Autora pelos prejuízos suportados e que vierem a suportar, em virtude dos actos praticados pelos Réus, bem como a restituir o montante correspondente respeitante às rendas recebidas desde a data do óbito do autor da herança (03.03.2013) até à restituição, a liquidar em execução de sentença.

Os Réus M. M. e marido, A. T., apresentaram articulado de contestação, desde logo, pugnando pela condenação da Autora em multa e indemnização nos termos do regime previsto pelos artºs 542º e segs. do Cód. Proc. Civil; por outra via, arguindo a excepção de ilegitimidade por preterição do litisconsórcio necessário, defendendo que os direitos relativos à herança só podem, por princípio, ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros, nos termos da previsão do artº 2091º do CC, pelo que a acção deveria ter sido obrigatoriamente instaurada contra todos os herdeiros, o que não sucedeu; ademais, alegando a ocorrência da excepção de caducidade atinente ao pedido subsidiário formulado pela Autora; e, por fim, impugnando os factos alegados pela Autora, defendendo que as partilhas realizadas correspondem à vontade de todos os interessados, assim como as compras e vendas efectuadas entre as RR..
Na sequência da arguição da excepção de ilegitimidade por preterição do litisconsórcio necessário deduzida pelos réus, veio a autora, em articulado autónomo suscitar o incidente de intervenção principal provocada de A. J., a qual, não tendo sido objecto de manifestação por parte dos réus, veio a ser admitida (cfr. fls. 208-210).
Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual a Autora desistiu do pedido subsidiário, tendo a desistência (parcial) sido homologada por sentença (cfr. fls. 215).
Foi fixado o objecto do litígio e os temas da prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e a final foi proferida decisão que julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os réus do pedido e julgou igualmente improcedente, o incidente de litigância de má fé suscitado contra a autora.

A A. não se conformou e interpôs recurso de apelação, com impugnação da matéria de facto.
A parte contrária contra-alegou, pugnando pela rejeição da impugnação da matéria de facto.

Em 28 de junho de 2018 foi proferido acórdão, no qual se procedeu à análise da impugnação da matéria de facto, tendo se mantido inalterados os factos provados e não provados e se julgou o recurso totalmente improcedente.

II – Objeto do recurso

Considerando que:

. o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

A questão a decidir são é a seguinte:
. se deve ser admitida a revisão da sentença proferida no processo principal, o que implica analisar-se se o documento em que o recorrente fundamenta o recurso de revisão é um documento novo, de que a parte não dispusesse ou nem tivesse conhecimento dele, por facto que não lhe fosse imputável e se o documento, por si só, é suficiente para modificar a decisão em sentido para si mais favorável.

III – Fundamentação

A situação factual é a supra descrita.

O recurso de revisão de sentença regulado nos artigos 696º e seguintes do CPC é o meio processual destinado a impugnar decisões que já tenham transitado em julgado. Trata-se de um recurso extraordinário, como bem se compreende. Só em situações muito delimitadas é que é possível pôr em causa, os princípios da estabilidade e da segurança jurídica inerente ao trânsito em julgado de uma decisão, assentando o recurso de revisão no princípio da justiça material, permitindo a alteração de uma decisão que se encontra errada.
O recorrente requereu ao abrigo do disposto no artigo 696º, alínea c), do Código de Processo Civil, a revisão do acórdão proferido em 28 de junho de 2018, alegando que só agora conseguiu localizar o original do documento junto na ação, documento cuja assinatura a 2ª R., M. M. impugnou.
Dispõe a alínea c) do artigo 696º do Código de Processo Civil, que “ a decisão transitada em julgado pode ser objecto de revisão quando se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida”.

A procedência do pedido de revisão depende assim de três requisitos:

. que se apresente documento novo;

. que a parte não dispusesse nem tivesse conhecimento dele por facto que não lhe seja imputável;
. que, por si só, o documento seja suficiente para modificar a decisão em sentido para si mais favorável.

Da requisito da novidade

«A “novidade” significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão em causa, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pôde socorrer-se dele e desde que não tenha podido juntá-lo ao processo por facto que não lhe seja imputável.
O documento em que o recorrente baseia a sua pretensão é um documento datado de 21.04.2001, cuja cópia foi junta ao processo principal, pela A., no decurso da audiência prévia, realizada em 10.09.2015, tendo a A. logo requerido que se ordenasse a notificação do interveniente para juntar o original, por se encontrar na sua posse, o que foi deferido pelo tribunal, ordenado a notificação do chamado para juntar o original no prazo de 10 dias.
Os RR. vieram alegar nunca ter visto tal documento que se mostra dactilografado e que a assinatura que consta do mesmo como sendo da Ré M. M., não foi feita pelo seu punho, impugnando assim a assinatura que lhe era atribuída (requerimento de 10.09.2015). A R. nunca pôs em causa que a cópia junta não correspondesse ao original, mas apenas que a assinatura aposta no documento não era sua.

