Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
261/18.9GEBRG-A.G1
Relator: CLARISSE GONÇALVES
Descritores: ASSISTENTE
PEDIDO DE CONSTITUIÇÃO
TEMPESTIVIDADE
ARTºS 68º
Nº 2
E 264º
Nº 4 DO CPP
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/29/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I) Estando em causa procedimento dependente de acusação particular, o prazo de dez dias, para requerer a constituição de assistente conta-se a partir da advertência feita ao denunciante da obrigatoriedade de se constituir nessa qualidade e dos “procedimentos a observar”.

II) No caso dos autos, não resultando claro que a denunciante tivesse sido devidamente advertida da obrigatoriedade da sua constituição como assistente e dos procedimentos a observar, nem tal se podendo presumir pelo facto de a mesma ter formulado pedido de apoio judiciário onde referiu não ter meios para “custear as despesas inerentes ao presente pleito, nomeadamente as associadas à constituição de assistente, formulação de acusação particular e pedido de indemnização civil”, impõe-se concluir pela tempestividade do pedido de constituição de assistente.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

- 1. No presente processo com o nº 261/18.9GEBRG-A, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, pelo Juízo de Instrução Criminal de Braga – Juiz 1, foi, por despacho datado de 24.01.2019, e ao que ora nos interessa, por extemporânea, indeferida a constituição como assistente de A. B., quanto aos factos suscetíveis de integrar a prática pelo denunciado crime de injúria, ocorridos em 20/06/2018.

- 2. Não se conformando com “a decisão proferida, que não a admitiu a intervir nos autos como assistente quanto aos factos que, em abstrato, configuram a prática de um crime de natureza particular”, A. B. interpôs o presente recurso, formulando as seguintes Conclusões (transcrição):