A A. requereu a realização de uma perícia à assinatura, a qual foi deferida em 13.11.2015 e ordenada, de novo, a notificação do interveniente principal, para juntar o original no prazo de 30 dias.
Em 26.02.2016 o interveniente principal informou os autos que não conseguiu localizar o original, motivo pelo qual se entendeu, designadamente, não se poder proceder à realização da perícia e os autos prosseguiram para julgamento.
Os recorridos defendem, que este documento não é novo, uma vez que a cópia e o seu original não se assumem como elementos probatórios distintos entre si, podendo as cópias, ainda que impugnadas, ser livremente valoradas em confronto com a demais prova produzida.

Vejamos:

Os documentos autênticos e os documentos autenticados estão revestidos de força probatória plena, a qual só pode ser ilidida com a demonstração da falsidade do documento (artº 371, nº 1 e 372º, nºs 1 e 2 do CC).
Já os documentos particulares têm um regime diferente. Para pôr em causa as declarações constantes de um documento particular, não tem de se demonstrar a sua falsidade, bastando à parte a quem ele é oposto, impugná-lo. A impugnação consiste numa simples declaração de desconhecimento, se o declarante não intervém no documento, ou, caso intervenha, na impugnação da letra e/ou da assinatura, caso estas lhe sejam atribuídas.
A lei confere a certas cópias a força probatória do original – cópias dos documentos arquivados em repartições notariais ou noutras repartições públicas (artº 387º, nº 1 e 383º, nº 1 do CC), se a conformidade com o original se encontrar atestada pela entidade competente. Assim, se o documento original for um documento autêntico, a cópia faz prova plena, nos mesmos termos em que a faz o original (artº 371º, nº 1 do CC)

As cópias dos documentos não arquivados em repartições notariais ou noutras repartições públicas têm o valor probatório dos originais, se a sua conformidade com o original for atestado por notário (artº 387º, nº 2 e 386º do CC). Assim se o documento atestado for um documento particular, terá a força probatória dos documentos particulares.

Também os documentos cuja conformidade com o original for atestada por uma das entidades a que se refere o DL 28/2000, de 13/03, possuem o valor probatório dos originais (artº 1º, nº 5).
As cópias dos documentos particulares não impugnados terão o valor probatório dos originais.
Se impugnadas, tanto relativamente às cópias como aos originais, incumbe à parte que os apresentou, provar a sua genuinidade (artº 374º, nº 2 do CC). Se impugnados, tanto o original como a cópia, são livremente apreciados pelo tribunal, em conjugação com a demais prova produzida.
A circunstância de não estar junto aos autos o original de um documento impugnado não invalida que se dê como provado o facto que o mesmo pretende provar, se esse mesmo facto resultar da demais prova produzida (cfr. se defende no Ac. do TRL de 11.07.2019, processo 4013/15 (1)).

Ao contrário do alegado pelo recorrente, o documento em causa não foi totalmente desconsiderado pelo tribunal de primeira instância. Ele foi ponderado, mas no confronto com a demais prova produzida, no caso a prova por depoimentos de parte e por testemunhas, o tribunal entendeu que não se mostravam demonstrados os factos que com ele se pretendiam provar. Como se pode constatar pela análise da motivação da decisão de facto constante da decisão da 1ª instância, a propósito das declarações prestadas pelas testemunhas que depuseram no sentido da partilha efectuada corresponder ao que foi querido pelas partes (tese dos RR.):

“As declarações naqueles prestadas não surtiram abaladas pelas entretanto dispensadas pelas testemunhas O. N. (esposa do interveniente) e A. P. (filho da testemunha A. A.), ou mesmo pelo depoimento de parte prestado pelo interveniente principal, A. J.. Quanto a este último e à respectiva esposa, pretendia-se fazer o enquadramento dos factos que teriam alegadamente levado à assinatura da declaração junta a fls. 214; no entanto, das referidas declarações não surte, desde logo, suficientemente provada a autoria da assinatura ali aposta. Quanto à testemunha A. P., resulta que as respectivas declarações se mostraram pouco objectivas, condicionadas quiçá pela relação próxima assumidamente mantida entre aquele e o primo A. J., não se demonstrando credível, como aquele procurou fazer crer, que tivesse dos factos um conhecimento efectivo e directo, que, aliás, não demonstrou.---“
(..) Em suma, da prova produzida e de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, não resulta apurado que os prédios em sujeito se encontravam na posse de J. N. já em data anterior a 22.09.1986, e que essa posse se tenha mantido não obstante a formalização de modo diverso na mencionada escritura de doação e partilha em vida efectuada por seus pais, já falecidos, M. V. e M. R.; ou que o decesso J. N., e sua primeira mulher até à morte desta, vieram exercendo a posse de boa-fé, contínua, pacífica e pública sobre os referidos prédios, por si e antecessores legítimos, desde há mais de 30 anos, tudo sem qualquer interrupção, sempre no seu interesse e proveito, com ânimo de exclusivos donos, à vista e com o conhecimento de toda a gente nisso interessada, sem qualquer estorvo ou turbação; ou que entretanto, o predito J. N., sua primeira mulher, as rés R. N. e M. M. se concertaram para que aquelas propriedades ficassem formalmente adstritas ao seu mais próximo núcleo familiar, ao caso em nome da 1ª Ré, filha daquele.”
O facto da Ré M. M. e seu marido terem impugnado a assinatura do documento não impediu o tribunal de se pronunciar sobre o mesmo. Entendeu é que a demais prova produzida, nomeadamente o depoimento prestado pelo ora recorrente e pela sua mulher que depuseram no sentido de que tal documento tido sido efectivamente subscrito pela Ré M. M., irmã do recorrente, não tinham permitido ao tribunal, conjugando ainda toda a demais prova produzida, formar uma convicção no sentido de que tal documento tinha sido efetivamente subscrito pela Ré, nem que os prédios em causa tivessem estado na posse do autor da herança desde data anterior a 22.09.1986.
E o acórdão desta Relação também nada se refere que permita concluir que o Tribunal desconsiderou o documento.

Consignou-se no seu texto o seguinte:
“Entende a apelante que os factos constantes das alíneas a) a c) se provaram com base no documento junto a fls 214 e no depoimento de O. N., A. P. (filho da testemunha A. N.) e do interveniente A. J.. Também se baseia na testemunha A. P. para a prova dos factos constantes das alíneas d) e e).
O interveniente A. J., irmão da R. M. M., declarou que quem escreveu o texto da declaração de fls 214 foi a colaboradora do seu escritório e que a R. M. M. a assinou, tendo o seu marido se recusado a assinar. Nela, consta como tendo sido declarado pelos RR. M. M. e marido A. T.que a compra que formalmente realizados(sic) aos nossos tios, R. N. e marido J. P., não corresponde de facto a transacção alguma para o nosso nome, uma vez que o prédio em causa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o artigo ... é propriedade plena e exclusiva dos pais e sogros dos declarantes (…)”..
Essa declaração foi junta em fotocópia e notificada a parte para apresentar o original, não o juntou, alegando não o ter encontrado, versão que o interveniente voltou a apresentar quando prestou depoimento. A R. impugnou a assinatura constante da mesma. Esta declaração está datada de 21 de Abril de 2001, foi dactilografada e apenas a assinatura foi manuscrita. A falta de junção do original inviabilizou a perícia à letra e à assinatura que tinha sido requerida pela R..
(…)

Vejamos:

Ouvida toda a prova e ponderada a mesma, não entendemos que tenha ocorrido erro de julgamento pelas seguintes razões:
Embora algumas testemunhas tenham se referido à existência de problemas financeiros e à falência de sociedades detidas pelo J., o certo é que não foram juntos aos autos quaisquer documentos comprovativos dessa dificuldades. Efectivamente não foi junta qualquer sentença declarativa da falência de qualquer sociedade de que o J. N. fosse sócio, nem consta que alguma vez tenha sido R. ou executado em qualquer acção ou execução, nem que o tivesse sido qualquer sociedade de que fosse sócio. O interveniente referiu ter sido avalista do seu pai e ter tido problemas por causa disso, mas também não foi junto qualquer documento que o provasse, pelo que suscita muitas dúvidas que o falecido tivesses problemas financeiras com a dimensão que se pretendeu conferir.

E se a intenção era que os bens não ingressassem formalmente no património do J. N., para não correr os riscos de os perder, caso viesse a ser executado por algum credor, fica por explicar porque é que, apesar disso, ainda assim lhe foram doados alguns bens (escritura de 22 de Setembro de 1986 – metade das verbas 18, 48, 50, 67, 68, 72 e 73 pelo seu pai, M. V. (fls 53) e a restante metade pela sua mãe, M. R. (fls 62), todos eles prédios rústicos.