A) Entende a recorrente que o requerimento que apresentou para a constituição de assistentes foi oportuno e tempestivo, devendo admitir-se a sua intervenção como assistentes, mesmo quanto aos factos que configuram a prática de um crime de natureza particular.
B) A apresentação da queixa foi feita na GNR de Braga e, nem nessa altura, nem posteriormente foi transmitido à recorrente que os factos que participou têm, em concreto, natureza particular.
C) Da notificação efectuada pelo órgão de polícia criminal que: “Tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias (artigo 68, nº. 2 do CPP) a contar da presente notificação” e “O denunciante pode declarar, na denúncia, que deseja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória (artº. 246º, nº. 4 do CPP) sob pena de os autos serem arquivados”.
D) O artº. 68º, nº. 2 do C.P.P. dispõe, quanto ao requerimento para a constituição de assistente que “tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias a contar da advertência referida no nº. 4 do artº. 246º”.
E) Este artº. 246º, nº. 4 do C.P.C., inegavelmente indissociável ao artº. 68º, nº. 2, dispões que “o denunciante pode declarar, na denúncia, que deseja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória, devendo, neste caso, a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal a quem a denúncia for feita verbalmente advertir o denunciante da obrigatoriedade de se constituir assistente e dos procedimentos a observar”.
F) A notificação feita à recorrente e que consta dos autos a fls. 8 não se trata de qualquer advertência à aqui recorrente da obrigatoriedade de se constituir assistente, dados os factos denunciados configurarem um crime de natureza particular, nem refere a cominação da falta dessa constituição como assistente.
G) A advertência referida no nº. 4 do artº. 246º do C.P.C. não foi efectuada de forma clara e expressa à recorrente que compreendeu que teriam um prazo de 10 dias para se constituir assistente (“fazer um requerimento”) após a notificação constante daquele nº. 4, que viesse a ser-lhe feita.
H) O prazo fixado no artº. 68º, nº. 2 está necessariamente interligado à notificação do artº. 246º, nº. 4, o que significa que no caso de estarmos perante um crime de natureza particular, o prazo de 10 dias para efectuar o requerimento de constituição de assistente só se inicia com o cumprimento do dever de informação e advertência da denunciante, referido naquele nº. 4 do artº. 246º do C.P.P, o que, “in casu”, não se verificou.
I) O prazo de 10 dias para a constituição de assistente só se inicia após notificação com a advertência constante do artº. 246º, nº. 4 do C.P.P., ou seja, com a notificação que informe da obrigatoriedade de constituição de assistente e dos procedimentos a adoptar em caso de estarmos concretamente perante um crime de natureza particular.
J) A notificação de fls. 8 apenas refere a obrigatoriedade de declarar na queixa que deseja constituir-se assistente, caso o crime revista natureza particular, sendo que, volta a repetir-se, jamais foi comunicado à recorrente que o crime participado reveste natureza particular, e que, por essa razão, teria que declarar a sua pretensão em constituir-se assistente e requerer a sua efectiva constituição como assistente no prazo de 10 dias.
K) Por não lhe ter sido advertido desconhecia a recorrente a obrigatoriedade da declaração da constituição de assistente e a própria constituição de assistente.
L) À recorrente não lhe foi comunicada a natureza do crime, pelo que, não conseguiu alcançar, como legalmente se impunha, a natureza do prazo e o início da sua contagem.
M) Não tinha a recorrente obrigação de saber ou conhecer que os factos participados se enquadravam num crime de natureza particular, pelo que, sempre teria de ser notificada de tal facto, como claramente impõe o nº. 4 do artº. 246º do C.P.P.
N) Ficou a recorrente legitimamente convencida de que dispunha de um prazo de 10 dias para constituir advogado e se constituir assistente, prazo este que apenas se iniciaria após a notificação de que o crime em causa revestia natureza particular.
O) A notificação de fls. 8 não se trata da informação e advertência exigida no artº. 246º, nº. 4 do C.P.P., não referindo que a denunciante foi advertida da obrigatoriedade de se constituir assistente, atendendo ao tipo de crime participado.
P) Entendeu a recorrente que o M.P. a notificaria do tipo de crime participado e da advertência da obrigatoriedade da sua constituição de assistente nos termos do artº. 246º, nº. 4 do CPP, caso o M.P. viesse a entender que os factos participados revestiam natureza particular.
Q) E foi a advogada que lhe foi nomeada que, independentemente da natureza dos crimes participados aconselhou a requerente a requerer a sua constituição de assistente, apesar de desconhecer a natureza dos crimes e de não ter sido notificada da advertência constante do nº. 4 do artº. 246º do C.P.P.
R) Este Tribunal de Instrução Criminal de Braga já se pronunciou noutro processo (Proc. nº. 657/13.2JABRG-A – Tribunal Judicial de Vila Verde – 1º. Juízo) sobre matéria idêntica ao objecto do presente recurso, tendo, inclusivamente, nos termos do artº. 414º, nº. 4 do CPP, reparado a decisão de não constituição de assistente, quanto aos crimes de natureza particular (cf. doc. 1).
S) Também o M.P., nos autos supra identificados na conclusão R, entendeu, em sede de contra-alegações, ser de admitir a constituição de assistente por entender não terem sido satisfeitas todas as comunicações e advertências obrigatórias.
T) Ao indeferir a constituição como assistente da recorrente, quanto aos factos susceptíveis de integrar a prática de crime de injúria, sem a prévia comunicação à recorrente de que os crimes participados revestem natureza particular e da advertência referida no nº. 4 do artº. 246º do CPP, violou o despacho recorrido o preceituado nos artºs. 68º, nº. 2 e 246º, nº. 4 do C.P.P. e artº. 32º da C.R.P..

Termos em que,

Deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, nos termos das conclusões supra, revogando-se a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra em que seja admitida a constituição como assistente de A. B., mesmo quanto aos factos que em abstracto configuram a prática de um crime de natureza particular, com as legais consequências, com o que se fará, Justiça.

- 3. A Exmª Procuradora-Adjunta respondeu ao recurso onde “entende que o despacho recorrido deve manter-se, não devendo ser dado provimento ao presente recurso.”

- 4. Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, entendendo que “o recurso deve ser julgado procedente.”

- 5. Cumprido que foi o estatuído no nº 2 do artº 417º do Código de Processo Penal, não foi apresentada qualquer resposta.

- 6. Efectuado exame preliminar, proferido o competente despacho e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

II – FUNDAMENTAÇÃO

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente na respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no artº 410º, nº 2, do Código de Processo Penal.

Como resulta das transcritas conclusões, a questão que se nos coloca é a de saber se foi ou não a ora recorrente notificada com a advertência prevista no nº 4 do artº 246º do CPP, e, consequentemente, se o requerimento de constituição de assistente por si apresentado é ou não tempestivo.