É certo que no documento de fls 115 – de 12.10.1985, cerca de um ano antes da escritura de doações e partilha - outorgado pelos sete dos oito filhos do casal M. e M. R., consta que sete dos oito irmãos, estavam de acordo que ficasse para o J. N. uma casa sita em ... e que essa casa não consta da escritura das doações e partilha como atribuída ao dito J.. No entanto, esta situação é explicada pelas RR. e pela testemunhas R. N. e D. N. como tendo sido o próprio J. quem pediu para trocar bens com a sua irmã R. N. na ocasião da escritura, pessoa que teria entre os irmãos maior disponibilidade económica para lhe pagar tornas, porque preferia receber dinheiro para fazer face aos seus problemas financeiros. No documento de fls 115 constam diversas rasuras, que ilustram posteriores trocas de bens, embora nada tenha sido alterado relativamente à atribuição ao J. N. da casa de ..., tendo também a testemunha A. J. (pai) referido que foram feitos diversos acordos e diversas reuniões, o que a testemunha M. R. corroborou, pelo que se desconhece se o documento constante de fls 115-120, com data de quase um ano antes da escritura de doações e partilha, corresponde à versão final do acordo da distribuição dos bens.
O prédio em questão e onde funciona a carpintaria, corresponde à verba 55 da escritura assim descrita – casa de rés-do-chão com a área coberta de 192 m 2 e logradouro com a área de 50 m2, sita no lugar de … (2)-, inscrito na matriz predial sob o artº … (fls 102), doado à R. N. e posteriormente, em 24 de Abril de 2001, vendido por esta à filha do J. N., a R. M. M.. Em 3 de Maio de 2001, a R. N. igualmente declarou vender à M. M. 5 prédios rústicos que lhe tinham sido doados (fls 149 e ss).
Quanto aos actos de posse que o falecido J. N. teria praticado sobre o referido prédio, através da exploração que fazia da carpintaria nele existente, o certo é que também os mesmos se mostram contrariados pelo documento junto a fls 262- 264, relativamente ao período anterior e contemporâneo da escritura de doações e partilhas. Este documento diz respeito ao contrato de arrendamento do referido prédio, celebrado em 4 de Janeiro de 1985, no ano anterior às doações aos filhos do M. N. (pai), pelo prazo de um ano renovável, em que intervieram como locadores os pais do J. N. e como locatária a sociedade X – Sociedade de Carpintaria do Minho, Limitada, representada pelos seus sócios J. D. e J. R. (fls 261-264), sociedade que de acordo com o depoimento da R. M. M. que não foi contrariado nessa parte, se manteve vários anos a explorar a carpintaria. E embora tenham sido levantado dúvidas sobre se o falecido J. N. não seria também detentor do capital da referida sociedade, através de terceiro, nenhuma prova segura foi produzida nesse sentido.
Mas ainda que se considerasse que o J. N. explorou a carpintaria durante alguns períodos, daí não resulta que praticasse actos de posse relativamente ao prédio onde a carpintaria se encontra instalada. A exploração de um estabelecimento não implica necessariamente a posse do prédio onde aquele se encontra.
No sentido de que o falecido não actuava como proprietário daquele prédio, também depôs a testemunha E. P. que não é familiar de qualquer das partes e que interveio como fiador no contrato de arrendamento celebrado em 1 de Janeiro de 2012, em que figura como locadora a R. M. M. e como locatário o filho da testemunha E. P., H. S. e como fiadores, além da testemunha E. P., também o seu irmão J. V. (fls 134-136) e onde foi acordado o pagamento de uma renda mensal de 300 euros, a pagar apenas a partir de 1 de Janeiro de 2013.
A apelante entende que não deve ser conferida credibilidade a esta testemunha face à declaração de fls 288. Esta testemunha foi confrontada com o referido documento, subscrito nomeadamente por si (fiador e não o locatário) e onde se compromete a pagar mensalmente a renda de 200 euros a partir de 01.07.2012, antecipando o seu pagamento e não apenas a partir de 1.01.2013, como constava do contrato de arrendamento e onde o J. N. (que também terá subscrito a declaração), assumiu a responsabilidade de pagar 50% do ramal da água da câmara que necessitava de ser instalado. A apelante considera que este compromisso do J. N. é demonstrativo de que ele se arrogava proprietário do prédio. Mas se assim é, então porque é que não foi feita a obra, o que a testemunha confirma, se o proprietário até concordava com ela, nas condições constantes da declaração?
E se os bens declarados vender posteriormente pela R. N. à M. M. eram efectivamente do J. N., assim como os bens que terão sido doados pelo irmão D. N. aos filhos do J. N. (de acordo com a testemunha A. P. e a testemunha D. N.), porque é que a herança apenas reclama os declarados vender à R. M. M. e não também os doados a esta R. e ao interveniente? Assinale-se ainda que não foi junto qualquer documento comprovativo da aludida doação, nem da doação que o pai do J. N. teria ainda feito a R. e J. (netos do J. N.) que também teria tido o fim de não fazer ingressar no património do J. N. bens que lhe estavam destinados, a fim de os subtrair à acção dos credores. E não poderá deixar de se estranhar que o filho da testemunha A. tenha um conhecimento muito mais extenso dos factos que o seu pai que foi directamente interveniente na escritura de doação e partilhas, assim como no acordo de fls 115.
Da prova produzida resultam muitas dívidas sobre o que efectivamente se pretendeu doar e sobre a actuação do falecido J. sobre o prédio em causa, face aos depoimentos contraditórios e aos documentos referidos. Foi alegado que era o J. N. que explorava a carpintaria através de sociedades em que participava, mas não foi junto qualquer documento comprovando ser accionista de qualquer sociedade que explorasse a carpintaria. Quanto a actos de posse sobre o prédio não foram praticados quaisquer actos enquanto o pai do J. N., o M. N. foi vivo, pois que reservou o usufruto dos bens para si, sendo ele que constava como locador e recebia as rendas que foram sendo pagas pelos arrendatários do prédio e pagava os impostos, usufruto este que foi reservado e consta na escritura de doação, sendo que relativamente ao pagamento dos impostos (contribuição autárquica, actual IMI) tal foi assegurado pela R. R. N. e não foi posto em causa pelo depoimento de qualquer outra testemunha. Não foi junto qualquer recibo, qualquer factura, qualquer declaração para efeitos de IRC ou IRS que pudessem demonstrar que o J. N., que na tese da A., explorou durante anos um estabelecimento de carpintaria naquele prédio, o que é de estranhar, quando foi referido que o estabelecimento tinha vários empregados e um escritório, onde a filha do autor da herança, M. M., trabalhou, sendo portanto uma empresa com alguma dimensão, pelo que alguma documentação dessa actividade teria de existir.
Também a circunstância das rendas provenientes do arrendamento ao H. S. serem entregues ao J. N. não colide com o que ficou dito, pois que, se destinariam a ajudar o J. N., proporcionando-lhe rendimentos para subsistir que não tinha, necessitando de ser auxiliado pelos seus filhos, o que também se mostra corroborado, para além do depoimento da R. M. M., pelos documentos juntos a fls 177 e 178, cuja autoria é imputada ao falecido J. N. e onde este declara ter recebido nos anos de 2011 e 2012 uma mensalidade de 200,00, no total de 2.400,00 da filha M. M. e do genro A. T., o que demostra que esta o auxiliava economicamente, o que também foi confirmado pela testemunha D. N..
E na dúvida dos negócios que realmente se quiseram celebrar, bem andou a Mma. Juíza a quo a não dar como provados os factos constantes das alíneas a) a c), decidindo contra a parte onerada com a prova.”
Como resulta do que se transcreveu o tribunal da Relação não deu como provados os factos constantes nas alíneas a) a c), relativos aos autos de posse com corpus e animus do de cujus sobre os bens reivindicados, devido, designadamente, às versões contraditórias existentes que não permitiram formar uma convicção no sentido defendido pela autora e não porque não foi junto o original do documento de fls 214.
Não fora a cópia ser de má qualidade, e a parte ter requerido um exame à assinatura, a junção do original nem se mostraria necessário, porque a Ré não põe em causa que a cópia seja idêntica ao original. A sua não junção pode ter impedido a realização de uma perícia à letra e/ou assinatura, mas não impediu que outra prova tenha sido produzida, como aconteceu neste caso, tendo o ora recorrente prestado declarações expressamente sobre o documento em cujo original baseia a presente revisão.
Mas ainda que assim não se entendesse, e se considerasse que o documento reunia o requisito da novidade, ainda assim, não seria caso de admitir a revisão, por não se verificarem os demais pressupostos legais, o que de seguida analisaremos.

Do desconhecimento ou falta de acesso anterior ao documento não imputável

O desconhecimento ou a falta de acesso anterior ao documento deve, em suma, assentar em razões atendíveis, não podendo ser imputável à falta de diligência dos sujeitos, sob pena de se desvirtuar a relação entre a regra e a excepção ditada, nesta matéria, pelo legislador.
Como se defende no Ac. do STJ de 19.12.2018, proc.179/14.4TTVNG-B.P1.S1 para a doutrina, o recurso de revisão só é admissível, com fundamento na alínea c), do artigo 696º, se não for imputável à parte a impossibilidade de apresentação do documento no processo anterior, ou seja, se não lhe puder ser assacada a impossibilidade de o apresentar a tempo de interferir no resultado da decisão a rever.

Para isso, é necessário que a parte demonstre que, apesar de ter empregue todos os esforços que estavam ao seu alcance para o obter, mesmo assim, não o conseguiu.

Deste modo, não podem servir de base para o recurso de revisão tanto os casos em que a parte apesar de ter conhecimento da existência do documento, o não o quis apresentar na ação, como os casos em que a parte, não teve dele conhecimento, devido à sua incúria, falta de zelo e de cuidado, sendo-lhe, assim, imputável o seu não uso por não agido com a «diligência própria dum bom chefe de família».