Apreciemos:

O teor do despacho recorrido, na parte que aqui interessa, é o seguinte:

Requerimento de constituição como assistente de fls. 26:

Nos presentes autos, veio a requerente A. B., em13/11/2018, apresentar queixa, entre outros, por factos ocorridos e suscetíveis de integrar a prática do crime de injúria – cfr. fls. 4.
Na mesma data foi notificada, para, no prazo de 10 dias, requerer a sua constituição como assistente relativamente a esses factos, nos termos do artº 246º, nº 4 e 68º, nº 2 do Código de Processo Penal – fls. 8.
Por requerimento entrado em 16/11/2018, a requerente juntou aos autos o comprovativo de haver apresentado pedido de apoio judiciário, nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento de honorários de patrono no dia 15/11/2018 – fls. 11.
A fls. 28 consta o comprovativo do deferimento do pedido de apoio judiciário formulado, nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento da compensação de patrono no dia 14/12/2018.
A fls. 27 consta o ofício de notificação à requerente, no dia 17/12/2018, da concessão do benefício nas modalidades requeridas, mormente, de nomeação de patrono. Que se considera notificada no 3º dia útil posterior ao registo, ou seja, no dia 20/12/2018, nos termos do artigo 113º nº 1 do CPA.

Resulta do exposto e do preceituado nos artºs. 24º, nº 5 al. a) da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, que o prazo para requere a constituição de assistente relativamente a crimes de natureza particular foi interrompido em 15/11/2018 e teve o seu reinicio em 21/12/2018. Assim, o prazo de 10 dias para requerer a constituição de assistente relativamente a crimes de natureza particular, nos termos do artº 68º, nº 2 do Código de Processo Penal, esgotou-se no dia 14/1/2019 (descontado o período de férias judiciais).

Tendo o ato sido praticado em 16/1/2019, portanto no segundo dia útil subsequente ao termo do prazo, nem tendo sido paga a multa a que alude o artigo 107º - A al. b) do CPP, o ato é extemporâneo quanto a crimes de natureza particular.

Constitui jurisprudência obrigatória do Ac. STJ de Fixação de Jurisprudência nº 1/2011: “Em procedimento dependente de acusação particular, o direito de constituição como assistente fica precludido se não for apresentado requerimento para esse efeito no prazo fixado no nº 2 do artigo 68º do Código de Processo Penal.”

Assim, por extemporânea, indefere-se a constituição como assistente de A. B., quanto aos factos susceptíveis de integrar a prática pelo denunciado crime de injúria, ocorridos em 20/6/2018.

Com relevo para a questão proposta, colhem-se dos autos os seguintes elementos:

- a) Em 13.11.2018 A. B. compareceu no Posto da GNR de Braga “para dar conhecimento dos seguintes ilícitos:

A denunciante foi funcionária da empresa “X, Unipessoal, lda.” em ..., Braga, sendo o estabelecimento um salão de cabeleireiro.

No dia 20 de junho de 2018, cerca das 18H30, a depoente desenvolveu sozinha a sua actividade laboral. Cerca das 16H30, compareceu a denunciada, S. C., que é patroa do estabelecimento, mas não se sucedeu nada de anormal. Cerca das 18H30, após a última cliente abandonar o salão, comparece o marido da denunciada, e passados breves segundos a depoente foi alertada pela denunciada para se deslocar ao quarto (local mais reservado) e sem a depoente contar foi surpreendida pela denunciada que começou a insultar a depoente em viva voz de “filha da puta, vacazola, dou-te duas chapadas bem dadas, vou-te às ventas, eu é que sou a patroa, eu é que mando aqui…” neste momento agarra no seu braço e agita a depoente num ato de desespero e atirou com a sua pessoa contra a parede sem causar ferimentos, sucedendo-se uma discussão entre ambas as partes, até que cerca das 19H05, entrou um cliente no salão e acabou a discussão, momento que a depoente pegou nos seus haveres e abandonou o local.

Ao chegar a casa e como se estava sentir muito desconforto emocional, solicitou ao seu filho para a levar ao Hospital Escala em Braga, onde recebeu assistência médica.