O que leva a concluir que se a parte agiu com a devida diligência, com a que lhe era exigível, na obtenção do documento, e não o tendo conseguido, não lhe pode ser imputada a sua não apresentação na ação em que foi proferida a decisão a rever.
No caso, o recorrente alega no recurso que o documento se encontrava no seu escritório onde foi localizado por uma colaboradora do mesmo, no dia 3 de janeiro de 2020, dentro de uma gaveta destinado à guarda de processos. Os recorridos aceitaram estes factos.
Ora, a ação principal deu entrada em 9.07.2014. O interveniente principal foi citado por carta expedida em 24.03.2015, não tendo oferecido qualquer articulado, nem nada tendo declarado.
Na audiência prévia realizada a 10.09.2015, o mandatário da A. juntou aos autos a cópia do documento em questão, referindo logo que o original se encontrava na posse do interveniente. Logo nessa data, foi ordenada a notificação do chamado para juntar o original no prazo de 10 dias.
Face à impugnação da assinatura imputada à R. mulher, levada a cabo pelos RR. contestantes, por requerimento de 10.09.2015, em 23.09.2015 veio a A. requerer que se procedesse ao exame grafológico da assinatura imputada à Ré M. M. constante do documento posto em crise, a realizar por entidade competente a designar pelo tribunal para prova da genuinidade ou falsidade que vêm alegadas.
Em 25.09.2015 veio o chamado juntar requerimento onde comunicou que “lamentavelmente, não encontrou o original da declaração cuja fotocópia lhe foi remetida, apesar dela ser possuidora, a qual, após intensas buscas a não localizou, encontrando-se, todavia, ainda a realizar diligências com vista à sua localização e assim satisfazer o ordenado por Vª Exª.”.
Em 13.11.2015 iniciou-se a audiência final, na qual foi admitida a perícia requerida pela A. e, não obstante o informado pelo interveniente em 25.09.2015, se ordenou nova notificação do mesmo para juntar o original, tendo lhe sido concedido, dessa vez, um prazo alargado de 30 dias. Decorrido esse prazo, sem que o original tivesse sido junto, a Mma Juíza determinou que se notificasse o interveniente para o juntar.
Em 26.02.2016 o interveniente veio dizer que não encontra o documento, “pese embora as diligências por si realizadas com vista à localização da declaração em causa, a não encontrou, para o que solicita a devida relevância a V. Exa.”
A Mma Juiza por despacho de 01.04.2016 decidiu que “atenta a manifesta inviabilidade de realização da pretendida perícia (exame grafológico) a declaração id. nos autos, designadamente por falta de apresentação do original, deverão os autos prosseguir em conformidade”.
A segunda sessão teve lugar em 27.09.2016, a terceira em 11.11.2016, a quarta em 21.11.2016 (na qual prestou depoimento o ora recorrente, na qualidade de interveniente principal), e última sessão com a continuação da inquirição da testemunha E. P. e com alegações teve lugar em 8.03.2017.
Assim, entre a data da citação do interveniente e o encerramento da discussão decorreram quase dois anos.
Ora, considerando o recorrente tal declaração como determinante para a decisão da ação, do que é espelho o presente recurso, e sabendo que a mesma se encontrava na sua posse, poderia ter desenvolvido mais aprofundadas buscas, percorrendo, um por um, todos os documentos que guarda no seu escritório (ou na sua habitação), com o fim de o localizar. Devia o recorrente, considerando que aquele documento era nuclear ou decisivo para conferir credibilidade à versão da A., ter diligenciado a sua obtenção de forma mais firme ou insistente e, seguramente, menos displicente. Se o tivesse feito, teria de o ter localizado, como veio a ocorrer, sendo certo que dispôs de tempo suficiente para o efeito, Note-se que não foi invocada a ocorrência de qualquer situação anómala no escritório do interveniente que pudesse ter determinado a não localização do documento. Entre a audiência prévia e o início do julgamento decorreu mais de um mês e meio e nessa data ainda lhe foi concedido novo prazo adicional de 30 dias para localizar o documento, tendo só em 26.02.2016, já decorrido o prazo de 30 dias, o interveniente informado que não o conseguia localizar. A segunda audiência, no entanto, só teve lugar em 27.09.2016 e a última em 08.03.2017. Ora, os documentos poderão ser juntos s supervenientemente, nos termos dos artigos 423º, nº 3 do CPC, pelo que o recorrente dispôs de vários meses para localizar o original que sabia estar na sua posse. E se o documento tivesse sido junto, certamente teria sido admitido e ordenada a realização da perícia. Face ao exposto, e admitindo-se que o recorrente tenha realizado buscas, não há como não concluir que não desenvolveu as necessárias e adequadas diligências para o efeito.
Assim, não se vê como não considerar imputável ao recorrente a falta de junção à ação principal do original da declaração. Como se defende no Ac do STJ de 30.04.2019, proc 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2 “Quando o acesso ao documento está ao alcance da parte, a instrução do processo com a sua apresentação é um ónus, devendo desconsiderar-se a inacessibilidade que seja imputável à falta de diligência da parte, sob pena de se desvirtuar a relação entre a regra e a excepção ditada, nesta matéria, pelo legislador”.
Mas mesmo que assim não se entendesse, o documento em que baseia a presente revisão não se pode considerar como por si só suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Da suficiência do documento para por si só modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida

Mostrando-se a assinatura impugnada, tendo a recorrida M. M. reiterado na resposta ao recurso que a assinatura não é do seu punho, é necessária a realização de um exame pericial para que se possa concluir que a declaração vertida no documento foi subscrita pela recorrida M. M., exame que o recorrente requereu no requerimento de interposição do presente recurso. Assim, o documento não é suficiente por si só, pois é necessária, a ser admissível, a realização prévia de uma perícia.
Mas, ainda que se entendesse que a suficiência exigida pela lei não obsta à realização de uma prévia perícia à assinatura nele aposta, e na mesma se concluísse, com elevada probabilidade, que a assinatura é do punho da recorrida, poder-se-ia dizer que o documento era suficiente para, por si só, modificar a decisão em sentido mais favorável ao recorrente?