Como entrou de baixa não voltou mais ao local de trabalho.

De seguida foram feitas diligências de conciliação entre o seu advogado, Dr. …, e a denunciada e como esta não aceita o fim do vínculo contratual, profere ameaças junto do seu advogado nos seguintes termos “vou lhe fazer a vida negra, vou-lhe dar cabo da vida…”, motivo da depoente temer pela sua integridade física.

O local não possui sistema de videovigilância.

Indica como testemunha E. C., residente na Rua … – Terras de Bouro.

Deseja procedimento criminal contra a denunciada.”

- b) nesse mesmo dia – 13.11.2018 -, a denunciante foi notificada, tendo em conta o que ora nos interessa, “para constituição de assistente”, nos seguintes termos:
“Notificação para Constituição como Assistente
Orgão de Policia Criminal
M. G., Guarda-Principal, número ….
Pessoa Notificada
A. B.
(…)

Em cumprimento do disposto no artigo 68º do CPP, fica notificado(a) do seguinte:
Quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituam assistentes e deduzam acusação particular (artigo 50º, nº 1, do CPP), devendo para o efeito apresentar requerimento dirigido ao Meritíssimo Juiz de Direito do Tribunal onde corre o processo.
Tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias (artigo 68º nº 2, do CPP) a contar da presente notificação.
O denunciante pode declarar, na denúncia, que desja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória (artigo 246º, nº 4, do CPP) sob pena de os autos serem arquivados.
Os assistentes são sempre representados por advogado (artigo 70º, nº 1, do CPP).
Foi informado(a) sobre o regime do direito de queixa e as suas consequências processuais, bem como sobre o regime jurídico do apoio judiciário (artigo 247º, nº 2, do CPP).
Foi informado(a) sobre o regime e serviços responsáveis pela instrução de pedidos de indemnização a vítima de crimes violentos, e os pedidos de adiantamento às vítimas de violência doméstica, bem como da existência de instituições públicas, associativas ou particulares, que desenvolvam atividades de apoio às vítimas de crimes (artigo 247º, nº 3, do CPP).
A constituição de assistente dá lugar ao pagamento de taxa de justiça, nos termos fixados no Regulamento das Custas Processuais (artigo 519º, nº 1, do CPP) – 1 Unidade de Conta.

O presente documento foi integralmente lido e revisto por todos os signatários que declaram ter ficado cientes de todo o seu conteúdo e recebido cópia do ato.” (fls. 8).

O referido documento encontra-se datado e assinado pelo órgão de polícia criminal e pela notificada A. B..

- c) a 16.11.2018 A. B. informou nos autos que “por não possuir bens nem auferir rendimentos que lhe permitam suportar as despesas inerentes ao presente processo, requereu o benefício de proteção jurídica, nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento da compensação de patrono e atribuição de agente de execução (…)” Terminou requerendo que se interrompessem os prazos em curso, até à notificação da decisão do pedido de apoio judiciário. Efetivamente no requerimento onde formula o pedido de apoio judiciário, em observações, explica por palavras suas a sua pretensão, do seguinte modo: “A Requerente não possui bens, nem aufere rendimentos suficientes que lhe permitam custear as despesas inerentes ao presente pleito, nomeadamente as associadas à constituição de assistente, formulação de acusação particular e pedido de indemnização cível.”
- d) a 19.12.2018 foi junto aos autos comprovativo do deferimento do apoio judiciário formulado por A. B..
- e) a 16.01.2019 A. B. requereu a sua constituição como assistente. Juntou dois documentos: o comprovativo de que lhe foi concedido, a 14.12.2018, apoio judiciário nas modalidades de “Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, Nomeação e pagamento de compensação de patrono e Atribuição de agente de execução”; e indicação da advogada nomeada pela Ordem dos Advogados.
- f) a 24.01.2019 foi proferido o despacho recorrido (já acima transcrito).

Dispõe o nº 4 do artº 246º do CPP, que tem por epígrafe “Forma, conteúdo e espécies de denúncias”, que: “O denunciante pode declarar, na denúncia, que deseja constituir-se assistente. Tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória, devendo, neste caso a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal a quem a denúncia for feita verbalmente advertir o denunciante da obrigatoriedade de constituição de assistente e dos procedimentos a observar.”