Conforme resulta claramente do texto legal não é qualquer documento que pode fundamentar um recurso de revisão, mas só aquele que por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida, devendo ser suficiente para destruir a prova em que a sentença se fundou. Se o documento, quando relacionado com os demais elementos probatórios produzidos em juízo, não tiver força suficiente para destruir a prova em que se fundou a sentença, não há razão para abrir um recurso de revisão (3).
A este propósito veja-se o que afirma Rodrigues Bastos (4) que "não preenche este fundamento a apresentação de documento com interesse para a causa que, relacionado com outros elementos probatórios produzidos em juízo, fosse susceptível de determinar uma decisão mais favorável para o vencido; para servir de fundamento à revisão, é necessário que o documento, além do carácter de superveniência, faça prova de um facto inconciliável com a decisão a rever, isto é, que só por ele se verifique ter esta assentado numa errada averiguação de facto relevante para o julgamento de direito.”
Por sua vez Luís Filipe Brites Lameiras que defende que o documento que for junto para fundamentar a revisão tem de possuir “uma força probatória qualificada, auto- suficiente e impossível de destruição – só por si ele é suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável. Estamos em suma, no patamar da prova legal e vinculada – da prova plena – à qual é, em absoluto alheio, qualquer tipo de julgamento de facto produzido pelo julgador, à luz da sua liberdade de apreciação (artº 655º). O julgamento – quanto ao pertinente documento -, se bem com reflexo no facto, é de direito, produzido pela própria lei”. (5)
Quanto à suficiência, o Código de 1939 exigia que o documento tivesse a virtualidade de “destruir” a prova em que a decisão revidenda se havia fundado.
O Código de 1961, e as alterações ulteriores, vieram “aligeirar” esse requisito: não se exige já que o documento altere radicalmente a situação de facto em que assentou a sentença [acórdão] revidenda, basta que lhe implique uma modificação dessa decisão em sentido mais favorável à parte vencida» (cfr. Acórdão do STJ de 17.09.2009, proc. nº 09S0318).

Ainda, a propósito da suficiência, no Ac. do STJ de 18.12.2013, processo 3061/03.7TTLSB-B.L1.S1 entendeu-se que:

O requisito da suficiência tem de ser entendido como exigência de que o documento apresentado disponha de total e completa suficiência probatória, no sentido de que, se esse documento tivesse sido tomado em consideração pelo tribunal que proferiu a decisão revidenda, essa decisão nunca poderia ter sido aquela que foi – e isto sem fazer apelo a outros elementos de prova, sejam eles documentais, testemunhais ou periciais –, por constituir prova plena de um facto inconciliável com a decisão a rever”.
Para decidir se um documento é suficiente, “importa colocarmo-nos nas vestes do tribunal que apreciou a factualidade trazida para os autos com vista a saber, se estando na posse desta declaração ,a mesma iria alterar o sentido fáctico da decisão. Não se pondo em causa a autenticidade da mesma, o outrotanto já não se pode dizer da credibilidade tendo em vista o objectivo que se pretende atingir.
Alberto dos Reis (Código do Processo Civil Anotado, Vol. VI, pág. 357) também ensina: “O magistrado para julgar se o documento é decisivo, deverá pô-lo em relação com o mérito da causa, deverá proceder ao exame do mérito e indagar qual teria sido o êxito da causa se o documento houvesse sido apresentado.
Feito este exame, ou o magistrado se convence de que se o documento estivesse no processo, a sentença teria sido diversa e, neste caso, deve admitir a revogação; ou se convence de que, não obstante a produção do documento, a sentença seria a mesma, porque assenta sobre outras bases e está apoiada em razões independentes do documento – e neste caso deve repelir a revogação”.(cfr. se defende no Ac do STJ de20.03.2014, proc. 2139/06.0TBBRG-G.G1.S1, de onde foi retirado o extracto transcrito).

Defende o recorrente que provada a genuinidade da assinatura, ela constitui confissão dos factos alegados, assim se sobrepondo à prova testemunhal produzida em sentido contrário.

O recorrente embora fundando o recurso num documento, não faz apelo ao valor probatório dos documentos particulares – artº 376º, nº 1 e 2 do CC - , mas ao documento enquanto confissão extrajudicial da parte contrária.

Confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (artº 352º do CC).
A confissão pode ser judicial ou extrajudicial (artº 355º, nº 1 do CC). A primeira é efectuada em juízo e a segunda, não o é.
A confissão extrajudicial em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos, e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente tem força probatória plena (artº 358º, nº 2 do CC).
O documento em causa não tem destinatário, mas encontrando-se em poder da parte contrária, poder-se-á entender-se que a declaração lhe foi dirigida.
No entanto, não se pode olvidar que o documento não está assinado pelo marido da R., embora se destinasse a ser pelo mesmo assinado, como resulta do seu texto, mas não o está.
Ora, a confissão só é eficaz quando feita por pessoa com capacidade e poder para dispor do direito a que o facto confessado se refira (artº 353º, nº 1 do CC). Não é eficaz a confissão de factos feitas por um só dos cônjuges relativamente a direitos cuja alienação ou oneração necessite de autorização do outro (6), como acontece relativamente a imóveis quer sejam bens próprios quer sejam bens comuns (artº 1682º-A do CC).
O reconhecimento de factos desfavoráveis que não possa servir como confissão, vale como elemento probatório a valorar livremente pelo tribunal (artº 361º do CC), pelo que não se impõe.

Mas ainda que assim não se entendesse ou se apreciasse o documento à luz do artº 376º do CC, a declaração proferida nos termos em que o foi, não se afiguraria suficiente para provar uma situação de posse por tempo prolongado, susceptível de permitir a aquisição por usucapião do direito de propriedade, fundamento da ação, como defendem os recorridos.
A declaração inserta no documento não constitui reconhecimento de que a propriedade que se atribui ao pai da declarante tenha sido adquirida por usucapião. Declarar que um prédio é da propriedade plena e exclusiva de alguém, nada diz quanto ao modo como a propriedade ingressou no seu património, não contendo a declaração os elementos de facto necessários para a prova da usucapião, ou seja uma posse dotada de corpus a animus que se prolongou por determinado período de tempo, mínimo de 15 anos no caso de imóveis, não havendo registo do título nem da mera posse (artº 1296º do CC), sendo que é na aquisição por usucapião pelo autor da herança que a A. fundamenta a sua pretensão.
Assim, como resulta do que se expôs, o documento em que o recorrente fundamenta a revisão, não possui, só por si, força suficiente para destruir a prova em que se fundou a sentença que se pretende rever. E assim sendo, como é, não pode proceder a revisão.
Por fim, impõe-se umas breves palavras sobre a referência feita pelo recorrente à falsidade de depoimentos e declarações.
Como se referiu já no despacho proferido pela relatora que mandou submeter o recurso à conferência, considerou-se que o recorrente não pretendeu fundamentar a revisão na alínea b) do artº 696º do CPC. Como resulta expressamente do seu recurso, tanto do corpo alegatório - parte B) - , como das conclusões (conclusão 1ª), o recorrente apenas pretendeu fundamentar o seu recurso no original do documento que, entretanto, localizou e no fundamento da alínea c) do artº 696º do CPC.
A referência que faz no recurso de que, caso se possam considerar confessados os factos que constam da declaração, essa circunstância irá fazer vingar a tese da Autora e conduzir à conclusão de que “a R. M. M. mentiu sob juramento legal no depoimento que prestou neste tribunal e perante a Mmª Juiz, assim como mentiram as testemunhas que esta apresentou e que corroboraram, a seu pedido, a sua falsa versão” deu origem, a que, à cautela, os recorridos M. M. e A. T. Lima, tenham vindo expressamente pronunciar-se, sobre a referida falsidade, enquanto fundamento previsto no artº 696º, alínea b), tanto na parte II do corpo alegatório, como nas conclusões XXXIII a XXXIX..
No entanto, como resulta expressamente do recurso e se referiu já, o recorrente não pretendeu invocar como fundamento da revisão a referida falsidade. E não o pretendeu, certamente, porque não se encontram reunidos os necessários pressupostos, desde logo, porque a matéria sobre a qual versaram os depoimentos apelidados de falsos foi objecto de discussão no processo em que foi proferida, onde foi esgrimida pelo A. a sua falsidade, exigindo a alínea b) do artº 696º CC que a matéria não tenha sido objecto de discussão no processo a rever.
A referência à falsidade dos depoimentos foi efectuada, na análise global que o recorrente fez da prova produzida, mas sem pretender fundamentar o recurso nessa falsidade, pelo que nada mais há a acrescentar a propósito desse fundamento.
E sendo manifesto que o presente recurso não pode proceder não havia que realizar quaisquer diligências prévias, a serem as mesmas admissíveis.

IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar improcedente o recurso de revisão interposto por A. J., mantendo a decisão a rever.
Custas pelo recorrente.
Notifique.
Guimarães, 22 de abril de 2021


1. Acessível em www.dgsi.pt, sítio onde poderão ser consultados todos os acórdãos que venham a ser citados, sem indicação da fonte.
2. Freguesia de ….
3. Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 02/06/2004, proferido no proc. 619/2004-4.
4. Notas ao Código de Processo Civil, vol.III, 3ª ed., pág. 319.
5. Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 2008, p.197.
6. Conforme defendem Pires de Lima e Antunes varela, CC anotado, anotação ao artigo 353º do CPC.