E sob a epígrafe “Assistente”, estipula o nº 2 do artº 68º do mesmo diploma legal que: “Tratando-se de procedimento dependente de acusação particular, o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias a contar da advertência referida no nº 4 do artigo 246º.”

Conclui-se, assim, que no caso de se tratar de procedimento dependente de acusação particular, o prazo de dez dias, para requerer a constituição de assistente conta-se a partir da advertência feita ao denunciante da obrigatoriedade de se constituir nessa qualidade e dos “procedimentos a observar”.

No caso que nos ocupa, a denúncia foi apresentada por A. B., ora recorrente, a 13 de novembro de 2018, perante a GNR (órgão de polícia criminal), tendo a denunciante sido, no próprio ao, notificada para a constituição de assistente, nos termos em que referimos supra, na al. b).
É patente do teor da dita notificação, nomeadamente, que “o requerimento tem lugar no prazo de 10 dias (artigo 68º, nº 2, do CPP) a contar dessa notificação” e que “tratando-se de crime cujo procedimento depende de acusação particular, a declaração é obrigatória (artigo 246º nº 4, do CPP) sob pena de os autos serem arquivados”.

Não há qualquer dúvida que a denunciante foi notificada pelo órgão de polícia criminal (GNR), perante quem apresentou a denúncia para se constituir assistente.

Mas será que foi advertida da obrigatoriedade da constituição de assistente e dos procedimentos a observar?

Do teor da notificação efetuada, tratando-se, como se trata, de um formulário, não é expresso, no sentido de que na situação dos autos – estando em causa procedimento criminal dependente de acusação particular -,a constituição de assistente, no prazo de dez dias a contar da notificação, era obrigatória, sob pena de os autos serem arquivados.

A dita notificação tem expressões genéricas. Nela pode ler-se, por exemplo: “Quando o procedimento criminal depender de acusação particular…”, “Tratando-se de procedimento dependente de acusação particular…”, “Tratando-se de crime cujo procedimento dependa de acusação particular…”, “Foi informado(a)…”

Estas expressões, não especialmente formuladas para o caso concreto, não garantem que a denunciante tenha efetivamente ficado ciente da obrigatoriedade de constituição de assistente, no prazo legal previsto para o efeito, sob pena de arquivamento dos autos.

Não houve, ou melhor, dos autos não se infere que tenha havido, a advertência expressa a que alude o artº 246º, nº 4 do CPP. O teor da notificação de folhas 8, que acima já transcrevemos na íntegra, não é, salvo melhor entendimento, suficientemente esclarecedor para a denunciante da sua obrigatoriedade em se constituir assistente, no prazo de dez dias, para que o procedimento criminal pudesse prosseguir face à natureza (particular) do crime denunciado.

A recorrente afirma que nem quando apresentou queixa à GNR, nem mesmo posteriormente, “lhe foi transmitido que os factos que participou revestiam natureza particular, e que, por essa razão, teria que declarar a sua pretensão em constituir-se assistente e requerer a sua efetiva constituição como assistente no prazo de 10 dias.”

Assim, não resultando claro que a denunciante tivesse sido devidamente advertida da obrigatoriedade da sua constituição como assistente e dos procedimentos a observar, nem tal se podendo presumir pelo facto de a mesma ter formulado pedido de apoio judiciário onde referiu não ter meios para “custear as despesas inerentes ao presente pleito, nomeadamente as associadas à constituição de assistente, formulação de acusação particular e pedido de indemnização civil”, procede o recurso interposto, devendo a decisão recorrida ser reformulada, tomando em consideração que o pedido de constituição como assistente foi formulado em tempo.

III – DISPOSITIVO

Face aos fundamentos expostos, e, na procedência do recurso, revoga-se a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra em que, na apreciação do pedido de constituição como assistente de A. B., quanto aos factos suscetíveis de integrar a prática pelo denunciado crime de injúria, ocorridos em 20/06/2018, se considere que o respetivo requerimento foi tempestivamente formulado.
Sem custas.
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(Texto elaborado pela relatora e revisto por ambos os signatários – artº 94º, nº 2, do CPP).
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Guimarães, 29 de abril de 2019

(Clarisse Gonçalves - Relatora)
(Mário Silva - Adjunto)